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De forma geral, não há como negar a importância dos processos de comunicação para o desenvolvimento de uma localidade. Sem comunicação não há informação e “informação é o insumo básico do desenvolvimento” (BORDENAVE, 1982). Isto posto, de imediato somos levados a pensar nos modernos meios de comunicação que a tudo interligam e a todos atingem, direta ou indiretamente, constituindo redes estruturais - institucionais, econômicas ou técnicas. Mas não é desse tipo de rede macro-estrutural do qual trata esse estudo. O nosso ângulo é o micro cenário social. O foco em questão são as redes formadas por pessoas - pessoas que se comunicam entre si - ou seja, redes sociais de comunicação interpessoal, e mais especificamente as existentes em localidades rurais amazônicas. Justamente nas malhas dessas redes submersas, formadas por parentes, vizinhos, compadres e comadres, é que o saber local circula e são elas, muitas vezes, em regiões mais isoladas, a única fonte e forma disponível de troca de informação. Nosso objetivo é propor uma discussão sobre a importância dessas redes para o desenvolvimento da Amazônia. Monografia FIPAM XVIII. Núcleo de Altos Estudos Amazônicos NAEA/ UFPA, 2004.
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Formação e Desenvolvimento de Áreas Amazônicas - FIPAM XVIII Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA
Universidade Federal do Pará – UFPA Rosane Maria Albino Steinbrenner
NO BALANÇO DAS REDES UMA DISCUSSÃO SOBRE A IMPORTÂNCIA DAS REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇÃO
INTERPESSOAL PARA O DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADES RURAIS
AMAZÔNICAS
Belém, 2004
Formação e Desenvolvimento de Áreas Amazônicas - FIPAM XVIII
Núcleo de Altos Estudos Amazônicos – NAEA Universidade Federal do Pará – UFPA
Rosane Maria Albino Steinbrenner
NO BALANÇO DAS REDES UMA DISCUSSÃO SOBRE A IMPORTÂNCIA DAS REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇÃO
INTERPESSOAL PARA O DESENVOLVIMENTO DE COMUNIDADES RURAIS
AMAZÔNICAS
Monografia submetida ao Programa de Pós- Graduação Interdisciplinar em Desenvolvimento Sustentável do Trópico Úmido – PDTU, como quesito parcial para a
obtenção do título de especialista em Formação e Desenvolvimento de Áreas Amazônicas - FIPAM XVIII,
sob orientação do Prof. Dr. Thomas Hurtienne.
Belém, 2004
Agradecimentos
Sempre considerei um certo exagero os agradecimentos em produções acadêmicas. Já não
penso assim, portanto, aqui vão os meus:
Antes de mais nada, agradeço ao amigo, co-orientador “vitalício” e entrevistado neste
trabalho, Benno Pokorny, sem o qual não teríamos reingressado na aventura da construção
do conhecimento.
Agradeço sobremaneira a generosidade e disposição dos peritos entrevistados em atender
tantos e todos os meus “porquês”.
Agradeço a meu orientador Thomas Hurtienne por todo apoio e por me permitir ser livre para
arriscar.
Meus agradecimentos também à atenção do professor Armin Mathis.
Agradeço ainda à amiga Guilhermina, por seu ouvidos e olhos atentos e à Westfalen pelas
informações primeiras que geraram a fagulha da curiosidade sobre o assunto “redes”
Aos amigos especiais do FIPAM XVIII.
E claro, a minha família, paciente e carinhosa: Max, Vitoria e Anna Julia.
Dedico este trabalho a meu pai, Asdrubal Albino, com saudade.
Belém, Abril de 2004.
“Não é possível não comunicar.”
Paul Watzlavick, 1973
“ Não é um conceito, é uma realidade.
Existem redes de comunicação em todo lugar,
então são relevantes em todo o lugar.”
BENNO POKORNY, 2003
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes I
Resumo
De forma geral, não há como negar a importância dos processos de
comunicação para o desenvolvimento de uma localidade. Sem comunicação não há
informação e “informação é o insumo básico do desenvolvimento” (BORDENAVE,
1982). Isto posto, de imediato somos levados a pensar nos modernos meios de
comunicação que a tudo interligam e a todos atingem, direta ou indiretamente,
constituindo redes estruturais - institucionais, econômicas ou técnicas. Mas não é
desse tipo de rede macro-estrutural do qual trata esse estudo. O nosso ângulo é o
micro cenário social. O foco em questão são as redes formadas por pessoas -
pessoas que se comunicam entre si - ou seja, redes sociais de comunicação
interpessoal, e mais especificamente as existentes em localidades rurais
amazônicas. Justamente nas malhas dessas redes submersas, formadas por
parentes, vizinhos, compadres e comadres, é que o saber local circula e são elas,
muitas vezes, em regiões mais isoladas, a única fonte e forma disponível de troca de
informação. Nosso objetivo é propor uma discussão sobre a importância dessas
redes para o desenvolvimento da Amazônia. Nesse sentido, com a ajuda de peritos
que trabalham com pesquisa e/ou desenvolvimento em comunidades rurais na
região, procuramos abordar duas questões centrais: a comunicação existente entre
os atores locais é levada em conta por projetos de desenvolvimento implementados
na Amazônia Legal? Que papel podem desempenhar essas redes sociais de
comunicação interpessoal no entendimento da realidade local e na construção do
desenvolvimento das comunidades rurais amazônicas? Quanto à primeira questão,
a opinião dos peritos não revela otimismo. De maneira, geral, mesmo sob amplo
consenso teórico a partir da Rio 92 com respeito à importância da participação para
a construção do desenvolvimento sustentável, a opinião de peritos que trabalham,
em média, há mais de dez anos com comunidades rurais amazônicas, é que a
comunicação aí existente entre os atores locais não é de fato considerada, ou não o
é como deveria ser. Quanto à segunda questão - o papel, função ou o uso que pode
ter as redes sociais de comunicação interpessoal existentes nas comunidades nos
processos de desenvolvimento local - há entre os peritos entrevistados um misto de
dúvida, um certo ceticismo, mas principalmente a certeza de que para se chegar a
alguma resposta positiva, a conversa, ou melhor, a pesquisa, está só começando.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes II
LISTA DE SIGLAS
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BM – Banco Mundial
BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
CA – Centro Agropecuário
CIFOR – Centro Internacional de Pesquisa Florestal
Cooperaçú - Cooperativa de Produtores de Igarapé-Açú
Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária
DFID – Department of International Development
FASE - Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
Imazon – Instituto do Homem e do Meio Ambiente
MMA - Ministério do Meio Ambiente
MPEG – Museu Paraense Emílio Goeldi
NAEA – Núcleo de Altos Estudos Amazônicos
NEAF – Núcleo de Estudos Integrados sobre Agricultura Familiar
PNUD - Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento)
Pró-UFRA - Projeto de Fortalecimento Institucional da Universidade Federal Rural
da Amazônia
UFPA - Universidade Federal do Pará
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes III
LISTA DE GRÁFICOS E TABELAS
GRÁFICO 1 - CAMPO DE ATUAÇÃO DOS PERITOS ENTREVISTADOS
GRÁFICO 2 - TEMPO DE ATUAÇÃO EM PROJETOS COM PRODUTORES RURAIS
FAMILIARES NA AMAZÔNIA
GRÁFICO 3- RELAÇÃO ENTRE AS RESPOSTAS SOBRE COMUNICAÇÃO
INTERPESSOAL NA COMUNIDADE
GRÁFICO 4- PROJETOS NA AMAZÔNIA LEVAM EM CONTA A COMUNICAÇÃO
INTERPESSOAL EXISTENTE NA COMUNIDADE?
GRÁFICO 5- TRABALHA DE ALGUMA FORMA COM ESSE ENFOQUE EM SEUS
PROJETOS?
GRÁFICO 6 - RELAÇÃO ENTRE AS RESPOSTAS RELACIONADAS
A REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇAO
TABELA 1 - PERCENTUAL DAS RESPOSTAS RELACIONADAS A COMUNICAÇÃO
INTERPESSOAL LOCAL
TABELA 2- PERCENTUAL DAS RESPOSTAS RELACIONADAS A REDES SOCIAIS
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes IV
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 1
2 REDES: MÚLTIPLOS SENTIDOS ...................................................................... 6
2.1 Sobrevôo histórico ........................................................................................................ 6
2.2 Na “rede” dos muitos sentidos .................................................................................... 7
2.3 Os vários significados do termo ................................................................................ 10
2.4 Propriedades e características das “redes” .............................................................. 11
3 REDES E CAPITAL SOCIAL ............................................................................ 13
4 REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL: DE QUE “REDE” SE ESTÁ FALANDO? ................................................................................................... 17
4.1 Comunicação na visão de Luhmann ......................................................................... 18
4.2 A comunicação dialógica de Habermas ......................... Erro! Indicador não definido.
4.3 Elementos do processo de comunicação ................................................................... 23
5 AGRICULTURA FAMILIAR E LOCALIDADES AMAZÔNICAS – O CENÁRIO25
5.1 Agricultura familiar – no “acostamento” da história ............................................. 25
5.2 Os sentidos da participação: uma discussão importante ........................................ 27
6 METODOLOGIA UTILIZADA ........................................................................... 31
7 RESULTADOS .................................................................................................. 34
7.1 Quantificando resultados I: quanto à relevância da comunicação intepessoal no
desenvolvimento local ............................................................................................................ 34
7.2 Discussão I ................................................................................................................... 36
7.3 Quantificando resultados II: quanto ao reconhecimento do enfoque de redes
sociais de comunicação interpessoal ..................................................................................... 43
7.4 Discussão II ................................................................................................................. 45
8 CONCLUSÕES ................................................................................................. 49
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 52
ANEXOS .................................................................................................................. 56
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 1
1 INTRODUÇÃO
Esteja onde estiver, seja quem for, o ser humano está inserido em alguma forma
de rede. Nas metrópoles, onde é mais evidente a superposição e interdependência
das diversas redes – reais e virtuais, técnicas e sociais, locais e globais, estáveis e
dinâmicas, integradoras e desintegradoras (SANTOS,1996) – ou nas localidades1
mais isoladas, estamos todos imersos em complexas redes superpostas
(VILLASANTE ,1996). As redes submersas, formadas no cotidiano das relações
familiares, de parentesco e de vizinhança, remontam à própria origem da história da
humanidade. Desde que o ser humano passou a viver em grupo por necessidade de
cooperação como estratégia de sobrevivência, primeiro, no interior das cavernas,
depois, entre esquinas de cimento e pedra, as redes são uma evidência das
relações sociais e políticas (PUTNAM, 1996) e a comunicação entre seus
integrantes vem a ser a própria dinâmica dessa realidade essencialmente imaterial,
meramente abstrata (SANTOS, 1996; LUHMANN, 1998).
É possível afirmar, portanto, que a noção de redes é tratada em princípio como
algo geral, presente em todas as esferas e instâncias das interações sociais da
humanidade. Na atualidade porém, quando parece emergir um novo tipo de sistema
social, chamado por alguns de “sociedade da informação” ou “sociedade de
consumo”, ou ainda “sociedade pós-industrial” ou “pós-moderna”, a noção de “rede”
ressurge como um dado novo, onde a informação e a comunicação passam a ser o
centro do debate sobre as transformações em curso, as quais atingem todos os
setores da vida social.
Vivemos num mundo onde os avanços tecnológicos levaram a uma espécie de
ruptura das tradicionais fronteiras de espaço e tempo. É bem verdade que a
realidade social, como diria Milton Santos (2000), sempre foi complexa, intrincada,
contraditória, em permanente transformação. Isso não é novidade, estamos diante
de uma evidência histórica. A variável nova introduzida no mundo contemporâneo
pela tecnologia é a velocidade surpreendente com que essas mudanças acontecem
e a abrangência que atingem. Ao longo e ao largo dos quatro cantos do planeta as
1 Neste trabalho, a exemplo de Veiga e Albaladejo (2002), “localidade é vista como espaço
social e geográfico da ação no cotidiano” de determinado grupo social, onde os vínculos sociais podem ser vistos como fazendo parte de estratégias sociais, no “sentido de Bourdieu” ou seja: “ Estudar a 'localidade' é ,então, estudar o universo das práticas sociais localizadas”
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 2
relações sociais hoje são afetadas pela globalização. Por um lado o mundo do
trabalho, as relações de consumo, o mundo das idéias passam a ser submetidos a
um processo de homogeneização, regido por padrões externos definidos pelos
países hegemônicos e pelo grande capital. Por outro, as resistências se fazem sentir
pelo seu sentido contrário: a busca da identidade, do local. E nesse contexto muitos
autores apontam a formação de redes de movimentos sociais como um elemento
fundamental dessa nova dinâmica da resistência, especialmente ligada à
organizações não governamentais (ongs) ambientais e defensoras dos direitos das
minorias.
O assunto redes tem despertado vasto interesse, traduzidos em farta literatura
(CASTELLS, 2001; LUHMANN, 1998, SHERER-WARREN, 1995, 1999;
VILLASSANTE, 1996; SANTOS, 1996; FREEMAN, 1991; RANDOLPH,1993; DIAS,
1995; LOIOLA; MOURA, 1996; CAPRA, 2002; DE FRANCO, 2001), principalmente
no que diz respeito a compreensão da crescente complexidade das sociedades
modernas e pós-modernas. Mas cabe indagar: qual importância de toda a discussão
sobre “redes” que se trava a nível intelectual para a prática dos estudos de redes de
pessoas em determinada localidade?
Não se pode esquecer que em meio ao cenário global, regido pela velocidade e
pela diversidade de informações, subsiste um universo social com parâmetros
profundamente rudimentares no que diz respeito à infra-estrutura e oportunidades,
porém, de extrema riqueza étnica e cultural. Um cenário onde inúmeras vezes a
única fonte de informação existente em dezenas de quilômetros é a figura do
vizinho e os únicos mecanismos de adaptação e geração de novos conhecimentos
ao alcance dessas populações são as redes de relações estabelecidas localmente
(Assis, 2000). Este é o contexto de interesse deste estudo e para o qual
consideramos importante buscar construir um entendimento da noção de redes
sociais com foco específico nos processos de comunicação existentes, que
passaremos a designar redes sociais de comunicação interpessoal. Isso porque
partimos do pressuposto de que conhecendo os processos de comunicação e os
fluxos de informação existentes em dada comunidade estaremos mais próximos de
compreender sua realidade local. “Dize-me como é tua comunicação e te direi como
é tua sociedade,”2 afirma Bordenave (1982) parafraseando uma máxima popular.
2 Em seu livro “O que é comunicação?”(1982.), Raul Bordenave aborda a comunicação como um
fenômeno intrínseco da sociedade, capaz de revelar sua natureza:“A comunicação é uma necessidade básica da pessoa humana, do homem social.[...] A comunicação não existe por si
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 3
Alguns autores, que inclusive motivaram a escolha do tema deste estudo (ASSIS,
2000; VEIGA; ALBALADEJO, 2002), já buscaram na análise da morfologia de redes
sociais locais subsídios para explicar os caminhos do desenvolvimento em
localidades do mundo rural amazônico. Neste estudo pretende-se focar a questão
das redes, porém, elegendo a comunicação como categoria-chave para entender a
realidade local e auxiliar a busca de caminhos que levem ao desenvolvimento
sustentável da Amazônia. Nesse sentido buscamos basicamente responder a duas
questões: o que são essas redes sociais de comunicação interpessoal aqui tratadas
e, no contexto da construção do desenvolvimento local, para que servem?
Inicialmente, procuramos uma aproximação da noção de “redes”, tentando
reconhecer, através de levantamento bibliográfico, os inúmeros conceitos e usos
para o verbete para poder depois melhor situar o entendimento das aqui designadas
redes sociais de comunicação interpessoal. Além disso, através de entrevistas
estruturadas com peritos que atuam nas áreas de pesquisa, extensão ou em
projetos de desenvolvimento junto a localidades de produtores rurais familiares na
Amazônia, buscamos discutir a importância da abordagem tendo como foco redes e
seus fluxos internos de comunicação e sua possível utilização em processos de
desenvolvimento local em áreas rurais da Amazônia.
Problematizando
Partimos da convicção de que todo projeto de desenvolvimento que pretenda
repassar ou gerar conhecimento, necessita reconhecer o saber local e as formas
locais de organização utilizadas para a transferência desse saber. Caso contrário,
pode estar fadado ao insucesso e ao desperdício de insumos. A falta de participação
de atores locais é apontada em vários estudos como uma das principais causas do
fracasso de políticas públicas, programas e projetos de diferentes tipos. Como
consequência dessa falta de envolvimento da comunidade, ações governamentais e
não governamentais, implantadas de cima para baixo não sobrevivem e acabam por
ser substituídas por outras igualmente efêmeras (BANDEIRA, 1999).
Ao longo do tempo, é bem verdade, a participação dos atores locais tornou-se
um dos grandes consensos, não apenas nas discussões mais atuais sobre pesquisa
mesma, como algo separado da vida em sociedade. Sociedade e comunicação são uma coisa só. Não poderia existir comunicação sem sociedade, nem sociedade sem comunicação. A comunicação não pode ser melhor que sua sociedade nem esta melhor que sua comunicação. Cada sociedade tem a comunicação que merece: dize-me como é tua comunicação e te direi como é tua sociedade”.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 4
e extensão (aconselhamento centrado no parceiro; pesquisa-ação; pesquisa
participante; pesquisa-desenvolvimento), mas também em todas as áreas que digam
respeito ao entendimento e proposição de mudanças (desenvolvimento local,
integrado e sustentável; desenvolvimento endógeno; desenvolvimento autônomo;
capital social; boa governança). E isso, com as bênçãos das grandes entidades
financiadoras mundiais (Banco Mundial (Bird); Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID). No entanto, a teoria não conseguiu concretizar-se na prática
(PETERSEN, 1999; HURTIENNE, 2001; COSTA, 1997).
O problema é que, apesar do consenso teórico sobre a importância da
participação no desenvolvimento local, inúmeros projetos e iniciativas
governamentais e não governamentais com boas intenções ainda chegam para
vender soluções. Por um lado, os grupos locais não são vistos como agentes
capazes de gerar ou buscar sua própria informação (POKORNY et alli, 2001). Com
isso, aos atores locais resta muitas vezes o papel passivo no processo de
comunicação, prevalecendo relações verticais que geram dependência e
desestímulo àqueles que devem ser sujeitos no processo de construção de seu
próprio desenvolvimento. Por outro, corre-se o risco de um certo participacionismo
(CHANDLER, 2001), que manifesta-se na idéia de que toda e qualquer participação
é sempre o melhor e portanto inevitavelmente necessária. Dogmatiza-se, assim, a
promoção da participação gerando, por sua vez, o perigo de um processo bem
intencionado de participação popular, porém impositivo e artificializado. Ou seja, em
ambos os casos a participação é mais uma vez articulada de cima para baixo.
Desconsiderar a assimetria das relações de poder vigentes na comunidade
pode por fim potencializar os antagonismos já existentes (POKORNY, 2003).
Reconhecer e mapear redes sociais de comunicação interpessoal, acreditamos,
poderia ajudar a melhor identificar os diferentes níveis de participação de atores
locais, subsidiando dessa maneira a implementação de políticas públicas. que
levassem em conta a complexidade das relações sociais da localidade e , portanto,
com maiores chances de êxito.
Referecial teórico
Para entender a dinâmica dos processos de comunicação em sistema sociais
entendidos sob o padrão de rede, lançamos mão da complexidade da teoria
sistêmica do sociólogo alemão Nikllas Luhmann, que problematiza a comunicação e
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 5
a elege como unidade elementar que constitui os sistemas sociais. Se a
comunicação como processo e seus elemento se evidenciam sob o olhar quase
cínico de Luhmann, para compreender o papel da comunicação nos processos de
transformação social temos que buscar subsídios num outro teórico alemão, seu
contraponto e polemizador, Jürgen Habermas, discípulo da escola de Frankfurt,
para quem a comunicação é “dialógica” e tida como “fundamento nuclear a partir do
qual os processos sociais podem ser compreendidos e a realidade social
modificada” (SAMPAIO, 2001).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 6
2 REDES: MÚLTIPLOS SENTIDOS
A sociedade contemporânea tem trabalhado o conceito de rede em várias
esferas e contextos. Trata-se de uma noção que assume diferentes significados,
variando de acordo com a situação e principalmente com o campo disciplinar. Na
chamada era da informação, tudo parece abrigar o pressuposto de estar ou não em
rede.
Autores como Castells (2001), que têm em foco o fenômeno da globalização,
atrevem-se a dizer que a própria contemporaneidade pode ser definida pelo fato de
estar conectado a uma rede Capra (2002) chega a afirmar que, a exemplo das
combinações e arranjos articulados no universo celular, tudo nesse mundo e nessa
vida está organizado sob o padrão em rede3. Mas, como indagam os estruturalistas
franceses Degenne e Foorsé (1994), a questão que se coloca é: como dar um
conteúdo preciso a um conceito que serve para descrever e explicar realidades
sociais tão diversas quanto o parentesco, o poder, a comunicação, as trocas, os
mercados, as organizações, as comunidades urbanas ou rurais4? Essa é uma
pergunta que permite respostas tão diversas quanto a variedade de usos e conceitos
que o termo “rede” carrega em si. Essa ampla difusão do enfoque de rede surge na
verdade como uma novidade em torno de uma idéia nada recente.
2.1 Sobrevôo histórico
A utilização do termo rede em abordagens disciplinares data da segunda
metade do século XVIII. No século XVII a palavra “réseau”, grafia francesa do termo,
era uma palavra técnica e popular usada por tecedores para designar
entrecruzamento de fibras têxteis ou vegetais. Dessa metáfora têxtil a noção de rede
foi absorvida no século seguinte em diferentes contextos: no contexto militar pelas
fortificaçôes (BAKIS apud TAVARES,1999); no plano civil, relacionavam-se às
3 “ Em todos os níveis da vida – desde as redes metabólicas dentro da célula até as teias alimentares
dos ecossistemas e as redes de comunicação da sociedade humana- os componentes dos sistemas vivos se interligam sob a forma de rede.” (CAPRA, 2002, p.267). 4 “ Come donner un contennu précis à un concept qui sert à décrire et à expliquer des réalités
sociales aussi diverses que la parenté, le pouvoir, la communication, le échanges, les marchés, les organizations, les communautés urbaines ou rurales, la sociabilité, le soutien relationnel,etc“ (DEGENNE; FORSE, 1994; p.19)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 7
galerias de minas e às vias de transmissão de água das grandes cidades
(GUILLERME apud RIBEIRO, 1998); a astronomia se apropriou do conceito no uso
da retícula ótica e a topografia, buscou-no para auxiliar a construção da idéia da
triangulação do espaço (BAKIS apud TAVARES, 1999).
No início da era moderna, na virada do século XVIII para XIX, com a química –
considerada por Parrochia (1993) “a verdadeira ciência da ligação e da comunicação
das substâncias” – são então gerados os “instrumentos teóricos que estão na origem
do conceito científico de “redes”. (D. PARROCHIA apud SANTOS,1996 p.208). Mas
foi somente no final do século XIX que o termo rede passou a fazer parte do domínio
das relações sociais, em decorrência da aceleração do desenvolvimento técnico,
que por sua vez promoveu o aumento do número de ligações (TAVARES, 1999), ou
poderíamos dizer, de comunicação, entre pessoas e lugares.
É também a partir do século XIX que o termo rede assume um significado
figurado e começa a ganhar status de conceito, sendo utilizado na hidrologia, na
geologia e na biologia (Idem). No urbanismo por exemplo, a noção de rede urbana é
contruída a partir da metáfora biológica da circulação sanguínea, a mesma idéia que
um século depois iria inspirar pensadores da teoria sistêmica (MATURANA e
VARELA, 1974; MATURANA, 1994; LUHMANN, 1990) na construção de um paralelo
entre sociedades e seres vivos, ou seja, entre redes biológicas, e redes sociais, que
trataremos mais à frente neste estudo.
No século XX ocorre a difusão do uso do conceito de rede. Segundo a
professora Sherer-Warren (1999), hoje o termo é utilizado tanto “pela ciência, como
conceito teórico ou metodológico, quanto por atores sociais que passaram a
empregar essa noção para se referirem a determinado tipo de relação ou prática
social”. Para Milton Santos (1996), a idéia de rede na atualidade parece a tudo
invadir e a tudo aderir, gerando uma tal polissemia, capaz de acarretar potenciais
imprecisões e ambiguidades.
2.2 Na “rede” dos muitos sentidos
As ciências em geral (Físicas, Tecnológicas, Humanas), têm trabalhado o
conceito de redes, para explicar diferentes fenômenos sociais. Para ficar em alguns
exemplos: na Geografia têm-se as redes territoriais, as redes técnicas, de produção
e as redes urbanas, que indicam níveis de interdependência e de fluxos entre as
cidades. A Antropologia trata das redes primárias e usa os conceitos de redes de
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 8
vizinhança, de parentesco ou de amizade/compadrio para explicar formas
específicas de interação entre indivíduos de determinado agrupamento. A
Administração analisa as redes organizacionais, empresariais e de controle. No
campo da Economia surge a noção de redes na esfera do mercado, do consumo, da
produção. E das Ciências da Computação vem a noção de redes de informação. Da
Sociologia vem a idéia de redes sociais como rede de relações e inter-relações entre
grupos sociais. (SHERER-WARRER, 2001, LOIOLA; MOURA, 1996; TAVARES,
1999).
No que diz respeito às Ciências Agrárias, em especial ao ensino da Extensão
Rural, a partir dos anos 80, tendo como referência pioneira o livro de Rogers e
Kincaid (1981), diversos trabalhos sobre inovações rurais passaram a utilizar a
abordagem em rede. Na literatura, uma série de pesquisadores(ROGERS; KINCAID,
DARRÉ, FRASLIN apud ASSIS, 2001) passaram a estudar “as capacidades locais
de inovação em função das morfologias de redes de diálogo entre agricultores” para
ajudar a definir “contextos sociais locais mais favoráveis à emergência da inovação e
à condução do processo de mudança” (ASSIS, 2001, p.4). Nesse campo é muito
usado o termo redes de diálogo, que segundo definição de Rodrigues (1978) “são
conjuntos de indivíduos ligados através de fluxos de comunicação, constituindo
estruturas sociais informais” (Rodrigues apud Assis, 2001, p.4). Os integrantes das
redes não têm posições formais definidas, no entanto, “certos indivíduos
desempenham papéis especiais que podem ser traduzidos em maior ou menor
dinâmica no fluxo de comunicação’’.(Idem)
Para tentar sistematizar a multiplicidade dos usos e sentidos emprestados à
noção de rede, Loiola e Moura (1996) levam em conta diversos campos de estudo:
do campo das relações interpessoais, que tem por foco o indivíduo, fazem parte,
segundo as autoras, as redes primárias, as redes naturais, as redes submersas e
também as redes de comunicação. São estruturas informais, onde as relações
emergem de forma natural, a partir de “interesses compartilhados e de situações
vivenciadas em agrupamentos ou localidades”- a vizinhança, a família, o parentesco,
o local de trabalho e vida profissional.
Ao campo dos movimentos sociais vinculam-se expressões como redes de
movimentos, redes sociais e redes de solidariedade (LOIOLA; MOURA, 1996) ou
ainda redes movimentalistas (DOIMO apud SHERER-WARREN, 1999). Esse é um
campo definido como ético-político, no qual “atores coletivos, portadores de
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 9
identidade diversas, se articulam formando as redes, com base em conexões pré-
existentes” (Idem) – enquadram-se aí as ONGs (organizações não-
governamentais),ações de solidariidade pública, fóruns, associações, sindicatos,
etc5.
No campo do Estado estão inseridas “redes que representam formas de
articulação entre agências governamentais e/ou destas com redes sociais,
organizações privadas ou grupos”. O objetivo de tais articulações seria “permitir
enfrentar problemas sociais e implementar políticas públicas”. São redes
institucionais, formadas por coordenações ou comissões formais de instituições
engajadas em políticas comuns (DEBOUCHET apud LOIOLA; MOURA,1996));
redes secundárias formais, onde papéis e funções dos participantes são definidos
por normas precisas (GROSSELIN; LEFILLEUL apud LOIOLA; MOURA, 1996)),
redes socio-governamentais, nas quais interagem orgãos governamentais e
sociedade civil organizada (MAUREL apud LOIOLA: MOURA, 1996)) e redes locais
de inserção, que articulam atores do Estado e da sociedade civil em torno de
políticas públicas em âmbito local (MORGENSZTERN apud LOIOLA; MOURA,
1996).
No campo dos negócios encontram-se denominações de redes de
inovadores (por exemplo joint ventures visando acordo de Pesquisa e
Desensvolvimento-P&D), redes sistêmicas (agrupamentos de organizações que
tomam decisões articulam esforços de produção de forma conjunta), redes
secundárias não formais (surgem para atender necessidade específicas e fornecer
produto ou serviço) e redes estratégicas (formam-se entre empresas juridicamente
independentes mas que mantém “relações complexas recíprocas, de caráter mais
cooperativo do que competitivo”) (LOIOLA; MOURA, 1996)6.
5 No campo dos movimentos sociais, as interações, de forma geral, são horizontais e as práticas
pouco formalizadas ou institucionalizadas e a base de tais formações seria a existência de conflitos, de laços de solidariedade e de projetos políticos ou culturais compartilhados em identidades e valores coletivos (SHERER-WARREN apud LOIOLA; MOURA, 1996). Castells considera que um padrão de organização e intervenção descentralizada e integrada em rede, característica dos novos movimentos sociais”, é o principal agente de mudança na sociedade atual (CASTELLS, 1996b p.426) 6 Segundo Fukuyama (1997), no mundo das organizações, as redes são vistas como “a solução para
o problema de coordenação de organizações altamente descentralizadas” para enfrentar a complexidade da sociedade capitalista pós-fordista, onde “ alta confiança é uma exigência da produtividade e da qualidade”, ou seja, onde a competitividade precisa da cooperação”. E justifica: “(...) as corporações centralizadas e autoritárias têm fracassado pela mesma razão que levou ao fracasso os estados centralizados e autoritários: elas não conseguem lidar com os requisitos informacionais do mundo cada vez mais complexo que habitam”. (FUKUYAMA apud DE FRANCO, 2001).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 10
2.3 Os vários significados do termo
O vocábulo “rede”, conforme o dicionário Aurélio (2004), deriva do latim rete,
que significa “entrelaçamento de fios, cordas, cordéis, arames, com aberturas
regulares fixadas por malhas, formando um espécie de tecido”. Em sentido figurativo
pode significar o conjunto dos meios de comunicação ou de informação (telefone,
rádio televisão, jornais); o conjunto das vias de transporte ferroviário, rodoviário,
aéreo ou ainda o conjunto de estabelecimentos, agências, ou mesmo indivíduos,
pertencentes a organização que se destina a prestar determinado serviço (rede
bancária, rede de saúde, rede de saneamento).
Em sentido popular, rede está vinculada à idéia de armadilha (“caiu na rede, é
peixe!”), competição (rede que divide adversários - rede de vôlei, tênis) ou disputa
(rede que consagra resultados - rede de futebol – “bola na rede!”). De forma mais
ampla, o termo rede pode denominar qualquer conjunto ou estrutura que por sua
forma ou disposição lembre um sistema reticulado, isto é, assemelhe-se a uma rede
e no caso das redes técnicas, difunda-se em áreas consideráveis, como por
exemplo redes de energia, de saneamento ou a rede de computadores da Internet,
cuja palavra já traz em si o vocábulo rede na grafia utilizada nos países anglo-
saxões (net).
Na definição de Castells, rede é um conjunto de nós interconectados. E nó é o
ponto no qual uma curva se entrecorta (CASTELLS, 2001; p.566). Já o que o que
vem a ser o “nó” depende do tipo de redes das quais se está falando. Loiola e
Moura (1996) defendem que os nós correspondem à atores e organizações que
mantém relações entre si e aí a diversidade não poderia ser maior. Castells, ao
analisar a sociedade contemporânea sob o padrão em rede sugere vários exemplos:
São mercados de bolsas de valores e suas centrais de serviços auxiliares avançados na rede de fluxos financeiros globais. São conselhos nacionais de ministros e comissários europeus da rede política que governa da União Européia. São campos de coca e de papoula, laboratórios clandestinos, pistas de aterrisagem secretas, gangues de rua e instituições financeiras para a lavagem de dinheiro na rede de tráfico de drogas que invade as economias, sociedades e Estados no mundo inteiro. São sistemas de televisão, estúdios de entretenimento, meios de computação gráfica, esquipes para cobertura jornalística e equipamentos móveis gerando, transmitindo e recebendo sinais na rede global da nova mídia no âmago da expressão cultural e da opinião pública, na era da informação. (CASTELLS, 2001, p.566)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 11
2.4 Propriedades e características das “redes”
A primeira propriedade das redes é a conexidade – qualidade de conexo –
aquilo que tem ou em que há ligação (FERREIRA, 2004). São portanto os fluxos,
de todo o tipo – das mercadorias às informações – que pressupõem a existência
das redes (DIAS, 1996)7.
Do ponto de vista popular, a noção de centralidade não faz parte do sentido de
“rede”. Pelo contráro, igualdade e complementariedade entre as partes, reforçados
pela noção de regularidade são tidas como aspectos básicos da morfologia das
redes (LOIOLA; MOURA 1996; p.54).
Já no que diz respeito ao plano técnico-operacional, as redes são definidas em
dois diferentes tipos de acordo com a idéia da origem do fluxo: as de fluxo
unidirecional, com pontos de origem e destino bem definidos, sendo que na origem
localiza-se a fonte geradora do fluxo, configurando-se como ponto central da rede,
como por exemplo uma rede de energia elétrica; e as de fluxo multidirecional, que
apresentam interconexão entre os pontos/elementos, onde os fluxos acontecem sem
que haja necessariamente um centro propulsor e onde as unidades se
complementam para formar a rede. Nesse caso, redes interativas de computadores
são um bom exemplo.
No plano das redes sociais, direção e intensidade dos fluxos entre os pontos
da rede tendem a tornar-se estratégicos na disputa pelo poder. Como coloca Santos,
“a existência de redes é inseparável da questão do poder” (1996; p.215) e quem
detém a informação ou os meios de comunicação dos fluxos detém o poder. Nesse
caso, segundo Castells,(1996) “ o poder dos fluxos é mais importante que os fluxos
do poder”8.
Redes são estruturas abertas ou fechadas? Quando se trata de redes sociais
há respostas afirmativas para ambos os casos. Castells coloca que as “redes são
7“ É antes de tudo pela conexidade que a rede solidariza os elementos. Mas ao mesmo tempo em
que tem o potencial de solidarizar, de conectar, também tem de excluir” [...]“Em outras palavras, nunca lidamos com uma rede máxima, definida pela totalidade de relações mais diretas, mas com a rede resultante da manifestação das coações técnicas, econômicas, poíticas e sociais” (DIAS, 1996; p.148) 8 “A presença na rede ou a ausência dela e a dinâmica de cada rede em relação às outras são fontes
cruciais de dominação e transformação de nossa sociedade”.[...]“As conexões que ligam as redes (por exemplo fluxos financeiros assumindo o controle de impérios de mídia que influenciam processos políticos) representam os instrumentos privilegiados do poder. Assim, os conectores são os detentores do poder” (CASTELLS, 1996; p.565).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 12
estruturas abertas capazes de expandir de forma ilimitada, integrando novos nós
desde que consigam comunicar-se dentro da rede, ou seja, desde que compartilhem
os mesmos códigos de comunicação (CASTELLS, 2001, p.566). Já o sociólogo
alemão Niklas Luhmann considera redes como sistemas operacionalmente
fechados, porém com certa permeabilidade entre sistema e meio, “pois só assim
pode ser garantida a produção regular de informação” (LUHMANN apud ESTEVES,
1993). Nesse caso, trata-se de pensar a sociedade como um sistema vivo,
“autopoiético”, que é capaz de se autocriar e se reproduzir, ou seja, ser auto-
sustentável.
Na teoria sistêmica de Luhman, o ponto central consiste em identificar os
processos sociais da rede autopoiética como processos de comunicação. “Os
sistemas sociais usam a comunicação como seu modo particular de reprodução
autopoiética. Seus elementos são comunicações que são produzidas e reproduzidas
por uma rede de comunicações e que não pode existir fora dessa rede” (LUHMANN
apud DE FRANCO, 2001, p.468).
Já para De Franco (2001), mais relevante do que indagar se a rede social é
fechada ou aberta (i.e., autopoiética ou não) é analisar “o padrão de organização” no
interior da rede - entender o arranjo particular de conexões entre componentes - e
sua dinâmica ou “modo de regulação”. Segundo ele, quanto mais “verticais” e
hierárquicos forem as redes sociais menos auto-sustentáveis, ou seja, menos se
aproximam das características dos sistemas vivos. Por outro lado, quanto mais
“horizontais” forem os padrões de organização das redes, quanto mais comunitários
e democráticos, mais se aproximam das características dos sistemas vivos.
Resumindo, pode-se dizer então, que seja qual for a abordagem, independente
do enfoque (antropológico, sociológico ou multidisciplinar) a noção e a realidade da
rede sempre traz em si um sentimento de dualidade, de ambigüidade – una e
múltipla, estável e dinâmica, real e virtual, técnica e social, pública e privada,
fechada e aberta, local e global, horizontal e vertical, com elos fortes e fracos.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 13
3 REDES E CAPITAL SOCIAL
A noção de rede tem sido, com frequência, associada a um outro conceito
bastante difundido nos últimos tempos - o de capital social. A primeira pessoa a usar
a expressão capital social com seu sentido atual foi Jane Jacob (1961), que definiu-o
como rede, e tanto Maturana (1985-1993) quanto Putnam (1996), “introduzem o
padrão de rede para explicar como se formam e/ou como operam os laços
cooperativos”, ou seja, aqueles laços capazes de produzir capital social, “entre as
pessoas de uma determinada cultura ou sociedade.”(DE FRANCO, 2001;p.367-368).
Não se pode esquecer, no entanto, a contribuição de outros autores, como
Bourdieu e Coleman, na discussão sobre capital social9. A contribuição de Bourdieu
se dá principalmente na identificação dos vários outros tipos de capital (além do
físico), entre os quais ele considera o capital social. Coleman é considerado o
principal responsável pela introdução do capital social nas agendas de pesquisa. Ele
faz uma abordagem sociológica sobre o capital social, mostrando a sua importância
para o funcionamento dos sistemas e estruturas sociais.(MONASTÉRIO, 2000;
CASTILHOS, 2002)..Mas é com Putnam que, de certa forma, se chega à síntese da
discussão sobre o tema.
O conceito de capital social tem suas origens nas idéias da sociedade cívica, de
Alexis de Tocqueville (1840) mas entrou em voga a partir da década de 1990,
quando recebeu atenção especial dos cientistas sociais (De Franco, 2001). Com o
lançamento, em 1993, do livro de Robert Putnan, Making democracy work civic
traditions in modern Italy – traduzido no Brasil, em 1996, como Comunidade e
democracia :a experiência da Itália moderna, o conceito de capital social foi
relançado e amplificado (Idem).
Na medida em que se pretende apenas traçar o paralelo entre redes e capital
social não vamos aqui buscar os precursores na formação do conceito10 nem
tampouco polemizar com as críticas à abordagem de Putnan11 Nossa pretensão é
centrar nas definições de Putnam, que são as que ficaram mais conhecidas.
9 Uma das obras de BOURDIEU é: “The Forms of Capital”, in Handboook of Theory and Research for
the Sociology of Education”, ed. J. Richardson. N.Y., Greenwood (1985). Já a obra clássica de Coleman é: “Foundations of Social Theory”, Belknap Press, Cambridge, (1990) (CASTLHOS, 2002) 10
Ver Tocqueville *1840); Jacobs( 1961); North,(1970); Granovetter, (1985); Coleman, (1988) 11
Ver Portes (1993); Ladd (1993); Evans (1995); Fukuyama (1995); Abu-El-Haj (1999);Woolcock (1999) Para uma síntese das origens do conceito de capital social e visões atuais, ver De Franco (2001); Monastério (2000); Castilhos (2001)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 14
Putnam buscava responder essencialmente à pergunta: “porque alguns
governos democráticos têm bom desempenho e outros não?” Depois de 20 anos de
rigoroso empirismo, analisando experiências de reforma institucional realizadas em
regiões da Itália, Putnam concluiu que para a estabilidade política e mesmo para o
desenvolvimento econômico, “o capital social pode ser mais importante até do que o
capital físico ou humano”(PUTNAM, 1996, p.192). Na conceituação de Putnam, “o
capital social diz respeito a características da organização social, como confiança,
normas e sistemas, que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade,
facilitando as ações coordenadas”.(PUTNAM,1996, p. 177).
A tese de Putnam é que não foi o desenvolvimento econômico do Norte da Itália
que se transformou em qualidade de vida mas sim as relações sociais, baseadas na
confiança e a cooperação mútua, que possibilitaram os avanços. que hoje a
distinguem sobremaneira de regiões do Sul da Itália, consideradas menos cívicas,
onde impera, ao contrário, a desconfiança entre os indivíduos e a prática do
clientelismo personalista nas relações com o governo local.
Tal entendimento vem fortalecer a tese de que o desenvolvimento não é
simplesmente resultado direto do crescimento econômico e da modernização, não
podendo ser medido apenas quantitativamente (taxa do Produto Interno Bruto –PIB;
renda per capita e outros indicadores econômicos). Essa nova visão, que tem como
foco o capital social, é hoje o enfoque básico para a definição de políticas públicas,
para entender fracassos e propor soluções (BANDEIRA, 2001). Em tal abordagem, o
contexto cultural se mostra como fator determinante, ou no mínimo revelador, da
qualidade das relações sociais12.
Mas o que define a qualidade de uma relação social? Para Putnam a resposta
está na “boa regra da reciprocidade generalizada”, associada em geral “a um amplo
sistema de intercâmbio social”. Nas comunidades em que as pessoas acreditam que
a confiança será retribuída, sem que haja abuso, existe maior probabilidade de
haver intercâmbio, afirma o autor.
Segundo Putnam, “toda sociedade – moderna ou tradicional, autoritária ou
democrática, feudal ou capitalista – se caracteriza por sistemas de intercâmbio e
comunicação interpessoais, tanto formais quanto informais” (1996, p.182). O que os
diferencia segundo o autor, é que alguns desses sistemas são basicamente
12
Muitas das ponderações ou afirmações aqui contidas são resultado dos debates realizados sob coordenação do professor Thomas Hurtienne, em grupo interdisciplinar de estudos sobre Capital Social - NAEA/UFPA (2003).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 15
“horizontais”- ou seja, congregam atores sociais ou “agentes” que têm os mesmo
status e o mesmo poder – e outros são basicamente “verticais”, reunindo “agentes
desiguais em relações assimétricas de hierarquia e dependência”. Quase todos eles
combinam ambas as caractertísicas, ou seja, nenhuma relação é absolutamente
horizontal ou completamente vertical porém, ressalta o autor, “quanto mais
horizontalizada for a estrutura de uma organização, mais ela favorecerá o
desempenho institucional na comunidade em geral” (1996, p.185).
Está inserida nesta abordagem a idéia de tecido social como um sistema de
interações e comunicação em rede, ligado ora por elos fracos (constituídos por
relações mais esporádicas, por conhecimento, afiliações ou associativismo) ora por
elos fortes (constituídos por relações mais intensas, como família, parentesco,
vizinhança). Essa tipologia dos intercâmbios sociais tem sido freqüentemente
discutida13. E a conclusão, “por ironia”, como coloca Putnam citando Granovetter, é
que ”os vínculos interpessoais “fortes” (como parentesco e íntima amizade) são
menos importantes do que os vínculos “fracos” (como conhecimentos e afiliações à
associações secundárias) para sustentar coesão comunitária e a ação coletiva”
(PUTNAM, 1996, p.185).
Como exemplo de grupos horizontalmente organizados Putnam (1996) cita
“clubes desportivos, cooperativas, sociedades de mútua assistência, associações
culturais e sindicatos” e como exemplo de organizações herarquicamente
organizadas “a Máfia e a Igreja Católica institucional”. De Franco (2001) pondera
que, em geral, clubes profissionais e especialmente sindicatos não são tão
horizontais assim e parte da Igreja Católica, sua porção chamada “popular” (redes
eclesiais de base, florescidas no Brasil e América Latina) não pode ser considerada
notadamente vertical. Esses exemplos variam pois de acordo com a trajetória e o
contexto no qual estão inseridos. O que é horizontal aqui pode não ser alí, por isso a
análise de redes pressupõem uma dada territorialidade. Mas voltando à pergunta
original: qual a relação entre redes e capital social? Augusto de Franco (2001)
esboça a resposta:
Rede, comunidade e Capital Social são conceitos congruentes. Redes formam comunidades, ou comunidades se caracterizam por apresentar um padrão de rede [...] Redes são Capital Social (ou são uma forma de Capital Social). Comunidades “produzem” Capital Socia”. (DE FRANCO, 2001;p.389)
13
Ver Sherer-Warren, 1999, onde cita sobre o assunto Granovetter, 1973; Rosentahal, 1985; Marwell, 1988; Hennig&Lieberg, 1994.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 16
Evidencia-se, portanto, que, ao propormos a observação de redes de pessoas
que se comunicam entre si em dada localidade, estaremos muito provavelmente
percebendo também uma certa qualidade das interações existentes, o que
certamente estará revelando indícios do volume de capital social presente na
comunidade observada, o que viria a ser um bom indicador para a
sustentabilidade.das ações desenvolvidas.
Resumidamente poderíamos então dizer que capital social vem a ser
essencialmente a comunicação entre atores sociais, baseada em relações de
confiança, e esta, a palavra-chave para explicar o desenvolvimento.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 17
4 REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL: DE QUE “REDE” SE
ESTÁ FALANDO?
Nesse trabalho usa-se a designação redes sociais de comunicação
interpessoal (RSCI), para revelar o entendimento de rede social - referindo-se a
“redes locais ou geograficamente delimitadas”(SHERRER-WARREN, 1999) – tendo
como foco específico de observação os processos de comunicação entre os atores
sociais que nela interagem, isto é, que diz respeito aos fluxos de informação entre os
integrantes da rede.
As redes sociais de comunicação interpessoal, a exemplo das redes de
diálogos14 (RODRIGUES apud ASSIS, 2001), são redes de indivíduos que
constituem estruturas sociais informais, capazes de interagir tanto endógena quanto
exogenamente dependendo do contexto e da conjuntura existente, ou seja, são
redes de pessoas que realizam rotineiramente a comunicação dentro de um certo
grupo local mas que, num dado momento, podem interagir com outro nível de atores
sociais, como comerciantes regionais, organizações governamentais e não
governamentais ou entidades financeiras que passam a atuar na região. Portanto,
tais redes de indivíduos podem ser palco de interesses (temporários ou
permanentes), gerados a partir do próprio grupo ou a partir de estímulo externo.
De forma mais ampla, é pertinente afirmar que RSCI são, antes de mais nada,
redes de interação social, que ,por sua vez, vem a ser um “sistema no qual atores
sociais estão envolvidos e onde as informações transitam obedecendo uma ordem
determinada pelos tecidos histórico e social que constituíram esse universo” (SILVA,
1996;p.12). Nesse caso, considera-se que a interação se vale, no que diz respeito
ao processo de compreensão, de representações construídas a partir do ato da fala,
das interações comunicativas e de toda a situação existente( VAN DIJK apud SILVA,
1996)
O foco das RSCI recai sobre o processo de comunicação e nesse sentido,
recorremos à Luhmann para entendê-lo. Niklas Lluhmann é considerado o teórico
contemporâneo que mais se debruçou no entendimento da comunicação como fator
14
‘’As redes de diálogo são conjuntos de indivíduos ligados através de fluxos de comunicação, constitu indo
estruturas sociais informais. Os membros das redes não têm posições formais definidas, porém, certos indivíduos desempenham papéis especiais que podem ser traduzidos em maior ou menor dinâmica no fluxo de comunicação’’ (Rodrigues, 1978 In: Assis, 2000)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 18
intrínseco para a compreensão da sociedade. Para o autor, a comunicação vem a
ser a unidade elementar que constitui os sistemas sociais e deve ser compreendida
como um processo de seleções que se desenvolve em três níveis: produção de um
conteúdo informativo (seleção da informação), difusão (comunicação do
enunciado) e compreensão (aceitação ou rejeição) desse mesmo conteúdo
(LUHMANN apud ESTEVES, 1993). Desse modo, segundo Mathis, “a interpretação
do processo comunicativo como unidade de três seleções enfatiza o papel do
destinatário. É ele que determina se a comunicação se realiza ou não”. (2001, p.123)
4.1 Comunicação na visão de Luhmann
Dentro da Teoria Sistêmica de Luhmann, a comunicação tem um caráter
eminentemente técnico, discutido de forma altamente abstrata e complexa. Por esse
motivo, somado à dificuldade de acessar publicações do próprio autor, recorremos à
literatura que analisa o legado teórico de Luhmann (CAPRA, 2000, 2002; ESTEVES,
1993, MATHIS, 1998a, 1998b 2000; STONCKINGER, 2001, 2003) para buscar
entender a dinâmica segundo o autor dos processos de comunicação em
sociedades complexas.
Para Luhmann, que aspirava a uma teria universal da sociedade, a
comunicação é justamente o que distingüe os sistemas sociais dos outros sistemas,
onde ocorreriam simplesmente processos informacionais, ou seja, onde haveria
apenas transmissão de sinais quantificáveis de um lugar a outro, conforme modelo
matemático de Shannon-Weaver15. Nesta nova visão, ”os sistema sociais usam a
comunicação como seu modo particular de reprodução autopoiética”, termo que
deriva dos radicais gregos auto (“próprio”) e poiesis, (“criação”, “produção”), utilizado
originalmente pelos chilenos Marturana e Varela (1974) para designar a capacidade
de auto-reprodução de sistemas biológicos 16
15
Criado em 1949 por C.E.Shannon e W.Weaver, é considerado dentre os modelos de comunicação O mais influentes nas últimas décadas Trata-se de um modelo linear da comunicação visto como um processo de transporte da informação de um ponto A (o emissor) para um ponto B(o receptor). A informação, uma vez codificada em sinais por um emissor, seria transmitida através de um canal (a mídia) para um receptor que processaria a sua decodificação (SAMPAIO,2001) 16
Hoje a noção de autopoiese já ultrapassou em muito o domínio da biologia, sendo utilizada em campos tão diversos como a sociologia, a psicoterapia, a administração, a antropologia, a cultura organizacional e muitos outros. Essa circunstância transformou-na em um importante instrumento de investigação da realidade (Mariotti, 1999)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 19
Ao final e ao cabo o sistema, tanto biológico quanto social, seria tanto produtor
como produto. A idéia é de que a vida é um processo de conhecimento, construído
de forma incessante e interativa. É o que Humberto Maturana e Francisco Varela em
seu útlimo livro, A Árvore do Conhecimento (1990), vão chamar de biologia da
cognição, ou seja, construímos o mundo em que vivemos ao longo de nossas vidas.
mas por sua vez, ele também nos constrói ao longo dessa jornada comum. Isso quer
dizer que mesmo que não percebamos de imediato, somos sempre influenciados e
modificados pelo que experienciamos e comunicamos.
Segundo Luhmann, os elementos essenciais dos sistemas sociais são
comunicações, produzidas e reproduzidas de modo recorrente por uma rede de
comunicações, e que não podem existir fora de tal rede. Ou seja, sistemas sociais,
no entender de Luhmann são sistemas fechados mas que interagem, sistema e
meio, através da possibilidade de acoplamentos estruturais. É o que permite a
realimentação permanente da informação no sistema (MATHIS, 1998b). Capra
(2002)17, físico e teórico de sistemas, explica esse processo autopoiético:
Essas redes de comunicação geram a si mesmas. Cada comunicação cria pensamentos e um significado que dão origem a outras comunicações, e assim a rede inteira se regenera – é autopoiética. Como as comunicações se dão de modo recorrente em múltiplos anéis de realimentação (feedback loops), produzem um sistema comum de crenças, explicações e valores- um contexto comum de significados – continuamente sustentado por novas comunicações. Através desse contexto comum de significado, cada indivíduo adquire sua identidade como membro da rede social, e assim gera o seu próprio limite externo. Não se trata de um limite físico, mas de um limite feito de pressupostos, de intimidade e de lealdade – um limite continuamente conservado e renegociado pela rede de comunicações. (CAPRA, 2002;p.95)
A comunicação, acrescenta Esteves (1993), destina-se, pois, a produzir a
“eficácia simbólica generalizante que torna possível a regularização da vida social
sob a forma de uma organização sistêmica” e, ao mesmo tempo, cria condições de
estabilidade favoráveis à sua auto-preservação e desenvolvimento.
Luhmann trata de um sistema operacionalmente fechado ou “auto-referente”, o
que significa dizer que o processo seletivo da comunicação é voltado para si próprio,
isto é, para o sistema em que tem lugar, mas é também permeável, ou seja, se dá a
partir de seus próprios elementos porém preserva um certo grau de abertura. Só
17
Fritjof Capra é autor de diversos livros campeões de vendas em vários países do mundo, como O TAO da Física, O Ponto de Mutação e A Teia da Vida (Editora Cultrix), mas no meio estritamente acadêmico tal sucesso, aparentemente, é visto com ressalvas. A escolha pelo autor se deu por seu estilo justamente mais voltado ao público leigo, tornando-se mais fácil a aproximação da complexa teoria de Luhmann.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 20
assim pode ser garantida a produção regular da informação – resultado de uma
dada permeabilidade do sistema em relação ao meio (ESTEVES, 1993). Isso tem a
ver com o entendimento de que a “autopoiesis se refere à autonomia e não
siognifica autarquia” (MATHIS, 1998b, p.263).
Uma das mudanças principais das concepções de Luhmann sobre a Teoria
Geral dos Sistemas diz respeito justamente à relação entre sistema e meio. A
primeira versão da Teria dos Sistemas aplicada à realidade social, que tinha como
vertente Talcot Parsons, concebeu a sociedade como uma espécie de sistema
soberano, com capacidade ilimitada de modelação do seu meio ambiente. Na visão
de Luhmann, ao contrário da versão tradicional, onde a posição central na relação
parte-todo estava sempre reservada ao indivíduo, “o homem deixa de ser
considerado como parte (a fundamental) desse mesmo organismo social e torna-se-
lhe exterior – passa a constituir um meio ambiente do sistema e como tal, fonte
permanente geradora de problemas , criadora de complexidade” (ESTEVES, 1993
p.4).
Nesse sentido, a categoria central do sistema não é mais o ator, mas o
observador, não é mais a ação mas a pura comunicação. De certa forma o indivíduo,
por mais que esteja presente, como que desaparece no centro da cena social ou
melhor, aparece como elemento desestabilizador do sistema.
Ao afirmar que “apenas a comunicação sabe comunicar” (LUHMANN apud
STOCKINGER, 2001, p.41) Luhmann aparentemente se afasta das concepções da
comunicação centrada na participação dos agentes sociais, ou seja, da
comunicação como modelo dialógico, cujas origens remontam à filosofia de Sócrates
e Platão.
Nesse aspecto, na medida em que o indivíduo ou grupo de indivíduos em
determinada localidade são basicamente o foco do que chamamos aqui redes
sociais de comunicação interpessoal, nos distanciamos ,de certa forma, da teoria de
Luhmann e nos aproximamos da visão de Habermas, para quem a comunicação só
pode ser entendida dialogicamente, como o fundamento nuclear a partir do qual os
processos sociais podem ser compreendidos e a realidade social modificada
(SAMPAIO, 2001, p.4).
Para Habermas, a comunicação é concebida como um processo dialógico,
através do qual sujeitos capazes de linguagem e ação interagem com fins de obter
um entendimento. Estão delineados assim, nessa formulação, alguns pontos
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 21
centrais da teoria habermasiana da ação comunicativa ou da competência
comunicativa. São eles: “a compreensão da comunicação como interação, a
centralidade da linguagem como meio privilegiado do entendimento - daí a noção de
dialogia - e a compreensão do entendimento como sendo o objetivo da
comunicação.” (SAMPAIO, 2001, p.4)18 Percebe-se pois, que o interesse
emancipatório é o fio condutor da obra do autor e a comunicação é tida como
fundamento nuclear da transformação social.
Comunicação: improvável e arriscada
Enquanto para Habermas, a comunicação é considerada como sinônimo de
consenso, de busca do entendimento, para Luhmann, pode-se comunicar também
para se marcar o dissenso (SAMPAIO, 2001) e nesse aspecto, nos reaproximamos
do entendimento luhmaniano. A perspectiva de Luhmann é a de uma abordagem
problematizante da comunicação, na qual a comunicação é antes de tudo
improvável e arriscada.
Tanto as condições de improbabilidade quanto de risco estão relacionadas
com os níveis de seleção nos quais opera a comunicação. A improbabilidade da
comunicação está relacionada 1º) com a compreensão (ou seja, que a mensagem
alcance outros); 2º) com a capacidade de recepção (que, ao, encontrar outros, a
mensagem seja entendida) e 3º) diz respeito aos resultados pretendidos com a
comunicação (.que a mensagem – se recebida e entendida – seja aceitada). Nesse
caso, explicita Pissarra Esteves, “mesmo quando as dificuldades anteriores são
ultrapassadas, resta, como derradeira, a de conseguir incorporar a comunicação ao
nível do comportamento (do Outro), fazer adoptá-la (os conteúdos usados) como
premissa de ação”. Por isso, para Luhmann, nesse ponto, toda comunicação é
arriscada, porque defronta-se permanentemente com a questão se a informação
participada e compreendida será aceita ou recusada.(MATHIS, 2001; SAMPAIO,
2001, STOCKINGER, 2001). Para elucidar vale citar Stockinger:
(...)no preciso momento em que a comunicação acontece, cada um ouve
apenas aquilo que "quer" ouvir, e cada um compreende apenas aquilo que "quer"compreender. Não há instância alguma que pudesse avaliar com certeza o que a emissão e a recepção tem em comum, já que eles se relacionam como "caixas pretas"(black boxes), cujo conteúdo fica vedado
18
Inês Sílvia Vitorino Sampaio é doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, professora do Curso de Comunicação Social da Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e do Mestrado em Sociedade e Políticas Públicas da Universidade Estadual do Ceará (UECE).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 22
para um observador externo. A intenção da contribuição do outro nunca será completamente revelada, por mais que ele "jure"falar a "verdade", ele poderá esconder ainda outras intenções. É com isso que a comunicação conta para se reproduzir. Quanto mais "segundas intenções" houver, quanto mais desentendimentos existirem, tanto mais precisará ser
comunicado para seu possível esclarecimento.(STOCKINGER, 2001, p.46)
É o que Luhmann chama de dupla contingência. Contingência, segundo o autor, é
“algo que não é necessário nem impossível, algo então que é (era ou será) assim
como é mas também poderia ser diferente” (MATHIS, 1998c, p.6). Mas é justamente
o dilema permanente entre os agentes da comunicação (Alter e Ego) diante da
incerteza da compreensão que exige que a comunicação aconteça.
Para tornar a comunicação um evento provável existem meios, como explica
Mathis: “a língua, para reduzir o problema da compreensão; os meios de difusão,
para facilitar o alcance ao destinatário; e os meios de comunicação simbolicamente
generalizados, para facilitar a aceitação da comunicação“ (MATHIS, 2002, p.123).
Estes, os chamados “media sistêmicos, funcionais ou simbolicamente
generalizados” (ESTEVES, 1993) – dinheiro, poder e influência segundo Parsons; e
mais amor e verdade, acrescidos por Luhmann - que operam como substitutos ao
papel que a linguagem teve nas sociedades convencionais na garantia de sentido
(“performatividade do sistema”) e, ao mesmo tempo, na definição de novos padrões
do entendimento humano (Idem).
As ressalvas quanto ao risco e à improbabilidade da comunicação também
deveriam ser consideradas nas intervenções sociais e abordagens em comunidades
- ainda mais em localidades rurais amazônicas com acentuada especificidade
cultural - principalmente no que diz respeito ao processo de ajustamento de
expectativas quanto aos resultados pretendidos com a comunicação efetuada entre
os diferentes atores sociais. Fracassos e frustações seriam mais facilmente
evitados e/ou superados.
Do ponto de vista teórico, acreditamos por fim, que para melhor entender o que
é e como funciona o processo de comunicação em uma dada rede social de
comunicação interpessoal, deveríamos lançar mão de um arranjo que levasse em
conta o modelo de Luhmann ponderado pela visão de Habermas. Afinal, ambos os
autores, parecem se complementar na busca de explicações para os paradoxos da
sociedade moderna. Poderíamos ter então, como resultado, um entendimento do
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 23
funcionamento do processo de comunicação na sociedade e de seu papel na
construção do desenvolvimento local.
4.2 Elementos do processo de comunicação
Ao focar a comunicação de forma inusitada, complexa e sofisticada, Luhmann
reordena e/ou reinterpreta os elementos constituintes básicos do processo de
comunicação (ESTEVES, 1993).
A informação , ou conteúdo informativo, vem a ser na teoria sistêmica de
Luhmann o resultado de uma certa seleção entre alternativas disponíveis com
determinada intenção (Idem) “Tudo que tem sentido é passível de ser selecionado,
de se transformar em informação” explica Mathis (2001;p.123). E mensagem é
aquilo que na prática objetiva a informação, o que a materializa e a coloca à
disposição dos interlocutores para que dela possam partilhar (ESTEVES,1993).
Os Interlocutores ou agentes de comunicação, na visão luhmaniana, são
destituídos de caráter antropologizante. São utilizados os termos Ego para designar
aquele que comunica e Alter, o que recebe a informação. Em determinadas
circunstâncias são os próprios sistemas que atuam como agentes no processo de
comunicação e mesmo quando identificadas pessoas individuais, “ sua participação
no processo é sempre encarada como a de elementos que assumem o estatuto de
agentes de um determinado sistema social” (Idem).
O código é o elemento que evidencia o caráter eminentemente técnico da
comunicação considerada pela Teoria dos Sistemas. O código desempenha uma
papel essencial no processo de comunicação. É ele que regula o processo, que
determina o que pode ser comunicado e revela ao longo do tempo as
transformações na capacidade de comunicação de acordo com aquilo que cada
época entende como o seu “centro de sentido”. Trata-se de um código binário, ou
seja, um puro operador capaz de trabalhar com as duas alternativas do binário–
“afirmações” e “negações”. Nesse sentido, segundo Pissara Esteves, é o código que
verdadeiramente possibilita a comunicação, na medida em que somente a partir dele
é possível produzir informação (com sentido) e identificar o ruído (tudo que escapa a
uma das alternativas do binário). Isso significa que estaria criada no sistema uma
nova necessidade social que demandaria, por sua vez, a criação de um novo código
com capacidade de processar um novo tipo de informação capaz, por sua vez, de
satisfazer a nova necessidade de sentido.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 24
Um último elemento, a compreensão, é reordenado na concepção de Luhmann
já para além do processo de comunicação propriamente dito. É tida como uma
consequência sempre contingente deste mesmo processo, “a ponto de se poder
considerá-la como o derradeiro processo de seleção” (ESTEVES, 1993, p.13). O
grau de incerteza desta compreensão irá depender dos resultados obtidos nos níveis
de seleção anteriores (seleção da informação; comunicação mensagem).
Há ainda e antes de mais nada, a expectativa de êxito que é por ele considerada
como o elemento ordenador do processo, do conjunto das operações seletivas. Ao
falar de expectativa ele leva em conta de imediato o caráter incerto e duvidoso do
sucesso da comunicação. Permanecem sempre em aberto tanto a possibilidade de
aceitação como a de recusa das mensagens – “o processo de comunicação
preserva até o limite um indispensável grau de abertura, que é simultaneamente,
condição do seu sucesso, mas também a eventualidade do fracasso” (Idem). Seria,
compara com humor Stockinger (2001) como afirmar que em cada casamento um
possível divórcio já está embutido.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 25
5 AGRICULTURA FAMILIAR E LOCALIDADES AMAZÔNICAS – O CENÁRIO
Desde a Conferência Mundial das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro, em junho de 92, a Amazônia vem
despertando a atenção de organismos nacionais e internacionais em busca de
soluções sustentáveis para os diferentes problemas, particularmente os de natureza
ambiental, diretamente relacionados ao homem amazônico.
Com isso, nos últimos anos, impulsionada pelos sucessivos debates sobre
desenvolvimento sustentável, geração de emprego e renda, segurança alimentar e
principalmente desenvolvimento local, a discussão sobre o papel da produção
familiar no desenvolvimento rural vem ganhando força (MATTOS et Alii, 2001). E a
Amazônia, por suas características ambientais, onde predomina a forma de
produção familiar rural, aparece como tema central desse debate.
A agricultura familiar no Brasil ocupa 14 milhões de pessoas (60% do total da
agricultura), representa 75% dos estabelecimentos agrícolas, 25% das terras
cultivadas e é responsável por 35 % do volume da produção agrícola nacional19. Na
Região Norte a agricultura familiar representa 85% dos estabelecimentos agrícolas e
ocupa 21,8 milhões de hectares20. Dados do Ministério do Desenvolvimento Agrário
(2000), ilustram que os estabelecimentos familiares brasileiros são responsáveis por
37,9% do Valor Bruto de Produção (VBP), ainda que contando com apenas 30,5%
da área e 25% dos financiamentos21. Uma análise regional destaca a importância da
produção familiar na Amazônia, sendo responsável por 58,3% do VBP da Região
Norte, a maior participação familiar regional em VBP do Brasil, com somente 37,5%
da área e 38,6% dos financiamentos disponibilizados (COSTA apud MATTOS et alli,
2001)
5.1 Agricultura familiar – no “acostamento” da história
Para entender o cenário da agricultura familiar amazônica é preciso voltar um
pouco no tempo. A realidade precária das comunidades do interior da Amazônia é,
em grande parte, resultado do fracasso da colonização oficial induzida na região no
período marcado pela ditadura. Os planos oficiais de colonização que faziam parte
19
FONTE: Folha da Embrapa – Jan/Fev. 1999, ano VII, no 37.
20 FONTE: Novo Retrato da Agricultura Familiar- O Brasil Redescoberto, 2001- Convênio Incra/FAO,
com base nos dados do Censo Agropecuário 1995/96, IBGE. 21
Censo Agropecuário 95/96 e Projeto de Cooperação Técnica INCRA/FAO (Costa,xxx)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 26
da política regional de ocupação dos anos 70 e 80, na defesa da ocupação dos
espaços “vazios”, atraíram por um lado milhares de migrantes desinformados sobre
as reais condições locais e por outro, desconsideraram as populações já existentes
(ROSA, 2002).
O projeto de desenvolvimento rural da Amazônia não atribuiu ao campesinato
nenhum papel estratégico (MATTOS et alii, 2001 HURTIENNE, 2001; VEIGA, 1998;
COSTA, 1997). Ao contrário dos países desenvolvidos, no Brasil a pequena
produção agrícola sempre foi tratada mais como um fator de atraso. Na época, a
modernização agrária era vista como um processo irreversível que teria como
suporte grandes empresas (HURTIENNE, 2001).
O resultado de tal trajetória? A resposta não é novidade: concentração
fundiária, migração e adensamento dos centros urbanos, baixa eficiência
econômica, ausência de equidade social e utilização inadequada dos recursos
naturais. Assim se desenvolveram ao longo da história as diversas fronteiras
agrícolas brasileiras - do Rio Grande do Sul nos anos 20 à Amazônia na década de
70, onde o projeto de colonização desenvolvido no governo militar deparou-se então
com peculiaridades ambientais e sociais (MATTOS et alii, 2001).
O planejamento para a região, sem levar em conta as realidades locais
conduziu a uma política de desenvolvimento catastrófica para a Amazônia. Um
verdadeiro desastre econômico e ecológico, traduzido em concretos 60 milhões de
hectares desmatados nos últimos 30 anos (HOMMA, 2002)
O impacto da degradação dos recursos naturais e portanto sua necessidade de
preservação se faz sentir especialmente entre a população mais pobre, tanto o
pequeno produtor de imigração recente, que têm na exploração dos recursos
florestais uma fonte importante de subsistência 22, quanto o caboclo23 da Amazônia.
Este, quando comparado ao migrante, relaciona-se com a floresta de forma mais
harmoniosa, na medida em que tem no aproveitamento dos recursos naturais –
pesca, caça e extrativismo - a base de sua sobrevivência (GALVÃO, 1976;
WAGLEY, 1977; WOLFF, 1998, LIMA, 1999). O grande desafio colocado é o de
como promover o desenvolvimento local no interior da Amazônia Legal de maneira
integrada, ou seja com a participação dos diversos segmentos sociais, e de forma
22 Atividade de subsistência refere-se àquelas voltadas, primeiramente para o consumo da família e, em segundo lugar, para a comercialização do excendente (Cayres, 1999)
23 Caboclo: pequeno produtor rural de ocupação histórica (ROSA, 2002)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 27
sustentável? Esta é uma questão ainda recheada de perguntas sem tantas
respostas.
Nos últimos anos, tem-se tornado cada vez mais aceita, a idéia de que é
necessário criar mecanismos que possibilitem a participação mais direta da
comunidade na formulação, no detalhamento e na implementação das políticas
públicas (BANDEIRA,1999). Na literatura já é recorrente o reconhecimento da
participação como uma das precondições fundamentais para alcançar
desenvolvimento sustentável (CHAMBERS apud ROSA, 2002). No entanto, esse
consenso teórico não se evidencia na prática com a mesma desenvoltura.
Entender o fluxo de informações, tanto endógeno quanto exógeno, existente
numa localidade rural é apontado por diversos autores (ARAÚJO, 2002; VEIGA,
1999; SCHMITZ, 2001) como ferramenta importante para a compreensão da
complexidade local, tanto do grupo quanto do contexto social no qual está inserido –
seus laços sociais, seus sistemas de produção, suas relações de comércio, ou seja,
seus caminhos de sobrevivência. Perceber, portanto, quem está “dentro” e quem
está “fora” das redes de comunicação locais, como veremos mais à frente, tende a
tornar-se informação-chave na orientação de iniciativas que tenham como objetivo
promover o desenvolvimento local.
5.2 Os sentidos da participação: uma discussão importante24
A intervenção social em comunidades tradicionais25 por entidades
governamentais ou não governamentais é uma questão que tem sido alvo de
debates e pesquisas (STOCKINGER, 2003) e a questão da participação, inúmeras
vezes, está no centro desse debate.
Uma conceituação que pode ser considerada adequada aos objetivos desta
discussão, até mesmo para mostrar sua ampla aceitação em círculos inimagináveis
24 A argumentação e discussão presente neste ítem fazem parte de artigo sobre a comunicação como fator de influência no manejo de bens comuns ( floresta), em fase de elaboração pelo Dr. Benno Pokorny, consultor do CIFOR (Centro Internacional de Pesquisa Florestal) e professor da Universidade de Freiburg e pela autora desta monografia, Rosane Steinbrenner. 25
Ressalta o autor que, falar de comunidades tradicionais num sistema globalizado não é correto e isso porque “todos os sistemas sociais conhecidos, por mais tradicionais que possam parecer, já estão conectados à sociedade da comunicação, quer factualmente, quer virtualmente pela mídia, e já não exibem a tradicionalidade “original”. (STOCKINGER, 2003;p.249).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 28
até os anos 70, é a adotada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID),
para o qual a participação “é um processo por meio do qual os indivíduos e as
instituições afetadas por incentivos de desenvolvimento podem influenciar a tomada
de decisões e a alocação de recursos relacionados com essas iniciativas” .Ainda
segundo documento do BID, a participação é importante porque “ habilita e põe em
ação as pessoas como atores e supervisores de seu próprio desenvolvimento”.E
isso, conitnua o documento, “pode ajudar a criar e manter democracias estáveis e
boa governança26 assim como o crescimento econômico” pois “quando populações
pobres e marginalizadas participam nos projetos de desenvolvimento adquirem
habilidade e desenvolvem atitudes que as possibilita contribuir mais
significativamente a sociedade em geral”.
A busca pela participação, é bem verdade está na raiz da construção de
sociedades mais justas e democráticas. Durante as últimas décadas, no que diz
respeito ao desenvolvimento local, a interação e colaboração entre os atores gerou
experiências muito positivas. É certo afirmar também que a ação local, realizada em
busca de colaboração e participação, é considerada como fator importante para
promover a articulação entre os atores sociais, bem como para fortalecer a coesão
da comunidade e melhorar a qualidade das decisões, assim tornando mais fácil
alcançar objetivos de interesses comum.
Esse entendimento consensual reflete-se na literatura, onde já é recorrente o
reconhecimento da participação como fator essencial para alcançar o
desenvolvimento sustentável (CHAMBERS apud ROSA, 2002). A crescente difusão
desse enfoque também no Brasil pode ser atribuída ao próprio avanço da
democratização do país mas também a uma nova abordagem que vem se tornando
dominante no contexto internacional, “que enfatiza a importância da participação da
sociedade civil e da articulação de atores sociais para as ações relacionadas com a
promoção do desenvolvimento” (BANDEIRA,1999). Conceitos como capital social e
boa governança evidenciam esse enfoque como algo consensual, mesmo entre os
grandes financiadores de projetos, como Banco Mundial (BM) e Banco
Interamericano de Desenvolvimento (BID). Estudos chegam a apontar que a
26
A boa governância é caracterizada por: um processo esclarecido e previsível de formulação de políticas públicas, por servidores públicos profissionalizados, por um Poder Executivo que possa ser responsabilizado por suas ações e por uma sociedade civil forte e atuante nas questões de interesse público — todos agindo dentro das regras da lei. A participação é um componente intrínseco da boa governância” (relatório de referência
para a reunião do Grupo dos Sete em Lyon, 1996, Banco Mundial apud BANDEIRA, 1999).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 29
ausência de envolvimento dos atores locais é causa da efemiradade de inúmeros
projetos (BANDEIRA, 1999; POKORNY, 2001).
No entanto, é preciso levar em conta o risco de um consenso absoluto sobre a
importância da participação popular nos processos de desenvolvimento local,
manifestado na idéia extrema de que toda e qualquer participação é sempre o
melhor e portanto, inevitavelmente necessária. Dogmatiza-se, assim, a promoção da
participação gerando por sua vez o perigo de um “participacionismo” de fundo
conservador ou seja, um processo bem intencionado de participação popular porém
impositivo e artificializado. Não levar em conta as assimetrias de poder vigentes no
interior de um dado grupo social, é sabido, implicam no perigo de potencializar os
antagonismos já existentes na localidade (POKORNY ; STEINBRENNER, 2004).
Em comunidades rurais na Amazônia, o risco de uma certa artificialização da
participação pode ser maior. Isso porque elas podem parecer erroneamente aos
atores externos como um grupo social homogêneo. Por sua localização, em uma
extensa área relativamente pouca povoada, e pelo fato de que muitas dessas
comunidades apresentam uma origem bem parecida em sua trajetória e até um
relacionamento direto dos mesmos ancestrais, tendem a ser consideradas como
uma espécie de “comum humanidade” (BOTANSKI; THÉVENOT APUD
ALBALADEJO; VEIGA, 2002), que portanto, deveriam juntar-se para superar os
seus problemas e melhorar o seu nível de vida. Esta visão simplificada no entanto,
deixa de fora dois fatos importantes: a heterogeneidade dentro da comunidade e o
fato de que a participação não é algo que automaticamente corresponde à cultura de
comunidades rurais. ( POKORNY; STEINBRENNER, 2004)
É preciso levar em conta ainda algo muito comum no meio rural: a falta de
preparo dos profissionais responsáveis pela promoção, estímulo ou implantação de
processos que conduzam ao desenvolvimento local somado à ignorância quanto ao
contexto social local (CAYRES, 2002). O resultado dessa combinação é o risco de
ver agudizados os antagonismos sociais pré-existentes na comunidade,
comprometendo ou mesmo inviabilizando os processos de participação.
Nesse sentido, seria preciso considerar quatro fatores como pré-requisitos à
qualidade das ações participativas: a) o reconhecimento das assimetrias (níveis de
poder e interesses) existentes na comunidade; b) a graduação das ações e
abordagem à comunidade de acordo com as assimetrias detectadas; c) a
qualificação dos atores locais bem como de facilitadores para a aplicação de
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 30
métodos participativos e d) o reconhecimento do caráter contingente da
comunicação (incerteza quanto à compreensão e aceitação da mensagem).
A identificação e consideração consciente destes pontos críticos poderia
auxiliar na adequação e otimização de ações voltadas ao desenvolvimento local. O
reconhecimento das redes sociais de comunicação serviria como importante
instrumento para orientar ao desenvolvimento, justamente por ajudar a compreender
o contexto local em sua complexidade, na medida em que pode revelar a
diversidade das interações entre os atores sociais.
Levando-se em conta que as interações no interior de uma rede social é um
processo sempre dinâmico e diverso, mais do que mostrar quem está na rede, e
portanto inserido no processo comunicação/participação, o enfoque em redes
sociais de comunicação pode revelar quem está fora, excluído da rede local. Sem
dúvida, uma informação relevante ao planejamento de políticas públicas que visem a
inclusão social27
27 Entendemos inclusão como o reverso da exclusão social, definida como a “negação da cidadania” Segundo a professora Adaisla Sposati, coordenadora do projeto de Estudos Territoriais de Desigualdades Sociais nas cidades brasileiras, são configuradas quatro grandes utopias de inclusão social: autonomia, qualidade de vida, desenvolvimento humano e eqüidade (Sposati ,"Exclusão Social Abaixo da Linha do Equador" - Seminário sobre Exclusão Social, PUC/SP, Maio de 1998)
http://www.dpi.inpe.br/geopro/exclusao/exclusao.pdf ( acessado em 27.04.2004)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 31
6 Metodologia utilizada
Com o objetivo de estudar a relação entre comunicação e desenvolvimento rural
de produtores familiares na Amazônia, tendo como foco redes sociais de
comunicação interpessoal, este estudo valeu-se de pesquisa bibliográfica e de uma
série de entrevistas semi-estruturas com peritos.
Conforme definição de Carvalho, “a pesquisa bibliográfica deve ser entendida
como a atividade de localização e consulta de fontes diversas de informação escrita,
para coleta de dado gerais e específicos a respeito de determinado tema” (2002,
p.100). Buscou-se nesse sentido, acessar o maio número possível de fontes
disponíveis. Sobre o uso e conceito do termo “rede” a literatura é ampla, diversa, por
vezes ambígua, e demonstra que o assunto se configura num mosaico ainda em
aberto, apresentado aqui numa profundidade bastante limitada pelo tempo e
abrangência permitidos nesse estudo.
No que diz respeito ao principal referencial teórico desse trabalho, a teoria
sistêmica do sociólogo alemão Niklas Luhmann, em especial o seu entendimento do
processo de comunicação, a literatura é escassa - com raras publicações do autor
traduzidas no Brasil - e sua leitura mostra-se difícil, principalmente numa primeira
aproximação do assunto. Por tais motivos, optou-se por buscar autores que
pudessem facilitar a compreensão do pensamento complexo e abstrato do autor 28
Entrevista semi-estruturada, na visão de Trivinõs (1987), com a qual
concordamos, é aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em
teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo
campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se
recebem as respostas do informante. (TRIVINÕS, 1987, p. 146). Os dados coletados a
partir desse tipo de entrevista são analisados, na maior parte das vezes,
qualitativamente, porém um dado rigor na repetição de certos questionamentos mais
pertinentes aos objetivos do estudo permitiu eventuais quantificações.
28
Dentre os autores selecionados destacamos: Gottfried Stockinger, sociólogo e teórico da comunicação, professor Universidade Federal da Bahia; Jose´Pissara Esteves, doutor em teoria da comunicação, professor da Universidade de Lisboa; Armin Mathis, sociólogo e cientista político, professor adjunto do NAEA/ UFPA; Inês Sílvia Vitorino Sampaio é doutora em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, professora do Curso de Comunicação Social da Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e ainda o físico Fritjof Capra.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 32
Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com 13 peritos que
desenvolvem trabalhos com produtores familiares rurais na Amazônia, em sua
maioria há mais de 10 anos. Todos os entrevistados (13) são pesquisadores, sendo
que cinco deles atuam em projetos exclusivamente de pesquisa, quatro atuam em
projetos de pesquisa e desenvolvimento e outros quatro atuam tanto em pesquisa e
desenvolvimento como em cooperação técnica. A escolha dos entrevistados teve
como critério a notoriedade de suas atuações no campo da pesquisa e/ou
desenvolvimento junto a produtores rurais na Amazônia e a repetida indicação de
seus nomes por parte de membros da instituição de ensino da autora (Naea-UFPA),
consultados como fonte primeira de sugestões.
Fonte: pesquisa 2003
.
Objetivo
O objetivo principal das entrevistas foi buscar revelar que entendimento e
reconhecimento têm os peritos do conceito ou enfoque sobre redes sociais de
comunicação interpessoal e que papel, na opinião deles, tal enfoque (RSCI) pode
desempenhar em projetos de pesquisa e/ou desenvolvimento, em especial , no
cenário rural amazônico.
Roteiro
O roteiro das perguntas foi dividido em três etapas. A primeira parte das
perguntas centrou-se na compreensão dos entrevistados - a partir de suas
experiências empíricas - do significado e da relação entre fatores como
comunicação interpessoal, participação e desenvolvimento. Na segunda parte,
questões metodológicas sobre abordagem à grupos locais foram colocadas aos
GRÁFICO 2
Tempo de atuação em projetos com
produtores rurais familiares na
Amazônia
70%
15%
15%
+ de 10 anos
5 a 10 anos
3 a 5 anos
GRÁFICO 1
Campo de atuação dos peritos
entrevistados
38%
31%
31%Pesquisa
P&D
Coop.Téc.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 33
entrevistados. Essas duas etapas funcionaram como uma fase exploratória, uma
preparação para o tema central da entrevista: o entendimento sobre redes sociais de
comunicação interpessoal e a relevância ou não do conceito na opinião dos peritos.
Análise dos dados
A análise dos dados obtidos concentrou-se na primeira e na terceira etapa do
roteiro de entrevistas (comunicação & desenvolvimento rural e RSCI), especialmente
nas respostas a questões que contribuem para afirmar o problema da participaçao
como consenso teórico porém dilema prático. Concentrou;se ainda naquelas
capazes de confirmar ou refutar a hipótese de que a comunicação interpessoal e o
saber local são meio e fonte primordiais de potenciais transformações das relações
sociais.
A etapa intermediária, com perguntas voltadas ao campo metodológico,
resultarou num rico material sobre algumas das principais angústias de quem -
pesquisador, técnico ou político - trabalha com grupos locais. Indagações da
seguinte ordem: “Como vencer o desafio da abordagem? Como “chegar” à
comunidade? Quais os passos a serem seguidos? O que evitar a todo custo sob
pena de comprometer a relação com o grupo observado ou a compreensão do
mesmo? Como avaliar se a abordagem deu certo? Enfim, como saber se a
comunicação está funcionando?
Este material reflexivo sobre as formas de estabelecer interação com grupos
sociais em localidades rurais, em última instância, diz respeito a própria objetividade
do método nas ciências sociais e pelas inquietações que suscita, teórica e
praticamente, exige sem dúvida um olhar mais atento e uma análise mais profunda
que, pela envergadura possível a este estudo, não é permitido no momento.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 34
7 RESULTADOS
7.1 Quantificando resultados I: quanto à relevância da comunicação intepessoal no desenvolvimento local
No primeiro grupo de perguntas analisadas, referentes à comunicação
interpessoal existente na comunidade, uma análise das respostas faz saltar aos
olhos, de imediato, a confirmação do cenário de fundo deste estudo – o amplo
consenso teórico sobre a relevância do saber local e da participação nos processos
de desenvolvimento que não necessariamente se estende à prática . A totalidade
dos entrevistados considera relevante a comunicação interna interpessoal existente
na comunidade, porém nenhum deles afirma que, de forma geral, os projetos
desenvolvidos na Amazônia consideram tal fator.
0
50
100
%
13 peritos entrevistados
GRÁFICO 3
Relação entre as respostas sobre
comunicação interpessoal na comunidade
Acha relevante a comunicação interpessoal existente na comunidade.
De forma geral,os projetos na Amazônia consideram a comunicação interna existente na
comunidade.
A maioria dos entrevistados (62%) afirma que os projetos não consideram os
processos de comunicação interpessoal existente no interior de grupos locais e uma
outra parcela considerável (38%) acredita que o fazem apenas parcialmente, de
forma incipiente ou insuficiente.
GRÁFICO 4
De forma geral, os projetos na Amazônia levam em
conta a comunicação interpessoal existente na
comunidade?
Sim
0%
Parcial/te
38%
Não
62%
Sim
Parcial/te
Não
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 35
Ou seja, em termos gerais, o reconhecimento consensual teórico da
relevância do saber local para processos de transformação das relações sociais não
se estende efetivamente à prática dos projetos desenvolvidos junto à produtores
familiares em áreas rurais amazônicas. Mas isso apenas em termos gerais, pois no
que diz respeito à atuação específica dos peritos ou ao entendimento que têm dela,
as repostas revelam um cenário diferente.
Quando perguntados se trabalham de alguma forma com esse enfoque nos
projetos que desenvolvem em áreas rurais na Amazônia, apenas uma pequena
parcela (23%) dos entrevistados afirma que não. A pesquisa revelou que a maioria
absoluta dos peritos ouvidos neste estudo (77%), leva sim em conta a comunicação
interna existente nas comunidades, ainda que alguns considerem que o fazem de
forma parcial ou insuficiente.
TABELA 1
PERCENTUAL DAS RESPOSTAS RELACIONADAS A COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL LOCAL
Perguntas SIM Parcialmente/ Não
suficiente Não
1)Você acha relevante a comunicação interna, interpessoal, que existe na comunidade?
100%
0%
0%
2)Trabalha de alguma forma com esse enfoque em seus projetos?
61,53%
15,38%
23,07%
3)Na sua opinião, os projetos, de forma geral na Amazônia, consideram a comunicação existente na comunidade?
0%
38,46%
61,53%
Fonte: pesquisa 2004
GRÁFICO 5
Trabalha de alguma forma com esse
enfoque em seus projetos?
62%15%
23%Sim
Parcialmente/Nâo
suficiente
Não
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 36
7.2 Discussão I
Para a maior parte dos entrevistados a comunicação a que se refere este
estudo – a comunicação entre indivíduos de um mesmo grupo social de determinada
localidade rural amazônica – é não apenas “importante” mas “ fundamental” e
“extremamente necessária” aos processos de desenvolvimento. Mas é importante
porquê? Uma seleção de alguns trechos das entrevistas nos apontam algumas
respostas:
Toda inovação, todo conhecimento passa por esse processo. Você tem que
saber, como pessoa externa, que existe esse fluxo de informação, como ele
se realiza, quem são as pessoas e quais os temas que (as) interessa. (
Heribert Schmitz / NEAF – Núcleo de Estudos Integrados sobre Agricultura
Familiar)
Eu acho fundamental a gente olhar de mais perto essas relações, e,
sobretudo como a partir das relações locais podemos construir essas
outras associações que nós estamos querendo.(Roberto Araújo/MPEG –
Museu Paraense Emílio Goeldi) São elas (as pessoas da comunidade) que decidem o que é importante ou
não, se a árvore fica ou não, que realmente decidem como vai ser a
paisagem para o futuro. (Patrícia Shanley/CIFOR – Centro Internacional de
Pesquisa Florestal)
Um dos grandes desafios para o manejo florestal comunitário é exatamente
você entender as relações que existem dentro da comunidade para que
possa ser desenvolvida uma atividade produtiva,.(...) mas o que eu tenho
observado é que (a importância da comunicação interna da comunidade) se
revela através dos conflitos, (justamente quando) não houve
comunicação,(quando) a informação não foi passada de forma adequada
ou nem todo mundo conhece as informações. (Paulo Amaral/ Imazon –
Instituto do Homem e do Meio Ambiente)
No sudeste (do Pará) temos 365 projetos de assentamentos envolvendo
mais de 45 mil famílias, em uma área muito grande que corre o risco de ser
desmatada completamente ao longo do tempo. Então, aqueles
assentamentos que têm um líder com mais agressividade, que estão mais
em contato com INCRA, com os prefeitos, parece que eles têm muito mais
facilidade de drenar benefícios sociais pra sua comunidade; escolas,
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 37
contratar merendeira, professores, enfim, esse líder com um pouco mais de
visão consegue obter mais recursos pra sua comunidade. (Ou seja), o
pessoal que conversa mais entre os membros da comunidade está mais
amadurecido. (Alfredo Homma/ Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária)
Essa realidade da comunicação interpessoal, que “veicula idéias, valores e
[...] propicia a interação do próprio grupo” (Tonildes Ataíde – Cooperaçu/
Cooperativa de Produtores de Igarapé-Açú, informação verbal), é, no entanto,
subestimada pelas instituições externas. “O que se pensa não é uma ação de
parceria, um encontro de saberes, mas levar conhecimento ao encontro de
desconhecimento” (James Johnson/DFID/ Pró-UFRA –Department of International
Development/ Projeto de Fortalecimento Institucional da Universidade Federal Rural
da Amazônia, iv). O resultado desse modo tradicional de agir e pensar o
desenvolvimento leva a uma relação de “paternalismo acadêmico” (idem). Isso por
sua vez revela que a comunicação interpessoal é ainda pensada muitas vezes de
forma unidirecional, enquanto fluxo de informação de fora para dentro.
A maioria das experiências que vem sendo implementadas no município
parte do principio que a gestão, as idéias têm que emanar das instituições
externas para a localidade e isso já é um indício de que não está sendo
privilegiado o saber local, as inter-relações locais.” (Tonildes Ataíde/
Cooperaçu)
Ou seja, a preocupação maior, na maioria das vezes, é fazer com que as
mensagens emitidas pelos atores externos sejam compreendidas pelos atores
locais, numa atitute relacional tipicamente top-dow. Com isso, o componente
participação, um conceito amplamente aceito como relevante ao processo de
desenvolvimento, fica comprometido.
O que tem acontecido? O que eu tenho observado? Muitas vezes , nas
propostas, se afirma – “ vai ser um projeto participativo” e esse
“participativo” se tornou um jargão, porque todo mundo pensa que participar
é você colocar um bando de pessoas numa sala, fazer uma apresentação,
todo mundo concordar e sair de lá dizendo – “Olha, o pessoal participou”.
Isso não é participação, porque às vezes, o líder comunitário está
sacudindo a cabeça, ele está concordando mas isso não significa que ele
esteja entendendo, que ele esteja de fato concordando. (Paulo
Amaral/Imazon)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 38
Essa situação pode revelar, numa visão luhmanniana, o caráter contingente
da comunicação, na medida em que reforça a concepção de que a comunicação é
antes de tudo improvável e arriscada. Algo que tende a se potencializar diante de
relações interculturais marcadas por expressivas diferenças. Tal situação está
vinculada objetivamente a modelos de extensão rural que denotam o entendimento
do camponês não como sujeito de seu desenvolvimento mas como agente passivo e
incapaz. O técnico, em contrapartida é alçado à condição daquele que é capaz de
“assistir “(ajudar, auxiliar, proteger, socorrer) “estendendo” seus conhecimentos
técnicos a alguém sem conhecimento e sem técnica (CAYRES, 2002). Segundo
Schmitz (2001), tanto o modelo de extensão clássico quanto o difusionista-inovador,
partem do princípio de que as mudanças nas sociedades rurais se dão por
intervenções técnicas e não como resultado de alterações nas estruturas sócio-
políticas e econômicas das sociedades em questão29.
Eu posso falar um pouco mais dessa questão do chamado extensionista,
que pode ser agente de desenvolvimento externo. O que se observa nesse
caso é que falta muitas vezes o diálogo com o agricultor. Tradicionalmente
continua até hoje - a maioria dessas pessoas externas chegam mais com
uma certa missão que com interesse de dialogar e isso tem a ver com a
orientação, com o referencial, com o papel dessa pessoa externa que está
definido na organização e também se reflete na identidade do próprio
extensionista. (Heribert Schmitz/NEAF)
Essa postura de quem atua no “mundo rural” evidencia a falta ou insuficiência
de qualificação desses profissionais mas também uma visão do próprio setor
agrícola, ainda vinculada à filosofia dos pacotes tecnológicos (sistema de crédito
orientado, especificamente para o financiamento de produtos determinados), dentro
do conceito instituído nos anos 70 da modernização conservadora, caracterizada
pelo privilégio a áreas, produtos e grupos de produtores (SCHMITZ, 2001).
É possível observar porém, outras motivações para a manutenção dos
modelos tradicionais de desenvolvimento rural que não adotam como prática comum
considerar os processos de comunicação interna e o saber dos atores locais. Há,
por exemplo, o fator tempo e também indicadores de êxito. E isso “porque é muito
29
Sobre modelos de extensão rural ver Schmitz, 2001; Bordenave, 1982; Fonseca, 1985.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 39
mais fácil e mais simples, trabalhar com pessoas que já tem essa possibilidade de
comunicar, de trocar informação, de falar uma linguagem” (Pokorny, CIFOR, iv).
Projetos de forma geral trabalham com pessoas que já podem articular-se e
tem a tendência de excluir as pessoas que não tem esse jeito, que já não
estão ligadas (à determinada rede social) Eles (os responsáveis pelos
projetos) chegam à liderança e ficam na liderança e o passo possível é
apenas a plenária, ou seja, trabalham com grupos grandes, o que
necessariamente exclui as pessoas que não são bem articuladas. (idem)
E qual o resultado dessas práticas, digamos, unidirecionais e/ou excludentes?
De forma geral, de acordo com opinião de entrevistado, da qual compartilhamos,
“normalmente, a tendência é de aumentar as discrepâncias existentes” no âmbito
local. (Pokorny, iv). Isto é, este tipo de abordagem que de certa forma impõe ou se
limita ao trabalho em grupo exclui os que não fazem parte do grupo,
consequentemente a dinâmica do grupo está sempre dominada pelos mais fortes,
mais aptos ou mais adaptados ao processo de participação. “Este conceito implicita
apoiar e fortalecer as elites locais e descartar os mais desfavorecidos nas
comunidades, os quais precisariam de suporte ainda mais urgente ” (idem). Ou como
coloca Putnam, a centralização do poder e relações verticalizadas não favorecem a
formação de capital social entre os membros do grupo social. Ao contrário, a
participação nos processos de tomada de decisão em assuntos que digam respeito
à coletividade e o estabelecimento de laços de confiança tendem a favorecer a
transformação das condições e relações sociais.
Outro resultado de abordagens de cima prá baixo “é que os projetos tendem a
não ir muito longe” (Ataíde, iv.). Como coloca Bandeira num texto de discussão
sobre a participação e articulação de atores sociais e o desenvolvimento regional30,
a falta de efetivo envolvimento da comunidade nos processos de tomada de decisão
acarreta uma sequência de substituição de projetos igualmente efêmeros, “(...)num
ciclo patético que envolve grande desperdício de recursos e só contribui para
aumentar o descrédito em relação à eficácia das ações do setor público” (1999, p.).
(...)essas mesmas atitudes, comportamentos institucionais, vão solapando o
processo de descentralização, porque enfraquecem as organizações
30
No texto Participação, Articulação e Desenvolvimento Regional, texto elaborado para o projeto “Novas formas
de Atuação no DesenvolvimentoRegional” (finaciado pelo convêncio IPEA/BNDES/ANPEC), Pedro Bandeira, economista e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, discute exemplos de projetos de desenvolvimento regional no Rio Grande do Sul.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 40
comunitárias, deixam as relações bilaterais verticais em vez de fortalecer a
formação de redes locais, de inserir conhecimentos a serem discutidos
horizontalmente, o que de fato iria contribuir para o
desenvolvimento.(James Johnson, DFID, Pró-UFRA)
Mas o que vem a ser desenvolvimento local? Segundo definição de um
consultor independente com três décadas de vivência na área do desenvolvimento
humano – organizacional e comunitário o entendimento de desenvolvimento está
intimamente ligado à identidade e autonomia.
Desenvolvimento está no Aurélio, é não envolver, tirar o envolvimento. Por
exemplo, eu estou envolvido por esta roupa, desenvolver seria tirar a roupa,
então quando eu vou para uma comunidade, desenvolvimento seria fazer a
comunidade descobrir o que ela realmente é,(...) qual sua verdadeira
natureza.(Pedro Jofilsan, consultor idependente/ BNDES/PNUD- Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social/ Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento)
O desenvolvimento local, uma concepção recente de desenvolvimento,
significa uma ruptura: do modelo tradicional de planejamento normativo e setorial
para um planejamento estratégico centrado no territorial. Ou seja, um
desenvolvimento que “remete aos municípios e comunidades a busca pela
autonomia na definição das mudanças sociais necessárias para melhorar a
qualidade de vida das populações locais” (SILVA, 2003).31
Augusto de Franco (2001) parte do princípio de que todo desenvolvimento é
local, na medida em que por mais que se pense global a ação e o resultado dela
reflete-se, em última instância, no local, seja este “ um distrito, um município, uma
microrregião, uma região de um país, um país ou uma região do mundo”. Entretanto
quando se fala em desenvolvimento local, na maioria das vezes está se referindo a
processos de desenvolvimento em “espaços subnacionais”, especialmente espaços
municipais ou microrregionais.
Entre os peritos entrevistados por este estudo a palavra mais frequentemente
associada à desenvolvimento local vem a ser “empoderamento” (empowerment),
que poderia ser traduzida simplesmente como a aquisição pela comunidade da
capacidade de “ caminhar com as próprias pernas, (de) ser independente” ( Regina
Oliveira, MPEG).
31
Fábio C.da Silva, em exposição em aula FIPAM2003.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 41
Vale todavia, transcrever a definição de empoderamento do Programa Eicos –
Estudos Interdiciplinares de Comunidades e Ecologia Social, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Unesco:
O conceito (de empoderamento) vai além das noções de democracia, direitos
humanos e participação para incluir a possibilidade de compreensão a
respeito da realidade do seu meio (social, político, econômico, ecológico e
cultural), refletindo sobre os fatores que dão forma ao seu meio ambiente
bem como à tomada de iniciativas no sentido de melhorar sua própria
situação” [...] Nesse sentido, é importante perceber que o conceito de
empoderamento vai além da participação - muitas vezes medida na simples
presença em assembléias.(...)Ora, com a simples participação (que pode ser
confundida com aquiescência) essa alteração só pode ser "esperada"; já o
empoderamento pressupõe uma participação crítica e ativa que não pode, de
forma alguma, ser confundida com a simples "presença" ao longo do
processo de decisão. 32
Um processo de empoderamento eficiente deve envolver, portanto, tanto
componentes individuais como coletivo, pois “só assim é possível desenvolver as
habilidades necessárias para que se obtenham reais transformações sociais”.
Poderíamos pois supor que entre essas “habilidades necessárias” está a capacidade
de participação dos atores locais. Considerando que, por diversos fatores, de
personalidade ou de conjuntura, essa capacidade é distinta entre os integrantes de
um grupo local, a pergunta é: como garantir a inclusão dos atores menos “aptos” no
processo de desenvolvimento local? Nesse sentido, é preciso considerar como
“menos aptos” dois tipos de atores que se situam nos extremos de um gradiente de
poder de um mesmo grupo local:
Uns, que são excluídos por falta de habilidades e possibilidades, e outros,
que não são interessados em participar das iniciativas colaborativas. O
primeiro grupo, é caracterizado por um bem estar bem abaixo do nível
médio da comunidade. São eles, que por desejo individual, localização
remota ou por suas características individuais como religião, sexo,
preferências, são tendenciosamente evitados pelos outros. O segundo
grupo, dos desinteressados, estão no outro extremo social da comunidade.
São eles que, pelo seu poder e posição hierárquica, beneficiam-se da
situação como está e, por isso, não necessariamente, tem interêsse em
32
http://www.eicos.psycho.ufrj.br/portugues/empoderamento/empoderamento.htm
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 42
mudanças. No extremo, estas pessoas são absolutamente isoladas da
comunidade, como no caso de grandes madeireiros e fazendeiros da região
(Pokorny e Steinbrenner, artigo em preparação).33
A idéia é que, para evitar a agudização das discrepâncias no cenário local, é
preciso aproximar os níveis de capacidade/habilidade de participação entre os
diversos atores locais. E para mobilizar estes grupos extremos são necessários
esforços específicos de mobilização, apoiados numa proposta de ação direcionada
cuja dinâmica aconteceria por etapas, a exemplo da concepção pedagógica das
“classes de aceleração” e “progressão”, baseada na pedagogia da autonomia de
Paulo Freire34. Segundo este conceito, numa primeira etapa os atores que
promovem a intervenção social, como ONGs por exemplo, devem trabalhar
isoladamente com os diferentes grupos em contextos diferenciados O grupo dos
excluídos deve ser preparado para as negociações e a comunicação com os grupos
mais poderosos. Nesse caso, muitas vezes está se trabalhando a auto-estima35 dos
indivíduos do grupo, despertando sua capacidade de mobilização. Esta estratégia é
bem conhecida nas iniciativas de fortalecimento da posição de mulheres na
comunidade. Já o grupo dos desinteressados precisaria ser atraído por potenciais
vantagens de uma colaboração.
Deve ficar claro também que esse movimento para atenuar os desníveis na
capacidade/habilidade de participação dos diferentes atores sociais não é garantia
de redução de conflitos, às vezes pelo contrário, a inclusão dos excluídos pode
acirrar confrontos ausentes anteriormente no período de alienação. Por último, é
necessário levar em conta que essa preparação de determinados atores, planejada
por etapas, ao buscar um certo nivelamento dos diferentes ritmos de participação
poderia provocar um eventual risco de padronização das diversidade locais e
33
Pokorny esclarece que “ dependendo do assunto e das características metodológicas da iniciativa, os grupos dos excluidos e desinteressados poderia variar significativamente”. ( In Pokorny e Steinbrenner, 2004 – artigo em preparação) 34
A idéia destas classes de aceleração é permitir que todos os alunos atores avancem, supondo, também, que eles podem apresentar desempenhos diversos de acordo com os conhecimentos que detêm, as habilidades desenvolvidas e o grau de autonomia conquistado. O professor desempenha o papel do mediador. Esta mediação é entendida enquanto um processo de intervenção de um elemento intermediário em uma relação, criando situações para que os alunos construam seus próprios pensamentos e conhecimentos (Schindwein; Petri, 2001) 35
“Auto-estima é a vivência de termos apropriados à vida e às exigências que ela coloca. Mais especificamente, auto-estima é a confiança em nossa capacidade de pensar e enfrentar os desafios básicos da vida. A confiança em nosso direito de ser feliz, a sensação que temos de valor, de que somos merecedores, de que temos o direito de expressar nossas necessidades e desejos e de desfrutar os resultados de nossos esforços” (BRANDER, 1994, P.28)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 43
consequente homogeneização cultural, este, talvez, o custo natural do processo de
desenvolvimento local.
Ações específicas diferenciadas, de acordo com a diversidade dos atores,
exige abordagens também diferenciadas. Nesse sentido, é fundamental um
diagnóstico prévio do nível e qualidade da comunicação existente entre os atores.
Assim, o reconhecimento das redes sociais de comunicação interpessoal existentes
entre os integrantes do grupo social, vem a ser, no nosso entender, instrumento
relevante para avaliar os diferentes graus de inserção dos atores sociais e auxiliar
na decisão sobre o tipo de procedimento e abordagem mais adequados a cada
caso. Além disso, e talvez o mais importante, é que, ao reconhecer os fluxos de
informação endógenos existentes e levar em conta o saber local, respeita-se o ator
local não só como receptor passivo mas como fonte de informação, um passo
essencial no processo de empoderamente da comunidade e de conquista da
cidadania.
7.3 Quantificando resultados II: quanto ao reconhecimento do enfoque de redes sociais de comunicação interpessoal
No segundo grupo de respostas analisadas, que dizem respeito ao
entendimento e reconhecimento que têm os peritos do conceito ou enfoque sobre
redes sociais de comunicação (RSC) e sua possível utilização em projetos de
pesquisa e/ou desenvolvimento, os dados obtidos revelam que o enfoque de redes
sociais de comunicação interpessoal é considerado importante mas ainda não é
adotado por peritos ou projetos de pesquisa e /ou desenvolvimento na Amazônia. A
maioria dos entrevistados considera importante estudar, reconhecer e mapear RSCI
(53,84%), e outra parcela considerável (30,76%) considera isso parcialmente
importante. Também a maior parte dos peritos afirma ter interêsse sobre o assunto
redes sociais de comunicação interpessoal (46,15%) , ainda que uma parte
considerável admita um interesse parcial (38,46%) ou nenhum interesse (15,38%).
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 44
0
50
100
%
13 peritos entrevistados
GRÁFICO 6
Relação entre as respostas relacionadas
a Redes Sociais de Comunicaçao
É importante estudar, reconhecer e mapear as RSC.
Tem interesse sobre o assunto Redes Sociais de Comunicação.
Trabalha de alguma forma com o enfoque de RSC .
RSC são de alguma forma consideradas por organizsmos de pequisa e/ou planejamento.
Fonte: pesquisa 2004
Apenas um dos peritos entrevistados (7,69%) afirma utilizar o enfoque de
redes sociais de comunicação interpessoal, tendo em vista a análise das redes de
atores sociais e o fluxo de informação existente entre eles. Outros três entrevistados
(23,07%) afirmam utilizar parcialmente a abordagem de redes sociais de
comunicação, porém com outro enfoque, seja pelo viés antropológico da rede de
relações sociais, seja pela via do reconhecimento das redes de interação e
articulação locais para fins de mobilização e empoderamento ou enquanto diálogo
de saberes, que vem a ser justamente a busca do entendimento de como
profissionais do desenvolvimento conseguem interagir com as populações com as
quais estão trabalhando.
A maior parte dos entrevistados (69,22%) afirma não utilizar o enfoque de
RSC em suas pesquisas e projetos, sendo que dentre estes, mais da metade
(38,46%) considera que na verdade não o fazem porque não haviam de fato refletido
sobre o assunto, o qual consideram importante, e admitem, ainda pretendem de
alguma forma fazê-lo.
Apesar de não ser possível mensurar, ficou claro durante as entrevistas que
há uma certa dificuldade imediata de compreender a dimensão do conceito proposto
pela entrevistadora, ou o que afinal vêm a ser redes sociais de comunicação
interpessoal. Um motivo disso seria uma certa predisposição a uma associação
direta entre comunicação e “meios” de comunicação à distância (como rádio, tv,
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 45
publicações, etc). Um segundo motivo seria mesmo o caráter de novidade do
assunto, até o momento pouco refletido pela maioria dos entrevistados.
TABELA 2
PERCENTUAL DAS RESPOSTAS RELACIONADAS A REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇÃO
Perguntas SIM Parcialmente Não Sem resposta 4)Na sua opinião, é importante estudar, reconhecer e mapear as redes sociais de comunicação?
53,84%
30,76%
0%
15,38%
5)Tem interêsse sobre o assunto “Redes Sociais de Comunicação”? (discute, lê, estuda ?)
46,15%
38,46%
15,38%
0%
6)Trabalha de alguma forma com RSC em suas pesquisas?
7,69%
23,07%
69,22%
0%
7)Na sua opiniao, as redes sociais de comunicaço são,de alguma forma consideradas por organismos de pesquisa ou planejamento?
0%
7,69%
30,76%
61,53%
Fonte: elaboração do autor Total de entrevistados: 13 peritos
Nem todos os entrevistados foram questionados se entendem que as redes sociais
de comunicação interpessoal são de alguma forma consideradas por organismos de
pesquisa ou planejamento que atuam na Amazônia, e portanto, esta questão não
pôde ser igualmente quantificada. No entanto, pode-se considerar como indicador da
ausência de tal enfoque entre os projetos desenvolvidos na região o fato de que
entre os que foram indagados (46%) nenhum respondeu afirmativamente.
7.4 Discussão II
Neste grupo de perguntas as respostas são mais vagas e portanto expressam
que o enfoque de redes sociais, tendo em vista os processos de comunicação local,
é um assunto irrefletido por parte dos peritos entrevistados, ou percebido de forma
intuitiva.
“Na verdade a gente faz (uso do enfoque de RSCI) e não sabia, porque a
gente faz o mapeamento, a matriz. O próprio questionário é o conhecimento
local. Talvez a relação de troca de informações é que a gente não observou
melhor como isso acontece. Ou seja, você está no meio da rede, está
usando, mas não está refletindo como funciona essa rede”. (Regina
Oliveira/MPEG)
As conversas com os peritos evidenciam também que o foco em relações e
interações sociais, não é algo novo, pelo contrário, já muito bebeu na fonte da
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 46
Antropologia - nas trocas simbólicas de Malinowski, nas dádivas de Mauss - na
sociologia dos bens simbólicos de Bourdieu ou na pedagogia de Paulo Freire.
O que existe são interações sociais das mais diversas, principalmente em
torno de atividades do cotidiano - troca de trabalho, mutirões, ajudas,
relações de vizinhança e as questões técnicas, se é que a gente pode
separá-las nesse contexto, elas de uma certa maneira estão embebidas
nessas redes. O que fizemos foi tentar entender o conjunto dessas redes
de interação social.[...] usando bastante a idéia de economia simbólica de
Bourdier, quer dizer uma troca de trabalho, uma troca de bens, nunca é
só isso, sempre tem um lado simbólico que vai junto, uma certa
construção de relações, capital simbólico, etc. A idéia é essa, quer dizer
uma relação qualquer, ela nunca é simplesmente utilitária, você vai ter
sempre um lado social de capital social, de capital simbólico nessas
relações.” (Iran Veiga/, coordenador do Centro Agropecuário -
CA/NEAF/UFPA)
Na pesquisa sempre vou tentar identificar que articulações, que grupos
sociais estão envolvidos, a forma que eles se relacionam, quais são os
atores, os sujeitos; isso aí é uma premissa até da educação popular (...)
mas não com esse enfoque de rede de diálogo (Letícia Tura/FASE -
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional)
O diferencial quando se trata da observação de redes sociais de comunicação
interpessoal, vem a ser o foco específico na comunicação existente entre os atores
sociais.
Algumas respostas evidenciam também resistência ou restrições do ponto de
vista metodológico ao enfoque de redes sociais que têm como foco a comunicação
interpessoal. Os principais qüestionamentos dizem respeito a viabilidade operacional
como ferramenta metodológica, especialmente no que diz respeito, segundo alguns
peritos, ao tempo exigido para um adequado reconhecimento das redes de relações
locais. Além disso, na medida em que as relações sociais são muito dinâmicas, o
“mapa” das redes de comunicação para usos específicos e pontuais (como por
exemplo, o direcionamento de determinadas mensagens no interior da rede –
campanhas de utilidade pública, de mobilização, etc). com a mesma brevidade,
poderia perder a “validade” e ficar com as informações do contexto comprometidas.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 47
Com certeza é interessante (reconhecer e mapear as RSCI) mas não é
funcional, operacional [...] A questão da densidade, da geometria, da
configuração das redes, não é sem importância, mas muito mais importante
do que isso é a qualidade do que está por trás disso, quer dizer o que está
fundando o laço social local que é a base dessas redes (Iran
Veiga/CA/NEAF)
Mais importante que mapear é entender como funciona, como revoluciona
com o tempo, quais são os fatores que provocam essas mudanças. Mapear
é importante, mas mapear as relações mesmo não é relevante. (James
Johnson /DFID/ coord. Pró-UFRA)
É importante estudar, é relevante estudar esse tipo de rede (social de
comunicação interpessoal) mas nem tanto de uma maneira descritiva, mas
sim de uma maneira dinâmica, quer dizer, para entender como elas são
criadas e qual é a influência, o efeito dessas redes. (Benno
Pokorny/CIFOR)
Perguntamos ainda, qual poderia ser a utilidade do uso do enfoque de redes
sociais de comunicação interpessoal para projetos de desenvolvimento na
Amazônia? A maior parte das respostas apontou um considerável otimismo em
relação a essa opção, algumas mais centradas nos interesses do ator externo,
outras, mais voltadas à comunidade.
Se você identifica pessoas, instrumentos ou ferramentas dessas redes,
você pode trabalhar melhor a própria divulgação do trabalho, da ação
[...]Quando você trabalha com transferência de tecnologia também é
fundamental entender como elas se dão e como essas redes funcionam,
como elas já estão consolidadas, criadas, constituídas (Westfallen Nunes
/CIFOR; consultor MMA- Ministério do Meio Ambiente).
Isso interessa no momento em que você quer realmente junto com uma
população rural divulgar alguma tecnologia. Nesse momento é interessante
e você deve conhecer um pouco essa rede real.(Heribert Schmitz/NEAF)
A partir da forma como se configuram as relações sociais e do que a gente
pode aprender dessas estruturas, poderemos influenciar na configuração de
novas relações no desenvolvimento.(Roberto Araújo/MPEG)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 48
Provavelmente é uma das maiores possibilidades de influenciar a dinâmicas
do desenvolvimento em regiões rurais remotas. (Benno Pokorny/CIFOR)
Por fim, gostaríamos de destacar um trecho de uma entrevista que revela um
entendimento, compartilhado por nós, de como deve ser pensado o assunto redes
sociais de comunicação interpessoal:
A questão das redes é uma tentativa de associar uma visão mais macro em
termos de estruturas da sociedade, herdadas da história social, das zonas
de origem desses imigrantes (na Amazônia), e associar isso numa
perspectiva mais micro, de mudança a nível local, de mudança de saberes,
mas também de mudanças de relações sociais. E então fazer a síntese
desses dois elementos, macro e micro, e tentar entender um pouco como é
que está se transformando localmente essa capacidade local de agir sobre
seu contexto. (Iran Veiga, CA/ NEAF/UFPA)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 49
8 Conclusões
Muito se fala em “rede” hoje em dia, principalmente quando se trata do estudo das
complexidades do mundo moderno, urbano, tecnológico, globalizado. Toda essa
ampla utilização do termo e enfoque de redes parece até beirar um certo modismo
teórico. Mas quando o assunto é o estudo de grupos sociais, especialmente no
contexto de comunidades rurais localizadas em áreas mais remotas do planeta,
como no interior da Amazônia Legal, isso não se reflete. Essa é uma discussão que,
neste contexto, está só começando.
Processos de comunicação movimentando informações entre pessoas de um
mesmo grupo em determinado território não são novidade. Estão por toda parte e
em todos os tempos. Isto é, as redes sociais de comunicação interpessoal, mais do
que um conceito, são uma realidade da própria natureza das relações humanas e
sociais.
A comunicação interna, interpessoal, existente entre os integrantes de um grupo em
dado território é considerada relevante e extremamente necessária aos processos
de desenvolvimento local. Ainda assim, projetos em áreas rurais amazônicas, de
forma geral, não levam em conta o saber local e os processos de comunicação
endógenos. Entretanto, profissionais que atuam com projetos de pesquisa e
desenvolvimento na Amazônia, em grande parte, já percebem e trabalham com
essas informações, mesmo que de forma insuficiente e intuitivamente.
Apesar de consideradas relevantes, as redes sociais de comunicação interpessoal
são um enfoque ainda não dominado e pouco utilizado por peritos e desconsiderado
por projetos que atuam com produtores rurais familiares na Amazônia.
De forma geral, é possível perceber uma visão otimista em relação ao estudo de
redes focado nos processos de comunicação. A maioria dos entrevistados considera
importante estudar, reconhecer e mapear as redes sociais de comunicação
interpessoal. Alguns entrevistados, porém, questionam essa relevância,
especialmente por apresentarem reservas quanto a viabilidade operacional do
método. E isso, basicamente por dois motivos:
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 50
1) Redes sociais são dinâmicas por natureza e o reconhecimento e
mapeamento de uma dada rede só conseguiria ser provisório, ou seja, exigiria
uma atualização permanente, o que poderia, como instrumento metodológico,
inviabilizar ações específicas e pontuais (como por exemplo, difusão de
informação – campanhas de saúde, alertas ambientais, etc);
2) Mais importante do que mapear redes sociais de comunicação é entender
como funcionam essas redes; ou seja o entendimento das redes pode
contribuir para a compreensão das relações sociais locais.
Nesse sentido, a idéia do estudo de RSCI como metodologia para o diagnóstico dos
níveis de participação local, se embasa no entendimento de Pokorny e Steinbrenner
(2004), de que dentro dos moldes convencionais dos projetos e ações voltados ao
desenvolvimento local, participa quem já está apto, capaz ou qualificado ao
processo de comunicação. Fica de fora justamente quem mais deveria ser atraído
para o contexto dialógico local, ou seja, os extremos do cenário social – por um lado
os atores afastados por fatores de escassez como exclusão social (pobreza,
isolamento) e por outro lado os atores distanciados pelo inverso - concentração de
poder econômico (ex: madeireiro, grande proprietário rural) É possível imaginar
portanto, uma espécie de “régua social”, onde o centro seria ocupado pelos elos
fortes da rede social de comunicação, formado pelo grupo mais homogêneo, com
níveis mais acentuados de participação. Nas duas extremidades, posicionariam-se
os elos mais fracos da RSCI, constituídos por atores mais distanciados do processo
de comunicação.
O reconhecimento das RSC poderia auxiliar na implementação de políticas públicas,
na medida em que ajudaria a identificar quem está isolado na rede social de
comunicação interpessoal local. Estes atores mais isolados, especialmente os mais
desfavorecidos, poderiam ser alvo de práticas participativas desenvolvidas por
etapas – a exemplo da idéia das classes de aceleração pedagógica (Paulo Freire).
Poderia ser desenvolvida uma preparação específica, planejada por etapas, tendo
em vista a geração de capacidades/habilidades no sentido de diminuir as distâncias
entre os níveis de participação dos diferentes integrantes dos grupos locais e assim
facilitar os mecanismos de negociação e colaboração entre os atores locais e atores
externos. Dessa forma, estaria sendo fortalecida a autoconfiança desses atores
menos ativos ao mesmo tempo que, pela prática da participação, poderiam estar
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 51
sendo gestados mecanismos que favorecem a formação de capital social, como
processos de negociação permanente.
Tal abordagem contrastaria com certa tendência atual ao “participacionismo”,
refletido na prática usual e generalizante das plenárias e reuniões em grandes
grupos como ferramentas padrão de mobilização social. Porém não se pode deixar
de considerar um certo risco de, ao buscar a inclusão de atores isolados, através de
uma dada padronização do ritmo de participação, estar obtendo, subjacente, o
mesmo resultado combatido, ou seja, o empalidecimento das diversidades culturais
existentes no contexto local. O que, em última instância, como reflexão derradeira,
poderia ser encarado como uma espécie de custo cultural do desenvolvimento local
participativo.
Por fim, conclui-se que buscar entender a realidade local, a partir do olhar focado
nos fluxos de comunicação existentes entre pessoas em dado lugar é antes de tudo
lançar mão de fatores objetivos e subjetivos, reveladores tanto da estrutura quando
da diversidade dos indivíduos. Em última instância, o enfoque de redes sociais de
comunicação interpessoal pode ser entendido como mais uma tentativa de buscar a
compreensão da realidade que nos cerca, apostando num arranjo entre o macro e o
micro, entre a estrutura e a ação social, entre o coletivo e o individual, a exemplo do
que postulam autores como Bourdieu e Giddens. Uma espécie de busca socrática
pelo “caminho do meio” para a compreensão do mundo em que vivemos.. Este,
talvez, o caminho mais adequado para entender e explicar a realidade social em sua
complexidade crescente.
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 52
Bibliografia
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Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 56
Anexos
ANEXO I
RELAÇÂO de ENTREVISTADOS Lista de peritos entrevistados, selecionados em função de atividades
desenvolvidas junto à pequenos produtores rurais da região amazônica.
Entrevistado Formação Tipo de projeto
Principais temas
Área /tempo de atuação
Local de trabalho
1.Alfredo Homma
Eng. agrônomo Mestrado e Doutorado em Economia Agrícola (Viçosa)
Pesquisa Extrativismo vegetal Economia de recursos naturais e Desenvolvimento agrícola
Sudeste paraense (desde 1976)
EMBRAPA Amazônia Oriental
2.Benno Porkorny
Eng. Florestal Doutorado Univ. Freiburg (Alemanha)
Pesquisa Viabilidade do manejo florestal sustentável. Desenvolvimento autônomo- (com
base em recursos florestais).
Muaná (Ilha do Marajó), Gurupá, Tailândia, Itaituba (desde 1998)
CIFOR –
3.Heribert Schmidt
Engenheiro Mecânico Doutorado em Ciências Agrárias Extensão Rural e Teoria da Comunicação (Berlim)
Pesquisa Cooperação Técnica Desenvolvimento
Participação e parceria na pesquisa e extensão (Intensificação da agricultura através da mecanização e da gestão de fertilidade)
Estado do Pará ( em especial, Transamazônica) (desde 1993)
UFPA/ CA/ NEAF
4. Iran Veiga Eng. agrônomo Mestrado e Doutorado em Sociologia Rural Espaço Tempo e Sociedade (Univ. de Toulouse)
Pesquisa Desenvolvimento
Diálogo de saberes
(Como profissionais do desenvolvimento conseguem interagir com as populações com as quais estão trabalhando,?)
Sudeste do Pará (Marabá), Altamira, Transamazônica e Nordeste do Pará (desde 1990)
UFPA / CA/ NEAF
5.James Johnson
Ciências Agrícolas e Florestais (Oxford) Mestrado em Economia Agrícola e Desenbvolvimento Rural (Univ. de Londres)
Pesquisa Desenvolvimento
Desenvolvimento Local e Políticas Públicas Fortalecimento municipal Descentralização Administrativa
Brasil- Maranhão e Pará (desde 2001)- Tanzânia (1985) Bolívia (1986-2001)
Pró-UFRA ( DFID)
6.Letícia Tura
Socióloga Mestrado UFRJ
Pesquisa Políticas de desenvolvimento rural e gênero
Sudeste do pará, Baixo Tocantins e Nordeste paraense (desde 1996)
FASE
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 57
Entrevistado Formação Tipo de
projeto Principais temas
Área /tempo de atuação
Local de trabalho
7.Patricia Shanley
Ecóloga Mestrado Escola de Floresta (YALE) Doutorado Educação Ambiental ( KANT – Inglaterra)
Pesquisa Coop. Técnica Desenvolvimento
Produtos não madeireiros Comunicação científica para amplo público
Amazônia brasileira (desde 1991); América Latina, África e Ásia (desde 2000)
CIFOR .
8.Paulo Amaral
Eng. Agrônomo Especialista em desenvolvimento rural (NAEA)~ Mestrado em manejo e conservação de florestas e meio ambiente (CAT –Costa Rica)
Pesquisa Desenvolvimento
Pesquisa florestal Manejo e conservação de floresta,
(escalaempresarial/ escala comunitária)
Amazônia, principalmente nos estados do Acre, Rondônia e Pará
- Manejo florestal (desde 1992) -
Manejo comunitário (desde 1997)
IMAZON –
9.Pedro Jofilsan
Psicólogo, com formação em pscologia organizacional teologia,filosofia e Administração,
Pesquisa Coop. técnica Desenvolvimento
Desenvolvimento local Comportamento Humano (há 30 anos)
Brasil (5 regiões) (desde 1993) Amazonia (desde 2000)
BNDES/ PNUD Instituto de Assessoria do Desenvolv. Humano
10.Regina Oliveira
Bióloga . Mestrado em Ecologia (INPA)
Pesquisa Coop. Técnica Desenvolvimento
Etnoecologia e Etnobiologia Ecologia Humana Desenvolvimento Sustentável Comunitário
Pará (Monte Alegre, Curuaúna, Santarém) (desde 2001)
MPEG –
11.Roberto Araújo
Antropólogo Doutorado na Universidade de Paris & Nanterre
Pesquisa Desenvolvimento Sustentável Sociedades Rurais e periurbanas da Amazônia .Comercialização de cocaína no NE Amazônico.
Sul do Pará Transamazônica Acre (desde 1986)
MPEG –
12.Tonildes Ataíde
Sociólogo Mestrando em Agricultura Familiar Sustentável NEAF/CAP/UFPA
Pesquisa Desenvolvimento
Avaliação de procedimentos metodológicos participativos Desenvolvimento comunitário
Igarapé-Açu (PA) (desde 1999)
Cooperaçu
13.Westafallen Nunes
Eng. Agrônomo Mestrado em Ciências Florestais (UFPA)
Pesquisa Desenvolvimento local sustentável Transferência de tecnologia
Diversos municípios do Pará: Muaná (Marajó), Ponta de Pedras, Abaetetuba, Paragominas, Tailândia, Jacundá (desde 1991)
CIFOR MMA
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 58
ANEXO II
ROTEIRO DA ENTREVISTA:
1. APRESENTAÇÃO:
. Essa entrevista é parte integrante de um projeto de pesquisa, dentro
do curso de especialização em Gestão Ambiental e Políticas Públicas-
FIPAM 2003- NAEA- UFPA, que objetiva estudar a relação entre
comunicação e desenvolvimento sustentável de pequenos
produtores rurais na Amazônia.
O ENTREVISTADO:
a). Nome:_____________________________________________________ b).Formação Acadêmica: _________________________________________ ______________________________________________________________ c). Local de Trabalho:_____________________________________________ d). Principais temas de pesquisa desenvolvidos: ________________________ _______________________________________________________________ ________________________________________________________________ e). Trabalha com comunidades de pequenos produtores rurais?
SIM N’ÃO Em caso de resposta afirmativa:
e.1). Em que tipo de de projeto?
pesquisa
cooperação técnica,
desenvolvimento
Outros ___________________
e. 2) Em contato direto ou só teoricamente ?
e.3) Onde ( local)? ______________________________________________ ______________________________________________________________ e.4) Desde quando?______________________________________________
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 59
2. QUESTIONÁRIO: 2.1 PRIMEIRA ETAPA: COMUNICAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
PERGUNTA INFORMAÇÃO OBTIDA
1.Acha relevante a comunicação interpessoal existente dentro das comunidades? Porquê?
2.Em que aspectos, de que forma você identifica essa importância (ou desimportância)?
3.Trabalha de alguma forma essa questão em seus projetos? De que forma?
4.Como você observa essa comunicação?
5.Que tipo de fatores você considera que favorecem a comunicação interna na comunidade?
6.Qual, na sua opinião, é a relação entre comunicação interna existente na comunidade e desenvolvimento local?
7. Que tipo de comunicação favorece o desenvolvimento da comunidade?
8.O que você entende por desenvolvimento local?
9. Na sua opinião, os projetos de forma geral, consideram a comunicação existente na comunidade? Porquê? Resultado disso? Em caso afirmativo, de que forma? ( Se exclui da análise?)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 60
2.2 SEGUNDA ETAPA: METODOLOGIA PERGUNTA INFORMAÇÃO OBTIDA
1.No que diz respeito à comunicação entre diferentes atores, quais são, na sua opinião, os principais desafios da abordagem à comunidade?
2.Como enfrenta isso?
3.Como você faz a abordagem à comunidade? Quais, na sua opinião, os principais passos a serem seguidos na comunicação com a comunidade?
4.O que tenta evitar a todo custo, sob pena de comprometer a relação com a comunidade ou a melhor compreensão desta?
5.Como avalia o que deu certo e o que deu errado?
6.O que é liderança para você?
7.Como você identifica e como avalia as lideranças locais ?
8.Como você escolhe seus interlocutores?
9.Sobre o quê as pessoas falam no dia à dia?
10. Como elas escolhem seus interlocutores?
11.Como analisa o modelo de funcionamento desse processo interno de comunicação? ( que teoria tem na cabeça?)
Rosane Steinbrenner FIPAM 2004 - No Balanço das Redes 61
3.3. TERCEIRA ETAPA: REDES SOCIAIS DE COMUNICAÇÃO INTERPESSOAL PERGUNTA INFORMAÇÃO OBTIDA
1.. Que entendimento tem a respeito de “rede social de comunicação interpessoal”, também designada na literatura rede local de comunicação interpessoal ou rede de diüalogo ? Ou seja, rede de pessoas que se comunicam entre si em dada localidade?
2.Tem interesse sobre o assunto ( discute, lê, etc)? Com que frequência?
.
3.Trabalha de alguma forma com esse enfoque em suas pesquisas? De que forma?
4.Como avalia a importância das redes sociais de comunicação interpessoal no contexto local onde estão inseridas?
5. Como você mapeia o fluxo de informação existente em uma rede?
6.O que são bons indicadores para definir a qualidade de uma rede social de comunicação interpessoal?
7. Na sua opinião, é importante estudar, reconhecer e mapear as redes sociais de comunicação existentes entre os atores locais? Porquê?
8. Na sua opinião, as redes sociais de comunicação interpessoal são de alguma forma consideradas por organismos de pesquisa ou planejamento? Porquê? E o resultado disso?
9. Indicar três peritos para serem entrevistados
1. 2. 3.
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