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1 O JINGLE E O JINGLE ELEITORAL Carlos Manhanelli Os jingles estão entre nós como espectros . Sempre nos rondando o tempo todo, e há mais tempo do que imaginamos, eles se fazem presentes. Não adianta resistir: quando menos esperarmos, estaremos cantarolando, assoviando ou batucando com as mãos algo do tipo “Tá na hora de dormir, Não espere mamãe mandar”, “Passa passa o talco Rossi”, “Pipoca na panela, começa a arrebentar/Pipoca com sal, que sede que dá”, Não adianta bater, eu não deixo você entrar”, O tempo passa, o tempo voa”, Estrela brasileira, no céu azul” ou Dois hambúrgueres, alface, queijo, molho especial, cebola, picles e um pão com gergelim”.Não adianta pedir para a cabeça esquecer, o jingle entra em nossa mente e ali dura por muitos e muitos anos. Com rimas e frases de fácil absorção e melodias e arranjos bem bolados, já se vão mais de 70 anos de história de jingles no Brasil. Antes dos anúncios musicados, os mascates foram os precursores do anúncio público de produtos, através dos pregões, assemelhando-se muito com os jingles usados atualmente. José Ramos Tinhorão assevera que "a ideia de usar frases musicais para atrair compradores não era nova, pois, pelo menos desde o século XIX, os vendedores de rua usavam esse mesmo esquema embora confiando apenas no alcance da própria voz ao gritar suas mensagens sob a forma de pregão". Seu livro Música popular Os sons que vêm da rua dedica, inclusive, um capítulo a esses pregões comerciais: baleiros, sorveteiros, amoladores, etc. (SIMÕES, 1990, p. 171) A letra abaixo, cantada por um sorveteiro no Rio de Janeiro, demonstra claramente a proximidade: Sorvetinho, sorvetão Sorvetinho de ilusão Quem não tem 200 réis Não toma sorvete não Sorvete iaiá É de quatro colidade (sic)

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    O JINGLE E O JINGLE ELEITORAL Carlos Manhanelli

    Os jingles esto entre ns como espectros . Sempre nos rondando o tempo

    todo, e h mais tempo do que imaginamos, eles se fazem presentes. No adianta

    resistir: quando menos esperarmos, estaremos cantarolando, assoviando ou

    batucando com as mos algo do tipo T na hora de dormir, No espere mame

    mandar, Passa passa o talco Rossi, Pipoca na panela, comea a

    arrebentar/Pipoca com sal, que sede que d, No adianta bater, eu no deixo

    voc entrar, O tempo passa, o tempo voa, Estrela brasileira, no cu azul ou

    Dois hambrgueres, alface, queijo, molho especial, cebola, picles e um po com

    gergelim.No adianta pedir para a cabea esquecer, o jingle entra em nossa

    mente e ali dura por muitos e muitos anos. Com rimas e frases de fcil absoro e

    melodias e arranjos bem bolados, j se vo mais de 70 anos de histria de jingles

    no Brasil.

    Antes dos anncios musicados, os mascates foram os precursores do

    anncio pblico de produtos, atravs dos preges, assemelhando-se muito com os

    jingles usados atualmente.

    Jos Ramos Tinhoro assevera que "a ideia de usar frases musicais para atrair compradores no era nova, pois, pelo menos desde o sculo XIX, os vendedores de rua usavam esse mesmo esquema embora confiando apenas no alcance da prpria voz ao gritar suas mensagens sob a forma de prego". Seu livro Msica popular Os sons que vm da rua dedica, inclusive, um captulo a esses preges comerciais: baleiros, sorveteiros, amoladores, etc. (SIMES, 1990, p. 171)

    A letra abaixo, cantada por um sorveteiro no Rio de Janeiro, demonstra

    claramente a proximidade:

    Sorvetinho, sorveto Sorvetinho de iluso Quem no tem 200 ris No toma sorvete no Sorvete iai de quatro colidade (sic)

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    (SIMES, 1990, p. 172)

    A rima utilizada desde os antigos preges do sculo XIX, para que o

    ouvinte possa guardar com maior facilidade a letra da propaganda comercial

    musicada (anncio): Se bem no escreveu no foi Abreu quem vendeu

    (FUNDAO JOO PINHEIRO, 1997, p. 97), atingindo com facilidade o

    analfabeto, j que outras formas, principalmente a escrita, muito usada na poca,

    s atingia a classe mais abastada.

    O pblico, na maioria, analfabeto ou semialfabetizado, encontrava nas rimas a indispensvel ajuda mnemnica para melhor guardar temas e anncios (era o que os anunciantes desejavam, por isso buscavam os poetas). Enfim, eles dessacralizaram o produto. Inteligentes, descontrados, de certo modo anteciparam o ngulo do consumidor. Casimiro de Abreu fez graa, Lopes Trovo fez pardia, Olavo Bilac fez stira. Batendo na tecla alegre, divertida, lanaram a semente do que mais distinguia a propaganda brasileira: o seu tom irreverente. (RAMOS, 2005, p. 3)

    Alis, de Olavo Bilac a quadrinha que propagava a classe dos fsforos,

    usado por altas autoridades nacionais e internacionais:

    Aviso a quem fumante Tanto o Prncipe de Gales Como o Dr. Campos Sales Usam Fsforo Brilhante (CARRASCOZA, 1999, p. 78)

    As primeiras notcias que se tm sobre o uso da msica para

    convencimento e propaganda de bens e servios remontam ao sculo XVI, por

    uma postura do ento donatrio das capitanias de So Vicente, Martim Afonso de

    Souza, conforme esclarece o texto de Roberto Simes:

    ... a 15 de junho de 1543, o donatrio Martim Afonso de Souza, na capitania de So Vicente, baixava uma postura proibindo os mercadores de, nos preges que antecediam as vendas, falar mal da mercadoria dos concorrentes. O que nos permite supor que era corriqueira a propaganda comparativa pejorativa a ponto de se fazer necessria a fixao de normas de conduta tica em pleno sculo XVI. (SIMES, 1990, p. 171)

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    Ao p da letra, a palavra jingle quer dizer tinido, retinir (barulho do sino), ou

    seja, o alarido produzido com o intuito de chamar a ateno para alguma coisa,

    sino tocado de certa forma para cada mensagem. A Igreja Catlica desenvolveu

    toques de sino para cada ocasio, enviando mensagens populao sobre os

    acontecimentos. Para cada mensagem, um retinir do sino diferente. Casamentos,

    batizados, mortes, missas eram anunciadas nas cidades atravs do toque dos

    sinos. Hoje, ainda, em algumas cidades do interior, esse expediente usado pelas

    parquias locais. No caso da propaganda, o barulho do sino fundamental para

    divulgar as qualidades e propostas dos produtos e servios e, se for muito bom,

    servir de prefixo musical por muito tempo (os jingles da Varig, depois de muito

    serem lembrados por todos, j no falavam mais o nome da empresa: apenas o

    som orquestrado j remetia lembrana Tururu Tururu Tururu ouvia-se Varig

    Varig Varig; jingle Estrela brasileira, autor Archimedes Messina).

    Mas, espera, vamos deixar as coisas claras, porque, para seu Messina, o que certo certo. O "Varig, Varig, Varig... que encerrava todos os jingles, s vezes cantado, s vezes s orquestrado j existia quando ele chegou empresa. Messina o tornou famoso, mas a criao, se ele no se engana, foi do Titulares do Ritmo, um grupo de cegos formado em Belo Horizonte nos anos 40. (AUTOR DE HITS, 2006)

    As msicas comerciais, ou propagandas comerciais musicadas, nasceram

    muito antes dos jingles, que s vieram a se institucionalizar a partir do rdio. O

    primeiro registro histrico sobre propaganda comercial musicada data de 1882,

    quando foi elaborada uma propaganda comercial musicada para medicamento

    destinado digesto.

    Foi em fins do sculo passado que a propaganda comercial musicada comeou a aparecer no Brasil. Assim, era editada, em 1882, para distribuio gratuita, a polca Imberibina, composta por Mariano de Freitas Brito, em louvor a um medicamento para a digesto. Tambm em louvor a um remdio a polca Lugolina", editada em 1894, com letra e msica de Eduardo Frana, mdico, farmacutico e fabricante do produto anunciado. (SIMES, 1990, p. 172)

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    Grandes nomes tambm fizeram parte dos compositores de propaganda

    comercial musicada. O grande maestro Villa-Lobos comps uma msica

    enaltecendo as qualidades do famoso Guaran Espumante Antarctica (a

    Antarctica lanou seu guaran em 1921).

    Na Discoteca Oneyda Alvarenga, no Centro Cultural So Paulo, localizamos

    algumas outras propagandas musicadas dessa poca, assinadas por

    compositores de prestgio. lvaro Souza comps uma para Mikanol, um remdio

    para tosse e bronquite. Otaviano Gaeto fez outra para o Licor das Crianas. Para

    o Caf Paraventi, Marcelo Tupinamb dedicou seu talento, enquanto Eduardo

    Souto declarou sua preferncia Cerveja Polar.

    Mas, antes do rdio, como se veiculavam as propagandas comerciais

    musicadas?

    As empresas forneciam partituras gratuitas para serem tocadas e cantadas.

    Tem especial importncia a produo dos cafs-cantantes, dos chopes-berrantes

    e dos teatros de revistas alm do carnaval, claro. Os cafs-cantantes, mais

    comportados, e os chopes-berrantes, mais escrachados, eram a verso nacional

    dos cabars europeus. Para estimular o consumo de bebida, esses

    estabelecimentos ofereciam espetculos curtos, marcados pela pndega e pelas

    msicas de letra maliciosa, que formaram o gosto do pblico (o maxixe um dos

    ritmos que provocou escndalo na sociedade de ento). Da vieram muitas das

    primeiras estrelas da nossa indstria fonogrfica, como Catulo da Paixo

    Cearense, Eduardo das Neves, Bahiano, Cadete, Geraldo e Mrio Pinheiro.

    Alguns autores creditam s partituras e a um de seus reprodutores, o piano, as origens da msica de massa. Patrice Flichy aponta a importncia deste instrumento musical nos lares de classe mdia, no final do sculo passado, na sociedade europeia. O piano no estava destinado apenas execuo de msicas clssicas, e as edies de partituras indicavam uma grande variedade de canes populares, j segmentadas em vrios estilos (religiosos, patriticos, baladas sentimentais, canes cmicas) e com tiragens numerosas. Os editores teriam sido ento os primeiros empresrios fonogrficos... (DIAS, 1963, p. 27)

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    Os comerciais no rdio nasceram ao vivo, falados por locutores e artistas,

    feitos na sua maioria com certo tom humorstico, e nem sempre chamavam a

    ateno do prezado ouvinte.

    O primeiro comercial da histria do rdio foi veiculado em uma emissora

    americana em 28 de agosto de 1922 e era simplesmente falado, com uma

    durao escandalosamente grande para os padres atuais: 10 minutos.

    Recomendo a voc, que valoriza sua sade, suas esperanas e sua alegria domstica, a se afastar das slidas massas de tijolos, onde se v a luz do sol atravs de uma pequena fresta e onde crianas crescem famintas por correr por gramados ou avistar uma rvore... Amigo, voc e sua famlia merecem deixar a congestionada cidade e desfrutar o que a natureza reservou para voc. Visite nossos novos apartamentos em Hawtorne Court, Jackson Heights, onde voc vai aproveitar a vida em um ambiente amigvel. (VIANNA, 2004, p. 37)

    Constatou-se ento que todos cantavam as msicas famosas irradiadas

    pelo rdio e, sem muito esforo, percebeu-se que a msica era um grande veculo

    para levar a propaganda das marcas. Se as pessoas cantarolavam msicas, por

    que no cantariam a propaganda comercial musicada?

    Os jingles aparecem institucionalmente nos EUA em 1926, como forma de

    viabilizar financeiramente as rdios que so autorizadas a veicular comerciais para

    ganhar seu sustento. Oficialmente, o primeiro jingle foi produzido nos Estados

    Unidos, em 1926, para o cereal matinal Wheaties, cujo slogan principal Para

    um caf da manh de campees (LIMA, 1995).

    At ento, rdios eram consideradas sociedades culturais sem fins

    lucrativos. Permitiu-se legalmente o uso comercial das rdios em 1931, que da

    para frente se espalham pelo mundo radiofnico e chegam ao Brasil.

    A introduo de mensagens comerciais transfigura imediatamente o rdio: o que era erudito, educativo, cultural passa a transformar-se em popular, voltado ao lazer e diverso. O comrcio e a indstria foram os programadores a mudar de linha: para atingir o pblico, os reclames no podiam interromper concertos, mas passaram a pontilhar entre execues de msica popular, horrios humorsticos e outras atraes que foram surgindo e passaram a dominar a programao. Com o advento da publicidade, as emissoras trataram de se organizar como empresas para disputar

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    o mercado. A competio teve, originalmente, trs facetas: desenvolvimento tcnico, status da emissora e sua popularidade. A preocupao educativa foi sendo deixada de lado e, em seu lugar, comearam a se impor os interesses mercantis. (ORTRIWANO, 1985, p.15)

    Em nossa concepo, jingle uma pea publicitria baseada em um

    briefing que orienta o compositor na formao da letra e melodia.

    Segundo Pedro Nunes (COSTA; SILVA E BIANCO, 2003, p. 4), o jingle

    uma gravao publicitria essencialmente musical, com mensagem cantada, cuja

    primeira etapa de produo parte do briefing.

    Sampaio tece o seguinte comentrio acerca do jingle:

    As pessoas ouvem e no esquecem. aquilo que a sabedoria popular denomina de chiclete de orelha. A vantagem dos jingles, em razo do formato, que essas peas musicais contm, alm da mensagem, o clima, a emoo objetivada e um expressivo poder de recall. O jingle algo que fica, uma vez que as pessoas guardam o tema consigo, e muitos anos depois ainda so lembrados pelos consumidores. Devido ao poder de memorizao que a msica tem, o jingle uma alternativa de comunicao muito poderosa. Sua nica limitao que, por ser msica e ter que seguir uma mtrica, s vezes no se consegue colocar na pea todas as informaes desejadas pela campanha publicitria. (SAMPAIO, 2003, p. 79)

    Um dos objetivos do jingle, portanto, facilitar a memorizao, o que os

    especialistas chamam de recall. A sua fora est intimamente relacionada ao grau

    simultneo de persuaso decantatria e figurativa. O compositor tem que ligar

    fantasia e realidade e aliar isso capacidade de seduo, de persuaso, fazendo

    uma msica bastante compacta, rpida e que tenha, alm disso tudo, poesia e

    beleza.

    Lula Vieira, publicitrio que se notabilizou pelo seu conhecimento e acervo

    de jingles, tendo inclusive um programa no rdio e na TV sobre eles, em entrevista

    concedida1 diz que:

    Jingle uma ideia cantada, no apenas uma musiquinha que as pessoas se lembrem ou uma letra fcil de se repetir, no uma

    1 Entrevista concedida em 15 de maro de 2008, no Rio de Janeiro.

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    ideia repetida at o cansao, mas uma boa ideia cantada, uma coisa que as pessoas acham importante e que, pela repetio e pela embalagem musical, e pela simplicidade da letra, se torna inesquecvel. Mas antes de mais nada, um bom jingle uma boa ideia. (VIEIRA, 2008)

    J o maestro Reginaldo Bessa3, um dos maiores jinglistas da atualidade,

    em entrevista, define jingle dizendo que: Antes de tudo o jingle uma coisa que

    parece fcil, mas muito difcil, tanto que so poucos os profissionais que

    conseguiram se estabelecer neste ramo no Brasil. Como dissemos, o jingle

    geralmente feito com 30 segundos, ou seja, existe uma tradio dos 30

    segundos, e conseguir transmitir uma mensagem sobre um produto nesse tempo,

    dentro das vrias facetas que o produto tem (a sua colocao no mercado, o seu

    perfil, a classe que ele vai atingir), no coisa fcil. Fazer um jingle de 30

    segundos, msica e letra, que fique na cabea do ouvinte sempre um grande

    desafio. (BESSA, 2008)

    Cid Pacheco, professor de comunicao poltica e marketing eleitoral da

    UFRJ, define jingle como sendo:

    (...) primeiro de tudo, um jingle um anncio, e, sendo um anncio ao qual se acrescenta msica, o objetivo central dele persuadir o pblico, ou seja, quanto ao jingle comercial, visa fechar a venda de um servio ou produto. Os jingles nascem com a necessidade de massificao da propaganda, e atravs do veculo de massa rdio, na dcada de 30. (PACHECO, 1993)

    Foi com o rdio que os jingles se institucionalizaram como forma-padro da

    publicidade. Isso se deve em muito aos programas de rdio, em que os textos

    publicitrios eram cantados de improviso. Um programa em especial deu grande

    impulso produo dos jingles no pas, devido qualidade tcnica de seus

    redatores. Era o programa Cas, na Rdio Philips.

    Com base nessas informaes e nesse conceito que se afirma que o

    primeiro jingle no Brasil nasceu em 1932, de um acordo entre o apresentador de

    rdio Ademar Cas e o dono de uma padaria, o qual, relutando, no queria um

    3 Entrevista concedida em 15 de maro de 2008, no Rio de Janeiro.

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    comercial na rdio alegava que nunca ouvira um comercial de padaria em

    rdio. Cas ento fez uma oferta. Feito o trato, encomendou a Antnio Gabriel

    Nssara (Nssara) a composio e nasceu o primeiro jingle do rdio brasileiro

    promovendo o (depois famoso) po Bragana. (CAS, 1995) Mas Cas estava decidido a dobrar o portugus e o convenceu com a seguinte proposta: O preo o seguinte: vou colocar o anncio no ar. Se o senhor gostar, paga, seno, fica de graa. (CAS, 1995, p. 49)

    Quando Nssara ouviu essa histria (briefing passado por Cas), inspirou-

    se na nacionalidade do proprietrio da padaria e comps uma quadrinha em ritmo

    de fado. O primeiro jingle da histria da propaganda no rdio do Brasil ficou assim:

    AUTOR: Antnio Gabriel Nssara INTRPRETE: Almirante GNERO: Fado ACERVO: Carlos Manhanelli MDIA: CD mp3 Oh, padeiro desta rua tenha sempre na lembrana. No me traga outro po Que no seja o po Bragana. Po inimigo da fome. Fome inimiga do po. Enquanto os dois se matam, A gente fica na mo.

    De noite, quando me deito E fao minha orao, Peo com todo respeito Que nunca me falte o po. (CAS, 1995, p. 50)

    O portugus, dono da padaria, ficou feliz da vida com a propaganda de seu

    estabelecimento e fechou um contrato de um ano de publicidade com Cas.

    Tambm so dessa fase vrios outros jingles feitos e cantados por gente

    famosa. Lembramos que nesse perodo no existia gravao para uso radiofnico

    dos jingles, os quais eram interpretados ao vivo por cantores e cantoras ilustres da

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    poca (Carmen Miranda, Francisco Alves, Mario Reis e Slvio Caldas, para citar

    apenas alguns).

    Jararaca e Ratinho, famosa dupla sertaneja da poca, contam em

    entrevista concedida Rdio Nacional que houve ocasio em que cantaram mais

    de 100 vezes o mesmo jingle (Maria sai da lata leo Maria) durante o dia em

    que passaram no estdio.

    Vrios foram os compositores que, j nessa fase, ganhavam dinheiro

    dedicando-se a criar jingles. Um dos mais famosos sambistas da poca, Noel

    Rosa, fazia composies ou pardias de suas prprias msicas para alegrar os

    fabricantes e lojistas. dele o jingle, que ficou famoso na poca, para as Casas

    Drago, da Rua Larga, no Rio de Janeiro:

    Voc mais conhecido do que nquel de tosto mas no pode ficar mais popular do que O Drago. (VIZEU, Carlos A., s.d., on-line)

    O mesmo Noel, valendo-se da melodia de outra composio sua, De

    babado, fez uma adaptao para um cigarro ainda muito em voga:

    voc a que comanda e o meu corao conduz Salve a Dona Yolanda a Rainha Souza Cruz. (VIZEU, Carlos A., s.d., on-line)

    Baseados nessas informaes, podemos afirmar que o jingle nasce

    oficialmente no Brasil, com essa denominao e estilo musical, em 1932, sendo

    este o ano em que permitida a veiculao de peas publicitrias nas rdios,

    atravs do decreto 21.111 de 1o de maro de 1932. Na biografia de Sivan Castelo

    Neto encontramos mais uma evidncia de que o jingle nasce com essa

    denominao a partir da dcada de 1930.

    A biografia de Sivan Castelo Neto registra que ele viveu seus primeiros perodos de ouro em So Paulo. Participou de

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    orquestras de vrios cinemas, como Odeon, Repblica e Royal. Em 1923, foi Diretor Artstico da Rdio Educadora. Depois, exerceu a mesma funo na Rdio Bandeirantes: Meu pai teve bons perodos de luminosidade em So Paulo, entre as dcadas de 1920 e 1940 diz Berto Filho. Antes de alcanar prestgio, foi corretor de anncios de rdio. Os textos, ele mesmo redigia e depois os lia no ar, alm de criar as trilhas sonoras. Naquela poca, no se usava ainda a palavra jingle5 e a redao publicitria era feita intuitivamente, pois ainda no havia escolas preparando profissionais para esse segmento. (Biografia Sivan Castelo)

    Conclumos ento que jingles comerciais so peas publicitrias, que

    nasceram para destacar qualidades de um produto, dando-lhe as caractersticas,

    composio, nome, resultados com o uso (utilidade, aval, fabricante e diferena

    dos outros produtos) e levando ao conhecimento do consumidor (e o persuadindo

    a adquirir) as qualidades e benefcios advindos da sua existncia no mercado, e

    para isso utiliza letras de fcil assimilao, rimas e melodias positivas e marcantes

    que formam o famoso chiclete de ouvido.

    OS JINGLES ELEITORAIS NO BRASIL

    Para que possamos entender a histria do jingle eleitoral no Brasil e sua

    trajetria, a diferena entre msicas polticas, stiras, msicas de protesto,

    pardias, galhofas e jingles eleitorais, temos que tomar por base a histria da

    msica poltica no Imprio, na Repblica Velha, a histria da indstria fonogrfica,

    a histria do rdio e por fim o caminho do jingle eleitoral no Brasil at os dias de

    hoje.

    A msica com conotao poltica nasce ainda no imprio, retratando o

    ambiente e servindo como meio de protesto, na maioria das vezes com muito bom

    humor, contra o sistema ou a situao poltica do momento.

    A msica As laranjas da Sabina, composta por Alusio Azevedo, um

    exemplo tpico de msica de protesto contra a monarquia.

    5 Grifo nosso.

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    Essas e tantas outras msicas da poca do Imprio sempre falavam de

    acontecimentos ou situaes polticas, satirizando ou menosprezando os polticos.

    nesse perodo, tambm, que nasce a indstria fonogrfica no Brasil. As

    primeiras gravaes so de msicas nascidas no Imprio, como relata Franklin

    Martins:

    J na primeira fornada de gravaes, em 1902, aparecem msicas sobre temas polticos, como Laranjas da Sabina, Saldanha da Gama e Camaleo, compostas anos ou dcadas antes. Todas elas esto voltadas para trs: abordam costumes parlamentares dos tempos do Imprio e resgatam episdios ocorridos na turbulenta transio entre o fim da monarquia e a consolidao da Repblica. Outras composies, como Capanga Eleitoral ou Cabala Eleitoral, lanadas pouco depois, ainda estariam marcadas pela mesma necessidade de ajustar contas com o passado. (MARTINS, 2008)

    Nasce a primeira empresa de gravaes no Brasil, fundada por Fred Figner

    em 1889. Em 1902, a Casa Edson se moderniza, abandonando a gravao em

    cilindros e comeando a comercializar os discos de gravao lateral, de um lado

    apenas, inventados por mile Berliner em 1887. O primeiro disco gravado no

    Brasil, pela prpria Casa Edson, foi o lundu Isto bom, de Xisto Bahia,

    interpretado por Bahiano (CHIADO BRASILEIRO, s.d., on-line).

    J que falamos da indstria fonogrfica, temos que registrar os primeiros

    jingles gravados para uso nas rdios, que, coincidentemente, so por mim

    tambm considerados os primeiros jingles feitos para campanhas eleitorais no

    Brasil, como por exemplo: No se meta com seu Jlio, de Heckel Tavares, foi

    gravado em disco na voz de Luiz Peixoto em 1929 (XAVIER, 2008).

    Como destacamos, no se pode falar de jingles sem antes conhecer a

    histria do rdio. Desde o nascimento desse novo veculo de comunicao, no

    mundo inteiro o rdio e a poltica tm caminhado juntos.

    Na Alemanha, durante a revoluo de 1918-1919, cinco anos antes de sua

    regulamentao oficial, j se ouvia rdio. Nos Estados Unidos, a partir de 1932, o

    rdio seria a principal forma de comunicao entre o recm-eleito Presidente

    Franklin Roosevelt e o povo norte-americano, por meio das transmisses do

    programa Fireside Chats (Conversas ao lado da lareira). Na Alemanha, no incio

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    dos anos 30, Joseph Goebbels usa o rdio como meio ideal de propagao

    ideolgica. Naquela poca, 70% das famlias alems possuam rdio em casa. O

    rdio ganhou tamanha fora poca que Hitler patrocinou a fabricao de um

    receptor o Volksempfnger VE 301 , o rdio do povo, que ostentava o

    smbolo do III Reich (a guia) sob o dial, e cujo nmero de modelo era uma

    referncia data em que Hitler se tornara chanceler: 30 de janeiro de 1933. Ainda

    durante a Segunda Guerra Mundial, o rdio foi uma das maiores formas de

    resistncia, com as histricas transmisses da BBC de Londres.

    Nos anos 40 e 50, na Argentina, Juan Domingo Pern fez do rdio

    instrumento de propaganda poltica. Eva Pern, oriunda do rdio (desde a dcada

    de 40 fazia programas romnticos radiofnicos), junta-se a Pern e lana em 1944

    o programa oficial de propaganda radiofnica Por um futuro melhor, de exaltao

    revoluo de 1943.

    Na dcada de 50, o rdio foi instrumento de resistncia poltica em Cuba,

    usado pela guerrilha comandada por Fidel Castro. A rdio rebelde, organizada por

    Che Guevara, iniciou suas transmisses da Sierra Maestra em 24 de fevereiro de

    1958.

    A primeira transmisso de rdio no Brasil foi realizada no dia 7 de setembro

    de 1922, quando o ento presidente Epitcio Pessoa usou a estao instalada no

    alto do Corcovado, no Rio de Janeiro, pela Westinghouse Electric International,

    para fazer um discurso em comemorao ao centenrio da Independncia,

    assustando os participantes da Exposio Internacional do Rio de Janeiro, onde

    havia 80 receptores trazidos dos Estados Unidos especialmente para esse evento.

    Durante toda a dcada de 20, as emissoras funcionaram sem regras

    prprias. As rdios se instalavam e recebiam do Departamento de Correios e

    Telgrafos o mesmo tipo de licena concedida para as estaes de telgrafo.

    Apenas na dcada de 30, durante o governo Vargas, as emissoras

    comearam a ter regras oficiais prprias. Vargas foi o primeiro a perceber a

    capacidade do rdio para um pas das dimenses do Brasil e o utilizou

    intensamente.

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    Os presidentes que o substituram pelo voto direto tambm fizeram uso

    intenso do rdio para levar sua palavra populao, assim como o regime militar.

    Os presidentes eleitos diretamente, aps a dcada de 80, tambm

    utilizaram o rdio para suas conversas informais com a populao. Jos Sarney,

    em 1985, com o seu Conversa ao p do rdio, inaugurou a nova fase. Fernando

    Henrique Cardoso colocou no ar o seu A palavra do Presidente, e o Presidente

    Lula mantm no rdio o seu programa Caf com o Presidente.

    Nos anos 60, o regime militar introduziu a obrigatoriedade do horrio

    eleitoral gratuito, no rdio e na televiso, que tem validade at hoje. H dcadas, a

    cada ano eleitoral, repete-se a utilizao do rdio no Brasil para arrebanhar

    eleitores.

    Passemos ento anlise da msica na Repblica Velha. As msicas

    encontradas nesse perodo so todas, sem exceo, stiras, pardias ou msicas

    de protesto. Em nenhum momento antes de 1929 conseguimos detectar qualquer

    msica que tivesse as mnimas caractersticas para ser classificada como jingle

    eleitoral. Alis, nessa discusso que gostaramos de entrar neste trabalho.

    Existe uma grande confuso em vrios textos pesquisados, nos quais

    aparecem canes de protesto, stiras, msicas e hinos ufanistas ou pardias

    classificados como jingle.

    Podemos definir um jingle poltico como sendo qualquer cano com um propsito poltico e publicitrio. Esse objetivo pode ser tanto conseguir apoio e votos para um poltico (partido, frente ou causa) quanto para criticar e diminuir apoio e votos a outro poltico (partido, frente ou causa) adversrio. (LOURENO, 2007, grifo nosso)

    Est evidente que msicas feitas para criticar e diminuir apoio no so

    jingles e sim stiras, pardias, galhofas ou msicas de protesto contra isso ou

    aquilo. Outro exemplo: Contudo, a histria do Jingle Poltico inicia-se anteriormente, na campanha de 1914 do ento presidente da Repblica, Marechal Hermes da Fonseca conhecido popularmente como seu Dudu. (...) Ao contrrio de promover polticos, como acontece hoje, o objetivo da maioria dos jingles daquela poca era destruir reputaes. (DE POLI, 2007)

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    Se o intuito do jingle enaltecer um produto ou um candidato, e se

    composto exclusivamente para isso, no podemos considerar msicas de protesto

    ou stiras contra esse ou aquele poltico como sendo jingles.

    Outro exemplo que podemos fornecer sobre o engano. O jingle poltico s

    chegaria aos ouvidos das multides, no entanto, depois do surgimento do rdio no

    Brasil, em 1922, com o presidente Washington Luiz (Ele paulista?/ sim

    senhor/Falsificado?/ sim senhor) (MORAIS, 2002).

    Por fim, questionamos a temporalidade em que se efetuam trabalhos sobre

    jingles. No estudo O jingle poltico brasileiro: da pr-histria do rdio ao

    desenvolvimento das campanhas eleitorais radiofnicas (1910-1960), de Cristina

    Lemos apresentado na Universidade Tuiuti, do Paran, em 2006 ,

    apresentam-se jingles de 1910. Se tivemos o incio da atividade com jingles

    eleitorais em 1929 (MARTINS, 2008) e a oficializao do jingle como pea

    publicitria para uso no rdio em 1931, impossvel seria termos jingles antes

    dessa data. Mesmo nos EUA, os jingles s foram oficializados com essa

    denominao no ano de 1926, quando autorizados a veicular em rdios com o

    intuito de propaganda.

    Como j vimos, segundo Pedro Nunes (Costa; Silva e Bianco, 2003, p. 4),

    o jingle uma gravao publicitria essencialmente musical, com mensagem

    cantada, cuja primeira etapa de produo parte do briefing.

    Da leitura efetuada nesses textos, podemos conceituar jingles eleitorais

    como peas compostas para atingir seus eleitores, de forma a elevar as

    qualidades do candidato no pleito eleitoral. So peas publicitrias musicadas

    compostas (feitas) sob encomenda, para valorizar um candidato a cargo eletivo,

    orientadas por um briefing, Conjunto de dados fornecidos pelo anunciante para

    orientar a sua agncia na elaborao de um trabalho de propaganda (SHOW

    TOPIC, s.d., on-line).

    Jingle eleitoral no uma manifestao musical espontnea que nasce de

    qualquer movimento social ou cultural, de massas ou segmentado, uma pea

    publicitria. Ele instigado a existir. necessria uma vontade e uma orientao

    no sentido de faz-lo. Todo o resto das msicas de cunho poltico ou so msicas

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    de protesto contra governos j implantados, ou so msicas de contrapropaganda,

    ou stiras contra governantes e candidatos, ou pardias e galhofas. No meu

    entender, no h como conceituar as msicas de carter poltico de jingle, j que

    s existem jingles eleitorais ou comerciais, que elevam as qualidades que

    apresentam em suas letras.

    Vamos analisar a msica citada no texto, que se refere ao seu Dudu

    (Hermes da Fonseca, 1914). A msica em questo Ai, Philomena. Quem

    explica Franklin Martins:

    Trata-se de uma adaptao da popularssima polca Uma cano italiana, parodiada a torto e a direito no Brasil a mais famosa talvez tenha sido a cantiga de roda Viva Garibaldi. No caso de Ai, Philomena, composta para a pea de teatro-revista do mesmo nome, brinca-se com o marechal Hermes da Fonseca, presidente da Repblica de 1910 a 1914, que acabara de deixar o governo. Alguns esclarecimentos: 1) Dudu era o apelido do marechal, dono de reluzente careca; 2) Hermes da Fonseca era tido como um grande p-frio. (Mal assumiu o governo, estourou a Revolta da Chibata [ver Os reclamantes]); sua primeira mulher, Orsina, morreu no incio do mandato; e, enquanto era presidente, o Brasil perdeu a soma de 2,4 milhes de libras depositada num banco russo, que quebrou; 3) a segunda mulher do marechal, Nair de Teff, que fazia caricaturas sob o pseudnimo de Rian, era muito avanada para a poca. Por isso, vivia na mira dos conservadores (durante um sarau, ao tocar ao violo o maxixe Corta-jaca, tido como lascivo pelos caretas da poca, escandalizou a elite carioca); 4) o marechal foi o primeiro presidente a viver no Palcio Guanabara, embora mantivesse o Catete para os despachos polticos e administrativos. Da a referncia casa que ganhou com os cobres do Tesouro; 5) no est claro quem seria o Rainha, que no Senado s dizia muito bem ao presidente, mas provavelmente trata-se do senador gacho Pinheiro Machado, homem forte da Repblica na poca e eminncia parda do governo Hermes da Fonseca. (MARTINS, 2008)

    Autor: Jos Praxedes e Marinho Intrprete: Bahiano Gnero: Valsa Gravadora: Casa Edson selo 195 RJ Mdia: CD mp3 Acervo: ABCOP A minha sogra

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    Morreu em Caxambu Com a tal urucubaca Que lhe deu o seu Dudu Ai, Philomena Se eu fosse como tu Tirava a urucubaca Da careca [cabea] do Dudu Dudu quando casou Quase que levou a breca Por causa da urucubaca Que ele tinha na careca Na careca do Dudu J trepou uma macaca E por isso, coitadinho que tem urucubaca Dudu tem uma casa E com chave de ouro Quem lhe deu foi o Conde Com os cobres do Tesouro Se o Dudu sai a cavalo O cavalo logo empaca S comea a andar Ao ouvir o Corta-jaca Dudu tem uma casa Que nada lhe custou Porque nesse "presente" Foi o povo que "marchou" Mas o Rainha Cavou o seu tambm Dizendo no Senado To somente "muito bem" Eu me arrependo De ter ido ao Caju E no ter vaiado A sada do Dudu Fala: Vocs esto falando, ele nem faz caso. Est comendo do bom e do melhor, hein! (ALENCAR, 1978)

    Basta conceituar o que vem a ser stira e pardia, para que encontremos

    Ai, Philomena inserida nesses conceitos. Conceituando stira:

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    Tipo de narrativa (literria, teatral, etc.) caracterizada pela crtica picante, mordaz, burlesca de determinada situao social, costumes, instituies ou pessoas. Encontrada j na comdia grega primitiva, na poesia e na prosa da idade mdia, a stira situa-se hoje entre as modalidades de expresso essencialmente ligadas ao humor. Sem humor a stira mera injria, sem boa forma literria, zombaria grosseira, chacota (Enc. Britnica). Assim, por meio do humor, do burlesco, a stira pressupe uma atitude ofensiva, ainda quando dissimulada; o ataque a sua marca indelvel, a insatisfao perante o estabelecido, a sua mola bsica. (MOISS, in RABAA, 2002, p. 660)

    Conceituando pardia:

    Uso de elementos de uma obra j existente, geralmente em tom jocoso ou satrico, para produzir uma nova obra que apresente uma relao de intertextualidade com a anterior. A pardia um recurso originrio da linguagem literria, mas pode abranger vrios tipos de linguagem, como teatro, msica, pintura, cinema, etc. (RABAA, 2002, p. 551).

    No so necessrias grandes anlises para perceber, atravs da letra (e da

    definio fornecida pelo Dicionrio de Comunicao), que esta pardia nasce da

    indignao da populao com o status quo, e no um jingle encomendado como

    pea publicitria do Seu Dudu ou de qualquer outro candidato ou poltico, ou

    seja, uma pardia em tom satrico e no se encaixa no conceito de jingles, assim

    como todas as msicas encontradas antes dos primeiros jingles eleitorais,

    compostos dentro de princpios mnimos de conceituao aceita para essa

    classificao feita de 1929, para a campanha de Jlio Prestes, intitulados

    Comendo Bola e Seu Julinho Vem.

    Todos os exemplos utilizados antes de 1929 se caracterizam por serem

    stiras, galhofas ou msicas que apresentavam o dia a dia da poltica brasileira,

    como atesta o texto de Franklin Martins:

    As composies da poca, no entanto, no se limitavam a fazer a crnica de fatos e a destacar personagens da vida poltica nacional. Iam mais alm: tambm criticavam os vcios e as insuficincias da Repblica, to jovem e j to velha. Eleies em Pianc, de 1912, mostra que as eleies a bico de pena e a

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    degola dos candidatos eleitos tornavam a consulta s urnas um jogo de cartas marcadas. Pai de toda a gente, provavelmente composto um pouco antes de 1910, investe contra a poltica de governadores, que assegurava o poder absoluto das oligarquias nos Estados. A partir de 1915, as gravadoras, em estreita dobradinha com os teatros de revista, aceleraram o ritmo de lanamento de msicas polticas. Recorrendo aos gneros musicais mais populares na poca as marchinhas, as modinhas, as polcas, as valsas, os lundus, os maxixes, os caterets e, depois, os sambas , os compositores passaram a mirar diretamente nos figures da poltica com galhofa e a irreverncia. No houve presidente da Repblica, salvo Epitcio Pessoa, que escapasse das gozaes. Hermes da Fonseca sofreu em Ai, Philomena (1915), Wenceslau Braz em Desabafo Carnavalesco (1917), e Delfim Moreira em Seu Derfim tem de vort (1919) infelizmente ainda no se localizou uma gravao desse cateret engraadssimo. Tampouco a oposio foi poupada. Que o diga Rui Barbosa, ridicularizado em Papagaio Louro (1920). Nas eleies de 1922, quando o esquema do "caf com leite", atravs do qual So Paulo e Minas revezavam-se na Presidncia da Repblica, comeou a apresentar fissuras, o pas j assistiu a uma verdadeira batalha musical, opondo Ai, eu M e Goiabada. As composies, embora tomassem partido na campanha eleitoral, no eram jingles e tampouco pareciam encomendadas. Na verdade, no apoiavam candidatos. Simplesmente eram do contra, mas sem perder o bom humor e sempre revelando certa dose de ingenuidade. Bernardes sofreu na pele de seu M e Peanha pagou seus pecados como uma goiabada estragada. Um esclarecimento: na poca, era comum o uso de metforas sobre comidas ou bebidas para designar os estados: Minas era o queijo, o leite ou a coalhada; So Paulo, o caf; o Estado do Rio, a goiabada de Campos ou o arroz de Pendotiba; a Bahia, o vatap e a pimenta. Tambm se abusava dos apelidos: Bernardes era o "Rolinha" ou o "Seu M"; Rui Barbosa, o "Papagaio louro"; Hermes da Fonseca, o "Dudu"; Wenceslau Brs, "So Brs"; Washington Luiz, o Bode ou o Cavanhaque, e por a vai. Como se v, o Brasil urbano, onde se produzia a maior parte das msicas da poca, ainda era muito rural. (...) Em 1926, j sinalizando que o clima no pas era de degelo, aparece Caf com leite, que mostra com humor e talento como a aliana entre So Paulo e Minas fazia os presidentes na Repblica Velha. Sai Bernardes, mineiro, e entra Washington Lus, paulista. A sensao generalizada de alvio. Livres da censura e do medo de represlias, os compositores no poupam crticas ao homem que havia governado com mo de ferro o Brasil por quatro anos. Rolinha transforma-se no Passarinho do m (mal) (1927), responsvel pelas desgraas de todos os brasileiros. J o novo ocupante do Palcio do Catete recebido com otimismo e simpatia, como atestam a toada Paulista de Maca e a marcha

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    O cavanhaque do bode, ambas de 1927. (MARTINS, 2008, grifo nosso)

    Vrios autores consagraram os jingles eleitorais como ferramenta de

    persuaso, comunicao, propaganda e marketing eleitoral. Vejamos alguns

    conceitos:

    Jingle um discurso musical dirigido a um eleitor. Se for bem feito, vai chegar ao corao dele, at mesmo antes de ter passado por sua cabea. (MENDONA, 2001, p. 91) Jingle: sempre til em qualquer campanha. A msica bem feita e com ritmo empolgante tem a vantagem de atingir o lado emocional do eleitor. Deve, se possvel, trazer em sua letra relao com a plataforma do candidato. (RAMOS, 2003, p. 74) Jingle: mensagem do candidato em forma de msica, simples e atraente, fcil de memorizar. (RECH, 2000, p. 99) Jingle aquela pea musical complementar que procura traduzir em linguagem emocional o que o eleitor deseja. Quando ele perfeito e funcional, tem que traduzir o sentimento oculto do eleitor; aquilo que ns chamamos de inconsciente, j que cada eleio tem seu perfil. (BESSA, in: PACHECO, 1993, p. 196) O jingle tem um papel fundamental, j que pode transmitir, da maneira mais popular, o significado maior da candidatura. E quando, alm disso, consegue exprimir o sentimento do eleitorado, o jingle converte-se numa espcie de corrente emocional, tornado-se a prpria alma da campanha. (TEIXEIRA, 2000, p. 91) Jingles son mensajes musicalizados, que quedan grabados en forma ms efectiva, que solo se dijeran con palabras y sin msica. (TOLEDO, 1985 p. 27) Os carros de som devem tocar a msica do candidato, com seu nome, um bom slogan, de fcil recordao, e a ideia bsica contendo propostas do candidato. (TORQUATO, 2002, p. 174) O jingle deve ser, nesse sentido, a trilha mais bem estudada na campanha, j que representa todo o sentimento que se espera que o eleitor identifique no candidato. (ALVIM, 1995)

    Conclumos ento que, nos casos dos jingles eleitorais, deve-se respeitar o

    ritmo e a melodia que melhor possa servir para a regio, poca, moda, e que

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    tenha o efeito de ser agradvel, de fcil assimilao e, principalmente, que grude

    como chiclete no ouvido dos eleitores, tendo um efeito persuasivo para que possa

    ser til campanha eleitoral, ou seja, consolidar as opinies que nos sejam

    favorveis ou modificar as adversas.

    Atravs de nossas pesquisas e com a ajuda do Dicionrio Houaiss de

    Msica Popular Brasileira, de Ricardo Cravo Albin, que define todas as outras

    formas musicais, concluo este texto definindo jingles com a frase do inesquecvel

    Prof. Cid Pacheco: Um jingle um anncio. Sendo um anncio ao qual se

    acrescenta msica; o objetivo central dele persuadir o pblico.

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    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ALVIM, Toffler. A terceira Onda, Rio de Janeiro: Editora Record 1995 AUTOR DE HITS. Folha on-line, disponvel em: , acesso em: 27/01/2008.

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    O JINGLE E O JINGLE ELEITORALOS JINGLES ELEITORAIS NO BRASILREFERNCIAS BIBLIOGRFICAS