Arte, Lator Simondon

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Das Geometrias aos Sistemas como Obra de ArteAndria Machado Oliveira e Hermes Renato Hildebrand UFRGS, Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil UNICAMP/PUCSP, Campinas, So Paulo, BrasilResumo A noo de identidade estabelecida pelo modelo renascentista e cartesiano d lugar a um imaginrio com vrias possibilidades perceptivas e com uma grande diversidade de pontos de observao com base na teoria das redes. Hoje, os signos digitais estabelecem novas perspectivas de relacionamentos e conexes sociais, ambientais, polticas, psicolgicas, entre outras, que nos obrigam a repensar nossos paradigmas de percepo. Deixamos de privilegiar os modelos centrados e passamos a tratar dos modelos acentrados que primam pelos processos, redes e estruturas multilineares e multifacetadas. Obra, artista e interatores compem um processo relacional e um sistema como obra de arte. Termos Indexados - Arte, Tecnologia, Matemtica, Geometrias, Redes e Sistemas. Abstract The idea of identity as established by the Cartesian model has given place to an imaginary endowed with a variety of perceptual possibilities as well as a wide range of points of view based on the theory of networks. Now, digital signs create new relational perspectives and social, environmental, political and psychological connections which require a rethinking of our paradigms of perception. Instead of privileged centralized models, we reflect on decentralized models which take into consideration processes, networks and multi-linear and multi-faceted structures. Work, artist and interactors comprise a relational process and a system as a work of art. Index Terms - Art, Technology, Mathematic, Geometry, Networks and Systems.

I. Introduo O objetivo do presente artigo discutir e problematizar os pressupostos que determinam os espaos de representao artsticos e matemticos deste o ciclo materialista industrial ocidental at a contemporneidade com a ideia de sistema como obra de arte em espaos de representaes digitais. Neste sentido, apontamos que a noo de identidade forjada pelo modelo cartesiano, que determina um sujeito observador que mantm uma distncia do objeto observado, hoje, substituda pela noo de subjetividade e pelas estruturas processuais multifacetadas e multilineares dos sistemas em rede. No comeo deste ciclo, as produes eram artesanais e nossos sensores eram os olhos e as mos. Com a inveno das mquinas, nossos sensores naturais passaram a serem mediados pelos sensores mecnicos. E, a partir da descoberta da eletricidade e do mundo subatmico, passamos a interagir com tudo atravs dos sensores eletro-eletrnicos e digitais, densamente

mediados. Assim, estivemos a ampliar nossa capacidade perceptiva atravs da criao de suportes, ferramentas e linguagens. Na cultura ocidental as representaes baseadas na geometria euclidiana foram, paulatinamente, sendo substitudas, no imaginrio dos artistas e cientistas, por representaes das geometrias no-euclidianas e, mais recentemente, pelos signos de natureza topolgica baseados, nas teorias das redes, dos grafos e dos sistemas complexos. De fato, as representaes que h muito estiveram apoiadas em pontos fixos, em unidades discretas de tempo e espao, na identidade de objeto e de sujeito e em conceitos univocamente determinados, do lugar s redes, multiplicidade de conexes e relacionamentos atravs das interfaces tecnolgicas de informao e comunicao, especialmente as digitais, que estabelecem convergncias entre as mdias e as linguagens. Encontramos diferentes formas de compreender o espao, o tempo e o espao-tempo, bem como, o conceito de identidade, de sujeito e de subjetividade. Arte, Cincia e Tecnologia sempre estiveram interligadas, influenciando uma no pensamento da outra e, atualmente, integram-se atravs de uma infinidade de formas de observao. H um dilogo construtivo entre elas, organizado por um pensamento que busca se esgotar em cada poca. Aqui, escolhemos abordar, de modo amplo, trs momentos distintos de tal relao: do sc. XII at sc. XVIII - perodo pr-industrial, do sc. XVIII at metade do sc. XX - perodo industrial mecnico e, a partir dessa data at os dias de hoje perodo eletro-eletrnico e digital. No primeiro momento, a noo de identidade estabelecida pelos modelos dos matemticos Ren Descartes (1596-1650) e Gerard Desargues (1591-1661) determinam mtricas que solicitam um distanciamento entre o sujeito que observa e aquele ou aquilo que observado. Isto , a noo de identidade estabelecida por pontos discretos, tempos, lugares e sujeitos determinados, por objetos pr-definidos, e pelo conceito de existncia. J na Idade Moderna, o homem aparece separado da natureza, tornando-se um objeto de estudo independente e passando a ter propriedade de seu corpo. Conseqentemente, torna-se controlador e responsvel por ele. Segundo Denise SantAnna,O controle sobre o corpo , portanto, indissocivel da esfera poltica. [...] Como se a subjetividade moderna

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emergente no pudesse se afirmar sem o desenvolvimento de uma objetividade cotidiana: aquela do clculo matemtico que fornece a medida, o significado de cada gesto e de cada palavra. [1]

O corpo, como territrio divino, foi desacreditado pelo mundo mecnico que afirmava que o mistrio entender os problemas, as intenes do homem, sua essncia e seus princpios. A verdade, neste momento, se situa no mundo humano regido pelo mecanicismo que buscou um ponto fixo no corpo centrado no crebro. Depois do Renascimento, as tcnicas manuais ganharam a luz da racionalidade, deixando de ser consideradas como arte menor, conforme preconizadas por Plato anteriormente. Nesse perodo passa-se do mecanicismo para a termodinmica, tudo se torna mvel quando a mquina torna-se autnoma. Deus no est mais dando corda, pois tudo regido pelo motor. Simondon [2] coloca que o sc. XIX produziu uma filosofia tecnolgica tecnocrtica, porque se reduziu aos motores e no s regulaes. De acordo com SantAnna [3], o corpo uma usina de transformao de alimento em energia, conduzido a partir da dialtica da linha de montagem: funciona e no funciona. No se pode parar de funcionar, at o prazer e o cio necessitam ser justificveis. Tudo deve gerar energia. O homem se autoproduz, se autotransforma pela disciplina. Busca superar Deus ao fazer mais rpido e melhor do que ele. Pode-se ficar entre ser espectador do funcionamento das mquinas ou ser responsvel pela organizao dos conjuntos tcnicos ao colocar as mquinas para trabalhar; progresso demonstrado, no mais no arteso e sim no engenheiro (o organizador do conjunto de trabalhadores e mquinas). O homem que pensa o progresso no o homem que trabalha. Hoje, notamos que o conceito de verdade-absoluta, certeza e as tendncias em direo ao centro esfacelamse e, gradativamente, so substitudos pelas verdadesrelativas, incertezas lgicas e conceitos que acentuam as caractersticas perifricas e as bordas dos fenmenos. A intensa troca cultural a que somos submetidos e a quantidade de informao que nos so disponibilizadas permitem uma infinidade de novas conexes que, ao serem tratadas de forma interdisciplinar, nos conduzem aos conceitos de interatividade, processos e a virtualidade das redes fsicas e das redes mentais. II. A Geometria do Ponto de Fuga e a Paisagem Na famosa afirmao de Descartes: Penso, logo existo, encontramos um sujeito constitudo em sua subjetividade como centro das reflexes, um sujeito estvel, univocamente determinado, individual e fixo no tempo e no espao. Ao analisar as caractersticas deste perodo observemos o que Lcia Santaella tem a dizer. Para ela,

de acordo com essa imagem, a existncia do sujeito idntica ao seu pensamento. Trata-se da idia de um sujeito racional, reflexivo, senhor no comando do pensamento e da ao, cujos pressupostos atravessaram as filosofias kantianas, hegelianas fenomenolgicas e at existencialista. essa mesma imagem de sujeito que esteve subjacente, at recentemente, s principais teorias sociais e polticas ocidentais. [4].

Nas palavras de Albert Drer, parafraseando Piero Della Francesca, primeiro o olho que v; segundo, o objeto visto; terceiro, a distncia entre um e outro" [5]. Na obra O Casal Arnolfini de Jan van Eyck - 1434 verificamos que o ponto de fuga determinante na construo da pintura. Nesse quadro encontramos a frase Jan van Eyck esteve aqui fazendo uma referncia clara importncia do olhar do observador que, alm de determinar a estrutura perspectiva da obra, tambm indica a presena do autor refletido no espelho ao fundo com um registro documental estabelecido pela obra. No campo da matemtica, os modelos nos ajudam a estabelecer os padres de representao da natureza e das produes. Neste perodo, os sentidos so organizados atravs dos aparelhos sensrios naturais, sem dispositivos mediadores. A perspectiva linear, utilizada pelos matemticos e artistas do perodo renascentista, resume uma situao na qual o objeto observado por uma percepo particularizada dos indivduos e os modelos de representao so estruturados a partir da subjetividade de nossas vises. Tal viso separa cultura e natureza ao fixar o espao, em uma noo racionalista atravs da perspectiva e do uso da moldura como recorte da natureza. Esta forma de representao no se encontra apenas no Renascimento, mas pode ser observada nas pinturas romanas, nos panoramas do sculo XVIII, nos ambientes virtuais de modelagem 3D e, at, nos games dos computadores contemporneos, estando sempre calcada na busca de um ilusionismo do espao. So representaes em que se obtm uma sensao de imerso via afirmao de uma realidade conhecida, uma substituio da pintura pela realidade, da cpia pelo original platnico. Valorizando apenas uma perspectiva, muitas vezes elas so utilizadas com um valor de documentrio que consolida paradigmas da viso dominante, como, por exemplo, no Imprio Romano para glorificar as conquistas das batalhas e manter a unificao do Imprio; ou ainda nos panoramas, nos quais Oliver Grau questiona a funo representativa da imagem ea maioria dos panoramas de batalha. A batalha de Sedan visava educar atravs de um modelo poderoso, no de pensamento democrtico, mas de obedincia inquestionvel. [6]

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Nesta forma de representao, a valorizao da paisagem ocorre devido ao anseio de domnio da prpria paisagem, uma crena no domnio da natureza, de apropriao de uma realidade absoluta via um racionalismo mtrico. Para Anne Cauquelin, a perspectiva formaliza a realidade, faz dela uma imagem que ser considerada real. [7]. A paisagem renascentista surge como uma exigncia do olhar perspectivo, uma vez queprojeta diante de ns um plano, uma forma que se une a percepo; vemos em perspectiva, vemos quadros, no vemos nem podemos ver seno de acordo com essas regras artificiais estabelecidas em um momento preciso, aquele onde nascem a questo da pintura e a da paisagem. [8] A paisagem um decalque na parede, uma narrativa que fala de um outro, de uma viso unilateral de uma realidade mltipla; presa na moldura, ela recorta o real e, ao subtrair o excedente, visa aproximar a iluso do dito real idealizado. [9].

como, por exemplo, a Escola de Atenas de Rafael Sanzio.

Fig. 1 A Escola de Atenas de Rafael Sanzio - 1511, Vaticano.

III. A Geometria Projetiva e a Arte Moderna Com as mquinas e suas tecnologias mecnicas, as representaes do espao fundem-se com o tempo e se camuflam, gerando os movimentos contnuos que so estudados pelos matemticos atravs das sries infinitas, das funes e do clculo diferencial e integral. Tudo movimento. Na arte, tambm podemos perceber estas mesmas transformaes no processo de gerao de imagem com a fotografia, as telas de cinema e as representaes pictricas dos quadros cubistas, futuristas e dadastas. Picasso deixa-se influenciar pela deformao das figuras baseadas nos modelos africanos e libera suas representaes expressividade. Com a fragmentao dos objetos, os artistas mostram vrios ngulos de uma mesma imagem, ao mesmo tempo. Tal estrutura de pensamento foi sofrendo alterao desde o romantismo, com as obras de William Turner (1775 1851) e com o surgimento da mquina fotogrfica, rompendo-se com a barreira figura-fundo racionalista e iniciando-se a penetrao em outros nveis da forma e da matria, como se v nas obras impressionistas. Czanne, ps-impressionista, rompe com as leis racionalistas da perspectiva, possibilitando uma imerso na paisagem ausentes de si, como ele prprio mencionava, ofertando uma perspectiva oriunda dos sentidos da percepo, como se observa na obra La Meule em que ele busca no a representao da realidade, mas a estrutura desta realidade. A arte moderna, no incio do sculo XX, faz uma fissura neste espao exterior hegemnico e estilhaa-o com o cubismo, penetra-o com o abstracionismo, questiona-o com o dadasmo, recria-o com o surrealismo. Tais movimentos mostram-nos a possibilidade do perspectivismo nietzscheano cada perspectiva se definindo a partir do lugar de onde se olha -, da coexistncia de mltiplos espaos, da diversidade de caminhos de entrada na obra, da existncia de paradoxos, da incluso do acaso, do inacabado, da

A paisagem ilusionista acaba afirmando a crena que existe uma realidade absoluta que pode ser representada de modo inquestionvel. A paisagem constri-se no entre olho e no real, na ao de ver. Francisco Varela corrobora com tal ideia, para eleA realidade no projetada como algo dado: ela dependente do sujeito da percepo, no porque ele a constri por um capricho, mas porque o que se considera um mundo relevante inseparvel da estrutura do percipiente. [10]

Ocorre uma dupla construo e, assim,compreendo porque vejo, e medida que vejo, mas s vejo por meio e com o auxlio do que compreendo que preciso ver naquilo que vejo. [11]

Portanto, focando no Renascimento momento que solidifica o pensamento ocidental greco-romano, percebemos uma procura pelo domnio e mensurabilidade do espao via razo, uma aspirao em possuir a realidade exterior atravs da categorizao e classificao. Esta ambio pode ser visualizada na arte pela lei da perspectiva que domina as medidas de todo o espao dando uma iluso espacial da realidade; nas leis da proporo que colocam o homem como centro e medida de todas as coisas; nos estudos cientficos da anatomia humana e da natureza em geral; na composio espacial que localiza o homem como centro composicional da obra e como observador; bem como os fsicos, formulando leis que pudessem dar conta de explicar, mensurar e determinar a realidade exterior. Observa-se um pensamento recursivo voltado a atingir uma realidade dada a priori, ficando o ser humano com papel de observador de algo j existente, de contemplador da obra, interagindo primordialmente via o sentido do olhar e preso mimese de um real absoluto;

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feira, enfim, de outras noes espaciais e temporais. Faz-se uma quebra da realidade externa como absoluta e nica; abre-se a percepo para outras realidades existentes; abalam-se as dicotomias de figura e fundo, a preponderncia do sentido visual sobre os demais, incluindo-se o ttil. Algumas destas questes aparecem tambm na cincia, como a lei da relatividade, a fsica quntica, as geometrias no-euclidianas e a teoria dos conjuntos nocantorianos. Deixa-se de observar o mundo atravs de uma geometria intuitiva e passa-se a estud-lo atravs dos paradoxos e das contradies, assim como o de Zeno, de Aquiles e a Tartaruga. Escher exemplificou estes modelos quando realizou seus desenhos e gravuras apresentando os paradoxos gerados por representaes tridimensionais que eram realizadas no plano. Ele elaborou a representao de pessoas subindo e descendo escadas explicitando o verdadeiro labirinto e as contradies. Walter Benjamin, no livro Magia e tcnica, arte e poltica [12], fala sobre a arte na era da reprodutibilidade tcnica. Ele questiona alguns conceitos tradicionais vigentes at o final do sculo XIX, como criatividade e genialidade, validade eterna e estilo, forma e contedo. Com o surgimento da mquina fotogrfica, e, consequentemente, da reproduo de imagens, o conceito de autenticidade escapa reprodutibilidade tcnica ao perder a referncia ao original, quele objeto igual e idntico a si mesmo, a uma autoridade que o legitime como verdadeiro, tradio imposta a ele, sua aura enquanto discurso consagrado. A unidade e durabilidade do lugar transitoriedade e repetibilidade. A sacralizao da obra, ritual secularizado, impe uma relao de poder, enquanto a reproduo aproxima a obra do espectador. Ao retirar seu invlucro e destruir sua aura legitimada, lhe d autonomia e substitui a existncia nica por uma serial. O objeto, sua cpia, sua reproduo fica cada vez mais prximo e acessvel ao fruidor. A obra de arte criada para ser reproduzida; assim se emancipa cada vez mais do seu uso ritualstico, no qual a importncia consistia em que as imagens existissem e no que fossem vistas. Agora, pelo contrrio, aumenta sua exponibilidade, uma vez que elas so produzidas para atingir uma maior visibilidade. Didi-Huberman aborda em seu livro O que vemos, o que nos olha [13] a concepo de aura em Walter Benjamin, apresentado duas posturas distintas: uma em que a aura vista como um discurso legimado e institudo, e outra como uma atmosfera da obra. Neste artigo, o comentrio sobre a aura da obra de arte referese ao seu poder de legitimao. J Marcel Duchamp aplica o conceito de movimento aos seres humanos atravs de suas verses do Nu Descendo a Escada. A respeito destes trabalhos ele escreveu que eles no eram pinturas, mas sim uma organizao de elementos cinticos que expressavam o tempo e espao atravs das representaes abstratas do movimento. Para ele, devemos ter em mente que,

quando consideramos o movimento representado no espao, estamos entrando no reino da matemtica e da geometria. As representaes estruturam-se a partir das novas perspectivas de observao, agora, mediadas pelas mquinas. No perodo industrial mecnico a racionalidade levada ao extremo e produz um pensamento calcado no inconsciente humano que, num primeiro instante, parece ser paradoxal, assim como as representaes de M. C. Escher, porm, em outro momento passamos a no ficar nada surpreso, ao admitir que os sonhos dizem muito mais sobre as questes humanas do que poderamos perceber conscientemente. O homem v que a mquina passa a ser um importante meio de produo e de comunicao e conforme Walter Benjamin [14], consolida-se a industrializao mecnica como o perodo da "reprodutibilidade tcnica". Ao se implantar o novo processo de produo de bens, onde o trabalho das mquinas acrescenta velocidade ao sistema produtivo, redirecionamos nossas percepes e aes no mundo. A civilizao industrial introduz a serialidade em seu sistema produtivo. IV. A Topologia e os Sistemas em Redes Hoje, o grau de complexidade de nossos modelos e a amplitude de variveis que devem ser consideradas nos ambientes simulados, nos obriga a buscar novas perspectivas de observao para compreender a relao entre sujeito e objeto. Diante desta abordagem, em que novas categorias se formulam ou se evidenciam, encontramos a teoria matemtica das redes, que agora no mais enfatiza a idia de ponto fixo, de tempos e lugares determinados, de sujeitos e objetos estabelecidos, mas, busca encontrar a multiplicidade das formas de representao das redes que se interconectam numa infinidades de possibilidades. Enfim, estamos diante de ecossistemas que so constitudos pela sua capacidade de gerar relacionamentos entre os ns e atravs das conexes disponveis em cada modelo. A teoria das redes, como modelo, nos permite observar estas conexes, a multiplicidade de ambientes em que podemos navegar, a incerteza diante multiplas escolhas, a interdisciplinaridade e o carter dialgico da linguagem que agora, no tem mais o centro como elemento fixo da perspectiva linear, mas est espalhado em pontos perifricos numa cartografia e nos diversos mapas e diagramas que podemos construir com as redes. Abandonamos o centro e passamos a atuar em todas as partes e em todas as direes. Os pontos perifricos e as bordas, nos modelos atuais, adquirem valor e importncia e os pontos centrais dos modelos ora esto nas bordas, ora nos centros, ora em outro lugar e as vezes, em lugar nenhum, modificando-se em funo de variveis que se alteram a todo instante. Assim, sem muito rigor cientfico, podemos definir rede como um conjunto de pontos interligados. E de

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maneira axiomtica, podemos definir rede pelos conceitos de n (ponto) e de aresta (conexo - relao) que liga dois ns. De fato, as redes so agrupamento de pontos (ns) que se ligam a outros pontos (outros ns) por meio de linhas (arestas) e nos conduz a uma estrutura de organizao matemtica com um grau de liberdade muito grande determinando estruturas em processo. Vamos ento comear por uma reflexo dos padres lgicos que passamos a visualizar de modo mais constante. Obviamente, neste artigo no ser possvel abordar com profundidade temas to complexos como todos os modelos lgicos de representao que podemos identificar nos dias de hoje. Portanto, esta anlise, ser apresentada de forma esquemtica, dirigindo-se especificamente para alguns sistemas perceptivos visuais das artes e da matemtica. Ao olhar para a cincia, apoiaremos nossas observaes na Matemtica porque, conforme Charles Sanders Peirce, lgico e matemtico, a principal atividade desta cincia descobrir as relaes entre os vrios sistemas e padres encontrados na natureza e na cultura, sem identificar ao que eles se referem, a no ser em relao aos aspectos criados pela prpria linguagem. [15] Para isto, os estudiosos sempre estiveram preocupados com os tipos de representaes que a Matemtica formula porque entendem ser esta a cincia dos padres [16]. Os elementos da visualidade, assim como as expresses abstratas, so relativas ao tratamento matemtico e, de fato, e de algum modo, as imagens representam, ou traduzem, as linguagens abstratas, enquanto as expresses so representaes destas formas [17]. Comecemos nosso raciocnio identificando trs grandes reas de estudo das representaes matemticas, so elas: a Geometria Mtrica que aquela que herdamos de Euclides; a Geometria Projetiva que trata das projees e das transformaes invariantes no espao e a Topologia que observa as representaes espaciais matemticas na sua forma mais geral. De fato, as Imagens Matemticas [18] produzidas pela cultura ocidental estruturam-se por algoritmos extrados, inicialmente, da Geometria de Euclides, depois das Cnicas de Poncelet, das Transformaes Afins de Mebius e Klein, passando por Lobachevsky, Bolyai e Riemann e pelas Geometrias No-Euclidianas, chegando hoje, s diversas estruturas Topolgicas: Combinatrias, Algbricas e Diferenciais abrangendo grande parte do conhecimento matemtico. Na Geometria Mtrica as transformaes pautam-se pela invarincia das medidas dos ngulos, das distncias, das reas, da continuidade e da no possibilidade de deformao das figuras. Uma representao do espao que define relaes internas de medida e ordem entre os elementos. Sabemos que a Geometria, inicialmente, pensada como um ramo da

Matemtica e que estuda as formas e as dimenses espaciais. Ela permite que analisemos as propriedades dos conjuntos que so invariantes sob determinados grupos de transformaes. Isto significa dizer que ela estuda as propriedades dos pontos, linhas, superfcies e objetos slidos e suas relaes, quando eles sofrem transformaes espaciais, assim como, reflexo, rotao e translao. Considerada como a cincia do espao, a Geometria, por muito tempo, foi definida com base em cinco axiomas. Ela foi totalmente formulada e deduzida a partir destes axiomas, nos textos "Os Elementos", de Euclides, por volta de 300 aC. e perduraram por 1.500 anos. A partir da descoberta das Geometrias NoEuclidianas, que so aquelas que no necessitam do quinto axioma para serem elaboradas, nossas concepes fsicas e abstratas do mundo comeam a se alterar. Os matemticos acreditavam que o axioma das paralelas poderia ser deduzido logicamente a partir dos outros quatro. Com as descobertas realizadas por Lobachevsky, Bolyai e Riemann, a dimenso dos objetos e sua espacialidade ganham novos mtodos de anlise que permitem a formalizao da Teoria da Relatividade de Albert Einstein. A criao da Geometria No-Euclidiana ocorreu a partir da tentativa de se transformar o quinto axioma em teorema. O primeiro a entender o problema do axioma foi Gauss em 1817, e, posteriormente, Janos Bolyai em 1823 e Lobachevsky em 1829. Bolyai e Lobachevsky admitiam em sua Geometria Hiperblica, como ficou conhecida, a negao do quinto axioma de Euclides e a validade dos axiomas da incidncia, da ordem, da congruncia e da continuidade. Eles chegaram concluso que o nmero de paralelas deste espao geomtrico era maior que um. Estas formulaes matemticas somente se completaram, em 1854, com Riemann. Atualmente, constatamos que existem trs tipos diferentes de Geometrias: a Hiperblica de BolyaiLobachevsky, a Elptica de Riemann e a Euclidiana. Com o uso das novas tecnologias digitais, podemos construir as representaes no-euclidianas de modo muito fcil. E com a descoberta destes novos espaos de representao, as idias topolgicas comearam a invadir o conhecimento matemtico da poca, dando vida ao que chamamos de Topologia. Em 1735, Euler publicou um texto sobre a soluo do Problema da Ponte de Knigsberg, que comea a introduzir discusses sobre os conceitos topolgicos matemticos. De fato, o primeiro resultado realmente conhecido sobre Topologia foi realizado por Mebius, em 1865. Em seus estudos, vemos a descrio detalhada das faixas de um lado s. Em 1872, Felix Klein ampliou as discusses sobre os espaos topolgicos atravs da teoria dos grupos, fazendo surgir a verdadeira concepo de Topologia

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[19]. Weierstrass, em 1877, deu uma prova rigorosa do que seria conhecido como o famoso Teorema de Bolzano-Weierstrass, introduzindo o conceito de vizinhana de um ponto, fundamental para o desenvolvimento da matemtica, da por diante. Hilbert, usando este conceito de vizinhana, em 1902, elaborou trabalhos sobre transformaes em grupos diferenciais e anlises sobre o conceito de continuidade em espaos topolgicos. Newton Costa define Topologia como "a estrutura global da totalidade dos objetos que esto sendo considerados" [20], e assim, ampliamos significativamente os estudos sobre os problemas topolgicos, em particular, os estabelecidos para as redes matemticas. Pierre Rosenstiehl afirma que se alguma forma de conhecimento marca a poca em que vivemos, este fenmeno e o das redes. Segundo ele,Como todos os fenmenos morfolgicos profundos, de carter universal, o fenmeno da rede pertence no s cincia, mas tambm vida social. Cada um de ns se situa em redes, correspondendo cada rede a um tipo de comunicao, de freqncia, de associao simblica. [21]

cada vez mais densos e complexos, verificamos que as interfaces digitais, hoje, permitem novas formas de conexo entre todas as reas do conhecimento humano. Atualmente, devemos focar nossas atenes nos processos inacabados em vez das produes concludas. Devemos dar nfase s conexes, s arestas e a fluidez das bordas, aos espaos vazios e ao sujeito mediado pelo Outro da cultura. Todos estes modelos no enfatizam a idia de ponto fixo, de tempos e lugares determinados, de sujeitos e objetos com identidades bem definidas. Buscamos sim, a multiplicidade das formas que se interconectam, as solues dos problemas que descrevem dinamicamente um grande nmero de unidades cooperantes, embora individualmente livres, e ainda tratam da simulao dos sistemas complexos e de uma infinidade de temas em que o paradigma acentrista tem lugar. VII. Sistema como Obra de Arte Baseados nestes pressupostos, verificamos que os suportes digitais apoiados nos meios de produo do perodo eletro-eletrnico e digital permitem novas formas de conexo entre Arte, Cincia e Tecnologia. Tal dinmica nos leva concepo de sistema como obra de arte. Focar no sistema em vez da obra propriamente dita dar nfase, s arestas, fluidez das bordas, s conexes, os espaos vazios, o sujeito mediado pelo Outro, pela linguagem e pela cultura e s foras no visveis da natureza. Consideramos que estas questes so vitais, dada a vertiginosa dinmica que as tecnologias propiciam nos processo de mediao cada vez mais densos e complexos. Ao compartilharmos vrios pontos de vista estamos dando vazo a uma pulso de vida na medida em que a descoberta de novos padres culturais e naturais no somente permitem a ampliao do conhecimento, como tambm estabelece novos sentidos a nossa percepo da realidade. Em tal perspectiva de sistema como obra, Gilbert Simondon nos auxilia ao apontar a idia de sistema como um processo de individuao. Neste sentido, a obra de arte e observador se constituem num mesmo processo e fazem parte do mesmo sistema. De acordo com Simondon, deve-se conhecer o indivduo pela individuao muito mais do que a individuao a partir do indivduo [24]. Ele concebe o indivduo a partir da individuao, ou seja, a partir de uma ontologia que pondera o ser no como nico, pronto e isolado, mas como algo que est sempre se tornando. Um processo dinmico que no permite o congelamento da forma, do corpo fixo, uma vez que ele satura-se e transforma-se continuamente, estando em permanente diferenciao de si mesmo. Simondon entende que[...] primeiro, existe o princpio de individuao; em seguida, este princpio opera em uma operao de individuao; por fim, o indivduo constitudo aparece

A definio matemtica de rede muito genrica. Elas esto associadas aos objetos matemticos pela sua natureza topolgica. Uma rede conjunto de vrtices ou ns que podem ser: lugares, memrias, elementos nos bancos de dados, pontos de conexo, pessoas numa fila, casas de um tabuleiro de xadrez, enfim, tudo aquilo que se caracteriza como fixo. Segundo Costa, os fixos so elementos aos quais atribumos ou reconhecemos caractersticas que neles se sedimentam [22]. Porm, o que transforma este sistema em uma rede so as ligaes efetuadas entre estes ns, sendo informaes que podem circular tendo estes fixos como baliza e catalisadores. As redes so modelos matemticos estudados pela Topologia Combinatria que, por sua vez, vo buscar referncias na Teoria dos Grafos. J, os Grafos, geram modelos a partir de um conjunto abstrato de pontos sem propriedades, e de um conjunto de linhas que possuem a propriedade de unir dois pontos sem se cruzarem. Isto demonstra o grau de liberdade axiomtica dos modelos estruturados como Rede. [23] Diante destas conceituaes tericas, onde novas categorias se formulam ou se evidenciam, as Teorias das Redes e dos Grafos, baseada na Lgica Combinatria, apresentam-se como uma soluo sistmica muito interessante. Os ecossistemas, constitudos pela sua capacidade de gerar relacionamento entre os ns e fluindo pelas arestas, determinam tambm a multiplicidade dos ambientes percebidos e o carter dialgico das linguagens apresentado pela diversidade dos sistemas semiticos. Abandonamos o centro e passamos a atuar em todas as partes e em todas as direes, a partir de informaes locais, assim como nos labirintos. Nesta dinmica dos processos de mediao

[25].

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Os indivduos obra, artista e interator pertencem ao mesmo processo de individuao, estando em interatividade constante. A interao ocorre entre corpos em atividade relacional em sistemas de individuao, uma vez que a interao, aqui, vista como ressonncia interna de um sistema. Esta viso sistmica requer outro modo de representao, precisando-se substituir a mmese das cpias platnicas pela afirmao do simulacro. O simulacro a potncia de afirmar todas as sries heterogneas, misturando-as e desordenando-as, validando a divergncia e o descentramento, isto , o simulacro inclui em si o ponto de vista diferencial; o observador faz parte do prprio simulacro, que se transforma e se deforma com seu ponto de vista [26]. Os indivduos vivos no so termos de uma relao, mas, como Simondon nos diz, teatro e agente de uma relao em uma comunicao interativa em que no est em relao nem consigo mesmo nem com outra realidade, j que ele es el ser de la relacin, y no ser en la relacin, pues la relacin es operacin intensa, centro activo [27]. Assim, a individuao no resultado de forma e matria, corpo e alma, e sim expresso de uma resoluo em constante (trans)formao [28]. A interatividade, vista pela individuao, uma experincia de presentificao, indo alm da representao. Deleuze comenta quedir-se- tanto que ela (individuao) estabelece uma comunicao interativa entre as ordens dspares de grandeza ou de realidade; ou que ela atualiza a energia potencial ou integra as singularidades; ou que ela resolve o problema posto pelos dspares, organizando uma dimenso nova na qual eles formam um conjunto nico de grau superior [29].

uma vez que proporciam uma experincia sem contigidade com o referente real e com outras situaes espao-temporais. Segundo Oliver Grau,enquanto ambientes virtuais anteriores apresentavam portais que resultavam em transies abruptas, no mundo das imagens de Osmose o observador vivencia transies osmticas de uma esfera a outra, vendo uma esfera esmorecer lentamente antes de se amalgamar prxima [33].

Observa-se que a funo do pblico alterada na viso de sistema como obra de arte. Segundo Milton Sogabe,a interao propriamente dita, no sentido do pblico afetar os eventos que l acontecem, d ao pblico uma nova funo ou caracterstica, solicitando sua participao no s atravs da interpretao ou reflexo mental, mas tambm a sua atuao corporal na obra [30].

O interator atinge um estado de imerso atravs das transformaes da paisagem digital, experimentando sensao de leveza, ausncia de gravidade e movimento multidirecional. Em Osmose utiliza-se capacete de realidade virtual, recursos da computao grfica 3D e sons interativos que so explorados sinestesicamente. Tais relaes tambm podem ser encontradas nas obras do grupo SCIArts Equipe Interdisciplinar que desenvolve seus trabalhos na interseco entre arte, cincia e tecnologia e a partir da idia de sistema como obra de arte [34]. A produo do grupo procura exprimir a profunda complexidade existente na relao entre estes elementos e a representao de conceitos artstico-cientficos contemporneos que demandem novas possibilidades miditicas e poticas. A obra Por um Fio prioriza as relaes entre as diversas obras existentes em uma mostra de arte e opera com os processos paradoxais da observao humana onde interagem simultaneamente espaos virtuais e realidade, imagens em tempo real e imagens pr-gravadas. Entremeios I e II que uma obra que opera nos espaos entre obras e transforma a individualidade das obras presentes em um evento; um sistema integrado que ganha significado com a presena dos interatores no ambiente. Re-Trato, Des-Espelho e Marciso atuam com o sujeito mediado pelo Outro, pela linguagem e pela cultura os sistema so construdos de maneira que se produzam espelhos bizarros que reflitam outras faces de ns mesmos para a nossa prpria contemplao. Essas obras propem jogos de imagens no qual o indivduo se reconhea a partir de outros pontos de vista, que no o de seu prprio, mas de um outro externo e que causa estranhamento de si mesmo.

Ressalta-se, novamente, que esta atuao na obra no se restringe a uma ao definida a priori, como apertar um boto, mas uma ao de experimentao ao nvel molecular dos corpos ou elementar dos objetos tecnoestticos, uma ao de agenciamentos, agenciar estar no meio, sobre a linha de encontro de um mundo interior e de um mundo exterior. [31]. O pblico inter(ator) pertence a obra, j que, por exemplo, o espao das instalaes que era ocupado com elementos tridimensionais d lugar ao pblico que precisa se movimentar e atuar dialogando com os elementos virtuais que se atualizam [32] . Podemos observar tais relaes em obras de realidade virtual, como Osmose (1995) de Charlotte Davies,

Fig. 2 Atrator Potico de Grupo SCIArts Equipe Interdisciplinar 2005.

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Por fim, Atrator Potico e Gira.S.O.L so produes que operam com as foras no visveis da natureza. A instalao hipermdia interativa Atrator Potico constri sua potica atravs do dilogo entre imagem, som, ferro-fludo (um lquido magntico que se conforma ao campo formado por bobinas eletromagnticas) e a interao com o pblico e foi realizada em parceria com o msico Edson Zampronha. J, a obra Gira S.O.L. - Sistema de Observao da Luz - utiliza-se de uma estrutura que possui a propriedade de se organizar diante de um estmulo ambiental tal como a flor girassol. A relao entre a natureza e a tecnologia, atravs da utilizao da energia solar constri a potica da obra. A idia de sistema como obra de arte faz parte de uma viso processual e relacional do mundo que, cada vez mais, vem se afirmando em todos os campos do conhecimento. Essa ideia faz referncia obra propriamente dita, que no se apresenta, neste caso, como um objeto ou um espao fsico delimitado e visvel, mas como um sistema. As instalaes desenvolvidas pelo grupo SCIArts, desde o princpio baseia-se na idia de um sistema interligando eventos, influenciado pelas teorias dos sistemas complexos, dos campos mrficos [35], da teoria das redes [36] e do efeito borboleta [37]. A teoria geral dos sistemas surgiu influenciada por alguns tericos holistas, mas foi encaminhada, em 1950, pelo bilogo Luwig von Bertalanffy [38]. Essa viso holstica, predominante na biologia, tambm passou a influenciar a Arte. Na Argentina, nos anos 60, o Centro de Estudios de Arte y Comunicacin (CAYC), apontou para essa possibilidade trazendo a idia da Arte de Sistemas. preciso considerar o contedo semntico presente na expresso arte de sistemas e compar-lo com a expresso sistema como obra de arte que aqui est sendo proposta. No primeiro caso, h uma generalidade artstica que, de alguma maneira, se conforma em um sistema, enquanto, no segundo caso, a natureza do sistema que permite v-lo como obra artstica. H ainda uma diferena crucial no enfoque dado ao conceito de sistema, hoje, as teorias consideradas fazem suas observaes com base nos sistemas complexos. De uma maneira muito simplificada, a Teoria da Complexidade define sistemas complexos como organizaes constitudas de muitas partes heterogneas que interagem localmente sem interferncias de um controle centralizado. Segundo a abordagem oferecida por tais teorias, o universo sistmico. A economia, o crebro, os sistemas de trfego das grandes cidades podem ser descritos como sistemas que compartilham comportamentos ou dinmicas semelhantes, no obstante a diversidade, a escala, ou a natureza de suas composies. O entendimento de tais dinmicas sistmicas requer a integrao de inmeras perspectivas

oriundas das mais diversas reas do conhecimento, partindo da fsica qumica, da biologia cincia da computao, da cincia social economia, da cincia cognitiva matemtica. O tipo de abordagem que se realiza dentro da perspectiva da complexidade enfatiza aspectos da organizao, da arquitetura dos sistemas em detrimento do estabelecimento de estados individuais. O objetivo da teoria da complexidade buscar compreender como novas classes de entidades se estabelecem e permanecem, como por exemplo, sistemas qumicos autnomos, organismos vivos, estruturas cognitivas e sociedades, modelando-as no contexto de uma abrangente teoria da evoluo. Dentro de uma perspectiva de aplicao to ampla, no descabido supor que as Artes e suas prticas possam ser consideradas como objetos de estudo no campo de conhecimento configurado pelas teorias dos sistemas complexos. Aventar tal possibilidade de anlise, no implica negar ou desconsiderar outras abordagens. Ao contrrio, a utilizao de um instrumental oriundo da Complexidade se coloca aqui como uma tentativa de contribuir para a ampliao do conhecimento crtico da Arte, principalmente quando se trata de refletir sobre caractersticas emergentes como as que se apresentam nas obras de Artes Contemporneas com base nas Novas Tecnologias. As prticas artsticas de hoje e as rupturas com padres pr-estabelecidos que elas representam so tais que sua crtica, no contexto da Arte, demanda novos paradigmas e, eventualmente, a reformulao de aspectos ontolgicos da Arte. RefernciasSANTANNA, D. Corpo e Histria. In: Cadernos de Subjetividade. So Paulo: Editora Educ, 1996. [2] SIMONDON, Gilbert. Du mode dexistence des objects techniques. Paris: Editions Aubier, 1989. [3] SANTANNA, D. Corpo e Histria. In: Cadernos de Subjetividade. So Paulo: Editora Educ, 1996. [4] SANTAELLA, M. L. Sujeito, subjetividade e identidade no ciberespao. In: LEO, L. (org.). Derivas: cartografias do ciberespao. So Paulo: Annablume, 2004. [5] PANOFSKY, E. O Significado nas Artes Visuais. So Paulo: Perspectiva, 1979, p. 360. [6] GRAU, O. Arte Virtual: da iluso imerso. So Paulo: Editora UNESP: SENAC, 2007, p. 137. [7] CAUQUELIN, A. A inveno da paisagem. So Paulo: Martins, 2007, p. 114. [8] Ibidem, p.79. [9] Ibidem, p.104. [10] VARELA, F. O Reencantamento do Concreto. In: Cadernos de Subjetividade O Reencantamento do Concreto. So Paulo: Hucitec/EDUC, 2003, p. 79. [11] CAUQUELIN, A. A inveno da paisagem. So Paulo: Martins, 2007, p. 85. [12] BENJAMIN, W. Magia e tcnica, arte e poltica: ensaios sobre literatura e histria da cultura. So Paulo: Brasiliense, 1994. [1]

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[13] DIDI-HUBERMAN, G. O que vemos, o que nos olha. So Paulo: Ed. 34, 1998. [14] BENJAMIN, W. Magia e tcnica, arte e poltica: ensaios sobre literatura e histria da cultura. So Paulo: Brasiliense, 1994. [15] HILDEBRAND, H. R. As Imagens Matemticas: a semitica dos espaos topolgicos matemticos suas representaes no contexto tecnolgico. Tese de doutoramento apresentada no Programa de Comunicao e Semitica de PUCSP, 2002, p.103. [16] DEVLIN, K. Matemtica: a cincia dos padres. Portugal: Porto Editora, 2002. [17] PEIRCE, C. S. The New Elements of Mathematics. The Hague: Mouton. Ed. Eisele, Carolyn, 4 vols, 1976, p. 213. [18] HILDEBRAND, H. R. As Imagens Matemticas: a semitica dos espaos topolgicos matemticos suas representaes no contexto tecnolgico. Tese de doutoramento apresentada no Programa de Comunicao e Semitica de PUCSP, 2002. [19] BOYER, C. B. Histria da matemtica. Traduzido por Elza F. Gomide. So Paulo: Edgard Blucher, 1974, p.401. [20] COSTA, N. C. A. Ensaios sobre os fundamentos da lgica. So Paulo: Hucitec, 1990, p.16. [21] BOYER, C. B. Histria da matemtica. Traduzido por Elza F. Gomide. So Paulo: Edgard Blucher, 1974, p.401. [22] COSTA, N. C. A. O conhecimento cientfico. So Paulo: Discurso Editorial, 1997, p.113. [23] ROSENSTIEHL, P. Lgica Combinatria: Redes. In Enciclopdia Einaudi - Volume 13. Lisboa: Imprensa Nacional Casa da Moeda, 1988, p. 228-246. [24] GILBERT, S. A Gnese do Indivduo. In: Cadernos de Subjetividade. So Paulo: Hucitec-EDUC, 2003, p.100. [25] GILBERT, S. A Gnese do Indivduo. In: Cadernos de Subjetividade. So Paulo: Hucitec-EDUC, 2003, p.100. [26] DELEUZE, G. Lgica do Sentido. So Paulo: Editora Perspectiva, 1969, p. 264. [27] SIMONDON, G. El individuo y su genesis FsicoBiolgica La individuacin a la luz de las nociones de

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THE APPROACH - Arte e Neurocincia a Memria como ReconstruoMaria Manuela Lopes UCA University for the Creative Arts Farnham, UK Ectopia, IGC/FundaoCalouste Gulbenkian, PortugalAbstract A proximidade da arte e da cincia questionada e construda pela utilizao de imagens processos e materiais semelhantes em circulao por diferentes contextos. O projecto THE APPROACH tido como reflexo da capacidade de reconstruo da memria e da sua relevncia na auto-identidade A exposio serve como ponto de partida para uma investigao artstica em torno do Universo cientfico da doena de Alzheimer. No percurso desenha-se: a tecnocincia e a inscrio de Latour e o discurso e corpo dcil de Foucault como fronteiras conceptuais, a arte como contexto performativo; as ferramentas, processos, tecnologias de visualizao, materiais e sujeitos dos espaos da investigao mdico cientfica da Demncia da Faculdade de Medicina de Lisboa como lugar e contexto de circunscrio e a inteno de questionar as estratgias de representao da relao entre memria e auto-identidade numa primeira apresentao como instalao artstica. Index Terms Arte, biologia, imagem, memria, neurocincia.

I. Introduo A relao entre as artes e as cincias tem sido sujeita a permanentes mudanas nos ltimos dois sculos perdurando o dinamismo nas suas proximidades. Robert Zwijnenberg [1], historiador de arte do TAGC Holanda, afirma que esta relao incerta e cambiante da arte e da cincia tem a ver com o facto de ter sido apenas no sculo XIX que a arte e a cincia definitivamente se separaram, evoluindo para domnios mais ou menos autnomos que hoje conhecemos Durante sculos arte e cincia existiram numa relao prxima; s com o advento da cincia moderna as duas se separaram. Hoje na idade da biotecnologia ou da tecno-cincia (termo cunhado por Bruno Latour e Donna Haraway tentando descrever a complexidade da produo de conhecimento e a necessidade de reajustar a definio de cincias naturais categoria correspondente nos modelos da cincia do sc xx), a linha demarcante da diviso entre os dois domnios parece estar de novo a mudar. Transgresses tomam lugar; contudo, no existe um desenvolvimento brusco e as mudanas so visveis desde o fim do sculo xix. Se existe uma longa histria de narrativas que mostram uma diviso fundamental e inultrapassvel entre a arte e a cincia podemos encontra uma igualmente extensa narrativa de tentativas de enfatizar a sua consonncia.

Nos ltimos 30 anos viram-se crescentes colaboraes entre artistas e cientistas por razes diversas e complexas. De acordo com Ingeborg Reichle [2] Uma das razes mais decisivas ser o facto da tecnologia e da cincia se terem tornado fundamentais nas sociedades modernas. Nas ultimas dcadas tem se sentido um esforo das artes no aproximar da cincia atravs da participao nas praticas cientficas [3] . Projectos de intercmbio entre artistas e cientistas, como os artists in Labsna Suia, tm-se tornado mais comuns e um alargado nmero de organizaes tem emergido estimulando e iniciando a colaborao de ambos os lados da fronteira (em Portugal temos o caso da Ectopia IGC Fundao Calouste Gulbenkian e dos programas de residncia da Cincia Viva e DGArtes). A frequente separao postulada entre arte e cincia tem sido negada, frequentemente por artistas, simplesmente porque os cientistas sempre se permitiram serem conduzidos por aspectos estticos nas suas investigaes [4] tem sido apontado o facto de que ambos se aproximam de formulaes visuais e expresses das suas ideias e conceitos em termos semelhantes. Alem dos critrios estticos e experimentalistas de ambas as disciplinas a aproximao da abstraco tambm tem sido referida como tendncia comum. Em 1960 Robert Schenk, professor no Instituto de Anatomia de Basel, na Sua, referia que as razes da aparente coincidncia formal entre a arte e cincia, as relaes de proximidade, assentavam na atitude analtica do clima intelectual, tendo na abstraco uma possibilidade de aproximao essncia das coisas. A esse abstraccionismo segue-se a re-visualizao dos achados de investigao mdicos e cientficos que ainda perdura. Na histria das imagens cientificas, observao, permanece uma importante atitude desde a Renascena e as imagens e smbolos tem sido veculos de conhecimento desde o inicio da nossa cultura. O objecto de escrutnio mais visado tem sido a imagem, tida como criadora de analogias entre a natureza e a sua simulao ou representao. Hoje a proximidade da arte e da cincia toma formas diversas desde o tratamento iconolgico das imagens cientficas a processos de manipulao de material biolgico em laboratrios de biologia molecular. Estas entradas dos artistas nos laboratrios (e as apresentaes consequentes de projectos de manipulao biolgica, performance cientificas ecolgicas ou explorao de

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imagem e formas informadas pela cincia) no s tem levado a um profundo questionamento sobre categorias como cultura, natureza ou humano, como considerao de novos panoramas sociais de futuro, com novas tecnologias, profilaxias e teraputicas e provavelmente a mais um reaproximar de questes filosficas e sociais do universo cientifico. II. Ver, Saber, Recordar As novas tecnologias de visualizao (macro e micro) e construo da realidade biolgica, como a descodificao do genoma, a imagem no invasiva do corpo in vivo ou as prticas recombinantes da medicina molecular, alteram a nossa noo de natural, tecnolgico e humano, desafiando noes de escala e de espao. Num tempo em que a primazia do racional, do sujeito cerebral [5] nos traz, inclusive, conceitos de morte (morte cerebral) distintos dos que aprendemos com os avs (morte do corpo por paragem cardaca), interessa-me questionar as relaes de dependncia da capacidade cognitiva memria - na construo de quem somos, do que vemos e do que e quem amamos. A minha prtica e investigao tem sido baseados em conceitos pessoais e subjectivos de memria e autoidentidade, assentado na utilizao dos novos media e recentemente de materiais biolgicos. Tenho dirigido simbolicamente ateno aos processos de memria e lembrana recorrendo a apropriao, enquadramento, seleco, construo, montagem e edio. Neste processo, imagens, materiais e experincias e ausncias so manuseados, produzidos e consumidos. Vivemos numa poca em que questes de memria so facilmente relevadas para segundo plano temos equipamentos e tecnologias que contribuem para novos rituais de preservar os eventos para (mais tarde recordar) os usufruir quando tivermos mais tempo. Temos aparelhos auxiliares que nos despertam e alertam para o arroz estar cozido, horas de acordar, telefonar ou encontrar algum, ou mesmo o que temos de fazer num dia, numa aula, num evento. No obstante a questo do envelhecimento da populao e da degenerao das capacidades cognitivas associadas longevidade do corpo so objecto de muitos estudos em reas diversas. Pessoas que desenvolvem incapacidade cognitiva ou demncia podem beneficiar dos materiais, aparelhos ou tecnologias acima descritos, mas as mesmas perdem progressivamente sentido como dispositivos de exteriorizao de memrias e tornam-se complexos puzzles. Desde os anos 70 que a investigao cientfica tende para um mtodo de sistema de mltipla memria, centrada em estudos neuropsicolgicos de pacientes com leses cerebrais [6], informada pela imagiologia. A memria, pode afirmar-se, construda de muitos fragmentos, tipos, sistemas e processos. Sugiro que pode

ser evocada pela montagem, justaposio e pela instalao.

pela

sobreposio,

Fig. 1 distncias da paisagem projectada THE APPROACH.

luz de diapositivo

Fig. 2. distncias da paisagem impresso em vidro, projecto THE APPROACH.

THE APPROACH surge do foco em imagens produzidas nos estudos de doena de Alzheimer e no estabelecer de uma ligao critica dessas imagens aos estudos visuais e s artes plsticas. Alguns artistas que trabalham hands on com os processos biolgicos apresentam, segundo Jens Houser (um critico e comissrio de arte e biotecnologia) averso ideia de representao, assumindo uma distino ontolgica entre representao e o que ela diz representar. Zwijnenberg [7] questiona a existncia desta distino nas cincias ditas naturais. Vrios ensaios foram escritos sobre o estatuto da imagem, da visualidade e da representao na cultura contempornea, inclusive o como ela moldada pelas tcnicas de visualizao. Por exemplo Jonathan Crary [8] centra-se na forma de observar incorporada. Crary examina como as prticas culturais foram condicionadas pelos dispositivos pticos como a cmara obscura, panoramas, lanternas mgicas, caleidoscpios e estereoscpicos assim como em outras

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formas de visualizao levando os seu estudos at aos discursos e s tecnologias modernistas pr-digitais. Subjectividade e viso foram formuladas de novas maneiras, assim como perspectiva e ponto de vista foram cruciais em conduzir estas transformaes. Alguns estudos centraram-se na transparncia e na visualizao do interior do corpo, uma experincia somente possvel atravs do desenvolvimento dos raios X pelo prmio Nobel, Wilhelm Rontgen em 1895 e das tecnologias mdicas associadas radiografias, ecografias, TAC, IRM, etc. O estudo pioneiro de Liza Cartwright [9] ,Screening the Body: Tracing Medicine's Visual Culture, dedicado s histrias cruzadas do olhar no cinema e na medicina (Raios X) analisados numa perspectiva de estudos culturais. Bettyann Kevles [10] no livro Naked to the Bone dedica-se ao impacto sociocultural da radioactividade nos artistas do sculo XX. Ela afirma que o impacto de ver o corpo transparente ofereceu a artistas como Picasso, Frieda Kahlo, Du Champ e De Kooning novas possibilidades de imaginar e apresentar a forma humana. Declara que o raio X assim com as imagens digitais providenciaram ferramentas para revolucionrios, como Cartwright refere o cinema e o vdeo como referenciais de encontro dessa imaginao popular que penetra barreiras. Barreiras essas no mais intransitveis como as da pele que passa a ser encarada como interface e permite reflexes como as do trabalho de Orlam ou do comissrio Hauser com o projecto sk-interfaces, mostrado em 2008 em Liverpool. Jos van Dijck [11] prossegue os estudos de Cartwright considerando tecnologias mdicas e dos media como instrumentos de representao produzindo significados que contm nas suas coordenadas o momento histrico e so equivalentes a um entendimento de como o conhecimento medico construdo e apresentado. Van Dijck defende que o aumento da visibilidade associa-se complexidade da informao visual e esconde mais escolhas ticas. Ver e imaginar associa-se a responsabilidade de mostrar o interior, reflexo dos interesses paralelos entre as classes cientificas e mdicas e os media e ao papel da representao do corpo nos valores como perfeio, doena, plasticidade, privacidade e integridade. Existem vrios estudos histricos sobre as origens e o desenvolvimento das tcnicas de imagiologia mdica [12] e sobre a hermenutica de prticas visuais nascidas de visualizao de cincia [13] Barbara Stafford [14] no seu livro Body Criticism centra-se nas estratgias comuns arte e medicina no Iluminismo como a dissecao, a abstraco e a marcao, tudo contribuindo para uma exteriorizao do corpo interior/invisvel, contribuindo para a integrao da visualizao com o conhecimento. Bruno Latour e Steve Wolgar [15] no estudo seminal sobre a vida no laboratrio entrelaam discursos de investigao em biotecnologia com a produo de factos e conhecimento

com imagens do corpo transparente usando uma aproximao etnogrfica. Joseph Dumit [16] outro antroplogo interessado na imagem mdica, defende uma ligao directa entre os actos de uma pessoa e as imagens cerebrais representando-os, assumindo que para o olhar no especializado das imagens mdicas so tidas como fotografias de como ns somos e aparecemos. Ele centra-se na mudana de significados e usos das imagens de tomografia (PET) quando saem do laboratrio para outros contextos como revistas, jornais cientficos ou tribunais. Outra perspectiva adoptado por Suzanne Anker e Dorothy Nelkin no livro The Molecular Gaze [17] onde reflectem sobre o uso de materiais e processos de biologia por artistas e analisam algumas colaboraes entre arte e cincia onde se interrogam noes de personalidade, auto-identidade e memria autobiogrfica (no meu entendimento da auto experimentao como processo). Alguns outros livros e artigos como o Signs of Life de Eduardo Kac [18] ou o Picturing Science Producing Art de Caroline Jones e Peter Galison [19] ou ainda James Elkins [20] centram ateno nas diversas utilizaes de imagens e processos das cincias em arte e do inverso do quanto as metodologias cientficas fazem parte de um contexto socio-cultural. A minha investigao provoca especficas circulaes e dedica ateno migrao dos processos, materiais e imagens da rea de investigao mdica e biolgica da perda de memria. Numa perspectiva prxima dos etngrafos exploro a montagem, a circulao e a reconstruo de estratgias de representao dos laboratrios de neurocincias para e no o estdio e no local de exposio. As cincias sociais e os estudos de cultura visual tem dedicado ateno s imagens criadas pelas tecnologias de imagiologia como resultado de mediaes complexas entre peritos e tecnologias, assimilao e reconstruo [21]. Estes estudos disputam assumpes de que as imagens so representaes e produzem evidncias de processos escondidos do olhar; requerem um questionar ento do que uma imagem e a conscincia da natureza altamente construda das imagens do crebro. III. Laboratrio, Estdio. No laboratrio inscries ou traos - exemplos, grficos, esboos, arquivos segundo Elkins [22] desafiam a um reconsiderar do estatuto e funo da imagem per se. As imagens de Neurocincia podem ser entendidas como ferramentas performativas de informao [23] o que parece assentar numa viso pragmtica do que significa representar. Como Nelson Goodman e Catherine Elgin [24] apresentam em 1988 a semelhana no condio suficiente para a representao. Por exemplo as cores das imagens cerebrais no se assemelham s funes cerebrais que implicam, so modelos estatsticos que tornam

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disponveis a relao entre os elementos numricos e picturais que compe a imagem e permite operar com a imagem. Ento representar entendido como a propriedade que permite operar com a imagem, no a substituio de outra coisa, uma operao que permite situaes de escala reduzindo a meu ver o assunto a um fragmento, um paciente a uma doena, um sintoma a uma imagem. Esta relao das fronteiras est implicada no processo de construo do trabalho onde se questiona o valor do objecto/imagem na sua alterao dentro e fora do contexto institucional e cientfico, na fruio subjectiva recorrendo a memrias, sensaes e antecipaes valorizando o mrito esttico e a proximidade em detrimento da valia epistemolgica e da estrutura de poder e legitimao. Se no laboratrio as imagens so lidas dentro do que chamou Foucault [25] discurso mdico e da prtica cientfica, no estdio ou no exposio so re-actuadas debaixo de pressupostos culturais. Neste projecto considerei 4 espaos de circulao que eu constantemente exploro, correspondo, articulo e questiono. Estes espaos so: 1 - o laboratrio de Biologia Molecular e Celular de Neurocincias; 2 - O laboratrio de estudos de Demncias (com a parte clnica, a sesses de neuropsicologia e as capturas de ressonncias magnticas ou TAC):; 3 - O estdio; 4 - O espao do pblico como referncia ao do paciente (a sala de espera, a cadeira do consultrio, o seu corpo, etc). THE APPROACH surge explorando montagem e circulao de imagens e experincias entre as vrios espaos organizados e quasi asspticos (o laboratrio ou a galeria) ou altamente emocionais e quasi caticos (o hospital e o estdio). Surge comparando os espaos entre as diferentes tenses e ritmos, a zonas de ajuste, onde se articula a auto conscincia, a memria e projecta aces futuras.

Fig. 4. imagem impressa em vidro do projecto THE APPROACH.

O projecto THE APPROACH foi para mim um verdadeiro teste aproximao de um espao e assunto que implica uma estrutura de investigao complexa e um questionamento tico permanente encompassando o desafio esttico. Dificilmente distancio a materialidade e espacialidade com que se apresentou o projecto das relaes intrnsecas ao pensamento e experimentao, de como estruturar a minha tese de investigao. Sinto latente a problemtica de definir sobre qual memria est a ser escrutinada, a auto-identidade de quem ou a importncia de contribuir para um conhecimento que tem de ser disciplinarmente reiterado. A importncia do material de suporte recai sobre a necessidade de definir uma estrutura que permita ver alm (atravs de) disciplinas mantendo na fragilidade (intrnseca ao vidro) a capacidade de coerncia num suporte e transporte de contributo no campo das artes visuais. Num exerccio de separar a materialidade do trabalho da sua co-constituio na relao observadorobjecto, as particularidades sobre as quais gostaria de elaborar so: superfcie, mtodo de obteno das imagens, organizao no espao dos materiais e a justaposio. Materiais de superfcies apresentados: Vidro, retro impresso fotogrfica a cor, luz de projeco de diapositivo. IV. Galeria. Quando se entra no espao expositivo est-se na presena longnqua de uma paisagem em trs superfcies reflectoras justapostas e pousadas no cho. A paisagem proposta uma mistura duma assemblagem de imagens mdicas de neuroanatomia, delineadas a cinza como um desenho de contorno e alguma cor quase invisvel, com uma imagem espectral do local da exposio; ou melhor do limite exterior da sala de exposies. De repente o observador apercebe-se que num funcionando como um espelho o seu prprio corpo j parte integrante dessa

Fig. 3 imagem impressa em vidro do projecto THE

APPROACH.

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paisagem. Com o aproximar acrescenta a presena de quatro imagens suspensas, a cor, tambm impressas no centro de vidros, mas no distingue ainda o assunto que abordam. Com o subsequente caminhar, uma luz de diapositivo invade a zona central da paisagem no cho junto parede. Como que num jogo de seduo, revela/esconde, agora que o observador se sentia capaz de distinguir os contornos dos desenhos que em fragmentos compem essa paisagem montanhosa aparentemente familiar, a luz que a invade sobrepe-se capacidade ocular de focagem e impele a deciso recuar, avanar, afastar-se ou manter-se imvel. As opes de mobilidade podem levar a que a luz se apague passados uns segundos ou a que permanea accionada, no entanto, fora do eixo central dela a observao da imagem geral permite aferir do que se trata. Na opo de imobilidade o cerne recai sobre a mancha de luz provocada sobre os vidros e as consequentes sombras projectadas pelos desenhos na parede atrs do vidro. Ao observador paciente lhe dado acesso a um novo momento, a descoberta de que a mancha de luz respira, no som do dispositivo e contorno de luz que encolhem e esticam em movimentos compassados de retraco e expanso ao que se segue um sentir no seu prprio corpo esse eterno movimento que em memoria do sistema nervoso autnomo nos permitem seguir vivendo. Em THE APPROACH dados (imagens mdicas e de processos cientficos) como metforas visuais so extrados do contexto de laboratrio e inseridos nas leis e na manipulao do contexto cultural. Intersectando e justapondo imagens correspondentes a trs espaos distintos (dois cientficos e um pessoal e criativo), cincia tornada um assunto pessoal, subjectivo, interpretao e reconstruo. O processo medeia e apropria-se da tenso entre facto /fico, verdade/construo inerente utilizao de imagens de cariz cientfico. Na recolha e seleco de imagens desafio a reflexo do que prende o meu olhar, onde repousa o meu fascnio se imiscui com a repulsa. Porque escolho estes fragmentos e os articulo deste modo? Identifico aspectos formais e critrios que me permitem relacion-las como a afinidade com a visibilidade, a relao com a memria dos pacientes, a ligao com a minha memria, com o processo de diagnstico, de construo de modelos, de processos teraputicos, aspectos formais, propriedades espaciais, distraces, surpresas e outros critrios improvveis de se tornarem palavras. Transparncia e sobreposio so manipulados como metfora do corpo dcil [26] e transparente das praticas mdicas, sociais e cientficas ocidentais, e tambm do arquivo composto de sucessivas camadas de informao sobrepostas. Transparncia associada inspeco mdica TAC/PET/RM e s prticas cinemticas que utilizo no meu trabalho (vdeo projectado, projeco de diapositivos, instalao,...). H

uma qualidade lumnica que exploro e que torna visvel a negociao inter-actuante do espectador com o objecto. A luz interage subtilmente nas possibilidades de visualizao da poro ou do todo, inversamente proporcional proximidade do espectador, encostandose tradio da pintura. Um outra relao da luz com a visibilidade a declaradamente interactiva que se acende em projeco de diapositivo vazio sobre o painel central a paisagem quando existe approach (aproximao). Estes modos de interaco luminosa so uma forma de reintroduo do temporal e relativo do processo do prprio construir da imagem subjacente a recolocao do evento no domnio da experincia incorporada e do subjectivo retirando nfase ao domnio do objecto imagem e da representao. A luz do vazio alude num segundo momento ausncia, ao apagar por excesso no processo aditivo da imagem projectada (as cores somadas resultam em branco) e ao apagar por omisses no processo degenerativo da demncia. Intencionalmente no existe a cor branca nas imagens deixando a norma (branca) do local expositivo imperar como fundo/contexto de leitura da obra. Acrescenta assim toda a textura e vivncia (marcas, fissuras, alteraes de cor) das superfcies de contacto dos suportes dos vidros suspensos ou reclinados sobre as paredes do espao, como se a prpria histria do espao se inscreve-se nesta obra tambm. Decidi sobrepor camadas de imagens (sem o fundo) em suporte transparente. Imagens essas adquiridas em publicaes referentes aos processos desenvolvidos nos diferentes laboratrios e no meu estdio. Uma imagens dos desenhos da paisagem do meu atelier (cpia de contorno das paisagem de Czanne) , outra imagem das publicaes de imagens do crebro (correspondentes aos processos do laboratrio de Demncia) e outra dos processos que acompanho no laboratrio de medicina molecular e celular. Como ainda no tinha acesso aos pacientes a camada que potencialmente lhes poderia caber foi substituda pela imagem reflectida do observador no espao expositivo. Nesse perodo tinha no meu estdio uma imagens das pinturas de Czanne como recordao de uma exposio e de uma conversa com a minha supervisora principal de investigao Kathleen Rogers. Essas imagens levavam-me simultaneamente para uma experincia pessoalmente vivida e para uma metfora da construo da identidade artstica atravs do processo de cpia e repetio, reconstruo e representao. Czanne regressava anualmente mesma localizao para pintar a mesma paisagem essa ideia reverberava na minha cabea quando decidi comear a copiar algumas dessas linhas de paisagem to ensaiadas por ele. Simultaneamente decidi retomar os testes neuropsicolgicos a que os pacientes com perda de memria tem de se submeter. Destes testes constam exerccios de cpia, nomeao, tarefas, reconhecimento, etc. Muitas vezes a necessidade de conhecer uma dimenso por mim substituda por desenhar imagens dela como se a cpia constante

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informasse a um nvel de quem visita um espao e ao fim de um tempo com a familiarizao entra nele sem dar por isso e atenta ao que l se passa em vez de ao espao em si. V. Reflexo Esta tentativa de articular as imagens destas localizaes diversas e conceber e produzir uma exposio a partir da, foi o primeiro ensaio de formao de uma construo multi-espacial que enfatizasse essas 4 localizaes distintas com naturezas e ecologias diferentes construindo a possibilidade de uma nova experincia e atentando questo do lugar na constituio da pessoa e do discurso e tambm constante necessria nas mediaes (inscries) na produo de significados. A sobreposio, ou montagem por colagem, no s interna s impresses mas da prpria organizao espacial e da luz a incidir nos vidros, alude necessidade de constante reposicionamento e ajuste da nossa coerncia e verdade que a memria, no seu processo de constante reviso e reconstruo nos impe na perspectiva de uma continuidade sentida e da aceitao e projeco de uma imagem de ns para o exterior. Reflectindo e analisando algumas das imagens (em sentido lato onde incluo gestos e processos e informao contextual) das memrias e experiencias que recolho dos laboratrios as respostas so de intriga, repulsa, atraco ou incompreenso trazendo no geral um desafio. Por vezes consegue-se perceber uma durao, ou denotar um sofrimento ou perda, normalmente a essas associo ideias de semelhana ou presena/ausncia do corpo. Outras so mais frias e silenciosas, nitidamente mapas ou arquivos de informao, guias no esforo do entendimento cientfico da complexidade. Algumas nitidamente geram potencial conhecimento ou diagnstico outras (bioconstrues celulares em gelatina de agar, protenas em lquidos suspensos em frascos eppendorf, ou outros gestos e processos de laboratrio) so s existentes no sentido de que uma imagem o quando fixada num suporte de registo. Apesar de as agregar na minhas memrias e encontros com a sua produo inicial sinto nelas o resduo de potencial plstico que pretendo articular ao consider-las como material de explorao artstico. Uma imagem cerebral de uma determinada pessoa construda por um software guia baseado em inmeras marcaes, mapas e imagens de outros corpos. O fascinante que mesmo o olho treinado capaz de integrar, ver e interpretar esta multitude de imagens (camadas, fatias de dados) admite margens para ambiguidades retirando o papel objectivo de uma imagem fotogrfica de um objecto. Exploro essa ambiguidade enfatizando a visvel sobreposio de camadas, devolvendo ao assunto alguma complexidade perdida na falsa objectividade da imagem mdica e

aumentando a ambiguidade sobrepondo registos de assuntos e lugares diferentes ( os 3 espaos mencionados). Segundo Ron Burnett [27] as imagens sempre funcionam como interface que estrutura a interaco entre as pessoas e o ambiente. Neste caso so um modo de estruturar as pistas e rastos de um processo tecnolgico como um padro de estado biolgico. Os rastreios cerebrais aglomeram vrios elementos numa forma de apresentar uma coerncia e uma anlise emprica potencial sobre os resultados de um processo. Em THE APPROACH so apropriadas pela aproximao do interior do corpo, a par de outras tecnologias de visualizao com tradio mimtica, como o desenho, o Raio X ou a fotografia, pela riqueza reconstrutiva que apresentam aproximando-se duma ideia de exemplificao da interdependncia da natureza e da cultura [27]. Nesta perspectiva aproximando-se das sobreposies fotogrficas da Suzanne Anker na srie Laboratory Life[28]. De acordo com Reichle no seu artigo [28] Where Art and Science Meet S. Anker foca no seu trabalho a representao de espaos cientficos, modelos de biologia molecular e o acto de transformar objectos que estavam antes no domnio cientifico para veculos de significado em reas diferentes de conhecimento. A questo de como a imagem excede a sua base material tem sido debatida ao longo da histria das imagens e do crescente uso delas em todos os domnios sociais, culturais e cientficos. Hoje, e nesse sentido, entende-se a possibilidade de image-worlds propostos por Burnett. As imagens formam a base onde desde sempre foram definidas as nossas necessidades de projeco para o exterior, permanecendo o pensamento por imagens como um acto humano fundamental. Contudo, so uma forma de prover significados em aberto sem absolutismos ou completudes, dai o crescente e permanente interesse do produtor e observador nesse meio como instrumento de troca, negociao e comunicao. Novas consideraes despertam complementado a tarefa critica em processo: o valor epistemolgico destas imagens e as redes de construo nos processos de escala e representao implicados, a responsabilidade tica do olhar o devir do outro, o possvel impacto psicolgico de uma reinterpretao artstica dessas imagens, os significados atribudos pela comunidade cientfica e os significados colocados pela experincia do projecto num contexto artstico.

Agradecimentos Esta investigao tem o apoio de bolsa da FCT, SFRH/BD/37721/2007.

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Materializao e Virtualizao nas MediaMilton Terumitsu SogabeInstituto de Artes da Univ Estadual Paulista, So Paulo, SP, Brasil.Abstract A realidade aumentada traz o conceito de uma realidade fsica misturada com uma realidade virtual, ampliando assim a realidade. Neste artigo apontamos para o fato de que a realidade sempre misturada e ampliada, desde as primeiras imagens criadas pelo ser humano, atravs das diversas media que ampliam a realidade, cada qual com sua especificidade. O conceito de representao est aqui presente tanto no contexto das imagens artesanais quanto no das imagens de sntese que criam a realidade virtual, porm cada tecnologia representando imageticamente diferenciados aspectos dos objetos representados. Index Terms Imagem, media, representao, realidade virtual e realidade aumentada.

I. Introduo Na histria dos processos de construo de imagens encontramos dois aspectos concomitantes, a compreenso de certas leis da natureza e a traduo dessas leis pela linguagem visual, a qual ns utilizamos para representar vrios aspectos da realidade e o nosso prprio pensamento. As representaes visuais acompanham o desenvolvimento tecnolgico, que materializa o conhecimento humano de cada poca, e nesse sentido, os meios de produo de imagens so produtos e produtores de cada poca, formatando interpretaes sobre o real, construindo uma viso de mundo e at parte desse mundo. Imagem e real esto sobrepostos cognitivamente desde as primeiras imagens construdas pelo ser humano e nesse sentido, representao e representado so afetados mutuamente, esto conectados e definem o nosso pensamento. Na definio de signo, Peirce [1] declara que Estar em lugar de, isto , estar numa tal relao com um outro que, para certos propsitos, considerado por alguma mente como se fosse esse outro. O pensamento por imagens mentais e/ou imagens fsicas utilizando-se de relaes e sinteses, acontece pela justaposio e sobreposio de imagens de contextos diferenciados, construindo falsidades ou reflexes sobre o mundo. Podemos refletir a partir de duas imagens mentais, analisar uma pintura atravs de outras imagens na mente, e comparar duas imagens impressas revelando uma nova imagem mental. A construo de imagens e visualizao se constitui sempre como uma maneira de pensar o mundo. Nesse processo, a fotografia um marco na materializao das observaes dos aspectos pticos do mundo fsico, resultado do conhecimento foto-

qumico, ptico e mecnico. O sonho de construo de uma imagem que represente o mundo, tal e qual ns o vemos, parece realizado com a fotografia, mas com o tempo percebemos que a fotografia apenas mais uma maneira de registrar o mundo. Porm, essa maneira nova e acrescenta na imagem mais um novo aspecto da realidade, diferente dos aspectos revelados pela pintura. A fotografia revela aspectos alm do nosso olhar, ultrapassando a nossa sensibilidade luminosa, temporal e espacial, indo alm da faixa do espectro eletromagntico da luz branca e materializando imagens de um mundo s imaginvel at ento. A partir da fotografia as tecnologias da imagem extrapolam o ultravioleta, o infravermelho e vo alm, permitindo um aprofundamento na observao e compreenso do corpo e do planeta, atravs da materializao imagtica pelas novas sensibilidades tecnolgicas que se diferenciam do ser humano. As imagens de raios X do corpo humano, a visualizao da temperatura dos oceanos pelo infravermelho e muitas outras vo ampliar nossa viso sobre o corpo e o planeta. [2] Essas imagens ultrapassam a construo da configurao das formas visveis pelo ser humano, e penetram nos objetos revelando configuraes internas e caractersticas no visveis ao nosso olhar, aumentando as informaes sobre os objetos registrados. Embora no temos viso de raios X, nossa mente passa a pensar o corpo atravs dessas imagens, ampliando nosso modo de ver, que sempre uma interpretao, diferente do conceito de olhar inocente, um olhar puramente optico. Alm das configuraes externas e internas do corpo e de outros elementos da natureza, as tecnologias da imagem tambm vo representar o movimento, seja atravs das sombras chinesas, do desenho animado, do cinema, do vdeo, cada qual revelando uma nova caracterstica espao-temporal. Com a tecnologia digital materializamos outro grau de conhecimento do ser humano sobre o ambiente e sobre si mesmo, permitindo representar atravs de linguagens simblicas aspectos do mundo que ultrapassam as leis pticas, a aparncia externa, interna ou o simples movimento, e passam a incorporar leis de processos internos e comportamentais das coisas, produzindo uma imagem que parece ter vida prpria, tal qual o objeto que ela representa. Depois desse processo, comeamos a vivenciar a realidade fsica com a presena dessas imagens como se tivessem ultrapassado para este lado do monitor, habitando os objetos fsicos reais em frente aos nossos101

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!olhos, com a denominada realidade aumentada. Esse resultado obtido atravs da composio de duas imagens diferenciadas, que provocam a sensao de uma imagem estar presente na realidade fsica. II. Representao Visual De acordo com Peirce [3] O signo representa alguma coisa, seu objeto. Representa esse objeto no em todos os seus aspectos, mas com referncia a um tipo de idia que eu, por vezes, denominei fundamento do representamen. A representao visual constri signos visuais que carregam certos aspectos e no todos do objeto representado, e a cada tecnologia e media visual, um novo aspecto desse objeto vai sendo representado, num aprofundamento da sua representao. Nessa busca encontramos graus de representao, e a cada etapa ampliada a complexidade dos aspectos representados. III. Representao Icnica Segundo Peirce [4] Um signo pode ser icnico, isto , pode representar seu objeto principalmente atravs de sua similaridade, no importa qual seja seu modo de ser. A observao da aparncia visual das formas no mundo e a representao dessas qualidades formais num plano bidimensional ocupam grande parte da histria da pintura, centrada na mmese, que se torna por um perodo dessa histria, uma cincia ptica, na qual o conceito de olhar inocente predominou por um tempo. [5] A observao do mundo e a representao por similaridade levou a uma construo de uma linguagem visual, desde os primeiros registros grficos, evoluindo com as observaes e as representaes dessas observaes, acrescentando detalhes de proporo, volume, figura-fundo, luminosidade, profundidade de campo, e outros aspectos que levaram a um realismo pictrico. A perspectiva renascentista faz parte dessa cincia, descobrindo leis geomtricas no mundo fsico e construindo uma imagem que incorpora essas leis na sua estrutura, pelo menos do ponto de vista monocular do observador. As leis geomtricas dos objetos reais representados no espao bidimensional acontecem na transferncia ponto a ponto, de uma realidade tridimensional para uma bidimensional. A materialidade com que a imagem construda tambm faz parte desse processo e a tinta a leo alcana a iluso da transparncia matrica da pintura como se fosse o vidro de uma janela atravs da qual contemplamos a natureza.

Fig. 1. Desenhista da viola. Gravura,1525, Albrecht Drer.

A. Composio de imagens artesanais. Alm da representao de novos aspectos da natureza, o que nos interessa tambm a utilizao composta de imagens para a representao ou reflexo, pois esta caracterstica que est presente na realidade aumentada. A colagem se utiliza basicamente do recurso da sobreposio de elementos de realidades separadas num mesmo contexto, para produzir um novo significado. No campo da imagem artesanal, alm da colagem para construo de novos contextos antes no existentes, tambm encontramos outras formas como no Surrealismo, onde a coexistncia de situaes adversas constri uma nica realidade geralmente onrica. O Cubismo com outros referenciais de espaotempo, tambm cria em uma nica imagem a simultaneidade de espaos em tempos diferenciados, e embora sejam da mesma realidade, ampliam-na inserindo um referencial temporal. As panormicas que tem origem na antiguidade, e principalmente em final do sculo XVIII, quando realizam pinturas gigantescas que envolvem as paredes circulares de um espao especfico, provocam no pblico a sensao de estar inserido dentro daquela realidade. Para abrigar os panoramas, Robert Baker imaginou uma estrutura arquitetnica circular, a rotunda, iluminada na parte central por uma clarabia, contendo duas plataformas de observao em dois nveis, onde o espectador poderia visualizar a imagem e seus detalhes. [6] A pintura tambm est presente no teatro atravs da cenografia, misturando-se com os atores reais e construindo realidades diversas que o pblico vivencia num mesmo espao. Manovich [7] relata sobre um fato do final do sculo XVIII, na Russia: De acordo com o mito histrico, no final do sculo XVIII, a rainha Catherine, a Grande, decidiu viajar pela Russia para observar com os prprios olhos, como os camponeses viviam. Oprimeiro ministro e

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!amante de Catherine, Potemkin ordenou a construo especial de vilas cenogrficas ao longo do percurso programado. Cada vila consistia numa sequncia de fachadas. As fachadas voltadas para a estrada eram situadas numa distncia considervel para esconderem sua artificialidade. Como Catherine nunca saiu de sua carruagem, ela voltou de sua jornada convencida de que todos os camponeses viviam felizes e em prosperidade. No cinema tal como no teatro so construdos diversos tipos de cenografias, porm no cinema a cenografia enquadrada de uma maneira que o resto do espao onde se encontra no aparece na imagem, criando uma maior iluso, como no caso de Catherine, o que no acontece no palco de teatro, onde vemos uma cenografia o tempo todo. IV. Representao Indicial A representao indicial embora mantenha uma similaridade com o objeto, difere da icnica pela sua conexo fisica com o objeto representado, onde essa relao acontece ponto a ponto, atravs de algum fenmeno fsico e no pela observao e representao humana. As fotografias, especialmente as do tipo `instantneo, so muito instrutivas, pois sabemos que, sob certos aspectos, so exatamente como os objetos que representam. Esta semelhana, porm deve-se ao fato de terem sido produzidas em circunstncias tais que foram fisicamente foradas a corresponder ponto por ponto natureza. [8] Outros aspectos presentes na representao icnica, tambm podem estar presentes na representao indicial, como o caso da perspectiva que est incorporada na mquina fotogrfica, com su