Doença micronodular difusa
Autores
Karin Storrer-Pós-graduanda em doenças intersticiais-UNIFESP-SP
Lilian Kuranishi-Pós-graduanda em doenças intersticiais-UNIFESP-SP
Naienne Stecca-Ex-residente do Serviço dePneumologia da UNIFESP-SP
Rimarcs G Ferreira-Docente, serviço de Anatomia-Patológica-UNIFESP
Cássio Gomes Reis Jr-Radiologista-HSPE-SP.
Carlos AC Pereira-Orientador de PG, Doenças Intersticiais-UNIFESP
Caso
Homem, 33 anos, negro, procedente de São Paulo, natural da Bahia, dois filhos,
polidor de ferro. Procurou serviço médico de referência após alteração em exame de
radiografia de tórax, realizado de rotina na empresa. Na ocasião era assintomático do
ponto de vista respiratório, não se queixava de alterações nos diversos aparelhos e
sistemas, não era portador de nenhuma comorbidade e não fazia uso de nenhuma
medicação. Nunca havia fumado e negou contato com pássaros e mofo. Há 12 anos
trabalha polindo peças de ferro com lixadeiras e soldando-as com solda elétrica; faz uso
de máscara facial para proteção, porém não em tempo integral.
Ao exame físico estava em bom estado geral, acianótico, afebril, anictérico,
eupneico, FR= 16 irpm, FC= 78 bpm, PA= 120/80 mmHg, Sat O2=97%, ausculta
pulmonar e cardíaca sem alterações, abdome e membros sem particularidades.
Espirometria com VEF1/CVF: 0,83 (98%), CVF: 4,36 L, (84%), VEF1: 3,61 L
(84%), dentro dos limites da normalidade.
Figura 1.Tomografia de alta resolução
Questão 1. As causas mais comuns de nódulos miliares difusos, dentre as abaixo,
são:
A) Pneumoconioses
B) Carcinoma bronquíolo-alveolar
C) Sarcoidose
D) Tuberculose
E) Metástases
As causas mais comuns de nódulos miliares são: tuberculose e metástases. Micoses
(histoplasmose e raramente paracoccidiodomicose e outras micoses) e sarcoidose
podem dar padrão miliar. As metástases miliares tem como fontes mais comuns o
carcinoma renal, carcinoma de tireóide e o melanoma, lesões altamente vascularizadas.
O carcinoma de tireóide pode resultar em padrão miliar assintomático. Ocasionalmente
a origem das metástases miliares é o próprio pulmão, situação na qual uma lesão maior
é usualmente visível. Em casos de metástases, achados de disseminação pelos linfáticos
e gânglios mediastinais podem ser encontrados.
Alguns casos de sarcoidose um padrão miliar pode ser observado.
O carcinoma bronquíolo-alveolar pode resultar em nódulos de aspecto miliar. Em geral
são de padrão centro-lobular, pela disseminação broncogênica das lesões, e mal-
definidos.
As infecções pulmonares em geral resultam em nódulos pulmonares centrolobulares,
com padrão de árvore em brotamento, porém algumas infecções virais, tais como
pneumonia por varicela, e infecção pelo CMV podem resultar em nódulos miliares. Na
tuberculose miliar, lesões residuais, ou focos de consolidação com ou em cavidades
podem estar presentes. Na tuberculose miliar em não idosos e não hospedeiros
comprometidos, perda de peso, febre e debilidade são esperados. Linfopenia é
freqüente, bem como anormalidades da função hepática, especialmente elevação da
fosfatase alcalina (em torno de 90% dos casos). Esplenomegalia é também comum.
Quando escarro é obtido, a cultura é positiva em torno da metade dos casos. Na
ausência de escarro, broncoscopia com biópsia trans-brônquica poderá revelar
granulomas, com ou sem caseose e com ou sem baciloscpia positiva.
Outras condições que podem resultar em padrão miliar são as pneumoconioses
(pneumoconiose dos trabalhadores do carvão, silicose, siderose), histiocitose de células
de Langerhans, amiloidose e microlitíase alveolar.
As alterações iniciais da silicose são de nódulos de 1-3 mm, bem definidos,
especialmente nas partes posteriores e superiores dos pulmões. Na TC em geral os
nódulos são centrolobulares e perilinfáticos.
Resposta correta: D e E
Questão 2. O padrão tomográfico mostrado corresponde a:
A) Nódulos centrolobulares
B) Nódulos de distribuição perilinfática
C) Nódulos de distribuição randômica
D) Padrão de árvore em brotamento
A radiografia de tórax mostra nódulos pulmonares às vezes mais facilmente do que a
TCAR, por efeito de somação. Entretanto, a TCAR permite localizar os nódulos
pulmonares em sua forma de distribuição (principalmente se simétrica ou assimétrica) e
sua relação com o lóbulo pulmonar secundário. Três padrões são clássicos na
caracterização dos nódulos pulmonares: centrolobular, perilinfático e randômico.
Além disso, os nódulos são classificados em grandes (>1 cm), médios e pequenos ou
micronódulos (≤0,3 cm).
O lóbulo pulmonar secundário é a menor porção do pulmão separada por septos
conjuntivos. Nos septos interlobulares encontram-se veias e linfáticos (figura 2). No
centro do lóbulo encontram-se a arteríola e o bronquíolo centrolobular. Proximalmente
ao bronquíolo terminal, e correndo junto ao feixe broncovascular, encontram-se
linfáticos.
Figura 2. Lóbulo pulmonar, com destaque para arteríola e bronquíolo centrolobular, e
linfáticos e vênulas perilobulares.
Os nódulos de distribuição centrolobular, refletem na maioria das vezes doenças
bronquiolares. Estes nódulos situam-se a pequena distância da pleura, mas o contorno
pleural, habitualmente liso na TCAR, não é afetado. Em geral os nódulos centro-
lobulares são de contorno mal-definido, por expressarem processos inflamatórios
bronquiolares. Nas doenças por inalação de poeiras inorgânicas, os nódulos
centrolobulares podem ser bem definidos, como na silicose. Quando os nódulos
centrolobulares são ramificados, o padrão é denominado de árvore em brotamento
(“tree-in-bud”), que expressa em geral bronquiolites infecciosas ou inflamatórias não
infecciosas.
O padrão perilinfático se caracteriza por distribuição dos nódulos ao longo do feixe
broncovascular, nos septos interlobulares e nas regiões subpleurais, onde se situam os
linfáticos. Na TCAR, nódulos situados nas cissuras, refletem o envolvimento dos
linfáticos subpleurais.
O padrão de distribuição randômica, ou ao acaso, expressa o comprometimento de
diversos compartimentos pulmonares, envolvidos aleatóriamente, de modo que se pode
observar nódulos centrolobulares e subpleurais, mas a característica é a distribuição
simétrica e difusa de nódulos bem definidos, sem predomínio de envolvimento. Este
padrão reflete em geral doenças de disseminação hematogênica.
Exemplos de distribuição são mostrados abaixo.
A B C
Figura 3. Padrões perilinfático (A), árvore em brotamento (B) e randômico (C).
Um algoritmo para caracterização da distribuição dos nódulos pulmonares é mostrado
abaixo.
No presente caso os nódulos poupam as regiões subpleurais e/ou perifissurais, distam
pequena distância da pleura e em alguns cortes, como no último da figura 1, são mal-
definidos, sendo, portanto, caracterizados como centrolobulares.
Resposta correta: A (nódulos centrolobulares).
Referências
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Questão 3. A maioria das fumaças de solda contém:
A) Manganês
B) Cromo
C) Ferro
D) Níquel
E) Silicatos
As soldas de arco elétricas servem para unir metais e ligas que se tornam
macias ou líquidas depois de submetidas a temperaturas elevadas que podem atingir até
12.000°C assim que a eletricidade passa de um condutor ao outro. Este processo produz
substâncias gasosas e poeiras compostas de um conjunto de metais e outras substâncias
químicas volatilizadas dos eletrodos. Os fumos de solda são partículas sólidas muito
finas de óxidos de metais formadas durante o processo de soldagem. Os tipos de
substâncias e as respectivas quantidades que um soldador inala dependem do método de
soldagem, das condições nas quais a soldagem é realizada e dos tipos de metais a serem
soldados. Os componentes primários dos fumos de soldagem são óxidos de metais
usados na manufatura dos eletrodos consumidos durante o processo de soldagem. A
maioria das fumaças geradas contém ferro (80–95%) e manganês (1–15%). Eletrodos
de aço inoxidável são comumente usados na indústria de soldagem e contém cromo
(15–30%) e níquel (5–10%) em adição ao ferro e manganês. Dependendo do processo e
materiais usados, outros elementos podem ser encontrados nos fumos de solda,
incluindo alumínio, zinco, cádmio, cobre, chumbo, fluoretos, sílica, bário, magnésio,
cálcio, estanho, cobalto e berílio.
O processo de soldagem pode ser feito por várias técnicas e equipamentos,
estimando-se que existam mais de 80 tipos de soldagem.
Embora o termo “pulmão da solda” tenha sido usado como sinônimo de siderose, o
termo deve ser evitado, desde que é inespecífico. Pneumoconiose em um soldador pode
representar a resposta a um componente individual, ou o efeito cumulativo de
exposições mistas. Um diagnóstico mais preciso deve ser feito, como siderose,
pneumopatia por metal duro, beriliose, sidero-silicose e outros.
Resposta correta:C
Referências
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O paciente foi submetido à biopsia pulmonar a céu aberto por toracotomia
direita. O exame anatomopatológico evidenciou achados de siderose (figura 4).
Após o diagnóstico o paciente foi orientado a se afastar da exposição.
Figura 4. Achados anatomopatológicos
Questão 4.Assinale a alternativa correta em relação à siderose pulmonar:
A) Não há fibrose associada
B) A ferritina sérica pode estar elevada
C) Mesmo com o afastamento da exposição a doença não regride
D) O tempo de latência entre início de exposição e doença é menor que cinco anos
E) Deposição de ferro de causa endógena, como na hemossiderose pulmonar,
resulta em achados histológicos idênticos à siderose exogena
Comentários
A siderose pulmonar é uma pneumoconiose causada por inalação de poeiras
contendo óxido de ferro. Embora descrita inicialmente em soldadores de arco elétrico
ocorre em numerosas ocupações: polidores, fundidores, lixadores, extratores de minério
de ferro, produtores de pigmentos naturais contendo óxidos de ferro.
Estudos epidemiológicos apontam prevalências diversas entre os expostos. Em
1978 um estudo com 661 soldadores mostrou prevalência de 3,4%. É aceito um período
mínimo de cinco anos de exposição para o aparecimento das lesões, no entanto o tempo
de latência varia amplamente.
A lesão pulmonar na siderose se deve ao acúmulo de macrófagos carregados de
grânulos de ferro, porém sem espessamento septal ou alveolite e, portanto, a doença é
descrita como uma pneumoconiose benigna em que há pouca incidência de sintomas e
as provas de função pulmonar são próximas dos limites da normalidade. Quando os
sintomas ocorrem a queixa respiratória mais comum é a bronquite, porém uma
associação definitiva entre a solda e asma ocupacional ainda carece de mais estudos.
Alguns estudos relatam que quando a siderose apresenta sintomas pode estar
associada com silicose. No entanto alguns estudos têm mostrado que soldadores de ferro
podem ter fibrose pulmonar sem a coexistência de silicose. Billings e Howard
encontraram aumento da incidência de câncer pulmão e de doença obstrutivas das vias
aéreas, causada por exposição a oxido de ferro e outros agentes. O risco maior estaria
nos indivíduos expostos à mistura de ferro com maiores quantidades de cromo e níquel,
ambos sabidamente carcinogênicos. Em outro estudo de soldadores não se observou
aumento no número de neoplasias pulmonares. Outros fatores confundidores nesta
relação podem ser o tabagismo e exposição simultânea a asbesto.
Há relatos de siderose associada a acúmulo de ferro sérico em pacientes
sem doenças hematológicas que pudessem explicar tal acúmulo, nem história de
múltiplas transfusões ou consumo alcoólico. Aumento da concentração de ferritina
sérica pode vista nestes indivíduos, e o mecanismo para esta elevação envolve
fagocitose das partículas inaladas de ferro pelos macrófagos alveolares, que são
gradualmente transportadas do espaço alveolar para o interstício e deste para o estoque
corporal. Outras causas de elevação da ferritina devem ser excluídas.
A apresentação radiológica mais comumente observada nas radiografias destes
pacientes são micronódulos distribuídos difusamente em ambos os pulmões, que podem
predominar nas regiões peri-hilares. Os nódulos representam acúmulo das partículas de
ferro no macrófagos agregados nos espaços alveolares peribronquiolares e linfáticos
peribroncovasculares. Na TCAR nódulos centrolobulares com ou sem ramificações são
observados na maioria dos casos.
O diagnóstico dever ser feito com história bem documentada de exposição ao
metal e alteração radiológica compatível. Alguns estudos mostram dosagem aumentada
de ferritina no fluido do lavado broncoalveolar, podendo este dado ser útil no
diagnóstico de alguns casos. A biopsia pulmonar deve ser feita em casos de dúvida, e a
principal diferenciação deve ser com a silicose pulmonar.
A biópsia pulmonar revela deposição perivascular e peribronquiolar de pigmento
de ferro. O pigmento, o qual consiste predominantemente de óxido de ferro, típicamente
é marron escuro ou preto, frequentemente com um halo dourado. Siderose deve ser
diferenciada de deposição endógena de ferro, por exemplo, por congestão passiva
crônica, situação na qual numerosos macrófagos estão carregados de hemossiderina.
Embora a hemossiderina e o pigmento de ferro exógeno se corem com o azul da Prússia,
a hemossiderina não tem os centros escuros característicos do óxido de ferro.
O tratamento é o afastamento do trabalhador do local de exposição, ou mudança
de setor. Em alguns casos há reversão completa das lesões. Nos casos em que há
exposição a outras poeiras lesivas, pode haver progressão para formas graves de fibrose.
A prevenção deve ser feita com uso de equipamento proteção individual, radiografias e
espirometrias freqüentes.
Resposta correta:B
Referências
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