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Coleção Primeiro Amor 10 - Mais que um amigo - Elizabeth Winfrey-

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Tradução de João Alcino Andrade MartinsEditora Ática

“Nunca tive um namorado.Mas isso vai mudar...e rápido.

Só preciso encontrar o meu verdadeiro amor antes de Steve achara garota dosseus sonhos.É a NOSSA APOSTA, e não posso deixá-lo vencer.Mas por que ao pensar no amor pressinto que está escondido bem debaixo domeu nariz?” pensa Kelly.

RESUMO

UM PERIGOSO JOGO DE AMOR

Para Steve, sua melhor amiga Kelly, tem medo de se aproximar dos garotos. Ela

acha que será rejeitada, sem perceber como é bonita, inteligente e charmosa.Então ele resolve lançar-lhe um desafio. Até o Baile de Verão, no final do ano,deve arranjar um namorado. Para sua surpresa, Kelly não só aceita, como odesafia também. Os DOIS devem encontrar uma nova paixão.É só quando ela começa a sair com Derrick que Steve percebe como foi tolo.De que lhe adianta ter conquistado a insinuante Claudia, se seus pensamentos

 jamais se afastam de Kelly?Por causa de uma aposta inconseqüente, corre o risco de perder seu verdadeiroamor...

1 – KELLY

Naquele dia alguma coisa mudou em mim de verdade, e nunca vou saber aocerto por que isso aconteceu. Pode ter sido o céu muito azul ou o cheiro forte egostoso das rosas no ar. Ou porque passei os anos todos do colégio sóassistindo de longe aos namorados, enquanto minhas colegas entravam nessa otempo todo. Talvez porque já fazia quase dois meses que não via Chris e por isso me sentisse um pouco perturbada. Ou, quem sabe mesmo, pode ter sidoapenas porque eu estava a fim de me apaixonar.- Você sabe qual é o seu problema, Kelly Byrne?- Sim, eu sei. Meu problema é você me perguntar a toda hora se eu sei qual é omeu problema - respondi a Steve Parson ele, meu melhor amigo e, infelizmente,meu crítico mais severo.- Errou de novo. - ele fez que não com a cabeça e deitou-se na grama.Nós estávamos em um piquenique no Lago Gambler, numa conversa meio semgraça sobre como tínhamos passado às férias de inverno. Isso provavelmenteestava aborrecendo Steve.Passar o feriado do Dia do Trabalho no lago era desde muito tempo umaespécie de tradição entre nós. Quando uma pessoa é nossa melhor amiga evice-versa, certos rituais se tornam tão importantes que passar por cima deles

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faz com que ambos se sintam como se algo muito grave estivesse acontecendo.Foi por essa razão que não aproveitei a oportunidade de ficar á toa, curtindocom minhas colegas do Acampamento de Verão, e acabei vindo de avião doMinessota dois dias antes do fim do período de férias.Não estou querendo me fazer de vítima, porque sei que Steve também deixou

de ir a um passeio de barco com seu amigo Andrew Rice, para passar aqueledia comigo. Por outro lado, isso não significava que eu estivesse louca para umasessão "vamos analisar Kelly". Para deixar bem claro meu tédio, suspirei damaneira mais dramática que pude.- Certo, doutor Parson. Por favor, então me esclareça.Steve sentou-se e tirou da boca o talinho de grama que estava mordendo.-Steve: Falando diretamente, você é tipo de garota que segue ao pé da letra adieta do chá gelado. E, o pior: é sempre sabor de limão, nunca pêssego oumorango.Steve sorriu (meio irônico para o meu gosto) e tornou a deitar-se. Ele secomportava como se tivesse acabado de resolver o problema da fome no

mundo, mas para mim tudo não passava de um papo-furado confuso sobre chágelado.Se eu tivesse um pingo de cérebro, trataria de colocar o fone de ouvido de meuwalkman e ignorar aquele comentário. Mas Steve tem essa mania irritante de meencaixar na marra dentro de suas teorias.- Mais alguma coisa – perguntei - Ou você acha que só preciso parar de tomar chá gelado e, assim, meu último ano no colégio vai me trazer fama, fortuna,beleza e um grande e verdadeiro amor?- AHHHHH!!!!! A senhorita ficou curiosa! - ele dramatizou enquanto falava,olhando pra frente, como se essa conversa estivesse sendo testemunhada por milhares de pessoas muito interessadas.

- Na verdade tem mais. Veja, Kelly. Quando vamos ao mercado, temos muitostipos de bebidas para escolher. Mesmo para quem procura um simples chá, épossível escolher entre dúzias de sabores diferentes.- Sim, e daí?Se eu não apressar Steve enquanto ele fala, poderemos ficar sentados por horas, eu ouvindo e ele dando milhões de voltas em torno de um assunto.- Então porque você nunca escolhe maça, por exemplo? Ou até mesmo manga?- Nunca ouvi falar que manga fosse um sabor de chá.- Está certo, mas a questão não é essa. O fato é que você nunca varia. Não diz:"Ei, manga pode ser interessante. Acho que vou experimentar". Em vez disso,segue sempre a mesma dieta de chá gelado e faz dele a sua única companhia.- Chá gelado não é a minha única companhia. Você é que é.Steve pegou a garrafa de chá gelado de minhas mãos, já meio vazia, e tomouum grande gole.- Kelly, eu estou falando por metáforas, vê se me acompanha no raciocínio.- Sim, estou acompanhando. Estou acompanhando...- Em qualquer situação, você escolhe sempre o caminho mais seguro. Temmedo de tentar coisas novas. Tem vivido a sua vida toda como uma freira queprometeu seguir apenas um caminho, e só aquele caminho. Encare a verdade,

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você precisa variar.- Por quê?- Por quê?, POR QUÊ? Porque se fizer isso, coisas incríveis podem acontecer.- Por exemplo? - como comentei antes, Steve tem a mania de me meter namarra dentro de suas teorias.

- Você poderia ser uma inventora, como o cara que inventou o telefone. Poderiaser uma cantora de sucesso. E, o que é mais excitante, poderia se apaixonar.Ou arranjar um namorado, ou pelo menos ter um encontro.Suspirei profundamente. Minha vida amorosa, ou melhor, minha falta de uma,era um dos assuntos favoritos dele. Nos momentos mais inesperados - por exemplo, quando estávamos estudando matemática, eu podia contar com elepara me lembrar de minha existência sem namorados. "Esta equação é igual asua vida amorosa, um monte de fatores desinteressantes que são iguais a zero."Sei que estou passando a impressão de que Steve é uma pessoa insensível esó fala sobre coisas sem graça, mas não é nada disso. Acontece que ele nãoentende como nós, as pessoas normais, levamos a vida. Por normal eu quero

dizer aqueles que não tem quase um metro e oitenta, cabelos sedosos e lindos,olhos verdes e um corpo absolutamente incrível. Para quem ainda não adivinhouessa é a descrição de Steve, como meu amigo também é chamado, se não citeiessa observação antes. Ele também é muito charmoso e tem um jeito irritante defazer todo mundo gostar dele logo de cara.Mas aquilo que ele estava dizendo sobre o medo, na verdade, tinha sentido. Eusinto medo, em relação a um monte de outras coisas. E, principalmente, convivocom o terror da rejeição. Quero dizer, tenho visto tantas garotas chorando nobanheiro, com o coração partido por causa de algum cara que decidiu lhes dar um fora bem no meio do pátio da escola! Daí, quando olho para essas garotas,sempre retocando o batom e saindo para o pátio para se mostrarem de novo

disponíveis para a tortura, experimento a maior simpatia por elas. De Verdade.Mas me pergunto também porque é que elas se colocam nessa situação. Ter umnamorado é mesmo tão bom assim? Vale a pena sentir-se tão mal toda vez quese vê o garoto de quem se gosta colocar o bração em volta de outra garota? Euacho que não, de jeito nenhum!Sou o que minha mãe costuma chamar de Dona Arrepiandinha. Ela quer dizer com isso que não deixo ninguém chegar muito perto, papo de psicologiapopular. Mas sempre digo a minha mãe que odeio psicologia popular. Ter todomundo rotulado bonitinho, como se fosse apenas uma caixa de absorventes oude lâminas usadas descartáveis, me parece uma coisa desumanizadora. Nóssomos todos indivíduos diferentes, e até mesmo excêntricos. Por que reduzir nossa vida a uma definição que se pode ser encontrada num dicionário ou numaenciclopédia.Como Steve estava dizendo, sou muito travada pelo medo. Mas, pergunto denovo, quem não é?- Medo, é? - Apertei os olhos e encarei Steve.Ele tinha voltado de um período na fazenda de seu avô. Eu não pude deixar denotar que o trabalho na fazenda tinha feito maravilha por seus músculos dobraço e do peito. Se, ao menos, ensinar jazz a um bando de meninas de dez

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anos pudesse fazer o mesmo por meu corpo!Steve concordou muito sério.- Olhe para si mesma. Você tem dezessete anos e nunca namorou. Tem certezade que quer passar seu último ano de colégio sozinha?Assim já era demais! Agora era a hora de virar o jogo.

- E você, Steve? Está certo que você tem uma coleção de namoradas, dessasque vai pegando por aí afora, de qualquer jeito. Vai me dizer, que quando estáno seu carro, com uma dessas garotas, você não se sente sozinho, solitário?- Pelo menos estou tentando arranjar companhia.- EU TAMBÉM tento...apenas não tenho o mesmo sucesso.Steve deu um risada.- Você colocou isso na sua cabeça e não muda. O seu príncipe encantadopoderia vir, com seu cavalo branco e tudo o mais,que você o deixaria passar.- Não é bem assim não.Infelizmente, quanto mais essa conversa se prolongava, mais eu sentia queSteve estava levantando uma questão importante. Como desejava que ele fosse

direto a questão e depois me deixasse comer meu sanduíche em paz!- Prove então.- Provar o quê?Perguntei desviando o olhar para o chão, já arrependida por ter prolongadoaquela conversa. Até comecei a pensar em algumas piadas sobre garotas dedez anos a quem ensinaria jazz. Faria qualquer coisa para que Steve deixassede lado os assuntos pessoas.- Mostre-me que você quer mesmo se apaixonar.- Como?- Ora como? Se apaixonando, é claro.- Steve, isso não é como tirar um dez em história. A gente não sai simplesmente

por aí e se apaixona porque quer.- Como você sabe, se nunca tentou?O papo já estava ficando ridículo. Steve não iria desistir, e eu já estava mesentindo envergonhada. Ele adorava me ver em situação embaraçosa. Por algum motivo achava isso uma demonstração de afeto. Eu achava humilhante.- Esqueça.Disse com firmeza e mordi meu sanduíche e liguei meu i-pod. Se não prestasseatenção nele, talvez Steve acabasse desistindo.Steve se aproximou e tirou meus fones de ouvido. Ainda pude ouvir a voz deAretha Franklin abafada e meio estridente saindo dos fones.- Preste atenção no que eu vou falar Kelly. Eu DESAFIO você a se apaixonar.Já tinha percebido antes que virar o jogo contra ele acabava dando errado. Masque chance eu tinha? Fiz uma tentativa desesperada.- Está certo! Pois eu desafio VOCÊ a se apaixonar. E não estou me referindo aum namorico de duas semanas com a garota que trabalha no Pizzas Hut, nãotá?De repente fiquei animada, pensando em todas as condições que poderia impor sobre o romance de Steve.- Nem estou falando de alguns encontros com a Sarah Fain, aquela peituda

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nanica. Estou falando de COMPROMISSO. Um encontro de personalidades.Ele deu de ombros.- Está certo. Você conseguiu.- O quê?Eu não esperava que ele realmente aceitasse isso tudo. Contava apenas obter 

um recuo de Steve e uma chance de esquecermos toda aquela conversa.- Eu desafiei você. Você me desafiou. Aquele que conseguir vence.Sua expressão era muito séria, mas eu ainda tinha esperança de que a idéiatoda fosse uma brincadeira.- Você quer mesmo que nos desafiemos mutuamente a nos apaixonar?- Por que não?Perguntou ele, cruzando os braços e ainda sério.Confesso que, para minha surpresa, eu estava começando a me interessar peloassunto. Quem sabe Steve não tinha razão? Talvez já fosse tempo de KellyByrne mostrar aos garotos, ou ao menos a um dos garotos do colégio Jefferson,do que ela era capaz. Além disso era nosso último ano do segundo grau. Se

desse uma mancada, o pior que poderia acontecer seria ter de sofrer pelo restodo ano, e depois o jeito seria nunca mais mostrar minha cara nas reuniões. Dequalquer modo, eu provavelmente não iria mesmo as reuniões de turma docolégio. Mas se quisesse continuar com a idéia maluca de Steve teria de fazer direito.Eu não estava disposta a correr o risco de ter meu coração magoado só paraencarar um desafio do meu amigo.Então concordei, balançando a cabeça lentamente.- Você está certo.- Estou?Pela primeira vez ele me pareceu um tanto inseguro.

- Claro que está. Mas vamos fazer disso uma aposta.Os olhos de Steve se iluminaram. Ele adora apostar.- Agora você sacou o lance, Kelly. Vamos fazer uma aposta das grandes.Eu estava deitada, apoiada nos cotovelos e então me sentei.- Alguma idéia?- O perdedor tem de preparar o almoço do vencedor por um mês?Balancei a cabeça negativamente. Se a gente ia entrar nessa de desafio, entãoprecisávamos fazer da forma correta. Se ganhar não tivesse muita importância,provavelmente nós dois deixaríamos a aposta de lado e logo voltaríamos anosso antigo comportamento.Ele tentou de novo....- Que tal o perdedor ter de limpar o quarto do vencedor uma vez por semana,durante um ano?- Isso não seria muito justo. Eu sou uma verdadeira maníaca por arrumação, evocê, um bagunceiro.- O perdedor deverá usar uma placa com as palavras "chute-me" por umasemana.- Não. Isso não seria muito original.- Cinqüenta pratas?

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- AH, qual é Parson? Você pode fazer melhor que isso!Steve deitou-se na grama de novo, espreguiçou-se e fechou os olhos por causado sol.- Me deixe pensar um minuto. Vou fazer uma proposta que vai deixar ocabelinho da sua nuca arrepiado.

Eu me deitei de bruços, apoiando a cabeça nos braços. Estava a fim dedescansar meus olhos e pretendia pensar em uma aposta legal, mas tinhaproblemas para me concentrar. Então, enquanto Steve pensava, deixei aimaginação correndo solta.Eu me vi, no primeiro grande jogo de futebol do ano, segurando uma bandeirado Jefferson. Assistia a tudo, enquanto meu anônimo verdadeiro amor caminhava pelo campo. Ele se virava olhando a platéia, até que seu olhar encontrasse o meu. Então faria o sinal de positivo para mim, antes de chamar seu time para o começo do jogo.Ri da idéia. Jogadores de futebol não fazem o meu tipo.Então eu me vi no palco, dançando o lago do cisne. Ao final da apresentação,

três dúzias de rosas vermelhas eram lançadas aos meus pés. Em meus sonhos,eu sorria ternamente e lançava um beijo a meu maravilhoso namorado. Estaseria uma cena muito linda, com um detalhe: o Lago do Cisne está totalmentesuperado.Steve sentou-se de repente e bateu palmas.- Já sei! Se você está querendo mesmo um desafio, acaba de conseguir um.Eu me ergui, apoiando-me nos cotovelos.- Então me diga.- Está certo. Se perder, você terá de cortar o cabelo bem curto e tingir de loirooxigenado - Propôs, me olhando e mexendo as sobrancelhas.- O QUÊ????? – gritei.

Steve devia estar maluco. Ele sabia muito bem que o cabelo era meu únicoponto forte, cheio, escuro e comprido. Quase sempre quando estava nobanheiro do Jefferson e alguma garota de cabelos ralos entrava, ela suspiravade inveja quando olhava para meus cabelos. Essa era minha única vaidade, eSteve queria tirá-la de mim?Acho que ele percebeu minha indignação.- O que foi Kelly? Você tem tanta certeza assim de que vai pedir?Como odeio o orgulho! O orgulho obriga a gente a fazer cada bobagem! Naquelecaso foi o orgulho que me fez concordar com os termos de Steve.- Tudo bem, senhor Invencível. E o que acontece se eu ganhar?- Simples, eu terei de furar minha orelha.- AHHH, não!!! De jeito nenhum! Você está falando toda hora sobre furar aorelha. Isso não conta.- Está bem. Então pense em alguma coisa.Não costumo ter momentos de brilhantismo, mas quando acontecem são muitoinspirados mesmo. Aquele foi um de meus ápices de inspiração.- Se eu ganhar a aposta, então, VOCÊ, Steve Parson, terá de cortar o cabelocom a inscrição da palavra "perdedor". Para facilitar o acordo eu mesma farei ocorte. – disse, lançando minha proposta.

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Ele não pareceu muito contente com a idéia de ter o cabelo cortado de forma aproclamar ao mundo em alto e bom som que era um perdedor. Mas Steve nãorecuaria agora. Não é de seu estilo.- Vamos selar o acordo.Então apertamos as mãos solenemente, e foi quando me lembrei de que nosso

acordo não dizia nada sobre o prazo.Imaginei que precisássemos de tempo suficiente para nos apaixonar, mas nãotanto tempo até estarmos como dois velhinhos gagás, quando fôssemoscomparar as respectivas anotações.Parece até que Steve leu meus pensamentos.- Nosso acordo vai até o Baile de Verão. Aquele que aparecer primeiro com seuverdadeiro amor vence a parada.Um novo pensamento me ocorreu.- Ei, e o que acontece se nós dois nos apaixonarmos?Ele se ergueu e me deu um tapinha na testa.- Então nós dois vencemos. Dá empate.

Enquanto Steve e eu guardávamos a comida, a manta e nosso material deleitura, comecei a experimentar uma estranha sensação de frio no estômago.Nos próximos meses iria precisar mais do que trabalho duro e uma boa dose desorte. Eu precisaria de um milagre...

2 – STEVE

Na terça-feira de manhã eu me levantei com um pensamento na mente: "Masque aposta estúpida eu fiz com a Kelly" . Nunca teria proposto a coisa toda seimaginasse que ela iria até o fim. Mas toda vez que penso que posso prever cada movimento de Kelly ela decide fazer algo inesperado. Daí agora eu tinha

de me apaixonar.Analisando assim superficialmente, pode-se pensar que a tarefa seria mais fácilpara mim do que para Kelly. Afinal de contas, nunca tive problemas para arranjar encontros, sou confiante e nem um pouco tímido. Kelly, ao contrário, é muitofechada. Ela é uma das garotas mais bonitas da escola, senão a mais. Só que,quando alguém lhe diz isso, sua resposta é um "obrigada" e ela sai pensandoque o cara está louco. Ela escapa pela tangente e fala sobre favorecimento,condescendência masculina e homens que pensam que podem fazer umamulher se sentir bem dizendo a ela alguma coisa que é obviamente mentira. Oque posso dizer? Minha melhor amiga tem um complexo.Mas agora que ela estava decidida a se apaixonar, eu tinha certeza de quecumpriria o trato. Kelly sempre batalha para conseguir seu objetivo. Eu havialançado um desafio, e ela ficaria pensando sobre o caso até ter um plano.Diferente de mim, que não tenho nem idéia de como elaborar um.Kelly provavelmente procuraria em sua sala de aula e, batendo os olhos emalgum panaca, se apaixonaria por ele. Enquanto isso, eu estaria empacado nobanco traseiro do meu carro, lugar predileto para Kelly me imaginar com asgarotas, com alguém muito legal, mas que na verdade não se importaria se eu

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estivesse vivo ou morto. E, para coroar isso tudo, a palavra "perdedor" estariagravada em meu corte de cabelo esquisito.Enquanto andava na escola, naquela manhã ensolarada de terça-feira, euprocurava Kelly no pátio. Quem poderia saber? Talvez ela tivesse acordadorecusando a coisa toda também. Se fosse assim, eu concordaria de imediato, e

ela nunca precisaria ficar sabendo que minha confiança tinha sido abalada. Mas,por azar, ela não estava lá...Ela provavelmente estaria fazendo um cronograma para o seu primeiroencontro, o seu primeiro beijo e o primeiro "Eu te amo" .E, conhecendo Kelly, sabia que ela ia adiar o "Eu te amo" até momentos antesde entrar no salão do Baile de Verão com seu amado. Ela tem uma queda por cenas dramáticas.Eu tinha começado a subir o quarto andar, contando os degraus dos lances deescada, a caminho de minha nova sala, quando Andrew Rice, meu melhor amigo depois de Kelly, se aproximou. Eu não o via fazia bastante tempo, já quefaltei a nosso passeio de barco.

- Oi Parson. Achou algum anjo na fazenda?- Não, mas encontrei um pão-duro, que é o meu avô. Ele me pagou cem pratas.Depois de eu ter dado um duro danado o mês inteiro.- Bem vindo ao mundo real. Por isso é que trabalho para o meu pai.O Senhor Rice é advogado, e todas as férias Andrew trabalha no escritório dele.Passa a maior parte do tempo tirando cópias e enviando mensagens por fax. Seestivesse no lugar dele, eu ficaria doido.Chegamos ao último andar. Com uma certa satisfação, percebi que Andrewestava bufando e sem muito fôlego. meses dentro de um escritório debaixo deluz fluorescente e ar condicionado não deixam ninguém com muito pique.- Não olhe agora. Debbie Jackson a sua direita.

Disse Andrew me cutucando.Suspirei. Debbie tinha sido minha namorada por um mês durante o outonopassado. Gostei bastante dela no começo,mas depois de certo tempo ela estavame deixando doente. O jeito dela de falar...parecia que estava sempreperguntando alguma coisa. Mas quando fazia uma pergunta o tom de voz soavacomo uma afirmação. eu me sentia num daqueles jogos de programa detelevisão com perguntas e respostas.Ainda pensei em me agachar atrás de um armário, mas já tinha sido visto.- Oi, Steve? - Ela falou, me beijando no rosto. Percebi que estava mais bonita doque no ano passado. Tinha cortado curto o cabelo loiro, e sua franja caía sobreos olhos de um jeito bel legal.- Oi, Debbie.Como passou as férias?Pensei que poderia estar errado sobre Debbie. Talvez ela fosse meu verdadeiroamor, e eu tivesse me enganado por sua forma de falar. Talvez não tivessepercebido isso antes.- Foi muito bom. Eu trabalhei em uma butique. E você?Naquele momento soube que não havia futuro para mim e Debbie. Podem mechamar de maluco, mas gosto de uma conversa que não seja inteiramenteirritante para mim. Pude sentir Andrew a meu lado se segurando para não dar 

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risada. Considerando a maturidade, ele está no mesmo nível de Barney, ovizinho de Fred Flinstone nos desenhos da TV.- Foi bom. Bom. - Respondi olhando para o relógio. - Caramba! O primeiro sinal

 já vai bater, e o senhor Maughn é o nosso orientador.- Eu entendo. Ele foi meu orientador no segundo ano. - ela então falou virando-

se para ir embora - Você gostaria de sair um dia desses?- Andrew: Sim pode ser - Adiantou-se Andrew respodendo por mim. Não foilegal, mas não consegui segurar um início de risada. Minha própria maturidadeparece que me faltou àquela hora.Debbie deu uma olhada meio estranha para nós e foi embora para o pátio.Sentei-me em uma carteira no fundo da sala do Sr. Maughn e fiquei pensando.Eu tivera encontros com algumas garotas muito legais mas também saíra comoutras que ainda nem deveriam andar sozinhas pela rua, quanto mais ser minhas namoradas.- Cara, não tem nenhuma garota que valha a pena nessa escola. - Reclameicom Andrew.

Andrew fez que não ligava encolhendo os ombros.- Você lembra de quando estávamos no primeiro grau. Parecia que todo osegundo grau estava cheio de garotas bonitas e excitantes. Pelo jeito elas todasdevem ter se formado há muito tempo.- Steve, eu acabei de fazer uma lista de vinte tremendas gatas, com as quais eugostaria de sair e ter um encontro esse ano. Como é que você vem me dizer queaqui não tem garota bonita?Eu balancei a cabeça negativamente.- Estou falando de alguém especial. Alguma garota por quem eu pudesse meapaixonar.- Apaixonar? AHHHH, dá um tempo cara... - Andrew me disse isso, e voltou para

a sua lista de nomes.Dei uma olhada no caderno para ver a lista. À medida que ia lendo os nomes, iafazendo mentalmente o cruzamento com a minha relação de garotas com quem

 já tivera um encontro. Quando cheguei ao número onze, meus olhos searregalaram.- Kelly?Pronunciei quase me engasgando.- Claro. – Andrew confirmou - Ela preenche todos os meus requisitos. - Edesenhou um asterisco ao lado do nome de Kelly.Fiquei contemplando a lista fixamente. Ele tinha colocado o nome de Kelly entreos de Amanda Wright e Carrie Starks. Inacreditável! Não que eu não ache Kellyatraente, inteligente e outras coisas mais. Só que o fato de ver o nome delaincluído em uma lista com outras intenções me incomodou. Era com se Andrewnão entendesse que Kelly era um caso especial. Ela não é do tipo que se colocaem uma lista feita só pelo tesão de sair com uma garota gostosa. Ela é umapessoa.- Você é um babaca. – desabafei - Faz idéia de como ela ficaria furiosa sesoubesse disso? - Perguntei, pegando a folha de papel e sacudindo na frente deseu rosto.

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Ele deu de ombros.- Eu pessoalmente duvido que Kelly esteja preocupada em como eu gasto meutempo durante as palestras de orientação, antes do início das aulas. – ele disse,olhando para mim e levantando as sobrancelhas. - VOCÊ é o único que parecese importar com isso, Parson.

- O que você quer dizer?- Que você está com ciúmes. - Respondeu ele estalando so dedos.- Você pirou. – respondi.Há anos que eu tenho esse problema de as pessoas me provocarem sobre eucurtir uma paixão secreta pela Kelly. Mas nunca nenhuma dessas idiotices meperturbou.Naquele instante tocou o segundo sinal. pulei para o meu lugar vendo osr.Maughn tirar um maço de documentos de dentro da pasta. Ele pigarreou ecomeçou seu discurso sobre os males de chegar atrasado e perambular peloscorredores. Depois de três anos de colégio esse era o tipo de conversa a quenão era preciso prestar muita atenção.Se alguém já ouviu um desses discursos

sobre o primeiro dia de aula, conhece todos.Eu podia sentir meu rosto ficando vermelho enquanto pensava no que Andrewtinha dito. Está certo que sempre fui bastante paternalista quando o assunto eraKelly. Mas isso porque eu sei como são os caras. E não quero que ninguémfique falando dela do mesmo jeito sacana e grosseiro como falam sobre asoutras garotas.Depois de alguns minutos, Maughn terminou seu discurso de boas-vindas aocolégio Jefferson. Então deu início a chamada dos alunos pela lista, outra coisamuito chata do início das aulas. Lá pelo meio da letra D a porta abriu com umestrondo. Pude perceber pelo rosto de Maughn que ele não gostou. Osprofessores sempre acreditam que, se conseguirem controlar os alunos no

primeiro dia de aula, então poderão passar o resto do anos sem enfrentar maiores problemas. Claro que Maughn detestou ver seu "plano A" em relação adisciplina ir por água abaixo.Virei a cabeça para olhar quem estava entrando. Ela deu alguns passos paradentro da sala e parou como se não estivesse certa de poder entrar. carregavaum monte de cadernos que pareciam prestes a cair a qualquer momento.Seu cabelo loiro e comprido estava preso por um rabo de cavalo meio frouxo,mostrando o queixo muito bonito e os olhos arredondados. Vestia mini-saia euma camiseta listrada de alças. Suspeitei profundamente, absorvendo os efeitosde olhar para aquela pernas bronzeadas. De repente a lista de Andrew era aúltima de minhas preocupações.-Nome?- Rosnou o Maughn.A garota deu uma olhada pela classe como se estivesse procurando por amigos.Cruzamos nossos olhares. Por uma fração de segundos nós nos encaramos.Então eu sorri.- Rebecca Foster. - Respondeu ela, calma e indiferente ao fato de que toda aclasse havia parado por causa dela. Acho que percebeu bem a situação e deveter concluído que não havia motivo para se sentir intimidada.Maughn correu o dedo pela lista.

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- Foster, Foster... – murmurou para si mesmo - Sabe que horas são, senhoritaSchmith?Ela deu uma olhada para o relógio na parede atrás da mesa do Sr.Maughn...- HAmmm...nove e dezoito?- Sim. – concordou ele - O horário de entrada e ás oito e cinqüenta e cinco. Qual

é a sua desculpa?Ela andou até a frente da classe e entregou a ele um papel verde.- Eu estava na secretaria da escola por causa de minha transferência.Maughn pareceu alvoroçado, a classe inteira permanecia quieta. Existe algumacoisa nas mulheres muito bonitas que leva as pessoas a parar de conversar eprestar atenção nelas.- Então está certo. – concordou Maughn - Por que não se senta? Mais tarde eupasso as instruções que você perdeu.Rebecca armou um sorriso gracioso e deslizou para uma carteira na primeirafila. Ficou olhando direto para o Sr.Maughn como se ele fosse um grande sábioa revelar os segredos da vida. Praguejei comigo mesmo por ter escolhido um

lugar tão no fundo da sala.Maughn pegou sua lista e continuou de onde havia parado, mas com uma vozmais descontraída e amistosa. Acho que ele resolveu mudar para o "plano B":faça com que os garotos amem você e eles ficarão contente por se comportar direitinho.Eu estava tão concentrado analisando a nuca de Rebecca que Maughn precisouchamar meu nome duas vezes. Pode ter sido minha imaginação, mas juraria queRebecca até se endireitou na cadeira quando pigarreei e respondi à chamada.Andrew enviou um bilhete curto e direto: "Garota linda à sua frente". Fiqueiencabulado, rasguei a folha e coloquei os pedaços no bolso. Não permitiria queele transformasse Rebecca em apenas mais um nome de sua lista. Achei nela

alguma coisa especial. E o friozinho no meu estômago avisava que ela seriaminha. Logo.Passei o resto da aula pensando muito. Como eu chegaria até ela? Deveria ser forte e agressivo? Ou calmo e educado? Como não sabia nada sobre agarota,era difícil planejar a proximação. Não fazia a menor idéia da espécie decara com quem ela namorava.Não sabia se era do tipo que gosta de música, depraticar esportes, ou romântica. E também não sabia se tinha algum namorado.Em silêncio, rezei para que ela tivesse sido transferida de um lugar bem longe,porque assim o namorado não seria um problema.Não são muitas as pessoas que deixam passar a oportunidade de ter um bomrelacionamento com alguém só por causa de um namorico à toa. É o que chamode síndrome dos acampamentos de verão. A pessoa vai acampar, entãoconhece alguém, e todas as noites trocam beijos debaixo de uma arvore ou emuma canoa. Terminado o verão, os dois declaram seu amor um pelo outro edizem que até o próximo acampamento do ano que vem o tempo vai passar voando. Depois de poucas cartas e um ou dois telefonemas meio embaraçosos,a coisa toda cai no esquecimento.no ano seguinte os dois vão achar que jáestão muito velhos para o acampamento de verão. Sim, estou falando por experiência própria. No entanto, nunca me esqueci das noites estreladas que

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passei ao lado de Elaine Mason.Minhas ruminações sobre Rebecca e os romances desastrosos dosacampamentos de verão não estavam me levando a lugar algum. Então decidivoltar a ser eu mesmo – ou mais ou menos isso – e esperar que o melhor acontecesse. Esta é a tática que normalmente uso com as garotas. No segundo

ano do colegial conheci uma garota na pista de atletismo, Gna Roslin, e entãolhe disse que era praticamente avançado em salto de vara. Ela pediu umademonstração, e quase quebrei o queixo quando cai de cara no colchão duro. Aexperiência (assim como algumas palavras sábias de minha amiga Kelly) medeixou ciente de que as mulheres, em sua maioria, são muito espertas paraconferir as informações. E, assim que descobrem uma jogada em falso, elascaem fora.Quando o sinal tocou, continuei em minha carteira. Ainda estava indeciso sobreme aproximar ou não de Rebecca. Então ouvi o Sr.Maughn pedir que ela ficasseum pouco mais para que ele pudesse repetir as normas sobre a rotina do colégioJefferson. Essa era a minha chance para fazer um primeiro contato simpático

com ela.Antes de seguir atrás de Andrew, dei uma última olhada na direção de Rebecca.Ela sorriu e fez um movimento disfarçado, mexendo com os ombros. Senti umcalafrio. Naquele exato momento tive a certeza de que ganharia a aposta comKelly.E era ela quem estava me esperando no saguão. Nós assistíamos a aula defísica juntos no primeiro período.- Sobre a nossa aposta... – Kelly começou a falar.Levantei a mão interrompendo a frase.- Nem pense em desistir, Byrne. – cortei - Acabei de encontrar a garota dosmeus sonhos. Você já pode ir preparando a tesoura e a água oxigenada.

Ela fez uma cara de surpresa.- Ahh, eu não ia desistir. Só queria dizer que o nosso acordo deve ser colocadopor escrito. E nem pense em inventar um jeito de se livrar.- Que o melhor romance ganhe. – concordei.Enquanto voltamos para a sala eu mal podia esperar até nossa próxima aula deorientação.

3 – KELLY

Eu sabia que, mesmo em um dia que estivesse de bom humor, odiaria ter físicanas primeiras aulas. Nos próximos seis meses, logo de manhã, estaria lidandocom equações confusas e experiências de laboratório chatas. Acho queninguém deveria ter de encarar assuntos como matemática ou coisa parecidaantes do almoço.Sentada, ouvindo a voz da Sra. Gordon para lá e para cá resmungando algumacoisa sobre velocidade, eu olhava para o rosto de Steve. A expressão delevariava como se estivesse meditando sobre algum fato que tivesse achadorealmente interessante. Pressenti que pensava sobre a nossa aposta, e amaneira arrogante com que se sentava, com os ombros jogados para trás, me

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provocou uma sensação de mal-estar.Não era justo. Steve sempre tinha muita sorte e eu, não. Uma vez ele tinha meconvencido a ir junto com ele e sua avó a um bingo em um centro para pessoasda terceira idade. No fim da noite, Steve havia ganho uma boa grana. Quandofinalmente consegui vencer uma rodada, o prêmio não era em dinheiro, mas

uma daquelas camisetas com a inscrição: "Minha vó esteve nas cataratas doNiágara e tudo que ela me trouxe foi esta camiseta vagabunda". Depois daquelanoite, toda vez que a avó dele estava por perto, ele insistia para que eu usasseessa camiseta. E ainda por cima verde-limão NÃO é uma das minhas corespreferidas!Quando o sinal tocou, a Sra. Gordon ainda resolvia o primeiro conjunto dequestões. Tinha tanta coisa anotada que dava a impressão de que a genteestava escrevendo um tratado.acho que é assim mesmo que se parecem todosos problemas físicos.Antes de sairmos da sala, Steve me passou um pedaço de papel que estiverarabiscando durante a aula. Tinha desenhado a si mesmo dentro de um grande

coração e eu do lado de fora, tentando lançar uma flecha. Sobre a cabeça daminha figura estava um balão com a inscrição: "As de cabelos vermelho intensose divertem mais".- Rá,rá, rá.- disse secamente - Você vai ficar só pensando nessa aposta idiotadurante os próximos quatro meses?Steve arreganhou um sorriso meio safado e me deu um tapinha nas costas.- Claro que não. Logo, logo vou estar apaixonado que não vou ter mais muitotempo para curtir a minha vitória. - Respondeu dando um puxãonzinho em meucabelo, e foi embora.Arrastei para meu armário aquele enorme livro de física que mais parecia dechumbo. Mal tinham dado às dez horas, e o dia já estava com cara de ser o pior 

de toda a minha vida no colegial.Fechei a porta do armário com tanta força que, além do barulho, fiz chacoalhar todo o conjunto de madeira em volta.- Mal dia no trabalho, querida? – comentou uma voz sacana, se fazendo demeiga.- Ellen....Liguei pra você umas cinco vezes ontem.- Desculpe. Meu pai insistiu para que nós visitássemos o Museu de Cera,quando voltávamos de Monterrey. Daí demoramos mais meio dia andando decarro e só chegamos tarde da noite. Meu traseiro ainda está adormecido detanto tempo que fiquei sentada.Dei uma risada e a abracei forte. Depois de Steve, Ellen Frazier era a minhamelhor amiga. Muito alta, magra e morena, ela tinha aquele olhar perdido que sevê nas modelos de revistas de moda. Era, porém, muito realista e não seconsiderava nada de especial. Ao contrário, chegava mesmo a se achar umtanto esquisita por não ter muito seio.- Então, como foi a reunião da família Frazier? – perguntei.Ela olhou para o teto e juntou as mãos como quem reza:- Meu pai e meus tios ficaram três dias competindo para ver quem era o melhor pescador. A noite eles jogavam xadrez até tarde, e isso provocava chiliques em

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minha mãe. Enquanto isso, meus priminhos a toda hora precisavam trocar asfraldas. E adivinhe quem é que sobrou para tomar conta dos pimpolhos?- Em outras palavras, foi exatamente como você esperava.Peguei um pente de dentes largos em meu bolso. A umidade estava fazendocom que meu cabelo ficasse todo crespo e, se não cuidasse dele, iria acabar 

parecendo que tinha um vassourão na cabeça. Ellen segurou meu livro dehistoria para que eu pudesse me pentear direito. Fazia mais de dois anos que agente fazia essas mesmas coisas.- Sim, foi exatamente como eu pensava.- ela confirmou - Mas aconteceu umasurpresa legal.- Já sei, você se apaixonou pelo seu instrutor de equitação – arrisquei, pegandode volta o livro de historia.- Muito melhor. – respondeu ela, com um sorriso malandro.Como naquele momento se apaixonar era um assunto da maior importânciapara mim, não consegui imaginar o que poderia ser melhor.- O quê? – perguntei.

- Em duas palavras. Sutiã Maravilha. Minha tia me deu um.- Você é uma doida. – suspirei.- Não sou mais. Com esses truques de mulher, eu finalmente vou ter aquilo quemereço. – retrucou Ellen, faiscando com olhos verdes.Começamos a caminhar pelo saguão. Olhei para ela e, até onde podia perceber.Ellen parecia a mesma.- Não quero ser desmancha-prazeres, mas não estou notando nenhumadiferença.- Bem, é que não estou usando agora. Hoje de manhã fazia tanto calor que eunão estava a fim de todo aquele enchimento colado no corpo. Mas deixa estar,quando o outono chegar vou mandar ver.

Dei uma risadinha. Ellen sempre arranjava um jeito de fazer com que até oargumento mais furado parecesse totalmente lógico. Essa era uma das coisasque eu adorava nela.- Tenho certeza de que você vai fazer inveja na Dolly Parton – concordei,lembrando a cantora peituda, rainha da musica country.Estávamos indo para a aula de redação, que era uma das matérias que euqueria fazer desde o primeiro ano. Ellen e eu adorávamos fazer poesias e àsvezes escrevíamos histórias juntas, cada uma redigindo uma sentença.- Isso vai ser antes ou depois de ganhar o premio de melhor musical daBroadway?Havíamos chegado na sala da Sra. Heinsonh. Como a porta estava aberta pudevê-la arrumando as classes em círculo. Ela acenou quando nos avistou,chamando para sentar.- Kelly e Ellen, que bom vê-las. Sabiam que vocês serão as vítimas de minhaprimeira atividade em classe. Sempre tenho dificuldades para arrumar alguémque leia os textos para o resto da turma.- Não olhe para mim. – disse Ellen - Não vou ler nada em voz alta no primeirodia de aula.A Sra. Heinsonh virou pra mim.

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- Kelly, posso contar com você?Dei de ombros. não tinha certeza se estava a fim de fazer a leitura.- Pode ser. – respondi.Ellen e eu sentamos uma ao lado da outra.Peguei meu caderno novo(tinha umacapa preta brilhante com um calendário impresso dentro) e usei corretivo liquido

para escrever e estava "Redação" na capa. Quando estava quase pintando meudedinho com o corretivo, Ellen me cutucou..James Sutton circulava pela sala de aula e vinha direto para nosso lado. Fiqueisem fôlego por um instante e, sem querer, coloquei a mão em cima do título"Redação", que ainda estava molhado.Eu sentia uma grande queda por James desde o dia em que tinha assistido suaatuação, durante a apresentação dos calouros do Jefferson. Cabelos loiros,olhos azuis e covinhas nas bochechas, James sempre chamava a atenção.Agora era o vocalista principal de uma banda chamada Radio Waves, e todas asgarotas de todos os graus eram caidinhas por ele. Nos últimos três anos fomoscolegas em várias matérias, porém mal nos falávamos. Uma das razões é que

ele namorava Tanya, a bonita líder de torcida que estudava um ano a nossafrente. E, mesmo que estivesse sozinho, uma garota como eu não teria a menor chance. Ele poderia namorar qualquer aluna da escola.Ellen debruçou-se para o meu lado.- A fofoca é que Tanya deu o fora em James quando ela se formou. E que eleagora está livre.Procurei manter a calma me lembrando de que não havia chance de James vir se interssar por mim. Tudo o que a notícia inesperada de Ellen significava era ofato de que eu teria que me acostumar com a idéia de ver James abraçandouma garota diferente a cada dia...mas nunca a mim. Não era isso o que euqueria. Apoiei o queixo sobre uma das mãos de tal maneira que meus dedos

podiam esconder uma pequena pinta que tenho na bochecha do dado esquerdo,só para o caso de ele olhar em minha direção.Mesmo adorando a aula de Redação, fiquei a maior parte do tempo disfarçandoumas olhadinhas para James. O fato de ele ter escolhido esta matéria o tornavamais misterioso e atraente. Talvez ele fosse um novo Ernest Hemingway. Suaspernas longas esticadas cortavam o círculo formado pelas cadeiras. Não melembro nunca de ter achado uma calça jeans tão fascinante.Depois que a Sra. Heinsonh explicou a estrutura dos poemas haiku, nos deuquinze minutos para escrever um. Tudo o que consegui foi colocar meu nome noalto da folha. Acho que a Sra. Heinsonh percebeu que eu estava distraída epediu para Jack Duarte lesse seu poema para a classe.Num dado momento Ellen me passou um bilhetinho perguntando: "Como vai oSteve?". Um dia ela tinha tido uma grande queda por Steve, mas, se me lembrobem, nunca fez nada em relação ao assunto. Acho que era porque ela sabia dashistórias de Steve com as garotas e não o considerava um bom candidato anamorado. Ellen tinha uma teoria esquisita de que nosso destino, meu e deSteve, seria ficarmos juntos. Cansei de falar que não sairia com Steve mesmoque ele fosse o último dos garotos disponíveis na face da Terra, e ela apenasme encarava com um sorrisinho nos lábios.

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Nos últimos minutos de aula a Sra. Heinsonh determinou a tarefa para a próximasexta-feira. Nós teríamos de escolher uma poesia, ler em voz alta na sala edepois explicar seu conteúdo. Mentalmente repassei a lista de meus poemasfavoritos, sempre relembrando o que cada um deles significava para mim...- Me encontre na fila do almoço. – pedi a Ellen, enquanto ela saia para aula de

calculo.Ela fez um gesto de cabeça, que concordava, e me voltei, seguindo até oarmário. Ainda tinha mais duas horas de aulas antes de enfrentar aqueleambiente chato do restaurante. Antes que eu saísse, porém, senti alguémpegando em meu braço. Fiquei vermelha imediatamente. Mesmo ele nuncatendo tocado em mim, meu sexto sentido me dizia que, quando me virasse,daria de cara com James Sutton.- Oi Kelly, como vai? - Seus olhos castanhos azuis eram quentes, e me sentiquase desmaiando, como uma donzela dos tempos antigos, ou da Idade Média.- Ah, bem. Eu estou bem. - Odiei a mim mesma naquele momento. Jamesprovavelmente era um poeta incrível, e eu acabara de murmurar a resposta mais

sem graça do mundo.Ele se aproximou ainda mais de mim, o que me fez sentir um arrepio. Troquei oslivros de braço e procurei parecer descontraída.- Você me faria um grande favor? Pelos velhos tempos? – perguntou ele.Não sabia que velhos tempos eram esses de que ele falava, mas eu estava, sim,querendo lhe fazer um grande favor.- Claro – respondi sem fazer idéia do que se tratava - Como posso ajudar?- Eu não sei muito sobre poesia. Você poderia me dar umas dicas? Talvez meexplicar sobre o que é bom e o que não é, e todas aquelas coisas?Ele parecia envergonhado de verdade, e isso me derreteu o coração.- Sem problemas. – respondi - Mas, se você não é muito chegado em poesia,

porque escolheu essa matéria?Ele fez uma cara de surpresa e apontou a secretaria.- Problemas com o horárioConcordei em silêncio. Mesmo que James não fosse o próximo Quintana, aindacontinua sendo um dos garotos mais bonitos da escola.- A gente se encontra na biblioteca, amanhã depois da aula. – combinei, comose aquele encontro fosse normal.Ele me deu um apertãonzinho no braço e foi embora. Pensei em minha apostacom Steve enquanto reparava que toda garota no saguão arriscava um olhar nadireção de James. Era possível que um novo dia estivesse nascendo na vida deKelly Byrne. E não me importava qual era o motivo, se o destino, se umaconfusão de horário, o que quer que fosse. James Sutton tinha pedido a minhaajuda para o trabalho.Depois da aula encontrei Steve correndo na pista de atletismo do colégio. Eledizia que gostava de usar aquela pista porque era fácil de saber quantosquilômetros havia corrido. Mas sempre achei que gostava mesmo era de ter todas as garotas olhando pra ele.Ele diminuiu a velocidade quando me viu. Eu estava contente e não pudeesconder um sorriso. Não era sempre que tinha a oportunidade de apresentar 

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boas notícias a Steve a respeito de minha vida amorosa.- Ei, Kel. O que foi? – Perguntou ele, apoiando-se em meu ombro para poder esticar e alongar os músculos da perna.- Bem, acho que não vai dar em nada, mas James Sutton me pediu ajuda com otrabalho de redação.

Nunca fui de falar sobre meus romances sem me subestimar, então esperei queSteve comentasse para ter certeza de que o pedido de James significavaalguma coisa.Ele ficou quieto por alguns instantes. Em seguida voltou a ficar em pénormalmente e me olhou...- James Sutton? Não me diga que você gosta daquele panaca?Não acreditei que Steve acabara de chamar James de panaca.- Ah, qual é? – respondi em voz alta - James é maravilhoso, talentoso, sexy...Ele deu uma risada.- Cai na real, Dulce. O cara é um cabeça-oca. Além disso, namora a toninha daTanya desde garotinho.

Balancei a cabeça negativamente. Sempre me surpreendo com a falta depercepção dos homens em saber o que as mulheres vêem de atraente em umrapaz.- Só para você ficar sabendo. Tanya foi para uma faculdade bem longe. Jamesestá disponível.- Bem, então sorte sua.Steve começou a se exercitar sem sair do lugar e senti que ele não teria maisnada de útil para dizer sobre o assunto.- É isso aí. Pelo menos dessa vez, SORTE MINHA. Agora se me der licença,tenho de ir a biblioteca.Não disse a ele que queria pesquisar alguns poemas antes de ajudar James no

trabalho, porque Steve não entenderia o que significava se preparar.Saí da pista com a cabeça erguida. Claro que o deixei com ciúmes. Eu tinhaconseguido um ótimo começo em relação a nossa aposta, e ele certamente nãoaguentaria pensar que poderia perder. Corri para o meu carro, com a mochilabalançando nas costas.Tarde da noite eu ainda me revirava na cama, tentando pensar no poemaperfeito para James ler em sala de aula na sexta-feira. Podia antever seu rostose iluminando enquanto lia e a forma como iria entender o porquê de eu ter escolhido precisamente aquele poema. Ele tomaria minhas mãos nas suas e suaboca se aproximaria da minha. Bem na parte em que James se preparava parame beijar apaixonadamente, meu telefone tocou. (Meus pais me deram minhaprópria linha telefônica aos catorze anos, já que praticamente vivia penduradano nosso telefone.) O som do toque fez meu coração acelerar. Será que Jamese eu podíamos nos comunicar mentalmente?- Alô?- Sou eu.Imediatamente me senti uma boba. Sempre ficava contente em ouvir a voz deSteve, mas não era bem ele quem estava esperando ouvir.Olhei para o relógio na cabeceira.

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- O que foi? É tarde.- É sim. Adivinhe o que o seu super amigo tem para contar?- Você já se apaixonou?Só mesmo Steve para achar que encontrara a garota perfeita em apenas oitohoras depois da última vez que tínhamos nos visto.

- Não, CASABLANCA está passando na “Sessão Corujão”. Canal quatro.- Ligo para você em seguida.Desliguei e pulei da cama, indo para o estúdio onde temos uma televisão e umtelefone. Meus pais estavam dormindo e, por isso, não acendi luz nenhuma. Sobo clarão vindo do aparelho de Tv, disquei o número de Steve. Ele atendeu aoprimeiro toque.- Humphrey Bogart acabou de vê-la pela primeira vez. Ela está ouvindo Samtocar piano.- Eu sei. Acabei de ligar a TV.Sentei-me no sofá com o telefone ao ouvido. Steve e eu às vezes assistíamos aum filme falando ao telefone. Mesmo que não conversássemos muito,

gostávamos de ter alguém para comentar as passagens que nos emocionavammais. Casablanca era nosso filme favorito de todos os tempos.Uma hora e meia depois eu tentava abafar meus soluços, mas mesmo assimSteve sabia que eu sempre chorava quando ficava claro como era impossível oamor entre Rick e Ilsa.- Kel, está chorando de novo? Você já viu esse filme umas trinta vezes.- Eu sei – respondi enxugando os olhos - Mas mesmo assim continua sendotriste cada vez que vejo.Eu estava quase sussurrando, porque não queria acordar meus pais.Steve riu delicadamente.- Você é romântica mesmo, não é?

- Ah, eu apenas sou sensível a filmes românticos.- Bons sonhos, Kelly.- Bom sonhos, Steve.Desliguei o telefone e a televisão. Enquanto voltava para meu quarto, lembrei deque não tinha escolhido o poema para James.- Chama-se”Canção para beber” – disse James – Olha, Yeats criou umametáfora entre beber vinho e estar apaixonado.Quase desmontei quando percebi o que havia dito, me senti mortalmenteenvergonhada. Será que James ia pensar que escolhi aquele poema depropósito, que estaria sugerindo que ele e eu ficássemos apaixonados ou coisaparecida?Então resolvi não esquentar a cabeça. A maioria dos poemas é sobreamor, ele não iria pensar que eu tinha segundas intenções.James sorria de modo irônico ao meu lado.- Heinsohn vai ver só uma coisa. Ela sempre está falando sobre metáforas ecoisas do tipo e tudo o mais sobre poesias.- Sim, ela vai gostar deste. Podemos conversar mais sobre a interpretaçãodepois da aula... se você quiser.Ele fechou o livro de poesias e colocou a mão sobre meus joelhos. Tocou por apenas um instante, mas me fez estremecer toda.

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- Você é a melhor Kelly.Então se levantou segurando o livro. Fiquei observando enquanto ele ia emborae admirando seu jeans desbotado, que realçava seu corpo. Será que Jamesnunca me enxergaria comO amor da sua vida, desses amores escritos nos poemas de Shakespeare?

Será que algum rapaz alguma vez me veria daquele jeito? Toquei meu joelhoonde James havia colocado a mão e pensei no que Steve poderia dizer nessecaso:"Você tem de ir a luta, Kelly. Ou a vida vai passar sobre você como um rolocompressor."Bem, mesmo Steve não achando que James fosse grande coisa, eu adotaria afilosofia de vida do meu melhor amigo. Já estava cansada de ficar de fora do

 jogo do amor... Droga! Vai ver que eu andara lendo poesia demais...

4 – STEVE

Quinta-feira, 12 de setembro

Nove horas da manhã.Puxa!já se passaram seis semanas de aula, mas até parecem seis dias. Aindanão saí com Rebecca, mas tenho conversado com ela muitas vezes. Hoje nóstivemos um papo interessante.- Você vai ao jogo de futebol amanhã? – perguntei.- Por que iria? – retrucou ela.Dei de ombros.- Eu vou estar lá.Ela sorriu tão longa e demoradamente que me deu vontade de agarrá-la e beijar aqueles lábios vermelhos.- Bom, se é assim então acho melhor consultar a minha agenda – disse.

Na aula de orientação de hoje não pude falar com ela frente a frente. Mas tenhoa impressão de que ela vai ao jogo. Acho que amanhã vai ser uma grande noite.Kelly vai ficar chateada por eu estar ganhando a posta, mas isso é problemadela. De qualquer jeito ela não vai cair na real em relação a James Sutton. Sópor que esta ajudando o cara nas tarefas de redação, ela pensa que estaapaixonada. Mas, pelo que ela me contou, James não é lá muito bom de papo.Meio sem querer, peguei uma conversa dos dois na biblioteca e tive que tapar aboca pra não dar uma risada.Kelly (falando de um livro que tinha na mão): Eu adorei 1984. o que você achou?Sutton: gostei. Foi um ano legal. Eu adorava andar de skate naquela época.Kelly: mas eu estava falando do livro de George Orwell. Aquele sobre o futuro.Sutton: ah, sim. Acho que assisti o filme na tv. É aquele sobre o computador chamado Hal, não é?Kelly: ah, é sim...Quando será que ela vai enxergar que:

1) o cara só tem aquele cabelo cheio de luzes e outras coisas horrorosas porqueas garotas adoram.2) Ele ainda sonha com a Tanya-qualquer-coisa.

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Acho que preciso ter uma conversa de verdade com ela. A vida da Kelly taficando quase ridícula.- Steve, você tem de fazer alguma coisa em relação a esse carro. - disse Kellyenquanto chegávamos ao colégio na sexta-feira.

- Por quê? – respondi, procurando um lugar grande o suficiente para quecoubesse meu Oldsmobile 1972.- Está nojento. Eu acho que até tem alguma coisa nascendo dentro daquelagarrafa.Ela me mostrou então uma garrafa plástica com um líquido meio esverdeadobalançando lá dentro. Depois apontou para o assoalho, ao lado do passageiro,onde seus pés se apoiavam sobre uma pilha de jornais velhos e latinhas vaziasde refrigerante.- Está certo. Como pagamento pela carona até o estádio de futebol, porque vocênão dá uma limpada no meu carro? Eu até passo com ele pela sua casaamanhã, só para facilitar as coisas pra você.

Estacionei o Oldsmobile entre um pequeno Toyota e um Fiat, enquanto Kellydestravava o cinto de segurança.- Sem chance. Provavelmente iria parar no hospital, vítima de algum venenocriado aqui.Fechamos as portas e fomos para o estádio. Parecia que todo o colégioJefferson tinha vindo assistir o primeiro jogo dos Raiders da temporada.Kelly se enveredou pelo meio do amontoado de calouros que zanzavam fazendohora perto das arquibancadas. Ela foi abrindo caminho em direção à parte maisalta das arquibancadas onde Ellen Frazier e Mike Feldman já estavam sentados.- Oi pessoal – cumprimentou Kelly – Já entraram no clima do jogo dos Raiders?Ellen fez careta.

- Claro. Mal posso esperar para começar a torcer. Adoro assistir a AmandaWright chacoalhando seus pompons.- Que coincidência! Eu também! – disse Mike, mexendo com suas sobrancelhaspretas.- Então por que a gente vem assistir? – Kelly perguntou a Elles, enquanto sesentava perto de mim – Até parece que a gente gosta de futebol.-Estamos aqui pela mesma razão que todas as outras garotas – respondeu Ellen

 – Esperamos encontrar nosso verdadeiro amor nas arquibancadas d ColégioJefferson.Desliguei da conversa de Kelly e Ellen e olhei as arquibancadas. Mesmoachando que Rebecca Foster não aparecia no jogo de futebol, tinha umapequena esperança no intimo de que poderia topar de repente com aquelecabelo loiro e aqueles olhos azuis no meio da multidão.Rebecca e eu tínhamos conversado durante todos os dias daquela semana. Elaandava flertando comigo, sorrindo, jogando o cabelo para trás de modoprovocante e tinha olhado para mim de um modo especial. Porém depois daaula de orientação ela sempre desaparecia pelo saguão, e até aquele momentoeu não tivera oportunidade de combinar um encontro. Mas sabia que aindaconseguiria. Toda vez que a via entrando na sala de Maughn com se fosse a

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dona do colégio, eu tinha a certeza que não descansaria enquanto não abeijasse.Meu coração veio parar na boca quando vi Rebecca, sentada com um panfletode futebol nas mãos, do outro lado das arquibancadas. De agasalho e umacamiseta preta justinha, mesmo daquela distância pude perceber que ela estava

linda. E, o melhor de tudo, sozinha. Era exatamente a oportunidade queesperava.Quando me levantei senti Kelly me puxar pelo bolso de trás de meu jeans.- Aonde é que você vai? A gente acabou de chegar.- Vi o Andrew. – respondi, apontando para algum lugar nas arquibancadas dooutro lado do campo - Vou até lá conversar com ele.Não estava a fim de agüentar as gozações de duas amigas sobre ir paquerar uma garota. Não tinha certeza se Rebecca me receberia bem ou não e, setivesse de voltar sem conseguir nada. Não queria que todos ficassemcomentando pelo resto da noite.Antes que alguém dissesse alguma coisa, me mandei arquibancada abaixo, de

olho no ponto onde Rebecca estava sentada. Para o caso de Kelly estar olhandofui para o lado da numeradas e fiquei na fila por alguns minutos. Dei umaespiada no placar e vi que os raiders ganhavam por 7 a 0, dando-me contasubitamente de que até o momento não tinha assistido um minuto do jogo. Corripara o lado das arquibancadas em direção a Rebecca.À noite ela parecia ainda mais bonita do que às cinco para as nove da manhã.Seu cabelo brilhava ainda mais sob as luzes dos refletores do estádio. Quandome viu caminhando em sua direção, sorriu e deslizou para o lado do assento.Entendi que era um convite para que me sentasse ao seu lado.- O Doce Steve. Como está? – ela cumprimentou quando me aproximei. Opessoal tem me chamado por esse apelido para fazer graça sobre minhas

conquistas. Normalmente isso me irrita um pouco. Mas, vindo dos lábios dela, oapelido acendeu uma esperança.-Steve: Tudo legal, vim para assistir ao jogo.Quando me sentei a seu lado dei um jeito para que nossos joelhos se tocassem.Mesmo esbarrando pela calça jeans, pude sentir um choque percorrendo minhaperna de cima a baixo.Rebecca olhou para o campo e suspirou.- Eu ia ficar em casa hoje, mas é tão solitário. Não consigo ficar assistindo aosprogramas de tv de sexta à noite.Concordei balançando com a cabeça e quase não acreditando na minha boasorte. Claro que ela estava procurando alguém para curtir a noite. Com certezaera uma garota tímida e sensível e talvez fosse por isso que sempre saia tãodepressa depois dos períodos de aula.- Não esquenta, Rebecca. Eu posso ser seu guia pelos próximos jogos dasnoites de sexta-feira no colégio Jefferson.Ela deu uma risadinha e chegou um pouco mais perto.- Ouvi algumas garotas comentando que vai ter uma festa na casa de PatrickMayor depois do jogo.Suspirei disfarçadamente pensei que depois nós poderíamos sair para comer 

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um hambúrguer ou uma pizza. Patrick Mayor era um jogador de futebol de quemmuita gente não gostava. Porem, se ela queria um pouco do outro lado doJefferson, não seria eu quem iria contrariar sua vontade.- Legal. Vou falar com a turma e vamos todos juntos. Você poderá conhecer ummonte de pessoas.

- Quem são seus amigos? – perguntou ela.- Bem, você conhece Andrew Rice. Ele está em nossa turma de orientação.- Sim. Ele joga futebol.Confirmei meio surpreso por ela saber o esporte preferido de Andrew. Vai ver ele tinha andado dando em cima dela quando eu não estava por perto. Típico.- É isso, ele joga como centroavante.- Quem mais?Ela olhava para mim com expectativa e não pude deixar de reparar em seuscílios, os mais longos que já tinha visto.Por um segundo fiquei indeciso. Achei que não ia pegar bem falar de Kelly.Muita gente não compreendia nossa relação, e eu não queria que Rebecca

entendesse errado também. Contudo, se não falasse e ela descobrisse maistarde que éramos grandes amigos, seria ainda pior. Disfarcei e procurei falar com a maior naturalidade possível.- Kelly Byrne é minha melhor amiga. Ela está sentada nas arquibancadas dooutro lado, junto com nossos amigos.Rebecca olhou para o povão.- El não é líder de torcida?Dei uma risada. Imaginar Kelly como líder de torcida era tão engraçado como seeu estivesse lá no campo comandando a turma. Kelly não era do tipo de garotaque veste uma minissaia e fica gritando as letras do nome de um jogador parapentelhar a torcida. Kelly prefere sentar e fazer comentários cínicos a respeito

da vida dos adolesncentes do segundo grau de hoje em dia. Balancei a cabeçanegativamente.- Não, mas ela é dançarina. Ela ensina jazz durante o verão em umacampamento em Minnesota.- Que legal. – disse Rebecca, franzindo o nariz.- Chega de falar de Kelly. Conte mais sobre você senhorita Foster.Rebecca ficou quieta durante um instante como se estivesse organizando ospensamentos.- Bem , eu disse que era da cidade de Nova York.- Disse sim.Eu estava tentando prestar atenção no que ela falava, mas me distrai olhandouma mecha de cabelo castanho brilhoso que caía sobre seus olhos. Não puderesistir e, passando a mão coloquei o cabelo preso atrás de sua orelha.- Já contei que nos mudamos para cá porque meu pai e minha mãe queriam quemeu irmão e eu tivéssemos uma vida melhor em uma cidade pequena?- Contou.Continuei pensando em como era sedoso o seu cabelo que acabara de tocar.Ela não se afastara quando esbocei o gesto, o que achei promissor.- Já disse que acho você uma gracinha? – ela mordeu o lábio ao falar, e ficou

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me olhando com aqueles longos cílios.Fiquei momentaneamente tão chocado que não consegui responder nada. Masme recuperei em seguida:- Não, não me disse.Ela fez que nem se importou.

- Então me lembre durante a festa que eu direi.Sorri imaginando Anah andando pela escola com aquele cabelo vermelhointenso. Eu já podia sentir o gostinho da vitória.

*

O resultado do jogo foi 2 a 1. Foi uma grande vitória do Elite, para um começode temporada, e todo mundo invadiu o campo para cumprimentar os jogadores,Peguei na mão de Rebecca enquanto a gente andava pelo meio da multidão.Tinha certeza de que Kelly podia arranjar uma carona para casa com Ellen, masse ela estivesse esperando por mim não queria deixá-la desapontada.

Ela não estava na arquibancada e, mesmo depois de dar uma volta pelo campo,não consegui encontrá-la em lugar algum. Rebecca não gostou desse passeiopela praça de esportes do Jefferson e então decidi que Kelly seria perfeitamentecapaz de se virar sozinha.- Podemos dar uma passadinha em casa para eu me trocar? – Ela perguntouenquanto nos dirigíamos a meu carro no estacionamento.- Você está linda assim mesmo. – disse eu, admirando-a pela centésima vêsnaquele dia.- Obrigada. Mas como não conheço o pessoal acho melhor eu não parecer desarrumadaEntramos no carro, o que terminou a conversa.

Enquanto dirigia para a casa dela fiquei pensando como iria se vestir, já que seachava desarrumada agora.Algum tempo depois estava sentado na sala da casa dos Foster, esperandoRebecca acabar de se arrumar. Os pais dela tinham saído e a casa permaneciasilenciosa. A sala era grande com um pé direito alto e grandes portas francesas.A sra. Foster tinha instalado um carpete grosso cor de creme e colocado algunsquadros na parede.- Meu irmãozinho ainda vai acabar com esse carpete – pude ouvi-la dizendominutos depois. Ela estava parada na porta do corredor de saída e pareciamaravilhosa. Trajava um vestido vermelho curto e decotado. Usava um colar tãofininho que parecia prestes a se arrebentar a qualquer instante.- Tchau, desarrumada. – eu disse por pura gozação.Ela deu uma voltinha e em seguida pegou em meu braço.- Vou considerar isso um elogio. – respondeu bem humorada.- Mas foi essa mesmo a intenção.Saímos para a noite quente e gostosa e Rebecca trancou a porta da casa.Caminhamos até o carro, e seu salto fazia pequenos ruídos contra a calçada. Noescuro da noite, cada passo sussurrava uma promessa. Apesar do calor,experimentei um calafrio.

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Quando chegamos a casa de Martin, havia carros estacionados por todo oquarteirão. Paramos a umas dez casas de distância e seguimos juntos com umaturma de colegas do Jefferson até a porta da casa. Bem antes de chegar àentrada já se podia ouvir a música vindo de caixas acústicas potentes. Rebeccaagarrou a minha mão com força e retribui com um suave aperto. Imaginei como

poderia ser constrangedor ficar andando por uma casa desconhecida cheia depessoas estranhas.De repente Andrew saiu de dentro da casa de Martin na maior correria. Atrásdele vinha uma garota gritando esganiçadamente com uma metralhadora debrinquedo espirrando água.- Vou pegar você. – gritava ela, enquanto passava por nós feito uma bala.Andrew correu para trás de mim como se eu fosse um escudo.- Aqui é território neutro – gritou - Steve é como se fosse a Suíça.A garota que só então reconheci, era Carrie Starks (a número dez da lista deAndrew) e baixou a arma de brinquedo.- Está certo. – concordou ela - Mas estou esperando você lá dentro.

Andrew saiu de trás de mim e me cumprimentou.- Grande festa, não é?Concordei de imediato.- Realmente tem uma festa aí, é o que posso dizer.Andrew se abaixou para amarrar um dos tênis.- O que aconteceu com você no jogo? Kelly me disse que você tinha ido meprocurar para conversar, mas não o encontrei. Quando disse que o não tinhavisto, ela fez aquela cara de quem não gostou muito e murmurou alguma coisasobre uma aposta.Por um instante me senti culpado por largar Kelly no estádio. Mas não haviaporque me preocupar. Eu poderia muito bem telefonar para ela de manhã cedo

para me desculpar. Em vez de responder a pergunta eu me virei para Rebecca.- Andrew, você conhece Rebecca?Ele olhou ainda abaixado e reparou pela primeira vez que ela estava comigo.-Claro que conheço. Qualquer pessoa que tire sarro do Maughn é alguém queeu considero uma amigo.Andrew se curvou diante dela e a beijou a mão.- Eu não fiz de propósito para contrariar – insistiu ela – Acho que ele apenascostuma dizer a coisa errada na hora errada.Andrew e eu caímos na risada. Era um comentário suave diante do que tinhaacontecido.- De qualquer modo, Kelly esta lá dentro – disse ele- ela e Ellen estão gastandoo chão de tanto dançar.-Steve: É mesmo?Não sei porque fiquei surpreso em ouvir que minha amiga estava na festa.Provavelmente porque sempre era eu que a levava a todos os eventos sociais.Na maioria das vezes ela ficava irritada durante as festas e então começava ame perturbar para levá-la para embora para casa, no máximo depois de umahora e meia.- É isso aí, cara. Dá uma conferida.

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Andrew voltou correndo para dentro de casa, gritando cumprimentos para todosque encontrava pelo caminho.Seguimos atrás dele e, enquanto entravamos, eu ia dizendo o nome e faziaalgum comentário sobre cada uma das pessoas que estavam no jardim.Rebecca parecia estar absorvendo cada palavra que ouvia, balançando a

cabeça e prestando muita atenção a tudo o que se passava em volta.Quando entramos, ela quis ir para perto de onde vinha a música. O tapete tinhasido enrolado e colocado em um canto na sala de Mayor, e todas as poltronas esofás estavam encostados as paredes.Assim que entramos na sala, a música foi trocada e valeu como uma deixa paraque eu tirasse Rebecca para dançar. Ela me pareceu contente e, por isso,apertei um pouco mais meu braço contra a sua cintura.Enquanto dançávamos pela sala, vi uma cena que me deixou de boca aberta.Kelly estava dançando bem do nosso lado, quase ombro a ombro.Seus olhos estavam fechados e sua cabeça se recostava contra o peito deJames Sutton. Eu não ficaria mais chocado se avistasse um elefante entrando

de repente pelo meio da sala. Kelly não era o tipo de garota que chama aatenção por estar dançando devagar e coladinha (na verdade, eles estavamparados se abraçando), bem no meio de uma festa lotada de gente.Quando Kelly abriu os olhos, ela me viu encarando-a de frente. Pensei queficaria sem graça e se afastaria de James, mas não foi isso que aconteceu. Eladeu uma piscadinha e, e fez sinal de positivo.- Oi, Steve. - disse, parecendo muito orgulhosa de si mesma, como se dançar com James Sutton fosse equivalente a ganhar o prêmio Nobel da Paz ou coisaparecida.- Ah, oi. – respondi.- Oi, Parson. – James cumprimentou, dando-me um tapinha nas costas - Quem

é a sua nova amiga?Por uma fração de segundo esqueci o nome de Rebecca. Mas isso não tevemuita importância porque Kelly respondeu.- Rebecca, certo? Eu sou Kelly e, esse é James.Notei que Kelly puxou James um pouco mais para perto, como se estivessequerendo indicar a Rebecca que aquele era seu namorado.- Oi, James. – respondeu Rebecca, e não disse nada para Kelly.Houve um longo silêncio que me deixou desesperado para quebrar.- A gente se encontra por aí mais tarde. - Falei, puxando Rebecca para outrolado.- É, pode ser. – Kelly respondeu.Mas ela nem me olhou. Encarava James, e de repente senti que alguma coisamuito importante estava acontecendo, algo como por exemplo Kelly estar mevencendo na aposta.Esfreguei o queixo no cabelo macio de Rebecca enquanto tinha uma visãodesagradável de mim mesmo com a palavra "perdedor" escrita no corte decabelo.Não era uma cena muito bonita.

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*

Conversei com Kelly no domingo a noite.-Kelly: Então, como vai a adorável Rebecca? - Ela perguntou assim que atendiao telefone.

- Adorável. – respondi secamente.Estava esperando que ela comentasse como tinha feito papel de bobaagarrando Sutton.- Sexta foi demais, não é?- Incrível. – respondi. Ela não estava entendendo minha ironia.- Uma pena que Rebecca não seja o tipo de garota pela qual você poderia seapaixonar. Acho que estou na frente na corrida para achar o par perfeito.- O QUÊ? – gritei. Agora ela estava me sacaneando de verdade. - Por que nãodeveria me apaixonar por Rebecca?- Você não viu o jeito como ela ficou olhando para James? Quase ficou vesga.Espero que James não a convide para sair. Ela é muito bonita.

- Ah, dá um tempo. Rebecca nunca sairia com James. Ele é totalmente inferior amim.- Ele era, não era?Kelly deu uma risada.- Por favor, desculpe. Esqueci com quem estava falando. Você é o maior cara domundo.- Não precisa vir com gozação. - Falei, me sentindo magoado.Kelly ficou quieta por um instante.- Falei sério Steve. Você é o melhor. É só observar quem escolhe como seusmelhores amigos para a gente perceber isso.Como sempre eu não conseguia ficar bravo com Kelly.

-Steve: Durma bem Kelly.-Kelly: Durma bem Steve.Desliguei o telefone sorrindo. Kelly Byrne era única, especial.

5 – KELLY

Quarta-feira, 18 de outubroSim, sim, sim! hoje foi simplesmente demais, nem sei se vou conseguir dormir.antes de entrar em detalhes, devo dizer que até dançar com James na festa deMartin no fim de semana passado, meu progresso com ele não vinha sendo lámuito grande. Na verdade, tinha sido o mínimo.Exemplo: numa ocasião, depois de várias semanas ajudando James no trabalhode redação, eu estava olhando para ele por cima de um livro de poesias deWallace Stevens. Ele percebeu que eu olhava e me perguntou:- o que foi? meu rosto está sujo?Então sem pensar respondi:- ah, eu só estava aqui sentada, sonhando acordada com o fim de semana. oque você vai fazer no sábado à noite?Grande sacada, certo? errado! ele respondeu:

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- sábado eu tenho ensaio com a banda.- ahhh...- Foi minha resposta, e voltei ao livro de Wallace Stevens- e você, vai ter um encontro com quem? - Ele perguntou em seguida.- encontro?- Engoli em seco.- sim. você disse que estava sonhando sobre o final de semana. Então deduzi 

que você deve ter um encontro, que é sobre o que eu costumo fantasiar.- ah, ninguém que você conheça.- Desconversei de modo meio esfarrapado.Já tinha dado toques demais.Uma semana depois James me perguntou como estava indo o romance commeu misterioso namorado e, sorrindo enigmaticamente(bem, pelo menosesperava que sim), respondi que não tinha dado certo.Ele não respondeu masme deu uma olhada muito significativa. Depois comentou:- você realmente mudou muito, dulce. antes você era mais uma garota do tipogrande amiga, mas agora...sei lá...agora é mais como uma mulher.Daí ele saiu andando, sem perceber que meu coração estava quase saindo pelaboca.

Então, depois da aula de redação, James me pegou pela mão e puxou parauma sala de laboratório vazia. Ele me abraçou e começou a dançar igual nasexta-feira passada. Ele parou e disse exatamente:- que tal se a gente fosse dançar mais no sábado à noite?  

 Admito que foi uma situação meio boboca e antiquada, mas o que é que temisso? O que importa é que ele me convidou para um encontro de verdade. Claroque, quando contei para Steve, eu estava meio gaguejante e ele tirou o maior sarro da minha cara. Mas, pergunto de novo, qual o problema? Agora só precisofazer acontecer no sábado...

Engraçado como na vida da gente, o tempo às vezes parece voar e, em outras

simplesmente parece que para, desafiando qualquer conceito lógico! Eu explico.Meus dois primeiros anos de colégio rastejaram como se o tempo fosse umatortura. Cada aula parecia que ia durar até o próximo século, as noites de sexta-feira se arrastavam interminavelmente e as tardes de domingo eram como umasentença de prisão dentro da biblioteca.No último ano tudo mudou. Nas primeiras semanas de outubro minha vida quaseme deixou tonta. Entre minha paquera com James, papeando com Steve eestudando, eu me senti como se estivesse em ação durante as vinte e quatrohoras do dia. Percebi também que, com um pouco de maquiagem, meus olhosficavam exatamente como Steve sempre disse que gostava. Também estivetrabalhando como babá, em alguns dias da semana depois das aulas eganhando uma grana (nem me importei que viesse na forma de notasamarrotadas, e não como um cheque limpo e profissional), o que me fazia sentir como uma adulta.Quinta-feira de manhã acordei antes que o relógio tocasse. Meio no escuro,ainda fui tropeçando até o calendário quase em branco na parede. Peguei umavelha caneta com tinta perfumada (vermelho framboesa, mais exatamente) emarquei o dia 21 de setembro. Não era para não esquecer qual o dia em quetinha um encontro com James, só queria ficar acompanhando os dias que

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faltavam até a data.Quando chegou o sábado (achava que o mundo ia acabar antes do final desemana), meu estômago dava voltas. Lá pelas seis horas me tranquei nobanheiro para vomitar. Isso não foi muito legal.Depois que me recuperei fiquei olhando para o dia marcado no calendário. Claro

que sempre pensei naquele primeiro dia na biblioteca como o de nossoaniversário. Depois daquele dia estava certa - ou mais ou menos...bem, não, naverdade - de que iria vencer a aposta com Steve. Ele com certeza se encheriade Rebecca em uns dois meses, mas eu estaria namorando firme com James.Durante as aulas de redação ficava olhando para ele e pensando em nós dois,velhinhos, de cabelos brancos, rodeados de netinhos. Ellen não conseguiaacreditar que eu pudesse me comportar assim tão estupidamente, até agora elanunca tinha me visto assim, caminhando nas nuvens. Na verdade, até hoje nemeu mesma tinha me visto assim, nas nuvens.Lá pelas oito horas contemplava a mim mesma na frente do espelho em meuquarto. Estava com um vestido preto curto e casaquinho preto. Meu cabelo

comprido caía pelo rosto e, nos lábios, tinha aplicado um batom rosa clarinho.Quando ouvi uma buzina lá fora, apanhei a bolsa e corri escadaria abaixo.- Tchau. - Gritei para meus pais, que estavam assistindo TV no estúdio.- Steve sempre vem até a porta. - Minha mãe comentou.- Steve é um pateta.James me esperava em seu jipe vermelho, mas o jipe tinha a capota abaixada eo vento desalinhara alguns fios de seu cabelo. Ele parecia muito bonito, e por um momento quase não acreditei que nós estávamos saindo para um encontrode verdade.Ele se inclinou e empurrou, abrindo a pequena porta do jipe, enquanto sorriapara mim. Entrei quase tendo um troço. Nós já tínhamos ficado sozinhos antes,

mas sempre no meio de outras pessoas. Sentar perto de James e ver sua mãopegando a alavanca de câmbio me fez sentir como se apenas nós doisexistíssemos no mundo.- Poderíamos ir a pizzaria do Jon. - Sugeriu ele, enquanto eu tentava afivelar ocinto de segurança com as mãos tremendo.- Legal. - Respondi baixinho.Por algum tempo andamos em silêncio. No céu as estrelas já brilhavam. Olhei eescolhi a mais brilhante. “LUZ DA ESTRELA, BRILHO ESTELAR, À PRIMEIRAESTRELA QUE VEJO ESTA NOITE, EU PEÇO, EU DESEJO...VENCER AAPOSTA COM STEVE". “Estou pronta para me apaixonar” pensei. Por umaquestão de ênfase, fechei os olhos e visualizei a estrela em minha mente.Quando abri os olhos, James estava me olhando com uma expressão deencanto.- Olho para você e suspiro. – disse ele - Você é linda.Meu coração acelerou. James acabara de citar uma frase do poema "Umacanção para beber", de Willian Butler Yeats, um dos que selecionei para eleincluir em seu trabalho de redação de algumas semanas atrás. Sua voz eraprofunda e rouca, produzindo calafrios que me percorriam a espinha.Jon faz uma pizza na pedra deliciosa, e era um lugar5 muito popular na época.

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Estivera lá um milhão de vezes com Steve e Ellen, sempre secretamenteinvejando os casais sentados nas mesas ao longo da parede do restaurante.Agora estava radiante toda garota lá olharia para nós desejando estar em meulugar.- Gosto de pepperoni – ele falou quando nos sentamos.

Olhei para o menu. Steve e eu gostávamos de inventar combinações de pizzas.Nossa favorita era berinjela, bacon e cogumelos.- Para mim está bom. – concordei.James recostou-se apoiando às mãos sobre a mesa. Sem saber bem o queconversar, fiz o mesmo. De repente ele se inclinou para a frente.- Então você e Steve Parson não têm nenhum caso? – perguntou.Gelei.- O quê?- Você e o Parson. Todo mundo na escola sabe que vocês dois são como doisirmãos siameses.Não pude resistir à risada. Steve tinha tido umas vinte namoradas só nos últimos

dois anos. Será que James pensava que eu era o tipo de garota capaz de seenvolver com um cara que vivia correndo atrás de outras?- Steve tem um monte de namoradas, mas definitivamente não sou uma delas.Nós somos apenas amigos.James fez o pedido à garçonete e, olhando para mim, levantou as sobrancelhas.- Não acredito que pessoas de sexos diferentes possam ser amigas. – afirmou -Acho que sempre vai haver uma certa...tensão.- Não no meu caso. – respondi rapidamente.Estava desesperada para mudar de assunto, mas ao mesmo tempo curiosa parasaber o que as pessoas pensavam sobre minha amizade com Steve. Alguémseria capaz de acreditar que eu e ele fossemos namorados? Será que todos

achavam mesmo que eu me limitava a ficar sentada, esperando pacientementeenquanto ele saía para namorar todas as garotas da escola? Era umpensamento humilhante. Sempre me vi como uma mulher forte e indomável, nãoo tipo que aceita um segundo lugar. Mas poderia ser que os outros não meenxergassem desse modo. Talvez me considerassem uma bonequinhaapaixonada.- Bem, de uma coisa eu sei. – disse ele, pegando na minha mão.- O quê?...Os pensamentos sobre Steve fugiram de minha cabeça assim que senti seusdedos fortes que se entrelaçavam com os meus.- Nós dois nunca poderemos ser amigos.Seus olhos brilhavam e seus lábios vermelhos pareciam irresistíveis.- Por quê? - murmurei- Porque eu sempre vou querer beijar você, assim como estou querendo agora.Precisamente nesse instante a garçonete veio trazer nossos refrigerantes. Issoquebrou a tensão, mas eu tinha certeza que meu rosto estava em brasa. Nãosabia como interpretar tudo que James dizia. Por um lado, sonhava com essemomento. Por outro, a situação não parecia muito real. Sempre pensei que umromance florescesse como um turbilhão. Eu me imaginava trocando frases

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poéticas e olhares apaixonados com meu amado. No entanto, ali estava James,me falando daquele modo e eu totalmente sem graça. Ele quase não meconhecia de verdade, pensei. Será que aquelas palavras eram sinceras?Mais tarde a garçonete veio trazer nossa pizza. Enquanto via James cortandoum pedaço e dando uma grande mordida, outro pensamento me veio a cabeça.

Se James fosse mesmo tão legal, por que iria me querer? Afinal de contas,ninguém jamais tinha se interessado por mim.Apesar de sentir o estômago embrulhado, resolvi também começar a comer meupedaço de pizza. James me olhava intensamente, e quase me engasguei com oqueijo, que pareceu entalar na garganta, impedindo-me de respirar direito. Tossie tomei um grande gole do meu refrigerante. Imaginei então que, se Jamestivesse sentido alguma atração por mim, eu acabara de arruinar minhaschances. Esse pensamento provocou uma estranha sensação excitante. Sempreadorei um desafio.- Então, James, o que você acha das aulas de redação? - Perguntei, tentandolevar o assunto para um campo mais seguro.

- Redação é muito legal. – respondeu ele.- Acha mesmo?-Claro. Acho até que vou escrever algumas das letras de música para a minhabanda. Normalmente quem escreve é outro, mas suas poesias são muito semgraça.Ele pegou outro pedaço e um guardanapo.- Que bom. Eu gostaria de ler algumas de suas letras de música qualquer diadestes, se você deixar.- Acho que vou compor uma musica para você.Novamente fiquei envergonhada. Olhei para baixo, concentrando-me na comida.Flertar não era o meu ponto forte e, mesmo me esforçando, não conseguia

achar nada de interessante para dizer em resposta.James parecia não gostar de falar enquanto comia, e então fiquei prestandoatenção nas conversas das outras mesas. Sempre que estou nervosa, consigome acalmar prestando atenção em alguma outra coisa que não em mim mesma.Este era um truque que minha mãe tinha me ensinado.Ouvia o que as pessoas atrás de nós nas mesas falavam. A primeira voz era deuma garota que já havia visto quando entramos no Jon’s.- Papai me tomou o cartão de credito por um mês. Ele ficou histérico só porquecomprei uma jaqueta de couro na semana passada, pode? Nunca vi um cara tãochato!Revirei os olhos. Se eu usasse o cartão de credito do meu pai, ficaria trancadaem meu quarto por um ano de castigo.- Não é justo! – disse o garoto ao lado dela – Será que ele não percebe que,sem cartão, você não é ninguém?...- O que eu posso fazer? Ele não tem noção do que é ser jovem. Estou pensandoem processa-lo por negligencia e abandono.Dei uma risada alta. A conversa atrás de nós parecia a fala de personagens deum filme de segunda categoria. Pode uma coisa dessas?- Você ouviu essas duas? - Cochichei para James.

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Ele negou balançando a cabeça.- O que estão conversando?Limpei a garganta e me preparei para fazer uma imitação de uma garotinha rica.Era uma mistura se sra. Howell do programa A ilha de Gilligan e aquilo queimaginava ser a voz de uma aristocrata.

- É tãããão cruel. – imitei a garotinha - Papai tirou meu Roll’s Royce. Ele meobrigou a ficar com a BMW. Estou tãããão humilhada.Tornei a rir.O rosto de James estava totalmente inexpressivo. Ao ouvir a voz delas,sussurrei sacudindo a cabeça na direção da mesa di casal.- Escute.- Adorei a reforma que fizeram no clube de campo. – comentou a garota - Masacho que o painel de mogno atrás da churrasqueira ficou exagerado.Pisquei para James, mas ele olhava para mim como se eu estivesse maluca.Pelo jeito, não achara a menor graça na minha imitação. Suspirei. Se Steveestivesse comigo, quando imitei a menina ele teria imitado a outra.

Provavelmente ficaríamos imitando as duas pelo resto da noite e rindo o tempotodo.Fiquei envergonhada quando vi James estava sério. Reconheço que não eramuito simpático fazer pouco de outras pessoas. Percebi, que para Buffy (o nomeque inventei para a garota que imitei), ficar sem o cartão de crédito era mesmouma grande tragédia.James empurrou seu prato vazio.- Sabe, o Radio Waves está se preparando para assinar contrato com umagravadora independente. Poderemos lançar um CD daqui a um ano.Fiquei impressionada. Imediatamente me vi como a namorada de um astro dorock...

Poderia ir ao camarim, andar de limusine, ingressos grátis.- Ah é? Você me mostrará as músicas em particular, antes do lançamento? -Perguntei, enquanto abria um grande sorriso."Isso", pensei. "Acabei de flertar". Não foi nada fácil e me senti meio idiota, massobrevivi. Talvez até o lançamento do CD de James eu já seja uma perita emflerte.Ele colocou a mão por baixo da mesa e bateu no meu joelho.- No momento que você quiser Kelly, Quando quiser.Eram quase onze horas quando voltamos para casa. Eu estava nervosa eprocurava pela maçaneta da porta do carro. Mas James me pegou pelo braço epuxou.- Você é um barato, Kelly. - murmurou.Um barato? Essa não era a expressão que eu esperava ouvir.- Gostaria de ter você sempre por perto. – ele acrescentou.Então se inclinou para a frente e me beijou. A única coisa que pude pensar naquele instante foi: "Oh, Meu Deus, estou realmente beijando James Sutton!".Mas então relaxei um pouco e me concentrei em seus lábios quentes e macios.Fiquei contente por estar sentada, porque meus joelhos tremiam, e se estivesseem pé provavelmente perderia o equilíbrio.

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Beijei também tentando não pensar em minhas mãos suadas e que meu hálitoprovavelmente estava cheirando a queijo. Quando ele ser afastou, eu me sentiatrêmula e desorientada.- Bons sonhos, Kelly. – murmurou.Enquanto caminhava para casa, refleti que "bons sonhos" era aquilo que Steve

sempre me desejava. Por algum motivo, a expressão me pareceu imensamentediferente vindo de um rapaz que tinha acabado de me beijar na boca.Domingo de manhã fui até a casa dos Jonhson. Em certos dias da semana tomoconta de Nina, a filha deles de dez anos. Quando cheguei, Nina estava no jardimpraticando alguns passos de dança. Desde que ela ficara sabendo que euensinava dança, insistia em estabelecer essa como sua prioridade número um.A prioridade número dois era bater papo com os garotos da sua escola Lincoln.- Ei, Nina. – cumprimentei - Está ensaiando aquela seqüência de passos queensinei na quinta-feira?Andei pela calçada e desabei sobre a grama. Tinha dormido pouco à noite,pensando em meu encontro com James, e a falta de sono tem seu preço.

- Claro. Quer me ver dançar com música?Ela saltitava enquanto esperava minha resposta.- Gostaria muito. Por que não vai buscar seu CD player portátil? Eu espero aqui.Fechei os olhos contra a claridade do sol e fiquei contente por ainda estar quente o bastante para ficar no jardim.Em seguida Nina voltou com seus pais e o toca fitas pendurado pela alça.Enquanto eles gritavam instruções de última hora, Nina colocava o CD quegravei para ela.A garotinha praticava a rotina pela décima quinta vez quando Steve apareceu.Ele adorava ir me encontrar nos Jonhson porque Nina tinha simplesmenteveneração por ele.

Nina interrompeu a seqüência e correu para ele.- Quer ver minha nova dança? – perguntou.Ele caminhou até a escada e sentou-se no primeiro degrau.- Claro que quero. Ou você pensa que eu vim até aqui só para ver Kelly?Nina deu uma risada e foi preparar o CD. Eu me sentei perto de Steve, aliviada.Às vezes uma garotinha de dez anos tem mais energia do que posso dar conta.- Então, como foi o grande encontro ontem à noite? - Perguntou, enquantocontemplava Nina saltitando feliz pelo gramado.- Maravilhoso.Imaginei se Steve poderia saber, apenas me olhando, que James tinha mebeijado. Ainda lembrava do toque gentil de seus lábios nos meus.Ele me olhou levantando as sobrancelhas.- Tem certeza de que você não está dizendo isso só para ganhar a aposta?- Fique sabendo que essa nossa aposta idiota é a última coisa que me preocupaagora.Era mentira, mas estava cheia de Steve ficar lendo nas entrelinhas o tempotodo.- Você não achou o cara um chato? - Steve bateu palmas quando Nina terminou

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a dança e fez uma reverência. - BIS!!!Fiz um sinal para Nina recomeçar a dança e virei-me para Steve.- Só para você ficar sabendo o Radio Waves está para assinar contrato comuma gravadora independente – revelei, melindrando.Steve ficou bravo.

- Em primeiro lugar, fique sabendo que James já vem dizendo isso há mais deum ano. Aqueles caras têm tanta chance de entrar no mundo da música quantoeu! Em segundo lugar, você não respondeu a minha pergunta. Ele é ou não éum chato?- Ele é fascinante. E, o que é mais importante, acha que eu sou fascinante.- Não duvido – Steve retrucou - Para ele, depois de namorar com Tanya Reed,você poderia ter a aparência que tivesse.- Obrigada pelo cumprimento.Steve estava começando a me irritar. Apesar de nossa aposta, eu tinha chegadoa pensar que ele ficaria feliz se eu arranjasse um namorado. No dia do trabalhoele parecia se importar muito com essa perspectiva.

- Desculpe. De verdade. Mas me diga só mais uma coisa.- O quê? – perguntei, suspirando profundamente.- Quantas vezes ele se olhou no espelho para arrumar o cabelo?Tive de dar risada. James era muito vaidoso. Cheguei a surpreendê-lo tentandover seu reflexo na fôrma de pizza metálica vazia.Steve começou a imitar James se enfeitando diante de um espelho, e caímos osdois na gargalhada. Bem nesse preciso instante Nina terminou a dança e deveter pensado que nós dois estávamos malucos.Caminhei com Steve até o carro e deixei Nina recolhendo as coisas para levar para dentro, a fim de que pudéssemos entrar e preparar o almoço. Ela mostrava-se desapontada porque Steve estava indo embora. Adorava ficar se exibindo

diante dele.- Agora, falando sério. Até que ponto você gosta de James? - Abriu a porta docarro e ficou me olhando.Fiquei quieta por um instante. Nunca havia pensado que um cara como Jamesseria meu namorado. Eu seria uma doida se deixasse passar uma oportunidadecomo aquela. Mesmo que mais tarde acontecesse de terminar com ele e ficar decoração partido, eu tinha de encarar a batalha.- Gosto muito dele. – confessei finalmente - Acho que pode ser o cara certo paramim.Steve balançou a cabeça.- Bem, não pegue a tesoura ainda. Muita coisa pode acontecer de agora até oBaile de Inverno. Muita coisa.Steve acelerou, cantando pneu, em direção à avenida. Enquanto observava seucarro desaparecer na esquina, tive a clara sensação de que meu melhor amigotinha um problema.Mas quando era que ele não tinha, afinal?

6 - STEVE

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Terça-feira, 24 de outubro

Não consigo tirar Kelly e James da cabeça. Nos últimos dias eu os tenho vistona paquera. Um par de vezes até os vi “ficando”, de mãos dadas. É esquisito ver Kelly agindo de forma tão boba. Ela parece até outra pessoa, e não estou certo

de que gosto disso. Quando disse a ela em setembro que deveria se apaixonar,não sabia que tudo aconteceria tão rápido.James é um cara bonitão, para quem gosta do tipo arrumadinho. E ele é muito

 popular na escola. Mas sua personalidade não é lá essas coisas. E me chamou a atenção o fato de que nunca vi Kelly rindo quando está junto com ele. Quandoestá comigo, ela não pára de rir o tempo todo.Rebecca viajou com os pais no fim de semana, mas nós temos um encontromarcado para sábado. Se não sair como planejei, então vou ter problemas.

Sem dúvida eu estava começando a ficar nervoso sobre a possibilidade deperder a aposta. Se perdesse, iria parecer um perfeito idiota, e Kelly nunca,

nunca mais me deixaria esquecer isso.Também não podia me esquecer de queAndrew iria pegar no meu pé pelos próximos cinqüenta anos. E então tínhamoso assunto complicado de se apaixonar. Eu já estava cansado de ficar sozinho outendo encontros com qualquer garota que aparecesse. Queria mais do queapenas uma boa diversão.Estava pronto para levar a sério o papo com Rebecca. Já tinha pensado que elaera uma das mulheres mais bonitas que eu jamais havia conhecido. E eraesperta. Sem mencionar que era sofisticada. E sexy. Está bem, ela era perfeita.Não sei porque estava tão ansioso quando fui até a casa dela sábado à tarde.Será que era porque tinha encontrado uma garota com quem eu realmente mepreocupava e agora sentia medo de ser rejeitado? Ou apenas estava sem jeito?

De qualquer forma, pela primeira vez limpei meu carro por fora e por dentro. Noassento traseiro trazia uma cesta de piquenique com sanduíches, batatinhas,biscoitos de chocolate e refrigerantes (preparados por minha generosa mãe).Enquanto andava em direção à casa dos Foster, eu assobiava contente. Nomomento em que estivesse numa boa com Rebecca, Kelly estaria passando por um aperto.Um garotinho loiro atendeu a porta. Estava vestindo uma camiseta do Power Rangers e parecia que estivera brincando na terra.- Quem é você? - perguntou, medindo-me de alto a baixo.- Steve Parson, meu senhor. O cavalheiro é o dono da casa?Usei minha melhor entonação de voz, como um vendedor, e ele riu. Abriu mais aporta e fez um sinal para que eu entrasse.— Você é o namorado da minha irmã?Ele me olhava como se eu fosse um bichinho de laboratório.— Não sei. Melhor a gente perguntar para ela.—Jason, está fazendo arte de novo? — Rebecca falou descendo a escada.Ela estava maravilhosa como sempre, em um jeans preto e uma blusa verde

 justa. Seu cabelo estava preso em um coque frouxo, mas várias mechasescapavam e formavam uma moldura para seu rosto.

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— Não — respondeu Jason, dando um passo para trás.— Cai fora. Volta para teu bolo de terra.Jason correu até ela, deu uma pisada no seu pé e saiu correndo pelo corredor adentro.— Gracinha de garoto. E a irmã mais velha é mais gracinha ainda.

Rebecca deu um beijinho em minha bochecha.— Ele é um monstrinho. Por que as crianças não nascem já crescidas?Pelo jeito, ela não gostava muito de crianças.— Acho que seria um pouco difícil para as mães.— Falando nisso, é melhor a gente ir antes que minha mãe venha conhecer você. Em quem ela põe as garras, acaba por convencer que o melhor é sentar na cozinha e ficar tomando café com ela.Rebecca pegou uma jaqueta jeans desbotada e jogou sobre os ombros.Enquanto eu dirigia, ela procurava alguma coisa para ouvir no rádio.— Quantas estações boas tem nesta cidade? Essas aqui seriam cassadas emManhattan.

— Tem uma boa, que toca jazz — disse eu, mudando a sintonia até localizar uma de que gostava.— Tudo bem. Esta é legal — ela concordou. No sinal vermelho paramos e olheipara ela.— Você não se importa de comer essas coisas de piquenique, né?— Claro que não. Só não quero comer formiga. — Ela soltou o cinto desegurança e chegou mais perto de mim. — Onde estamos indo?— Lago Gambler — respondi, orgulhoso.Não costumo ter meus encontros lá, mas como Rebecca era uma garotaespecial achei que merecia que eu o partilhasse com ela.— Parece algum lugar que saiu de uma música de Kenny Rogers.

Dei uma risada. Kelly tinha dito a mesma coisa na primeira vez que viemos aolago juntos.— É bonito, pode crer.— Tão bonito quanto o Central Park?— Bem, não tem charretes para passear. Mas garanto que não tem nem sombrade esgoto no lago.Coloquei o braço em seu ombro. Aquele seria um grande dia.— Bem, acho que vou me arriscar.Entrei na estrada de terra que leva ao lago.— E como você está indo no Jefferson?— Tudo bem. Andei levando um papo com algumas líderes de torcida e achoque vou entrar para a equipe na temporada que vem. E, pelo que tenho vistosobre as lideranças estudantis, acho que tenho grandes chances de vir a ser presidente.— Uau! Você é bastante ambiciosa.Rebecca nunca tinha me parecido uma pessoa politicamente ativa na escola.— Eu gosto de deixar a minha marca. E pense também como será bom para omeu currículo quando for para a faculdade.— Acho que agora sim você está falando como uma nova-iorquina.

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Parei o carro no final da estrada ao lado do lago Gambler. Mesmo sendo um diaensolarado e quente de outono, nós éramos os únicos presentes.— Este lugar é mesmo bonito — comentou Rebecca, como se sentisse aliviadapor eu não a ter levado a algum depósito de lixo.— Senhorita Foster, apresento-lhe o lago Gambler.

Ela deu uma risada e desceu do carro. Peguei a cesta de piquenique e a manta,e corri para chegar junto dela.— Que acolhedor — disse ela, enquanto eu caminhava bem atrás.— É, sim. Apenas você, eu e o sol — respondi.Pegamos a manta, cada um de um lado e a estendemos na grama.Coloquei uma pedra em cada canto e me sentei. Inclinado e apoiando-me noscotovelos, bati na grama ao meu lado:— Madame, sua mesa está pronta.Rebecca ajoelhou-se ao meu lado e abriu a cesta.— Oh, manteiga de amendoim e geléia.— Eu traria caviar mas o A & P estava com a data vencida.

— Caviar seria um pouco de exagero para um lanche. Manteiga de amendoim egeléia está bom.Ela começou a tirar a comida da cesta. Parecia bem à vontade e me senti comose fizéssemos piqueniques juntos desde muitos anos antes.— Talvez devêssemos trazer Jason aqui um dia — disse eu. — Pense nosmontes de incríveis tortas de lama que ele poderia fazer.Rebecca me olhou como se eu acabasse de propor que aprontássemos umatremenda orgia.— Acho que não — ela respondeu. — Não me parece que com ele aqui nósteríamos um grande encontro.Abri uma latinha de refrigerante e enchi um copo plástico grande que tinha

trazido.— Que tal um brinde? — perguntei. Ela deu um sorriso largo.— Contanto que não envolva o meu irmãozinho, eu topo. À nossa volta folhasvermelhas e amarelas caíam silenciosamente no chão. O lago estava azul-claroe o sol cintilava na água como se ela estivesse salpicada de diamantes. Sófaltava aparecer um cara com um violino para o fundo musical, e o lago Gambler seria o lugar mais romântico da face da terra. Levantei meu copo.— Ao lago Gambler e, nas palavras de John Denver, à luz do sol que banhaseus ombros.—A nós e a minha nova vida na América das raízes.Rebecca tocou seu copo no meu, olhando fixamente por de trás de seus longoscílios.Coloquei meu copo de refrigerante na grama e me aproximei de Rebecca.Nossos lábios se encontraram e eu a beijei suavemente. Na hora senti umafaísca me queimando por dentro. Os lábios de Rebecca tinham um sabor melhor do que parecia. Meu coração disparou quando me aproximei mais ainda sobre amanta. A medida que nossos beijos iam se tornando mais e mais demorados, eudesejava que Kelly estivesse ali para ver. Ela ficaria de uma vez para trás noque se referia a nossa aposta. Então Rebecca passou os dedos pelos meus

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cabelos e não consegui pensar em mais nada.— Foi muito legal. Eu pedi a Rebecca para vir até em casa — contei paraAndrew. Acabáramos de terminar uma partida de basquete um contra um naquadra externa do colégio Jefferson. O tempo tinha se tornado um tanto frio,mas eu estava suando e um pouco sem fôlego.

— E ela concordou?Ele girou a bola na ponta do dedo indicador, um malabarismo que vinhatreinando havia anos.— Cara, claro que ela disse sim. Você conhece alguma mulher que conseguiuresistir ao meu charme?— Eu me lembro de uma.Andrew lançou a bola na minha barriga, e me fez gemer.— Quem?Levantei do banco onde estávamos sentados e comecei a bater bola.— Quem você acha? Kelly.— O quê?

Segurei a bola e fiquei imóvel.— Kelly Byrne. A garota que você vem enrolando há anos. Ela nunca entrou nasua de machão.— Kelly e eu somos amigos. Veja o que quer dizer isso no dicionário.— Por que você não olha no dicionário o significado de dissimulação? Você nãoestá com nada, cara.— Pensei que o assunto era Rebecca.Pegamos nossas mochilas e fomos andando em direção ao estacionamento.— E era. Para falar a verdade, não entendo por que você anda correndo tantoatrás de uma namorada. Ainda faltam muitas semanas para o baile. Pode ser que você encontre alguém melhor.

Balancei a cabeça numa negativa. A total falta de sensibilidade de Andrewnunca deixou de me surpreender. Mesmo sendo um rapaz, parecia que ele viaas garotas como pragas.— Veja, Andrew. Tem umas coisas na vida que são realmente legais. Coisascomo amor, satisfação e felicidade.— E?Paramos, e ele ficou me encarando.— E o quê?— E você pensa que vai ter isso tudo com Rebecca? Andrew pegou a bola egirou sobre a ponta do dedo indicador de novo.— Claro. Por que não?Andrew levantou os braços em rendição.— Eu só não consigo entender como é que você pode amar uma garota queconheceu apenas há dois meses.— Olha eu estou a fim de alguma coisa séria. Não vejo nada de errado nisso.Comecei a andar de novo, e Andrew me seguiu.— Bem eu gosto de experimentar bastante. Garotas são uma grandeenxaqueca, se você quer saber.— Eu não perguntei nada a você.

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— Pois deveria. Rebecca só está atrás de farra, cara. Ela não é o tipo de garotapor quem você gostaria de se apaixonar.— Vou considerar isso como um conselho. Agora, pode devolver minha bola?— Toma — ele respondeu. — Pode acreditar, você está se metendo emencrenca.

Ele esticou o braço segurando a bola.Dei um tranco no braço de Andrew. O que ele sabia sobre mulheres?

7 - KELLY

Quarta-feira, 1º de novembro10 horas da manhã

Ontem James me convidou para o Baile de Boas-Vindas. Estávamos na festa doDia das Bruxas na casa de Caroline Sung (eu estava de bruxa e ele, de pirata),e ele me convidou sob a luz negra que criava efeitos especiais no salão. No

começo da noite confesso que fiquei aborrecida quando ele passou um tempãome contando como havia sido a festa do Dia das Bruxas no ano passado,quando ainda estava namorando Tanya. Eu não estava com o humor muito bom

 porque Steve não tinha aparecido. Ele e Rebecca tinham ido à casa de um certo jogador de futebol.Mas o que importa é que James me convidou para o Baile de Boas-Vindas: seráminha primeira festa na escola em que terei um namorado oficial. Será que issosignifica que estamos apaixonados um pelo outro?P.S.: Mal posso esperar para contar a Steve as novidades. Parece que a gentenão conversa há anos.

O inverno chegava. Todos estavam vestindo suas blusas de lã e comentandoque podiam enxergar a própria respiração no ar frio fora de casa. À noite, fecheia janela de meu quarto e me perguntei se já era hora de ligar meu cobertor elétrico. Quando fui dar aula para Nina Johnson, nosso espaço passou a ser asala de jogos no porão, e não mais o jardim. Ellen Frazier decidiu que podiacomeçar a usar seu Sutiã Maravilha.Mesmo repetindo a todo instante que essa coisa de baile de escola é muitoinfantil e idiota, eu ardia de ansiedade pelo momento de entrar no salão tendo obraço de James em minha cintura. Via a mim mesma com um pequeno buquêde rosas vermelhas no vestido, brincos de zircônia pendendo sobre os ombrosexpostos, os tornozelos provocantes rodeados pelas tiras das sandálias de saltoalto.A banda Radio Waves estaria tocando no baile, e por isso eu não poderia ficar muito tempo junto de James. Mas eu me sentia feliz sabendo que qualquer umadas garotas no salão se derreteria de ciúmes por saber que era eu quemacompanhava o grande astro.Na sexta à tarde, Ellen e eu fomos ao shopping ver umas roupas. Ela haviaconcordado em ir ao baile com um dos amigos de James, embora não estivessemuito a fim.

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— Que tal este? — Ellen perguntou.Ela ria e segurava um vestido de tafetá rosa, com uma blusa balão. Em volta dosombros tinha desenhos de fadas ou qualquer coisa assim. O vestido era horrível.— Se eu me vestisse assim, só faltaria me embrulhar em folhas de gibi pra ficar parecendo um chiclete de bola.

Fui olhar em outros cabides e peguei um vestido preto curto. Tinha um bolerocom aplicações de contas e era perfeito.Ellen pegou um vestido de seda verde, e então entramos no provador.— Acho que Steve e a tal de Rebecca estão namorando sério — comentouEllen.Ela estava tirando a blusa de lã, e por isso sua voz saiu meio abafada, masmesmo assim eu entendi.Comecei a desamarrar minhas botas pretas.— Eles irão ao Baile de Boas-Vindas juntos, se é isso que você quer dizer.Arranquei as botas e tirei as meias pretas grossas, imaginando que elas nãocombinariam de jeito nenhum com um vestido de baile.

Ellen virou de costas para mim e puxei o fecho do vestido verde. Eu podia dizer que o "auxiliar da natureza", que era como ela chamava o seu Sutiã Maravilha,combinava muito bem com aquele vestido.— Sim. Sei que eles vão ao baile — minha amiga comentou. — Faz um tempãoque o Steve convidou a Rebecca. Mas aquele bracelete que ele deu a ela meparece um bocado caro. Andrew Rice me contou que Steve detonou uma boaparte do dinheiro que ganhou com seu trabalho durante as férias de verão.Parei o fecho pela metade.— Que papo é esse? Que bracelete?Pelo espelho, pude ver Ellen levantar as sobrancelhas.— Você não sabe?

Balancei a cabeça, tentando parecer indiferente.— Não, acho que ele se esqueceu de me falar sobre isso. Não tem problema.— Bem, é de ouro com uma opala. Opala é a pedra da sorte dela. Vi o braceletequando estávamos no banheiro ontem. Aliás, do jeito que ela fazia com asmãos, era preciso ser cego para não ver.Fiz de conta que não tinha interesse no que ela dizia:— Hum, não sabia que Steve era do tipo que apela para coisas como comprar uma pedra da sorte para uma garota. Que coisa mais antiga, papo dos anos60...— Tenho certeza de que ele vai comentar com você sobre o bracelete. Vai ver nem teve a chance ainda. — Ellen ficou na ponta dos pés para ver qual vestidocaía melhor.— Claro. Tenho certeza de que ele se esqueceu.Mas eu estava furiosa. Como Steve tinha deixado de contar uma coisa tãoimportante quanto essa a sua melhor amiga? E eu tinha certeza absoluta de queele havia conversado com Andrew sobre o presente, e até mesmo consultadoAndrew sobre o que deveria comprar. Steve nunca foi de dar presentes a suasnamoradas, especialmente jóias caras. Quanto a mim, a única coisa que elealgum dia me deu foi um peixinho dourado (que, por sinal, morreu três dias

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depois).Afinal era possível que Steve realmente estivesse amando Rebecca. Se isso eraverdade, nossa aposta daria em empate. Eu estava certa de que amava James.Mas será que Steve ia me abandonar, agora que tinha achado alguém melhor que eu? No passado nossa amizade sempre estivera em primeiro lugar. Ele me

contava tudo a respeito de tudo que acontecia em seu dia-a-dia, incluindo suavida amorosa. Agora parecia que ele não estava precisando mais de mim.Talvez eu tivesse de dizer adeus ao meu melhor amigo. Era um pensamentomuito deprimente, para dizer o mínimo.Ellen girava em frente aos três espelhos e alisava o vestido de seda na altura dopeito. Ela parecia usar pelo menos manequim quarenta.— Bem, acho que Steve namorando Rebecca Foster é um desperdício de umcara legal. Ela é horrorosa.— Por que diz isso?Admito que não gostava muito de Rebecca. Toda vez que a encontrava ela meignorava. Porém já estava bem acostumada a receber um gelo das namoradas

de Steve, e isso não me incomodava. Na verdade até que essa atitude delas mefazia bem. Mas ainda estava surpresa por Ellen ter essa opinião negativa sobrea última conquista de Steve.— Argh. A garota só quer aparecer. Eu a ouvi jogando conversa fora sobreSteve no banheiro das garotas. Só ficava falando de como ele era bonito, masnão disse uma palavra sobre a personalidade interessante dele, por exemplo. —Ela abriu o fecho e tirou o vestido.— Verdade? — Eu ainda me olhava no espelho. Por algum motivo, o vestidopreto perdera o encanto. Sentia meu estômago se revirando e já não estava commuita vontade de fazer compras.— Ela disse a Amanda Wright que Steve seria o seu bilhete para a popularidade.

Como todo mundo o conhecia, ela acabaria sendo reconhecida também. Contouque, quando estava no terceiro ano, era a chefe das líderes de torcida enamorava o quarto zagueiro. Como é possível ser uma pessoa tão superficial?Segurei o vestido preto e o bolero.— Você está com ciúmes de Rebecca, não está? Quero dizer, sei que você temuma queda por Steve, mas ele não seria um bom namorado, ele é muito galinha.Acredite em mim, melhor ficar na amizade.Ellen franziu a testa:— Kelly, eu não estou com ciúmes. Você está?— Não me faça rir — respondi indignada. — Eu nunca sairia com Steve paranamoro. Já disse isso pra você umas cem vezes.— Eu sei que você disse. — Ellen vestiu os jeans e procurou pelos sapatos. —Mas você nunca me explicou de verdade por que não quer sair com ele.Suspirei.— Por uma razão muito simples. Eu estou com James. E, mesmo que nãoestivesse, Steve e eu não fomos feitos um para o outro.— Continue explicando — ela pediu, levantando as sobrancelhas e olhando paramim.— Ele é como um irmão para mim, não sabe assumir um compromisso, é

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arrogante, gosta de outros sabores de sorvete de que eu não gosto, e sempretemos brigas idiotas para ver quem fica com o controle remoto da TV.Eu sabia que era só conversa inconseqüente, mas a cutucada de Ellen mepegou de jeito. Falar de Steve desse modo tão pessoal me deixava encabulada.Ellen riu.

— Bem, posso ver que vocês formam uma dupla e tanto. Desisto deste papo.Sei que você detesta falar sobre Steve.— Obrigada. Agora vamos sair logo daqui. Não estou encontrando o vestido quequeria.Enquanto saíamos da loja, tentei ignorar a sensação de enjôo. Ainda não podiaacreditar que Steve não me dissera nada sobre o tal bracelete. Assim quecheguei em casa, telefonei para ele. Steve teria de me explicar um monte decoisas.

Enrolava o fio do telefone no dedo indicador, enquanto esperava que alguématendesse a ligação na casa de Steve. Ao terceiro toque, ouvi a voz suave da

sra. Parson.— Alô, senhora Parson. Posso falar com Steve?Chutei as botas para longe e me estendi de costas na cama.— Kelly, que bom ouvir sua voz. Parece que faz tanto tempo que não nosfalamos.— Bem, tenho estado muito ocupada. Acho que Steve também.Gostava muito da sra. Parson. Ela era como uma segunda mãe para mim.— Kel? — Steve atendeu na extensão enquanto a sra. Parson desligava.— Oi.Por alguma razão meu coração disparou. De repente Steve me parecia umestranho.

— O que você vai fazer hoje à noite?Sabia que ele estava comendo alguma coisa pelo barulho que fazia com a bocae imaginei que seria salgadinho de milho. Ele devorava um saco dessessalgadinhos todo santo dia.— Tenho um encontro com James.Levei o telefone para perto do armário. James viria me apanhar em meia hora, eeu ainda não tinha idéia do que vestir.— Parece que nossa aposta pode dar em discussão.Pelo jeito de falar, ele parecia cansado, como se não quisesse conversar comigo.— É isso aí — respondi, sem conseguir disfarçar o tom de voz; amargo.— O que você quer dizer com isso?Ele estava irritado, mas nem me importei com isso.— Você e Rebecca estão ficando muito íntimos. Todo mundo está comentandosobre o extravagante bracelete que você fez questão de dar a ela.— Era o aniversário dela. E daí?— Por que você não me contou que estava tão apaixonado por ela, que quisdetonar o dinheiro que ganhou trabalhando durante o verão? Eu não significonada para você para me contar o que anda acontecendo em sua vida?

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Estava ficando cada vez mais brava. Steve poderia ter pelo menos me pedidoajuda para escolher o presente. Tenho um gosto bem melhor que o dele.— Me desculpe por ter nascido. Achei que você estava ocupada demais,beijando James Cara-de-Otário pelos saguões da escola, para prestar atençãoem mim.

Agora Steve também estava nervoso, e nosso papo estava indo para o brejo.— Ah, e você, que parece ter os lábios grudados nos de Rebecca! Já estouachando que vocês são irmãos siameses. De repente Steve parou de mastigar.— Acho que você está preocupada porque vou ganhar a aposta. Você já está secansando dessa desculpa para ter um namorado e sabe que esse seu namoronão vai durar até o Baile de Inverno.Peguei uma calça de malha e uma blusa de gola rolê e bati a porta do armário.— Pois saiba que estou total e absolutamente apaixonada por James Sutton.Por outro lado, você não saberia o que é amor mesmo se tropeçasse nele. Tudoo que importa para você é um rostinho bonito.Com a mão livre, tirei a calça jeans. O tempo passava e eu ainda não tinha

trocado de roupa. Usava de todo meu autocontrole para não desligar na cara deSteve.— Kelly, você não me conhece. Parece que passou os últimos três anos emuma nuvem de fumaça.— Claro que sim — respondi com ironia. — Agora, se você me dá licença,preciso me arrumar para um encontro. Boa tarde.— O mesmo para você. Mal consegui ouvir sua voz.— Tchau.Bati o telefone no gancho. Quase tinha chorado de raiva, e dentro de dezminutos James estaria buzinando lá fora.Mesmo furiosa com Steve, não podia acreditar como nossa conversa tivesse

terminado tão mal. Nunca havíamos ficado tão bravos um com o outro e nãoestava certa de que a gente poderia passar por isso numa boa.Tentei me animar com a idéia de que ia ter um encontro com James, mas aslágrimas escorriam pelo meu rosto. Olhando no espelho, eu me vi pálida, comolhos vermelhos. Poderia estar namorando, mas parecia que tinha perdido meumelhor amigo.

— Você sabe o quanto está bonita hoje? —perguntou James, me puxando paramais perto.Encostei a cabeça em seu peito, ouvindo as batidas de seu coração.— E você até que não é feio. Depois de um jantar italiano sensacional,estávamos parados em frente de casa. James fora tão atencioso e gentil a noitetoda que eu me sentira uma princesa.— Kelly, estou tão feliz por termos nos encontrado. O começo do ano estavauma chatice. Depois que Tanya foi embora, pensei que ficaria sozinho pelo restoda vida. Daí fui para a classe de redação e encontrei você.— Para mim é coisa do destino.Olhei para James, admirando seus olhos castanhos. Eu estava lealmentevivendo um conto de fadas.

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— Para mim também.A boca de James estava tão perto da minha que eu podia sentir suas palavras,em vez de ouvi-las. Passei os braços pelo pescoço dele e puxei-o mais. Eletocou meu rosto como se fosse de cetim. Acariciei sua nuca com a ponta dosdedos e pude senti-lo estremecer em meus braços.

Por um instante ficamos apenas nos encarando. Depois James me beijou,apertando seus lábios contra os meus. Uma espécie de formigamento percorreumeu corpo, enquanto um sentimento estranho de confusão misturada comsatisfação tomava conta de mim. Eu tinha aquilo que queria, mas mesmo assimhavia essa constante sensação de uma grande desilusão. Por quê?Ignorei o raciocínio lógico e me apertei mais contra ele, fechando os olhos, sob aluz tênue da lua que iluminava toda a nossa varanda.Não sei quanto tempo ficamos em pé ali, abraçados como se nunca tivéssemosficado juntos. Quando finalmente nos afastamos, estávamos os dois quase semfôlego.Naquele instante a luz da varanda acendeu e apagou algumas vezes. Minha

mãe sabia que estávamos ali fora e achava que eu já tinha aproveitado muitopor uma noite. Dei uma risada meio sem graça.James sorriu, passando a mão por meus cabelos e colocando-os para trás dasorelhas. Inclinou-se para a frente e me deu um beijinho na testa, e em seguidase abaixou para sussurrar em meu ouvido.— Vou cantar uma música só para você no baile.Entrei em casa e percebi que minha mãe discretamente já saíra do corredor deentrada. Fui até a janela da sala e abri a cortina branca de filó. James entrara no

 jipe e seu rosto estava mergulhado nas sombras. Fechei a cortina, que fez umsom abafado de assobio.Enquanto subia as escadas na ponta dos pés, uma parte de mim se sentia nas

nuvens. Já tinha conseguido atingir meu objetivo para o último ano da escola.Ainda nem havíamos passado pelas férias e eu me apaixonara pela primeira vezem minha vida. Quem poderia imaginar que a cínica Kelly Byrne poderia fazer brilhar os olhos de James, como naquela noite? Parecia mesmo um milagre.Contudo uma outra parte de mim se sentia como se tivesse sido atropelada.Embora pudesse ligar para Ellen e contar os detalhes da minha romântica noitecom James, Steve se afastara de mim. Se eu não podia partilhar as coisas boasda minha vida com a pessoa que eu considerava a mais importante no mundo,era quase como se elas nunca tivessem acontecido.

8 - STEVE

Quando cheguei à sala de física, na segunda-feira pela manhã, eu me sentiamuito ansioso para ver Kelly. A gente não conversava desde aquele papo-furadopelo telefone no sábado à noite, e eu ainda não tinha conseguido sacar o quenos levara a brigar daquele jeito. Falávamos como pessoas normais, mas derepente discutíamos e gritávamos como se fôssemos inimigos em guerra. Aindanão tinha passado a bronca e também não conseguia tirar a briga da minhacabeça.

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Kelly entrou na sala depois de mim e sentou-se em uma carteira a meu lado.Como havia vários outros lugares vazios, entendi que ela estava com vontadede fazer as pazes.A sra. Gordon discorria sobre alguma coisa a respeito de atirar moedas do altodo edifício mais alto de Nova York, e aproveitei para rasgar um pedaço de uma

folha do caderno. Escrevi em letras de fôrma, bem grandes, "PAZ". (Procuravadar o primeiro passo, mas não tanto a ponto de me desculpar.)Nos últimos quinze minutos, Kelly fizera grandes manobras tentando manter orosto longe de meus olhos. Tive de cutucá-la com o lápis para entregar obilhetinho. Ela deu uma olhadela em volta. Quando viu o pedaço de papel, sorriudiscretamente. Estiquei o braço, dei um puxãozinho em seu cabelo e entreguei obilhetinho. De repente me senti como se tivesse tirado um grande peso de cimados ombros.Quando o sinal tocou, Kelly se levantou e, aproximando-se de mim, colocou amão em meu ombro.— Amigos? — perguntou.

Concordei balançando a cabeça e apertando sua mão.— Sempre.Quando saíamos da sala, falei com ela.— Vamos ao Winstead's depois das aulas. Podemos comer umas fritas elembrar que nós não temos motivo para brigar.— Boa idéia, Parson. Encontro você lá às três horas.Rebecca me esperava no saguão. O bracelete que tinha dado a ela pendia doseu pulso. Dei uma olhada para Kelly e vi que tinha um sorriso forçado no rosto.— Oi, gente — cumprimentou Rebecca, olhando para mim.— Olá, Rebecca — respondeu Kelly —, que lindo bracelete!Parecia que Kelly falava com sua melhor amiga, e senti um grande alívio ao ver 

que ela tentava ser gentil com Rebecca.Rebecca segurou o pulso.— Obrigada, Kelly. Foi o Doce Steve quem me deu. Ela não é mesmo umdocinho?Ela agarrou minha mão e chegou mais perto.Percebi Kelly revirando os olhos. Seus olhos muito castanhos brilhavam, masnão pude compreender exatamente o que se passava em sua cabeça.— Doce como açúcar — Kelly concordou. — Vejo vocês mais tarde, pombinhos.Enquanto Kelly andava rápido pelo saguão; Rebecca se esticou e me deu umbeijo no rosto.— Adivinha? - perguntou.— O quê?Ainda olhava para Kelly, que agora estava com James perto da saída deincêndio. Ela ria, e era difícil de acreditar que nós havíamos brigado pelotelefone no sábado à noite.— Conversei com Carrie Starks. Combinamos de sairmos juntos, ela e PatrickMayor. Iremos ao baile de sábado à noite todos juntos.Fiquei preocupado ao me lembrar de como Patrick Mayor se mostravadetestável em ambientes como os bailes da escola. Ele não era uma pessoa

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com quem eu estivesse morrendo de desejos de me enturmar. Desde quePatrick e Carrie Starks tinham começado a namorar, os dois eramfreqüentemente vistos dando um showzinho em público. Não era nada agradávelver aquele robusto jogador de futebol americano socando sua namorada emplena luz do dia. Mas Rebecca aparentemente nem percebeu que eu não estava

nem um pouco contente.— Não vai ser legal? — perguntou. — Vamos curtir um bocado juntos! E se euficar amiga de Carrie, será um primeiro passo para entrar na equipe das líderesde torcida.Se ir ao baile com Carrie e Patrick era assim tão importante para ela, por que euhaveria de me preocupar? Afinal, quanto mais contente ela estivesse, maisromântica se sentiria. E bailes são feitos para o romance.— Vai ser muito legal — respondi, colocando meus braços em volta dela. — Eutopo.Nós nos separamos na porta da sala onde Rebecca teria a próxima aula edepois corri escada acima para a biblioteca, subindo dois degraus a cada passo.

Andrew e eu estávamos fazendo um trabalho de história e estudávamos tambémdurante o segundo período.Ele estava em uma mesa bem no meio da biblioteca, rodeado por uns vintelivros dos grandes. Mordia um lápis, compenetrado, e parecia mesmo umestudante muito mais sério do que realmente era.— Como é, Rice? — cumprimentei, puxando uma cadeira.— Psiu! Isso é uma biblioteca — disse Andrew com o dedo indicador sobre oslábios.Eu me inclinei para que ele pudesse ouvir o cochicho.— Como vai o garoto bem-comportado? — perguntei, olhando para os ladospara ver se o diretor não estava de olho em nós.

Andrew apontou para uma garota na mesa da recepção. Muitos calouros ficamatrapalhados com as normas da biblioteca, mas nunca tinha visto Andrew sepreocupar com isso. A garota tinha cabelos castanhos compridos. Ele se viroupara mim.— Prometi a Rachel que ficaria quieto — confidenciou.Fiquei surpreso. Teriam seres extraterrestres raptado Andrew e colocado umclone em seu lugar? Nunca fora de meu conhecimento que ele se preocupasseem cumprir uma promessa feita a uma bibliotecária.— E daí?— Daí que ela é uma garota maravilhosa. Vamos respeitá-la — sussurrouAndrew, enquanto olhava para mim e para Rachel, que digitava alguma coisa nocomputador.Estiquei o braço e coloquei a mão em sua testa.— Você está com febre? Ou ficou maluco?Ele empurrou minha mão.— Vamos fazer o trabalho. Rachel foi muito legal em pegar esses livros paranós. Vamos usá-los.Apanhei o livro mais próximo e comecei a folheá-lo. Pouco depois, levantei acabeça para perguntar a Andrew como ele gostaria de dividir o trabalho. Ele

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encarava Rachel com a boca aberta. Acenei, com a mão à frente dos seusolhos, tentando chamar a atenção.Percebi que ele ficou envergonhado, e um pensamento interessante cruzouminha mente. Ciente do fato ou não, Andrew tinha se apaixonado pela garotaque trabalha na biblioteca.

— O nome dela é Rachel — disse eu a Kelly, segurando a porta de vidro doWinstead's. — Ela trabalha na biblioteca.O Winstead's era um lugar muito legal. Tinha de tudo, de hambúrguer a burritos,apesar de toda a comida ter sempre o mesmo gosto. As mesas eram gastas, ehavia uma velha máquina toca-discos automática em um canto. Acho que Kellye eu gastamos metade da nossa vida social nessa lanchonete, principalmentedepois que tiramos nossa carteira de motorista. O Winstead's era um local muitopopular entre os calouros, que ali costumavam fazer hora, porque dava para ir de bicicleta, já que fica próximo da cidade.— Rachel Hall? — perguntou Kelly, indo direto para sua mesa favorita.

Ficava bem junto ao toca-discos. Kelly tinha a tendência de se apossar damáquina e selecionar as músicas enquanto estava por ali.— Acho que sim. Andrew disse que o nome era Rachel. E ele fazia aquela carade pateta toda vez que dizia o nome dela.Pendurei nossas jaquetas em um cabide perto da mesa e desabei na cadeira.Tinha sido um dia longo e cansativo.— Muito interessante. Acho que Rachel não estava na lista de Andrew.Kelly abriu o cardápio e tive de esticar o pescoço para ler as palavras de ponta-cabeça.— Bem, deu para ver que ele tem uma queda por ela.— Imagino se ela vai querer alguma coisa com ele — argumentou Kelly,

passando-me o cardápio.— Vamos dividir uma porção de nachos?— Puxa, eu estava mesmo a fim de uma porção de nachos, desde quealmoçamos aquele sanduíche de atum — concordei.— De qualquer jeito, eles não parecem que são do tipo nascidos um para ooutro. Mas o amor tem seus caprichos.— Se alguém entende disso, somos nós — concordou Kelly.Ela fez o pedido à garçonete. Depois foi até a máquina e colocou uma moeda.— Verdade. Quero dizer, há três meses nós dois pensávamos que nuncapoderíamos nos apaixonar. E agora veja só.Sorri para Kelly, que retribuiu o sorriso. A garçonete voltou com nosso pedidoem seguida. Esses nachos não passam de uma porção de fritas recobertas commolho de queijo. Em um lado do prato se estendia uma fileira de tremoços. Eupoderia jurar que essa porção de nachos do Winstead's era o meu pratopredileto.Kelly pegou um punhadinho e colocou na boca.— Sabe, Steve, tenho de admitir uma coisa.— O quê? — perguntei.— Estou contente de que você me tenha feito concordar com essa aposta idiota.

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Não sei se teria paquerado James e se estaria com ele agora não fosse aameaça de ter de sair por aí de loira oxigenada.— Bem, fico feliz por você estar nessa de garota apaixonada, mas ainda achoque James é um panaca.Comi outra batata, saboreando o queijo derretido.

— Você diz isso só porque quer ganhar a aposta. Não ficaria contente nem umempate?Sabia que ela não aceitaria nenhum conselho meu, mas enfim não deixara dedar minha opinião. Era o meu jeito de ser.— Não estou dizendo isso só para ganhar a aposta. Estou sendo totalmentesincero.— E que você responderia se eu lhe dissesse que Rebecca não é uma garotapara você?Uma das músicas que Kelly havia selecionado na máquina começou a tocar, eela se pôs a balançar o corpo, acompanhando o ritmo.— Eu responderia que não é da sua conta — declarei.

— Pois exatamente.— Isso quer dizer que não é da minha conta?— Isso mesmo, adivinhão.Agitei meu guardanapo como uma bandeira branca.— Tudo bem.Ela concordou acenando com a cabeça.— Pensei que você conseguiria enxergar as coisas do meu ponto de vista.Kelly empurrou o prato de fritas, pegou o copo de água e tomou tudo de um golesó. Vendo a cena, não pude deixar de cair na risada. Ela era realmente uma emum milhão.

Novembro tinha chegado, e o dia 11, sábado, dia do Baile de Boas-Vindas,amanheceu frio mas ensolarado. Na sexta à tarde já tinha preparado tudo para afesta: minha mãe me ajudara a escolher um buquê de rosas vermelhas paraRebecca, eu tinha mandado meu único terno para a lavanderia e até mesmolavara o meu carro. Estava tudo arrumado.Como Patrick era um jogador e Carrie a líder de torcida, Rebecca e eu fomossozinhos ao jogo dos Raiders. Depois voltaríamos para casa para trocar deroupa, e todos nos encontraríamos por volta das nove horas. Ainda não estavamuito contente por ter a companhia de Patrick e Carrie, mas já estava maisconformado com a idéia.Chegando ao estádio, Rebecca quis sentar nas arquibancadas em frente àsgarotas da torcida.— Vamos sentar aqui — ela pediu. — Assim podemos ver todos os nossosamigos.Ela acenou para Carrie, que respondeu chacoalhando um pompom vermelho.Vi Andrew sozinho em um canto e fiz sinal para ele vir se sentar conosco. Aexpressão de desolação que ele tinha não era normal.Rebecca ficou em pé e deu um abraço nele, que em seguida sentou-se.— Oi, Andy, como vai?

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Ele coçou a cabeça e esfregou o rosto, o que fez as bochechas ficaremvermelhas.— Para falar a verdade, já estive melhor. Aparentemente Rebecca nem ouviusua resposta.— Então, quem você vai levar ao baile? Andrew balançou a cabeça

negativamente.— Eu não vou ao baile.— Pensei que você fosse convidar a Rachel Hall — disse eu.Ele andara criando coragem durante uns dois dias e tinha jurado que ia pedir aRachel na sexta-feira depois das aulas.— Eu achei que ela não iria gostar. Ficaria parecendo que eu achava que elanão tinha conseguido um acompanhante.— Rachel Hall? Aquela garota desajeitada da biblioteca? Dei uma cutucada nascostelas de Rebecca. Ela era bonita einteligente, mas diplomacia não era o seu ponto forte.— Eu acho ela uma gracinha — falei. Andrew fez que não se importava.

— Acho que Rebecca está certa. Afinal o que eu tenho em comum com umagarota que trabalha numa biblioteca?— Não acho que vai querer sair com ela. Tenho certeza de que você podeconseguir alguém muito mais popular.— Kelly gosta de Rachel — comentei. — Elas estavam na mesma turma deinglês no ano passado, e as duas viviam conversando sobre livros.Atirei um olhar para Rebecca tentando fazer sinal para que ela deixasse Andrewem paz. Rachel era a primeira garota por quem ele manifestava interesse, e nãome agradava ver Rebecca colocando pedras em seu caminho.— Bem, o fato de Kelly gostar não quer dizer muita coisa. Ela não é exatamentea pessoa mais por dentro do que acontece no colégio.

A voz dela era suave, mas as palavras fizeram meu estômago revirar.— O que você quer dizer?Quase esquecera que Andrew estava sentado perto de nós. Minha atenção totalse voltava para Rebecca.— Bem, duvido que Kelly seja popular entre a turma do último ano. Ela é legal,mas...Rebecca deixou uma interrogação no ar como se tivesse dito tudo que há paradizer sobre Kelly.— Mas o quê? Kel não fica de papo-furado com a turma por que tem um montede coisas muito melhores para fazer. Como, por exemplo, dançar. Ou escrever.Ou passar uma parte de seu tempo conversando comigo.Sabia que soara meio irritado, mas não deu para segurar. Se havia uma coisaque me tirava do sério era ouvir alguém falando mal de Kelly. Eu poderiadiscorrer por horas sobre todas as coisas que ela faz que me perturbam, masquando alguém falava mal dela eu perdia a linha.— Desculpe, Steve. Eu só quis fazer uma simples observação. Pareceu queRebecca tinha ficado sentida, e na hora acheique talvez tivesse jogado pesado demais com ela. Afinal este é um pais livre.Ela podia falar o que quisesse. Além do mais, Kelly não precisava de que eu a

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defendesse.— Desculpe — disse eu, arrependido. — Acho que só estou sendo superprotetor em relação a Kelly Byrne. Andrew sabe o que quero dizei, não é?Virei-me para a esquerda, esperando que Andrew confirmasse. Mas ele nãoestava mais ali. Ainda deu para vê-lo caminhando em direção às numeradas.

— Tudo bem, esquece — disse Rebecca, colocando a mão em meu joelho. —Tenho certeza de que a gente pode se divertir bastante com outras coisas e nãoprecisamos ficar falando de Kelly.Concordei em silêncio e coloquei meu braço em seus ombros.— Concordo plenamente. Vamos falar de nós mesmos. Enquanto Rebeccacomentava sem parar de como eu iriagostar de seu vestido de baile, eu olhava disfarçadamente para asarquibancadas.A nossa direita e algumas fileiras acima, Kelly estava sentadacom James. Eles tinham um grande cobertor xadrez enrolado emvolta deles, e não dava para ver se ela e o Cara-de-Panaca (era

assim que chamava James em meus pensamentos) estavam de mãos dadas.Não que me importasse. Porém, de um ponto de vista social, achava muitointeressante observar Kelly se comportando de um modo totalmente contrário aoque era normal para ela. Em outras palavras, estava curioso.Ellen Frazier estava sentada atrás deles. Com certeza o cara ao lado dela era oseu par para o baile, mas eles se sentavam a um metro um do outro. Ellen tinhauma tremenda cara de pouco-caso, e não consegui segurar a risada. Kelly mecontara sobre Ellen e o sutiã milagroso, e então eu me esforcei para conseguir dar uma boa olhada nela. Pelo que pude ver, parecia igual ao de sempre. Mastambém ela vestia um casaco grosso, e por isso anotei mentalmente paraconferir mais tarde, durante o baile.

Olhei meio sem querer para Kelly. Estava morto de curiosidade para saber o quese passava debaixo daquele cobertor xadrez.Nessa mesma hora Kelly olhou para mim. Ela arregalou os olhose em seguida desviou o olhar. Senti meu rosto avermelhando. Elateria achado que eu a estava encarando?A voz de Rebecca cortou meus pensamentos.— Meu pai disse que hoje posso ficar duas horas a mais do que o normal. Não élegal?Cheguei mais perto de Rebecca e dei um abraço grande e apertado nela.— Legal! Muito legal mesmo!— Eu sei. Especialmente porque vai ter uma festinha particular depois do baile eé só para convidados, mas tenho certeza de que vou estar na lista.Concordei em silêncio, virando meu rosto em direção a Kelly. Nossos olhares secruzaram brevemente e ela se mexeu. O cobertor escorregou do seu colo, efinalmente pude ver que ela e o Cara-de-Panaca estavam mesmo de mãosdadas.Fechei os olhos imaginando se ela sentia tanto quanto eu que encontrar overdadeiro amor era assim tão difícil. Por alguma razão achei que no caso dela,não.

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9 - Kelly

Por que será que todo baile de colégio sempre tem um tema? Nunca tem umafesta só com luzes, uma banda e ponche.. Deve ser alguma lei não escrita que

os estudantes devam ser submetidos aos caprichos de um comitê de decoração.Para o Baile de Boas-Vindas o comitê escolheu o tema "Uma noite em Paris".Admito que o ginásio estava bem bonito, para os padrões do colégio Jefferson.Havia cordões de luzes em volta de todas as paredes, e até no teto, ealinhavam-se filas e filas daquelas mesinhas para café por todo o salão, comcadeiras de ferro e candelabros. Grandes painéis de lugares famosos em Parispintados pelos estudantes estavam pendurados nas paredes. Bem embaixo databela de basquete destacava-se uma escultura da Torre Eiffel de papel machê.Não era exatamente um espetáculo magnificente, mas reconheço que o comitêhavia se esforçado. Deviam ter gasto horas e horas instalando aquelas luzes.James e eu chegamos mais cedo porque o Radio Waves precisava arrumar os

equipamentos de som. Agora a banda já tocava, apesar de não ter chegadomuita gente ainda. Eu me divertia olhando James cantar e observando asgarotas que o viam cantar. Adorava a expressão embevecida em todos osrostos, o olhar vidrado que parecia o meu próprio olhar.— O que você acha da divertida "Parri"? — Ellen brincou, aproximando-se.Por mais legal que fosse assistir à apresentação de James no palco, eu jáestava cheia de ficar sozinha.— Um lugar que merece uma visita. Mas onde está o Sena?Ellen deu uma risada.Se derramarem mais uns copos de ponche, vai ter um riocorrendo bem no meio do ginásio.

— Ei, o que aconteceu com Sam?O acompanhante de Ellen era Sam, amigo de James. Eles vieram de carro coma gente, mas Sam não estava por perto.— Deve estar jogando conversa fora com seus amiguinhos lá noestacionamento. Acho que a gente pode descartá-lo como candidato anamorado.— Bom, você está linda. Fique de olho aberto que vai aparecer algum candidato.Ellen estava linda de verdade. Nós tínhamos voltado à loja e acabamoscomprando os vestidos que tínhamos experimentado antes. Ellen até parecia arainha do baile. E acho que nem precisaria do tal sutiã milagroso.— Na verdade, conheci um cara. Ele estava sozinho em pé ali pela Torre Eiffel.Acho que vou lá falar com ele. Partilhar opiniões culturais com um companheirode viagem é sempre mais agradável.Depois que Ellen saiu, fiquei ali tomando um chá de cadeira. O ginásio já estavacheio de estudantes e parecia que não havia ninguém sozinho por ali. Eu mesentia cheia de tédio e frustrada. O Radio Waves iria tocar a noite toda e todomundo estaria dançando na pista.Meus sapatos novos estavam me matando e então decidi sentar em umas dasmesinhas de café. Uma vez no lugar que escolhi, pude ver Steve chegando com

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Rebecca, Patrick Mayor e Carrie Starks. Sempre senti a presença de Steve emuma sala. Nos últimos anos cheguei a desenvolver uma espécie de senso depercepção que me alertava quando ele andava por perto. Às vezes até achavaque éramos como os irmãos gêmeos que se comunicavam por telepatia,aqueles que tinham se tornado tema de notícia e comentário no mundo todo.

Depois que vi Steve e Rebecca indo para a pista de dança, recostei minhacabeça na parede e fechei os olhos. Já tivera um dia bem cansativo e aindatinha muitas horas pela frente.Abri os olhos quando ouvi a voz de James falando no microfone.— Eu gostaria de dedicar essa música a Kelly Byrne — declarou com sua vozgrave e rouca. — Ela é a minha Garota dos olhos castanhos.Pelo menos uns cem pares de olhos imediatamente se voltaram para mim.Fiquei em pé e acenei para James, mesmo me sentindo um poucoenvergonhada. Meu coração disparou. Nunca ninguém havia cantado para mimantes, era uma idéia bastante romântica. Olhando para o rosto sorridente deJames, tive um calafrio de satisfação. Então o Radio Waves começou a tocar 

sua versão de Garota dos olhos castanhos, de Van Morrison. O ritmo era lento eapaixonado, perfeito para "Uma noite em Paris".Mesmo ouvindo uma canção dedicada a mim, continuava me sentindodeprimida. Não tinha ido à pista de dança nem uma vez e agora teria de ficar empé ali, ao lado, olhando todo mundo se divertir.— Me dá o prazer desta dança, senhorita?Virei-me rapidinho. Steve chegou por trás de mim, com os olhos azuis brilhando.Ele estava muito elegante e sofisticado em seu terno azul-claro e gravataxadrez. Tinha o cabelo escuro bem cortado e parecia um modelo de capa derevista.— Será um prazer, senhor — respondi, segurando o seu braço.

Steve olhava para o salão e pensei que procurava por Rebecca. Errei.— Parece que Andrew não virá mesmo — comentou.— Rachel Hall não veio também. Eu conferi. Steve balançou a cabeça.— Que desperdício, não é? Vai ver os dois estão em casa se sentindopéssimos.— Ainda bem que não somos nós — disse. Steve me apertou um pouco mais.— Ainda bem — concordou ele. Ficamos quietos por algum tempo.Nós não dançávamos muito. Ele estivera em todos os bailes da escola, mas eutinha ido apenas a alguns. E, normalmente, assim que eu chegava ao baileficava imaginando um jeito de despistar meu acompanhante e dar o fora. Como

 já disse antes, nunca tivera sorte com namorados.— Você está linda, Kel — ele disse me olhando nos olhos. Tínhamos ido parar no meio do salão e não pude deixar de sentir como seus braços estavam meapertando. Mas não era para menos, estávamos dançando uma música lenta eele tinha de meapertar assim.— Você acha mesmo? — perguntei.

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Steve nunca me elogiava, nosso estilo era mais de ficar gozando um com a carado outro. Ele acenou com a cabeça:— Claro.— Obrigada. Mas... por que está sendo tão gentil? Já estou ficando preocupada.Ouvia a voz sexy de James cantando a canção ao fundo, mas minha atenção se

concentrava em Steve.Ele deu uma risada.— Eu? Gentil? Não liga, não.Ele deu um giro e me inclinou até quase o chão. E abandonou aquele ar desério.— Ei, você acha que esse vestido é bem forte? Parece que vai descosturar.Agora sim, esse era o Steve que eu conhecera bem.—Ah, é? Pois vou lhe perguntar uma coisa — falei dando uma risada. —Quantos tubos de gel você gastou esta noite no cabelo? Três ou quatro?Nós dois caímos na risada. Então, quando James acelerou um pouco o ritmo damúsica, puxei Steve pelo salão como em um tango. Varamos pela pista de

dança, forçando os outros pares a dar passagem livre.Assim que a música retomou o ritmo, nos tínhamos ido parar do outro lado doginásio. Não era muito iluminado, e ficamos dançando nas sombras. Steve meapertou mais ainda e acabei passando os braços pelo seu pescoço.De repente me senti completamente sem ar. Sabia que meu coração estavadisparado e sentia o mesmo no pescoço de Steve.Inclinei a cabeça para olhar seu rosto e vi sua boca bem perto da minha.Pareceu-me que o tempo tinha parado, e não conseguia me desviar da luz quese refletia em seus olhos. "É isso o que as outras garotas vêem", pensei. "Este éo Steve que eu nunca tinha visto antes."Aproximei minha cabeça dele e fechei os olhos. Senti o estômago meio enjoado,

mas não conseguia me conter.— Posso interromper? — ouvi uma voz em tom bem alto, gritando em meuouvido.— Rebecca! — Steve disse, se afastando de mim. — Eu estava indo procurar você.— Pois então achou — disse ela, me ignorando de propósito.— É isso aí — disse eu, e me afastei mais ainda de Steve. — Vejo você maistarde, Parson.Atravessei o salão pelo meio dos pares que dançavam, querendo encontrar Ellen, Precisava desesperadamente de uma boa gozação, bem cínica, sobrecomo são ridículos esses bailes de escola.No meio do caminho me virei e dei uma olhada na direção de Steve. Ele estavame encarando, mas longe demais para que pudesse ver a expressão em seusolhos. Engoli em seco e me senti paralisada.Nesse instante Rebecca puxou Steve para beijá-lo, e toda a magia do momentose quebrou, Não sei dizer ao certo o que ocorrera entre ele e eu, mas esperavae rezava para que não acontecesse nunca mais.

— Que sufoco — disse James, horas mais tarde. — Sempre gosto de cantar 

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para uma porção de gente.Era quase uma hora da manhã e eu havia telefonado para minha mãe uma horaantes explicando que ia me atrasar. O baile acabara, mas James e o pessoal doRadio Waves precisavam desmontar e carregar os equipamentos.— Vocês foram ótimos — disse eu, colocando um monte de cabos elétricos

dentro de uma sacola.— Todo mundo adorou.— O que posso dizer? Tenho música nas veias. James pegou sua guitarra esentou-se em uma das cadeiras de ferro.Ele tocou uns acordes de blues,cantarolando alguma coisa. — O que mais posso fazer para ajudar? —perguntei, olhando para o palco quase vazio.Estava exausta e ainda tinha de levantar cedo para tomar conta de Nina.James esticou o braço e me pegou pela mão, puxando-me para uma cadeira aseu lado.— Acabei de compor esse blues Eu-não-quero-levar-Ketty-para-casa —cantarolou ele, repetindo o acorde na guitarra.

Dei uma risada.— Qual é, Mick Jagger. Meu pai vai chamar a polícia se eu não chegar em casalogo.Quando James estacionou em frente de casa, aquela lâmpada na varandaestava acesa. Pude ver a silhueta de minha mãe, através da cortina, esperandopor mim no sofá.Ele desligou o motor e apagou as luzes do jipe. Virou-se no banco e esticou obraço, colocando a mão em minha cintura. Em seguida me puxou para maisperto e me beijou com força, como nunca tinha beijado antes.No meio da noite escura, eu me sentia abrigada como em um ninhoaconchegante. As imagens do jogo de futebol, do baile e mesmo da minha mãe

esperando na sala simplesmente desapareceram. Eu prestava atenção apenasnos lábios, nas mãos e no som de nossa respiração.Um calafrio subiu pela minhas costas e cada parte do meu corpo tremia deexcitação.— Steve — sussurrei, sentindo seu cabelo macio entre meus dedos.No instante seguinte meu coração quase parou. Abri os olhos e me recusei aacreditar no que tinha acabado de falar.Cada vez mais espantada, percebi que tinha chamado James pelo nome deSteve. O que estaria pensando? Será que ele tinha percebido?Afastei a cabeça um pouco para atrás e olhei para James. Ele me abraçou,apertando meus ombros com força. Não tinha ouvido que eu dissera o nome deSteve. Uma enorme sensação de alívio bateu em mim. Mas não conseguia maisme concentrar nos beijos de James. O nome de Steve não me saía da cabeça.Por que eu dissera o nome dele? O que tinha de errado comigo?Balancei a cabeça levemente, tentando clarear os pensamentos. Raciocinandologicamente, tentei me convencer de que pronunciar o nome de Steve nãosignificava nada. Tinha acabado de vê-lo e estivera pensando nele.— Não me canso de beijar você — disse James, segurando meu rosto comgentileza.

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— Eu te amo — murmurei, encostando o rosto em seu ombro, Nunca havia ditoantes essas palavras a um rapaz (exceto a Steve, mas era um caso diferente), esempre imaginei sinos tocando e fogos de artifício explodindo nos céus quandoa hora certa chegasse. Não sentia nenhuma dessas coisas com James, masachei que era esperar demais. Naquele momento tinha certeza de que falava o

que estava sentindo. James Sutton era o meu destino. Ponto final.Até o instante em que desliguei a luz de meu abajur de cabeceira, não tinhareparado que James não havia dito eu te amo em resposta. Contudo eu tinhacerteza de que diria — e logo.

— Você dançou a noite toda? — Nina perguntou, enquanto tirava sorvete docongelador.Peguei duas taças e colheres.— Não. A banda de James estava tocando, e então eu não tinha ninguém comquem dançar.Nina deu um suspiro dramático.

— Bailes são tão românticos. Gostaria de ir.Nos últimos meses Nina vinha se mostrando muito interessada nesse lance degarotos e namoricos. Ela sempre ficava me perguntando sobre Steve e James esobre "garoto que é amigo" e "namorado".Ao chegar à casa da garotinha naquela manhã, ela estava pulando para cima epara baixo, morrendo de vontade de saber sobre o baile. Imaginei se em algumtempo eu teria encarado um Baile de Boas-Vindas na escola com tamanhootimismo. Contemplando o rosto meigo e contente de Nina, me senti uma mulher velha e azeda.— Não se preocupe, você ainda irá a muitos e muitos bailes. Aposto que todogaroto da sua classe vai querer ser seu acompa-nhante no Baile de Boas-

Vindas.Coloquei duas bolas de sorvete na taça e passei para ela. — Steve foi ao baile?Desde que ela e suas amiguinhas começaram a se interessar por garotos, Ninativera uma queda por Steve.— Claro. Ele foi com a namorada, Rebecca.Nina fez uma careta, deixando claro que não aceitava a idéia de que Steveestivesse saindo com uma garota que ela não conhecia.— Bom, mas pelo menos você dançou com ele?— Dancei, uma vez.Torci para que ela não percebesse que fiquei envergonhada. Pude sentir meurosto ficando vermelho e quente só de lembrar o que tinha se passado entreSteve e eu, nos poucos minutos em que dançáramos Garota dos olhoscastanhos. Isso era uma coisa que não estava nem um pouco disposta a discutir com Nina.— Você acha que Steve me levaria ao baile? Dei uma risada.— Ele não é um pouco velho para você? Nina deu de ombros.— Sou madura para minha idade.Coloquei uma grande colherada de sorvete de chocolate na boca.— Vou dar um toque para ele — respondi sorrindo.

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Nina tomava o sorvete em silêncio e então olhou para mim com cara de séria.— Você e Steve vão se casar um dia? Quase engasguei com o sorvete.— Não!Nina e eu já havíamos conversado muitas vezes sobre o fato de Steve ser apenas um grande amigo meu, mas ela simplesmente se recusava a aceitar que

ele não fosse meu ideal de namorado.Nina me olhou pensativa.— Bem, eu acho que você deveria se casar com ele. E eu seria a dama dehonra.Sabia que não adiantava discutir com ela, então apenas balancei a cabeça erevirei os olhos. Aquela menina precisava aprender muito sobre o amor.

10 - STEVE

Rebecca e eu estávamos deitados de bruços em um grosso cobertor xadrez,tomando sol no lago Gambler. Eu olhava para a água, pensando como era feliz 

 por ser jovem e apaixonado. Ao ouvir o som agudo de uma risada feminina, virei a cabeça. Não era Rebeccaque ria. Era Kelly. Ela protegia os olhos do sol com a mão e suas pernasbronzeadas e bem-feitas estavam esticadas.Sem me preocupar em como ela tinha vindo parar ali, deitei minha cabeça emseu colo, sorrindo e olhando seus olhos brilhantes. Devagar, ela se curvou eroçou de leve os lábios na minha orelha. Depois sua boca tocou a minha e,esticando meu braço, passei a mão por seus grossos cabelos negros. Depoisme levantei, sentando e apertando mais ainda meus lábios contra os dela. Emseguida, estávamos nos abraçando tão forte que parecíamos uma mesma

 pessoa.

Bem na hora em que beijava Kelly, acordei. Meu coração batia forte, e eu atésuava um pouco na testa. Meu mundo estava fora de controle. O que poderiaestar me acontecendo?Claro que já tinha sonhado com Kelly outras vezes. Todo mundo que conhecia

 já tinha estado presente em meus sonhos uma vez ou outra. Mas nunca sonharaque a beijava. Senti como um bofetão. Rebecca era a garota que deveria estar em minhas fantasias. Ela era minha namorada, e eu estava apaixonado por ela.Mas aquele longo beijo em Kelly me pareceu tão real que meus lábios aindasentiam os dela.O relógio na cabeceira mostrava 12h15. Um pouco envergonhado por estar dormindo até tão tarde, fui para o banheiro escovar os dentes e afastar da mentequalquer pensamento sobre Kelly.Todo mundo sabe que os sonhos não significam nada. Só porque sonhei quebeijava Kelly, isso não queria dizer que realmente desejava beijá-la. A gentetinha dançado uma música romântica na noite anterior, e ter um sonho inocentecom ela era muito natural.

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Lavei o rosto com água fria e decidi ir procurar alguém para um joguinho debasquete. Eu estava precisando de um pouco de exercício. O sonho com Kellynão significava nada.- Não tem nada a ver - declarei para meu reflexo mo espelho. - Néris. Nerusca.Nadica de nada.

- Fala, Parson, como foi o baile? – perguntou Andrew, na segunda-feira demanhã.Estávamos na biblioteca outra vez, para fazermos o trabalho de história. Oassunto eram as pirâmides do Egito. Eu estudava a parte histórica e Andrewtrabalha na epóca atual, sobre as pirâmides e as tumbas.- A banda estava um saco, mas dei sorte e curti bastante – respondi.Andrew ergueu uma das sobrancelhas.- Engraçado. Eu já vi o Radio Waves outras vezes e achei legal.- Legal para quem gosta - observei, abrindo um livro. - A propósito, Rachel nãoestava no baile.

Como pensei, o comentário que fiz tirou da cabeça de Andrew o interesse peloassunto sobre a banda ridícula de James Sutton. Ele então atirou uma olhada àrecepção e viu Rachel Hall entrando na biblioteca e indo tomar seu lugar, emfrente ao computador. Vi que ela olhou disfarçadamente em nossa direção elogo se voltou.Andrew afastou sua cadeira.- Lembrei agora que me esqueci de devolver um livro. Volto já, jáInclinei-me para ver Andrew paquerando. Queria que ele simplesmenteconvidasse Rachel para um encontro e saísse dessa enrascada. Andrew pegouum livro e começou a esfregar as mãos por um instante. Depois de um curtopapo, ele voltou para nossa mesa, todo desengonçado.

- Como é que foi? – perguntei, dando-lhe um tapinha nas costas.- Uma droga. Eu me sinto um idiota total perto delaEle colocou as mãos no rosto mas vi que espiou para Rachel por entre o vãodos dedos. Resolvi deixá-lo entregue às suas lamentações e voltei para o livrode história. O prazo era de apenas uma semana, e ainda tínhamos de aprender um bocado sobre os faraós e pirâmides.

- Estou aqui não faz um semestre e já sou amiga de todas as pessoas certas –disse Rebecca na quarta-feira à tarde. Nós estávamos sentados em meu carro eestivéramos nos beijando por uns quinze minutos.Minha barriga deu um nó. Como sempre acontecia quando Rebecca começavaa falar de seu índice de popularidade. No começo eu pensava que ela só queiraconhecer as pessoas. Mas agora achava que era uma obsessão. É até mesmo

 já tinha observado como chegava a ser grosseira com algumas pessoas que nãoestavam na lista dos mais populares- Puxa, que legal – falei – Agora sua vida está completaRebecca concordou- E tudo isso graças a você – ela jogou os longos cabelos para trás e ficou me

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olhando, enamorada – Ainda bem que encontrei você- O que você quer dizer?Procurei ser gentil mas por dentro achei uma basbaquice- Bem, como todo mundo gosta de você, automaticamente passam a gostar também de mim. Você é meu anjo

Nas ultimas semanas vinha pensando que Rebecca me amava, e que eu aamava. Mas algumas dúvidas não saiam da minha cabeça.Rebecca não demonstrava nenhum interesse em conhecer meus amigos amenos que fossem lideres de torcida ou atletas. E sempre que ela dizia que meamava a palavra “popularidade” vinha logo em seguida. Basicamente, Rebeccame tratava mais como um troféu de que como namorado.De repente me bateu um pensamento de que eu tinha forçado a mim mesmo ame apaixonar por Rebecca porque queria ganhar a posta com Kelly. Mesmosabendo que Rebecca só se interessava em ser popular, meus motivos afinalnão eram muito melhores que os delaA voz animadinha de Rebecca cortou meu devaneio

- Eu acho que nós o casal mais bonito do Colégio Jefferson High. Você nãoacha?Balancei a cabeça, concordando em silêncio, mas sentindo que meu mundo seespatifara em mil pedacinhos

Quinta-feira à noite Kelly e eu estávamos batendo papo no escritório da casadela, assistindo ao filme Uma jornada inesquecível . Esse era outro de nossosfavoritos, e eu me sentia relaxado pela primeira vez depois que Rebecca mechamara de “meu anjo”.Kelly olhava fixamente para a televisão, comendo pipoca direto. Eu não estava a

fim de que ela ficasse zombando de mim no caso de eu perder a posta. Mas,ainda assim, queria falar sobre Rebecca. Afinal ela era minha melhor amiga a esabia bem mais sobre as mulheres do que eu.- Kel, eu acho que Rebecca só quer aparecer – disse eu, enchendo a mão depipoca- Não brinca – Kelly respondeu suspirando- Pensando bem, não estou tão apaixonado por ela como achava- Hmmm – disse Kelly.- Kel, você está me ouvindo? – cutuquei seu braço- Acha que james ainda ama Tanya? – perguntou em vez de responder a minhapergunta- Kelly, acabei de dizer que acho que não amo RebeccaEla deixou de lado a pipoca e me olhouO caso é que a senhora Heinsohn chamou James para ler o poema, que eletinha escrito, em voz altaPelo jeito Kelly não estava nem um pouco interessada em ouvir o que eu tinha adizer - E daí? – perguntei- Era um poema de amor 

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- Por favor, me poupe dos detalhes – Não estava a fim de ouvir nada sobre james Cara-de-panaca.- O poema não era sobre mim- O que?Admito que agora ficara curioso

- Bom, as palavras eram sobre perda e “distância cruel”, como ele escreveu –Kelly mordeu o lábio e balançou a cabeça.- E daí? – tinha a impressão de que ela queria chegar a algum ponto- Acho que ele escreveu o poema para Tanya, o que significa que não estáapaixonado por mim.Poderia jura que vi uma lágrima dependurada no olho dela- Esse cara é um saco. Você ficará melhor se ele ainda amar TanyaDe repente me ocorreu uma idéia. Se Kelly terminasse com James e euterminasse com Rebecca, a gente ainda estaria empatado em relação à nossaaposta. Quem sabe? Podia ser que eu me apaixonasse de novo até o Baile deInverno. Tudo era possível

- James não é um saco – respondeu Kelly, elevando a voz – Se disser isso maisuma vez, eu detono você. Fique quieto!Estava ficando chateado com Kelly. Ela acabara de dizer que James aindagostava da antiga namorada. Se isso não era realmente um saco, então o queseria?- Está bom, o que você queria que eu dissesse?Kelly recostou-se no sofá- Tanya virá para o Dia de Ação de Graças. Você acha que devo me preocupar com isso?- Se você não quer que eu diga que James é um saco, então não tenho nada adizer – falei com firmeza

Kelly enfiou o rosto em uma almofada do sofá.- Steve, você se importa em ir embora agora? Não estou a fim de papoEla desligou a televisão pelo controle e fechou os olhosSem me despedir, daí pisando duro. Precisava levar um papo sério com Kellysobre o fato dela só se importar consigo mesma e com o pateta do seunamorado.No caminha de volta comecei a pensar em Rebecca de uma forma diferente. Eladevia ter seus probleminhas, mas quem não tinha? Pelo menos se mostravasempre feliz quando me vi a nunca tinha me chutado pra fora de sua casa...Tinha dado uma completa meia-volta. Na verdade, Rebecca ficaria feliz em ver nesse momento.

CAPITULO 11 KELLY

Domingo, dia 19 de novembro.Bem no meio de uma tarde chata...

O tempo está um pouco frio agora. Mas meu humor não está muito melhor.Desde a leitura de James, de seu poema ridículo, na aula de redação. Ellen e eu 

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temos analisado qual o real significado disso muitas vezes. Agora, com aameaça de Tanya pairando sobre minha cabeça, tenho sido cada vez mais

 possessiva em relação a James. E não estou gostando disso.

James não mencionou o nome dela e claro que não perguntei nada sobre o

 poema. Seria muita humilhação. Devo confessar que é por causa desse tipo desituação que sempre evitei me apaixonar. Mas tudo vai dar certo. Espero.

Na quarta-feira antes do dia de Ação de Graças a turma do segundo grau doJefferson foi liberada a partir do meio-dia, e não teríamos aula até segunda-feira.Depois das aulas encontrei James perto de seu armário, conversando com umamigo que fazia parte da banda. Quando me aproximei eles interromperam opapo e olharam para mim.- Tudo certo para amnhã a noite? - Perguntei passando o braço pela cinturadele.- Não perderia por nada. - Respondeu James, me beijando na cabeça. Ele

estava lindo de calça jeans preta e camisa xadrez bem colorida.- Vejo você às oito horas.Caminhei pelo saguão, sentindo-me contente como naõ sentia desde a leituradaquele poema idiota.Se James quisesse ficar com Tanya, não combinaria de vir para minha casa noferiado de Ação de Graças. Como Ellen dissera eu devia estar paranóica.Era quinta-feira à tardinha e minha mãe e eu estavamos arrumando a mesa paraa tradicional ceia de peru.

 – Então o Steve não virá hoje à noite? – perguntou minha mãe, enquanto mepassava uma pilha dos nossos melhores pratos.Balancei a cabeça. Steve costumava vir para nossa casa nos principais feriados,

mas nesse ano nós convenientemente deixamos de lado essa tradição. Desde adiscussão durante o filme na semana anterior, nossa amizade não vinha maissendo a mesma.- Ele e James não são muito chegados. – respondi, colocando os pratos namesa, e deixando um espaço bem grande para o candelabro de prata que minhamãe sempre colocava em ocasiões especiais.

 – Ah, que pena! - lamentou minha mãe. - A vovó queria tanto conversar com ele.Diz que ele sempre a faz rir e esquecer a dor da artrite.Eu fiz que não me importava.- Bem, ela ficará feliz em conhecer James, quero dizer, ele, que é o meunamorado.

 –Ei, não precisa se arrepiar toda, chuchuzinho. Certamente a vocó e o vovôestão esperando conhecer James. Eu estava apenas lembrando que elestambém gostam de Steve.- talvez no Natal, mãe.O telefone tocou, e minha intuição feminina fez com que sentisse um frio nabarriga, enquanto ia atender.- Alô?- Oi, Kelly. – respondeu James.

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Sua voz era sexy como sempre.- Oi, James.Respirei fundo. Podia ser que ele estivesse ligando só para saber o que trazer para o jantar.- Escute, não vai dar para ir a sua casa hoje à noite.

Tentei esconder o desapontamento.- Ahh, que pena. Os seus pais insistiram para você ficar com eles?Olhei para mamãe, que tentava disfarçar que não estava interessada em minhaconversa.- Ah, é sim. Você sabe como são essas coisas. Meus avós vieram para casahoje. E tudo o mais.- É sim, os meus estarão aqui também.Estiquei o fio do telefone tanto quanto era possível para que minha mãe nãoescutasse nossa conversa.- Eu ligo no fim de semana.- Está certo.

Desliguei o telefone e me preparei para ouvir os comentários da mamãe. Tinhacerteza de que no mínimo, ela diria que Steve nunca teria cancelado umcompromisso em cima da hora daquela maneira.Ela, contudo, não disse nada e só apareceu na porta da cozinha.

 –O jantar está pronto. – chamou. - Vamos nos sentar.Sentando-me em meu lugar, peguei uma porção de peru fatiado no prato ao ladodo de papai. Estava me sentindo tão mal quanto aquele peru. De repente perdi oapetite.

Quando a campainha tocou, pulei do meu lugar na mesa e corri para atender aporta. Esperava encontrar James, possivelmente com um buquê de flores nasmãos. Mas era Steve. Ele segurava um bolo de chocolate e tinha um pouco deneve em seu casaco.- Entrega especial para a família Byrne. - Falou já entrando.Um impulso me fez dar um grande abraço nele. Tinha me esquecido de quesempre pudera contar com Steve para melhorar meu humor, mesmo quandoestivesse firmemente decidida a ficar deprimida.- Você não deveria levar o bolo de chocolate de sua mãe para Rebecca? –perguntei.Ele abriu o fecho do casaco e o tirou.- Eles foram viajar, visitar amigos. Além disso, você não acreditou que eu iadeixar de lado essa tradiçao, acreditou?Ele deu um puxãozinho em meu rabo-de-cavalo e caminhou para a sala de

 jantar.- Steve Parson. - Ouvi minha vó exclamando. - Está nevando?Steve foi até vovó e a beijou no rosto.- Começou nesse instante, vovó. A mãe natureza soube que vocês estariam nacidade hoje.

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Como já disse antes, Steve tem uma grande habilidade para agradar àspessoas. E não importava se suas piadas eram ruins, minha avó sempre riatanto que parecia que ele era o melhor dos comediantes.- Crianças! – exclamou vovó - Fico feliz de vê-lo aqui. Kelly tem se arrastado deum lado para o outro da casa como se fosse um traste.

Steve me olhou, e fiz de conta de que não era comigo.- Não fique aí parado com esta sobremesa nas mãos. – disse meu pai - Vamos,pegue um prato para você também.Enquanto Steve ia até a cozinha, eu me sentei à mesa. De repente o bolo dechocolate parecia o remédio para a minha tristeza.

- Vamos andar na neve. - Sugeriu Steve, uma hora mais tarde.Estavamos sentados perto da lareira depois de comer bolo de chocolate. Meusavós tinham adormecido em suas poltronas, e meu pai aparentemente lhesseguira o exemplo.Lá fora nevava forte, e nosso jardim já estava coberto com uma gorssa camada

branca brilhante.- Vocês podem achar divertido agora. – mamãe disse - Mas amanhã vai ser umaluta.- Preciso de exercício depois de comer esse bolo. - Disse eu, tirando a manta naqual me enrolara.Steve me seguiu até a entrada e peguei nossos casacos. Enquanto eu vestia omeu, ele ficou xeretando em nosso armário da entrada, onde guardavamoschapéus, luvas, guarda-chuva e outras coisas do tipo. Achou um chapéu antigo,listrado de roxo e verde, com uma bola colorida em cima, e me colocou nacabeça.- Ei, eu não vou usar isso. Não quero atrapalhar o trânsito. – disse eu.

Steve mexeu as sobrancelhas.- Se você usar, eu ponho este. – disse. Tirou a mão das costas e mostrou umchapéu laranja brilhante, que meu pai tinha trazido de uma viagem de caça. Ochapéu tinha proteção para as orelhas e trazia escrito na frente: “faça-me umcarinho, não atire”.Dei risada, colocando um velho cachecol no pescoço.- Bem, esta é uma oferta que não posso recusar. Vamos assustar a vizinhança.Steve fechou a porta atrás de nós e saimos pelo jardim chutando neve. Na rua,viramos à esquerda. A duas quadras de casa havia uma rua quase deserta, e eusabia que estavamos indo para lá.Por algum tempo andamos em silêncio. Nevava bastante forte, mas como nãoventava eu me sentia aquecida e confortável em meu casaco. A toda horacolocava neve na boca para sentir o gostinho gelado. Steve andava emziguezague para deixar o maior número de pegadas possível.- A gente podia chamar o Andrew. – Disse eu, para quebrar o silêncio.Steve deu de ombros.- Ele não vai querer vir. Acho que anda estudando secretamente as fotos deRachel Hall em antigos livros da escola.- Por que ele simplesmente não a convida para sair? – perguntei, chutndo uma

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pedra no caminho.- Ele disse que ela não quer se amarrar, mas eu acho que ele tem medo darejeição. Não me lembro de ele ter se preocupado tanto antes com o fato dereceber um sim ou um não de uma garota.Concordei.

- Podemos relacionar isso com sentimento. – comentei.- Você preferia estar com James? - Steve perguntou andando em volta de mim.Demorei para responder. Na última hora e meia tinha me esquecidocompletamente de meu desapontamento com o fato de James ter canceladonosso encontro. Estar com Steve parecia ser a maneira perfeita de aproveitar aneve eo clima festivo no ar.- Não, estou contente aqui com você. – finalmente respondi - Por quê? Vocêqueria estar com Rebecca?Steve encheu a mão de neve e fez uma bola.- Não. Não é muito divertido jogar bolas de neve em Rebecca.Steve atirou uma bola de neve em mim e riu alto na noite escura. A bola me

acertou em cheio no rosto e gritei. Na mesma hora me ajoelhei e, usando asmãos, juntei tanta neve quanto consegui. Corri para cima de Steve, que aindaria, e joguie tudo em suas costas.Ele reclamou, tentando desesperadamente sacudir a neve do casaco.- Isso foi uma declaração de guerra.- gritou.Chegamos a rua deserta perto de casa, e por todo lado ainda havia neve intacta.Por quinze minutos ficamos parecendo uns malucos, jogando bolas de neve ederrubando um ao outro no chão. Dei tanta risada que minhas costelas doíam.Finalmente nos deitamos no chão. Eu estava tão cansada que fiquei aliestendida de costas, olhando para o céu e retomando o fôlego. Quando metoquei que meu traseiro estava molhado e quase congelado, virei-me para

Steve.- Essa foi legal, mas acho que já era hora de a gente se esquentar com umchocolate quente. – falei.- Antes vamos construir anjos de neve. – Steve sugeriu - Não tenho feito isso háanos.Ele deitou-se antes de minha resposta e começou a mexer os braços e pernas.- Não tem tanta neve assim, para fazer anjos bonitos. – argumentei - Precisa depelo menos um palmo de neve.Steve colocou uma bola de neve na boca e arotou.- E daí? O que vale é a intenção.Não podia discutir com sua lógica, então procurei fazer o melhor anjo que pudee depois me levantei para ver o resultado.- É, não está mal.- Nada mal mesmo. – Steve concordou - Agora será que ouvi alguém falando emchocolate quente, e a palavra-chave é "quente"?Minutos depois estavamos na cozinha de minha casa, quase sem fôlego.Tiramos nossas botas, meias e blusas, tentando ver se alguma coisa aindaestava seca. O cabelo de Steve estava ensopado mais ainda penteado, e seuslábios tinham um toque azulado.

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Todo mundo tinha ido dormir, e então fui na ponta dos dedos até a lavanderia epeguei uma calça e uma camiseta de malha de meu pai para Steve. A seguir fuiaté meu quarto e troquei minha roupa por um pijama de flanela. Quando nossentamos perto da lareira, com nossos chocolates quentes, estavamos secos eaquecidos.

Sem mais, Steve deu um longo suspiro.- O que foi? – perguntei.- Sei lá. Estava pensando que está é uma noite perfeita para um romance.Olhei para o fogo, pensando se James estaria com Tanya em algum lugar,tomando chocolate quente e dizendo a ela o quanto sentiu sua falta. Senti um nóna garganta e engoli em seco.- Sim, eu sei o que você quer dizer. – murmurei.Quando Steve se voltou para mim, seus olhos pareciam totalmente verdes. Elese aproximou no sofá e enrolou algums fios do meu cabelo em seu dedoindicador. Meu coração disparou e senti a mesma emoção confusa daquelanoite no Baile de Boas-Vindas.

- Sabe aquela música? – ele perguntou.Balancei a cabeça sem tirar os olhos dele.- Que música?- Se não pode estar com quem ama...- Ame quem está com você. – finalizei.Meu olhar se fixou em seus lábios e me senti hipnotizada por sua proximidade.Steve colocou a mão em minha nuca e me puxou para mais perto. Fechei osolhos, desejando que seus lábios tocassem os meus.Assim que senti seu beijo, um fogo líquido se espalhou em mim. Sem pensar,agarrei sua camiseta como se não quisesse que ele se afastasse mais. Nossasbocas se encontraram com perfeição, como se fossem feitas uma para a outra.

Os fogos de artificio que esperava com James finalmente aconteceram. Cadaparte do meu corpo estava viva e em chamas, como se estivesse no meio deuma experiência nuclear. o mundo lá fora evaporou-se e Steve era a única coisaque ainda existia no planeta.Um pouco depois ele se afastou.Assim que o beijo terminou, senti uma onda de vergonha. Era possível que eutivesse feito aquilo? Era possível ter beijado Steve, meu melhor amigo nomundo? Um milhão de questões invadiu minha mente, e fiquei sem fala.- Uau, não sei se isso foi uma idéia muito boa. - Disse ele, passando a mão pelomeu cabelo.Minha sensação de atordoamento transformou-se em raiva.- Por que você fez isso? – perguntei.-Steve: O que você quer dizer com eu fiz? – perguntou Steve - Você participoutambém.Fechei a mão, mostrando o punho.- Foi sua idéia. Não negue.Procurava manter a voz baixa, mas me sentia como se estivesse gritando.Steve me fulminou com o olhar.- Bem, claro que não foi uma boa idéia. - falou, dando um murro no sofá.

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- Você não pode suportar o fato de existir uma garota nesta cidade que nãoqueira sair com você. – desabafei.- Não se lisonjeie, Kelly. Isso nunca mais vai acontecer.- Está certo. - Falei cruzando os braços.- Está certo. - Ele respondeu ficando em pé.

- Diga obrigado a seu pai pelas roupas. Devolverei o mais depressa possível.- Não se apresse. - Respondi, caminhando para a entrada.- Não se preocupe.Ele pegou suas roupas ainda molhadas.- Por mim, está bem. - Abri a porta e fiquei olhando para ele. Minhas mãosestavam tremendo, e me senti muito perto de chorar.- Dê um oi meu para seus pais.Então ele se foi pela noite nevada, e eu bati a porta atrás dele. Aquela altura nãoestava mais me importando se acordava a casa toda. Esse dia tinha sido um dospiores de minha vida, e a única coisa que eu queria era me lamentar atéconseguir dormir.

Enquanto ouvia Steve dar a partida no carro e dirigir para a avenida, às lágrimasque estava segurando brotaram em meus olhos. Fui para meu quartocambaleando e me desmanchando em soluços que pareciam não ter mais fim.Uma vez mais tinha feito uma grande, uma imensa bagunça com minha vida.- Por que eu? - Murmurei na escuridão do quarto. - Por que eu?

12 - Steve

Quando abri os olhos na sexta-feira de manhã, sabia que alguma coisa tinhadado errado. Mas levei um bom tempo para juntar as peças e lembrar o desastreda noite anterior. Lembrei que beijara Kelly.

Sorri e bati minha cabeça de leve na parede acima da cabeceira de minha cama.Experimentei um frio na barriga ao perceber que tinha quebrado a principal regrade uma amizade platônica. Agora Kelly me odiava e eu não podia fazer nadasobre isso.Fiquei relembrando várias vezes o acontecido. O que será que me tinha feitobeijá-la? Teriam sido as brincadeiras na neve? A lareira? Balancei a cabeça. Osmotivos já não importavam muito — além de dolorosos, eram irrelevantes. Eutinha estragado completamente uma coisa muito legal, e nenhumaracionalização poderia mudar esse fato.E ainda tinha a questão de Rebecca. Falando friamente, eu a tinha enganado.Mesmo considerando que o beijo em Kelly acontecera durante um momento deinsanidade temporária, não havia como negar que tinha acontecido, ainda queRebecca nunca viesse a descobrir.Outra questão me perturbava. Se Rebecca descobrisse sobre o beijo, o que elafaria? Certamente seria ferida em seu orgulho. Mas ficaria mesmo magoada, ouapenas aborrecida? Ela dissera que telefonaria de Nova York, mas até aquelemomento não tinha dado notícia. Teria ido visitar seu antigo namorado?O pensamento de que ela estivesse beijando um outro cara me pareceuestranhamente confortador. Embora a imagem da minha namorada nos braços

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de algum nova-iorquino gosmento não fosse das melhores, a imagem aliviavaminha sensação de culpa. Rebecca e eu éramos jovens, e era compreensívelque nós dois cometêssemos erros. Certo? Certo!Resolvida esta questão, meus pensamentos passaram de Rebecca para Kelly.Mas antes mesmo que pudesse construir uma desculpa decente, mamãe bateu

a minha porta.— Steve? Está acordado? — ela perguntou, abrindo a porta só um tantinho.— Estou, infelizmente.Rolei na cama e me deitei de bruços, esperando que ela percebesse que eu nãoestava a fim de papo.— Kelly está lá embaixo, querido.— Está? — Sentei na cama rapidinho e empurrei meu acolchoado para o pé dacama. — Me dê dois minutos, mãe, e depois diga para ela subir.Pulei em um pé só pelo quarto, tentando vestir a calça e pentear o cabelo aomesmo tempo. A porta se abriu enquanto estava abotoando a camisa, e Kellyenfiou a cabeça para dentro do quarto.

— Será que você teria um tempo para a sua antiga melhor amiga? — elaperguntou.Na hora, a sensação ruim que experimentava desde que tinha acordadodesapareceu. A voz de Kelly soara amistosa, e tudoiria ficar bem.— Só se você retirar o "antiga" da pergunta — respondi,abrindo toda a porta.— Trouxe uma oferta de paz — declarou Kelly, entrando no quarto. Ela me deuuma caixa de rosquinhas e sentou-se em uma velha poltrona que tenho noquarto.— Sabe, Kelly, acordei esta manhã louco para comer umas rosquinhas. E então

você apareceu com elas.— Conheço você muito bem, Parson.Kelly colocou as pernas no braço da poltrona e apoiou a cabeça na mão.— Não consegui dormir direito ontem à noite.— Também não. Me senti péssimo.Peguei uma rosquinha e passei a caixa a Kelly. Ela se serviu de uma e mordeumetade de uma vez só.— Não podemos deixar isso estragar nossa amizade. Nossas reações foramexageradas.— Concordo plenamente — respondi.Pensando bem, a coisa toda não parecia tão grave. Nós nos beijamos. Um beijonão é o fim do mundo. Além disso, somos jovens normais e ativos. Jovens sebeijam o tempo todo. Não era como se tivéssemos cometido um assassinato oucoisa assim.Kelly mastigou pensativa por um instante.— Quero dizer, se a gente chegou a gostar realmente do beijo, então acho quetemos mesmo um problema.Concordei, imaginando aonde ela queria chegar com esse raciocínio. Semprepodia perceber quando Kelly estava armando uma de suas teorias.

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— Mas, analisando tudo que aconteceu racionalmente, aquele nosso beijo foiquase uma coisa boa.Ela parou por um momento, esperando minha reação. Como não disse nada,continuou:— Aqui estamos nós, dois amigos de sexos opostos. É natural que

experimentemos uma certa dose de... ahh, curiosidade um pelo outro.— Curiosidade — repeti, apenas para que ela soubesse que estava prestandoatenção.— Sim. E agora que já colocamos o nosso beijo fora do caminho, podemosdeixar essa história toda desaparecer no passado. Sabemos que nunca maisqueremos nos beijar e não vamos fazê-lo. Ponto final.Estava um pouco aborrecido por ela ter se desfeito de meu beijo assim tão fácil.Para mim, a experiência tinha sido como ser mandado para o espaço montadono lombo de um foguete. Quando finalmente me dera conta do que tinha sepassado, levará uns dez segundos para sentir os pés no chão novamente! Nãopoderia negar que ela me excitava, a um nível perigoso.

Mas não estava a disposto a discutir com Kelly. Naquela altura da conversaconcordaria até se ela dissesse que a Terra era quadrada. Só queria quevoltássemos a nossa amizade e prosseguir dali.— Ponto final — confirmei.Kelly estendeu a mão e a apertei com firmeza.— Bem, estou contente de que tenhamos resolvido isso — observou ela, comose a discussão fosse sobre quem lavaria os pratros do jantar.Sorri para ela.— Eu também, Kelly. Estou certo de que vamos dormir bem melhor esta noite.— Claro. Com certeza.— Com certeza.

Inclinei-me sobre meu travesseiro e me senti como se tivesse renascido. Afinalde contas, meu mundo não tinha desmoronado, eu não poderia estar maisagradecido.

Sentia meu estômago revirando enquanto dirigia para a casa de Rebecca nodomingo à tarde. Ela me telefonara assim que tinha chegado de Nova Yorknaquela tarde, e agora eu estava apenas a alguns minutos de rever aquelerostinho lindo. Queria ouvir sua voz, especialmente porque sentia como sefôssemos ter um novo começo. Desde o caso do beijo em Kelly tinha percebidoque talvez não estivesse dando tanta atenção a Rebecca quanto ela merecia.Claro que devia ter projetado esses sentimentos em Kelly, que por sua vez deviater projetado os sentimentos dela por James em mim, e no final dera no quedera.Domingo a temperatura ainda estava abaixo de zero. Então, quando Rebeccadissera que queria ir patinar no gelo no parque Hamilton, achei uma boa idéia.Já imaginava nós dois de mãos dadas patinando em círculos no lago. Comexceção de algumas crianças pelo gelo, estaríamos em nosso mundinhoparticular. Depois iríamos para a casa dela beber chocolate quente (na verdade,cidra quente seria melhor) e ficar nos beijando até tarde da noite. Mal podia

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esperar por aquilo.Quando cheguei, Rebecca abriu a porta. Antes que eu pudesse dar um beijo ouum alô, ela se virou, ainda na entrada da casa.— Olha! O que você acha da minha roupa nova para patinar? — perguntou.— Uau! — Não pude pensar em nada melhor como resposta.

Rebecca vestia uma roupa rosa para patinação. O material devia ser cem por cento malha elástica, porque estava colado ao corpo como uma segunda pele.Ela usava uma bermuda cor da pele e segurava em uma das mãos os patinsimaculadamente brancos. Para ser honesto, todo mundo que conheço patina de

 jeans e blusa de lã e nunca me ocorreria que Rebecca se vestiria como umabailarina de patinação no gelo. Mas não seria eu quem iria reclamar. Ela pareciauma atleta olímpica transformada em supermodelo.— Vamos nessa. Todo mundo vai estar lá.Ela apanhou o casaco e fomos embora.Não entendi o que ela quisera dizer com "todo mundo", mas ainda estava meiosem fala pelo efeito de sua roupa. Se tentasse falar, provavelmente minha voz

pareceria um guincho.Dentro do carro, puxei Rebecca para mais perto. Beijá-la apagaria a horrívelnoite do incidente com Kelly. Assim que meus lábios tocassem os dela, o Dia deAção de Graças seria apenas um sonho ruim. Pelo menos era o que euesperava.Senti Rebecca viva e aconchegante em meus braços, e o tecido macio da suaroupa parecia seda. Beijei seus lábios, seu rosto e sua testa. Não me sentivoando pelo espaço mas isso me excitava. Beijei mais forte ainda, tentandoesquecer o beijo em Kelly. Depois de uns minutos sem fôlego, decidi que aexplosão que experimentara com Kelly deveria ter sido porque sentia falta daminha namorada e ficara preocupado de que ela estivesse com outro cara em

Nova York. Estava apenas liberando as emoções que surgiram. Existem muitasexplicações psicológicas. A mente é muito poderosa... não é o que todo mundovive dizendo? Rebecca ajeitou o meu cabelo, sorrindo.— Estivemos só quatro dias separados e você parece um cara que atravessou odeserto todo sem nem um cantil.Beijei-a de novo.— É assim que me sinto.— Bem, fico feliz de saber que você gosta de mim. Não é toda garota que revêseu ex-namorado em Nova York e resiste a toda a conversa para voltar a ficar 

 junto.Dei uma olhadela em Rebecca, maravilhado pela capacidade que as mulherestêm de dizer a coisa exata para que um cara se sinta um completo idiota. Fiqueicontente de que o sol estivesse desaparecendo rápido, porque tinha certeza deque a culpa me faria ficar com o rosto vermelho.— Melhor a gente ir — disse.O estacionamento do parque Hamilton já estava com metade da lotação, ereconheci alguns dos carros. De repente captei o que Rebecca quisera dizer com "todo mundo".

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— A turma toda está aqui! — ela exclamou, contente, enquanto andávamos pelomeio do pessoal que circulava pelo lago.— Você não me disse que quase o colégio inteiro estaria patinando aqui estanoite — falei, um pouco mais duro do que pretendia.— E não é legal? Estou tão feliz em ver todo mundo. — Ela correu na minha

frente, desaparecendo atrás da barraca de aluguel de patins.Poucos segundos depois ouvi os gritinhos de Rebecca. Quando pude vê-la,estava abraçando Carrie Starks como se a garota fosse sua irmã que não via hámuito tempo. Achei uma palhaçada. Mesmo Rebecca gostando das líderes detorcida, Carrie Starks e Amanda Wright, penso que elas são superficiais eburrinhas, na melhor das hipóteses, e caluniadoras e manipuladoras, na pior delas. São do tipo de garotas que oferecem o rosto para os beijinhos decumprimento, mas são muito impacientes para esperar serem beijadas e nosfazem acabar beijando apenas o ar.Confiante, Carrie veio para o meu lado.— Você não vai me dar um beijinho, Steve? — perguntou ela chegando mais

perto. .Preparei os lábios e me curvei. Como esperava, dei um beijo gostoso bem ondea bochecha deveria estar, mas foi inútil, pois beijei só o ar.Rebecca me arrastou pelo lago, enquanto eu tirava meus patins de hóquei dedentro da mochila. Vi Patrick Mayor, Bart Langley e Josh Nielson, e meussonhos de uma tarde romântica se evaporaram. Minhas opiniões sobre Patricknão melhoraram desde a noite da festa que ele dera, quando vi Ketty agarradade um jeito quase indecente com James. E odiava Josh Nielson.Josh sentira uma quedinha por Kelly durante o segundo ano no colégio. Ela saiucom ele uma vez, detestou e nunca mais falou com ele de novo. O cara é umtroglodita. Josh então começou a fazer crueldades contra Kelly na escola. Como

ela não entrou na dele, Josh pichou as paredes do banheiro masculino comfrases pouco agradáveis. Um dia eu o vi fazendo isso e saímos no braço, aúnica vez em que fiz isso na vida. Depois que o treinador veio nos separar, jureique nunca mais socaria ninguém. No ano seguinte ele trocou de escola porqueos pais se mudaram para outro bairro, e eu não o tinha mais visto. (A propósito,Kelly nunca soube dessa briga.)Amarrei meus patins rapidamente, dizendo a mim mesmo que, depois de umano e meio, provavelmente Josh teria melhorado seu comportamento. Portanto,se fosse gentil com ele, não haveria motivo para cenas.Peguei Rebecca pela mão e circulamos pelo lago. Ignorando a presença deJosh, realmente estava começando a me divertir.— Isto é tão romântico — disse Rebecca, olhando para o céu estrelado e a luacheia.— E porque você está aqui — respondi, pegando suas duas mãos e girando emcírculos.Fiz uma parada rápida, como no hóquei, ao ver pelo canto do olho que JoshNielson vinha em nossa direção. Ele tinha uma expressão de gozação no rosto eme esforcei para ficar relaxado e me mostrar amistoso.— Oi, Josh — cumprimentei. — Conhece Rebecca Foster? Ele a olhou de cima

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a baixo e deu um sorriso seboso.— Só de ouvir falar, até agora. Prazer em conhecê-la, Rebecca.Ela olhou para ele e sorriu, flertando.— Como não vi você por aqui antes?— Eu estou no colégio Rosedale. Mas gosto de manter contato com os velhos

amigos.Josh me olhou e pude ver pelo brilho em seus olhos que ele estava doidinhopara me contar alguma coisa.Não estava nem um pouco interessado fosse lá no que fosse que ele tivessepara me dizer. Tomei Rebecca pela mão de novo.— Vamos continuar de onde paramos? — perguntei a ela, me despedindo deJosh.Nesse instante ele colocou a mão em meu ombro:— Falando em velhos amigos, Mayor me disse que a nossa queridinha KellyByrne está de caso com James Sutton.Percebi que Rebecca fechara ligeiramente os olhos e não a culpei, Josh falou de

um jeito que parecia que Kelly e eu tínhamos alguma coisa. Mas não queria queisso ficasse estranho, e então decidi explicar a Rebecca mais tarde.— Sim, ela está apaixonada — respondi, satisfeito por ver o sorriso malicioso setransformar em uma cara de preocupado.— Bem, você poderia dar um recado para ela — Josh disse.— Sobre o quê? Senti os músculos de minhas costas se contraírem, mas nãodeixei que ele percebesse que estava me atingindo.— Eu vi James e Tanya Reed parecendo muito amiginhos na pizzaria do Jon,numa noite dessas. Na verdade, eles estavam botando para quebrar, em umamesa no canto.Ele sorriu para mim e depois riu alto.

— É mentira — falei.— Não estou nem aí se você acredita ou não, Parson. Mas você deveria dizer asua amiga que Sutton só a está usando até poder colocar as mãos de novo emTanya.Eu estava trêmulo de raiva e não pude me controlar ao dar um passo em direçãoa Nielson. Se era verdade ou não o que ele dizia, já não importava mais, queriamais era tirar aquele sorriso idiota da cara dele.— Isso deve ser ciúmes porque Kelly não quis sair com você, seu pateta — faleicom raiva.— Kelly é uma panaca — Josh contra-atacou. — Pode perguntar a qualquer um.Então Rebecca resolveu entrar na discussão.— Ele tem razão, Steve. Todo mundo sabe que Kelly é assim, tipo... estranha.— Obrigado pela sua opinião, Rebecca. Mas isso é entre Josh e eu.— Quer sair no braço, Parson? — provocou ele, chegando o rosto perto do meu.— Você não vale isso — respondi.Percebi que Patrick e Bart tinham vindo para perto e nos obsevavam comcuriosidade.Quando olhei para o outro lado, Josh aproveitou a oportunidade. Vindo do nada,seu punho me acertou bem no queixo. Cai para trás, sentado, com um gemido.

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— Kelly é a garota mais legal que conheço — gritei. — Ela põe qualquer namoradinha sua no bolso.Enquanto tentava me levantar, Josh pulou sobre mim. Mas antes que ele mebatesse de novo, Patrick e Bart o agarraram. Eles o puxaram para o lado,segurando os seus braços.

— Acho que essa patinação acabou — disse Bart. Ele e Patrick levaram Joshpara fora do lago.Fiquei em pé sobre o gelo, ainda furioso. Quando tirei os olhos de Josh e fiteiRebecca, ela estava me encarando com as mãos na cintura.— Se você gosta tanto assim de Kelly, talvez deva sair com ela — gritou. —Vocês dois merecem um ao outro.Fiquei só olhando para ela, tão espantado que não podia nem falar. Como nãodisse nada, ela me sorriu gelado:— Está tudo acabado entre nós.Olhei ela patinando a distância e me senti como se fosse um balão que acabarade estourar. Quando ela chegou à beira do lago, desamarrou os patins e correu

para o estacionamento.— Josh, espere! — pude ouvi-la gritando.Então não consegui mais vê-la. Enfiei a cabeça em um monte de neve de tãocansado que me sentia. Estava magoado por Rebecca ter terminado comigo,mas no fundo sabia que nosso caso não tinha muito futuro. Ela sempre tiveramais coisas em comum com Carrie e Amanda do que eu quisera admitir, e agorapodia ver até que ponto era superficial.Um vento frio soprou em meus ouvidos, mas fora isso a noite estava silenciosa.Os feriados do Dia de Ação de Graças tinham terminado para mim, e também orelacionamento com Rebecca Foster.Olhei para o lagoa, agora deserta, e balancei a cabeça negativamente:

— Bem, acho que isso significa que perdi a aposta — disse em voz alta.13- Kelly

Quando Ellen e eu fomos para a aula de redação na segunda-feira de manhã,minhas mãos estavam suadas e sentia meu estômago enjoado. Não conversavacom James desde a noite do Dia de Ação de Graças e passara a maior parte dodomingo tentando convencer a mim mesma de que haveria uma boa razão paraque ele não tivesse me telefonado. Um motivo seria porque seus avós estavamna cidade. E também sabia que o Radio Waves teria uma apresentação em umcolégio em breve, e eles provavelmente estariam ensaiando. E até levei anevasca da noite anterior em consideração, era bem possível que ele tivessepassado metade da sexta-feira tirando neve da calçada.Minhas mãos ainda tremiam ao pensar em encontrá-lo. A Kelly pessimista tinhareaparecido, mais forte do que nunca. Quase esperava que ele surgisse comuma placa dizendo: Passei o fim de semana com Tanya Reed.— Tenho certeza de que ele só estava ocupado — assegurou Ellen. — TanyaReed não é ninguém comparada com você. Ela é pura aparência, sem nenhumconteúdo.

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— Oh, eu me sinto muito melhor agora — respondi com ironia. — Todo mundosabe que os garotos de dezessete anos preferem mil vezes o conteúdo à relesaparência, é claro... De que planeta você veio, Ellen?Ela deu de ombros:— Ei, pelo menos estou olhando pelo lado bom da coisa.

— Não tem lado bom nessa história — respondi meio deprimida. Quando Ellen eeu nos sentamos não havia sinal de James. A sra. Heinsohn então pediu queentregássemos o exercício de escrever uma história curta. Eu abri meu cadernomas mantinha um olho grudado na direção da porta.— Sobre o que é a sua história? — perguntou Ellen, esticando o pescoço paraespiar meu caderno.— Nada interessante. Na verdade é meio idiota — respondi rapidinho.Minha história era sobre uma garota e um garoto que eram muito amigos. Umacerta noite eles se beijam romanticamente isso quase arruina a amizade entreeles. No fim da história eles fazem as pazes. A idéia não era muito original, mastodos dizem que escrever alivia as culpas. Imaginei que escrever sobre o que

acontecera comigo e com Steve seria uma boa terapia, e pode parecer estranhomas foi mesmo.Voltei-me para Ellen:— E a sua?— A minha é meio idiota também — ela respondeu.Dei uma espiada na história de Ellen. Em letras maiúsculas ela tinha escrito notopo da página SOCORRO! TENHO UMA QUEDA PELO MELHOR AMIGO DEMINHA MELHOR AMIGA! Pelo título dava para ter uma boa idéia sobre o queera a história de Ellen. Se a sra. Heinsohn fosse apenas um pouquinho esperta,certamente conseguiria perceber as semelhanças entre os personagensmasculinos de nossas histórias. Suspirei. A segunda-feira não estava sendo um

dia bom.Cinco minutos depois de tocar o sinal, James chegou. Ele sorriu e se desculpoucom a sra. Heinsohn, sentando-se em uma carteira próximo da porta. Tenteiolhá-lo nos olhos, mas ele estava concentrado em ler a tarefa que a professorahavia colocado em sua carteira.Pelos quinze minutos que se seguiram procurei resistir à tentação de ficar olhando para onde ele estava sentado. Se ele queria me ignorar, eu é que nãoiria ficar de olho comprido, atravessando a sala, para o lado dele. Acabou ,repetia para mim mesma, ele ainda ama Tanya.Quando Ellen me deu um tapinha no ombro, quase pulei na carteira. Ela mepassou um papel todo dobrado e sacudiu a cabeça na direção de James.Meu coração disparou ao abrir o bilhete: Kelly, me encontre assim queacabarem as aulas. Amor, James.Dei uma olhadela e percebi que ele estava me encarando. Fiz que sim com acabeça e sorri, voltando a atenção para a sra. Heinsohn. Meu coração se aliviou.Talvez ele tivesse mesmo uma boa razão para não ter telefonado no final desemana. Por enquanto a solução era esperar pelo melhor.

— Não posso me demorar muito — expliquei a James, fechando a porta do jipe

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dele. — Tenho de estar na casa de Nina Johnson dentro de meia hora.James estava bonito como sempre, vestindo uma blusa preta de gola olímpica eum jeans desbotado. Seus olhos brilhavam muito. "Ele está feliz por me ver",pensei. Um arrepio gostoso correu pela minha espinha. Finalmente as coisasiriam voltar ao normal.

— Espero que me desculpe por não ter ligado este fim de semana — disse ele.Fiz que não me importava, como se não tivesse nem percebido que o telefonehavia ficado mudo por três dias inteiros.— Oh, tudo bem. Eu estava ocupada com meus avós.James concordou.— Sim, eu estava ocupado também.Decidi olhar diretamente em seus olhos e perguntar sobre sua ex-namorada. Seo passado era passado, então não haveria motivo para ciúmes.— Então, teve chance de ver Tanya no fim de semana? — perguntei. — Ouvidizer que ela estava na cidade.James mordeu o lábio e ficou olhando fixamente para o volante do jipe, como se

fosse um quadro de Picasso em vez de alguns quilos de metal e plástico.— Ahh, sim. Na verdade, foi por isso que estive ocupado.— Oh.Não havia mais nada a dizer. Deveria sair do carro e nunca mais falar comJames. A mistura de excitação e culpa em sua voz já havia dito tudo o que euprecisava saber. De repente estava cara a cara com a possibilidade real de ser descartada.Como uma boba, não saí do carro. Apenas fiquei sentada ali, parada, emsilêncio, esperando que ele dissesse mais alguma coisa.— Ela não sai com ninguém na escola. E realmente sente a minha falta... e achoque sinto falta dela também.

— Oh — disse de novo.Lágrimas tentavam brotar de meus olhos e pisquei rapidamente. Quase permitiraque James percebesse quanto me sentia humilhada e magoada.— Vamos tentar uma relação a longa distância — prosseguiu. — Não é que eunão ame você, acho você muito legal. Mas acho que... Tanya e eu estamosdestinados a ficar juntos, sabe?Engoli em seco e me endireitei no assento do jipe.— Acho isso muito bacana, James — falei. Surpreendentemente minha vozparecia natural e suave.— E mesmo? — ele perguntou, espantado.— Sim. Porque tem uma coisa que preciso dizer a você também.Enfiei as mãos nos bolsos do casaco para que ele não percebesse que estavamtrêmulas.— Tem, é?De novo ele pareceu surpreso. Suas belas sobrancelhas estavam levantadas, eele me encarava direto nos olhos.— Sim. Nesse fim de semana, Steve e eu percebemos que estamosapaixonados um pelo outro.Mesmo enquanto falava, não podia acreditar que aquelas palavras estivessem

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saindo de minha boca. "Desculpe, Steve" , pensei.— Oh.Senti uma certa satisfação quando notei que James ficava abalado.— Não é uma coincidência muito engraçada? — perguntei. — Temos tanta sorteque terminamos sem magoar um ao outro.

— Sim — concordou James, embora parecendo confuso.— Bem, acho que nos veremos por aí. — Inclinei-me e dei um beijo no rostodele. Abri a porta e saí do carro.— Tchau, Kelly.— Tchau, James — respondi, fechando a porta atrás de mim.Quando ele saiu do estacionamento, meus joelhos se dobraram e caí no chãoem soluços.

Normalmente gosto de tomar conta de Nina. Naquela tarde, porém, isso pareciamais uma sentença de prisão que um trabalho. Ela ficou me perguntando coisassobre a relação entre meninos e meninas a cada minuto.

— Marcy Stein vai dar uma festa na sexta-feira — disse ela. Nós estávamos noestúdio da casa dos Johnson, pois eu ajudava a garotinha em um projeto deartes para a escola.— Legal — respondi vagamente. Não estava lá morrendo de vontade de falar sobre festas.— Ela vai convidar uns garotos — continuou Nina. Ela parecia ansiosa por conhecer minha reação.— Que emocionante.Percebi na hora que não estava sendo justa com Nina, e o olhar magoado emseu rosto me fez sentir uma onda de culpa.— Desculpe — disse, dando um abraço nela. — Tenho certeza de que vocês

vão se divertir muito.Nina era uma garotinha, mas não era boba. Ela sabia que alguma coisa tinhaacontecido.— O que foi, Kelly? Você parece triste.Fiz que não liguei, tentando conter as lágrimas.— James e eu terminamos hoje. Por isso estou triste.— Eu não gostava dele mesmo — retrucou ela, como se essa declaraçãoencerrasse o assunto.— Você nem o conhecia — lembrei a ela.— Certo, mas Steve me falou dele,Ela recortou um coração de papel e escreveu suas iniciais nele.— E o que ele disse?— Disse que James era um grande pateta e que você merecia alguém muitomelhor.Quase caí na risada. Desde quando Steve discutia minha vida amorosa comuma garotinha de dez anos?— Acho que ele não deveria ter dito isso. Com quem eu saio não é da contadele. Ou da sua.Vi Nina escrever outras iniciais no coração de papel, H.R , que deveria ser sua

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paixão mais recente.— Mas ele estava certo. Não estava?Ela me olhou com seus olhos azuis, grandes e confiantes.— Sim — suspirei. — Acho que ele acertou.

Fiquei em pé na entrada da casa dos Parson tremendo de frio. Tinha saído tãodepressa que nem me lembrara de pegar o casaco.— Kelly!No instante em que me viu, Steve me deu um grande abraço.— Sinto muito — cochichou em meu ouvido.Enxuguei as lágrimas na manga da blusa dele e o encarei com curiosidade.— Como você soube?— Pela expressão do seu rosto, poderia dizer que alguém de sua família tinhamorrido ou que você e James tinham terminado. Como sua mãe me pareceunormal quando falei com ela ao telefone, imaginei que seria a outra coisa.Cobri meu rosto com as mãos e me atirei no sofá da sala de estar dos Parson.

— Me sinto péssima.— Sei exatamente como você se sente.Ele sentou-se perto de mim e me deu uns tapinhas nas costas.— Como você pode saber o que estou sentindo?— Rebecca me chutou quando estávamos patinando domingo — respondeu elecom voz natural.— Por quê?Essa novidade era chocante o bastante para me fazer esquecer minha própriador por um instante.— Quem sabe?Ele atirou-se no sofá, todo torto.

— Eu nunca fui com a cara dela. — Dei todo o meu apoio a Steve e não ia sentir nenhuma falta de ser boazinha com a rainha Rebecca.— E eu nunca gostei do James.— Falando em James, disse a ele uma coisa realmente idiota.Eu tinha decidido me confessar. Steve estava prestes a me ouvir contar que euanunciara que nós dois estávamos apaixonados.— O quê? — perguntou ele.— Promete que não vai ficar zangado.— O quê? Fala logo. Sua voz soava impaciente, e eu não queria irritá-lo maisainda antes de colocar para fora o que tinha a dizer.— Bem, quando James me disse que ele e Tanya estavam reatando, eu mesenti tão completamente humilhada...— Oue...? — Steve pressionou.— Que, para salvar as aparências, disse a ele que nós dois estávamosapaixonados um pelo outro.Fiquei olhando fixamente para um vaso, esperando por seu ataque de raiva.Para minha surpresa, ele soltou uma gargalhada.— E quem se importa? — disse.Pelo menos era uma preocupação a menos na minha cabeça.

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— Claro. O pessoal vive dizendo que somos apaixonados, você sabe disso. Emuma semana a gente diz para todo mundo que decidimos que o melhor é ser apenas bons amigos e tudo fica por isso mesmo.Pela primeira vez desde que James tinha terminado comigo, sorri.— Você está certo. O que a gente faz não é da conta de ninguém.

Steve concordou balançando a cabeça.— E mal posso esperar para ver a cara de Rebecca. Será um momento digno deuma foto.

14 - Steve

Quinta-feira, 30 de novembro23h30 Hoje vi Rebecca flertando com Patrick Mayor no saguão. E sabe de uma coisa?Não senti nada. Bom, quem sabe tenha sentido peninha de Patrick (rá,brincadeirinha!). Na verdade, eu me senti um pouco magoado. Será que

signifiquei alguma coisa para ela? E, mais uma vez, será que ela significou algo para mim? Talvez Kelly estivesse certa o tempo todo. É provável que eu nãosaiba mesmo o que é um amor verdadeiro. Mas quem sabe?

Na sexta-feira à noite Kelly e eu estávamos curtindo nossa fossa atacando umbanana split no Swenson's. Andrew estava com a gente, mas quase nãoconversava. Ele só ficava olhando para o sorvete como se o futuro estivesseescrito na calda de caramelo. Nós três formávamos um grupo bem melancólico.— Você sabe qual é o seu problema, Kelly Byrne? — perguntei.— Sei. E você ficar sempre me perguntando se eu sei qual é o meu problema —ela respondeu automaticamente.

Já tivéramos muitas e muitas conversas que começavam exatamente daquelaforma.— Errou de novo. Seu problema é que você se apaixona muito facilmente.— Ahh, não acredito que ouvi isso do cara que me desafiou a me apaixonar.Que hipócrita!— Mas agora estou mais velho e mais sábio — respondi. — Edecidi que o amor está absolutamente fora dos limites. Ela batucou a colher nataça de sorvete, pensativa.— Acho que tenho uma sugestão que vai fazer você reconsiderar a sua fuga doamor.— Duvido, mas experimente.— Você pode convidar Ellen para sair — respondeu ela, e se recostou nacadeira, com uma expressão satisfeita.— Ellen Frazier? — perguntei, surpreso.Sabia que Ellen arrastava uma asinha para o meu lado, mas nunca tinhapensado em sair com ela. Quero dizer, depois de mim, ela era a melhor amigade Kelly. A idéia de sair com ela me parecia muito esquisita.— Claro que Ellen Frazier. Ela é bonita, inteligente e dez vezes mais legal doque qualquer outra garota com quem você tenha saído.

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— Não, obrigado. Acho que vou ficar na minha. Naquele momento Andrewdesviou o olhar de sua taça de sorvete.— Concordo com Kelly. O que você tem a perder?Eu o encarei:— Ei! Você não é o cara que ainda está sem namorada desde o começo do

semestre?— Mas é diferente — respondeu ele.— Por quê?Fiquei na expectativa do que ele ia dizer e percebi que Kelly também estavacuriosa. Ultimamente Andrew tem feito muito segredo sobre o que se passa emsua cabeça.Ele lambeu a colher e limpou a boca com um guardanapo.— Porque eu vou pedir Rachel Hall, em breve. Muito breve.Revirei os olhos.— Ah, sei. Do mesmo jeito que você ia falar com ela uma dúzia de vezes nosúltimos dois meses.

Andrew corou um pouco.— Eu teria falado com ela, mas estava em um processo de eliminação. Agora,depois de estudar quarenta e duas garotas do colégio Jefferson, concluí queRachel é a única que merece. Sem ofensa, Kelly.Kelly fez que não se importava. Já estava acostumada aos comentáriosdetestáveis sobre as mulheres da parte dele.— Você é um mentiroso — declarei. — Não falou com ela ainda porque morrede medo de levar um fora.Andrew colocou dinheiro sobre a mesa.— Pense o que quiser, Steve. Mas aceite o conselho de Kelly e saia com Ellen.Ficar em casa no sábado à noite não é uma boa.

Ele se levantou.— Vejo vocês mais tarde, pessoal.Depois que Andrew saiu, Kelly colocou sua colher na mesa.— Não diga que não tentei. Se você morrer velho, grisalho e sozinho, não digaque Kelly não tentou ajudar.— Vou pensar nisso — concordei. — Mas por ora todas as minhas energiasestão concentradas em esquecer que Rebecca Foster existe. E é um trabalho detempo integral.— Então temos o mesmo patrão. Muito trabalho, pouco salário — Kellycomentou. — Termina isso.Ela empurrou para mim a taça de sorvete quase vazia. Dei umas colheradas eraspei a calda de caramelo no fundo da taça, saboreando o gostinho doce.— Que tal a gente dar uma olhada no que vai passar na "Sessão Coruja"? —perguntei antes mesmo de engolir a calda.— Legal — Kelly concordou.— É a semana Cary Grant no canal quatro.Ela se levantou e pegou o casaco e o chapéu do cabide. Enquanto a ajudavacom o casaco, captei nossa imagem no velho espelho pendurado na paredeperto dos cabides.

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Estávamos sorrindo, e percebi que nos parecíamos com qualquer outro casal nasorveteria. Se não conhecesse a situação, pensaria que éramos o casal maisvibrante do colégio, jovens e apaixonados.

Duas horas e meia mais tarde, Kelly desligou a televisão, no estúdio de sua

casa, suspirando. Acabáramos de assistir Philadelphia Story e ela tinha umaexpressão sonhadora nos olhos, que eu já tinha visto muitas vezes antes.Apesar de sua aparência meio durona, Kelly sempre foi do tipo manteigaderretida em relação a romances.— Você acha que algum cara pode me amar tanto quanto James Stewart amouKatherine Hepburn no filme? — perguntou. — Que pergunta boba — respondi.— Porque você acha que ninguém nunca vai me amar tanto assim, por isso? —perguntou com a voz triste. Kelly estava esticada no sofá, com as pernas emmeu colo. Quando olhei para seu rosto, observei que a expressão sonhadorafora substituída por um ar de tristeza.— Não, Kel. Porque tenho certeza de que tem um monte de caras que podem e

vão amar você tanto quanto Jimmy amou Kate.Ela sorriu.— Você acha? De verdade?— Kelly, você é a garota mais maravilhosa do colégio Jefferson. E dó mundo.Qualquer cara que não se apaixone por você só pode ser doido.Ela sentou e me abraçou. Retribuí o abraço, aliviado por ver que ela sorrianovamente.— Estou tão contente por você ser meu melhor amigo — falou com a vozabafada por minha camiseta.— Nem metade do que eu estou — respondi.Dei um aperto em seu ombro e a abracei mais forte ainda.

— Eu te amo — Kelly falou, com o rosto contra meu peito.— Também te amo. Sempre.Kelly e eu usávamos a palavra "amor" com freqüência. Nós sabíamos que erano sentido de "como amigos , e nunca nos incomodamos em dizer isso. Masnaquela noite as palavras pareceram mais verdadeiras do que nunca. Penseique fosse porque nós dois passáramos por maus bocados e descobrimos que,mais do que nunca, acreditávamos em nossa amizade.Kelly inclinou a cabeça e me deu um beijo amistoso na bochecha. Retribuí obeijo. Depois ela me beijou do outro lado do rosto E eu retribuí. Ficamos nessabeijação de face a face até contar uns vinte beijos.Num dado momento, quando ia beijar sua bochecha, meus lábios, assim meiosem-querer-querendo, tocaram os lábios dela.Em vez de recuar, dei-lhe um beijo na boca. Ela retribuiu. De repente, nós nosbeijamos de verdade e queríamos mais e mais.Kelly retribuía com seus lábios aconchegantes. Meus dedos passeavam por seus cabelos, e ela se agarrava a minha camiseta. Perdi até a noção do tempo,parado no ar e sentindo a eletricidade fluir por todo o meu corpo. Senti como sefôssemos as duas metades de um todo.Com um salto, Kelly se afastou. Ficou em pé para em seguida desabar em uma

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cadeira perto da lareira. Sem aviso, desatou a chorar. Ela cobria o rosto com asmãos, chorando em silêncio.Fui tomado por uma sensação de desamparo e me levantei. Tentei consolá-lacom palavras amenas e dando tapinhas nas suas costas.Instantes depois, ela tentou falar.

— Com James... beijar... nunca... eu não...Só podia entender uma em cada dez palavras, mas nem precisava ser um gêniopara sacar que ela estava muito aborrecida com James. Estava claro que, ao mebeijar, ela se lembrara de que o cara a quem realmente amava tinha lhe dado ofora.— Kelly, não esquenta. Tudo vai dar certo —falei, não muito certo sobre até queponto aquilo seria verdade.— Vai? — perguntou olhando para mim por entre as lágrimas.Concordei prontamente.— Olha. Nós dois estamos muito chateados com o fim de nossos namoros. Nãoé difícil entender que nos voltamos um para o outro. Prometo que nada entre

nós vai mudar.— Você está certo — concordou ela, limpando as lágrimas na manga da blusa.— Só estava chateada por causa de James, é isso.Kelly pareceu ganhar novamente a compostura. Eu estava contente, emboratenha notado que o tempo todo ela pensava no Cara-de-Panaca. Em meu caso,achava que os nossos beijos foram muito explosivos. De novo representei opapel de melhor amigo, de uma forma digna de um ator premiado com o Oscar da academia.— Somos amigos, como sempre fomos — declarei com firmeza. Kelly deu umsorriso largo e esticou o braço, oferecendo a mão para um cumprimento.— Amigos — repetiu.

Apertamos as mãos como em um acordo de negócios.— Essa é a palavra mais bonita da língua inglesa — disse eu, imitando voz deprofessor.Kelly pareceu deprimida.— Sim — respondeu. — Apenas fiquei triste com o caso de James.De repente senti vontade de cair fora para não ouvir Kelly se lamentando sobreJames. Queria ir para casa, onde poderia pensar melhor.— Bom, acho que nós dois perdemos a aposta — observei para amenizar oclima.— É isso aí.A voz de Kelly era uma combinação de distração com tristeza, mas a expressãodo seu rosto era neutra.Para falar a verdade, não sabia bem o que fazer diante da situação toda.

Voltando para casa, não conseguia tirar da cabeça as lamentações echoramingos de Kelly a respeito de James. Não entendia o que ela pudesse ter visto no cara, além da figura do macho.Contudo, depois de me trocar e deitar na cama, uma idéia se formou em minha

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mente: eu estava irritado porque Kelly ficava sempre elogiando James Cara-de-Panaca. Francamente, era o fim do mundo.Olhando fixamente para o teto, pensava em todas as garotas que já tinhabeijado. Todas as garotas do colégio que valessem a pena tinham saído comigoe Rebecca fora a única que tinha tomado a iniciativa de romper o namoro. Mas

mesmo com Rebecca sabia que ela tinha rompido por uma questão de orgulho.Ficara magoada por eu ter defendido Kelly e então se mandara. Embora nãotivesse contado nada a Kelly, sabia que Rebecca me aceitaria de volta se eupedisse. A semana inteira ela ficara de olho em mim, jogando charme, na salado sr. Maughn.Mas não queria reatar com Rebecca. Apenas queria que Kelly percebesse quemuitas garotas desejariam estar em seu lugar naquela noite. E nenhuma delasdespencaria a chorar depois que eu as beijasse. Muito pelo contrário.Sentei e ajeitei meu travesseiro. Precisava parar de filosofar e cair na real. Ofato de ter beijado Kelly e de que agora estava obcecado pela obsessão dela por James era uma indicação de que tinha tempo sobrando. Assim que convidasse

outra garota qualquer para sair (claro que não para me apaixonar), tudo emminha vida voltaria ao normal.Num relance, lembrei que Kelly tinha sugerido que eu saísse com Ellen. Até omomento nunca havia tido nenhuma intenção de sair com Ellen Frazier. Mas seKelly estava tão segura de que era uma boa idéia, então talvez valesse atentativa. Pelo menos, estaria provando a ela que, enquanto ela ficava selamentando por ter rompido com aquele panaca que chamava de namorado, aminha vida seguia em frente. E certamente ela não precisaria se preocupar deque eu fosse beijá-la de novo. Eu tinha aprendido bem a lição.Fechei os olhos, sentindo que já estava sonolento. A primeira coisa que fariapela manhã seria telefonar a Ellen Frazier. Ia sair com a melhor amiga de Kelly e

me divertir — mesmo que isso me matasse de tédio.15 - Kelly

Passei a maior parte da manhã de domingo zanzando pela casa. Meus paistinham ido a uma exposição de arte e a casa estava quieta demais. Mais tardedeveria tomar conta de Nina, mas até lá não tinha nada para fazer. Percebientão como é triste para uma adolescente quando tudo o que ela tem pela frenteé passar a tarde com uma garotinha de dez anos.Por volta do meio-dia sentei ao computador para fazer uma redação que tinhade lição de casa. Mas meus dedos apenas passeavam pelo teclado, eu nãoencontrava nada a dizer. Pensamentos sobre a noite anterior rolavam pelaminha mente, mas não conseguia organizá-los. Eu me sentia como se estivessesuspensa no ar, aguardando que alguma coisa acontecesse — só não fazia amenor idéia do que pudesse ser.Quando a campainha tocou, voei escada abaixo. Naquela hora ficaria feliz emsentar e bater papo até mesmo com um vendedor ambulante qualquer. Qualquer coisa que me mantivesse ocupada.Imediatamente meu humor melhorou quando vi o carro da Ellen estacionado na

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frente de casa. Decidi contar a ela o que tinha acontecido entre Steve e eu nanoite anterior.— Tenho uma novidade para contar que vai deixar você de boca aberta — disseela assim que abri a porta.— Fomos invadidos por extraterrestres? - sugeri enquanto pegava o casaco

azul-marinho de sua mão.— Os ETs não são nada em comparação com o que me aconteceu esta manhã— ela disse com os olhos brilhando.Fomos até a cozinha, onde peguei dois refrigerantes para nos.— Não faça tanto suspense! Diga logo!Ela abriu a latinha de refrigerante.— Estava lendo o jornal esta manhã, cuidando das minhas coisas.Quero dizer,não esperava que nada acontecesse durante todo o dia. Nada de nada.—Quer fazer o favor de ir logo ao que interessa! — interrompi. — Não agüentotanto suspense.— Steve me ligou e convidou para sair com ele esta noite.

Tossi, engasgando com o refrigerante.— Está brincando?Ela balançou a cabeça.— Não estou. Vamos sair para um jantar.— Uau. — Senti como se tivesse acabado de levar um soco.Ellen me olhou nos olhos.— Você não se importa, certo? Quero dizer, achei que tinha sido você que tinhadado um toque para ele.Esforcei-me para sorrir — Claro que não me importo. Só fiquei surpresa por ele não ter me dito nada, sóisso.

— Você parece que ficou meio verde — ela dalou, observando do meu rosto.— Ei, sempre achei que vocês formariam um par maravilhoso. Fiquei muitoalegre em saber. Até perdi a fala.Ellen sorriu de novo.— Tudo bem. Vou acreditar em você. Então, tem alguma coisa que você possame emprestar para vestir?— Vamos encontrar a coisa certa. Quando Steve vir você, Rebecca Foster vaiser apenas uma lembrança distante.Apesar de minhas palavras, eu me sentia vazia. Verdade que tinha sido minha aidéia de dizer a Steve para sair com Ellen. Porém acreditava que ele nunca fariaisso.Uma coisa era certa. Não poderia contar a Ellen que tinha beijado Steve. Podiaaté imaginar os dois rindo sobre isso no jantar. "Coitada da Kelly", pensariaSteve, "ela nunca vai arranjar um namorado".Estremeci. Não podia deixar, nem por um instante, que Steve e Ellenpercebessem como eu ficaria chateada por eles estarem saindo juntos.— Vamos lá para cima — convidei, ficando em pé. — Não temos nem umminuto a perder.— Obrigada, Kelly. Sabia que poderia contar com você para um apoio moral.

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Ela me abraçou e quando olhei para seu rosto vi que estava radiante.Em meu quarto, comecei a procurar pelo armário. Peguei um vestido rodadoverde e passei para Ellen.— Experimente este — sugeri.— Quando me olhar, lembre-se de que esta noite vou estar usando o sutiã

milagroso — disse Ellen alegremente. — Imagine dois dedos a mais aqui emcima.Atirei-me na cama e fiquei a observá-la enquanto se despia.— Esse tal sutiã é o seu seguro — comentei.Ela deu uma risada.— Como ficou?— Muito legal. — Ela já tinha colocado o vestido, que definitivamente pareciabem melhor nela do que em mim. — Na verdade, melhor você ficar com ele deuma vez. O corte cai muito melhor em você.Ellen se revirava na frente do espelho.— Você acha que Steve vai gostar dele?

— Claro que vai.Ellen foi até meu espelho de corpo inteiro e examinou seu rosto:— Acho que tem uma espinha aparecendo no meu queixo.— Não, não tem nada — disse eu, procurando parecer feliz e encorajadora.Ellen sentou-se na minha cadeira.— Estou ficando nervosa — confessou.— Não tem motivo. Você é um milhão de vezes mais legal que qualquer garotacom quem Steve já tenha saído.De repente Ellen endireitou-se na cadeira.— Ei, você conhece Steve melhor do que ninguém. Me dê umas dicas do quedevo fazer para que ele goste de mim.

Fechei os olhos por um momento, pensando. Como resumir tudo o que sabia deSteve em poucas frases? Mentalmente repassei todos os pequenos detalhesque poderia dizer a ela sobre meu melhor amigo. Respirei fundo.— Ele odeia picles no hambúrguer. Não diga a ele que você se acha gorda. Elenão importa que você cante dentro do carro, mesmo que sua voz pareça umavaca mugindo. Ele gosta de representações. Se você não conseguir adivinhar qual personagem ele esta tentando imitar, diga que é o Elvis Presley. Quandoum pequeno músculo perto dos olhos dele começa a pular ele está tentando nãodemonstrar que está zangado...Agora que tinha começado não podia parar. Senti como se tivessem aberto ascomportas de uma barragem. Ellen estava sentada em silêncio, me observando.Ela parecia estar prestando atenção, e então continuei.— Sua cor favorita é o verde. Ele é fã de música de discoteca. À noite ouverádio. Odeia garotas superficiais, embora você nunca viesse a saber disso a

 julgar por sua última namorada. Ele prefere morrer a trabalhar em um escritório.Ele é engraçado quando...— Kelly! Você está passando bem? — Ellen perguntou de repente.Ela fazia um gesto com a mão para que eu interrompesse a enxurrada de frasesque desembestara a falar. Eu tinha quase me esquecido de que minha amiga

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estava ali.— O quê? Oh, desculpe. Acho que falei mais sobre Steve do que você queriasaber.Ellen estava ocupada tirando as cutículas. Vi que mordeu o lábio e depois deuuma olhada para mim.

— Você está apaixonada por Steve, não está?Falara delicadamente mas cada palavra martelou em minha cabeça.— O quê? — gaguejei.Para ocupar as mãos, peguei um travesseiro e o abracei. Ellen ergueu asobrancelha:— Você me ouviu. Acho que você está apaixonada por Steve Parson.— Esta é a coisa mais idiota que já ouvi — retruquei, desviando meu olhar. —Não seja ridícula.— Kelly, o modo como você falava sobre ele, é como se...— Eu não estou apaixonada por Steve. E fim de papo. Sabia que minha vozsoava alterada, mas não consegui me controlar.

— Se você tem certeza...— Claro que tenho certeza. Agora pegue o vestido e vá se arrumar. Preciso sair.

Algum tempo depois fechei a porta da frente com cuidado, atrás de Ellen. Fiqueina entrada, sem me mexer, prestando atenção no silêncio da casa vazia. "Eunão estou apaixonada por Steve", disse a mim mesma. Quando as palavrasecoaram em minha cabeça quase acreditei que era verdade.

Sábado à noite Nina estava muito agitada e quase precisei arrastá-la pelaescada acima na hora de dormir. Ela tinha estado na casa de Marcy Stein, numafesta de meninos e meninas, na noite anterior, e queria me contar cada um dos

detalhes de tudo o que tinha acontecido no grande evento.— Então Peter Ross colocou um cubo de gelo nas minhas costas — disse ela,enquanto relutava em vestir um pijama de flores amarelas.— E o que você fez? — Peguei a escova e fiz sinal para que ela se sentasse nabeirada da cama.— Primeiro eu gritei. Depois dei o troco. Todo mundo riu tanto que pensei que agente ia fazer xixi na calça.Ela ria só de lembrar.— Vê se fica quieta. Tem um nó no seu cabelo. — Enquanto a penteava,esperava pela continuação da história.— Ainda não contei a melhor parte — ela falou.— E tem mais?Apesar do mau humor, não pude deixar de rir. O entusiasmo de Nina pela vidaera contagioso.Ela fez que sim com a cabeça.— Só vou contar para você se prometer não dizer nada a mamãe e papai —falou com expressão séria.— Juro que não conto.Ela se virou para mim, e não pude deixar de perceber que estava quase

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estourando de vontade de contar seu segredo.— Nós brincamos de girar a garrafa.— Não!!Tentei parecer escandalizada o melhor que pude. Tinha certeza de que Ninaesperava por uma reação dramática.

— Sim! Os meninos eram uns tipos tão nojentos que pensei que eu ia vomitar.— Quem você teve de beijar? — perguntei.Ajudei-a a levantar-se da cama para poder arrumar as cobertas.— Peter Ross! Eca!Nina fez cara feia e colocou a língua para fora. Dei uma risada:— Estou certa de que você sobreviverá. E pode ser que até venha a querer beijá-lo algum dia.Ela sacudiu a cabeça, protestando com uma careta.— Nem em um milhão de anos!— Se você é quem diz — comentei ligeiramente, dando-lhe um beijo de boa-noite.

Estiquei o braço e apaguei a luz de cabeceira. Quando estava saindo do quarto,porém, Nina sentou-se na cama e acendeu a luz.— Ei, Kelly.— O que foi? — perguntei colocando as mãos na cintura.— Você acha que vou me casar com Peter Ross, agora que nos beijamos?— Sim, e vocês vão viver felizes para sempre.Apaguei a luz esperando que ela não reparasse no tom amargo de minha voz.Saí do quarto certa de que em poucos minutos ela estaria dormindo e sonhandocom Peter "Eca" Ross. Estava contente por não ter tido coragem de lhe dizer que, depois da quinta série, os romances começavam a ir por água abaixo. Elairia descobrir isso logo.

Uma vez tendo descido as escadas, não havia muita coisa com que me distrair.Finalmente peguei um saco de salgadinhos e liguei a televisão na MTV.Enquanto comia os salgadinhos, desejava que Steve e Ellen estivessem sedivertindo. Eu esperava de verdade, de verdade mesmo, que eles estivessemtendo os melhores momentos de suas vidas.Depois de uma hora de vídeos e músicas, estava chateada, irritada e morrendode curiosidade. Não podia esperar mais para saber como tinha sido o encontrode Ellen. Olhei para o relógio e pensei que Ellen já deveria ter voltado para casa.Quanto tempo teria durado o jantar?O telefone de Ellen tocou três vezes antes que a mãe dela atendesse. Sabia quea sra. Frazier dormia cedo, e a voz dela me pareceu meio grogue e ligeiramenteaborrecida. Se Ellen estivesse em casa, ela seguramente não se daria aoincomodo de atender. Coloquei o aparelho no gancho.Ellen não tinha voltado para casa, o que significava que ela e Steve estavamainda juntos. O encontro havia sido um sucesso então. Em seguida haverianovos encontros. E mais. Logo eles estariam de mãos dadas em lugarespúblicos. E eu, no máximo, estaria segurando vela. Sozinha e indesejada.Nunca tinha conseguido saber de Steve qual era a dele em relação a Ellen.Nossa amizade não englobava esse tipo de pressão. Mas não seria eu quem

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ficaria no caminho da felicidade dele, ou de Ellen.— Vou deixar o caminho livre — falei para a TV. — Será a melhor solução paratodos nós.

16 – STEVE

- Esse vestido é de Kelly? - perguntei a Ellen repentinamente.Ela baixou o olhar, sorrindo.- Sim, ela me deu.- Por quê?Sabia que não estava sendo muito educado, mas não entendia porque Kelly lhedaria seuvestido verde. Era um de meus favoritos, e não pude dixar de reparar que ocaimento parecia muito melhor em Kel.- Acho que ela se cansou de usá-lo. - respondeu Ellen, dando de ombros.- Assim ela vai me frustrar muito. - comentei como se Ellen não estivesse ali.

Estavamos no Anthony's, casa de massas, e minha cabeça parecia que iaexplodir. Conseguira passar por todas as entradas e petiscos sem mencionar onome de Kelly, fazendo o maior esforço para ser atencioso e enxergar Ellencomo alguém com quem poderia ter encontros.Quando o garçon trouxera o café, um romance com Ellen já estavadefinitivamente fora de cogitação na mimha cabeça. Do jeito que a via, ela era amelhor amiga de Kelly. Acho que ela é uma grande agrota, mas toda vez que aolhava via Kelly. Agora estava me deixando discorrer à vontade sobre o assuntoque tinha ocupado minha mente o dia todo: Kelly Byrne.- Presumo que estamos falando de Kelly. - comentou ela, erguendo assobrancelhas.

- Sim.- Acho que você a frustrou também. - observou Ellen com voz séria. Depoistomou um gole do café, esperando que eu dissesse alguma coisa.- Eu a amo demais. - Coloquei mais creme na xícara e comecei a mexer,pensativo.- Ela ama você também. - disse Ellen com um suspiro.- Verdade?- Sim, verdade. E pensar que cheguei a acreditar que tinha sido convidada paraum encontro hoje à noite. Parece que você realmente precisa é de um analista.Balançou a cabeça e riu para si mesma. Naquele instante percebi a mancadaque tinha dado.- Ellen, me desculpe. Não tinha intenção de ficar o tempo todo falando de Kelly.Vamos conversar sobre outra coisa. Como...ah, para qual faculdade você vai?Ela sorriu delicadamente de novo.- Steve, não venha me dizer que está interessado em saber para qual faculdadeirei. Para ser honesta, você nã é tão bom ator assim.- Puxa, sou tão transparente assim? - perguntei envergonhado.- Desde que foi me buscar, percebi que sua mente tem estado muito longe.Ela recostou-se, dobrando e desdobrando um guardanapo de papel.

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- Pensei que se a gente saísse, esqueceria como...Não estava bem certo do que tentava dizer.- Esqueceria que você está apaixonado por Kelly. - completou Ellenmaliciosamente.- Não! - Protestei mais que depressa. - Quero dizer, esqueceria que acabei o

namoro com Rebecca e tudo o mais.- Por favor, me poupe. Você e Kelly estão apaixonados, e todo o mundo noJefferson sabe disso há anos. Se pelo menos vocês encarassem a realidade eficassem juntos, o resto de nós tocariamos nossas vidas.Meu coração estava disparado e quase perdi o fôlego.- Você acha mesmo que Kelly me ama?Ela colocou a xícara de café sobre a mesa com força.- Steve, eu sei que ela está apaixonada por você. Precisava vê-la outro dia. Eladizia que não se importava de que você me convidasse para sair, mas estavaquase chorando!- Você está me dizendo a verdade?

Minha boca estava seca e estiquei o braço para pegar um copo de água gelada.Ellen esfregou a testa.- Pense nisso, Steve. Você sabe, eu tenho sentido uma queda por você nosúltimos dois anos. Agora, finalmente, estamos tendo o que parecia ser umencontro. Acredita realmente que eu passaria a noite dizendo que Kelly e vocêdeveriam estar juntos, se não tivesse cem por cento de certeza?Ela terminou de falar e fez sinal para o garçon trazer a conta.- Entendo seu ponto de vista. - disse eu, quase sussurando.- Bom. Agora vamos embora. Tenho certeza de que você quer ir para casa epensar em Kelly.- Ellen, me promete que não vai dizer nada para Kelly sobre o que nós

conversamos esta noite.Prendi a respiração, esperando que ela concordasse em manter o bico fechado.- Prometo. – respondeu ela.Respirei aliviado.- Como posso agradecer por você ser tão legal? – perguntei. - O céu é o limite.Ela apontou para a nota em cima da mesa.- Diga você. Vou deixar que pague o meu jantar.- Feito. – disse.Claro que teria pago o jantar dela de qualquer modo.- E poderia me fazer um outro favor? – ela perguntou colocando o casaco.- Qualquer coisa.- Nunca mais me convide para outro encontro. - ela sorriu e pude ver por seusolhos que estava contente.Peguei em sua mão e beijei-lhe a testa.- Sabe, Ellen Frazier, você é muito legal.Estava assoviando quando saímos dop restaurante. Na verdade, cantei por todoo caminho de volta.

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Assim que cheguei em casa subi para meu quarto. Em minha cabeça já estavaligando para Kelly. Tinhamos muito o que conversar.Mas quando sentei na cama, com o telefone a meu lado, de repente me sentimeio desmotivado. Conversando com Ellen, tudo parecera simples. Agora queestava sozinho, meus entimentos eram muito mais complicados. Kelly e eu

temos sido amigos há anos. Nossa relação tinha se acertado de uma forma queeu não queria mudar.Coloquei o telefone de volta na cabeceira e caminhei até o qudro de avisospendurado na parede. Toda a superfície estava coberta com fotos dos doisprimeiros anos no Jefferson. Kelly aparecia em quase metade das fotos. Umadas grandes chamou minha atenção.Minha mãe tinha tirado a foto durante a primavera de nosso ano de calouro.Kelly e eu estavamos trabalhando, junto com um monte de colegas, em um lava-rápido. Recordei-me de que levantamos fundos para ajudar um hospital decrianças...Lá pelas três horas da tarde o movimento caiu um pouco. Estavamos mortos de

cansados e todos meio no bagaço. De repente, peguei a mangueira de água eespirrei em Kelly. Ela reagiu virando um balde de água com sabão sobre aminha cabeça. Depois disso todo mundo entrou na brincadeira. Após váriosminutos de água e sabão voando por todos os lados, caímos na risada geral.Quando larguei a mangueira de lado, vi que minha mãe tinha trazido nosso carropara lavar. Ela segurava uma câmera e estava a uma distância fora do alcanceda água. No momento anterior, Kelly tinha chegado perto para mecumprimentar. Ainda me lembro de que nossas mãos estavam cheias de sabãoe escorregadias. Minha mãe tirou a foto exatamente nesse instante.Mesmo em pé no meu quarto, sozinho, a imagem me fez rir alto. rindo e mecumprimentando, Kelly era a imagem perfeita dela mesma. Foi num relance que

sua essência saltou da foto e se aninhou em meu coração.Olhei para outras fotos pregadas no quadro. Em algumas apareciamos Andrew eeu, jogando basquete ou outra coisa. Mas minhas favoritas eram todas comKelly e eu – e minha mãe, andando a cavalo, fazendo bonecos na neve.O que aconteceria se dissesse a Kelly sobre os meus reais sentimentos e elanão sentisse a mesma coisa? Eu ficaria humilhado, para não dizer que perderiauma amiga. Nossas gozações e confidências estariam acabadas para sempre.Mas e se Kelly e eu começassemos a sair juntos e o relacionamento terminassecomo todos os outros? Não havia garantias de que nosso anor perdurasse. Elapoderia conhecer alguém de quem gostasse mais, resolver que meus beijos nãoeram tão bons assim, ou descobrir que minhas piadinhas não eram maisengraçadas. Ficaria de coração partido e eu perderia tudo o que mais importavano mundo para mim.Suspirei profundamente e deitei-me na cama. O telefone mudo parecia estar rindo de mim, e senti como se o atirasse na parede. Em vez disso, peguei o fonee digitei os seis primeiros números da casa de Byrne.Quando estava prestes a digitar o último, contudo parei. Por vários segundosfiquei imóvel, olhando para o teto. Não podia fazer isso, percebi. Não podiaarriscar minha amizade. O preço era muito alto.

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Sem me importar em tirar a roupa, apaguei a luz e me enfiei na cama. "Kellynunca vai saber como me sinto", prometi a mim mesmo. "Nunca".

17 – KELLY

Levantei no domingo de manhã com uma dor de cabeça de rachar. Podia ouvir que, lá embaixo meus pais conversavam sobre comprar ou não um novoaquecedor. Resmunguei e enfiei a cabeça sob o travesseiro, uma vez que asúltimas vinte e quatro horas tinham sido teríveis.Steve e Ellen. Ellen e Steve. Kelly e ninguém. Deveria ser umas cinco e meia damanhã, sim, fiquei acordada quase a noite toda olhando as trincas no teto,quando percebi como estava me sentindo mal. Agora disse as palavras em vozalta, para ver se ainda eram verdade:- Estou apaixonada por Steve. – murmurei - Mas ele não me ama.Falar isso era muito mais difícil do que simplesmente pensar. Enxuguei algumaslágrimas do rosto. Ainda nem eram dez horas e eu já estava chorando. Uau, que

vida, pensei ironicamente. Rolei na cama, forçando a mim mesma a repetir averdade inúmeras vezes.Quando já não aguentava mais meus próprios pensamentos consegui mearrastar para fora da cama. Ainda era cedo, mas não dava para deixar de lado oinevitável. Tinha de me afastar de Steve e teria de ser hoje.Coloquei um jeans bem velho e uma blusa desbotada do Jefferson. Paracompletar enterrei um boné na cabeça e calcei um par de tênis já bem malhado.Enquanto brigava para pentear o cabelo, decidi que iria cortá-lo, mesmo queSteve não fizesse questão de cobrar a aposta quando eu perdesse. Para queme importar com a aparência? A partir de então, iria passar todos os fins desemana com meus pais mesmo.

Do armário da entrada peguei uma caixa de papelão e coloquei no meio dacama, ainda desfeita. Vagarosamente, caminhei pelo meu quarto, passando asmãos em cada uma das coisas que lembravam momentos dos anos do colégio.A maioria me lembrava Steve, de uma forma ou de outra, e senti mais lágrimas arolar pelo meu rosto. precisava me livrar dessas coisas. Até mesmo a menor daslembranças que me recordasse nossa amizade seria torturante de ter por perto.Cuidadosamente coloquei no lugar o ursinho que Steve ganhara para mimnaquela festa do colégio, no segundo ano, e que batizei de Risadinha, porqueSteve sempre me fazia rir. depois do ursinho, guardei um par de brincospingentes de prata, que Steve tinha me dado em meu aniversário de dezesseisanos.Fui até a parede perto de minha mesa e peguei a foto de Steve e minha no lava-rápido. Observei nossos sorrisos, com as caras cobertas por espuma de sabão,e mais uma vez meu coração doeu. Depois de colocar a foto na caixa, fui olhar nas gavetas de roupas da cômoda. Nos últimos anos, tinha acumulado ummontão de camisetas dele, que nunca me dera ao trabalho de devolver.- Ele vai gostar de receber de volta essas camisetas. - murmurei, passando umadelas em meu rosto.Após o que pareceram alguns minutos, a caixa estava cheia. Dei uma olhada

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pelo quarto, que agora tinha ficado vazio e impessoal. A maior parte de minhavida estava dentro daquela caixa de papelão. Não sobrara nada.Peguei a caixa e empurrei para a porta do quarto.- Adeus Risadinha. – me despedi - Foi bom conhecer você.

A Senhora Parson nem tentou me impedir quando passei por ela a caminho dasescadas. Eu estava em plena missão, e nada ou ninguém se interporia em meucaminho. As escadas pareciam mais compridas do que nunca, e o peso da caixadeixava doloridos meus braços e minhas costas.Coloquei a caixa na porta do quarto de Steve. o barulho ecoou pela casaanunciando que eu estava por ali. Bati com força à porta, pouco ligando se ospais dele pensassem que eu estava doida.- Quem é? – gritou Steve lá de dentro.Sua voz era tão familiar, tão própria dele, que quase virei as costas e fui mereconciliar com meus sentimentos. Porém balancei a cabeça com toda firmeza eme afastei da tentação. Sabia que não seria fácil enfrentar Steve.

- Sou eu. - respondi, esperando que a voz não denunciasse meu estado.Abri a porta e empurrei a caixa para dentro do quarto com o pé. Então entrei ecruzei os braços.- O que foi? - Steve perguntou, parecendo sonolento. Seu cabelo estava tododesarrumado e tinha as cobertas enroladas pelo corpo. Mesmo assim pareciamaravilhoso. Poderia perfeitamente ser o garoto de um comercial de colchões.- Trouxe de volta as suas coisas. - falei direto. Não sabia como começaria aexplicar que nós dois não poderiamos ser amigos nunca mais. - Saquei quetinha um monte de camisetas suas nas minhas gavetas.Ele deu uma olhada no relógio.- Você sentiu vontade de me devolver as minhas camisetas às dez horas da

manhã de domingo?- Tinha de fazer. - respondi, como se isso explicasse tudo. - Tenho certeza deque você deve estar muito cansado depois de seu grande enconto com Ellen,então vou deixá-lo voltar a dormir.Virei as costas, pronta para ir embora.- Espere! - Steve gritou, agora bem acordado. - Será que daria pra você medizer o que está acontecendo? Você não está agindo normalmente.Fiquei olhando para o chão, tentando achar alguma coisa para dizer. Pareciaque meu plano tinha alguns furos.- Não podemos ser mais amigos nunca mais. - disse finalmente.Uma vez que já tinha falado, não pude segurar as lágrimas que brotaram emmeus olhos. Steve estava sério, e sua aparência era tão adorável e confiávelque não desejava nada mais do que me atirar em seus braços e pedir que seapaixonasse por mim. Mas meu olhar ousou em seus lábios e o imagineibeijando Ellen. Eles provavelmente tinham arrastado a sobremesa por um tempoenorme, trocando amassos em pleno restaurante. Essa ima gem me fez doer ocoração.- Por que não? - perguntou Steve com a voz alta e forte.

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- As coisas entre nós já não são mais as mesmas. - Explodi soluçando. - Não seicomo explicar isso.Ele estava silencioso, me encarando com aboca ligeiramente aberta. Desejeique o chão se abrisse para me engolir, mas nada disso aconteceu, nem mesmoum pequeno relâmpago cruzou o espaço.

- Você e Ellen vão formar um belo casal. – disse. - Desejo a vocês toda afelicidade do mundo.- Ellen e eu? Nós não...- Não diga mais nenhuma palavra! – Gritei. - Por favor não quero ouvir nadasobre isso.- mas Kelly, você pirou! Ou pior que isso. - ele tinha se levantado e caminhavaem minha direção.- Desculpe, Steve. Eu falhei como amiga e estou sabendo disso. Mas, por favor,não precisa dizer nada. Só me deixe sozinha...para sempre.Saí do quarto e batia aporta atrás de mim. Desci a escada com o coraçãopartido e as lágrimas embaçando minha visão.

No final das escada rumei direto para a porta, ignorando a cara de assustada dasra.Parson. Ouvia a voz de Steve gritando meu nome, mas consegui bloquear osom de sua voz.Saindo da casa, corri para o de minha mãe, que eu tinha estacionado na entradada garagem. Olhando para trás, vi Steve parado na porta da frente. Ele sacudiao braço e pulava.Bravamente, segui em frente.Acelerei pela rua quieta, deixando meu coração para trás...

Apesar do dia muito frio, abri a janela do carro para deixar entrar o ar. Eu me

sentia sufocada, e o vento frio era um alívio. Dirigia inconsolável, esperando merecuperar à medida que me afastasse de Steve.Liguei o rádio. Uma voz grave, baixa e melodiosa, se espalhou pelo carro, e meafundei no assento, agradecida por ouvir uma outra pessoa. Eu tentava mas nãoconseguia arrancar da mente a voz de Steve me chamando.- E agora essa bela canção antiga, "Vamos nos apaixonar", vai de Andrew paraManuela. Ele manda dizer que se divertiu muito ontem à noite e está muito felizpor finalmente conseguir pedi-la em namoro. – dizia o locutor.Desliguei o rádio, sorrindo amargamente. A ironia era muito grande e preciseiestacionar o carro para poder me recompor. Quais seriam as chances de euligar o rádio e ouvir uma dedicatória de Andrew para Mannu? Parecia que todomundo no Jefferson tinha sorte no amor. Todo mundo menos eu.Apoiei a cabeça no volante, retomando o fôlego. Estava decidida a não ir a meubaile de formatura. Não compareceria à noite de colação de grau. Ellen e eu nãodeveriamos nos encontrar no Baile de Inverno. Steve e eu não trocariamospresentes no Natal, nem iriamos esquiar. A partir de agora, ficaria apenasandando pelos corredores do Jefferson como um fantasma de mim mesma.Comecei a fantasiar sobre a possibilidade de fazer os exames antecipadamentee deixar o colégio mais cedo. Poderia me mudar de cidade, arranjar um emprego

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e começar uma vida nova. Já me via morando em Nova York, dançando emalgum musical da Broadway. Então imaginei uma vida nova no Meio-Oeste.Poderia me mudar para Nebrasca e me tornar fazendeira, por exemplo. Ouquem sabe chegaria dirigindo até Califórnia e me tornasse uma Hippie. Talvezaté assumisse uma nova identidade, passandoa me chamar Arco-Íris ou Lua.

Finalmente me sentei e enxuguei as lágrimas dos olhos. Por enquanto ainda eraa velha Kelly. E me sentia péssima. Meus pais não me deixariam mudar paraoutro país, se quer outro estado ou fazer nada do que imaginara. Eles me fariamficar e sofrer minha pobre existência, encarando um dia após o outro.Liguei o carro e comecei a andar. Depois de dirigir não sei por quanto tempo, fuiparar na frente do Cine Tivoli. O Tivoli sempre passava filmes antigos e osclássicos do cinema aos sábados e domingos. Quando vi que CASABLANCAestava na sessão que começava à uma hora, entrei com o carro noestacionamento vazio.CASABLANCA era o filme a que Steve e eu tinhamos assistido enquantoconversavamos pelo telefone em setembro último. Naquela época, nossos

sentimentos ainda eram puros e descomplicados. Se pudesse fazer voltar otempo, desfazer tudo o que acontecera desde aquela noite inocente.Quando comprei o ingresso, a bilheteira me olhou de um modo estranho.- A sessão demora quarenta e cinco minutos para começar. – Disse ela. - Vocêpode voltar mais tarde.Concordei, embora sabendo que não teria nenhum lugar para ir. Um cinemavazio era um bom local para ficar sozinha.- Vou esperar.- Respondi, com voz de choro.- Está bem, querida. – concordou ela, gentilmente. - Pode entrar.Deserto, o cinema parecia sinistr e surrealista. Assim mesmo ocupei umassento. Arrasada, fechei os olhos, ignorando a visão das filas de assentos

vazios. Se ia esperar quarenta e cinco minutos ou até o fim dos meus dias, nãoimportava mais. A vida tinha perdido o sentido.

18 – STEVE

Fiquei em pé na porta, olhando até que o carro de Kelly desaparecesse ao virar a esquina. Minha mãe, em pé ao meu lado, parecia mais chocada do que eu.- Mas o que foi isso? – ela perguntou.- É uma história muito comprida. - Respondi, suspirando.Sem dizer mais nada, subi as escadas e coloquei a caixa de papelão que Kellyhavia trazido em cima da cama. Com o coração partido, comecei a contemplar cada coisa que se encontrava ali dentro. Quando encontrei o Risadinha nofundo, eu o abracei e me enfiei sob as cobertas.Não sabia o que tinha se passado pela cabeça de Kelly. Será que Ellen contarasobre nossa conversa de ontem à noite? Sacudi a cabeça. Tinha acreditado napalavra de Ellen, quando me prometera que guardaria segredo.Rememorei tudo o que tinha se passado desde o feriado em que fizemos aaposta. Embora nós tivessemos briagdo mais do que de costume (muito mais),nuna pensei que Kelly fosse se desfazer de nossa amizade. Para mim a idéia de

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não sermos amigos era tão esquisita quanto a de não respirar. Nós deviamosera ficar juntos e, no entanto, agora ela estava nos separando. Por quê?De todo meu coração, preferia acreditar que ela estivesse com ciúmes de Ellen.Mas se fora a própria Kelly quem dera a idéia de convidar sua amiga parasair...Ela queria que eu me esquecesse de Rebecca e continuasse tocando a

vida. E era Kelly quem estava toda entusiasmada com James, agindo como se omundo tivesse vindo abaixo quando ele rompera com ela e voltara para Tanya.E mais, quando eu a havia beijado na sexta-feira, fora ela quem pusera os pésna terra primeiro. Quando me lembro dela se lamentando por James, meuestômago dá voltas.Por toda a manhã fiquei remexendo em tudo o que Kelly tinha colocado na caixapara me devolver. A cada vez que olhava para a cara marrom do ursinho sentiauma pontada no coração. Kelly tinha pedido que eu a deixasse em paz, e nãohavia mais nada que eu pudesse fazer.Finalmente fiquei zangado. Quem ela pensava que era? Desde quando tomavadecisões sobre nossa amizade, sobre nossa vida? Peguei o telefone. Iria forçá-

la a conversar comigo mesmo que tivesse de ir a sua casa e acampar em seuquarto.Desliguei quando a secretária eletrônica atendeu. Não sei por quê, mas a idéiade deixar uma mensagem desesperada, com a possibilidade de que elaestivesse no quarto ouvindo, era muito para minha cabeça. Não poderia forçar Kelly a falar comigo. Ela simplesmente ficaria brava e me chamaria de animal.Tudo o que eu poderia fazer era... exatamente nada.Estava em estado de choque quando o telefone tocou. Atendi ao primeiro toque,esperando que Kelly tivesse reconsiderado e voltado ao normal.- Alô, Parson? – ouvi a voz de Andrew.- Ei, Andrew.

Meu coração desabou e comecei a procurar uma desculpa para desligar o maisrápido possível.- Finalmente tomei coragem e fiz aquilo. - Ele comentou com entusiasmo.- O que você quer dizer com isso? - Perguntei, massageando o pescoço comuma das mãos.- Rachel. Ontem à noite convidei Rachel para sair. Foi demais, cara. Acordeipela manhã e disse a mim mesmo: "Christie, hoje você vai tomar coragem econvidar para sair a garota que está fazendo pirar a sua cabeça". Então telefoneipara ela, ela disse sim, e o resto é uma história romântica.- Imagino que vocês se divertiram um bocado. - Respondi, procurando disfarçar a ironia na voz.- Cara, foi como se tivessemos sido feitos um para o outro. E sabe da melhor parte? – ele perguntou.- O quê?Apertei o Risadinha tão forte quanto pude, desejando me sentir contente por ver a felicidade de Christie e Rachel.- Ela me confessou que está apaixonada por mim desde o começo do semestre.Não é demais?- É maravilhoso. – respondi.

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Não podia acreditar que Andrew Rice estava apaixonado. Ele sempre fora o caraque mais pegava no pé pelas minhas idéias de procurar a garota certa. Agoraera quem falava pelos cotovelos sobre isso, feliz como eu nuna tinha visto.- Quer saber o que fiz esta manhã?- Fala.

Andrew não tinha percebido que eu não estava tão a fim de papo quanto ele.- Liguei para uma estação de rádio e pedi ao locutor para fazer uma dedicatória.Então liguei para Marina e disse pra ela ligar o rádio. Ficamos os dois aotelefone, a gente nem mesmo falava, apenas esperando pela música.Andrew suspirou profundamente.- Parece que o amor pegou você fundo. - Comentei, não sabendo bem o quedizer a ele naquele momento as declarações de amor eram para mim como umafaca cravada no coração.- Até mesmo a convidei para o Baile de Inverno. – prosseguia Andrew. - Ei,quem sabe a gente pode formar uma dupla de casais!- Bom, não sei se vou ao Baile.

- Steve, claro que você vai. Se não tiver outro jeito, você pode ir com Kelly. Osdois estão sozinhos mesmo, e a maioria das pessoas acha que vocês namoram,então..Comecei arir, amargurado. Continuar a conversar com Andrew iria me fazer pular pela janela.- Olha cara, minha mãe está me chamando. Mas estou realmente muito feliz por você e marina. Continue assim, cara.Desliguei o telefone antes que ele pudesse dizer mais alguma coisa. Eu tinhaapenas dezoito anos e minha vida não era nada mais que dor e solídão. Deitadoali, não sabia quanto mais poderia suportar.

Não sei quanto tempo tinha se passado quando minha mãe colocou acabeçapela porta do meu quarto. Podem ter sido minutos, horas, dias.- Papai e eu estamos indo a um leilão. – disse ela. - Quer vir conosco?Enfiei o Risadinha debaixo do cobertor e balancei a cabeça.- Vou ficar por aqui mesmo.Mamãe deu um sorriso maternal, que me fez sentir como se tivesse cinco anos.- Está bem, querido. Mas não fique na cama o dia todo. Não é saudável.Ela fechou a porta, e eu peguei o Risadinha de novo de seu esconderijo.Quando ouvi a porta da garagem abrir, rolei para fora da cama. Fui ao banheiroescovar os dentes e lavar o rosto. Mas até mesmo pensear em pentear o cabelome pareceu um esforço excessivo.Ainda me sentindo como se estivesse em um vácuo, fui para a cozinha pegar uma xícara de café preto. Então me pus a folhear o jornal, meio indiferente,esperando tirar Kelly do pensamento.

Passei pela sessão de esportes, mas assim que vi os resultados dos jogospercebi que já nem lembrava de quem tinha vencido quem no futebol. Percebique também nem me importava com isso.

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Fui para a sessão de artes. Talvez um filme me distraísse da dura realidade.Notei um grande anúncio de CASABLANCA. O filme estava passando no Tivoli,e a primeira sessão era à uma da tarde. lembrei-me da última vez que haviaassistido aquele clássico. Kelly já estava na cama quando telefonei avisando,mas se levantou e viu o filme inteiro.

Dei uma olhada no relógio. A sessão teria início em quinze minutos. Corri para aporta, vesti a jaqueta e peguei as chaves. Então automaticamente fui ao telefonepara chamar Kelly e pergunatr se queria ir comigo.Assim que toquei meu telefone, recuei. Por um instante tinha me esquecido deque a idéia de ir ao cinema era para esquecer o que tinha acontecido naquelamanhã. Afastei-me do aparelho sentindo o estômago meio embrulhado. Kellytinha pedido para que não a chamasse nunca mais. Precisava me acostumar a ir ao cinema sozinho. nenhum dos meus amigos apreciava os encantos de umfilme em preto e branco.Dirigindo até o cinema, saquei que assistir Humphrey Bogart e Ingrid Bergmannão ia contribuir para afastar Kelly de meus pensamentos. Ainda mais que eu

chorava na parte em que Sam toca AS TIME GOES BY para Ilsa...Comprei a entrada, de qualquer jeito. Nada iria me distrair e fazer esquecer Kelly, então achei que era melhor esconder minha depressão na escuridão docinema.- Você tem um encontro com alguém aqui? – a senhora da bilheteria perguntouenquanto me dava o troco.- Não, muito pelo contrário. – respondi.Ela fez que não se importava.- Deve ser alguma coisa no ar hoje. - Observou, quase que para si mesma.- Acho que sim. - Concordei, sem saber do que ela estava falando, e pouco meimportando também.

Como já estava atrasado mesmo, fui comprar pipoca. Não tinha comido nada odia inteiro, e o estômago estava reclamando. Não tinha certeza se conseguiriacomer todo o pacote, mas por via das dúvidas pedi manteiga extra.Lá dentro do pequeno cinema meio vazio Humphrey Bogart estava na tela ehavia música ao fundo. Naquele momento me identifiquei com Bogart e seupersonagem Rick. Rick havia perdido seu único e verdadeiro amor e agoraestava sendo forçado a viver uma vida sem sentido. Era sempre muito frio eintocável, porque não se importava com nada. Decidi ser como ele dali emdiante, um declarado macho man que vai pela vida afora sem ser afetado por emoções ou desejos.Perdido em meus pensamentos trágicos, esperei que meus olhos seacostumassem com a escuridão. Caminhei devagar, procurando um lugar nãomuito cheio de gente. Queria ficar sozinho se por acaso viesse a ter um chilique.Quando cheguei à terceira fila do corredor, meu coração pareceu querer sair dopeito. Um cabelo ruivo com jeito conhecido estava a poucas fileiras à minhafrente. Parei, quase derrubando o saco de pipoca.Com uma das mãos esfreguei primeiro um olho e depois o outro. Achei que raalucinação. Quais seriam as chances de Kelly estar sentada bem a minha frentebem a minha frente, quase como se soubesse que eu viria encontrá-la?

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Fechei os olhos por um momento e , quando abri, ela ainda estava ali. Quandorecomecei a andar, não conseguia controlar o sentimento de que, ao contráriode Rick na tela, meu romance poderia ter um final feliz.

19 - KELLY

Ingrid Bergman ainda não tinha aparecido na tela e eu já estava de novoengolindo as lágrimas. Normalmente não choro até a parte em que Rick ouveSam tocando AS TIME GOES BY para Ilsa, ao piano. Pensando na força dela,decidi não agir como uma idiota. Ilsa nunca teria chorado durante um filme, elanunca choraria nem mesmo durante toda uma guerra.Enxuguei meus olhos na camiseta e procurei me endireitar na cadeira. Semquerer, meus pensamentos se voltaram para Steve. Contudo, em vez de melembrar de como nossa amizade tinha terminado, pensei em todos os bonsmomentos que tínhamos vivido juntos.

Seqüências de cenas em comum com Steve me atravessavam a mente e mefaziam sorrir. Primeiro, a lembrança de nós dois em uma canoa no LagoGambler. Depois me recordei de quando ele apareceu em minha porta vestidode coelho da Páscoa. E ri alto a me lembrar de steve saltando montanha abaixoesquiando, em um passeio da escola. Ele ficara em pé depois da demonstraçãoe agradecera com uma reverencia perante um monte de esquiadores perplexos.E então havia a imagem de nosso beijo. Podia quase sentir seus lábios quentesnos meus, seus dedos passando pelos meus cabelos. E quando dançávamos noBaile de Boas-Vindas eu me senti como se estivesse os em nosso mundoparticular. Seus braços me seguravam apertado, e por minutos inteiros meesqueci de que deveria estar apaixonada por James.

Que grande piada, pensei. Nunca amei James. Não sabia nem mesmo segostava dele. Confundi o desejo de ter um namorado com o amor verdadeiro.Agora a lembrança de ter chegado a chorar por ele ter voltado para Tanya meparecia ridícula.Estava tão distraída pensando em Steve que nem percebi que uma pessoachegava perto de mim. Não havia mais ninguém na minha fileira, mas derepente alguém se sentou a meu lado. Um arrepio percorreu todo o meu corpo.Mesmo antes de me virar, eu sabia que era Steve.- Alguém pediu pipoca? - Sussurrou ele ao meu ouvido.Fiquei paralisada, olhando para ele com os pensamentos em total desordem.Era quase como se o tivesse conjurado, de tanto que pensara nele. Agora Steveestava do meu lado, e mesmo no escuro do cinema eu podia sentir o calor deseus olhos. Olhei para baixo e percebi que usava sapatos trocados. “Ele parecepior do que eu”, pensei com o coração disparado.Não podia nem falar mas estiquei o braço e peguei uma porção de pipoca. Daívoltei a assistir ao filme. Estava quase chorando de novo. Não tinha certeza doque sentia, mas fiquei contente de ter Steve a meu lado. Com ele ali, a dor deperder um amigo era amenizada. Pelo menos durante a próxima hora e meia,aproximadamente, nós estaríamos juntos.

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E ali ficamos, ao longo do que pareceu uma eternidade, sentados duros emnossas cadeiras. Dias e noites se passaram em CASABLANCA, mas eu nemprestava atenção às cenas. Minha mente estava ocupada com a proximidade deSteve.Nós não nos tocávamos, mas o calor do seu corpo parecia me envolver. Num

dado momento nós dois colocamos a mão no saco de pipoca. Recuamos maisque depressa, cada um se afastando para o seu lado.Todavia, durante à última cena do filme, nossos ombros e braços se colaram, eeu quase não respirava. Nunca havia sentido tanto a proximidade de umapessoa. Mas ele não era apenas uma pessoa. Era Steve, meu melhor amigo emeu verdadeiro amor.Enquanto ouvia Humphrey Bogart dizendo "Nós sempre teremos Paris", aslágrimas rolavam pelo meu rosto, pela primeira vez desde que Steve se sentarana poltrona ao lado.De repente senti sua respiração em meu rosto e inclinei à cabeça. Cadamúsculo de meu corpo se retesava, esperando que alguma coisa acontecesse.

- Nós sempre... - Steve cochichou ao meu ouvido. Pensei que fosse terminar afrase com "teremos Paris", mas ele não o fez... - nos teremos para sempre.Estiquei o braço e peguei sua mão, apertando tão forte quanto podia. Quandome virei, ele gentilmente me acariciou o rosto, desenhando o contorno de meuslábios. Tinha certeza de que todo mundo no cinema podia ouvir meu coraçãobatendo, mas não me importava.- Eu te amo. – murmurei.- Eu te amo. – murmurou ele também.Nós nos beijamos enquanto o filme terminava. Beijei-o com todo o desejo desemanas, meses, anos que se passaram. O beijo de Steve era igualmenteapaixonado, e senti que pela primeira vez na vida nós dois nos entendiamos

completamente.Quanto mais ficavamos juntos, mais nosso beijo se aprofundava, e me esquecicompletamente de onde estavamos. Nada mais importava. O mundo era sóSteve e eu...eu e Steve...Tudo o mais era miragem evaporando-se no ar.Sem aviso, as luzes se acenderam. Nós ainda nos beijavamos. Só paramosquando todos no cinema começaram a aplaudir espontaneamente. Olhamos umpara o outro com ar cúmplice e caímos na risada. Um assobio longo e forte dealguém no corredor nos fez rir mais ainda. Mas não parávamos de nos olhar.Estavamos completamente absorvidos pela magia do momento.Depois que todos saíram do cinema, Steve me tomou pela mão e me puxou dacadeira. Andamos pelo corredor estreito abraçados, sem nos importarmos com ofato de que a cada passo tropeçavamos um no outro.Na entrada toda iluminada a mulher da bilheteria estava parada, com as mãosna cintura.- EU SABIA! – exclamou ela quando nos viu saindo juntos - Como eu disse,deve ser alguma coisa no ar!Andamos pela rua, sorrindo e rindo feito bobos. Todos apaixonados, pensei.De repente Steve parou e me abraçou. Eu o abracei também, tão apertadoquanto podia.

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8/2/2019 Coleção Primeiro Amor 10 - Mais que um amigo - Elizabeth Winfrey-www.LivrosGratis

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- Ei, Kelly. – disse ele.- O quê?Tirei o cabelo dele do rosto, adorando aquele toque em meus dedos.- Você já tem um par para o Baile de Inverno? – ele perguntou - sabe, precisoganhar uma certa aposta.

Puxei-o para mais perto, beijando-o de leve. Depois dei uma risada e um socoligeiro em seu braço.- Acho que você quis dizer que tem uma aposta que EU preciso ganhar. - Falei,olhando em seus olhos.Steve fez cara de sério e colocou as mãos em torno de minha cabeça.- Acho que NÓS dois ganhamos. - Sussurou gentilmente.Então ele me beijou, e não estou bem certa do que aconteceu depois. Tudo deque me lembro é que a noite terminou com chocolate quente e uma lareira.Adivinhe o resto...

FIM

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