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Fonte: Council on Foreign Relations Fonte: The Atlantic ANÁLISE DE RISCO: A (In)Segurança Alimentar na República Popular da China Sofia Dias Ramos, Nº 212430 Unidade Curricular: Técnicas de Tomada de Decisão Docente: Professor Auxiliar Carlos Gonçalves Lisboa 12 de Julho de 2015

Análise de Risco: A Insegurança Alimentar na República Popular da China

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Fonte: Council on Foreign Relations Fonte: The Atlantic

ANÁLISE DE RISCO:

A (In)Segurança Alimentar na República Popular da China

Sofia Dias Ramos, Nº 212430

Unidade Curricular: Técnicas de Tomada de Decisão

Docente: Professor Auxiliar Carlos Gonçalves

Lisboa

12 de Julho de 2015

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Índice

1. O Desafio da (In)Segurança Alimentar – O Caso Chinês p. 3

2. Metodologia p. 5

3. O Sistema Alimentar Chinês: Caracterização p. 10

4. Análise das Vacuidades e das Aberturas p. 13

5. Análise das Dinâmicas de Risco p. 19

6. Conclusões p. 22

7. Referências Bibliográficas p. 25

8. Anexos p. 27

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1. O Desafio da (In)Segurança Alimentar – O Caso Chinês

A alimentação é uma necessidade básica do ser humano. Como tal, a segurança

na garantia da satisfação dessa necessidade é fundamental para a sobrevivência e

estabilidade do Homem. Desde sempre que esta é uma das questões que faz o mundo e a

condição humana evoluírem e transformarem-se. Se em épocas mais antigas os nómadas

e os recolectores viajavam em busca de alimento, a sociedade actual fundada na

sedentarização faz com que na mesma busca se desenvolvam e se aperfeiçoem os

mecanismos de produção e distribuição desse alimento.

Em alguns pontos do globo, sensivelmente entre o final dos anos 1990 do século

XX e o início do século XXI, uma série de fenómenos, tendências e factores têm vindo

a degradar e a colocar em risco a existência de condições adequadas de produção e

qualidade alimentar e de acesso a alimentos.

O desenvolvimento tecnológico e a intensificação da industrialização provocam

alterações climáticas e poluição a vários níveis – ar, solos e água – e um aumento rápido

da riqueza, o que traz melhorias nos padrões de vida das populações e leva a um

aumento da população a nível mundial. Ora, o aumento da população global que tem

vindo a ocorrer nas últimas décadas e a sua distribuição desigual exerce, depois, pressão

na procura e utilização dos mais importantes recursos naturais para a garantia de uma

adequada produção alimentar: a terra arável e a água. Então, “uma população mais rica,

em média, irá necessitar de mais e melhores alimentos” (Moyo, 2013, p. 28) e isso

requererá consequentemente mais recursos.

O aumento de rendimentos e a melhoria dos padrões de consumo levam também

à intensificação do fenómeno da urbanização, cuja prosperidade “atrai vagas sucessivas

de migrantes vindos de áreas rurais” (Moyo, 2013, pp. 33-34). Deste cenário surge

ainda o fim da auto-suficiência do mercado interno de produtos alimentares de um

Estado e como tal o desequilíbrio na oferta e na procura internas. Por sua vez, isso gera

o aumento das importações no mercado global de produtos alimentares e um igual

desequilíbrio na oferta e na procura externas.

O ciclo acima descrito faz da segurança alimentar um desafio global no século

XXI. No âmbito deste fenómeno pluridimensional, a República Popular da China (RPC)

apresenta, se não todas, muitas das características sintomáticas referidas e que desse

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modo permitem considerar a potencial ocorrência de um cenário de insegurança

alimentar a nível nacional e, posteriormente, do colapso do sistema alimentar do país.

A China tem actualmente a maior população do mundo. Devido à

industrialização que tem vindo a ser operada desde o final dos anos 1970 do século

passado a pressão na terra arável e nos recursos hídricos do território nacional bem

como as alterações climáticas e a poluição resultantes começaram a verificar-se. O

fenómeno da urbanização trouxe o aumento do nível de vida e a emergência de uma

classe média significativa em ascensão e subsequentemente fez da China, depois do fim

da auto-suficiência do mercado interno, um dos maiores países importadores no

mercado global de recursos e produtos alimentares.

O Plano de Acção saído da World Food Summit, que ocorreu em 1996 no

quadro das Nações Unidas (NU), especificamente no âmbito do organismo das NU para

a Alimentação e Agricultura (FAO), define a segurança alimentar como “when all

people, at all times, have physical and economic access to sufficient, safe and nutritious

food to meet their dietary needs and food preferences for an active and healthy life” e

apela aos Estados que adoptem estratégias nacionais de combate à degradação

progressiva das condições de um adequado usufruto da segurança alimentar.

Este conceito tem quatro dimensões (FAO 2006; 2008): a disponibilidade

determinada pelo nível de produção alimentar, de stocks e fluxo de comércio; o acesso

dos indivíduos aos direitos e recursos adequados à aquisição de alimentos para uma

dieta adequada; a utilização dos alimentos através de uma dieta adequada, de água

potável, de saneamento e de cuidados de saúde para alcançar um estado de bem-estar

nutricional; e a estabilidade temporal das dimensões anteriores, não arriscando a

deterioração do status nutricional das populações devido a choques repentinos e

condições adversas (crises climáticas, crises económicas, instabilidade política) ou

eventos cíclicos como a insegurança alimentar sazonal.

Por sua vez, a insegurança alimentar corresponde então ao inadequado e

insuficiente acesso físico e económico a uma alimentação segura e nutritiva para uma

vida activa e saudável e pode ser crónica, quando o fenómeno é persistente e de longo-

prazo, ou transitória, quando o fenómeno é temporário e de curto-prazo (FAO, 2008).

Entre estes dois níveis insere-se a insegurança alimentar sazonal, na medida em que “it

is similar to chronic food insecurity as it is usually predictable and follows a sequence

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of known events” (FAO, 2008, p. 1) mas como “is of limited duration it can also be seen

as recurrent, transitory food insecurity” (FAO, 2008, p. 1).

Esta é uma das questões mais críticas para a estabilidade mundial, como para a

estabilidade do mercado global, do mercado interno chinês e para a própria estabilidade

política e social da RPC, que tem que garantir a produção, o acesso e a obtenção de

alimentação suficiente, regular e adequada para aquela que é a maior população do

mundo. Actualmente está no topo da agenda global e é, pois, um dos grandes reptos no

contexto da realidade nacional chinesa no século XXI.

Ora, no ambiente decisional de interacção estratégica relativamente a esta

problemática, é fundamental apreender e interpretar os elementos que a compõem e que

podem contribuir para o risco de ocorrência de uma aceleração elevada da insegurança

alimentar na China, designadamente um cenário de insegurança alimentar a todos os

níveis – produção, qualidade, quantidade, distribuição, acesso.

Neste sentido, após o enquadramento da temática, o objectivo do presente

trabalho é analisar o problema da (in)segurança alimentar enquanto desafio ao qual a

RPC tem imperativamente que fazer face na actualidade e, para tal, realizar uma análise

de risco aplicada à tomada de decisão relativamente a este problema.

Os objectivos específicos são, por sua vez, caracterizar a análise de risco

enquanto método de apoio à tomada de decisão e, nesse contexto, analisar e caracterizar

o sistema alimentar da China, identificar as vacuidades estruturais e as aberturas que o

mesmo possui, investigar em torno do modo como essas podem ser atingidas e conduzir

à aceleração elevada da insegurança alimentar na China e depois construir uma teia

mórfica orientada em torno do cenário analisado. Para tal, importa então aplicar a

análise de risco enquanto ferramenta de apoio à tomada de decisão no cenário específico

referido segundo uma abordagem ao risco e uma avaliação do mesmo.

2. Metodologia

Dada a possibilidade de ocorrência de um cenário de aceleração elevada da

insegurança alimentar na RPC, que pode propiciar as condições favoráveis ao colapso

do próprio sistema alimentar chinês, estamos perante um problema passível de ser

abordado por meio de uma análise de risco. Esta tipologia de análise tem como

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objectivo a avaliação de um problema de risco, tal como se apresenta a possibilidade de

ocorrência de um aumento da insegurança alimentar na RPC.

Então, por um lado demonstramos a importância da questão da insegurança

alimentar em ambiente decisional de interacção estratégica e por outro, para abordá-la,

demonstramos a necessidade de esclarecer o modo como deve o risco ser abordado.

Num mundo em evolução e transformação constantes e aceleradas, repleto de

diversos desafios e em situação de instabilidade a múltiplos níveis, o risco de ocorrência

de cenários de insegurança alimentar, sejam eles crónicos e por isso permanentes ou

sazonais e como tal temporários, surge como uma das questões mais prementes. Então,

consideramos a questão da (in)segurança alimentar enquanto problema susceptível de

uma análise de risco, o que envolve uma investigação em torno da caracterização da

situação presente do sistema alimentar chinês e uma análise das dinâmicas de risco que

contribuem, em dinâmica sistémica, para a aceleração elevada da insegurança alimentar

na China, o que desse modo pode conduzir ao colapso do sistema alimentar chinês.

O presente trabalho consiste portanto na realização de uma análise de risco, uma

tipologia de análise que permite e que visa analisar e avaliar o risco associado à

disrupção sistémica, neste caso, à aceleração elevada da insegurança alimentar na

China, que por sua vez pode provocar o colapso do sistema alimentar chinês. Para tal, as

teias mórficas constituem, em termos metodológicos, a técnica mais adequada a aplicar

à análise de risco proposta, na medida em que estamos perante um problema dinâmico

que cruza diferentes áreas com causalidade sistémica (demografia, ambiente, saúde,

segurança, economia, mercados financeiros, política, sociedade, cultura, tecnologia) e

esta técnica revela elevada eficácia na abordagem a problemas como esse, com

incerteza estratégica e de elevada complexidade dinâmica.

Primeiro, é essencial conceptualizar as noções centrais para a compreensão da

metodologia e técnicas aplicadas no âmbito da análise de risco e sintetizar a

investigação científica em torno das problemáticas associadas.

No seio dos Estudos Estratégicos, o conceito de Estratégia é originário do termo

grego strategia, que significa “comando”, termo derivado de strategos, que significa

“general” e que, por sua vez, tem origem em strátos, que significa “aquilo que está

disposto”, em agos, que significa “líder”, e em agein, que significa “liderar”. Esta noção

está, pois, ligada à noção de liderança e a um sentido de acção, arbítrio e controlo. A

abordagem à noção de estratégica é pertinente pela sua aplicação ao planeamento e

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organização de acções com vista a objectivos definidos em função de fins previamente

estabelecidos, isto é, pela sua aplicação no apoio à tomada de decisão estratégica.

No contexto da questão do risco e da sua ontologia sistémica, importa abordar o

conceito em si e o trabalho de investigação científica em torno do mesmo, ou seja, a

ciência geral do risco, fundamentada na base paradigmática da cibernética e

influenciada pela ciência dos sistemas e as ciências da complexidade.

O risco é definido, enquanto conceito central para a ciência geral do risco, a

partir do seu termo latim resicum, que sintetiza em simultâneo as noções de periculum

(perigo, ameaça), fortuna (sorte, destino) e incerteza, correspondendo assim a “uma

ideia de jogo de sobrevivência, em que se joga para sobreviver em situações de

exposição a ameaças e com um resultado em aberto” (Gonçalves, 2013a, p.5). A ciência

geral do risco expandiu o conceito e passou a trabalhá-lo enquanto “nome para situações

concretas sistémicas em que são identificáveis ameaças, oportunidades e incerteza

quanto ao desfecho das situações” (Gonçalves, 2013a, p. 5).

Actualmente, o risco é “a central strategic problem for human organizations

that face interconnected risk situations” (Gonçalves, 2012, p. 1) que são difíceis de

quantificar e que constituem ameaças à sustentabilidade futura dessas organizações.

Como tal, “risk can no longer be addressed in a reductionist approach, measuring each

risk source separately and considering relations in terms of static correlation

structures” (Gonçalves, 2012, p. 1). Hoje, as dinâmicas relacionais surgem em redes

complexas, são imprevisíveis e não-lineares. A organização tem, pois, “the need to

quickly adapt to the new strategic situation” (p. 2) e de assumir a maior celeridade com

que os pressupostos e os objectivos estratégicos podem sofrer alterações.

Então, as organizações, sejam Estados, empresas, organizações internacionais,

regionais ou não-governamentais, devem desenvolver uma estrutura de governação do

risco, capaz de promover uma gestão estratégica e integrada do risco, garantir a

avaliação da ameaça e os procedimentos de contingência e assegurar o funcionamento

eficaz de um sistema de monotorização das fontes de risco (Gonçalves, 2012, p. 2).

Neste sentido, são três as áreas transdisciplinares que apoiam este esforço: a ciência

geral do risco, a ciência dos sistemas e as ciências da complexidade.

O surgimento e autonomização da ciência geral do risco, abordada a partir de

uma base paradigmática da quarta fase da cibernética (Gonçalves, 2013b), resultaram do

desenvolvimento das ciências da complexidade, que trabalham em torno do risco e dos

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sistemas, e do desenvolvimento da área da análise de risco, enquanto área de

investigação aplicada (Gonçalves, 2013a).

A ciência geral do risco é, portanto, “uma ciência transdisciplinar com raiz na

investigação fundamental desenvolvida desde as décadas de 1960 e 1970

(principalmente a partir de 1970) acerca dos sistemas complexos” (Gonçalves, 2013a, p.

4). Ao nível fundamental considera o risco enquanto tal, com base numa mudança de

perspectiva na Física: “da busca de uma partícula fundamental para uma abordagem

relacional da matéria e das forças” (Gonçalves, 2013a, p. 5). Ao nível aplicado “visa o

desenvolvimento de metodologias e abordagens de gestão de risco em cenários de

complexidade dinâmica coevolutiva, correspondentes a situações de risco

interconectadas” (p. 4) que envolvem vários tipos de ameaças.

Deste modo, as dinâmicas relacionais sistémicas permitem perceber a que

corresponde um sistema: a “um padrão, estrutura ou qualquer conjunto de partes que

sustentavelmente articuladas entre si se constituem e permanecem enquanto presença

individuada integral e subsistente” (Gonçalves, 2013a, p. 5). Assim, um sistema não é a

mera soma das suas partes, pois “há propriedades na síntese que constitui a totalidade

do sistema que não estão nas partes, muito embora essas propriedades emirjam da

interacção entre as partes” (Gonçalves, 2013a, p. 6).

O problema da sustentabilidade da entidade sistémica é a base para o trabalho

em torno da questão do risco no seio da ciência dos sistemas e das ciências da

complexidade (Gonçalves, 2013a), o que leva à necessidade de definição do conceito de

sustentabilidade. Todos os sistemas são dependentes de campos de sustentabilidade, que

“são nos sistemas e com os sistemas” (Gonçalves, 2013a, p. 8), incorporam todos os

elementos que constituem o sistema e alertam-no para os sinais de ameaças e de

oportunidades. Os campos de sustentabilidade são caracterizados pela não-localidade,

“uma distribuição cognitiva projectiva holográfica, gerida por uma dinâmica de

simultaneidade sistémica, da unidade nas respectivas localidades sistémicas” (p. 9),

sempre inerente à totalidade sistémica, pois é própria da natureza do sistema.

Duas escolas desenvolvem investigação científica acerca da natureza sistémica

do risco e da complexidade e “help risk science establish a basis for addressing the

current risk problems that human organizations face” (Gonçalves, 2012, p. 13): a

Escola de Bruxelas-Austin e a Escola de Estugarda.

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A Escola de Bruxelas-Austin aborda o risco como parte do problema da

complexidade, “since it places risk as an underlying concept necessary to understand

complexity” (Gonçalves, 2012, p. 11)., e conceptualiza as organizações humanas

enquanto sistemas complexos abertos “that, to survive, have to expose themselves to

risk situations, consuming resources and generating adaptative dynamics for their

systemic sustainability, which, in turn, are generators of new risk situations”

(Gonçalves, 2012, p. 11). Ora, no seio de um sistema complexo, a capacidade de auto-

organização (auto-poiética) relacionada com o risco decorre da noção de estrutura

dissipativa, conceito de Ilya Prigogine, que corresponde a “um sistema aberto que se

alimenta de energia e matéria do meio, dissipando energia na sua actividade sistémica

auto-organizadora” (Gonçalves, 2013a, p. 3).

A Escola de Estugarda trabalha a noção de sinergética, conceito com origem no

termo grego synergein (συνεργειν), que significa “trabalhar em conjunto, cooperar”,

“central para uma abordagem sistémica ao risco” (Gonçalves, 2013a, p. 7), pois que a

auto-poiética característica de um sistema aberto “depende de uma sinergética em

conectividade vital” (Gonçalves, 2013a, p. 7), e trabalha com “self-organisation

processes that lead to the emergence of lower dimensional dynamics in high

dimensional systems” (Gonçalves, 2012, p. 10). Isto contribui para a ciência geral do

risco na medida em que “it allows one to address particular instances in which there

may emerge slow moving degrees of freedom, that come to act as control parameters

and fast moving degrees of freedom that come to behave as order parameters”

(Gonçalves, 2012, p. 10) e permite, através da ciência geral do risco, um nível de

antecipação e previsibilidade mais elevado com um certo grau probabilístico.

Então, no âmbito da realização de uma análise de risco em torno do problema da

insegurança alimentar na China, importa ter em conta as noções de estratégia, de risco,

de sistema, de complexidade e os trabalhos desenvolvidos pela Escola de Bruxelas-

Austin e pela Escola de Estugarda, nas quais “o risco tem sido trabalhado enquanto

problema, a partir de uma base de concretude sistémica, ligado à própria

sustentabilidade dos sistemas” (Gonçalves, 2013a, p. 2) e cujos conceitos fornecem “a

basic groundwork upon which one may build applications that can be effectively

applied to the current more complex contexts” (Gonçalves, 2012, p. 13).

Em suma, a análise de risco permite uma abordagem sistémica ao risco, este

último sempre inerente à existência do sistema. Sempre que há um sistema há risco, e

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sempre que há risco há ameaça à estrutura do sistema e, por conseguinte, risco de

colapso desse sistema. Não há estrutura sistémica que não corra o risco de colapsar. Esta

tipologia de análise permite então, entre outras possibilidades, apoiar a tomada de

decisão relativamente ao problema referido, dada a incerteza estratégica e a elevada

complexidade dinâmica e sistémica que o caracterizam.

3. O Sistema Alimentar Chinês: Caracterização

Na primeira fase da presente análise em torno do risco de ocorrência de um

cenário de aceleração elevada da insegurança alimentar na China cabe aferir a natureza,

as características e as dinâmicas fundamentais do sistema alimentar chinês no presente e

enumerar as condições de sustentabilidade do mesmo bem como as condições que

podem fazer quebrar essa sustentabilidade.

Importa salientar que esta é uma estrutura dinâmica, pois ocorre presentemente,

com causalidade sistémica, que a sustentabilidade está na dinâmica sistémica da

estrutura e que o sistema só se mantém enquanto a sustentabilidade se mantiver.

No início do século XXI, os efeitos das mudanças políticas e económicas

operadas desde o final dos anos 1970 do século XX na RPC começaram a fazer-se

sentir. A política de abertura ao exterior, o conjunto das reformas económicas encetadas

e as transformações decorrentes de tudo isso fizeram com que a China deixasse de ser

auto-suficiente em muitas áreas, nomeadamente no sector alimentar.

O actual sistema alimentar chinês enfrenta desafios que se prendem muito com a

questão da (in)segurança alimentar. A RPC tem a seu cargo a função e o imperativo de

alimentar a maior população do mundo, pelo que a segurança alimentar é encarada

como uma questão de estabilidade e por isso uma prioridade nacional no planeamento

estratégico dos sucessivos governos do Partido Comunista Chinês (PCC).

O sistema alimentar da RPC está construído com base num forte poder político,

numa grande capacidade económica e na coesão nacional do povo chinês, na medida em

que o país tem a seu favor “uma vasta riqueza e uma forte disciplina económica e

política” (Moyo, 2013, p. 14) e a capacidade de manutenção da ordem social no país.

Porém, estas dinâmicas sistémicas que tornam o funcionamento do sistema

sustentável são alvo de pressão por diversos motivos: questões ambientais, questões

demográficas, questões relacionadas com a oferta e a procura no mercado global de

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recursos e produtos alimentares, questões socioeconómicas e factores culturais. Estas

questões constituem, assim, dinâmicas de risco que ameaçam a sustentabilidade do

sistema e que, posteriormente, num cenário agravado, podem tornar-se condições

favoráveis ao colapso do mesmo. Importa salientar que ambos os tipos de condições, as

que dão sustentabilidade ao sistema alimentar chinês e as que contribuem para quebrá-

la, ocorrem em simultâneo e relacionam-se de forma dinâmica.

A actual estratégia chinesa para a segurança alimentar nacional consiste em

passar de uma produção rápida para satisfazer as necessidades alimentares da

população, pois que a quantidade de produção interna insuficiente é passível de ser

colmatada com importações provenientes do mercado global de recursos e produtos

alimentares através da capacidade económico-financeira da China para tal, para uma

produção de qualidade com objectivos de melhoria dos padrões de segurança alimentar,

dos padrões de vida e das condições ambientais do país e do resto do mundo.

O regime político autoritário do Partido-Estado facilita o exercício de autoridade

e controlo político no que toca à garantia da segurança alimentar, designadamente em

termos de implementação de políticas, reformas, regulações, legislações em torno do

sistema alimentar nacional e de questões associadas (controlo demográfico, das

migrações e das liberdades de expressão e de associação, investimento em alternativas

para aumentar a produtividade e qualidade, aumento das importações no mercado

mundial, reformas ambientais, sociais e fiscais).

O sistema alimentar chinês é profundamente enraizado nos meios rurais e é

bastante complexo e descentralizado. As quintas familiares são as maiores unidades de

produção e venda de produtos agrícolas (Lupo, 2014), muitas vezes sem equipamentos e

instalações adequados e sem padrões de gestão estandardizados. A regulação do sector é

feita em separado pelo governo e pelas províncias (Lupo, 2014), que adoptam políticas

regulatórias distintas, o que dificulta a uniformidade, a supervisão e o controlo da

quantidade e da qualidade dos alimentos produzidos, distribuídos e acessíveis e gera

fragmentações e inconsistências regulatórias (Lupo, 2014). Além disso, as quintas

pertencem aos governos locais, o que “means that land cannot be bought or sold by

farmers, only leased” (Carter, 2011, p. 7) e isso “raises a number of policy issues with

respect to the transition of China’s agricultural sector towards a more modern indus-

try” (Carter, 2011, p. 7). Este cenário desencoraja o investimento e a evolução das

quintas para mais e maior eficiência na produção e distribuição.

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O rendimento e a produtividade agrícola mantêm-se, assim, diminutos e isso

conduz à migração massiva de cidadãos rurais para os centros urbanos, onde os níveis

de vida são mais elevados, o que gera alterações na estrutura demográfica conducentes a

pressão sobre os alimentos ao dispor, tanto pela diminuição da produção devido à

diminuição de cidadãos rurais que são produtores agrícolas como pelo aumento de

pessoas a consumir os alimentos disponíveis nos meios urbanos. Face a isso, o governo

tem em curso um programa de migração faseado, que faz com que a saída de chineses

das áreas rurais para as áreas urbanas seja mais ordenada e sistemática (Moyo, 2013, p.

35), e tem em curso a implementação de reformas de combate às pressões ambientais e

de atenuação das consequências das alterações climáticas no país.

Em termos económicos, a China tornou-se, em 2010, a segunda maior economia

mundial (Moyo, 2013, p. 28) e é a maior economia agrícola do mundo (Carter, 2011),

suportando cerca de 1,3 biliões de pessoas. Porém, possui apenas cerca de 12% de terra

arável (Moyo, 2013, p. 40) e essa como fonte de alimentação “compete directamente

com a utilização da mesma como sítio onde as pessoas e os governos decidem construir

as suas casas e cidades” (Moyo, 2013, p. 40). A área arável começa a diminuir e surge a

necessidade de usar fertilizantes químicos (Carter, 2011, p. 6) para ultrapassar a

escassez de terra arável e de água. A poluição agrícola resultante dá, por sua vez,

origem a fenómenos de erosão (utilização intensa de parcelas diminutas de terreno) e de

desertificação. O desgaste intensivo destes factores de produção alimentar nacional faz

com que a China actualmente só satisfaça cerca de 70% das necessidades alimentares da

população (Lupo, 2014) e leva à necessidade de aumentar as importações.

Ora, a RPC tem conseguido manter a sustentabilidade e a relativa estabilidade do

sistema alimentar nacional precisamente pelo seu poder económico-financeiro. De

facto, “reversed its long-time status as a net agricultural exporting country to that of a

net importing country since 2004” (Carter, 2011, p. 5). Como tal, face às lacunas

internas, tem disponibilidade e capacidade para investir no aumento da quantidade e na

melhoria da qualidade dos alimentos produzidos a nível nacional (alimentos

transgénicos e alimentos orgânicos), para, em aquisições internacionais, pagar acima

dos preços praticados no mercado de modo a conseguir os recursos de que necessita e

para subsidiar as empresas estatais que investem no sector alimentar no exterior.

Apesar de todo o sucesso económico, a RPC ainda é um país em

desenvolvimento, com grandes disparidades e um profundo gap entre o meio rural e o

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meio urbano e com significativas franjas da sua população com inadequados e limitados

capacidade e acesso a uma alimentação regular e saudável e que por isso partem para os

centros urbanos em crescimento explosivo e onde as condições de vida são melhores,

acabando por pressionar a segurança alimentar dos mesmos.

A cultura chinesa também influencia a natureza, as dinâmicas e as características

do sistema alimentar chinês. A cultura de cost-cutting, a cultura de good-enough quality

e a falta de tolerância para com o desperdício (Lupo, 2014), características da cultura

nacional e resultado de episódios históricos do país, como fomes e episódios de

escassez de alimentos, têm bastantes efeitos ao nível da quantidade e da qualidade dos

alimentos que são produzidos e que saem para distribuição nacional.

O sistema alimentar chinês, que tem sido sustentável por um conjunto de

políticas nacionais e pela capacidade económica, sofre então múltiplas pressões em

várias dimensões que fragilizam, em termos sistémicos, a sua sustentabilidade.

Internamente, as acções encetadas para travar a deterioração das condições de

garantia da segurança alimentar da população nacional não se têm demonstrado

suficientes nem com a rapidez necessária para efeitos de estabilização e consolidação.

Externamente, muitos outros países para além da China também são afectados

pelos fenómenos das alterações climáticas, de alterações na estrutura demográfica, dos

êxodos para grandes centros urbanos e da escassez de recursos afectos à produção e

consumo alimentar, o que pode condicionar e limitar o volume de produtos alimentares

disponíveis no mercado global de alimentos.

Obtemos assim as condições que sustentam o sistema alimentar da RPC e, em

simultâneo, as condições que, se atingidas, alimentadas e aprofundadas, podem

conduzir à sua disrupção sistémica. Ora, todo este cenário pode conduzir ao aumento da

insegurança alimentar numa primeira fase, à sua aceleração elevada numa fase seguinte

e numa terceira fase ao colapso do sistema alimentar do país. De seguida, importa

identificar as condições demonstrativas de aberturas que expõem as vacuidades

estruturais capazes de quebrar a sustentabilidade do sistema.

4. Análise das Vacuidades e das Aberturas

Após analisar a estrutura do sistema alimentar chinês e identificar as condições

de sustentabilidade – construção, funcionamento e adaptação sistémica, pontos de força

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e pontos de ameaça – que o mantêm e suportam, importa agora identificar os pontos e

factores de transformação sistémica, ou seja, as vacuidades estruturais do sistema e as

aberturas que permitem atingir as vacuidades e investigar em torno da forma como essas

podem ser atingidas e, assim, despoletar a aceleração elevada da insegurança alimentar

na China, provocando a disrupção estrutural no funcionamento do sistema.

Baseamos, naturalmente, a realização desta fase da análise nas noções de

segurança alimentar e insegurança alimentar adoptadas desde logo na introdução à

presente análise e nas respectivas dimensões que consideramos estarem associadas.

Assim, a segurança alimentar corresponde ao acesso físico e económico de toda uma

população, em todos os momentos, a alimentos suficientes, seguros e nutritivos que

permitam satisfazer as suas necessidades dietéticas e preferências alimentares para uma

vida saudável e activa e as dimensões associadas são a disponibilidade (em termos de

produção, stock e fluxo), o acesso (através de direitos e recursos adequados à aquisição

de alimentos), a utilização (dos alimentos para o bem-estar) e a estabilidade temporal

dos vectores anteriores. A insegurança alimentar surge, então, como o inadequado e

insuficiente acesso físico e económico por parte de uma população a uma alimentação

segura e nutritiva para uma vida activa e saudável.

Depois, importa compreender as noções de vacuidades e aberturas, pontos vitais

do sistema que, se atingidos, podem conduzir à ruptura do funcionamento do mesmo.

Sempre que há uma vacuidade ou uma abertura num sistema há um factor de

insustentabilidade do mesmo, um ponto fraco que, se atingido, provoca uma disrupção

ou a aceleração de uma disrupção já em curso no contexto desse sistema.

Então, segundo a Arte da Guerra (孫子兵法), obra de Sun Tzu e uma referência

no pensamento estratégico militar asiático, especificamente no capítulo 6 (Vacuity and

Substance), xu (虛) corresponde às aberturas para a acção em relação às fraquezas

(pontos vitais) do adversário e shí (實) corresponde aos pontos de força. Neste sentido,

Sun Tzu defende que se aja nas aberturas do adversário e se recolha nos pontos de força,

de modo a obter o sucesso desejado. Incluída nesta definição está então a noção de

abertura táctica, relacionada com a noção de xu (虛), caracter que pode ser traduzido por

desprovido de conteúdo, falso, vazio, e a noção de shí (實), caracter que pode ser

traduzido por real, verdadeiro, honesto, sólido. Estes são frequentemente considerados

xu (虛) por vacuidade e shí (實) por substancial (Sawyer, 1993).

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Aplicando estas noções conceptuais ao contexto específico da presente análise,

as vacuidades expostas por aberturas (fragilidades sistémicas) em pontos vitais do

sistema alimentar chinês permitem a existência de dinâmicas de risco conducentes à

aceleração elevada de um cenário de insegurança alimentar no país.

Assim, identificámos no sistema alimentar chinês aberturas e vacuidades

estruturais a vários níveis, que se relacionam entre si de forma interdependente,

conduzindo directa e/ou indirectamente consoante causem directa ou indirectamente

alterações nas dimensões que permitem a existência de segurança alimentar no país, e

que constituem, se despoletadas e alimentadas, dinâmicas de risco para a aceleração

elevada da insegurança alimentar na RPC.

As políticas governamentais implementadas que se têm demonstrado muitas

vezes insuficientes e ineficientes conduzem a uma crise ambiental pela falta e/ou

ineficácia de políticas no sector ambiental, nomeadamente ao nível da protecção e

preservação ecológica, e de combate ao agravamento das alterações climáticas, gerando

propensão para a corrupção ambiental (este tipo de corrupção e os outros em torno da

quantidade e qualidade dos alimentos produzidos, distribuídos e disponíveis).

Conduzem a uma crise económico-financeira pela deficiente ou falta de regulação do

sector produtivo e distribuidor no âmbito do sector alimentar, o que leva à diminuição

das capacidades de fomento no sector da inovação científica e tecnológica para a

garantia, aumento e melhoria da segurança alimentar e à diminuição da capacidade

produtiva e dos rendimentos dos produtores, distribuidores e consumidores, gerando

propensão para a corrupção económica. Conduzem a uma crise política pelo surgimento

de desconfiança e descrença no sistema político e de instabilidade política devido à

insatisfação com as respostas do governo face ao risco de insegurança alimentar,

gerando propensão para a corrupção política. Conduzem a uma crise social devido ao

deterioramento das condições sociais da população decorrente da deterioração da

segurança alimentar em virtude de uma igual deterioração das condições ambientais,

políticas e económico-financeiras. Esta dinâmica despoleta directamente um cenário de

aceleração elevada da insegurança alimentar devido à existência de lacunas do ponto de

vista da implementação de medidas de governação política no âmbito dos vários

sectores relacionados com a garantia da segurança alimentar na China.

A ocorrência de uma crise ambiental conduz à ocorrência de uma crise social,

pois que o deterioramento das condições ambientais despoleta o agravamento das

16

condições sociais da população chinesa. Leva ao aumento das importações, pois que a

poluição do ar, água e solos e a ocorrência de catástrofes naturais resultantes das

alterações climáticas e de imprevisibilidades metereológicas têm efeitos na água e terra

arável necessárias à produção alimentar (agricultura e pecuária), o que por sua vez causa

a diminuição da produtividade e acesso e a deterioração da qualidade dos alimentos, e o

aumento das importações surge como solução para colmatar estas lacunas (insegurança

alimentar crónica) bem como as que emergem da ocorrência de fenómenos ambientais

sazonais (insegurança alimentar temporária). Esta dinâmica despoleta directamente um

cenário de aceleração elevada da insegurança alimentar na medida em que deixam de

existir as condições ambientais ideais para produção e distribuição de alimentos, o que

afecta a disponibilidade, o acesso e o consumo alimentar adequados e a estabilidade e

regularidade temporal de todas esses vectores.

A diminuição da produção de alimentos conduz à necessidade de um aumento

das importações pois que a deterioração ambiental e climática e a migração massiva dos

campos para as cidades reduzem a capacidade, o nível e a quantidade de produção

alimentar nacional, isto é, o meio rural (onde existem terrenos férteis e se faz criação de

animais) deixa de oferecer condições para produzir ao mesmo nível por motivos

ambientais e climáticos e assim a produção de alimentos deixa de ser suficiente para

suprir as necessidades alimentares da população nacional chinesa (fim da auto-

suficiência em termos de recursos para a produção alimentar e de produtos alimentares

no mercado interno chinês). Esta dinâmica despoleta directamente um cenário de

aceleração elevada da insegurança alimentar dado que conduz à deterioração da

regularidade da disponibilidade de alimentos, do acesso adequado em termos de

aquisição e da utilização dos mesmos para o bem-estar e, por sua vez, coloca em risco a

estabilidade temporal de todas estas dimensões.

O êxodo acelerado dos campos para as cidades, isto é, os fenómenos de

migração massiva, conduz à diminuição dos níveis de produção de alimentos a nível

nacional porque a população rural, a franja da população chinesa que trabalha

maioritariamente na produção alimentar (agricultura e pecuária), diminui por motivos

demográficos e por isso surge a falta de pessoas para trabalhar neste sector. Conduz ao

crescimento demográfico urbano elevado porque a população abandona o meio rural em

busca de melhores condições de vida que à partida existem no meio urbano e dá-se,

pois, um aumento da população nesse mesmo meio. Esta dinâmica despoleta

17

directamente um cenário de aceleração elevada da insegurança alimentar porque o

abandono do meio rural e a sobrepopulação do meio urbano têm efeitos negativos ao

nível de dimensões associadas à garantia da segurança alimentar, designadamente a

pressão nos recursos alimentares disponíveis, no acesso e na utilização dos mesmos.

A crise económico-financeira conduz a uma crise política pois surge um défice

de credibilidade no sistema político e na elite governativa devido à falta de respostas

adequadas para a resolução dos problemas e desafios existentes no que diz respeito à

segurança alimentar. Conduz a uma crise social porque a falta de condições de

estabilidade e segurança económico-financeira (diminuição de rendimentos, diminuição

do poder de compra, aumento das taxas de desemprego) geram instabilidade,

insatisfação e insegurança social. Esta dinâmica despoleta directamente um cenário de

aceleração elevada da insegurança alimentar devido à falta de capacidade económico-

financeira do governo chinês para satisfazer as necessidades alimentares nacionais,

tanto para investir no aumento da quantidade de produção alimentar nacional e na

melhoria da qualidade da mesma como para direcionar recursos para o aumento das

importações no mercado global de produtos alimentares, de modo a garantir a

estabilidade temporal da disponibilidade, do acesso e da utilização de alimentos.

A crise política conduz a uma crise social porque a instabilidade e tensões no

sistema político nacional decorrentes da falta de condições regulares de disponibilidade,

acesso e utilização de alimentos surtem desequilíbrios nas estruturas sociais rural e

urbana da RPC, levando à sua desestruturação, e conduz a uma crise económico-

financeira pois o regime político desestabilizado faz surgir a desconfiança por parte dos

mercados financeiros e investidores internacionais, que deslocam os seus recursos e

investimentos para fora do país pela incerteza dos retornos.

A crise social conduz a uma crise política na medida em que a desestruturação

da ordem social em vigor, tanto nos meios rurais, que sofrem de fenómenos de

desertificação e êxodo para as grandes cidades, como nos meios urbanos, que recebem

elevados números de cidadãos oriundos dos meios rurais e vêem as suas estruturas e

recursos sob pressão em termos de desequilíbrios na oferta e na procura, provoca

descrença e desconfiança no regime político e no governo.

O crescimento demográfico urbano elevado conduz à pobreza urbana

crescente porque os meios urbanos deixam de ser capazes de suprir de forma sustentada

e sustentável as necessidades alimentares de uma população urbana mais elevada, que

18

se vê sem condições sociais e económicas adequadas, e conduz à pressão sobre os

recursos alimentares nas grandes cidades porque ocorre um aumento da população a

viver nas grandes cidades e a necessidade de maior quantidade de alimentos aumenta

também. Esta dinâmica despoleta directamente um cenário de aceleração elevada da

insegurança alimentar na medida em que os recursos existentes nas grandes cidades se

tornam insuficientes por relação com a população que, em número elevado, passa a

existir nas mesmas, e como tal dá-se uma deterioração da estabilidade da

disponibilidade, do acesso e da utilização de alimentos.

A pobreza urbana crescente (deterioração das condições sociais e económicas

no meio urbano) conduz a um aumento da massa de pessoas com acesso limitado a

alimentos em virtude do aumento do número de pessoas, em especial no meio urbano,

com incapacidade de acesso e obtenção adequada e regular de alimentos e conduz à

fome urbana, um fenómeno generalizado de subalimentação, má nutrição e privação no

seio dos meios urbanos. Esta dinâmica despoleta directamente um cenário de aceleração

elevada da insegurança alimentar porque o aumento da população urbana leva à

insustentabilidade das estruturas políticas, económicas e sociais das grandes cidades e

isso conduz, por sua vez, ao inadequado e insuficiente acesso físico e económico a uma

alimentação segura e nutritiva para uma vida activa e saudável.

A fome urbana conduz a uma crise social porque a falta de capacidade de

acesso e obtenção de alimentos provoca instabilidade social e coloca em risco a

estrutura e ordem sociais em vigor. Esta dinâmica despoleta directamente um cenário de

aceleração elevada da insegurança alimentar porque a população chinesa fica perante

um panorama de inadequado e insuficiente acesso a uma alimentação segura e nutritiva

para uma vida activa e saudável devido à indisponibilidade em termos de produção,

stock ao dispor e fluxos de distribuição e devido à impossibilidade de acesso pela falta

de poder de compra, com naturais efeitos na utilização de alimentos para o bem-estar

alimentar de forma estável e regular no tempo.

A pressão sobre os recursos alimentares nas grandes cidades conduz à fome

urbana porque surge um desequilíbrio na oferta e na procura e os alimentos disponíveis

nos meios urbanos tornam-se insuficientes para uma alimentação regular e adequada das

populações nas grandes cidades chinesas. Esta dinâmica despoleta directamente um

cenário de aceleração elevada da insegurança alimentar pois provoca uma

19

desestabilização na regularidade e estabilidade temporal ao nível da disponibilidade,

acesso e utilização de alimentos para a saúde e bem-estar alimentares.

O aumento das importações, isto é, a necessidade de aumentar as importações

de alimentos provenientes do mercado global de produtos alimentares, conduz a uma

crise económico-financeira pois perante uma produção alimentar nacional insuficiente e

de fraca qualidade, a necessidade de aumentar de forma exponencial as importações

para suprir as necessidades alimentares da população chinesa tornam insustentável, ao

longo do tempo, a capacidade económica de continuar a fazê-lo, concomitantemente

com as boas condições de produção nacional em decrescendo. Disto decorre, por sua

vez, a propensão para o surgimento de um défice na balança comercial no que toca ao

sector alimentar na medida em que importa mais e consome a nível interno grande parte

dos recursos alimentares que seriam para exportação.

O aumento da massa de pessoas com acesso limitado a alimentos conduz à

fome urbana devido à incapacidade de acesso e obtenção de alimentos de forma

adequada e regular por parte da população total, tanto a os meios rurais, sem condições

de produção alimentar adequada e suficiente para consumo e distribuição, como a dos

meios urbanos, sem acesso e capacidade de obtenção apropriados. Esta dinâmica

despoleta directamente um cenário de aceleração elevada da insegurança alimentar

porque leva à falta de disponibilidade de alimentos para a população chinesa, que deixa

de conseguir ter adequados acesso e utilização dos alimentos.

5. Análise das Dinâmicas de Risco

Realizar uma análise de risco ao fenómeno da insegurança alimentar na China

significa trabalhar com relações sistémicas de movimento. Sabendo que uma análise

dessa natureza é realizada em torno da ocorrência de um cenário de aceleração elevada

da insegurança alimentar e que é composta por relações sistémicas de movimento, essa

possibilidade deve então ser trabalhada a partir de uma estrutura de morfismo.

Após uma abordagem às tendências de sustentabilidade do sistema alimentar

chinês e aos factores de quebra dessas tendências de sustentabilidade, as teias mórficas

de disrupção sistémica apresentam-se como a técnica mais adequada, pois permitem

construir teias de eventos, diagramas de ligações de acção e consequência das relações

sistémicas de movimento entre as dinâmicas de risco identificadas aquando da análise

20

das aberturas e vacuidades estruturais do sistema. Estas geram, por sua vez, os nós de

disrupção sequenciais conducentes ao cenário que integra as relações sistémicas de

movimento, neste caso a aceleração elevada da insegurança alimentar na China.

Ora, o objectivo nesta fase da análise é perceber de que forma é que as

vacuidades estruturais e aberturas identificadas enquanto dinâmicas de risco na fase

anterior da análise se relacionam em termos sistémicos dinâmicos e podem ser atingidas

e assim conduzir ao risco de aceleração elevada de um cenário de insegurança

alimentar. Mas antes, importa abordar as noções inerentes à técnica das teias mórficas.

Só depois passaremos à construção de uma teia mórfica orientada em torno de um nó de

disrupção central de aceleração elevada e aumento da insegurança alimentar.

As teias mórficas de disrupção são estudadas no seio da teoria matemática das

categorias, que estuda os objectos enquanto conjuntos estruturados e as relações

mórficas entre os mesmos. Esta teorização é útil “in any sciences where the notion of

system is relevant” (Gonçalves & Madeira, 2009, p. 30), pelo que se revela bastante útil

para a compreensão das relações sistémicas de movimento entre as dinâmicas de risco

em torno do cenário que abordamos na presente análise.

Segundo esta teoria cada objecto “can be identified from its position and motion,

in morphic relations” (Gonçalves & Madeira, 2009, p. 3) e estas últimas “are defined as

binary relations that have only two objects as terms, one is the origin the other is the

target” (Gonçalves & Madeira, 2009, p. 3). Uma relação mórfica inclui também um

fundamento para a ligação origem-alvo: “the morphic relations are thus directional,

and completely specified by the positions of the two objects and by the fundament”

(Gonçalves & Madeira, 2009, p. 3), o elemento que justifica a relação.

Ora, as relações mórficas são dirigidas “by the notion of morphism, which is

denoted by an expression where two objects are linked by a labeled arrow” (Gonçalves

& Madeira, 2009, p. 3). É essa seta que especifica qual é o objecto que é a origem e qual

é o objecto que é o alvo e é o fundamento da relação mórfica que a designa.

Então, o morfismo é uma noção geral de movimento direccionado e

fundamentado, ou seja, “conceptually operationalizes the whole morphic relation, that

is, the two terms connected by the arrow that is labeled by the fundament” (Gonçalves

& Madeira, 2009, p. 3). A relação mórfica é determinada pelos objectos e pelo

fundamento e o morfismo “defines a systemic motion from x to y, the double-arrow

simply signals the systemic relation itself” (Gonçalves e Madeira, 2009, p. 4). Só “the

21

identity morphism connects the object to itself, in itself, that is, the origin and target are

simultaneous” (p. 4). Nessa lógica “the system, considered in terms of its individuation,

bearer of an identity, is an existent in permanent rotative coincidence with itself” (p. 5).

Posto isto, a teia mórfica de disrupção enquanto estrutura geral é uma técnica em

grande parte qualitativa, na qual existem um conjunto de eventos e acções que

constituem os pontos de origem e de alvo, os nomes para as ligações, as ligações em si e

as fundamentações para as ligações, mas tem também uma componente quantitativa,

pois existe um número de nós de disrupção da sustentabilidade do sistema e um número

de cenários que consubstanciam as dinâmicas de risco.

Neste sentido, a estruturação das dinâmicas de risco identificadas na fase

anterior da presente análise será realizada através da aplicação da técnica das teias

mórficas de disrupção, designadamente através da construção de uma teia mórfica

composta por um conjunto de nós de disrupção (nós-origem e nós-alvo) interligados

entre si de forma sistémica e dinâmica com base nas respectivas fundamentações, razão

pela qual os nós de disrupção se ligam e razão pela qual existe o sistema. A teia será,

pois, orientada, em torno de um nó central terminal (a insegurança alimentar).

Assim sendo, como resultado da análise e da identificação de pontos de ruptura e

de dinâmicas de risco com origem nas aberturas estruturais e dinâmicas sistémicas que

expõem vacuidades no seio do sistema alimentar chinês, desenvolvemos uma teia

mórfica de disrupção para o cenário de aumento da insegurança alimentar na RPC,

sendo este o nó terminal do qual depende toda a sustentabilidade do sistema, com base

na construção de cenários integrados num paradigma centrado no movimento e no

relacionamento sistémico entre as várias dinâmicas de risco.

22

6. Conclusões

A segurança alimentar é um fenómeno multidimensional que, como tal, deve ser

alvo de uma análise na óptica de múltiplas perspectivas que complementam e

completam a visão estratégica necessária face ao problema. A insegurança alimentar é

um problema com uma natureza sistémica e complexa, inerente e intensamente

relacionado com os fenómenos do risco e da incerteza estratégica.

As organizações, neste caso o Estado chinês, “can no longer address risk from a

local and reductionist perspective, risk exposures must be addressed strategically and

conjointly in their coevolving dynamics” (Gonçalves, 2012, p. 21). O facto de o mundo

se ter tornado interligado e interconectado à escala global “has led to an

interconnectivity between risk situations, so that risk exposures depend upon a complex

web in which diferente domains appear interconnected” (Gonçalves, 2012, p. 21):

demografia, ambiente, saúde, segurança, economia, mercados financeiros, política,

sociedade, cultura, tecnologia. Assim sendo, a análise de risco tem as características e as

componentes indicadas para abordar a questão em análise.

23

Partindo da disponibilidade, produção, distribuição e acesso a alimentos

enquanto base fundamental no sentido da disrupção no seio de todos esses vectores,

realizámos uma abordagem sistémica às dinâmicas complexas do risco de ocorrência de

um cenário de aceleração elevada da insegurança alimentar na RPC, uma questão na

qual é imperativo o raciocínio estratégico em termos de tomada de decisão.

Os resultados da análise de risco realizada – caracterização do sistema alimentar

chinês (condições de sustentabilidade e condições de insustentabilidade), identificação

dos pontos de transformação sistémica (aberturas e vacuidades) e análise das dinâmicas

de risco através da construção de uma teia mórfica de disrupção – demonstraram que

esta é uma tipologia de análise bastante adequada e eficiente para a obtenção de uma

visão holística relativamente ao problema da insegurança alimentar na China, visão essa

útil a uma eventual tomada de decisão em torno da questão.

A caracterização do sistema alimentar chinês permitiu perceber que as condições

de sustentabilidade do sistema e as condições que podem fazer quebrar essa

sustentabilidade existem em relação estreita e intricada, o que dificulta a identificação

de cada tipo de características sistémicas e, por sua vez, a identificação daquilo que são

os pontos fracos do sistema face aos seus pontos de força.

A identificação dos pontos de transformação sistémica, isto é, das vacuidades

expostas pelas aberturas existentes, permitiu observar que o estado actual do sistema

alimentar chinês é de extrema fragilidade e pode entrar, não a curto mas a médio-prazo,

em cenário de insustentabilidade, sempre sistémica, dada a intensa interligação e

interdependência entre as dinâmicas que o constituem, e, caso nada seja feito, pode

mesmo atingir um cenário de disrupção e ruptura sistémica.

A organização das dinâmicas de risco resultantes numa estrutura de morfismo,

ou seja, numa teia mórfica, orientada em torno do ponto de disrupção central da

aceleração elevada da insegurança alimentar no país permitir ter uma visão gráfica, e

por isso mais perceptível de forma relativamente imediata, de todo o quadro até então

em processo de análise e investigação.

Actualmente, as principais ameaças, no seio do sistema alimentar chinês,

conducentes à aceleração elevada da insegurança alimentar na RPC encontram-se

sobretudo nos domínios económico-financeiro, político e ambiental.

Em termos económicos, a economia chinesa já se encontra em fase de

abrandamento (Público, 2013; Aljazeera, 2015) e o seu mercado financeiro atravessou

24

recentemente uma fase de instabilidade (Aljazeera, 2015) a qual ainda não ultrapassou

totalmente, tendo tudo isto influência na capacidade de garantia da segurança alimentar

por parte do país (investimento nas infraestruturas de produção e distribuição nacional e

aquisições internacionais de recursos e produtos alimentares).

Em termos políticos, a China atravessou também recentemente episódios de

desagrado para com o poder central de Pequim (o PCC), como foi o caso das

manifestações ocorridas em Hong Kong (BBC Brasil, 2014), o que mina a credibilidade

do Partido e do regime político e a sua capacidade para conduzir politicamente os

processos e os mecanismos relacionados com a segurança alimentar nacional.

Em termos ambientais, todas as políticas, reformas, legislações e regulações que

tem sido implementadas pelo governo chinês ainda estão em fase bastante embrionária e

a sua eficácia é questionável face a um problema que a nível nacional é tão profundo e

agravado. Os efeitos devastadores das alterações climáticas e a falta de preservação do

ambiente continuam a fazer-se sentir a uma velocidade, ritmo, progresso e intensidade

galopantes, tanto nos meios rurais que produzem os alimentos e que assim se vêem

perante a desertificação como nos meios urbanos cuja prosperidade se vê ameaçada e

em deterioração face ao aumento da população vinda dos meios rurais.

As vantagens de uma análise de risco prendem-se, então, com o facto de

conferirem aos decisores estratégicos, para as suas análises e decisões estratégicas, uma

percepção mais abrangente, mais profunda e multifacetada do problema em causa e dos

fenómenos que lhe estão associados, que podem resolvê-lo ou fortalecê-lo, e essa

percepção surge numa estruturação correspondente e mais aproximada à natureza

sistémica e complexa real do problema em causa.

Num mundo em que tudo existe em teias relacionais, onde tudo existe em

dinâmicas sistémicas complexas e onde o risco é um dos grande catalisadores da

incerteza e uma das ameaças mais temidas, porque mais desconhecidas na sua base

fundamental, a abordagem a um problema na busca de opções para a tomada de decisão

acerca do mesmo já não passa única e obrigatoriamente por um documento oficial com

listagens parcelares, fragmentadas e fraccionadas de características e tendências, forças,

fraquezas, oportunidades e ameaças ou vantagens, desvantagens, sugestões e medidas.

É aqui que surgem, e com uma importância fulcral, as análises a cenários com

riscos intrínsecos, complexos, dinâmicos e sistémicos, abordagens essas que possuem a

25

potencialidade de avaliação do problema em causa através da perspectiva global

desejável no contexto daquele que é hoje, e também, um mundo global.

7. Referências Bibliográficas

Livros

Moyo, Dambisa (2013) – A China e a Corrida aos Recursos: O Vencedor Leva Tudo.

Lisboa: Bertrand Editora.

Sawyer, Ralph D. (1993) – “Sun Tzu’s Art of War (孫子兵法)” in The Seven Military

Classics of Ancient China, pp. 145-186. X: Basic Books.

Artigos científicos

Gonçalves, Carlos P. & Madeira, Maria O. (2009), “A Systems Theoretical Formal

Logic for Category Theory”. Social Sciences Research Network – Working Papers.

Retirado de: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=1396841.

Gonçalves, Carlos P. (2012), “Risk Governance – A Framework for Risk Science-Based

Decision Support Systems”. Social Sciences Research Network – Working Papers.

Retirado de: http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=2085482.

Gonçalves, Carlos P. (2013b), “As Quatro Fases da Cibernética e a Ciência da Tomada

de Decisão”. Retirado de

http://www.academia.edu/4820997/As_Quatro_Fases_da_Cibernetica_e_a_Ciencia_da_

Tomada_de_Decisao

Gonçalves, Carlos P. (2013a), “Ciência Geral do Risco e Ciência dos Sistemas – Risco,

Sistema e Sustentabilidade”. Retirado de:

http://www.academia.edu/5011205/Ciencia_Geral_do_Risco_e_Ciencia_dos_Sistemas_

-_Risco_Sistema_e_Sustentabilidade

26

Artigos em publicações periódicas

Aljazeera (2015), Has China’s stock market bubble burst?. Retirado de:

http://www.aljazeera.com/programmes/countingthecost/2015/07/china-stock-market-

bubble-burst-150711113737001.html. Data de Acesso: 11 de julho de 2015.

Aljazeera (2015), China’s figures show economy slowing down. Retirado de:

http://www.aljazeera.com/news/2015/04/china-figures-show-economy-slowing-

150415065105549.html. Data de Acesso: 30 de junho de 2015.

BBC Brasil (2014), Hong Kong é palco de protestos pró-democracia; entenda. Retirado

de: http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/09/140929_hong_kong_entenda_pai.

Data de Acesso: 30 de junho de 2015.

Carter, Colin A. (2011). Carter, Colin A. 2011. “China’s Agriculture: Achievements and

Challenges”. ARE Update, 14(5), pp. 5-7. University of California Giannini Foundation

of Agricultural Economics.

Lupo, Lisa (2014), The Food System of China: The Real Story. Data de Acesso: 23 de

Maio de 2015. Retirado de http://www.qualityassurancemag.com/qa1214-food-quality-

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Público (2013), Economia chinesa – a hora do abrandamento. Retirado de:

http://www.publico.pt/economia/noticia/economia-chinesa--a-hora-do-abrandamento-

1600228. Data de Acesso: 30 de junho de 2015.

Publicações Oficiais

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the Basic Concepts of Food Security (pp. 1-3). EC - FAO Food Security Programme.

Food and Agriculture Organization of the United Nations, (2006). Food Security (pp. 1-

4). FAO’s Agriculture and Development Economics Division (ESA).

27

8. Anexos

Council on Foreign Relations (2011), Agricultural Innovations for Global Food

Security. Data de Acesso: 23 de Maio de 2015. Retirado de

http://blogs.cfr.org/coleman/2011/09/23/agricultural-innovations-for-global-food-

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The Atlantic (2011), The Meat of China’s Inflation Problem. Data de Acesso: 23 de

Maio de 2015. Retirado de

http://www.theatlantic.com/international/archive/2011/07/the-meat-of-chinas-inflation-

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