View
201
Download
0
Category
Preview:
Citation preview
Daprticateoria:trsinstnciasmetodolgicassobreapesquisaempoticasvisuais
SandraReyinPortoArte,PortoAlegre,v.7.n.13.p.8195,nov.1996.
Pesquisaemarte,pesquisasobrearte.ParatentarmosestabelecerumadiferenciaodentrodareadeArtesVisuais,emnossoprogramadePsGraduao,costumamoschamarapesquisananfasedePoticasVisuaisde"pesquisaemarte"paradiferenciladapesquisaemHistria,TeoriaeCrtica,denominada"pesquisasobrearte".Emreferenciandoapesquisasobreoprocessodecriaodoartista.Pesquisaemarte,nfasedePoticasVisuais,delimitaocampodoartistapesquisadorqueorientasuapesquisaapartirdoprocessodeinstauraodeseutrabalhoplsticoassimcomoapartirdasquestestericasepoticas,suscitadaspelasuaprtica,japesquisasobrearte,nfasedeHistria,TeoriaeCrtica,referendaaspesquisasenvolvendooestudodaobradearteapartirdoprodutofinal,seusprocessosdesignificaoecdigossemnticos,seuefeitosnocontextosocial,seusprocessosdelegitimaoecirculao.
COLOCAODOPROBLEMA
Apesquisaemartepodeserlevadaseguindoosmesmosparmetrosdepesquisaqueemoutrasreasdoconhecimento?Pesquisaremarteabrangeapenasorelatodemeios,procedimentosetcnicaslanadospeloartistanarealizaodesuaobra,ouabarcariatambmamanipulaodeconceitos,estudodasimplicaestericasdoatodeinstauraodaobra,oestudodeobraseescritosdeartistasconsagradosouno,assimcomotudoquepossadizerrespeitoaoprocessodeinstauraodotrabalhoartstico?Nossoobjetivonesteartigo,estandocentradonasquestesmetodolgicasdePoticasVisuais,considerarqueapesquisaemartesvisuaisumcamporelativamentenovonaatividadeacadmica,sendoqueestamodalidadedepesquisanocontextouniversitrio,anossoconhecimento,iniciounaUniversidadedeParisI,inciodosanos80.Noentanto,desdeLeonardodaVinci,aobradeartetemduasviasdeacessocomplementares:umavisualeoutrareferindoseatudoquepossapassarpelalinguagem.Seanteriormenteoensinodasartesvisuais,svezes,noexplicitavaquestesdepesquisa,parecenosconsequnciaumensinofundamentalmentecentradonasquestestcnicas,muitasvezesemdetrimentodasquestesartsticas.Oartistaquerealizaumapesquisanombitouniversitrio,concebeseufazerartsticocomoprxis,sendoportadordeumadimensotericae,consequentemente,articulandooseufazerdeateliercomaproduodeconhecimento.
Nummbitoinstitucional,colocaseoproblemadecritriosparaestetipodepesquisa,seguidamentetrazidobailapelasinstituiesfinanciadoras.Porm,narealidade,apesquisaemPoticasVisuaisenvolveodesenvolvimentodeumasriedecompetnciasnestareadepesquisaespecficaerelativamenterecente,masque,semdvida,necessitaconsolidarsejuntoaoutrasreasquepossuemgrandetradio.
Falarpesquisa,nosinduzimediatamenteapensaremparmetroscientficos.Talvezento,inicialmente,fosseoportunolembrarqueagrandediferenciaoafazerentrearteecincia,adequeaarteremeteaomundodosvaloresenodiretamenteaodosfeitos,comoacincia.Senacinciaospesquisadoresecientistascostumamtrabalharembloco,eseempenhamnadecodificaodefatoseinterpretaodeconceitosquepermitamorganizaroentendimentodarealidadeedescobrirprincpiosqueregemomundoeouniverso,naarte,oartistasegueouinventaumcertonmeroderegrasquelhepermitemcriarumavisodemundosingular.
SegundoHeidegger,oqueestemquestonaartenoadescoberta,massimoacontecimentodaverdade,econsequentemente,aobraenquantoobra,instituiummundo.
Mas,talvez,melhoraindaseriabuscarmossubsdiosnaprpriaarteeverificarmosnopercursodeKlee,queaolongodeumaevoluolentaeconstanteestabeleceumarelaorecprocaentreseupensamentoesuaatividadecriadora,extraindopoucoapoucoumnicopostulado:afusodesua
expressoformaledeseusuportefilosfico,concebendoaarte"nocomoumacinciaexata,mascomoouniversodadisparidade"(KLEE,1980.p.1114).
Estandopontuadasestasdiferenasiniciais,sertambmnecessrioconscientizarnosdequeapesquisaemPoticasVisuaispressupeparmetrosmetodolgicosquesediferenciamnosdapesquisacientfica,oudapesquisanareasocial,comoatmesmodapesquisasobrearte,pensadacomoprodutofinal.ApesquisaemPoticasVisuaisconstituisenumamodalidadeespecficadepesquisacomparticularidadesmuitoprpriasaoseuprpriocampo.
Apesquisaemartevaiencontrarrespaldotericonapotica,quepropesecomoumacinciaefilosofiadacriao,levandoemcontaascondutasqueinstauramaobra.Apalavrapotica,tendoficadodurantemuitotempodiludanointeriordaestticageral,foiempregadaprimeiramenteporPaulValry,partindodapoticanosentidoempregadoporAristtelesepropondoseaestudaragnesisdopoema.OobjetodeestudodeValrynooconjuntodeefeitosdeumaobrapercebida,nemaobrafeita,nemaobraafazer(comoprojeto):aobrasefazendo.JeanPommier(PASSERON,1989),citaadefiniovalerianadoconceitodepotica:"tudoquedizrespeitoacriao,obrasasquaisalinguagemaomesmotemposubstnciaemeio.Apoticacompreende,porumlado,oestudodainvenoedacomposioafunodoacaso,dareflexoedaimitao:ainflunciadaculturaedomeio,eporoutroladooexameeanlisedetcnicas,procedimentos,instrumentos,materiais,meiosesuporteideao".Passerondefendequeapoticanopossuinenhumarazoemselimitarsartesdalinguagem,esepropeaalargaraposiodeValryatodasasartes,nomeandoapoticacomo"oconjuntodeestudosquesedirigemaopontodevistadainstauraodaobra,notadamentedaobradearte"(PASSERON,1989,p.13).SenadefiniodeValryalinguagemaomesmotemposubstnciaemeioparaoestudodainstauraodopoema,poderamosafirmarque,emsetratandodasartesvisuais,aforma,aplasticidadeeavisualidadeosuportevisveldopensamentoeconceitosveiculadospelaobra.Sefazimportantetambmqueadimensoinvisveldaobra,sejadealgumaformarevelada,e,nestecaso,oartista,parece,temumpapelimportanteadesempenhar.Umduplopapel:comoautoretestemunho.Temospresenciadocomonaartecontemporneatemcrescidoaimportnciaatribudaaosescritosdosartistasparaadecodificaodasobras.
Masseapoticanocaracterizasenemcomooestudodaobrafeitanemdaobraafazer,comoprojeto,quejnasprimeirasconstataesformulaseadificuldadetalvezaimpossibilidadedelevaradianteumprojetodepesquisaemartesvisuais,rigorosamentepensadoeestabelecidoapriori.Umprojetoindicaquesabemosondequeremoschegar:ora,istoserevelaimpossvelparaaarte.Aobraapresentasecomoumcaminhocomvrioscruzamentos.SegundoKlee,"aobracaminhodelamesma''.Setomarmosumcaminhoerrado,precisoreconheceroerro,voltareretomarobomcaminho.Aobrasairacrescida,poisguardatodosestestraos.Oerronoprocessodeinstauraodaobra,noengano:aproximao.Erraradissipaodaspossibilidadesdaobra,apontandocaminhosparaaquela,outalvez,paraoutrasobrasqueviro.Duchamp,nosemironia,estabeleceseu"coeficientedearte"na"distnciaentreintenodoartistaeaobraacabada".
Entooprojetonapesquisaemartesvisuais,equivaleriaaumprojtil,algoquelanadocomumamira.Masocaminhoexatoqueirpercorrernuncasabemos.PierreSoulages,declaraque"oqueeufaomeesclareceoqueprocuro"revelando,decertomodo,acegueiradoartistanoprocessodecriao...
Seporumlado,precisolevaremcontaesabercultivaraintuionoprocessodecriao,poroutrolado,precisamosfazerapeloorganizaoeaomtodo,sequisermosfazerfrenteaorigornecessriopesquisaquevemcomelaatreladocomosefosseasuasombra:ocronograma.Comecemos,ento,desdej,acolocarumacertaordemnacasa:umapesquisaemPoticasVisuais,nocontextouniversitrio,abrangetrsinstnciasmetodolgicas:ametodologiadetrabalhoematelier,ametodologiadepesquisatericaeametodologiadetrabalhocomestudantes.
Ametodologiadetrabalhoematelierlevaemcontaaobracomoprocesso.Paraoartista,aobraaomesmotempoumprocessodeformaoeumprocessonosentidodeprocessamento,deformaodesignificado.Aobrainterpelaosseussentidosenquantoeleest"asvoltas"comela.Elaumelemento
ativonaelaboraoounodeslocamentodesignificadosjestabelecidos.Enquantoartista,aobraemprocessoperturbaoconhecimentodemundoquemeerafamiliarantesdela:elameprocessa.
Japesquisatericadeveavanarnestelabirintoparadescobriresteenigmaqueaobra.Ateoriabuscarespostasparaoporqudefazeristoouaquilo,especulasobreasimplicaesdaquiloqueestoufazendocomoquejfoifeito.Estabelecerelaescomahistriadaarteecomaproduocontempornea.Questionaemquesentidooqueeufaoafirma,emquesentidorompecomatradio.Operacionalizaconceitosparainvestigarcamposdeconhecimentointerdisciplinares.Oquelevadaprticateoria?Deumaformamuitodireta,rapidamentepoderamosresponderqueainsatisfaocomasrespostas.Sim,podemosdizlodestamaneiramuitosimples,masaarticulaodaprticacomocampoterico,traacaminhosextremamentecomplexos,portratarsedaconstruodeumconhecimentoqueinterseccionadiversoscampos.Desdeosprocedimentostcnicoslanadosnacriaodaobra,ataintrincadarededeconceitosestabelecidosapartirdestefazer,atrajetriamuitasvezesindicaqueprecisamosrealizarexcursesemcamposinterdisciplinares.Afilosofia,asemiologia,apsicanlise,aliteraturaemesmoacinciacontemporneapodemnosfornecerexcelentesconceitosparapensarmosnossaprticasesoubermosutilizlosoperacionalmenteisto,tendoocuidadoeacapacidadedeentenderestesconceitosemprofundidadeemseucontexto;eaotransplosparanossaprtica,estabelecersim,asaproximaes,mastambmosdistanciamentos.Nomomentoemquebuscamos,emcamposdeconhecimentoafins,determinadosconceitosparatestloseexperimentlosemrelaoaonossotrabalhoprtico,estamoslaandomoaferramentasconceituais.necessriouslascomtantodiscernimentoquantoasqueutilizamosnoprocessodeinstauraodotrabalhoprtico.Estesconceitos,provindosdafilosofia,literatura,semiticaoupsicanlise,sooquechamamosdeconceitosoperacionaisquenosfazemavanartantonocampoprticocomoterico.
Finalmente,nocasodopesquisadorquetambmorientaapesquisaanveldepsgraduao,ametodologiadetrabalhocomestudantesdePoticasVisuaispressupedoisprembulosfundamentais:orientarartistas,quenamaioriadasvezessoeminentementeprticos,noprojetodepesquisaprticaeinduzilosainventarumamaneiradeescreverquesejatovlidaquantoostericos.Convencerosestudantesparaqueestetextosejadiferentedoqueescreveofilsofo,ohistoriadorouocrtico,masquetertantovalorquanto...
aexperinciaqueautorizaoartistaaterumpontodevistatericodiferenciado.Paraumartistaplstico,comoseaspalavrasestivessemencarnadasnotrabalhoenoprpriocorpo.Suasanlisesteroestavivnciasuplementar:suaconfrontaopessoalcomoprocessodecriao.
Ento,estandonossocampodeinvestigaoesboado,passemosaexaminarmaisdepertocadaumadestasinstnciasmetodolgicas.
METODOLOGIADETRABALHOEMATELIER
Seaobranoavanaapartirdeumprojetoestabelecidoapriori,comoelaavanaria?TalvezKlee,maisumavez,possanosclarearaquesto:quandoduranteacriaodeumaobra,euatinjoumobjetivoprecisoqueedecorrnciadeumaevoluonatural,equeeucrionestenvelumcertoconjuntoacabado;acadavezqueistoacontece,aintensidadediminuirapidamenteeeudevoencontrarumoutrocaminho.ocaminhoquetemumcarterprodutivo.Odevirsecolocaacimadoser"(KLEE,1980).
Seocaminhoqueessencial,quetemumcarterprodutivonoprocessodecriao,podemosdeduzirqueporqueaobraavanasegundoumprocesso.Aformulaoemprocessosignificaqueaobraumprocessodeformao.ConformePareyson(1991)"aobraoprprioprocessodeformaolevadoatermo.Assim,cadamomentodesteprocessocontmemsitodoomovimento".
Eseaobra,aomesmotempo,umprocessodeformaoeumprocessonosentidodeprocessamento,deformaodesignificado,comoafirmadoacima,porque,dealgumaforma,aobrainterpelaosmeussentidos,elaumelementoativonaelaboraoounodeslocamentodesignificadosjestabelecidos.Elaperturbaoconhecimentodemundoquemeerafamiliarantesdela:elameprocessa.Tambmnestesentido,defazerumprocessoaalgum:sim,somosprocessadospelaobra.Aobra,emprocessode
instaurao,mefazrepensarosmeusparmetros,mefazrepensarminhasposies.Oartista,svoltascomoprocessodeinstauraodaobra,acabaporprocessarseasimesmo,colocaseemprocessodedescoberta.Descobrecoisasquenosabiaantesequespodeteracessoatravsdaobra.
Tudoficariamuitopobresepensssemosaobracomoummeroprodutofinal,resultadodeumprojetoestabelecidoapriori,semlevarmosemcontaosacasos,quesoinerentesaoprocessodecriao.Pensaraobracomoprocesso,implicapensaresteprocessonocomomeioparaatingirumdeterminadofimaobraacabadamascomodevir.Implicapensarqueaobranoavanasegundoumprojetoestabelecido,elaavanasegundoesteapriori:aobraestconstantementeemprocessocomelamesma.
Comofazer,paradeixaraobraseprocessaratravsdemim?Bachelardfalasobreo"racionalismoaberto",isto,umracionalismoqueseultrapassaemsecriando.Paraqueestaestruturanascente,queseestabelecelogoaosprimeirosinvestimentosdoartista,possaseconcluircomoumaespciedelgicainterna,necessriomultasvezes,darlugaraonosaber,ficaratentoaosimprevistos,"ouvir"e"ver"nossospensamentos.Seformosatentos,seguidamenteasideiasveememmomentosmaisinusitadose,svezes,inoportunos.Aobrasefazbemantesdecomearmosafazlanoatelier.Enoatelier,semprequecomeamosatrabalharumaideiaimediatamenteinstalaseoconflito.Oqueseriaesteconflito?Aimpressodequeaobraescapa,dequenoestamossabendomuitobemoqueestamosfazendo,quetudopodedarerrado.Aobraapresentasetambmcomoumenigma,nopodemosimporumavontadequevemunicamentedonossoraciocniointelectual.Aobrafinalmuitasvezesoinversodoquepretendamosfazer.Kandinsky,noinciodosculo,jcolocanfasenasuateoria,nosprocessosinternosdoartistaemdetrimentodarepresentaodomundoexterno.Escrevequetodaobratemumaconstruonoevidente,escondidaquesedesprendeinsensivelmentedaImagem."Estaconstruoescondidapodeserconstitudadeformasaparentementejogadassobreatela,quenoteriam,tambmaparentemente,nenhumaligaoentresi.Masoqueaausnciaexteriordeligao,suapresenainterior.Oquenaobraexteriormentedescosturadointeriormentefundidonumtodo(KANDINSKY,1989,p.193194).Klee,tambmnosinduzpensaraobracomoprocesso,comonaturezanaturante,nonaturezanaturada:"aartenoreproduzovisvel,tornavisvel.O"tornarvisvel"colocaeacentuaanfasenaobracomoprocesso,nocomoprodutofinal.
Pareysonafirmaquecomose"aobracomportassesuaprpriaregraeestaregrasconhecidacomaobraacabada.(...)Porquenaobraafazer,omododefazla,noconhecidoaprioricomevidncia,masprecisodescobriloeencontrlo,eparadescobrircomofazeraobranecessrioprocederportentativas,portateamento,inventandovriaspossibilidades,testandoaseselecionandoasdetalmaneiraque,detentativaemtentativa,acadaoperao,seconsigainventarapossibilidadequesedesejava,isto,osurgimentodaobra".
Seaobrasefaz,geralmentenummomentoquenotemostotalmenteconscincia,sempreaposterioriqueteremosatotalcompreensodoquefazemos.Apesquisatericapodevirtambm,emauxilio,aclarearcertasposies,aaportarsoluesparaproblemasenfrentadosnaprtica,aconferirposiesdeartistasqueapresentemproblemticassemelhantesasnossas.Parecequeexistenoprocessodecriao,umpontodecegueiraparaoartista,eaqueaobraseprocessaeconsequentementemeprocessa.Quasepoderamosdizer:quandoeuficocego,aqueaobrasefaz.Oprocessodecriaoesteenfrentamentodesencontradoentrecaoseordem,entredesequilbrioeequilbrio.precisoaprenderasuportarastiraniasqueasincertezasprovocam.Ocaosdaobrasefazendo,noconfusoindiferenciada,masaobra"emluta"comseucriador.
Oelementoagonnoprocessodeinstauraodaobranosedsemumaimplicaoimediata:aobraemprocessonopodeserpensadacomomeioparaatingirumdeterminadofim,mascomodevir.Umviraserqueseinstauranoprocessodecriaodeumaobraequepodecontinuarindefinidamente,estabelecendodilogos,idasevindasdaobraconsigomesmaouentreumaobraeoutra.
AobraemdeviraproximariaaideiadecosmosHeraclitiano?ParaHerclito,ocosmoscomportatantoaordemcomoadesordememvirtudedaunidadedoscontrrios."Otodoestnaspartes,assimcomoaspartesestonotodo,aohomemcadadescobrirasimesmoassimcomoarazoimanentedetodasas
coisas,implcitanaleidodevir."Sim,oprocessodecriaoalgoqueseapresentanaordemdocaos,masseaventurarnesteprocesso,implicatomarconscinciaqueeste"caos"noadesordemtotalouaconfusoindiferenciada.estaalternnciaqueseestabelecelogoaosprimeirosinvestimentosnaobra,entreosabereonosaber.
Aalternnciaentresaberenosaber,naobraemprocessodeinstaurao,noscolocasvoltasnaconstruodecdigosqueseinventammedidaqueseenunciam,estabelecendoaideiadejogocomoparteintegrantedoprocesso.Jogonocomoalgodeterminadoporregrasestabelecidasapriori,masumjogoondeasregrassoinventadasetransformadasmedidaqueaobrasefaz.Umaespciede"jogoideal"segundoDeleuze(1969),quenocomportaregraspredeterminadas,quenotemvencidosnemvencedores,jogo,segundoele,deinocnciacomo"nooutroladodoespelho"dasaventurasdeAlice,ondeoendereoeoacasonosedistinguemmais,parecemnoternenhumarealidade.EstejogoidealparaDeleuze,reservadoaopensamentoearte."Masestejogoquenoexisteforadopensamento,equenoproduzoutroresultadoanoseraobradearte,tambmaquilopeloqualopensamentoeaartesetornamreaiseperturbamarealidade,amoralidade,eaeconomiadomundo."
METODOLOGIADEPESQUISATERICA
Opressupostofundamentalparaapesquisaemartesplsticaspodeserenunciadodaseguintemaneira:todaobracontmemsimesmoasuadimensoterica.IstoImplicaqueaobrapossuiumsentidoalmdoquevemos.
ApesquisaemPoticasVisuaispartedamaneiracomoaobrafeita.Maneira,manirenalnguafrancesa,vemdemo(main).Paraestudaraobrafinaldopontodevistadapoticaprecisoobtertodasasinformaespossveissobreatcnica,procedimentosemetodologiadoartista.
Oqueseriaateorianestecaso?acolocaoemcenadeideias,sejasobaformaplstica,sejasobaformadeescritaparaaproximaroquepareceafastado.Osconceitostemquesertiradosdatcnica,dosprocedimentos,damaneiradetrabalhar,doprocessodeinstauraodaobra.
Masprecisoobservarque,tambmporestapeculiaridade,apesquisaemartesplsticasrequerumametodologiadiferenciada:opesquisadorproduzseuobjetodeestudoaomesmotempoemquedesenvolveapesquisaterica.Eleprecisaproduzirseuobjetodeinvestigao(suaobra)paradaextrairasquestesqueinvestigarpelovisdateoria.completamentediferentedotericoquesedebruasobreanlisesdeobrasacabadas.J.Lancri,diretordoCentrodePesquisasemArtesPlsticasdaUniversidadedeParisI,contaumapequenahistriaparametaforizarumaquestocrucialdapesquisaemPoticasVisuais:eledizqueapesquisacomoseestivssemosrealizandoumacorridaacavalo,bemmontadosemnossasela,atquederepentetemumoutrocavalo,semjquei,quevemseaproximandoequevainosultrapassaratodogalope.Apesquisa"acontece"seconseguirmospulardocavaloqueestamosmontados,paraestecavaloquepassademaneiradesenfreada.Eeledizquesabequandoistoaconteceu,quandoestudantes,muitasvezesemfinaldetese,lhechegamcomestanotcia:mudeimeutemadepesquisa!
EmPoticasVisuais,tododesafioconsisteemsaberdescolarasquestesmaispertinentesqueaprticasuscita.Oobjetodeestudonoexistecomoumdadopreliminarnoreferencialterico,comonapesquisaemHistriadaArte,porexemplo.Eleprecisasercriadocomocorpusdapesquisaeserlanadocomoumaseta.Soasinterpelaesdaprxisquedirecionaroapesquisaterica.Podemos,sim,lanarmodealgumasestratgias,comoporexemplo,realizardecalagens:melhorterminarotrabalhoprticoantesdaredaodequalquertextofinal.Masarealidadequegrandepartedasduaspesquisas,aprticaeaterica,solevadasconcomitantemente.Ento,manterumdiriodeanotaes(secreto)duranteoprocessodeelaboraodotrabalhoprtico,ondesepossaescrevertodososnossospensamentos,semcensura,temseconfirmadocomofundamentalparaaredaodequalquertextotericoe/oupotico.Tambmfundamentalaelaboraodefichasdeanotaessobreobras,artistaseconceitosquepossamsercolocadosemrelaocomotrabalhorealizado.
Retomemospotica,umavezqueapesquisaemPoticasVisuaisseapoianoconjuntodeestudosqueabordamaobradopontodevistadesuaInstaurao,nomododeexistnciadaobrasefazendo.A
poticapressupetrsparmetrosfundamentais:liberdade(expressodasingularidade)errabilidade(direitodeseenganar),eficacidade(seerroutemquereconhecerqueerrouecorrigiroerro).
Apoticalevaemcontaaconstituiodesignificadoapartirdecomoaobrafeita.Porexemplo:Proustescreveunoite.EainversootemadetodooromanceLarecherchedutempsperdu.
Naartecontemporneasenoconhecemosapropostaeomododetrabalhardoartista,dificilmenteconseguimosapreenderaobra.Temosqueterexplicaessobreapropostaeomododefazerdoartista.Acompreensodaobrapassapelalinguagem,nopodemosentendersemapalavra,muitoemboraprecisoaprenderaconvivercomesteparadoxo:apalavrajamaispodertraduziraobra.Alinguagemnosubstitui,maselacomoooutroladodamesmamoeda.Sequisssemoslanarmoaumametfora,poderamosdizerqueaobraealinguagemsocomoaalmaquenopodeexistirsemocorpo.Pareceento,queoimportanteinvisvelaosolhos,masprecisaserdesvendado.Conexoentrelinguagemeprticatoindissocivelquantoocorpoeaalma:umprecisadooutroparaexistir.
Quaisseriamosinstrumentosparaumaanlisepoticadeobrasdeoutrosartistasquequeiramosestudarparacolocaremrelaocomnossotrabalho?Depoimentosdizendoseoartistaestvivo,entrevistasecatlogos,soumafontepreciosaobraoriginaleescritosdeartistas.Estassoinformaesbrutasnecessriasparafazereresponderperguntas.
Umaobservaoimportanteadepartirdoqueparececontraditrio,porqueosartistasmuitasvezesfalamdeimpressesqueselestiveram,oudesensaesepercepessingulares.Nacontradiopodeestarcontidooncleodascoisas.Senaobraqueoscontrriosseunem,seoprocessodecriaosedcomoseestivssemospercorrendoasuperfciedeumafitadeMoebius(passamosdoexteriorparaointeriorsemprepercorrendoamesmasuperfcie),nacontradiopodeestaraluzdealgoqueestescondidonaobra.Seestditonosescritosdoartista,est,dealgumaforma,expressonaobra.precisoficaratentoaoque,primeiravista,achamossemimportncia.
Uminstrumentoimportantesoasanlisescomparativas.Ocomparatismodiferencialconsistenatarefadeaproximaroqueparecemuitodiferente,diferenciaroqueparecemuitosemelhante.Porexemplo,oNudescendoaescada,deDuchamp,seguidamenteinterpretadoemalgunslivrosdeHistriadaArtecomoumquadrofuturista.
Mas,segundoasdeclaraesdeDuchamp,elenoestavanemumpoucointeressadonasquestesdavelocidadecomoosfuturistas,esim,noestudododesdobramentodomovimentoapartirdasexperinciascomacronofotografia.Oconceitopertinenteparaestaobra,segundooprprioDuchamp,oconceitode"retardamento".Poristonopodemosnosaterapenasnaaparnciadaobra,masprocurardesvendarosconceitosqueoartistaestveiculando.importanteprocurarsimilitudesentrecoisasquesodiferentesediferenasque,primeiravista,podemparecermuitosemelhantes.
precisopensarqueosobstculossoinerentespesquisa.precisosaberquequantomaisobstculos,melhoraobra,maisrelevanteapesquisa.
Aescritatambmumprocesso.Formulamosumahiptesesupondoquevamosencontrarasrespostas,mastambmnoseguroquenotenhamosquemudarorumo.Aescritatraaseuprpriotrajeto.Tambmserevelacomoprocessodecriao.Noexistediferenafundamentalentreprticaeteoria.
Paradescobrircomoaobrafuncionaprecisamosdeferramentastericas:textosdehistriadaarte,defilosofia,entrevistasedepoimentosdeartistas,livrosdefsica,romances,etc.TratasedevercomoteoriadeBenjaminporexemplo,podeaplicarseatalobra.Mastambmtratasedevercomooutraobrapodeservircomoexemplodeenunciadostericos.
Podemosnosservirdevriosautores,mascomosvezesimportantereafirmarobvio,osmaisteissoosmaiores.Seencontramosporexemplo,emDidiHuberman,umdosmaisbrilhanteshistoriadoresdaartefrancsnaatualidade,umacitaodeMerleauPontyquepodemosrelacionarcomnossotrabalho,importantebuscarosconceitosnafonte,entoparaapesquisaprecisochegaratMerleauPonty.Osgrandespensadorescompreenderammuitascoisasepodemoscataloglos
invariavelmentesobestastrsqualidades:possuemprofundaenvergaduraterica,eaomesmotempo,soclarosepoticos.
Duranteapesquisa,importantefalarsobreotrabalho,explicarparaaspessoasoqueestamosfazendo.Fazerumesforoemrelaoclareza.Aclarezaeacomplexidadetemqueentrarnaestruturadotexto.Matisse,Duchamp,Klee,porexemplo,tmposiesmuitoclarasarespeitodesuasobras.Osgrandesartistas,nocustareafirmar,assimcomoosgrandespensadores,soaomesmotempoprofundos,clarosepoticos.
Etambmimportantelembrarqueaobraconstituiseapartirdaculturaquetemos,eistosecultiva.
METODOLOGIADETRABALHOCOMESTUDANTES
Deummodomuitosimples,apesquisaoquepermiteque,quandoosestudantesmefazemumaperguntaeutenhaumaresposta,masoinversotambmsefazpertinente:quandoeufaoumapergunta,elestmocompromissodeacharumaresposta.
Comobarmetro,osestudantesdepoticasvisuais,quesoeminentementeprticos,sdevemescreveroqueinteressaaeles.Seinteressaaelesquepodeinteressaraosoutros,entopodesebuscaramotivaoparaescreverbem.
Omtodotemqueseraomesmotemporigorosoeaberto.Cadaestudantetemquepartirdesuaprpriaobra.Falardaprpriaobradifcil,justamenteporqueseelaconstituisecomoobra,ultrapassa,numprimeiromomento,nossoconhecimentoracionaleintelectualdascoisas.
Algumasestratgias,tmmostradoeficacidadetantonomeutrabalhodepesquisa,comonaorientaodemeusalunos:
a)manterumdiriosecreto,ondesepossadescreverasobrasrealizadas,contarcomoasfez.importantecarregarestediriosempreconsigo,porqueasideiasnotmhoramarcadaparachegar.Usaseescrevernapginadireita,edeixaseapginaesquerdaparafazercomentrioseacrescentarnovasideiaseanotaesnodecorrerdotempodapesquisa.
Naorganizaododirioprecisodatarcadainterveno,anotaroquefazemoseoquequeremosfazer,oquelemos,eescrevertudoquepassapelacabea,semcensura.Porestarazoelesecreto.Assim,temosumtestemunhodoprocessosubterrneodaobra.Todasasideiasqueseteve,oquefoirealizadoeoquenofoi;
b)estabelecerpequenoscontratosdetrabalhoquedisciplinamodesenvolvimentodapesquisa.Istoporqueparaescreverprecisodedicarmuitotempo.Funcionaporpequenoscontratos.Emvezdemarcaradataparaientregadotrabalhofinai,marcaretapas,deelaboraocomdatasprecisas.
Eosbloqueios?svezespodehaverbloqueios.Pode"bloquear"otextoouasobras.Oprofessororientador,nestecaso,deveterahabilidadedesaberidentificaroqueoalunonodisse.Trazerluzoqueoestudantenodisse,afimdetentardeslindarobloqueio.Nestecaso,temsemostradoeficaztraarpequenasmetascomdatasprecisas,estabelecendocontratosentreprofessoreestudante.
Seasleiturassomuitoimportantes,verexposiestambmessencial.Ogrupoigualmenteumrecursomuitoimportante.precisoestimularosestudantesacriarelosentreosprofessoresecolegasdocurso.
Nafasedaredao,importantesaberqueoprimeirotextoserruim,osegundoeoterceirogeralmentetambm.Massetiverquerecomeardezvezes,precisoterahumildadedefazlo.
importanterealizarexercciosderedao.Escreverpequenosensaios.Comoexercidoderedaopodesereficazquecadapargrafopossareceberumtitulo.Strocardepargrafoquandomudardeassunto.
Ahipteseestabeleceofiocondutorparaapesquisaenaconclusoprecisodarumarespostaprovisriaparaahiptese.Nummbitouniversitrio,apesquisacomnfaseempoticasvisuaistemquetrazercontribuiespesquisageral.necessrioassinarocompromissocomaproduode
conhecimento.Emhiptesealguma,adissertaodemestradoouatesededoutoradodevelimitarsecompilaodeconhecimentosjveiculados.
Naintroduo,importanteredigirclaramenteahipteseperseguida.Umaboamaneiradeorganizararedaodividilaemitens,eacadaitematribuirumttulo.
Quandousaroeu,onseoimpessoal,naredao?Aprimeirapessoadosingularrefereseatudoqueestritamentepessoal,comosupeseserocasodaproduoplstica.Ons,quandoteorizamos,quandonosreferimosaconceitosouideiasdeautores,comacitao,referncia,ounotaderodapparaexplicaescomplementares,efinalmenteusamosoimpessoalquandonosreferimosaprocedimentos,oumencionamostcnicasouideiasdedomniocomum.precisoterclaroqueaoriginalidadedeumadissertaoestnofiocondutorquepropomosparaexplorarocampodeconhecimentoquedelimitamos,assimcomo,efundamentalmente,naarticulaoquefazemosentreprticaeteoria.
Osumrioeaapresentaodadissertaodevem,dealgumaforma,remeteraotrabalhoprtico.muitoimportanteaformadeapresentaradissertao:universitria,maslevandoemcontaaobra.EntrarnojogodaUniversidade,massubvertertambm.Apesquisaemartesplsticastemqueserrealizadacomtodaseriedade,masdeveserfeitacommuitoprazer.oprazerdadescobertaquemobilizaapesquisa.
E,finalmente,aconclusonoalgoquefecha,masalgoqueabre.
Comoaobra.
REFERNCIASBIBLIOGRFICAS
CABANNE.Pierre.MarcelDuchamp:engenheirodotempoperdido,SoPaulo:Perspectiva.1987.
DELEUZE.Logiquedusens.Paris:Editionsdeminuit,1969.
HERACLITO.Fragments.Paris:PUF,1987.Textoestabelecido,traduzidoecomentadoporMarcelCONCHE.
KANDINSKY.W.Duspiritueldansl'arretdanslapeintureenparticulier.Paris:Denol.1989.
KLEE,P.Lapensecratrice,critssurlartI.Paris:DessainetToira.1980.TextesrecueillisetannotsparJrgSpiller.
MERLEAUPONTY,M.Phenomnoiogiedelaperception.Paris:Gallimard,1992.
PASSERON,R.Pourunephilosofedelacratlon.Paris:KJincksieck.1989.
PAREYSON,L.Esttica,teoriadaformatividade.Petrpolis:Vozes,1991.
SANDRAREY(Brasil):ArtistaPlstica,DoutoraemArteseCinciasdaArteopoArtesPlsticas,pelaUniversidadedeParisIPanthonSorbonne.Frana.
ProfessoraOrientadoradoMestradoemArtesVisuaisnaUniversidadeFederaidoRioGrandedoSul.
Pesquisadora/CNPq.
Recommended