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PROBLEMAS DOS AFLORAMENTOS I - INTRODUÇÃO Quando se procede a levantamentos de campo, geralmente o geólogo só dispõe de pequenos afloramentos descontínuos que apenas revelam algumas partes da estrutura da região que está a estudar. A partir destes afloramentos ele vai ter que deduzir toda a estrutura da região (ou a maior parte possível) e, muitas vezes, os critérios estratigráficos são insuficientes para conseguir estes objectivos. Há, assim, necessidade de recorrer aos critérios estruturais, as quais serão descritos mais adiante. Entretanto, como existem alguns conceitos fundamentais que é necessário estarem bem presentes para a total compreensão destes critérios, faz-se em seguida uma breve revisão dos mais importantes. II - REVISÃO DE ALGUNS CONCEITOS Em consequência da deformação de uma região, podem ocorrer inversões da polaridade sedimentar que, normalmente, são devidas ao dobramento das formações. Por isso, é frequente distinguir em dobras monoclínicas um flanco normal (no qual as camadas têm polaridade normal) e um flanco inverso (no qual as camadas têm a polaridade invertida) (Fig. 1). Figura 1 - Dobras monoclínicas vistas de perfil (o ponteado indica base de camada). FN - flanco normal FI - flanco inverso Por vezes é possível termos dobras monoclínicas em que não chega a existir inversão das camadas; é o caso das chamadas dobras tombadas (Fig. 2). Figura 2 - Dobra tombada FN - flanco normal “FI” - flanco “inverso” Neste caso, embora não chegue a haver inversão da polaridade sedimentar, por vezes continua-se a falar em flanco normal e flanco inverso, o que não é correcto pois ambos os flancos apresentam polaridade normal. Outro tipo de designações frequentemente utilizado para classificar os flancos de dobras é o que os divide em longos e curtos, com base na sua extensão relativa (Fig. 3). Figura 3 - Classificação geométrica dos flancos de dobras monoclínicas. FL - flanco longo FC - flanco curto

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Page 1: Anexo_Vergencias

PROBLEMAS DOS AFLORAMENTOS I - INTRODUÇÃO

Quando se procede a levantamentos de campo, geralmente o geólogo só dispõe de pequenos afloramentos descontínuos que apenas revelam algumas partes da estrutura da região que está a estudar. A partir destes afloramentos ele vai ter que deduzir toda a estrutura da região (ou a maior parte possível) e, muitas vezes, os critérios estratigráficos são insuficientes para conseguir estes objectivos. Há, assim, necessidade de recorrer aos critérios estruturais, as quais serão descritos mais adiante.

Entretanto, como existem alguns conceitos fundamentais que é necessário estarem bem presentes para a total compreensão destes critérios, faz-se em seguida uma breve revisão dos mais importantes. II - REVISÃO DE ALGUNS CONCEITOS

Em consequência da deformação de uma região, podem ocorrer inversões da polaridade sedimentar que, normalmente, são devidas ao dobramento das formações. Por isso, é frequente distinguir em dobras monoclínicas um flanco normal (no qual as camadas têm polar idade normal) e um f lanco inverso (no qual as camadas têm a polaridade invertida) (Fig. 1).

Figura 1 - Dobras monoclínicas vistas de perfil (o ponteado indica base de camada).

FN - flanco normal FI - flanco inverso

Por vezes é possível termos dobras monoclínicas em que não chega a existir inversão das

camadas; é o caso das chamadas dobras tombadas (Fig. 2).

Figura 2 - Dobra tombada

FN - flanco normal “FI” - flanco “inverso”

Neste caso, embora não chegue a haver inversão da polaridade sedimentar, por vezes continua-se a falar em flanco normal e flanco inverso, o que não é correcto pois ambos os flancos apresentam polaridade normal.

Outro tipo de designações frequentemente util izado para classificar os flancos de dobras é o que os divide em longos e curtos, com base na sua extensão relativa (Fig. 3).

Figura 3 - Classificação geométrica dos

flancos de dobras monoclínicas.

FL - flanco longo FC - flanco curto

Page 2: Anexo_Vergencias

Note-se que os termos flanco longo e flanco curto não são sinónimos, respectivamente, dos termos flanco normal e flanco inverso, visto que os primeiros são apenas conceitos geométricos (não implicam qualquer conhecimento da polaridade sedimentar), enquanto que os segundos são conceitos geológicos que só podem ser util izados quando se conhece aquela polaridade. A figura 4 mostra os vários tipos de relações que podem existir entre estas duas classificações.

Figura 4 - Tipos de relações possíveis entre as classificações geológicas e geométricas dos flancos de dobras monoclínicas.

FN - flanco normal FI - f lanco inversoFL - flanco longo FC - f lanco curto

Convém agora chamar a atenção para o que se entende por anticlinal e por sinclinal.

Um anticlinal é uma dobra que apresenta as camadas mais antigas no núcleo (Fig. 5).

Figura 5 - Tipos de anticlinais.

Um s inc l i na l é uma dobra que apresenta as camadas mais recentes no núc leo

(Fig. 6).

Figura 6 - Tipos de sinclinais.

Existe, por vezes, uma certa tendência para confundir estes conceitos de anticlinal e de sinclinal com os de antiforma (ou dobra que fecha para cima) e de sinforma (ou dobra que fecha para baixo). Estes últimos são apenas conceitos geométricos que se podem utilizar sempre, mesmo que não se conheça a polaridade sedimentar das camadas. Quando, além da geometria das dobras, conhecemos a sua polaridade, então podem-se utilizar as denominações geológicas:

• antiforma anticlinal (anticlinal – Fig. 5-A); • sinforma anticlinal (falso sinclinal - Fig.5-B); • sinforma sinclinal (sinclinal - Fig.6-A); • antiforma sinclinal (falso anticlinal - Fig.6-B)

A terminar, vamos apenas rever o que se entende por vergência de uma estrutura. Trata-se da direcção para a qual "olham" os flancos curtos dos anticlinais, ou a direcção para a qual houve transporte de massa quando há cavalgamentos ou carreamentos.

Page 3: Anexo_Vergencias

Figura 7 - Vergência de uma

est ru tu ra deduzida a partir da observação dos an t i c l i na i s .

Note-se que só se pode falar em vergência de uma série quando conhecemos a

polaridade sedimentar pois, caso contrário, quando muito podemos falar em vergência geométrica. Mais ainda, também não é possível falar em vergência no caso de dobramento com simetria ortorrômbica (conforme se pode depreender da observação da figura 11), visto que neste tipo de dobras não existem flancos longos nem curtos. III - INTERPRETAÇÃO DE ESTRUTURAS RESULTANTES DA ACTUAÇÃO DE UMA

ÚNICA FASE DE DEFORMAÇÃO

Existem três factores que é necessário conhecer para a interpretação estrutural de uma região: polaridade sedimentar, critérios geométricos, vergência. Conhecidos quaisquer dois destes factores, é sempre possível determinar o terceiro. Na pratica, quando o geólogo aborda pela primeira vez uma região desconhecida, começa por tentar determinar a polaridade sedimentar (critérios sedimentares) e a polaridade estrutural (critérios geométricos) que lhe permitem concluir sobre a vergência regional das estruturas.

Os critérios geométricos consistem nas relações entre a estratificação (S0) e a clivagem (S1). No entanto, deve ter-se em atenção que estes critérios só podem ser utilizados quando a clivagem é de plano axial, ou seja, quando ela é paralela ao plano axial das dobras (Fig 8).

Figura 8 - Dobra monoclínica afectada

por clivagem de plano axial.

Page 4: Anexo_Vergencias

Uma variante da clivagem de plano axial é a denominada clivagem em leque (ver Fig. 9) com a qual ainda é possível aplicar as mesmos critérios geométricos que iremos ver mais adiante.

Figura 9 - Dobra monoclínica afectada

por clivagem em leque.

Na prática, a maneira de se reconhecer numa região se a clivagem é ou não de

plano axial, é ver se a lineação de intersecção S0/S1 (L1) apresenta a mesma atitude nos dois flancos das dobras, pois se a clivagem não for de plano axial (caso das dobras transectadas - ver Fig. 10) a atitude desta lineação vai variar num e noutro flanco.

Figura 10 - Dobra transectada; notar

a variação da atitude de L1 num e noutro flanco, e comparar com as figuras 8 e 9.

Vejamos agora quais as regras geométricas possíveis de estabelecer em estruturas

dobradas afectadas por uma clivagem de plano axial. 1 - No caso de dobras ortorrômbicas a clivagem é vertical e as camadas estão sempre

normais (Fig. 11). Como já vimos, nestes casos não é possível falar-se em vergências.

Figura 11

2 - No caso de dobras tombadas, a clivagem mergulha no sentido inverso do

tombamento; no flanco normal a clivagem e a estratificação inclinam no mesmo

Page 5: Anexo_Vergencias

sentido (inclinando a clivagem mais fortemente) e no “flanco inverso” inclinam em sentidos contrários (Fig. 12).

Figura 12

3 - Se se trata de dobras invertidas, a clivagem inclina sempre no mesmo sentido que a estratificação, inclinando mais do que esta no flanco normal e menos do que esta no flanco inverso (Fig. 13).

Figura 13

4 - Se as dobras são isoclinais, a estratificação e a clivagem estão confundidas e há que encontrar charneiras para decifrar a estrutura, pois só aí S0 deixa de ser sub-paralela a S1 (Fig. 14).

Uma situação que pode ajudar a decifrar estruturas deste tipo é quando se tem

clivagem em leque (Fig. 15) pois, assim, as regras já mencionadas para o caso das dobras invertidas continuam válidas.

Figura 14

Page 6: Anexo_Vergencias

Figura 15

Vejamos agora as condições em que se podem aplicar as regras anteriormente referidas (para além da condição da clivagem ter de ser de plano axial):

• Se a inclinação axial é nula, isto é, se o eixo da dobra é sub-horizontal, as regras anteriores são de aplicação fácil e imediata.

• Se a inclinação axial é moderada, para aplicar as regras é necessário observar os ângulos entre a clivagem e a estratificação segundo o eixo da dobra, ou seja, temos que imaginar a rotação da estrutura de modo a que o eixo fique sub-horizontal.

• Se a inclinação axial é muito forte, isto é, da mesma ordem de grandeza que a inclinação das camadas, é necessário aplicar as regras com toda a prudência pois é de considerar a existência de uma segunda fase de deformação que tenha afectado a estrutura.

• Se o eixo é vertical, o plano axial e as camadas também o são, e não se podem aplicar as regras.

• Nas regiões caracterizadas por dobras deitadas ou mantos de carreamento, cujos planos axiais são sub-horizontais, é impossível decifrar a estrutura apenas com base em critérios estruturais.

• Em zonas onde as camadas estavam invertidas antes do dobramento que gerou a clivagem de plano axial não podem ser aplicadas as regras.

• Em zonas com estruturas do tipo “tête plongeante" (Fig. 16), que resultam da actuação de uma única fase de deformação, as regras não podem ser aplicadas de modo imediato.

Vamos então ver como podemos proceder à interpretação de estruturas deste tipo.

Para tal, vamos começar por considerar dobras do tipo "tete plongeante" que apenas apresentem duas ordens de dobramento (como o caso ilustrado na figura 16).

Figura 16

Neste esquema a estrutura foi dividida em quatro zonas (A, B, C e D) de modo a podermos analisar com mais cuidado o que se passa em cada uma delas.

Page 7: Anexo_Vergencias

Zonas A e B - os flancos longos estão sempre com a polaridade sedimentar normal, enquanto que os flancos curtos estão geralmente invertidos.

Zonas C e D - os flancos longos estão sempre invertidos, enquanto que os curtos estão geralmente normais.

Zonas A e C - fazem parte da chamada zona de enraizamento da estrutura, na qual se diz que esta fecha para cima (upward-facing folding); aqui as relações estratificação/clivagem respeitam as regras enunciadas anteriormente (Fig. 17).

Figura 17 - Relações geométricas que se verificam na zona de enraizamento de estruturas do tipo "tête plongeante".

Zonas B e D - trata-se da zona em que a dobra esta a mergulhar, ou seja, onde ela

fecha para baixo (downward-facing folding); aqui as relações estratificação/clivagem são inversas das das regras atrás mencionadas (Fig. 18).

Figura 18 - Relações geométricas que se verificam na zona de mergulho de estruturas do tipo "tête plongeante".

Na prática torna-se bastante simples identificar em que zona de uma "tête

plongeante" deste tipo é que se integra um qualquer afloramento, para o que basta ter em atenção a relação entre as estruturas sedimentares e os critérios geométricos. As figuras seguintes ilustram alguns dos principais casos que podem ocorrer.

Figura 19 - Como os flancos longos

estão normais, este padrão de afloramentos tem que pertencer às zonas A ou B; mas como se verif ica que a polaridade sedimentar está de acordo com os critérios geométricos, este padrão tem que pertencer à zona de enraizamento, ou seja, a uma zona em que a estrutura fecha para cima, isto é, zonas A ou C. Logo, um exemplo deste tipo só pode ocorrer, no caso de uma "tête p l o n g e a n t " , n a z o n a A .

Page 8: Anexo_Vergencias

Figura 20 - Os flancos longos normais

indicam as zonas A ou B; como a relação clivagem/estratif icação não está de acordo com os critérios sedimentares, este padrão de afloramentos tem que pertencer às zonas B ou D. Logo, exemplos deste tipo só podem ocorrer na z o n a B ,

Figura 21 - Os flancos longos estão

invertidos, logo o padrão de afloramentos tem que pertencer às zonas C ou D; como existe concordância entre os critérios sedimentares e os estruturais, temos que estar nas zonas A ou D. Daqui podemos concluir que este exemplo é típico da zona C.

Figura 22 - Como os flancos longos

estão invertidos, este padrão de afloramentos tem que pertencer às zonas C ou D; como não existe concordância entre os critérios estruturais e os sedimentares, temos que estar nas zonas B ou D. Daqui se conclui que este exemplo apenas pode ocorrer na zona D.

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No entanto, quando consideramos estruturas do tiro "tête plongeant" com mais de duas ordens de dobramento, o problema complica-se, pelo que se deve ser mais cuidadoso na interpretação da estrutura. A figura 23 ilustra uma "tête plongeante" com três ordens de dobramento.

Figura 23 - "Tête plongeante" com três ordens de dobramento.

Neste caso, também se considerou a estrutura dividida nas mesmas quatro zonas

que tínhamos utilizado para a dobra da figura 16. Do mesmo modo, as zonas A e C são as chamadas zonas de enraizamento da dobra (nas quais as relações estratificação/clivagem respeitam as regras anteriormente enunciadas - ver Fig 17), enquanto que nas zonas B e D se vai aplicar o inverso das regras (Fig. 18), visto que estamos na zona de mergulho da dobra.

O problema que surge então é que, devido à existência de mais uma ordem de dobramento, acima do plano axial é possível ter-se flancos longos inversos (assinalados por A1 e B1), enquanto que abaixo do plano axial vai ser possível ter-se flancos longos normais (assinalados por C1 e D1).

Assim, a interpretação de estruturas do tipo "tête plongeante" tem que ser feita com bastante cautela e atendendo sempre aos aspectos acima focados para este tipo de estruturas.

A terminar o estudo de estruturas resultantes da actuação de uma única fase de deformação, convém referir mais duas regras que se verificam na maioria dos dobramentos, e que vão ter muito interesse na interpretação de estruturas e na reconstituição de padrões de afloramentos:

1ª - As vergências geométricas dos antiformas de ordem menor convergem para o

núcleo do antiforma de ordem maior (Fig. 24);

Page 10: Anexo_Vergencias

Figura 24

2ª - as vergências geométricas dos sinformas de ordem menor convergem para o núcleo do sinforma de ordem maior (Fig. 25).

Figura 25 IV - INTERPRETAÇÃO DE ESTRUTURAS RESULTANTES DA ACTUAÇÃO DE

DEFORMAÇÕES SOBREPOSTAS

Quando se analisam estruturas que resultaram da actuação de mais do que uma fase de deformação, a sua interpretação complica-se bastante visto que os padrões de interferência que daí resultam podem ser bastante complexos, principalmente se os vários campos de tensão actuantes não foram coaxiais (tiveram orientações diferentes); neste caso, vão obter-se estruturas com simetria triclínica que dificilmente poderão ser interpretadas utilizando-se um único perfil geológico.

Assim, vamos apenas deter-nos na análise de algumas estruturas que resultam da actuação de dois campos de tensão coaxiais, uma vez que estas apresentam uma simetria monoclínica que pode ser interpretada usando-se perfis coincidentes com o plano de simetria.

O que se pretende com este estudo é, para além de reconstruir a estrutura final, indicar como ela se poderá ter formado, assinalando também as vergências associadas a cada fase de deformação.

Neste estudo vamos começar por analisar em primeiro lugar o caso de dois dobramentos sobrepostos para, por fim, passarmos a casos em que existe um carreamento de primeira fase afectado por um dobramento de segunda fase.

1 – DOIS DOBRAMENTOS SOBREPOSTOS

A maioria dos conceitos que vamos utilizar aqui foram já referidos no capítulo anterior. Mais ainda, para facilitar a resolução dos vários problemas, não se vão considerar dobras menores associadas ao segundo dobramento.

Page 11: Anexo_Vergencias

Vamos começar por analisar os casos de dois dobramentos sobrepostos que apresentem vergências com o mesmo sentido. As figuras 26 e 27 representam os vários casos possíveis, mas nelas apenas figuram as dobras de 1ª ordem. É de salientar o facto da clivagem de 1ª fase (S1) se desenvolver mais nas charneiras das dobras de 1ª fase, enquanto que a de 2ª fase (S2) tem tendência a aparecer mais forte nas charneiras das dobras de 2ª fase, fazendo com que aí não seja, muitas vezes, visível a deformação associada à 1ª fase. ~

Figura 26

Figura 27

Page 12: Anexo_Vergencias

Nas figuras 28 a 31 representam-se, mais em pormenor, cada um dos dobramentos anteriores e nelas figuram as dobras menores da 1ª fase.

Figura 28

Figura 29

Figura 30

Figura 31

Page 13: Anexo_Vergencias

As figuras 32 e 33 representam, de um modo geral e esquemático, o que acontece quando há sobreposição de dois dobramentos que apresentam vergências opostas; nelas apenas figuram as dobras de 1ª ordem associadas aos dois dobramentos.

Figura 32

Figura 33

Page 14: Anexo_Vergencias

Nas figuras 34 a 37 representam-se, mais em pormenor, cada um dos dobramentos

das duas figuras anteriores, e nelas são já assinaladas as dobras de 2ª ordem geradas durante a 1ª fase.

Figura 34

Figura 35

Figura 36

Figura 37

2 - CARREAMENTO SEGUIDO DE DOBRAMENTO

As estruturas resultantes de carreamentos seguidos de dobramentos são em geral muito complexas, principalmente quando o autóctone e o alóctone já se apresentavam deformados antes

Page 15: Anexo_Vergencias

da ocorrência do carreamento. De modo a não complicar os esquemas, vamos apenas considerar que numa primeira fase há carreamento sobre uma estrutura em que a estratificação está sub-paralela ao plano de carreamento; após o desenvolvimento deste acidente, o autóctone vai manter-se indeformado (o que nem sempre acontece pois existe tendência para ele apresentar deformação relacionada com o carreamento), enquanto que o alóctone exibe dobras associadas a esta primeira fase de deformação (Figs. 38 e 39).

Figura 38

Figura 39

Vê-se, assim, que o alóctone exibe uma c l ivagem de pr imeira fase, enquanto que o

alóctone não apresenta nenhuma c l ivagem (uma vez que praticamente ainda não foi deformado).

Numa segunda fase todo o conjunto vai ser dobrado, e os vários casos que podem acontecer estão representados nas figuras 40 a 43, onde também se assinalam as vergências da 2ª fase.

Page 16: Anexo_Vergencias

Figura 40 Figura 41

Figura 42 Figura 43

Deste modo, o alóctone exibe duas clivagens .(S1 e S2) , enquanto que o autóctone apenas exibe uma clivagem que coincide com a S2 do alóctone.

Page 17: Anexo_Vergencias

RESOLUÇÃO DE UM EXERCÍCIO SOBRE PADRÕES DE AFLORAMENTO

O texto que se segue, com a resolução de um exercício de "padrão de afloramentos" pretende ilustrar uma das vários metodologias possíveis de utilizar na interpretação destes exercícios. Não se procurou fazer uma "receita universal" a aplicar a todos os exercícios deste tipo, mas apenas descrever uma linha de raciocínio que, ao fazer a analise detalhada dos vários afloramentos apresentados, vai permitindo a reconstituição progressiva da estrutura geral, por eliminação das situações impossíveis. Dado o aspecto didáctico deste texto, são por vezes analisadas situa coes altamente inverosímeis, apenas para demonstrar a impossibilidade da sua aplicação.

Por vezes, a interpretação dos afloramentos não permite o atingir de uma solução única. devido a insuficiência dos dados existentes. Neste caso, procede-se a uma breve discussão das vários soluções possíveis.

A linha de raciocínio utilizada na resolução deste exercício não é a única possível e. a mesma situação final pode ser obtida de outros modos. No entanto, qualquer que seja a via escolhida, deve-se sempre procurar a solução mais simples que explique os afloramentos existentes. Por vezes é possível chegar a mais do que uma situação final. O que se pretende é que a solução escolhida seja bem justificada e, tanto quanto possível real.

Figura 1

Da análise geral dos afloramentos que nos são dados ressaltam vários aspectos importantes

que há que ter em consideração na resolução do problema: - existencia (afloramento E) de dobras de primeira fase (F1); - existencia (afloramento B) de dobras de segunda fase (F2) com uma vergência

geométrica para sul; - existencia (afloramentos C e F) de acidentes. A existência de dobramentos de segunda fase obriga-nos a ser muito cuidadosos na

interpretação geométrica da primeira fase de deformação, nomeadamente no que respeita a determinação da vergência associada.

Comecemos por analisar os afloramentos D e E, visto serem os dois afloramentos que contêm mais informações sobre F1. Em ambos os casos, a atitude da clivagem de primeira fase (S1) é semelhante, aproximando-se da sub-verticalidade. No entanto, a análise das polaridades sedimentares, leva-nos logo a pensar na necessidade de existência de um dobramento. O recurso a um antiforma é extremamente improvável, pois isto conduziria a uma dobra em cogumelo, situação pouco frequente na natureza e que por isto não iremos aqui discutir. Somos assim levados a admitir a existência de um sinforma semelhante ao da figura 2A. O sinforma que assim obtivémos não pode ser considerado um sinforma de primeira fase, pois a dobra menor aí representada apresenta uma vergência contrária à que seria de esperar num sinforma F1 (Fig. 2B). Somos assim levados a admitir estarmos em presença de um sinforma de segunda fase; neste caso, a rotação produzida por F2 nas estruturas de primeira fase pode facilmente explicar o padrão deduzido (Fig. 3).

Page 18: Anexo_Vergencias

(A) (B)

Figura 2 – (A) Situação no f inal de F1; (B) situação no f inal de F2

(A) (B)

Figura 3 – (A) Situação no f inal de F1; (B) situação no f inal de F2

Do exemplo anterior, vê-se que apesar de n ã o haver nenhuma informação

directa sobre a existência de uma segunda fase de deformação neste local (por exemplo existência de S2), fomos levados a admiti-la, por ser esta a maneira mais simples de explicar as estruturas F1 existentes (afloramentos D e E).

Após deduzirmos da necessidade de existência de um sinforma F2 nesta zona, vamos analisar o que s e passa com os acidentes C e F. Até agora, ainda n a d a sabemos sobre a relação temporal entre eles e as duas fases de dobramento já referidas; por isto, são possíveis várias situações.

No caso de se considerar que são anteriores a F2, eles vão ter que estar afectados pelo sinforma da figura 3B e, deste modo, é possível considerarmos que os dois acidentes s ã o apenas um que, durante F2 foi dobrado (Fig. 4A). Ao repararmos na idade das formações aflorantes, vemos que acabamos de descrever uma estrutura que, quando retirada a deformação de segunda fase (Fig. 4.B) coloca terrenos de idade devónica sobre outras mais recentes, de idade carbónica. Estamos pois em presença de um cavalgamento no qual o sentido de transporte associado é para norte (basta ver os sentidos de movimento indicados na figura 1). Este é também o sentido de vergência das dobras F1 existentes no autóctone de idade devónica (ver anticlinal F1 na fiqura 4B).

(A) (B)

Figura 4

Page 19: Anexo_Vergencias

Tentando agora reconstruir a estrutura para sul do afloramento C vemos que, no autóctone aparece agora um antiforma de segunda fase. Do que foi dito anteriormente, resulta clara a necessidade de admitir que o acidente cavalgante vai ter que estar dobrado por este antiforma pois temos vindo a admitir que ele é anterior a F2. O problema que se põe agora é saber se o acidente vai passar entre os afloramentos A e B ou a sul do afloramento A. Dada a proximidade entre o afloramento C e o antiforma F2 existente em B. O mais lógico é admitir que o acidente passará entre A e B pois, caso contrário, isso obrigaria a que o acidente estivesse a truncar o antiforma F2 o que não seria lógico pois ele é posterior ao cavalgamento. Deste modo, o afloramento A será considerado pertencente ao alóctone e as relações entre S0 e S1 que ele apresenta, são fáceis de interpretar se considerarmos a rotação das estruturas de primeira fase em torno das dobras F2 (Fig. 5).

Figura 5

Fomos assim levados a admitir que A é um flanco inverso da F1, apesar de agora estar

estratigraficamente normal. Deste modo, os vários afloramentos pertencentes ao alóctone já foram correlacionados

entre si, restando apenas fazer o mesmo para o autóctone. Aqui o problema que se põe é a falta de informações acerca da F1, o que leva à existência de várias possibilidades, todas elas igualmente plausíveis. A ligação entre os vários afloramentos não oferece dúvidas e pode ser feita directamente (Fig. 6).

Figura 6

Page 20: Anexo_Vergencias

No entanto, a não existência de polaridades sedimentares leva-nos a admitir duas situações extremas (polaridade normal e inversa), cuja escolha origina ligeiras alterações na história geológica que, conforme veremos, não são muito importantes.

Após a correlação entre os vários afloramentos passemos a analisar com mais pormenor a estrutura obtida. A nível do autóctone pouco há a dizer, e discutiremos as possíveis soluções quando fizermos a história geológica. No entanto, no que respeita ao alóctone põe-se um problema que tem que ser explicado: com efeito, se retirarmos não só a deformação da segunda fase mas, também, a da primeira, a polaridade sedimentar fica invertida. Esta “anom alia” fica resolvida se pensarmos qual será a história geológica que nos permite explicar a existência de um grande flanco inverso a nível do alóctone.

HISTÓRIA GEOLÓGICA Numa primeira fase começam a formar-se grandes dobras fortemente vergentes para

norte, as quais apresentam flancos inversos bem desenvolvidos. Associados a estas dobras, ou ligeiramente tardios em relação a elas, desenvolvem-se acidentes cavalgantes que apresentam a mesma vergência. Devido a esta deformação, há formações do Devónico que vão ficar sobrejacentes ao Carbónico (Fig. 7).

Numa segunda fase, a estrutura anterior é afectada por nova fase de dobramento, agora com vergência para sul, ficando o alóctone com o aspecto representado na figura 8.

Figura 7

A vergência F2 (não a geométrica) pode ser deduzida directamente a partir do antiforma

F2 (fig.8), no qual se marcou S2. No entanto, há que ter o cuidado de se escolher o flanco normal da primeira fase, para que se possam usar os critérios estruturais na determinação da vergência F2.

Figura 8

Page 21: Anexo_Vergencias

A erosão ao actuar sobre a estrutura anterior provoca o desaparecimento do flanco

normal, pelo que actualmente na zona representada pelo corte da figura 1, apenas se conserva o flanco inverso.

No que diz respeito ao autóctone, apenas podemos avançar algumas conjecturas. Se considerarmos que a polaridade está normal, então podemos admitir que, quando se dá deformação representada na figura 7, o autóctone é pouco afectado e vai permanecer pouco perturbado; logo, no final da actuação das duas fases de deformação a estrutura seria a da figura 9. Se considerarmos a polaridade invertida, seríamos levados a admitir que o próprio autóctone também tinha sido deformado antes de F2 e, nesse caso, o cavalgamento teria levado a justapor um flanco inverso do alóctone sobre um flanco inverso do autóctone. A situação ficaria esclarecida se houvesse dobra F1 no autóctone que nos permitissem deduzir a polaridade sedimentar a partir dos critérios geométricos e da vergência de F1.

Figura 9 – O rectângulo ponteado assinala a “janela” de observação do corte original (Fig.1).

Page 22: Anexo_Vergencias

EXERCÍCIOS SOBRE AFLORAMENTOS

Reconstitua e interprete as estruturas

ISW NE

S1

S1

S0S0

S0

II

S0S0 S0

S N

S1S1

III

S0

S0

W E

S1

S1

S1

IV

S0S0

S0

W E

S1S1

S1

1/3

Page 23: Anexo_Vergencias

EXERCÍCIOS SOBRE AFLORAMENTOS (continuação) 2/3

VS N

S0

S0S0S1

S1

S1

VIS N

S0

S0

S0S1

VIIS N

S0S1

S1S0S0 S2

Devónico DevónicoCarbónico

VIIISW NE

S1S1

S1

S0

S0

S2

Ordovícico OrdovícicoSilúrico

Page 24: Anexo_Vergencias

EXERCÍCIOS SOBRE AFLORAMENTOS (continuação) 3/3

IXW E

S0

S0

S0

S1S1

S1S1

S2

XSN

S0

S1

S1S0

S0

S2

XISW NE

S1

S1

S1

S0

S0S0

S2