UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO – UNIRIO Centro de Ciências Humanas e Sociais – CCH
Programa de Pós-Graduação em Educação – Mestrado
AS RELAÇÕES DOS JOVENS COM O CINEMA E SEUS DIÁLOGOS VIA MSN -
DESAFIOS INICIAIS DE UM CAMPO DE PESQUISA
Kelly Maia Cordeiro
Mestranda UNIRIO, bolsista REUNI
RESUMO
O artigo a seguir é um esforço de refletir sobre a pesquisa de campo realizada no contexto
do grupo de pesquisa “O cinema e as narrativas de crianças e jovens em diferentes
contextos educativos”, coordenado pela professora doutora Adriana Hoffmann Fernnades.
buscando trazer pontos relevantes de interlocução entre cinema, cibercultura e educação. A
perspectiva teórico-metodologica funda-se nos Estudos Culturais Latino-americanos, nos
estudos sobre narrativa de Benjamin num processo de pesquisa-intervenção realizada numa
escola de ensino médio através de exibições e debates de filmes bem como em diálogos
sobre cinema através de conversas na internet via MSN situando os desafios da pesquisa
pelo processo das relações. As relações entre narrativa, consumo e cinema dialogam com as
perspectivas vividas pelos alunos na cibercultura.
PALAVRAS-CHAVE: Cinema – Educação - MSN
INTRODUÇÃO
E por esse motivo trago como uma provocação a reflexão deste como dispositivo
para acessar o artigo que se apresenta como um recorte inicial da pesquisa de mestrado em
andamento no Mestrado em Educação com base no projeto “O cinema e as narrativas de
crianças e jovens em diferentes contextos educativos”que investiga a experiência de
crianças e jovens com as narrativas audiovisuais em parceria com o projeto de pesquisa
“Formação do leitor com imagem e textos em roda de leitura” do professor Pedro
Benjamin Garcia (UCP), ou seja, projetos que se desenvolvem em contextos diferentes e
trazem a relevância da linguagem audiovisual do cinema, ambos projetos iniciados em
2010 aprovados respectivamente pela FAPERJ e pelo CNPQ.
Como se trata de uma pesquisa em andamento, nosso objetivo para esse artigo num
primeiro momento é problematizar a questão metodológica da pesquisa-intervenção,
compartilhando os caminhos percorridos pelos sujeitos envolvidos, as tensões que vive a
pesquisa através das mídias digitais, trazendo as contribuições teóricas principalmente de
Castro (2008), Moreira (2008), Recuero (2011) e Amaral (2008)
No segundo momento estabelecer os encontros entre o cinema, a educação e a
cibercultura (aqui restrita aos diálogos via MSN) na pesquisa, com as bases em Duarte
(2009), Lemos (2005) e Xavier (2008). Nesse contexto consideramos que as discussões
acerca da narrativa Benjamin (1994), cultura Santaella (2003) e consumo Canclini (1997)
tornam-se relevantes para pensar a pesquisa tecendo algumas considerações de um recorte
do campo refletindo sobre as questões surgidas e que são relevantes para a pesquisa nesse
momento.
PERSPECTIVAS TEÓRICO-METODOLÓGICAS DA PESQUISA
Ao considerarmos a pesquisa em desenvolvimento com jovens do Ensino Médio
Integrado-EMI pelas interfaces do cinema e do MSN, sob as características da
pesquisa-intervenção, nos cabe contextualizar nossos entendimentos sobre esse processo e
o percurso percorrido até esse momento.
Os primeiros encontros de pesquisa ocorreram através de contatos diretos com os
jovens num dos seus espaços de atuação: a escola. Por se tratar de uma instituição onde em
seu currículo consta como central a formação de audiovisual e por perceber que havia a
necessidade de mais momentos de reflexão sobre as produções fílmicas, surgiu a demanada
de alguns professores do EMI propondo que a parceria da escola com a universidade
ocorresse por meio de trabalhos com cinema. Tal proposta consolidou-se através dos
projetos anteriormente citados que estão sendo realizados conjuntamente na escola de
ensino médio. Assim os encontros com os jovens do Ensino Médio Integrado, com o
propósito de exibir e debater as produções fílmicas foi o motivo de diálogo com a escola e
com os jovens.
O campo se situa em Petrópolis-RJ, no Colégio Estadual Dom Pedro II no “Curso
Médio Integrado de Formação profissional técnica em comunicação social com ênfase em
rádio e TV”, tendo em seu currículo formal a proposta de um projeto pedagógico
desenvolvendo as práticas audiovisuais a partir dos princípios da ciência, cultura e trabalho.
A formação de técnico audiovisual oferecida pela escola contempla estudo de roteiro, direção
de pequenos curtas metragens, análises de filmes e textos. No currículo do EMI nos dias de
quarta-feira, os jovens tem a disciplina de “Comunicação Crítica”, nosso trabalho de
pesquisa acontece sempre nessa disciplina, constituindo-se de sessão fílmica seguida de
debate.
Moreira (2008) lança mão de cinco importantes aspectos relevantes dentro da
pesquisa-intervenção: a pesquisa acontece nos espaços do cotidiano dos jovens; a demanda
da pesquisa é o que desencadeia o processo que remete a outras demandas; as tensões que
surgem no campo são objetos de analise, pois o pesquisador se coloca como mediador e o
sujeito da pesquisa é agente ativo do processo; a interação que surge ao longo do processo
afeta o pesquisador e, por último, traz a necessidade de entender que dentro da
pesquisa-intervenção o ato de conhecer e o de intervir não se separam.
Castro (2008) contribui para pensarmos o caminhar dessa prática de pesquisa ao
dizer, que dentro da mesma ação investigativa (exibir e debater filmes) temos vários atores,
várias produções e que o processo de produção da pesquisa deve adquirir as marcar dos
envolvidos, promovendo entre eles o diálogo constante, compartilhando as experiências e
respeitando as diferentes formas de compreender e interpretar as questões. As produções
são fruto dessa colaboração, respondem aquelas questões postas pela demanda sendo os
jovens percebendo que suas visões estão sujeitas a transformações e reconstruções. Não se
trata de reconhecer a inexistência da hierarquização de poder que possa haver entre
pesquisador e pesquisado, e sim, reconhecer e se posicionar de maneira a reconhecer a
ambivalência das relações sendo tomado pelas interlocuções que o contexto da pesquisa
traz.
Por toda singularidade do próprio campo a pesquisa qualitativa sob as marcas da
pesquisa-intervenção realiza-se em consonância com o estudo teórico das narrativas de
Walter Benjamin. No contexto trazido por Benjamin (1994) a narrativa sofre mudanças de
acordo com os avanços da sociedade, nas bases esta era produzida e contada coletivamente,
pertencia ao tempo e momento contado, sendo sempre carregada pelas impressões de seu
narrador, que usava do resgate as memórias da experiência vivida e da oralidade o ponto
central da narração. A formação do sujeito se constituía pela narrativa experimentada.
Dialogando com Benjamin, Larrosa (2002) comunga por explora caminhos para
além da ciência e da técnica dos dias atuais, valorizando os processos em que passa a
experiência, entendo que esta para significa para o sujeito ficar exposto ao acontecido e ser
tocado por ele. Para tanto, é preciso:
“parar para olhar, parar para escutar, pensar mais devagar, olhar mais
devagar e escutar mais devagar; parar para sentir, sentir mais devagar,
demora-se nos detalhes, suspender a opinião, suspender o juízo,
suspender a vontade, suspender o automatismo a ação, cultivar a atenção
e a delicadeza, abrir os olhos e os ouvidos, falar sobre o que nos
acontece, aprender a lentidão, escutar aos outros, cultivar a arte do
encontro, calar muito, ter paciência e dar-se tempo e espaço”
(LARROSA, 2002 p. 19)
No contexto atual temos as marcas das mídias presentes no contexto da sociedade, o
tempo como certo aligeramento do fazer e o consumo com marca da sociedade. É nesse
sentido que ao trazer o consumo como processo cultural Canclini (1997) nos coloca diante
que este se aporta não somente na vertiginosa aquisição de produtos que veiculam nas
mídias, mas diante das relações que se desenvolveram na produção e nos modos de uso.
Nesse sentido o autor destaca que "o consumo serve para pensar" porque os modos de uso
apontados pelos sujeitos demonstram que estes constroem através do consumo modos de
relacionar-se, participar de grupos e criar identidades.
Nesse sentido a pesquisa-intervenção no diálogo com o cinema constituiu-se como
espaço de construção de narrativas pelos sujeitos como também de percepção dos
consumos culturais por eles vivenciados.
O CAMPO DE PESQUISA E SEUS DESAFIOS
No ano de 2010 três encontros com os jovens do EMI foram realizados: “O
Leitor” em 19/05; “O Carteiro e o poeta” em 15/09 e “Fahrenheit 451” em 20/10. Filmes
com temática diversificada, de países variados e formato diferenciado.
Sempre que um filme vai ser exibido e este foi uma obra impressa, os jovens tem
acesso a algum tipo de literatura referente a ela: o próprio livro, resenha ou textos
produzidos pelos docentes com a intenção de contextualizar a obra. Após as exibições
fílmicas e debates realizados o processo se inverte, passando os jovens a serem autores
escrevendo textos como resenhas sobre a obra lida, assistida e debatida ou mesmo
produzindo outros materiais como fotos relacionadas ao filme.
Em 2011 dando continuidade foram exibidos quatro filmes: “Adeus Lenin!” em
04/04; “Ensaio sobre a cegueira” em 17/08; “Balzac e a costureirinha chinesa” em 28/09 e
“Edifício Master” com data para 11/11. Utilizamos para esses momentos como técnica de
pesquisa o registro em diário de campo, as gravações dos debates e as produções realizadas
pelos jovens.
Após a exibição do primeiro filme do ano corrente- Adeus Lenin!- tomei a iniciativa
de solicitar os contatos de MSN deles e um grupo de dois a três jovens concordaram em dar
continuidade ao diálogo sobre filmes através da interface do MSN, ambiente de uso
cotidiano desses jovens. Com o tempo esse grupo cresceu e as conversas se ampliaram para
além dos filmes do encontro presencial passando a fazer parte dessa conversa também
outros filmes.
Com base nessa relação de reciprocidade, colaboração e mediação como
pesquisadora o campo de pesquisa foi se constituindo, focando como objeto de estudo a
relação dos jovens com o cinema e os diálogos sobre o cinema pelo MSN.
A pesquisa pelo MSN ainda em processo inicial, pois não iniciou-se junto com a
exibição dos filmes, recorremos principalmente as contribuições de Raquel Recuero e
Adriana Amaral entendendo que o aporte teórico-metodológico da pesquisa pelo contexto
da cibercultura é um desafio que enfrentamos enquanto pesquisadoras nesse espaço.
A pesquisa empírica no escopo das interfaces midiáticas vem ganhando vários
sentidos resignificando as bases estruturais da pesquisa social. De acordo com Recuero
(2011) são necessárias algumas considerações para que a investigação nas redes sociais se
torne consistente, cabendo a ênfase nas definições dos atores, da conexão e da abordagem,
uma vez que estamos falando de um complexo entrelaçamento de interfaces.
Amaral (2011) discorre sobre a pratica da abordagem da etnografia e termos
relacionados a esta quando utilizada no ambiente da internet: etnografia virtual,
netnografia, etnografia digital, webnografia e ciberantropologia. A definição de etnografia
que a autora incorpora se aporta em Angrosino (2009): “A etnografia é a arte e a ciência
de descrever um grupo humano- suas instituições, seus comportamentos interpessoais, suas
produções materiais e suas crenças” (apud Amaral 2011).
E na compreensão da autora:
“compreende os estudos de inspiração etnográfica como aqueles que não
o utilizam como metodologia, mas apenas como narrativa ou que se
utilizam de partes dos procedimentos etnográficos de pesquisa, mas não
chegam a ir a campo, porém, podem incorporar protocolos
metodológicos e práticas de narrativas como história de vida, biografias
ou documentos para compor a análise dos dados” (AMARAL,2011,
p.168).
Os caminhos da etnografia nas bases que se apresentam, possibilitam a imersão aos
produtos culturais criados pelos sujeitos da pesquisa – alguns dos quais tivemos
conhecimento outros vamos descobrindo no decorrer da pesquisa - bem como vídeos
produzidos por eles e colocados no YOUTUBE (para o presencial) e paralelamente
podemos desenvolver ações que resgatem práticas passadas. Fator importante ao
consideramos que o MSN é uma interface de mensagens instantâneas, em tempo real que
agrega membros autorizados para a comunicação, que na maioria das vezes se dá de forma
descontraída e informal.
O uso cultural que os jovens fazem do MSN é que dá sentido ao permanecer e
interagir dos movimentos nas redes sociais. “Mari” educanda do EMI, por exemplo, tem
como pratica habitar o MSN como “uma maneira de "estar" com os meus amigos, de
compartilhar sentimentos, emoções, fotos, palavras, conhecimento... E assim, nunca os
abandona mesmo quando estou longe” recolocando a idéia de espaço e de tempo físico,
mesmo que o corpo esteja centrado num lugar.
Para os estudos de pesquisa com base na cultura digital, Amaral (2008) utilizando
principalmente os estudos de Hine e Kozinets, ao falar da netnografia a coloca como
“método interpretativo e investigativo para o comportamento cultural e de comunidade
online”. A autora defende a imersão do pesquisador uma vez que o comportamento e as
informações produzidas não são de controle de quem realiza a pesquisa. Amaral (2008)
pondera sobre a ética na pesquisa ao uso das informações;
“os pontos cruciais que requerem a discussão de uma ética de pesquisa,
segundo Kozinets (2002) são, até onde a informação contida num site é
pública ou provada e o que é o uso consensual de informações no
ciberespaço. Sendo a netnografia uma metodologia que se utiliza da
captura de informações interativas vindas de pessoas reais, não apenas
de informações textuais passadas por uma edição”
E sobre a identidade dos atores da pesquisa a autora afirma que o caminho
eticamente recomendável, é que o pesquisador se identifique e identifique o interesse de sua
pesquisa, pedindo as permissões necessárias para o uso das informações obtidas em postagens e em
conversas com os participantes das comunidades e fóruns além da garantia de confidencialidade e
anonimato aos informantes. (AMARAL, 2008, . p. 9)
Sendo assim o por todo processo da pesquisa é necessário o olhar atento do
pesquisador, que nesse contexto é o medidor do processo, para as questões previstas e
imprevistas da pesquisa.
AS INTERFACES DO CINEMA, EDUCAÇÃO PELO MSN
O processo que hoje caminha a sociedade em torno da informação e interação por
meios eletrônicos, vem redesenhando o cenário das relações sociais e das formas de
aprender de crianças, jovens e adultos através dos usos das mídias digitais. Além da
mobilidade estamos falando hoje da acessibilidade pela conectividade, da autoria e
co-autoria ao pensarmos as interfaces que estruturam a comunicação.
Para Lemos (2005), o contexto da globalização vista como um processo político e
diferenciado a cada localidade, vem a contribuir com a expansão e repercussão midiática no
Brasil, mesmo que esta se encontre ainda em fase de desenvolvimento e desafios
complexos a serem superados.
Ao refletir sobre a globalização Santos (2010) nos diz que os efeitos desta está
diretamente ligado a ação do homem aos espaços ampliado geográficos da Terra, nos
colocando diante da compartimentação e fragmentação desses espaços cabendo ao lugar o
determinante, central do que o autor chama de “contrarracionalidade”. Portanto, os
processos culturais mesmo que se diga pertencer a uma rede global, não serão homogêneos,
se darão de forma diferenciada a cada lugar e assim também a cultura digital trazida por
Lemos (2005) “ciber-cultura-remix”,
A cibercultura caracteriza-se por três “leis” fundadoras: a liberação do pólo da
emissão, o princípio de conexão em rede e a reconfiguração de formatos midiáticos e
práticas sociais. Essas leis vão nortear os processos de “re-mixagem”
contemporâneos. Sob o prisma de uma fenomenologia do social, esse tripé (emissão, conexão, reconfiguração) tem como corolário uma mudança social na vivência do
espaço e do tempo.(LEMOS 2005 .p 01)
As relações que atravessam esses usos vem nos fazendo repensar e a reestruturar a
cultura digital e o território socialmente redesenhado que circunda a cibercultura,
principalmente pela difusão dos meios móveis de interação social. Santaella (2003) explica
que as formações culturais- cultura oral, escrita, impressa, massiva, das mídias e
cibercultura- não se anulam ou se esgotam na suas respectivas temporalidades, elas estão
presentes na contemporaneidade de forma simultânea e carregada da simbologia local. “isso
se explica pelo fato de que a cultura humana existe num continuum, ela é cumulativa, não
no sentido linear, mas no sentido de interação incessante de tradição e mudança,
persistência e transformação.” (Santaella Ibid:06)
Na proposta de pesquisa em andamento, a cultura digital pelo cinema é um dos
espaços habitados pelos jovens, se destaca não só pela relação hibrida que a caracterizou ao
longo da sua origem, ao transitar entre ficção e realidade movimentando o imaginário
social, mas também pelos modos como circulam pela rede, ora como lugar de difusão de
sua obra, com janelas especificas com informações de filmes variados e possíveis
comentários exteriores, ora como espaço ainda incerto de reprodução fílmica, Freitas
(2002).
O cinema que é uma linguagem audiovisual, real e de ficção, que atravessa os
limites territoriais e do imaginário, trazendo acima de tudo elementos para pensarmos a
sociedade, como o seu próprio consumo. Caminhando no sentindo de pensarmos as
relações entre cinema e educação, encontramos nas proposições de Xavier (2008) um
argumento bastante forte que não coloca em foco os conteúdos programáticos escolares,
mas recai sobre o papel principal de provocar reflexões, de desestabilizar a linha do
pensamento único, com novos elementos que podem re-significar as leituras concebidas.
Para ele, “um cinema que “educa” é um cinema que (nos) faz pensar”, o espectador ao se
colocar diante da experiência do cinema, que tem uma linguagem específica e não
comparativa as outras linguagens, só é atingido por ela quando começa a refletir sobre o
visto, construindo outras operações a partir da exibida.
Seguindo nessa compreensão de apropriação dos bens culturais, Canclini (1997) nos
diz que o consumo sofre um processo de racionalidade, não se consome apenas por
manipulação, por passividade de receber a informação e acatar. O consumo exige um ato
pensado, que se estrutura pelas organizações sociais dos sujeitos, nas mediações entre ele e
o grupo social a qual pertence.
Dentro dessa compreensão de “regras” para o consumo que o autor propõe,
destacamos a racionalidade sóciopolítica interativa, nesse campo as interferências de outras
áreas estão sempre presentes, criando mobilidades locais. O que determina o consumo não
é só a oferta, mas também o grupo social. Os sujeitos vão se agrupando por essa identidade
de consumo. Desse modo, os filmes que são consumidos por esses jovens não dizem
respeito somente à organização escolar, mas podem refletir num consumo para além desse
espaço através das relações que constroem com os amigos.
A seguir trazemos um recorte da pesquisa, que retrata a relação do jovem com o
cinema e o MSN.
O CONSUMO DO CINEMA COMO “COMPROMISSO” DE FÃ
O recorte que agora trazemos para esse artigo faz parte de uma conversa no MSN, uma
conversa com o jovem “Drigo” que entre outros assuntos que esteve presente, destaco o
trecho sobre o filme Harry Potter. Opto nesse momento em manter a formatação fiel da
conversa, por entender que está é relevante como princípio para a compreensão do diálogo
desenvolvido. Bem como reconhecer a interface do MSN como uma conexão pesquisa
(Recuero, 2011)
[...]
Pesquisadora diz:
vc curte esses filmes sequenciais?
Drigo diz:
Sim, harry potter marcou minha época desde pequeno eu assistia, tenho os
livros. E eu só tenho 17 anos, rs.
Pesquisadora diz:
Kkkk,o que sentiu tendo encerrado a serie?
Drigo diz:
eu fiquei triste, pois não terei mais aquele compromisso de todo ano
comparecer na estréia do filme no cinema é como se uma história que
estava me acompanhando há tempos tivesse terminado. mas eu fiquei
feliz porque foi um filme muito bem trabalhado, os dois últimos foram os
mais fiéis ao livro, o que era uma das maiores exigências dos fãs da série
[...]
Pesquisadora diz:
os efeitos tbm me fascinara
Rodrigo diz:
mas assim, a cena que mais me marcou de todos os filmes foi a cena da
caverna que o dumbledore e o harry foi tentar buscar o colar, no enigma do príncipe porque qd eu li foi exatamente como imaginei sem tirar nem
por.
Foi surpreendente nessa parte, eu ainda não tive tempo de assistir em 3d
mas os efeitos ficaram bem legais dessa vez várias cenas de destruição de
hog na sala precisa tbm.
pesquisadora diz:
vc me chamou atenção para uma coisa: essa do livro q vc leu e ver na tela,
ja vi q vc curte isso. Mas isso cria expectativa pra vc?
Drigo diz:
ah, demais.
Pesquisadora diz:
e qd não é real como imaginou?
Drigo diz:
dos filmes que eu já vi, os unicos que eu havia lido o livro antes foi
mesmo harry potter os outros tipo crepúsculo, marley e eu não tinha lido e
ainda não tive tempo de lê-los para ver se faltou alguma coisa no filme, rs.
ah, no sétimo filme quando eles foram encontrar a batilda (se não me engano é isso), em hogsmead foi diferente do que eu pensei.
não me lembro de ter me surpreendido negativamente ao ver uma cena já
esperada.
Pesquisadora diz:
então vc qualifica o filme como?
Drigo diz:
o filme é 10, tanto a parte 1 como a parte 2 foram os mais fiéis,
mantiveram um ritmo de filme interessante
Pesquisadora diz:
vc leu criticas negativas sobre eles?
Drigo diz:
sim
Pesquisadora diz:
fala uma
Drigo diz:
e eu até concordo em partes, mas para mim não fez muita diferença
que o fim do parte 2( a morte do vold) ficou estranha,mas ficou mesmo
,rsrsrs, para quem leu livro ficam ais evidente, mas para quem não leu,
ficou mais ou menos quando o filme acabou meu irmão ficou me
perguntando algumas coisas, ele não leu os livros.
Pesquisadora diz:
de alguma forma os produtores linkaram o livro ao filme. certo?
Drigo diz:
e a falta de destaque das mortes de alguns personagens importantes, como
o lupin e a tonks
sim,certo.
Pesquisadora diz:
eu fui assistir com uma pessoa q não assisitu a nenhum, ficou perdido,
não entendeu e achou chato
Drigo diz:
Hahaha,impossivel assistir o sétimo sem ter assistido pelo menos o 5, 6 e
o 7 parte 1
[...]
(Diálogo extraído do contexto da pesquisa pela interface do MSN, no dia
15 de agosto de 2011).
Diante do que foi exposto, destacamos no diálogo apresentado a relação do jovem
com o cinema, a leitura por diferentes caminhos que ele fez para narrar sua experiência
com o filme Harry Potter, a convergência das mídias sobre a obra e como o cinema
atravessa a sua história de vida.
Duarte (2009) ao abordar sobre as conexões do receptor, dos estágios do ponto de
vista de um sujeito passivo para sujeito ativo, acrescentando ainda que este é provido de
subjetividades que estão além de serem demarcadas, estas vão interferir completar e
modificar, sua visão diante do visto. O modo como o sujeito estrutura e compõe
significado a obra, está impregnada de suas experiências, ao contar ele vai incorporando
outros signos a obra estabelecendo a releitura. “Drigo” expressa emoção, conhecimento
dos personagens, das cenas, demonstra que seu conhecimento sobre o filme, vai além das
telas do cinema, a interação livro e cinema se fez presente nessa passagem.
A esse processo de interação entre o texto escrito, lido e o audiovisual, podemos
compreender através das narrativas que “Drigo” percebemos o quanto ele foi tocado pela
obra cinematográfica e escrita, aparecendo como marca de sua história de vida. Ele diz:
“Harry Potter marcou minha época desde pequeno eu assistia, tenho os livros. E eu só
tenho 17 anos, rs”.
Avançando, trazemos na passagem a seguir, o ponto de vista de “Jessi” sobre o que
é oferecido pela escola. Sabendo que não estávamos conversando de um filme especifico e
sim de uma forma geral sobre os filmes que são exibidos e debatidos.
[...]
Pesquisadora diz:
Esses filmes e discussões contribuem de q forma pra vc?
Jessi diz:
Acho que com a opinião de cada um nós colocamos pontos, que talvez
outros não tenham visto. Elas ajudam bastante na hora de preparar as
resenhas, a gente acaba conhecendo mais sobre a parte técnica do filme,
como: produção, edição, fotografia e afins.
Pesquisadora diz:
e fora da escola, esse debate ajuda de alguma forma?
Jessi diz:
Ajuda sim, o nosso olhar muda.
A gente presta mais atenção aos filmes, não vemos mais porque disseram
que a história é boa ou porque bateu record de bilheteria.
Nós prestamos atenção aos detalhes, detalhes que talvez sem o EMI não
perceberíamos e alguns filmes não teriam a tal apreciação que tem.
[...]
(Diálogo extraído do contexto da pesquisa pela interface do MSN, no dia
23 de agosto de 2011).
O cinema nesse contexto é encarado como formação direta ao sujeito, sofre um
processo que intenciona tirar os sujeitos da zona de conforto ao assistir a um filme.
Percebe-se que, a partir do projeto oferecido, os sujeitos desenvolvem hipóteses,
argumentos, discorda, pensa nas técnicas, nas intenções do diretor, no som e na linguagem.
Mesmo não estando de posse dos objetivos e do programa do EMI, os relatos dos jovens
nos indicam que há pelo menos dois tipos de sentidos produzidos pelos jovens nos debates:
os relacionados a técnica do cinema e os relacionados a interpretação do filme.
Para Duarte (2009) é muito importante que a escola possa contribuir para a
formação estética dos espectadores do cinema, favorecendo o acesso a bons filmes, a
ensinar a analisar e julgar as obras de diferentes formatos e nacionalidades. Se constrói essa
formação compartilhando e estimulando as experiências.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O processo de escrita deste artigo contribui para pensarmos a pesquisa nesse
momento. Um dos desafios meus como pesquisadora é ampliar as análises iniciais e
construir caminhos para diálogo do tema que possam ir além desse primeiro olhar inicial da
pesquisa. Esse texto me possibilitou pensar, de alguma maneira, sobre as produções dos
jovens, percebendo algumas questões que aparecem como elementos constitutivos da
pesquisa e necessitam de aprofundamento.
Algumas inquietações nos saltam: O que nos dizem esses jovens que são
“produtores” de audiovisuais sobre as relações de consumo hoje apresentadas na
sociedade? Qual a relação dos jovens deste curso com o cinema além dos muros da escola?
De que forma isso acontece?
No campo metodológico o que percebemos é a necessidade de traçar mais uma
etapa da pesquisa a partir das leituras e análise dos processos concebidos, realizando
entrevistas e analisando produções realizadas por eles que nos permitirão perceber melhor o
contexto vivido pelos jovens fora da escola nas relações entre cinema e cibercultura vivida
pelos jovens do EMI.
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