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arquitextos ISSN 1809-6298
130.04 ano 11, mar 2011
Clareza compositiva e a herança moderna brasileira. O
caso do edifício da FIEP em Campina Grande Marcio Cotrim Cunha
Fonte: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/11.130/3787
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
O edifício sede da FIEP/SESI/SENAI é facilmente reconhecido na paisagem urbana de
Campina Grande, não apenas por sua massa – visivelmente maior que os outros
edifícios no seu entorno –, mas sobretudo por um evidente caráter monumental e, ao
mesmo tempo, prototípico.
Essas características – monumentalidade e exemplaridade – foram atribuídas por
Carlos Eduardo Comas(1)em 1987 ao edifício do MES construído na segunda metade dos
anos 1930 e início dos anos 1940. Obviamente há diferenças abismais entre um
edifício e o outro, e um universo de acontecimentos que o separam. Porém cabe
perguntar: quais aspectos outorgam ao edifício da FIEP/SESI/SENAI as
características de monumentalidade e exemplaridade encontradas no MES? A resposta
inevitavelmente se desdobra em outra pergunta: a sede da FIEP/SESI/SENAI pode ser
entendida como parte de umalinhagem de edifícios institucionais modernos no Brasil
iniciada com a antiga sede do Ministério da Educação e Saúde?
O edifício na paisagem e no tecido urbano
O edifício, construído entre 1978 e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno
Ribeiro da Silveira, ocupa um lugar privilegiado na cidade de Campina Grande;
justamente na divisa entre o centro e o bairro de José Pinheiro onde se forma,
junto com a margem leste do Açude Velho, a Praça José Lopes de Andrade, resultante
da bifurcação consequência do açude. O terreno localizado na extremidade nordeste
do açude possui uma forma bastante irregular, delimitada pelas Avenidas Manoel
Guimarães, Rua João Florentino de Carvalho, Rua Almirante Tamandaré e a Rua Campos
Sales. O acesso principal se dá pela Avenida Manoel Guimarães, que surge da
convergência – em uma rotatória – entre a BR 104 e a BR 230, os dois principais
acessos à cidade. A forma resultante do terreno é a de uma espécie de “L” – com
ângulo obtuso – em um dos pontos excepcionais do tecido urbano da cidade. Essa
excepcionalidade permitiu duas características contraditórias: certo isolamento na
paisagem e ao mesmo tempo uma localização central na cidade. Se pensado em
termos rossianos, a praça, a rotatória o açude e o terreno, constituem um “fato
urbano” de características muito particulares que provavelmente contribuíram para
as decisões tomadas no projeto da sede da FIEP/SESI/SENAI da Paraíba.
Desenho de localização do edifício da FIEP, Campina Grande, PB.
autor Marcio Cotrim
Volumetria e uso
Apesar da excepcionalidade da situação onde foi construído, o edifício é
caracterizado por uma decisão relativamente simples: um prisma retangular de seis
pavimentos elevado sobre pilotis, marcado por elementos estruturais
predominantemente verticias e isolado na parcela descrita anteriormente; a esse
prisma se acopla um segundo volume mais baixo, de forma hexagonal, queabraça o
pavimento térreo – liberado pelos pilotis – lembrando uma espiral. Esta
simplificada descrição contém toda a lógica volumétrica do edifício, e ao mesmo
tempo revela também coerência com relação ao seu uso. O prisma assume o conteúdo do
programa mais genérico e flexível devido à planta livre que se repete nos seis
pavimentos, enquanto o volume espiral/hexagonal funciona como marquise de acesso e
auditório. Esse critério entre volume e uso fica evidenciado através dos croquis
iniciais do projeto. Segundo o arquiteto:
Após análise do terreno chegamos à conclusão de ser inviável qualquer construção no
subsolo, solução que, à primeira vista, poderia ser a mais adequada para os
auditórios, uma vez que dadas as exigências do programa, estes formariam volumes
que poderiam vir a comprometer a harmonia final do conjunto, tirando a leveza que
desde o início pretendemos conferir-lhe.(2)
Croqui esquemático do Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB,
elaborado a partir de desenho do arquiteto.
Transformação da ideia inicial: orientação solar, vistas e morfologia do terreno
A lógica descrita é a base a partir da qual Cydno Ribeiro desenvolveu o projeto que
finalmente foi construído no final da década de 1970. O projeto construído parece
ser definido como resposta a dois aspectos vinculados ao lugar: as vistas para o
Açude Velho e a forma do terreno. Esses dois pontos parecem ser os responsáveis
pela torção do prisma principal, definindo um ângulo obtuso. Ao considerar outro
croqui, como evolução do primeiro, a “torção” sugere uma decisão em busca das
vistas do Açude Velho que é confirmada pelo próprio arquiteto em depoimento à
revista Módulo durante o período da construção:
Notamos, porém, que a posição em que situamos o prédio não permitia um total
aproveitamento das vistas: o Açude Velho. Curvamos então o prédio e obtivemos um
vista satisfatória [...].(3)A curvatura, somada ao volume do auditório, determinou
uma espécie de “abraço” e como consequência a forma do espelho d’água que envolve a
parte aberta à Avenida Manoel Guimarães. Isso é justificado pelo arquiteto por
questões de sabor mais subjetivas: “marca a unidade do conjunto e visto dos
pavimentos, vem repetir o reflexo emitido pelo açude”.(4)
Croqui esquemático do Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB,
elaborado a partir de desenho do arquiteto.
desenho Marcio Cotrim
Distribuição, estrutura e proteção solar
A necessidade de um programa flexível e ajustável dirigiu a necessidade de uma
planta sem interferência de elementos estruturais; um espaço capaz de assumir
diferentes possibilidades de distribuição e layout. De fato, o caráter diáfano da
planta tipo – do primeiro ao quinto pavimento – de 600 metros quadrados é
obstaculizado unicamente pelas áreas de banheiros e da copa que se repetem em todos
os pavimentos e foi localizada em um ponto estratégico, exatamente na curvatura do
edifício.
A necessidade, no prisma principal, de uma planta sem interferências estruturais,
foi resolvida conjugando questões estruturais, expressivas, espaciais e de proteção
solar em uma única e importante atitude, entretanto, parecem se manifestar a partir
de quatro decisões de projeto concatenadas. Não se propõe aqui pensá-las como
sucessão de acontecimentos ao longo do processo criativo, mas sim, como
sobreposição de decisões/atitudes que provavelmente ocorreram de forma simultânea,
o que mostra a enorme sofisticação projetual do arquiteto.
[1] as torres de circulação e a planta diáfana
A primeira atitude, ainda ausente nos croquis iniciais, foi a de extrair do corpo
principal os dois volumes de circulação vertical. Cada um localizado em uma das
alas do edifício principal – a divisão em duas alas refere-se ao ângulo gerado pela
curvatura. Esses dois volumes de circulação, construídos inteiramente em concreto
armado, ganham importância na imagem final do conjunto, à medida em que o arquiteto
destacou-os por seu caráter monolítico e por serem mais altos devido ao depósito de
água e a maquinaria dos elevadores. Uma atitude que faz lembrar o conceito
de espaço servido eespaço servente desenvolvido por Louis Kahn no Richards Medical
Center (Filadélfia, Pensilvânia, 1957-1964) e que depois se dissemina através da
obra de diferentes autores como Stirling (Edifício da faculdade de História da
Universidade de Cambridge, 1964-1967). No caso brasileiro, um exemplo coetâneo
importante é o Centro Administrativo de Salvador, projeto de João Filgueiras Lima,
o Lelé.
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
Edifício da faculdade de História da Universidade de Cambridge, 1964-1967. Arq. James
Stirling.
desenho Marcio Cotrim
[2] os módulos em planta
A segunda decisão foi do ponto vista exclusivamente estrutural, ainda que, como
indicado anteriormente, também tenha tido repercussão em outras dimensões: a
definição de um módulo em planta, formado por quatro pilares, dois em cada uma das
faces de maior dimensão do prisma principal. Essa modulação se repete 10 vezes em
cada planta – sendo alterada unicamente no ponto de curvatura – e sete vezes em
altura, no pavimento térreo e nos demais. Os pilares que constituem essa modulação
foram tratados pelo arquiteto como “pilares principais”, indicando a existência de
outros.
[3] a grelha estrutural
A terceira decisão foi subdividir a grelha estrutural definida pelos “pilares
principais” da fachada poente – voltada para a Avenida Manoel Guimarães no
quadrante noroeste – por meio de outros três pilares secundários. A grelha vertical
resultante distribui as cargas até ser descarregada nos pilares da planta térrea de
maior robustez que os outros. A estratificação horizontal resultante só é
interrompida na altura da laje do terceiro pavimento, por uma espécie de “costura”
horizontal. Todo esse conjunto estrutural manifesto na fachada do quadrante
noroeste assume também grande parte da expressividade plástica do edifício, ao
mesmo tempo em que foi proposto como forma de proteger a fachada de pior incidência
solar. Finalmente, o próprio arquiteto confirma a conjugação entre estrutura e
proteção solar, ao atribuir o título de brise-soleil estruturalà solução dada à
fachada principal.
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
Textura e coroamento
O Auditório e a marquise de acesso, como dito antes, se destacam do prisma
principal por meio de contrastes na sua forma, altura e uso. Esses contrastes se
dão, evidentemente, por se tratar da parte do programa de maior singularidade: dois
auditórios, um com 400 lugares e outro com 80 lugares; marquise de acesso que serve
à torre de seis andares e a zona de auditórios, com área suficiente para abrigar
aglomerações em caso de convenções; além de uma garagem privativa para dez
automóveis, com sala de estar e serviços para os respectivos motoristas. Portanto,
a diferença com relação ao prisma retangular de seis pavimentos deve-se ao fato de
atender uma forma e altura condizentes com esse programa. Por outro lado, o
contraste é ainda reforçado pelo tratamento do material utilizado. Apesar do
arquiteto manter o concreto armado e aparente como material principal no volume
destinado aos auditórios, sua textura se destaca do restante do edifício por conta
de uma textura mais rude, elaborada com brita grossa maior granulação. Essa
atitude, de evidente sabor corbusieriano, recorda também o trabalho com concreto
armado de Marcel Breuer ou ainda a uma frente de arquitetos paulistas como Carlos
Milan, Joaquim e Liliana Guedes.
Além da marquise e do volume destinado aos auditórios, o tratamento dado à
cobertura se destaca no conjunto: uma laje de menor dimensão determina uma zona
descoberta de terraço-jardim enquanto acolhe a outra parte diferenciada do
programa, destinada originalmente a um restaurante, e que mais tarde se converteu
em espaço para eventos e reuniões mais restritas. Volumetricamente, o resultado é
uma espécie de coroamento do conjunto, marcado por uma linha horizontal que
serpenteia levemente em pontos determinados. Pode-se dizer que se trata de uma
tipologia tripartida: uma base de pilotis; um corpo principal repetitivo; e um
coroamento com certa liberdade formal.
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
Entre os croquis e o projeto executado
Antes de se ensaiar algumas especulações e respostas às questões inicialmente
colocadas, cabe tentar averiguar a relação entre os croquis – ao que tudo indica
iniciais –, os objetivos sugeridos e os resultados alcançados. Essas relações
poderiam ser sintetizadas em três preocupações: a relação com a morfologia do lote;
as vistas para o Açude Velho; e a proteção solar.
O primeiro aspecto parece ser o melhor atendido, pois com a curvatura, repete-se
esquematicamente a forma irregular do lote, um “L” de ângulo obtuso. É provável,
seguindo o percurso estabelecido neste texto, que essa decisão – velada nos
croquis, os quais indicam somente a preocupação com as vistas e com a orientação
solar desconsiderando completamente o desenho do lote – tenha condicionado
inicialmente o projeto, e como consequência, resultado em uma orientação pouco
favorável, já que as vistas não são plenas ao Açude – evidentemente um dos focos de
interesse da cidade – e nem a orientação é a mais adequada – o quadrante noroeste.
Contudo, se desconsiderarmos outras possibilidades de localização do prisma, os
resultados seriam parcialmente positivos. Com a curvatura, alcança-se, em uma das
metades do edifício, vistas ao Açude Velho, entretanto, a grelha debrise-soleil
estrutural, mostra-se pouco eficiente diante do sol da tarde do interior paraibano.
Uma última decisão, algo contraditória, chama a atenção: a fachadas leste e sul são
vedadas por elementos vazados cerâmicos, articulados de maneira brilhante, formando
uma renda, tal qual um mural de Athos Bulcão. Paradoxalmente, esse gigantesco
“mural” esconde as áreas “pouco nobres”, segundo o arquiteto, e protege eficazmente
a circulação interior do sol da manhã.
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
O Arquiteto, a herança moderna e o respaldo institucional
Com as informações levantadas até o momento, a partir da tentativa de extração dos
elementos mais essenciais do projeto, talvez seja possível extrapolarmos em direção
a algumas especulações desde três diferentes âmbitos: a biografia do arquiteto, que
participou de outros importantes projetos colaborando com Oscar Niemeyer; uma
eventual tradição moderna na arquitetura brasileira com relação a edifícios
institucionais; e, neste caso, a importância do cliente.
O carioca Cydno Ribeiro da Silveira (1940), formado pela Universidade Nacional de
Brasília em 1968, tem uma obra diversificada; ao mesmo tempo em que concluía a obra
da sede da Federação das Indústrias do Estado da Paraíba, com pouco mais de dez
anos de formado, desenvolvia experimentos com a técnica da taipa de mão na ilha de
Itamaracá em Pernambuco. A técnica da taipa se converteria, anos mais tarde, no
carro-chefe da obra do arquiteto. É possível, ainda que pouco provável, que a
lógica da grelha de madeira usada no sistema da taipa tenha fornecido
possibilidades que derivaram na solução do brise-soleil estrutural do projeto para
Campina Grande. Entretanto, seu contato com Niemeyer, sugere pistas mais
interessantes com relação ao repertório projetual que parece apoiar as decisões no
projeto para a FIEP/SESI/SENAI.
Cydno da Silveira trabalhou para Oscar Niemeyer – com quem já colaborava desde 1968
– na Argélia durante os anos entre 1972 e 1975, quando e onde, provavelmente
manteve alguma relação com o universo francês, ou ao menos, com os projetos de
Niemeyer para aquele país. Deste período, chamam a atenção dois projetos em
particular: a sede do Partido Comunista Francês, terminado em 1968 em Paris, ano em
que começou a colaborar com Niemeyer; e a Bolsa de Trabalho de Bobigny, iniciado em
1975, ano em que deixou suas atividades na Argélia.
Bolsa de Trabalho de Bobigny, 1975-1976. Arq. Oscar Niemeyer.
desenho Marcio Cotrim
Sede do Partido Comunista Francês, 1968, Paris. Arq. Oscar Niemeyer.
desenho Marcio Cotrim
Bolsa de Trabalho de Bobigny, 1975-1976. Arq. Oscar Niemeyer.
desenho Marcio Cotrim
Nos dois casos Oscar Niemeyer parece optar por estratégias de projeto semelhantes:
um prisma retangular elevado sobre pilotis – no caso da sede PCF, curvado e com
seis pavimentos, e no caso do projeto para a bolsa de Bobigny, com cinco pavimentos
– marcado por elementos predominantemente horizontais em suas fachadas; a esse
volume principal se acopla um volume mais baixo e de forma excepcional. Ambos os
edifícios são ainda coroados por um terraço-jardim definido através de uma laje com
forma desvinculada do perímetro do prisma. Finalmente, na sede do Partido Comunista
Francês, o conjunto é finalizado por uma torre, situada na fachada menos importante
do conjunto, destinada à circulação vertical. Os dois edifícios voltam suas
fachadas principais para um ponto urbano focal: em Bogigny, a Place de la
Liberatión; e em Paris, a Place Colonel Fabien e o Boulevard de la Villette.
Essa mesma lógica ainda pode ser divisada em outros projetos anteriores de Oscar
Niemeyer, como o Hospital Sul América, no Rio de Janeiro de 1952, ou a Biblioteca
pública de Belo Horizonte de 1955, nunca construída.
Hospital Sul América, no Rio de Janeiro de 1952. Arq.Oscar Niemeyer.
desenho Marcio Cotrim
Exemplaridade
As semelhanças entre a descrição dos dois projetos de Oscar Niemeyer construídos na
França e o edifício em Campina Grande projetado por Cydno da Silveira não são
poucas e no caso de se tratarem de uma referência direta – o que é provável – seria
algo bastante justificável. Afinal tratava-se de um jovem arquiteto com menos de 40
anos e não mais que dez de experiência, que teve a oportunidade de trabalhar com o
já afamado Oscar Niemeyer.
No entanto, não se trata aqui de descobrir a influência direta de Niemeyer na obra
de Cydno da Silveira, senão, refletir sobre o fato de ser uma tipologia consolidada
pela arquitetura moderna brasileira para edifícios institucionais urbanos e em
altura. A idéia de tipologia aqui se refere à transformação a partir de um tipo que
devido a sua exemplaridade é capaz de sofrer ajustes necessários para sua
adequação.
Provavelmente a gênese do tipo implícito nos edifícios em Bogigny e Paris encontra-
se na obra de Le Corbusier do final da década de 1928, especificamente em dois
projetos: o Centrosoyus (Moscou, 1928-29), um conjunto de três prismas retangulares
de planta livre, articulados ortogonalmente por torres de circulação vertical, onde
se destaca o volume protagonista da sala de plenos; ou ainda o pavilhão Suíço
construído em Paris entre 1931 e 1935.
Centrosoyus, Moscou, 1928-29. Arq. Le Corbusier. [Portal Historia en Obres
[http://descartes.upc.es/historiaenobres/]]
Centrosoyus, Moscou, 1928-29. Arq. Le Corbusier. [Portal Historia en Obres
[http://descartes.upc.es/historiaenobres/]]
Pavilhão Suíço, Paris, 1931 - 1935. Arq. Le Corbusier. [Portal Historia en Obres
[http://descartes.upc.es/historiaenobres/]]
Contudo, a definição clara de um tipo para o programa de edifícios institucionais
parece dar-se em comunhão com o desenvolvimento da arquitetura moderna brasileira a
partir do Ministério de Educação e Saúde, projeto da equipe formada por Lúcio
Costa, Oscar Niemeyer, Affonso E. Reidy, Jorge Moreira Leão e Carlos Ernani
Vasconcellos com consultoria de Le Corbusier, tendo seu processo iniciado por meio
de um concurso em 1935 e sua inauguração em 1945.
Será, portanto, no MES que a proposta – de um prisma retangular diáfano destinado
às atividades genéricas de escritório, no qual se acopla um volume formalmente
excepcional, destinado ao auditório e outras atividades extraordinárias e que é
coroado por um tratamento plástico diferenciado no terraço jardim – se articula, ao
mesmo tempo, a uma nova lógica de ocupação da quadra urbana – claramente oposta à
vigente – e uma solução que é capaz de unir a correta orientação solar com as
vistas privilegiadas.
Monumentalidade
Finalmente a conjugação entre a ocupação do terreno e a articulação hierárquica do
programa, volumes e formas, quando somada ao uso do edifício, um Ministério que se
destinava a cuidar da educação e saúde de uma nova sociedade que se modernizava,
revela um último aspecto presente no MES e que também se manifesta nos projetos
comentados de Niemeyer: o caráter monumental a partir de uma vontade de
representação institucional; seja ela um Estado, um Partido ou um Federação
sindical.
Esse caráter também se evidencia – com suas devidas proporções – no edifício da
FIEP. A monumentalidade como representação de força política, pujança econômica e
modernidade tecnológica, vinculada ao pólo industrial mais importante do Estado da
Paraíba, deveria, com bastante probabilidade ser um atributo desejado por Agostinho
Velloso da Silveira, presidente à época da instituição patronal.
Edifício sede da FIEP/SESI/SENAI da cidade de Campina Grande - PB, construído entre 1978
e 1983 e projetado pelo arquiteto carioca Cydno Ribeiro da Silveira.
foto Marcio Cotrim
Parece, portanto, ser possível identificar, à margem da idéia de escolas e
vertentes na arquitetura moderna brasileira, um linhagem de edifícios
institucionais, caracterizados pela transformação e adequação do tipoimplícito no
MES, no quais se mantêm ademais o caráter monumental daquele. Essa idéia de
linhagem – de matriz corbusieriana –, transformação e adequação a partir do MES
indica uma – entre provavelmente outras – linha subliminar que conecta uma série de
projetos espalhados geograficamente a partir dos anos 1940 até os dias atuais.
Notas
[o artigo foi desenvolvido dentro dos marcos do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura
e Urbanismo da Universidade Federal da Paraíba, na área de concentração “Arquitetura e
Análise do Projeto” vinculada à pesquisa “A dispersão da arquitetura brasileira através
das revistas entre 1975 e 1985”que é coordenada pela Dra. Nelci Tinem. O objetivo da
linha de pesquisa é comprovar o interesse no período entre 1975 e 1985 pelas
arquiteturas desenvolvidas fora dos três principais centros difusores e a diversidade
que marcou essa produção. A partir dessa primeira constatação que ambiciona estar
alicerçada na seleção, quantificação e catalogação do material, se pretende precisar as
estratégias utilizadas, desde um ponto de vista projetual, e os modos discursivos que
caminhavam em paralelo a esta mesma produção]
1
COMAS, Carlos Eduardo Comas. Protótipo e Monumento, um ministério, o
ministério. In: Textos fundamentais sobre história da arquitetura moderna
brasileira: v. 1/ organização Abílio Guerra.. São Paulo: editora RG, 2010, 316p.
2
Cydno da Silveira em depoimento publicado na revista Módulo Especial, n.01, mar. 1981.
3
Ibdem.
4
Ibdem.
Sobre o autor
Marcio Cotrim Cunha é arquiteto (2000), mestre (2002) e Doutor (2008) em Teoria e
História da Arquitetura pela ETSAB-UPC. Atualmente é professor convidado do Programa
de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Paraíba, onde
desenvolve pesquisa pós-doutoramento com financiamento do CNPq.
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