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FACULDADE DE DIREITO A PROVA NOS CRIMES DE CORRUPÇÃO E DE ACEITAÇÃO DE OFERECIMENTO OU PROMESSA: ASPECTOS SUBSTANTIVOS E PROCESSUAIS Gracinda da Graça Muiambo Maputo, Dezembro de 2017

FACULDADE DE DIREITO...do acusado tornando-se imperiosa a sua absolvição em respeito ao princípio in dúbio pro reo. Mais ainda, é que não devem ser usadas para a condenação

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FACULDADE DE DIREITO

A PROVA NOS CRIMES DE CORRUPÇÃO E DE ACEITAÇÃO DE

OFERECIMENTO OU PROMESSA: ASPECTOS SUBSTANTIVOS E

PROCESSUAIS

Gracinda da Graça Muiambo Maputo, Dezembro de 2017

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FACULDADE DE DIREITO

A Prova nos Crimes de Corrupção e de Aceitação de Oferecimento ou

Promessa: Aspectos Substantivos e Processuais

Dissertação de Mestrado realizada sob

supervisão do Professor Doutor Paulo

de Sousa Mendes e da co-Supervisora

Professora Doutora Catarina Salgado

Gracinda da Graça Muiambo

Maputo, Dezembro de 2017

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DECLARAÇÃO

Declaro que esta dissertação nunca foi apresentada para a obtenção de qualquer grau

ou num outro âmbito e que ele constitui o resultado do meu labor individual. Esta dissertação

é apresentada em cumprimento parcial dos requisitos para a obtenção do grau de Mestre, da

Universidade Eduardo Mondlane.

Maputo, 15 de Dezembro de 2017

_________________________

(Gracinda da Graça Muiambo)

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AGRADECIMENTOS

Em memória, aos meus pais, pela razão da minha existência.

Ao meu esposo e filhos, por todo o apoio prestado na elaboração da presente

Dissertação.

À minha colega e amiga Dra. Amina Abudo, por me ter incentivado a concorrer

para a admissão ao curso de Mestrado em Ciências Jurídicas.

Ao meu Supervisor, o Professor Dr. Paulo de Sousa Mendes, por me ter orientado

na elaboração do presente trabalho e pela sua pronta disponibilidade para atender as minhas

preocupações.

À minha co-Supervisora, a Professora Dra. Catarina Salgado, por todo o apoio

prestado na organização e revisão deste trabalho.

Ao meu amigo, o Professor Dr. Duarte Casimiro, pela expressiva colaboração na

pesquisa de jurisprudência sobre o tema tratado neste trabalho.

E, na minha formação como jurista, à Faculdade de Direito da Universidade

Eduardo Mondlane que continua a assumir um papel preponderante na minha formação como

pessoa.

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ÍNDICE

RESUMO ....................................................................................................................................... I

ABSTRACT ................................................................................................................................. II

ABREVIATURAS ...................................................................................................................... III

CAPÍTULO I ................................................................................................................................ 1

1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 1

1.1.Tema ....................................................................................................................................... 1

1.2. Delimitação do tema .............................................................................................................. 3

1.2.Formulação do problema de investigação ............................................................................... 4

1.4. Objectivo geral ....................................................................................................................... 4

1.5. Objectivos específicos ........................................................................................................... 4

1.6. Hipóteses e variáveis.............................................................................................................. 4

1.7. Motivação: ............................................................................................................................. 5

1.8. Justificativa: ........................................................................................................................... 5

2. Metodologia .............................................................................................................................. 5

2.1. Tipo de pesquisa: ................................................................................................................... 5

2.2. Método de abordagem............................................................................................................ 6

2.3. Método de procedimento: ...................................................................................................... 6

2.4. Técnicas e instumentos de investigação: ............................................................................... 6

3. Referencial teórico: ................................................................................................................... 6

3.1. Definição de termos: .............................................................................................................. 6

CAPÍTULO II ............................................................................................................................... 8

1. Aspectos Substantivos .............................................................................................................. 8

1.1. Considerações gerais sobre os crimes de corrupção (activa e passiva) e sobre o crime de

aceitação de oferecimento ou promessa. ....................................................................................... 8

1.3.Tipos de Crimes de Corrupção: ............................................................................................ 10

1.2.1. Crime de corrupção activa (art. 501º do CP) .................................................................... 11

1.2.2. Crime de corrupção passiva (arts. 502º e 503º do CP) ..................................................... 13

1.2.3. Crime de aceitação de oferecimento ou promessa (art. 509º). .......................................... 14

2. Aspectos comuns/similares entre os crimes de corrupção (activa e passiva) e o crime de

aceitação de oferecimento ou promessa:..................................................................................... 15

3. Competências dos poderes de facto ........................................................................................ 17

4. Regime Punitivo da corrupção ................................................................................................ 19

4.1. Direito Premial ..................................................................................................................... 20

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4.1.1. Origem e Natureza Jurídica .............................................................................................. 20

4.1.2. O Direito Premial no ordenamento jurídico moçambicano .............................................. 24

CAPÍTULO III ............................................................................................................................ 27

1. Análise Processual .................................................................................................................. 27

1.1. Auto de notícia do crime ...................................................................................................... 27

1.2. Natureza jurídica dos crimes de corrupção .......................................................................... 27

1.3. Detenção em flagrante delito ou mediante denúncia ........................................................... 28

1.4. Características dos crimes de corrupção .............................................................................. 28

2. Objecto da prova ..................................................................................................................... 31

2.1. Noção: .................................................................................................................................. 31

2.2. Finalidade da Prova.............................................................................................................. 32

2.3. Meios de Prova .................................................................................................................... 33

2.4. Elementos que devem ser provados nos crimes de corrupção lato sensu: ........................... 40

2.4.1. A qualidade de funcionário e o cargo que exerce; ............................................................ 40

2.4.2. Demonstração da origem e destino da vantagem .............................................................. 40

2.4.3. Existência ou não de algum interesse do particular relacionado com a actividade

exercida pelo funcionário;........................................................................................................... 41

2.4.4. Existência ou não de solicitação vs aceitação ou dádiva vs promessa. ............................ 41

2.4.5. Existência ou não de dolo por parte do servidor público. ................................................. 41

3. Meios de Obtenção de Prova .................................................................................................. 42

3.1. Definição: ............................................................................................................................. 42

3.2. Métodos proibidos de obtenção de prova ............................................................................ 42

4. Meios Admissíveis de Obtenção de Prova.............................................................................. 47

4.1. Em Moçambique .................................................................................................................. 47

4.1.1. Exames - (arts. 175º a 201º); ............................................................................................. 47

4.1.2. Buscas e apreensões (arts. 202º a 213º) ............................................................................ 47

4.1.3. Escutas telefónicas. ........................................................................................................... 49

4.2. Em Portugal: ........................................................................................................................ 50

4.2.1. Exames .............................................................................................................................. 51

4.2.2. Revistas ............................................................................................................................. 51

4.2.3. Buscas ............................................................................................................................... 52

4.2.4. Apreensões ........................................................................................................................ 52

4.2.5. Escutas telefónicas ............................................................................................................ 53

4.2.6. Acções Encobertas ............................................................................................................ 54

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4.2.6.1. Recolha de prova: .......................................................................................................... 55

4.2.6.2. Quebra de segredo profissional:..................................................................................... 56

4.2.6.3. Perda de bens a favor do Estado: ................................................................................... 56

4.3. No Brasil: ............................................................................................................................. 56

5. A valoração da prova nos crimes de corrupção ...................................................................... 57

5.1. Ilustração de alguns exemplos: ............................................................................................ 58

CONCLUSÃO ............................................................................................................................ 62

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 65

LEGISLAÇÃO ........................................................................................................................... 69

INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS ................................................................................... 71

DOCUMENTOS ELECTRÓNICO CONSULATADOS ........................................................... 72

JURISPRUDÊNCIA ................................................................................................................... 74

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I

RESUMO

Com este tema pretendemos reflectir sobre a problemática da prova nos crimes de

Corrupção e de Aceitação de Oferecimento ou Promessa, sendo certo que a abordagem do

mesmo cingir-se-á aos aspectos substantivos e processuais, previlgiando-se a corrupção de

servidores públicos – razão pela qual trataremos de realidades distintas da de outros tipos de

corrupção.

Outrossim, sabe-se que neste TLC há um grande défice de denúncia e de investigação,

o que torna difícil a responsabilização dos indivíduos que se envolvem neste tipo de práticas

criminosas, pondo em causa os órgãos da administração da justiça, sobretudo quando se trata

de casos mediatizados pela imprensa.

Por isso, dada a expansão do fenómeno da corrupção nos sectores da administração

pública, desenvolveremos o tema tendo em atenção aos métodos de obtenção de prova

utilizados em diferentes ordenamentos jurídicos, privilegiando-se o de Portugal e Brasil por

terem algumas similaridades com o nosso.

Analisaremos também os métodos de valoração da prova neste TLC chamando a

atenção aos operadores judiciários para que façam um melhor aproveitamento dos meios

processuais ao seu dispôr de modo a que se possa obter a punição de todas as formas de

corrupção na Administração Pública.

Adoptaremos a metodologia da pesquisa qualitativa e do uso da monografia de

compilação; o método de abordagem será o indutivo e o de procedimento o monográfico.

Usaremos as técnicas de pesquisa documental, bibliográfica e de análise de conteúdo.

O trabalho será estruturado em capítulos.

Palavras-chave: corrupção, servidor público, ilicitude, peita/suborno, prova.

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II

ABSTRACT

With this topic we intend to reflect on the problematic of evidence in Corruption

and Offering or Acceptance of Promise crimes, being confident that the approach of this will

be limited to the substantive and procedural aspects, emphasizing the corruption of public

servants – therefore, we will deal with distinct realities from that of other types of corruption.

Keywords: Corruption, public servant, unlawfulness, bribery/bribe, evidence.

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III

ABREVIATURAS

Ac. – Acórdão

Art.(s) – Artigo(s)

ASJP – Associação Sindical dos Juízes Portugueses

CCCP – Comentário Conimbricense do Código Penal

CEJ – Centro de Estudos Judiciários

CFJJ – Centro de Formação Jurídica e Judiciária

Cfr. – Confira/confronte

CP – Código Penal

CPP – Código de Processo Penal

CR – Constituição da República

Dec. – Decreto

Dec.-Lei – Decreto-Lei

EGFAE – Estatuto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado.

GRECCO – Grupo de Estados Contra a Corrupção

i.e. – isto é

Juris. – Jurisprudência

Lato sensu – em sentido lato

MP – Ministério Público

nt. - nota

n.°(s) – número(s)

Ob. cit. – Obra citada

Pág.(s) – Página(s)

Por ex. – Por exemplo

RLJ – Revista de Legislação e Jurisprudência

RMP – Revista do Ministério Público

SMMP – Sindicato dos Magistrados do Ministério Público.

Stricto sensu – em sentido restrito

TLC – tipo legal de crime

V.g. – verbis gratia.

Vol. – Vol.

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1

CAPÍTULO I

1. INTRODUÇÃO

1.1. Tema

O título da nossa dissertação é: “A Prova nos Crimes de Corrupção e de Aceitação

de Oferecimento ou Promessa: Aspectos Substantivos e Processuais”, por termos

constatado que a corrupção1 tem tendência para aumentar nos vários domínios do sector

público, privado e até mesmo político, como uma certeza irrefutável ameaçando a

consolidação de um Estado de Direito. Este fenómeno desperta a atenção da opinião pública,

na expectativa de que os crimes sejam investigados e, consequentemente, identificados os

verdadeiros autores dos mesmos para que sejam conduzidos à barra da justiça.

Ora como se sabe, os meios de comunicação social desempenham um papel essencial

nas sociedades democráticas, com maior enfâse no que se refere ao funcionamento do sistema

judiciário. E, recorrendo ao que diz Renzo Orlandi2 “(…) a liberdade de imprensa é um

ingrediente essencial de uma sociedade democrática e certamente não pode ser limitada

quando a notícia diz respeito a pessoas com responsabilidades públicas, sobre cuja conduta

anormal ou ilegal o cidadão comum, compreensivelmente quer ser informado”.

Por isso, quando são despoletados publicamente determinados casos de corrupção, o

que é alicerçado pela afirmação de Marta Fernandez Cabrera3, ao referir que “cada día

aparecen en portada de prensa nuevos escandálos associados a la comissión de delitos

contra la Admnistración. (…) han propiciado que la corrupción y el fraude aparezcan por

primera vez en los primeios puestos de los assuntos que más preocupan a la ciudadanía

1 Não existe uma definição consensual sobre a corrupção mas, Ary Ferreira da Cunha, Combate À Corrupção –

Da Teoria À Prática, Lisboa, Quid Juris - Sociedade Editora, 2015, pág. 72, adoptou um conceito operativo de

corrupção e definiu-a “Como uso abusivo, por parte de um agente público ou privado, de recurso, poder ou

posição inerente às suas funções, mediante a prática de qualquer ato ou omissão que implique a violação dos

deveres com que foi investido, com o objectivo de conferir, ampliar ou antecipar uma qualquer vantagem; ou

evitar, reduzir ou diferir uma desvantagem para si, para outro, e/ou para grupos de indivíduos ligados por laços

de interesse comum”. E, acrescenta o mesmo Autor que “Este conceito operativo não pretende ser uma

definição cirúrgica, mas parece-nos acrescentar um pouco de concretização ao usado pelo Departamento Central

de Investigação e Ação Penal português <desvio de um poder para fins diferentes daquele para que foi

concedido. Ou seja, o uso (abuso) para fins particulares de um poder recebido por delegação>”. 2 Renzo Orlandi, “<Operazione Mani Pulite> E Seu Contexto Político, Jurídico e Constitucional”, Constituição,

Economia e Desenvolvimento: Revista da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Curitiba, 2016, vol. 8,

n. 15, Jul.-Dez, pág. 398. 3 Marta Fernandez Cabrera, Aspectos Problemáticos Del Delito De Negociaciones Prohibidas A los

Funcionários Públicos En El ordenamento Jurídico Espanõl, in Os Crimes de Fraude E A Corrupção No

Espaço Europeu, 1ª Edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2014, pág. 254.

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2

espanõla segúnd la encuesta del CIS”, e também por Nelson Hungria4 ao afirmar que “(…)

de quando em vez, rebenta um escândalo, em que se ceva o sensacionalismo jornalístico. A

opinião pública vozeia indignada e Têmis ensaia o seu gládio; mas os processos penais,

iniciados com estrépito, resultam, as mais das vezes, num completo fracasso, quando não na

iniquidade da condenação de uma meia dúzia de intermediários deixados à sua própria sorte

(…)”, os órgãos de comunicação social por vezes, precipitam-se em fazer julgamentos

antecipados, nos quais o cidadão comum acredita e, à final, não compreende o desfecho que

muitas das vezes culmina com a absolvição, ou na pior das hipóteses em condenações

forçadas, o que leva a que em alguns casos a justiça criminal seja qualificada, aos olhos da

sociedade, como uma justiça “inoperante”.

Mas, não é por acaso que isto acontece, é que em processo penal, para que a prova

justifique a condenação do réu deve ser cristalina e indiscutível pois que, se esta se mostrar

muito frágil, subsistindo dúvidas acerca da autoria do crime não se pode forçar a condenação

do acusado tornando-se imperiosa a sua absolvição em respeito ao princípio in dúbio pro reo.

Mais ainda, é que não devem ser usadas para a condenação dos réus provas obtidas

através de certos métodos ilícitos, sob pena de se violarem os direitos, as liberdades e

garantias dos cidadãos.

Em termos de estrutura: o trabalho será organizado em capítulos, onde começaremos

por abordar o tema numa perspectiva substantiva, começando por apresentar as considerações

gerais acerca dos crimes de corrupção (activa e passiva) e do crime de aceitação de

oferecimento ou promessa; de seguida, apresentaremos os aspectos similares entre os crimes

objecto do presente estudo e falaremos das “Competências dos Poderes de Facto”. Um outro

aspecto que iremos tratar tem a ver com o regime punitivo dos crimes de corrupção e do

crime de aceitação de oferecimento ou promessa, onde falaremos do “Direito Premial”,

também designado pela doutrina como “Movimento do Direito Premial”.

De seguida, abordaremos o tema numa perspectiva processual onde faremos menção

ao auto de notícia relativo aos crimes de corrupção; falaremos da natureza jurídica dos crimes

de corrupção, da detenção em flagrante delito ou mediante denúncia e das características dos

crimes de corrupção em sentido amplo. No passo seguinte, faremos menção ao objecto da

prova, começando por apresentar a sua noção e finalidade. Iremos debruçar-nos ainda sobre

os meios de prova, começando pela sua caracterização e função, para de seguida fazermos

4 Nelson Hungria, apud, Jorge dos Reis Bravo, Manual Sobre Corrupção, Criminalidade Organizada e

Económico-Finaceira, Edição: Centro de Formação Jurídica e Judiciária – Ministério da Justiça, Maputo, 2010,

pág. 74.

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3

uma análise dos elementos que devem ser provados nos crimes de corrupção. Abordaremos

também os meios de obtenção de prova e faremos uma comparação entre os meios de prova

admissíveis em diferentes ordenamentos jurídicos. E, de seguida, analisaremos como tem

sido feita a produção e a valoração da prova nos crimes de corrupção, tentando apresentar

alguns casos ilustrativos.

Finalmente, apresentaremos as conclusões do nosso estudo sendo que as mesmas não

devem ser consideradas definitivas por estarmos cientes de que dada a complexidade do

tema, não teremos esgotado todas as questões suscitadas face às perspectivas de abordagem

do mesmo.

Temos, porém, a referir que nos deparamos com algumas limitações em termos de

colheita de dados estatísticos por não existirem publicações oficiais nesse sentido, razão pela

qual optamos por não apresentar nenhuns dados sob pena de falsearmos a verdade.

Para a indicação das referências bibliográficas, usaremos a norma portuguesa5.

1.2. Delimitação do tema

Como se sabe, ao Direito Penal cumpre a função específica de protecção da ordem

social (protecção da vida comunitária do homem) sendo que é ao Estado que cabe a tarefa de

investigar, esclarecer, perseguir e sentenciar os crimes cometidos dentro da sua “jurisdição”6.

Por isso, a abordagem do tema será feita numa perspectiva substantiva e adjectiva,

pois embora o direito substantivo e o direito processual sejam partes de uma mesma unidade,

cada um deles é autónomo em relação ao outro, cabendo ao direito substantivo ou material

“estabelecer por forma geral e abstracta, quais os factos que devem ser considerados crimes

e quais as penas que lhes correspondem” e ao direito adjectivo ou formal, “(…) a

regulamentação jurídica da realização do direito penal substantivo, através da investigação

e valoração do comportamento do acusado da prática de um facto criminoso”7. Daremos

previlégio à corrupção de servidores públicos, razão pela qual trataremos de realidades

distintas da de outros tipos de corrupção.

5 Pois, segundo refere Maria da Piedade Alves, Metodologia Científica, Lisboa, Escolar Editora, 2012, pág. 69,

“A norma portuguesa 405 constitui uma das mais usadas”, entenda-se, em Portugal. Importa também referir que

sempre que a obra for citada pela primeira vez, procederemos à indicação do nome do Autor, o Título da obra, a

Edição, o Local da publicação, a Editora, o Ano da publicação, o Número da página e por fim o Volume. No

caso de citação de uma mesma obra e do mesmo Autor, a posterior referência remeterá para a nota de roda-pé

em que foi primeiramente citada, com a menção “ob. cit.”, seguida do número da página.” 6 Cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Coimbra Editora, 1974, pág. 24, vol. I.

7 Cfr. Eduardo Correia, Direito Criminal, Coimbra, Edições Almedina, 2008, pág.13.

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4

1.3. Formulação do problema de investigação

Nos dias que hoje correm a corrupção lato sensu grassa quase todos os sectores da

administração pública, permitindo a obtenção ilícita de valores monetários ou de quaisquer

outros bens de valor e ainda de vantagem patrimonial ou não patrimonial sendo, porém,

poucos os casos em que os autores deste TLC são julgados e condenados pois, mesmo

chegando a julgamento o mais que pode acontecer é que os indiciados sejam absolvidos por

falta de prova. Daí que surgem as seguintes questões:

Como se pode resolver a problemática da dificuldade de obtenção de prova nos

crimes de corrupção latu sensu? Será que os métodos de obtenção de prova usados nos

diferentes ordenamentos jurídicos garantem a punibilidade dos que se envolvem nessas

práticas tendo em conta as características ocultas destes TLC?

1.4. Objectivo geral

Com o presente tema pretendemos contribuir para a discussão de como se pode

ultrapassar o problema da dificuldade de obtenção de prova nos crimes de corrupção (activa e

passiva) e no crime de aceitação ou oferecimento de promessa.

1.5. Objectivos específicos

- Fazer o enquadramento legal dos crimes de corrupção;

- Abordar os tipos de crimes de corrupção;

- Analisar os aspectos similares entre os crimes de corrupção;

- Abordar as competências dos poderes de facto;

- Fazer uma abordagem sobre o regime punitivo da corrupção;

- Analisar a natureza jurídica dos crimes de corrupção;

- Analisar o objecto da prova;

- Fazer uma análise dos meios de obtenção de prova;

- Analisar comparativamente os meios de obtenção de prova nos diferentes

ordenamentos jurídicos;

- Analisar como tem sido feita a produção e a valoração da prova nos crimes de

corrupção.

1.6. Hipóteses e variáveis

Existe dificuldade de obtenção de prova nos crimes de corrupção.

Variável independente: Dificuldade de obtenção de prova.

Variável dependente: Crimes de corrupção;

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5

Variáveis intervenientes: Corrupção, suborno, servidor público, ilicitude, prova.

Variável de controlo: Ordenamentos jurídicos de Moçambique, Portugal e Brasil.

1.7. Motivação:

Como se sabe, os crimes de corrupção são, pela sua natureza, de difícil prova, dadas

as suas características de opacidade e de grande complexidade. É por isso que nos sentimos

motivados a abordar o tema “A Prova nos Crimes de Corrupção e de Aceitação de

Oferecimento ou Promessa: Aspectos Substantivos e Processuais”, para analisarmos como é

que se pode ultrapassar o problema da dificuldade de obtenção de prova nestes TLC, de modo

a que todos aqueles que se envolverem neste tipo de práticas criminosas possam ser levados à

barra dos tribunais para serem julgados e condenados, reduzindo deste modo o número de

“cifras negras”.

1.8. Justificativa:

Elegemos este tema pelo interesse prático e actual de que, no nosso entender, a

matéria se reveste. Na verdade temos verificado que são poucos os crimes de corrupção que

têm sido julgados tanto nos tribunais inferiores assim como nos tribunais superiores o que, no

nosso entender deve-se ao facto de ser difícil a recolha da prova, tanto na fase de investigação

assim como nas fases subsequentes, levando a que um grande número de processos nem

sequer chegue a ser acusado pelo Ministério Público. Por isso, com o presente trabalho

pretendemos despertar a atenção dos operadores judiciários e suscitar um debate académico

mais aprofundado sobre a matéria, na esperança de que o mesmo constitua um instrumento

válido para todos aqueles que o venham a consultar.

2. Metodologia

2.1. Tipo de pesquisa:

Na elaboração do presente trabalho, iremos adoptar o tipo de pesquisa qualitativa8,

baseada na análise documental, na consulta bibliográfica e no uso da monografia de

compilação9, na medida em que ao abordar o tema iremos expôr o pensamento de diferentes

8 Pois, segundo refere Felipa Lopes dos Reis, Como Elaborar Uma Dissertação de Mestrado, 2ª Edição, Lisboa,

Pactor-Edições de Ciências Sociais e Política Contemporânea, 2010, pág. 63, a pequisa qualitativa “Oferece

melhor visão e compreensão do problema”. 9 A monografia de compilação “Consiste na exposição do pensamento dos vários autores que escreveram sobre

o tema escolhido”, cfr. Renata Domingues de Oliveira, Metodologia da Pesquisa Aplicada ao Direito com

Ênfase na Elaboração de Artigo Científico, SP: Faculdade de Ciências Sociais e Agrárias de Itapeva, 2011, pág.

14. Disponível na Internet: <URL: http//www.fait.edu.br/recursos/4/files/gradecurricularpdf/Apostila1.pdf>.

[Consult. 04/04/2015], pelas 14 horas.

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6

autores e a nossa opinião; organizaremos de forma lógica e sistemática os aspectos abordados

e no fim apresentaremos as nossas prórpias conclusões.

2.2. Método de abordagem

O método de abordagem será o indutivo10

, que nos permite partir de uma situação

concreta, que é a questão da dificuldade de obtenção da prova nos crimes de corrupção activa

e passiva e no crime de aceitação de oferecimento ou promessa não só no nosso, como

também em outros ordenamentos jurídicos.

2.3. Método de procedimento:

O método de procedimento será o monográfico11

, na medida em que a elaboração da

dissertação terá por base a consulta bibliográfica e de legislação, que irão fundamentar a

nossa pesquisa.

2.4. Técnicas e instumentos de investigação:

A técnica que iremos usar será a da pequisa documental12

e bibliográfica13

, porque

para a elaboração da dissertação iremos nos basear na consulta de legislação, na análise de

documentos e na consulta bibliográfica, tendo em conta a matéria abordada. Usaremos,

também a técnica de análise de conteúdo, na medida em que iremos descrever e interpretar o

conteúdo de legislação sobre a matéria, de modo a atingirmos uma melhor compreensão.

3. Referencial teórico:

3.1. Definição de termos:

Como dissemos anteriormente, com o presente tema pretendemos fazer uma análise

sobre como é que se pode ultrapassar o problema da dificuldade de obtenção de prova nos

crimes de corrupção. E, porque na abordagem que iremos fazer encontraremos algumas

variáveis intervenientes, começaremos por definir alguns conceitos principais,

nomeadamente:

10

De acordo com J. Eduardo Carvalho, Metodologia do Trabalho Científico: “Saber fazer” da Investigação Para

Dissertações e Teses, Escolar Editora, 2009, pág. 86, o método indutivo “Caminha na aproximação dos

fenómenos cada vez mais abrangentes, indo das constatações mais particulares às leis e teorias (conexão

ascendente)”. 11

Este método “Consiste no estudo de determinados indivíduos, profissões, condições, instituições, grupos ou

comunidades, com a finalidade de obter generalizações”. Cfr. Silvio Luiz de Oliveira, Metodologia Científica

Aplicada ao Direito, São Paulo, Pioneira Thomson learning, 2002, pág. 42.

12

Segundo ensina J. Eduardo Carvalho, ob. cit., pág. 33, a pesquisa documental “Procura a investigação de

documentos a fim de se poder descrever e comparar usos e costumes, tendências, diferenças”. 13

Segundo ensinamento de Felipa Lopes dos Reis, ob. cit. pág. 53, a pesquisa bibliográfica “É baseada na

análise da literatura já publicada em livros, revistas, imprensa, escrita electrónica disponibilizada na Internet”.

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7

Crime – é o facto voluntário declarado punível pela lei penal14

.

Indícios – são indicadores de facto que sugerem que o arguido terá responsabilidade

criminal no facto criminoso em investigação e que poderão ser infirmados ou, pelo contrário,

comprovados no decurso do processo, servindo de base, neste último caso, ao substracto

fáctico para se submeter o arguido a julgamento15

.

Peita ou suborno – são fórmulas que designam dádivas ou promessas como

contrapartidas da práti ca de actos contrários aos deveres dos funcionários16

.

Servidor público – Considera-se servidor público a pessoa que exerce mandato, cargo,

emprego ou função em entidade pública, em virtude de eleição, de nomeação, de contratação

ou de qualquer outra forma de investidura ou vínculo, ainda que de modo transitório ou sem

remuneração17

.

Prova – é a motivação da convicção da entidade decisora acerca da ocorrência dos

factos relevantes, contanto que essa motivação se conforme com os elementos adquiridos

representativamente no processo e respeite as regras da experiência, as leis científicas e os

princípios da lógica18

.

14

Cfr. art. 1º, do Código Penal de Moçambique, revisto pela Lei n.°35/2014, de 31 de Dezembro. 15

Cfr. Ana Prata; Catarina Veiga e José Manuel Vilalonga, Dicionário Jurídico, 2ª Edição, Coimbra, Edições

Almedina, 2012, Vol. II, pág. 262. 16

Cfr. Jorge dos Reis Bravo, ob. cit., pág. 85. 17

Cfr. art. 522º, n.°1 do CP de Moçambique. 18

Paulo de Sousa Mendes, Lições de Direito Processual Penal, Coimbra, Edições Almedina, 2014, pág. 173.

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8

CAPÍTULO II

1. Aspectos Substantivos

1.1. Considerações gerais sobre os crimes de corrupção (activa e passiva) e sobre o

crime de aceitação de oferecimento ou promessa.

Neste capítulo importa fazer um breve enquadramento legal dos crimes de corrupção,

ainda que de forma elucidativa, para melhor compreendermos a análise subsequente do tema

que nos propusemos desenvolver.

No ordenamento jurídico moçambicano, como mecanismo complementar de combate

à corrupção foi criada a Lei n.°6/2004, de 17 de Junho19

, que estabelecia o regime jurídico de

prevenção e combate à corrupção, regulamentada pelo Decreto n.°22/2005, de 26 de Junho,

que condicionava à apresentação de declaração dos bens e valores que compõem o

património das entidades empossadas para o exercício de funções públicas com competências

decisórias no aparelho de Estado, na administração autárquica, nas empresas e instituições

públicas, assim como a posse dos representantes do Estado nas empresas privadas e

participadas pelo Estado, a fim de serem depositadas em arquivo próprio de serviço – cfr. art.

1º do referido diploma legal

Na sequência da aprovação da Lei acima mencionada, foi criado em 2004, o Gabinete

Central de Combate à Corrupção20

, um órgão especializado do MP, de âmbito nacional e com

Gabinetes Provinciais, que têm por função a prevenção e combate aos crimes de corrupção,

peculato e concussão. Este órgão subordina-se ao Procurador-Geral da República e é dirigido

por um Magistrado do MP, com a categoria de Procurador-Geral Adjunto.

Importa referir que, com a entrada em vigor da Lei n.°35/2014, de 01 de Julho (Lei da

Revisão do Código Penal) foram revogados, dentre outros, os artigos 7º, 8º, 9º e 10º da Lei

n.°6/2004, de 17 de Junho, que tinham como epígrafes, designadamente: corrupção passiva

para acto ilícito; corrupção passiva para acto lícito; corrupção activa e participação

económica em negócio.

19

Esta Lei aplicava-se aos agentes dos crimes de corrupção e de participação económica ilícita, que fossem

dirigentes, funcionários ou empregados do Estado ou das autarquias locais, das empresas públicas, das empresas

privadas que fossem participadas pelo Estado ou das empresas concessionárias de serviços públicos, cfr. arts 1º

e 2º, n.°2. Importa ainda referir que nos termos e para os efeitos desta mesma lei, considera-se “Funcionário ou

empregado público, todo aquele que exercer ou participar em funções públicas ou a estas equiparadas, e para as

quais foi nomeado ou investido por efeito directo da lei, por eleição ou por determinação da entidade

competente”. 20

Anteriormente designado por Unidade Anti-corrupção, criada em 2002. Este gabinete já levou a cabo várias

investigações e instruiu várias acções penais, que envolvem servidores públicos das diversas áreas da

administração pública, judicial e política.

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9

Outrossim, a Lei n.°35/14, de 01 de Julho, introduziu no Capítulo II, Secção I, nos

arts. 501º a 511º os crimes de corrupção activa; corrupção passiva para acto ou omissão

ilícita; corrupção passiva para acto ilícito; corrupção de magistrados e agentes de

investigação criminal; participação económica em negócio; abuso de cargo ou função; tráfico

de influências; aceitação de oferecimento ou promessa; fraude e enriquecimento ilícito. E, na

Secção II, deste mesmo capítulo os crimes de peculato e de concussão. Como se pode ver,

parece que o legislador pretendeu incluir no mesmo capítulo todos os tipos de corrupção, o

que nos permite falar em corrupção lato sensu21

.

Importa ainda realçar a importância da Lei n.°16/2012, de 14 de Agosto (Lei da

Probidade Pública), que estabelece as bases e o regime jurídico relativo à moralidade pública

e ao respeito pelo património público, por parte do servidor público22

. Esta Lei veio

introduzir algumas alterações ao Decreto n.°22/2005, de 26 de Junho, relativamente às regras

sobre a declaração de bens e sobre conflito de interesses de certa categoria de servidores

públicos em ordem a dar uma resposta mais efectiva aos desafios que se colocam neste

domínio.

Relativamente a nova incriminação prevista no art. 509º do CP (Crime de aceitação de

oferecimento ou promessa), parece ter-se inspirado no artigo 322º do anterior Código Penal

de 1886, sendo o art. 509º mais abrangente por não se limitar à aceitação ou recebimento de

vantagem dependente apenas do “exercício de funções” mas também da aceitação ou

recebimento de vantagem pelo servidor público, “por força das suas funções”. E mais,

diferentemente do que se estabelecia no artigo 322º em que a vantagem tinha de provir de

alguém que “tivesse qualquer pretensão” dependente do exercício de funções públicas

perante o funcionário, a nova incriminação já não se limita somente à tal exigência, mas

também a que “o objectivo da entrega ou promessa da vantagem seja o de influenciar o

exercício do serviço no futuro ou gratificar o seu exercício no passado. É suficiente que a

21

O mesmo acontece no Direito Português, em que o crime de recebimento indevido de vantagem se encontra

inserido no mesmo capítulo e secção dos crimes de corrupção passiva e activa – cfr. Ricardo Rodrigues da Costa

Correia Lamas, O Recebimento Indevido de Vantagem. Análise Substantiva e Perspectiva Processual, in RMP,

Ano 32, N.°126, Edição e Propriedade: SMMP, Lisboa, Abril-Junho, 2011, pág. 68. 22

Neste particular temos a referir que a declaração de património não é apenas exigida no nosso ordenamento

jurídico. Há uma tendência geral no sentido de se exigir aos funcionários públicos que declarem o seu

património por se entender que esta prática contribui para consolidar a responsabilização dos funcionários

públicos, assegura maior transparência e facilita a deteção de potenciais casos de enriquecimento ilícito,

conflitos de interesses, incompatibilidades, bem como a deteção e investigação de potenciais práticas de

corrupção. Cfr. Primeiro Relatório Anticorrupção da União Europeia, elaborado pelo GRECO, disponível na

Internet: <URL: http://www.cpc.tcontas.pt/documentos/relatorio_anticorrupcao_eu.pdf>. [Consult. 22/10/2017],

pelas 19h e 15 minutos.

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10

vontade do particular que oferece ou promete a vantagem se dirija à criação de uma boa-

vontade relativamente a decisões futuras, a qual pode ser activada oportunamente”23

.

É importante salientar que com a nova incriminação, o legislador pretendeu encontrar

uma forma de combater a corrupção em sentido amplo e como tal deixou de exigir que a

vantagem prestada ou prometida ao funcionário público se refira a uma acção em concreto,

bastando que haja uma conexão com o exercício do cargo. No entanto, e como refere Paulo

de Sousa Mendes24

, embora referindo-se ao Direito português, no qual Moçambique se

inspira “O preenchimento dos tipos de crime de recebimento/oferta/promessa indevidos de

vantagem é exigente e muito mais difícil de comprovar na prática, o que não deixará de se

verificar também no ordenamento jurídico português, na medida em que os novos crimes

foram concebidos segundo o modelo da Lei de Combate à Corrupção alemã, de 1977”.

Mas, seja como for, e apesar da dificuldade de prova nos crimes de corrupção lato

sensu, não se pode ficar de braços cruzados perante este mal destruidor de um Estado

democrático, cujos efeitos provocam intensa danosidade social, como sejam, a disseminação

da corrupção e o risco de criação de um sentimento de impunidade, levando a que os

cidadãos percam a confiança nas instituições do Estado e nos processos democráticos25

.

1.2. Tipos de Crimes de Corrupção:

Antes de nos debruçarmos sobre as especificidades dos TLC de corrupção importa

referir que antes das alterações introduzidas pela Lei n.°35/14, de 31 de Dezembro, o crime

de corrupção passiva, seja para a prática de acto ilícito, seja para a prática de acto lícito,

previstos nos artigos 7º e 8º, respectivamente, da Lei n.° 6/2004, de 17 de Junho, era

23

Neste sentido, cfr. Paulo de Sousa Mendes, Os Novos Crimes de Recebimento e de Oferta/Promessa

Indevidos de Vantagem no Código Penal, in As recentes alterações ao Código Penal, Centro de Estudos

Judiciários, Coimbra Editora, 2011, págs. 8 e 9. 24

Idem, pág. 9. 25

A este propósito podemos fazer menção ao que consta do Primeiro Relatório do GRECO, citado na (nt. 22),

segundo o qual “Nenhum país está livre da corrupção, embora a sua natureza e extensão variem de país para

país. Este fenómeno colide com a boa governação, a correcta gestão dos dinheiros públicos e a competetividade

dos mercados”.

Importa também referir que segundo a Transparência Internacional, que publica o relatório anual Índice de

Percepção da Corrupção e que ordena os países do mundo de acordo com o grau em que a corrupção é

percebida a existir entre os funcionários públicos e políticos, numa pesquisa relativa ao ano 2016 e que

abrangeu 176 países, os resultados mostram que a Dinamarca e a Nova Zelândia têm o melhor resultado, com 90

pontos seguidos de outros tantos que ocupam o topo e compartilham características de governo aberto,

liberdade de imprensa, liberdades civis e sistemas judiciais independentes. Moçambique ocupa a 142º posição e

a Somália possui o pior desempenho no índice, com apenas 10 pontos, antecedida pelo Sudão do Sul (11

pontos), Correia do Norte (12 pontos) e a Síria (13 pontos), sendo estes países caracterizados pela ampla

impunidade da corrupção, governança fraca e instituições frágeis. Esta informação está disponível na Internet: :

<URL:

https://www.transparency.org/news/pressrelease/indice_de_percepcaeo_da_corrupcaeo_2016_circulo_vicioso_d

e_corrupcaeo>. [Consut. 13/10/2017], pelas 9 horas e 15 minutos.

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11

considerado um crime específico, porquanto para o preenchimento do tipo exigia-se que o

agente tivesse uma das qualidades previstas no art. 2º da referida Lei26

.

Ao contrário do que era antes, este TLC é, actualmente, considerado um crime

comum, podendo ser praticado por qualquer pessoa, quando esta aceite benefícios ilícitos

para a prática de actos decorrentes das suas funções, sendo certo que se o agente do crime for

um servidor público, esta circunstância passa a ser considerada uma agravante especial

qualificativa, em conformidade com o estabelecido nos arts. 502º, n.°3 e 503º, n.°3, ambos do

CP.

Em relação ao crime de corrupção activa, este foi sempre considerado um crime

comum, porque para o preenchimento do tipo não se exige que o agente seja “servidor

público”, sendo que ao abrigo do estabelecido no artigo 9º da Lei n.°6/2004, de 17 de Junho,

o agente visado pelo suborno tinha de ser uma das entidades previstas no art. 2º, da mesma

Lei e não qualquer outra pessoa como acontece à luz do estabelecido no art. 501º da Lei

n.°35/14, de 31 de Dezembro.

1.2.1. Crime de corrupção activa (art. 501º do CP)

A corrupção activa é considerada um crime comum, por ser susceptível de ser

cometido por qualquer pessoa, isto é, a sua consumação não depende do preenchimento, por

parte do agente, de quaisquer qualidades especiais enunciadas na lei.

Para a verificação deste TLC, é necessário que alguém, por si ou por interposta pessoa

(com a sua autorização ou ratificação), dê ou prometa dar a outrem, dinheiro, vantagem

patrimonial ou não patrimonial para determiná-lo a praticar actos lícitos ou ilícitos, omitir ou

retardar actos que tenha o dever de praticar.

Na verdade, existem vários posicionamentos acerca do bem jurídico protegido, no

entanto, segundo Almeida Costa, aquele “reconduz-se à autonomia intencional do Estado”27

.

Para uma certa corrente de Autores o crime de corrupção activa consuma-se,

independentemente da aceitação do suborno por parte do agente visado28

. Outros ainda,

26

Este artigo tem como epígrafe Âmbito de aplicação e estabelece o seguinte: “1. A presente Lei aplica-se aos

agentes dos crimes referidos no artigo 1 que sejam dirigentes, funcionários ou empregados do Estado ou das

autarquias locais, das empresas públicas, das empresas privadas em que sejam participadas pelo Estado ou das

empresas concessionárias de serviços público; 2. Considera-se funcionário ou empregado público, para efeitos

da presente lei, todo aquele que exercer ou participar em funções públicas ou a estas equiparadas, e para as quais

foi nomeado ou investido por efeito directo da lei, por eleição ou por determinação da entidade competente; 3.

(…)”. 27

Almeida Costa, apud, Jorge de Figueiredo Dias, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte

Especial, Coimbra Editora, 1999, Tomo III, pág. 681. 28

Neste sentido cfr. Paulo de Sousa Mendes, Sónia Reis, António Miranda, A dissimulação dos pagamentos na

corrupção será punível também como branqueamento de capitais? Separata da Revista da Ordem dos

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12

entendem que não obstante o crime de corrupção activa ser um crime formal não poderá,

todavia, concluir-se que toda a promessa ou oferta de vantagens a um funcionário público

preenche o respectivo tipo legal. Assim acontecerá apenas, desde que a peita cumpra os

requisitos da teoria da adequação ou causalidade29

.

A doutrina brasileira não encontra uniformidade quanto a admissibilidade da

tentativa, tanto no que tange à corrupção activa quanto passiva30

.

Quanto a nós, abraçamos a posição segundo a qual nos crimes de corrupção não há

crime tentado pois dificilmente se poderia provar que o funcionário visado recusou a peita ou

o suborno, desde logo por causa da maneira oculta como tem acontecido este tipo de crimes.

Daí que nunca ou quase que seria impossível a punição do corruptor. Até porque segundo

refere Almeida Costa31

“Subordinar a consumação da corrupção activa à aceitação do

suborno (ou da respectiva promessa) pelo funcionário significaria fazer depender a punição

do corruptor da verificação de um facto culposo de outrem, i.e., da decisão do empregado

público no sentido de receber a peita, observando-se um desvio à regra da “individualidade”

e da “intransmissibilidade” da responsabilidade penal”.

O crime de corrupção activa tem autonomia dogmática no sentido de que pode haver

condenação por corrupção activa, sem condenação por corrupção passiva, apesar de os

respectivos processos de execução estarem relacionados.

É considerado um crime de resultado32

no sentido de que a sua consumação ocorre

independentemente de haver aceitação da oferta ou da promessa da vantagem pelo

destinatário.

Advogados, Ano 68, II/III – Lisboa, Setembro/Dezembro 2008, pág. 809, que entendem que “Neste crime, o

particular é punido como autor de um crime consumado quer prometa, quer dê vantagem, patrimonial ou não, ao

funcionário, independentemente de o funcionário aceitar a promessa ou a vantagem ou mesmo, no caso de a

aceitar, não praticar o acto mercadejado”. E acrescentam que “trata-se, pois, de um crime em que a tentativa (i.e,

a simples promessa) é equiparada à consumação (…)”. 29

Segundo esta teoria, “para que se possa estabelecer um nexo de causalidade entre um resultado e uma acção

não basta que a realização concreta daquele se não possa conceber sem esta: é necessário que, em abstracto, a

acção seja idónea para causar o resultado” - cfr. Eduardo Correia, Direito Criminal, com a colaboração de

Figueiredo Dias, Coimbra, Livraria Almedina, 1996, pág. 257. 30

Cláudia Cruz Santos, Cláudio Bidino, Débora Thaís de Melo, A Corrupção - Reflexões (A Partir da Lei, da

Doutrina e da Jurisprudência), sobre o seu Regime Jurídico-Criminal em Expansão no Brasil e em Portugal,

Coimbra Editora, 2009, págs. 178 e 179, referem que “de um lado, asseveram vários doutrinadores a

impossibilidade de tentativa à luz do carácter formal do delito da corrupção e, de outro turno, autores há que

propugnam a viabilidade de fracionamento do iter criminis a ensejar a configuração da modalidade tentada.

Considerando-se, contudo, o bem tutelado, parece-nos que, tanto na hipótese de corrupção passiva quanto

activa, a consumação só queda configurada mediante a chegada à esfera do conhecimento da outra parte do

proceder corruptivo, leia-se, do pedido e oferta de suborno ou anuência com o mesmo. Só assim restará

exteriorizado o intento de “mercadejar com o cargo” a significar afectação ao bem autonomia intencional do

Estado.” 31

Almeida Costa, apud, Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 27), pág. 682. 32

Idem, págs. 683 – 684.

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13

O tipo subjectivo é doloso, porquanto o agente corruptor actua procurando conseguir

obter através da corrupção o resultado de qualquer uma das pretensões mencionadas no artigo

supramencionado, ou seja, exige-se o conhecimento e vontade de realização do crime por

parte do agente.

1.2.2. Crime de corrupção passiva (arts. 502º e 503º do CP)

A corrupção passiva à semelhança da corrupção activa, é um crime comum, por ser

susceptível de ser cometido por qualquer pessoa.

Para a verificação deste TLC de crime, é necessário que alguém, por si ou por

interposta pessoa (com a sua autorização ou ratificação), solicite, receba dinheiro ou

promessa de dinheiro ou qualquer vantagem patrimonial ou não patrimonial que não lhe seja

devida para praticar acto ilícito ou omitir a prática de acto que tenha o dever de praticar ou

praticar actos lícitos cabendo nas suas funções.

De acordo com o que diz Almeida Costa33

, a doutrina italiana regista uma assinável

uniformidade de posições relativamente ao bem jurídico protegido pela corrupção passiva. E

acrescenta que “(…) o objecto de protecção reconduz-se ao prestígio ou operacionalidade na

prossecução legítima dos interesses que lhe estão adstritos”.

A corrupção passiva é considerada um crime sinalagmático, na medida em que supõe

a existência de uma prestação (peita ou suborno), por parte do corruptor e a (prática ou

omissão de um acto), pelo funcionário público34

.

Neste TLC, o acto ou omissão do funcionário visado pelo suborno pode ser ilícito ou

lícito, distinguindo-se, deste modo, o crime de corrupção passiva entre própria e imprópria.

Na corrupção própria (art. 502º, n.°1) a pessoa pratica uma conduta (acto ou omissão) ilícita,

que expressa a violação dos deveres do cargo, enquanto na corrupção imprópria (art. 503º,

n.°1) a pessoa pratica um acto lícito, isto é, em conformidade com os deveres do seu cargo,

visando a obtenção de vantagem indevida.

Por outro lado, consoante a oferta ou promessa de vantagens ocorram antes ou depois

do acto do funcionário que se pretende “remunerar”, assim se depara com uma corrupção

antecedente ou subsequente35

.

A corrupção passiva é considerada um crime de dano na medida em que não se limita

a pôr em risco, mas consubstancia uma efectiva violação da esfera de actividade do Estado,

33

Almeida Costa, apud, Jorge de figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 27), págs. 656 a 657. 34

Neste sentido cfr. Rita Maria Meira Niza, Contributo para a análise do novo crime de recebimento indevido

de vantagem, Dissertação realizada no âmbito do 2º ciclo de Estudos, Mestrado Forense, Lisboa, 2012, pág. 25. 35

Idem, pág. 25 e Almeida Costa, apud Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 27), pág. 655.

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14

traduzida numa ofensa à sua “autonomia intencional”36

. Neste TLC o resultado típico traduz-

se na comunicação efectiva por parte do funcionário ao particular de que pretende ou aceita

receber uma vantagem ou promessa de vantagem, o que abre espaço para que os particulares

percam confiança pelas instituições do Estado.

O elemento subjectivo do tipo é necessariamente doloso no sentido de que se traduz

no conhecimento e na vontade livre, por parte do agente corruptor de obtenção de uma

vantagem indevida como contrapartida de um comportamento que viole os deveres do cargo.

1.2.3. Crime de aceitação de oferecimento ou promessa (art. 509º).

O crime de aceitação de oferecimento ou promessa é um crime específico na medida

em que a sua consumação depende do preenchimento, por parte do agente, de certas

qualidades especiais enunciadas na lei.

Para que se preencha este TLC torna-se necessário que o servidor público, por si ou

por interposta pessoa (com o seu consentimento ou ratificação) aceite ou receba dádiva ou

presente ou qualquer vantagem no exercício ou por causa do exercício das suas funções.

Este preceito visa evitar o recebimento, por parte de um servidor público, de qualquer

oferta ou gratificação resultante da função ou cargo público que exerce. No ordenamento

jurídico moçambicano, esta proibição vem, igualmente expressa no art. 41º da Lei

n.°16/2012, de 14 de Agosto (Lei da Probidade), onde se estabelece no seu preâmbulo que

“O exercício de funções na administração pública exige a probidade e respeito da ética”,

tendo em conta a luta que se tem estado a travar contra à corrupção a nível do sector

público37

.

E, segundo refere Pinto de Albuquerque38

, neste TLC “o bem jurídico protegido é a

integridade do exercício das funções públicas pelo funcionário”.

O elemento subjectivo do tipo é doloso, admitindo as três formas de dolo. O crime

concretiza-se quando o agente aceita ou recebe qualquer vantagem, com o conhecimento de

que a mesma não lhe é devida, como contrapartida de qualquer pretensão dependente do

exercício de suas funções ou por força das mesmas.

36

Vide Almeida Costa, apud, Jorge de Figeiredo Dias, ob. cit. (nt.27), pág. 661. 37

Aqui podemos referir que segundo uma constatação feita pelo GRECO do Conselho da Europa, nunca desde a

antiguidade a corrupção tinha sido um dos mais espalhados e insidiosos males sociais e, quando esta envolve

funcionários públicos e representantes eleitos torna-se inimigo da Administração Pública. Desde o fim do século

XIX esta também tem sido vista como a maior ameaça na esfera privada, mina a confiança e a certeza que são

necessários para a manutenção e desenvolvimento sustentável e as relações sociais. Estima-se que centenas de

biliões de euros sejam pagos em suborno todos os anos. Disponível na Internet: <URL:

https://www.coe.int/en/web/greco/about-greco/priority-for-the-coe> [consult. 28/11/2017], pelas 12 horas e 45

minutos. 38

Pinto de Albuquerque, apud, Rita Maria Meira Niza, ob. cit., pág. 32.

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2. Aspectos comuns/similares entre os crimes de corrupção (activa e passiva) e o crime

de aceitação de oferecimento ou promessa:

Importa, antes de mais, referir que os crimes de corrupção de que nos debruçamos

neste trabalho têm de comum o facto de poderem ser praticados por “servidores públicos” no

exercício de funções na administração pública39

, entendendo-se por funções de administração

pública, as actividades específicas dos órgãos e instituições do Estado40

.

É importante salientar que para efeitos de Lei Penal, o legislador alargou o conceito

de “funcionário público”, que em regra é um conceito específico do direito administrativo,

para o de “servidor público”, nos termos do disposto no art. 522 do C.P.

41, de modo a

abranger toda a tipificação dos crimes de corrupção, nos casos em que o agente activo seja

servidor público.

Segundo refere Jorge dos Reis Bravo42

, “O legislador procura alargar o conceito de

forma a não permitir lacunas de punibilidade que, por razões de identidade e igualdade das

situações, não se justificassem”. E, acrescenta o mesmo Autor que “Isto significa que tal

alargamento conceptual só é válido para as situações em que se equacione a posição do

empregado ou funcionário público enquanto sujeito activo de um crime”43

.

Por isso é que J. M. Damião da Cunha44

ensina que “O conceito de funcionário para

efeito da lei penal, só tem validade quando o exercício das suas funções seja eficaz. Não

podem verificar-se, pois, situações de usurpação de funções”.

Assim, e porque à semelhança do que se disse em relação ao nosso Código Penal,

muitas das legislações penais adoptaram um conceito autónomo e alargado de “funcionário

público”, mas com formulação e âmbito de aplicação distintos45

, julgamos ser importante

39

Segundo Diogo Freitas do Amaral, Curso De Direito Administrativo, 2ª Edição, Coimbra, Almedina, 2001,

Vol. I pág. 29, “Quando se fala em Administração Pública, tem-se presente todo um conjunto de necessidades

colectivas cuja satisfação é assumida como tarefa fundamental pela colectividade, através de serviços por esta

organizados e mantidos”. 40

Cfr. art.2°, n.°3 do EGFAE. 41

Tal como definimos na conceitualização. De referir que o n.°2, do art. 522º do CP, considera como

“Sinónimos de servidor público os termos funcionário, agente do Estado, empregado público, agente municipal

ou qualquer outro similar, que se utilize para referir-se à pessoa que cumpra funções em entidade pública”.

Vide, igualmente, a Lei n.°16/2012, de 14 de Agosto, que para além de definir o conceito de servidor público

enumera quais as entidades que cabem no referido conceito. 42

Cfr. Jorge dos Reis Bravo, ob. cit., pág. 98. 43

Idem. 44

J. M. Damião da Cunha, apud, Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 27), pág. 823. 45

Vide, por ex., o art. 386º do CP Português, onde se estabelece que “1. Para efeitos da lei penal a expressão

funcionário público abrange: a) o funcionário civil; b) o agente administrativo; c) Quem, mesmo provisória ou

temporariamente, mediante remuneração ou a título gratuito, voluntária ou obrigatoriamente, tiver sido chamado

a desempenhar ou a participar no desempenho de uma actividade compreendida na função pública

administrativa ou jurisdicional, ou, nas mesmas circunstâncias, desempenhar funções em organismos de

utilidade públicas ou nelas participar. 2. Ao funcionário são equiparados os gestores, titulares de órgãos de

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mencionar os conceitos similares ao de “servidor público” usados nas Convenções

Internacionais, ratificadas por Moçambique, começando pela Convenção da União Africana

sobre a Prevenção e o Combate à Corrupção46

, onde o conceito de “funcionário público”,

previsto no art.1.º, reveste o seguinte conteúdo “Todo o funcionário ou empregado do Estado

ou de suas agências, incluindo aquele que foi selecionado, designado ou eleito para exercer

actividades ou funções em nome do Estado ou ao serviço do Estado, a qualquer nível da sua

hierarquia”;

No Protocolo da SADC Contra a Corrupção, denominado por Protocolo da

Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral47

, o conceito de “funcionário

público’’, previsto no art. 1.º considera “qualquer pessoa com emprego no Estado, nas suas

agências, autoridades locais ou para-estatais, e inclui pessoa que exerça funções públicas ou

obrigações em qualquer das suas agências ou empresa”;

E, por fim, de acordo com a Convenção da ONU Contra a Corrupção, adoptada pela

Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de Outubro de 2003 (denominada Convenção de

Mérida)48

considera-se “agente público” “a) : i) todo aquele que detenha um mandato

legislativo, executivo, administrativo ou judiciário num Estado Parte, para o qual foi

nomeado ou eleito, a título permanente ou temporário, remunerado ou não, e

independentemente da antiguidade na função; ii) também aquele que desempenhe uma

função pública, incluindo para um organismo público ou para uma empresa pública, ou

presta um serviço público, de acordo com o disposto no direito interno do Estado Parte e

conforme o estabelecido na área do direito relevante desse Estado; iii) E ainda aquele que

no direito interno de um Estado Parte é definido como “agente público”. Este conceito é

muito mais abrangente, porquanto a convenção define na al. b) o conceito de “agente público

estrangeiro” e na al. c) o de “funcionário de uma organização internacional pública”, que

para o caso julgamos que não tem interesse.

Como se pode ver, são vários os conceitos de “servidor público” adoptados nos

diferentes instrumentos legais, mas tudo isso, e como foi acima referenciado, na expectativa

fiscalização e trabalhadores de empresas públicas, nacionalizadas, de capitais públicos ou com participação

maioritária de capital público e ainda de empresas concessionárias de serviços público”. Vide, igualmente, o art.

327º do, CP do Brasil, onde “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem embora

transitoriamente ou sem remuneração, exerce o cargo, emprego ou função público. 1º - Equipara-se a

funcionário público quem exerce o cargo, emprego ou função em entidade paraestatal. 2º (…)”. 46

Assinada em Adis-Abeba, Etiópia, e adoptada em 11 de Julho de 2003, em Maputo, pela 2ª Sessão Ordinária

da Conferência da União Africana, e ratificada pela Resolução n.°30/2006, de 2-8, da Assembleia da República. 47

Assinado em Blantyre, a 14 de Agosto de 2001, e ratificado por Moçambique através da Resolução

n.°33/2004, do Conselho de Ministros, de 20 de Junho de 2004. 48

Ratificada por Moçambique, através da Resolução, n.°31/2006, de 26 de Dezembro.

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17

de evitar a impunidade de todo e qualquer cidadão que exerça funções públicas, ou funções a

elas relacionadas, sempre que se envolverem em actividades criminosas, no exercício dessas

funções, e enquanto servidores públicos.

3. Competências dos poderes de facto

Segundo ensinamento de Claus Roxin49

“Tipos penais há em que o legislador, ao

invés de descrever de forma mais precisa as acções humanas que lesionam o bem jurídico,

serve-se de outra técnica e se apoia em deveres, concretizados em outros sectores de ordem

jurídica, e cuja violação passa a ser um requisito do tipo penal”. E acrescenta o mesmo

Autor que “Autor é quem viola um dever especial, pouco importando o domínio que tenha

sobre o facto; quem concorre para o facto sem esse dever será mero partícipe”50

. São os

chamados delitos de dever ou delitos de violação de dever, em que se encontram,

principalmente, os delitos próprios (delitos praticados por servidor público), como é o caso

dos crimes de corrupção passiva e também do crime de aceitação de oferecimento ou

promessa.

De referir que nos crimes de corrupção lato sensu, o legislador enquadrou um grupo

de pessoas que, em função da natureza dos cargos públicos que ocupam, são susceptíveis de

ser agentes dos crimes de corrupção passiva.

Importa salientar que nos crimes de corrupção passiva, nalguns casos a solicitação

pode partir de quem ocupa o cargo de direcção (um servidor público) e noutros ser um agente

corruptor privado a aliciar o servidor público com dádivas de todo o tipo, com o intuito de

obter uma decisão, serviço ou benefício a que não tem direito (corrupção para acto ilícito) ou

a acelerar um processo a que não lhe diz respeito (corrupção para acto lícito)51

, i.e, o servidor

público pode ser o destinatário da vantagem e noutros ser o próprio servidor público quem

solicita ou recebe uma vantagem ou uma promessa de vantagem.

Importa, porém, referir que nos crimes de corrupção nem todos os actos praticados

por um servidor público se mostram susceptíveis de preencher o correspondente ilícito

criminal. Por isso, se por ex., o servidor público recebe uma peita ou suborno respeitante a

uma actividade ou prestação que não se realize no desempenho das suas competências

públicas, não se preencherá o crime de corrupção passiva, podendo integrar um outro TLC,

49

Claus Roxin e Alaor Leite, O que é e o que não é a teoria do domínio do facto sobre a distinção entre autor e

partícipe no Direito Penal, Disponível na Internet: <URL: http://eugeniopacelli.com.br/artigos/o-que-e-e-o-que-

nao-e-a-teoria-do-dominio-do-fato-sobre-a-distincao-entre-autor-e-participe-no-direito-penal/>. 50

Idem. 51

Gabrielle Poeschl, Factores de Variação na Percepção da Corrupção, in Os Crimes de Fraude E De

Corrupção No Espaço Europeu, ob. cit., pág. 249.

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ainda que a conduta a que se dirige a peita ou suborno seja idêntica a que o agente executa na

sua qualidade de servidor público.

Na verdade, deve ter-se sempre em atenção que nos crimes de corrupção stricto sensu,

o acto a realizar pelo funcionário público deve integrar-se na esfera das suas atribuições

funcionais, surgindo aqui algumas dúvidas no sentido de saber se o acto a realizar pelo

servidor público deve corresponder às específicas competências legais ou se poderá importar

a simples actuação de “meros poderes de facto” decorrentes da posição “funcional” daquele.

Há os que entendem que o acto a realizar pelo servidor público deve integrar-se na

esfera das suas atribuições funcionais, sob pena de não se estar perante um crime de

corrupção, mas sim de poder estar-se perante uma situação de usurpação de funções, caso o

agente extravase as suas competências, v.g. um funcionário que recebe uma peita ou suborno

arrogando-se a competência para praticar um acto que não cabe nas suas específicas

atribuições52

.

E ainda, os que entendem que não importa se o acto praticado integra ou não a esfera

das específicas atribuições funcionais ou competências, bastando que a actividade em causa

se encontre numa relação funcional imediata com o desempenho do respectivo cargo53

.

Já, nos crimes de aceitação de oferecimento ou promessa, o acto a praticar pelo agente

do crime deve ser feito no exercício de suas funções ou por força das mesmas, não

integrando este TLC a conduta do servidor público que recebe uma peita ou suborno por

motivo completamente alheio às funções públicas por ele exercidas.

No entanto, e segundo refere Ricardo Lamas54

“Se no exercício de funções parece

reportar-se à vantagens solicitadas no âmbito das próprias funções, no decurso e no contexto

da actuação funcional do funcionário – sendo irrelevante se foi solicitada no local e horário

de trabalho (…), já por causa delas aparenta cingir-se à vantagem auferida ou solicitada

apenas porque o funcionário tem essa qualidade”, o que se torna difícil provar.

52

Neste sentido, cfr. Almeida Costa, apud, Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 27), pág. 664. 53

Para tal tazemos um exemplo dado por Almeida Costa, apud, Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 27), pág.

665, segundo o qual Se “Um contínuo de um certo departamento administrativo que recebe o pagamento de

suborno, como contrapartida de ele haver subtraído determinado processo que estava para ser decidido pelo seu

director. Aqui, a circunstância de a análise ou a custódia daquele processo não estarem abangidas nas suas

atribuições não afecta a “relação funcional imediata” do agente com o acto, circunstância que o coloca na órbita

do tipo legal de corrupção passiva”. 54

Ricardo Lamas, ob. cit. pág. 90

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19

Como se pode depreender neste TLC não conta apenas a actuação jurídica ou

resultante das funções adstritas ao funcionário, mas também nos poderes de facto do cargo do

servidor público55

, situação que a verificar-se preencherá o respectivo ilícito.

Pelo que, a conclusão a que se pode chegar é a de que os actos dos servidores

públicos, para serem relevantes para o preenchimento do tipo têm de caber dentro das suas

específicas competências legais ou dentro dos poderes de facto decorrentes dos cargos que

ocupam, sob pena de não se preencher o respectivo ilícito.

4. Regime Punitivo da corrupção

Antes da incriminação do crime de aceitação de oferecimento ou promessa só se fazia

a distinção entre os crimes de corrupção activa e os crimes de corrupção passiva - para a

prática de acto ilícito (própria) e para a prática de acto lícito (imprópria).

Com esta nova incriminação, o legislador pretendeu evitar a isenção de

responsabilização criminal, porque através dos primeiros, não se conseguindo provar qual era

o acto concretamente pretendido pelo agente do crime, não havia como criminalizá-lo.

E, para a prova deste novo TLC, o legislador não exige a verificação do nexo de

causalidade entre a vantagem e o acto do servidor público, mas sim a prova de que a

vantagem foi recebida por este no exercício das suas funções ou por causa delas.

Pelo que, neste ponto analisaremos a punição dos servidores públicos abrangidos

pelas normas dos artigos 501º (corrupção activa), 502º (corrupção passiva para acto ilícito),

503º (corrupção passiva para acto lícito) e 509º (aceitação de oferecimento ou promessa),

todos do C.P. em vigor na República de Moçambique.

Como nos referimos acima o conceito de funcionário público foi alargado para o de

servidor público, de forma a não permitir lacunas de punibilidade.

Relativamente aos crimes de corrupção, em sentido restrito, o legislador estabeleceu a

“agravação” da pena, no art. 501º, n.°2 (para a corrupção activa); para a (corrupção passiva

para acto ou omissão ilícita) verifica-se uma agravação da pena nas situações previstas no art.

502º, n.°s 2 e 3 e, para a (corrupção passiva para acto lícito), a agravação verifica-se nas

situações previstas no 503º, n.°s 2 e 3. E, relativamente ao crime de aceitação de

oferecimento ou promessa a agravação da pena está prevista no artigo 509º, n.°3.

55

Para tal, trazemos um exemplo dado por Ricardo Lamas, ob. cit., pág. 90, Segundo o qual “Se uma empresa

que presta serviços para uma Câmara Municipal, em situação concorrencial com outras empresas, oferece uma

vantagem a um dos seus Vereadores, existe, desde logo, uma possibilidade de que este venha a oferecer

publicamente – por meio de simples elogio, por exemplo -, a empresa ofertante, mesmo que não seja da sua

competência adjudicar-lhe serviços ou ter qualquer influência no processo de adjudicação”.

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20

Importa referir que quando os crimes são praticados por servidor público a agravação

das penas resulta do facto destes violarem um determinado dever relacionado com o seu

cargo. E, como ensina Roxin, “O que justifica a pena elevada do delito funcional é a

violação de um dever que se dirige apenas ao detentor da função”.56

Relativamente à “dispensa ou isenção” da pena, ela está prevista no art. 501º, n.°s 3 e

4, relativamente à (corrupção activa); art. 502º, n.°4, na (corrupção passiva para acto ou

omissão ilícita) e 503º, n.°4, na (corrupção passiva para acto lícito), todos do CP, ao que na

doutrina se considera de “Direito Premial” ou “Movimento Premial”, de que nos ocuparemos

de seguida.

De referir que, quanto à tipologia dos crimes acima mencionados, não existe nenhuma

disposição especial que prevê a possibilidade de “atenuação” da pena, devendo esta ser feita

nos termos gerais, desde que se mostrem preenchidos os pressupostos legais para a aplicação

de tal faculdade.

4.1. Direito Premial

4.1.1. Origem e Natureza Jurídica

A palavra “premiar” tem a sua origem (no latim praemiãre),e significa dar prémios a;

recompensar57

. E, poder-se-ia então perguntar o que é que o direito penal premeia? A

resposta seria a “delação” (do latim delatiõne), e significa revelação do crime com o fim de

tirar proveito; denúncia58

e a colaboração, que significa trabalho em comum; cooperação,

acto ou efeito de colaborar59

.

E qual será então a diferença entre a delação premiada e a colaboração premiada? A

resposta a esta pergunta é um tanto ou quanto controversa pois, em termos doutrinários há

posições que entendem que “ambas as denominações referem-se ao mesmo instituto, no qual

um investigado ou acusado presta relevantes informações à polícia ou ao Ministério Público,

56

Neste sentido, Cfr. Claus Roxin, apud, Luís Greco e Alaor leite, O que é e o que não é a teoria do domínio do

fato sobre a distinção entre autor e partícipe no Direito Penal. Disponível na Internet: <URL:

http://eugeniopacelli.com.br/artigos/o-que-e-e-o-que-nao-e-a-teoria-do-dominio-do-fato-sobre-a-distincao-entre-

autor-e-paticipe-no-direito-penal/>.

57

Cfr. J. Almeida Costa e A. Sampaio Melo, Dicionário da Língua Portuguesa, 8ª Edição, Portugal, Porto

Editora, 1999, pág. 1318. 58

Idem, pág. 477. 59

Ibidem, pág. 380.

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21

dando conta da participação de outras pessoas e revelando detalhes de esquema

criminoso”60

.

No entanto, há outras posições que, baseando-se na Lei 12.850/1361

, entendem que há

diferença entre os dois institutos, devendo a colaboração premiada ser compreendida como o

gênero62

e a delação premiada, uma das suas espécies também denominada “chamamento do

co-réu” e que se destina à identificação dos demais co-autores e/ou partícipes da organização

criminosa bem como das infracções penais por ela praticadas (art. 4º, inciso I, da Lei

12.850/13)63

.

Destarte, há quem entenda que parece ser mais comum a utilização do termo

“Delação”. Mas, segundo tal entendimento, o terrmo delação “traz em si, a ideia de traição, e

o Estado quer deixar de lado esta ideia, e por isso, prefere o termo <colaboração

premiada>. Portanto, apesar de na mídia ser muito comum a expressão <delação>, é mais

técnico usar <colaboração>”64

.

Quanto à nós, parece ser indiferente o uso de uma ou de outra designação pois, para

aqueles países em que não têm ainda uma Lei que detalha o funcionamento da colaboração

premiada, como acontece no Brasil, o que se pretende tanto numa como noutra situação, é o

rompimento do silêncio dos envolvidos permitindo aos Estados incentivar os criminosos a

colaborar com a justiça no combate à criminalidade altamente organizada, concedendo

benefícios aos suspeitos que, de qualquer uma das formas, cooperarem na investigação.

Ora como se sabe, a infracção criminal pode ser praticada por uma ou por duas ou

mais pessoas. Daí que um servidor público pode, por si só, praticar qualquer crime de

corrupção passiva, tal como se prevê nos artigos 502º e 503º ou um crime de aceitação de

oferecimento ou promessa, tal como se prevê no artigo 509º, todos do CP, como também,

estes crimes podem ser praticados por vários servidores públicos, partindo de uma decisão

conjunta, para a concretização de um mesmo fim, numa actuação coordenada e com as tarefas

60

Neste sentido, cfr. Felipe Faoro Bertoni, Entenda a diferença entre delação premiada e colaboração

premiada, disponível na Internet: <URL: https://canal ciênciascriminais.com.br/diferenca-delacao-colaboracao-

premiada/>. [consult. 15/09/2017], pelas 14 horas e 30 minutos. 61

Lei brasileira que detalha como funciona a colaboração premiada, e também designada por Lei de Combate às

Organizações Criminosas. 62

Porquanto se pode, por ex., colaborar com o Estado, identificando os demais co-autores e as infracções penais

por eles praticadas. Mas também, se pode colaborar com o Estado, sem denunciar terceiros, fornecendo a

localização de eventuais vítimas; a localização do produto das infracções penais praticadas pela organização

criminosa; revelando a organização da estrutura hierárquica da organização, etc. 63

Cfr. Luiz Flávio Gomes, Há diferença entre colaboração e delação premiada? Disponível na Internet: <URL:

https://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/ha-diferenca-entre-colaboracao--e-delacao-premiada/14756>

[Consult. 15/09/2017], pelas 14 horas e 15 minutos. 64

Neste sentido, Cfr. Juridicocerto, Aspectos Fundamentais da Colaboração Premiada, disponível na Internet:

<URL: https://juridicocerto.com/p/cayonperes/artigos/aspectos-fundamentais-da-colaboracao-premiada-948>

[Consult. 15/09/201], pelas 15 horas.

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22

bem definidas, sendo por isso co-autores65

e devendo responder todos eles pela totalidade do

crime cometido66

.

O direito premial, também designado pela doutrina como movimento premial ou

regime do arrependido, vigora no direito positivo de vários países (como por ex., em

Portugal, no Brasil, em Espanha, na Itália, e nos EUA), por o considerarem um meio eficaz

de combate à criminalidade organizada; É uma técnica de investigação criminal que pode, de

certo modo, através da colaboração dos arguidos, quebrar o silêncio destes, ajudando a

desmantelar as grandes redes criminosas inseridas no seio de uma determinada sociedade e

que se dedicam à criminalidade organizada, evitando a prática de novos crimes por essas

mesmas redes pois, como se sabe a corrupção raramente existe só e é usada como um

instrumento de facilitação do crime organizado, podendo potenciar outros ilícitos, v.g., o

tráfico de drogas, o tráfico de seres humanos, e o braqueamento de capitais.

Importa também referir que a colaboração deve ser voluntária, não importando se a

ideia partiu ou não do colaborador e muito menos os motivos que o levaram a colaborar com

os investigadores. Mas, a pergunta que se pode colocar é a seguinte: Os acordos de

colaboração não entram em choque com o princípio do nemo teneturse ipsum accusarese

detegere, segundo o qual ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo?

Segundo ensinamento de José António Rodrigues da Cunha67

“A consagração do

direito ao silêncio e à não autoincriminação no âmbito do processo penal, que decorre

directamente do respeito pela dignidade da pessoa humana e é indissociável das regras

próprias de um Estado de Direito, constitui uma importante garantia da liberdade

confessória. Em primeira linha, impede qualquer interpretação do silêncio do arguido como

aceitação de factos. Sendo, porém, inquestionável que em caso algum o uso do direito ao

silêncio poderá prejudicar o arguido, certo é também, que não o deverá beneficiar”.

Dito isto, e em reposta a questão acima colocada, o que se nos oferece dizer é que o

direito ao silêncio não é um direito absoluto, no sentido de que o arguido deve sempre manter

o silêncio. Até porque, corroborando com esta afirmação e recorrendo ao nosso Código de

65

Como exemplo de co-autoria num crime de corrupção, podemos citar a Denúncia feita pelo Procurador-Geral

da República contra Michel Miguel Elias Temer Lulia (Presidente da República Federativa do Brasil) e Rodrigo

Santos Da Rocha Loures (ex-Deputado Federal), denunciados da prática, em concurso, pelo crime de corrupção

passiva (CP, art.317, caput, c/c art. 29), e outras pessoas a eles ligadas, mas não detentoras de foro por

prerrogativa de função. Disponível na Internet: <URL: http://m.dw.com/downloads/39432330/denuncia-

temer.pdf>. [Consult. 28/11/2017], pelas 13 horas e 25 minutos. 66

Sobre a co-autoria, cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, 2ª Edição, Coimbra, Coimbra

Editora, 2012, Tomo I, págs. 791 a 797. 67

Cfr. José António Rodrigues Da Cunha, A Colaboração do Arguido com a Justiça – A Confissão e o

Arrependimento no Sistema Penal Português, in JULGAR, Revista N.°32, Edição: ASJP, Lisboa, Maio-

Agosto/2017, págs. 53 e 54.

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Processo Penal, encontramos algumas normas68

que deixam transparecer que ao prestar as

suas declarações, o arguido deve ser advertido de que não é obrigado a responder às

perguntas que lhe vão ser feitas sobre os factos imputados e sobre o conteúdo das

declarações que acerca deles prestar.

No entanto, caso o arguido opte voluntariamente pelo não exercício do direito ao

silêncio, preferindo colaborar com as autoridades para a descoberta da verdade material,

então é nosso entendimento que não se poderá falar de violação do princípio ora mencionado

e da autoincriminação, desde que o mesmo tenha sido previamente advertido das

consequências que poderão, eventualmente advir da celebração de um acordo de colaboração

premiada.

Mas, segundo refere Ricardo Lamas69

, o regime “premial” “assenta num paradoxo:

a pessoa que delatou que se arrepende é, ao mesmo tempo, agente do crime e meio de prova.

Assim sendo, o seu contributo para a produção da prova e para a perseguição penal da

outra parte no <pseudo-sinalagma> é <recompensado> com uma dispensa ou atenuação da

pena, mas não exclui a sua responsabilidade penal”.

Ora, como se pode ver, o delator passa a ter duas qualidades, a de arguido70

, e a de

declarante, na medida em que sendo arguido, está impedido de prestar juramento, o que faz a

diferença com a testemunha (por esta prestar juramento). Mas também, ao abrigo do

estabelecido no art. 216º, n.°4 do CPP, “não podem ser testemunhas os que participarem o

facto à autoridade pública (…)”. Daí que a doutrina entende que o julgador não deve apenas

decidir com base nas declarações prestadas pelo delator, devendo estas serem corroboradas

por outros elementos de prova71

.

No entanto, importa referir que uma vez preenchidos os pressupostos previstos para

que haja dispensa da pena, o delator deixa de ser parte interveniente no processo, cessando as

disposições que o incriminam da prática do crime.

68

Vide art. 254º, n.°3 e § 1º do art. 425º, ambos do CPP. 69

Ricardo Lamas, ob. cit., pág. 131. 70

Por recair sobre ele forte suspeita de ter perpetrado uma infracção, cuja existência esteja suficientemente

comprovada – cfr. art. 251º do CPP. 71

É o que acontece em Moçambique, onde se dispõe no corpo do art. 174º que, “A confissão do arguido

desacompanhada de quaisquer outros elementos de prova não vale como corpo de delito”; no Brasil onde o

art.197º do CPP estabelece que “O valor da confissão se aferirá pelos critérios adotados para os outros

elementos de prova, e para a sua apreciação o juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo,

verificando se entre elas existe compatibilidade ou concordância”; e no Peru, em que o art. 160º, n.°2, estabelece

que “La confesion solo tendrá valor probatório cuando, al. a) Este debitamente corroborado por outro u otros

elementos de convicción”, o que já não acontece em Portugal, em que não se exige que a confissão do arguido

seja corroborada por outros meios de prova, desde que seja verdadeira, cfr. o art. 344º do CPP.

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4.1.2. O Direito Premial no ordenamento jurídico moçambicano

Os mecanismos jurídicos entendidos como sendo de direito premial não são

uniformes nos diversos ordenamentos normativos dos diversos países. De referir que no

Direito Brasileiro o legislador introduziu leis que regulam o instituto da colaboração

premiada.

No direito moçambicano, o legislador estabeleceu várias situações que devem ser

tidas em consideração para a aplicação das penas entre os limites máximo e mínimo no art.

110º, e as situações em que as penas podem ser atenuadas extraordinariamente - art. 119º,

ambos do CPl.

Ora, segundo ensinamento de Figueiredo Dias72

, a determinação da pena, passa por

três fases distintas, a 1ª das quais em que o juiz investiga e determina qual a moldura penal

abstracta a ser aplicada; a 2ª em que o juiz investiga e determina qual é a pena concreta que

vai aplicar dentro da moldura penal abstracta, e a 3ª e última em que o juiz escolhe dentre as

penas possíveis de aplicar (alternativas ou de substituição), a espécie de pena que deve ser

cumprida pelo agente do crime.

No entanto, para a determinação da medida concreta da pena, o tribunal deverá

atender ainda a outras circunstâncias comuns, que embora não digam directamente respeito

ao TLC contendem a favor ou contra o agente do crime, e podem contribuir para a atenuação

da pena entre o limite mínimo e máximo previsto73

. O Juiz poderá ainda substituir a moldura

penal abstracta aplicável a um determinado crime, por outra, considerando o especial valor

das circunstâncias atenuantes - cfr. art 119º do CP.

Mas, não se pode considerar que nas situações acima mencionadas se está em face de

um direito premial, pois esta figura só é chamada à colação naqueles casos em que o agente

do crime colabora com a justiça denunciando um determinado crime e outros co-autores ou

contribuindo de forma decisiva na obtenção de prova, como por ex., através da indicação do

local onde se encontra escondido o produto do crime. E, como exemplos de uma verdadeira

premiação vejam-se os artigos abaixo citados74

.

72

Jorge De Figueiredo Dias, Direito Penal Português – Parte Geral II, Coimbra, Coimbra Editora, 2011, pág

256. 73

Idem, pág. 257. Vide, igualmente, Germano Marques da Silva, Direito Penal Português, Parte Geral III,

Teoria das penas e medidas de segurança, 2ª edição, Editorial Verbo, 2008, pág. 155. 74

Art. 532º, n.°1do CP onde se dispõe que: “Será isento da pena o comprador que, antes de consumado qualquer

um dos crimes enunciados nos artigos antecedentes, e antes de ser instaurado o processo, der à autoridade

pública conhecimento do mesmo crime e das suas circunstâncias, e dos outros agentes” e o art. 47º, da Lei n.°

3/97, de 13 de Março (que estabelece o regime jurídio aplicável ao tráfico e consumo de estupefacientes e

substâncias psicotrópicas e preparados ou outras substâncias de efeitos similares), onde se dispõe que “Nos

casos previstos nos artigos 33º, 35º, 41º e 42º, se o agente abandonar voluntariamente a sua actividade, afastar

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25

Ora, segundo referimos acima, o direito premial vigora no direito positivo de vários

paises, por o considerarem um meio eficaz de combate à corrupção.

Mas, para Germano Marques da Silva75

o direito premial “promove a denúncia de

outros agentes como requisito para uma atenuação ou isenção da responsabilidade penal,

quebrando valores essenciais numa sociedade democrática como a solidariedade entre

membros, amizade ou confiança, promovendo assim o egoísmo, a traição e levando a

comportamentos opostos aos consignados na Constituição da República Portuguesa quando

fomenta a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno”.

Por outro lado, Luigi Ferrajoli76

entende que “A prática da delação premiada

resulta <inevitavelmente> [n]a corrupção da jurisdição, [n]a contaminação policialesca dos

procedimentos e dos estilos de investigação e de juízo, e [n]a consequente perda de

legitimação política ou externa do poder judiciário”.

Concordamos, com o posicionamento dos Autores acima referenciados por

entendermos que o direito premial abre ou pode abrir espaço a que muitas pessoas envolvidas

em crimes cuja legislação vigente premeia a delação ou a colaboração, sentindo-se

pressionadas com a investigação, e usando a capa de “bons samaritanos” se refugiem nela,

para poderem beneficiar de um tratamento menos severo ou então de isenção da pena. Dá

ainda a sensação de que a justiça pode ser negociável, o que não é justo por não ser aplicável

a todos os TLC, para além de que a própria justiça perde uma certa credibilidade pois, a

prova obtida desta forma não é isenta de dúvidas e pode pôr em causa as próprias decisões

judiciais, através da manipulação pelo próprio delator.

Mas também, entendemos que a colaboração premiada constitui uma forma de

incentivar os arguidos a colaborarem com a justiça na investigação de um certo tipo de

criminalidade altamente organizada, v.g., nos crimes de corrupção (que são geralmente

praticados em ambientes ocultos), e nos crimes de branqueamento de capitais, (através dos

ou fizer diminuir, por forma considerável o perigo por ele causado, impedir que seja alcançado o resultado que a

lei quer evitar que se verifique, auxiliar de modo concreto, as autoridades na recolha de provas decisivas para a

identificação ou a captura de outros agentes responsáveis, particularmente, quando se tratar de grupos,

organizações ou associações, poderá a pena ser-lhe especialmente atenuada ou decretada a sua isenção”. 75

Germano Marques da Silva, apud, Mafalda Matos,O Direito Premial no Combate ao Crime de Corrupção,

disponível na Internet: <URL:

http://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/16884/1/Trabalho%20Final%20de%Mestrado.pdf.> [Consult.

22.02.2017] pelas 13 horas e 45 minutos. 76

Luigi Ferrajoli, apud, A Delação Premiada no Direiro Brasileiro, disponível na Internet: <URL:

http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2006_1/ricardo.pdf.>

[Consult.08.02.2017], as 9 horas e 30 minutos.

Page 36: FACULDADE DE DIREITO...do acusado tornando-se imperiosa a sua absolvição em respeito ao princípio in dúbio pro reo. Mais ainda, é que não devem ser usadas para a condenação

26

quais se oculta a prática de outros crimes), os quais sem a colaboração dos implicados,

grande parte deles nunca seriam esclarecidos77

.

Outrossim, é que não se deve olvidar o facto de muita das vezes os “Líderes” das

organizações criminosas serem “homens da trás” e usarem os seus “seguidores” para

executarem o seu trabalho e, portanto, para se chegar até eles e descobrir como funciona a

organização torna-se necessário usar os “homens da frente”, que nem por isso deixam de ser

considerados criminosos. Até porque indo ao encontro do que dissemos acima, o julgador não

deve apenas decidir com base nas declarações prestadas pelo delator, devendo as declarações

destes serem corroboradas por outros elementos de prova existentes no processo.

77

Segundo consta, “Se não fossem os acordos de colaboração pactuados entre Procuradores da República e os

investigados, o caso Lava Jato não teria alcançado evidências de corrupção para além daquela envolvendo Paulo

Roberto Costa. Existia prova de propinas inferiores a R$ 100 milhões. Hoje são investigados dezenas de agentes

públicos, além de grandes empresas, havendo evidências de crimes de corrupção envolvendo valores muito

superiores a R$ 1 bilhão. Apenas em decorrência de acordos de colaboração, já se alcançou a recuperação de

cerca de meio milhão de reais” – cfr. Colaboração Premiada – Caso Lava Jato, Acordos de colaboração com

investigados e réus, disponível na Internet: <URL: http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-lava-

jato/autuacao-na-1a-instancia/investigacao/colaboracao-premiada>. [Consult. 28/11/2017], pelas 13 horas e 30

minutos.

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27

CAPÍTULO III

1. Análise Processual

1.1. Auto de notícia do crime

Antes de mais importa referir que os crimes de corrupção, a par do crime de aceitação

de oferecimento ou promessa, assumem a natureza de crimes públicos, tendo em conta que o

respectivo procedimento criminal não depende de queixa78

.

A iniciativa do procedimento criminal nos crimes de corrupção lato sensu pode ser

levada a cabo por qualquer pessoa de modo a que seja instaurada a competente investigação

criminal79

. Entretanto, havendo queixa, ou denúncia, esta deverá ser escrita ou reduzida a

termo e assinada, ou sob a forma de anonimato, devendo conter as informações sobre os

factos, a sua autoria e as provas de que se tenha conhecimento, sob pena de ser indeferida,

sem prejuízo de o MP poder accionar os mecanismos que julgar convenientes para a

investigação e prosseguimento dos factos, ora denunciados.

1.2. Natureza jurídica dos crimes de corrupção

Os crimes de corrupção assumem a natureza de crime público, atendendo e

considerando que o MP pode promover o processo por sua iniciativa, isto é, tem sempre

legitimidade para promover o processo penal, desde que tenha conhecimento da existência de

factos relativos ao crime de corrupção – cfr. art. 12º da Lei 6/2004.

À semelhança do que acontece em outros TLC, e muito embora não haja uma

disposição legal expressa nesse sentido, parece-nos que nos crimes de corrupção, o titular do

interesse especialmente protegido com a incriminação (que pode ser qualquer pessoa), tendo

em conta o bem jurídico protegido que é a “Autonomia intencional do Estado”, pode

constituir-se em assistente, o qual deverá sempre estar representado por um Advogado – cfr.

art. 5º do Dec. 35007, e colaborar com o MP na investigação dos factos jurídicos com

relevância criminal com vista à condenação dos autores – cfr. art. 4º do Decreto-Lei 35007.

Na sua actividade de investigação, o assistente pode requerer diligências que se

afigurarem pertinentes, oferecer provas e deduzir acusação independente da do MP (embora

78

Entendida como sendo “A transmissão ao MP ou a outras entidades, que a deverão transmitir àquele, por

qualquer pessoa, singular ou colectiva, da manifestação de vontade de instauração de procedimento criminal

(…)”, cfr. Enriques Eiras, Processo Penal Elementar, 6ª Edição (Actualizada), Lisboa, Quid Juris? – Sociedade

Editora, Lda, 2005, pág. 21. 79

Considerada como sendo “O conjunto de diligências que, nos termos da lei processual penal, visam averiguar

a existência de um crime, determinar os seus agentes e a sua responsabilidade e descobrir e recolher provas, no

âmbito do processo”. Idem, pág. 49.

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28

se subordine a esta) e ainda que o MP se tenha abstido de acusar, e caso não se conforme com

a decisão poderá legitimamente interpor recurso.

1.3. Detenção em flagrante delito ou mediante denúncia

Nos termos do disposto no art. 288º do CPP considera-se “Flagrante delito todo o

facto punível que se está cometendo ou se acabou de cometer. Reputa-se também flagrante

delito o caso em que o infractor é, logo após a infracção, perseguido por qualquer pessoa,

ou for encontrado a seguir à prática da infracção com objectos ou sinais que mostrem

claramente que a cometeu ou nela participou”.

Como se pode depreender, daqui resulta que temos três situações em que se considera

que o infractor foi detido em flagrante delito: a primeira verifica-se durante a execução do

crime, a segunda quando o infractor é surpreendido no local da infracção, depois de o

cometer e com sinais evidentes da prática da infracção (quase flagrante delito) e por último

quando o infractor não é encontrado no lugar da prática da infracção, mas é perseguido logo

após a prática da mesma e é encontrado com sinais ou objectos que evidenciam a sua

comparticipação.

Ora, nos crimes de corrupção, o procedimento criminal, para além de ser da iniciativa

do MP, pode ainda iniciar com a detenção do infractor em flagrante delito,

independentemente de ordem escrita, devendo esta ser levada a cabo por todas as autoridades

ou agentes de autoridade ou por qualquer pessoa do povo, isto por um lado - vide arts. 287º a

289º do CPP.

Por outro lado, não sendo o crime cometido em flagrante delito, para se levar a cabo o

procedimento criminal, deve ser feita denúncia dos factos. Neste tipo de situações a detenção

só pode ser efectuada mediante autorização do Juiz – cfr. Ac. n.° 04/CC/2013, de 17 de

Setembro.

1.4. Características dos crimes de corrupção

É doutrina dominante que pelas suas características, nos crimes de corrupção

raramente se procede à denúncia dos factos e, como refere Cláudia Santos80

, “A dificuldade

de descobrir e, ainda mais, de recolher provas do cometimento do crime de corrupção

começa, antes de mais, nas suas próprias características, que o tornam num crime muito

particular”.

80

Cláudia Santos, apud, Luís Miguel Gonçalves Fernandes Campos, A corrupção e a sua Dificuldade

Probatória – O Crime de Recebimento Indevido de Vantagem, in RMP, N.°137, Ano 36, Propriedade e Edição:

SMMP, Lisboa, Janeiro/Março, 2014, págs. 118 e 119.

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29

Por seu turno, Jorge dos Reis Bravo81

refere que “os processos corruptivos

associam-se, em geral, a características que podem enunciar-se nos seguintes vectores:

opacidade, complexidade e ausência de consciência de vitimização. Tais características

potenciam de forma acentuada, por um lado, a ocorrência de assinaláveis “cifras negras”, e,

por outro, o insucesso no combate ao fenómeno, por parte das instâncias formais de

controlo, incluindo os tribunais”. E, acrescenta ainda este mesmo Autor que “(…) O certo é

que a falta de consciência de vitimização (por parte do interveniente activo) é, muitas vezes,

desresponsabilizante e traduz-se numa patente falta de interesse e vontade de colaboração

com as autoridade. Isso potencia o aumento das cifras negras e o défice de denúncia,

investigação e de responsabilização dos agentes”82

.

E mais, Ricardo Lamas83

refere que “A corrupção assenta precisamente na

existência de um acordo entre corruptor e corrompido, numa acção que se não faz a

descoberto e que é envolta nas maiores cautelas de sigilo”. O mesmo Autor acrescenta que

“ora, atenta tal consensualidade subjacente e a inexistência de uma “vítima imediata”, a

corrupção lato sensu é crime de rara denúncia: por um lado, os envolvidos não têm interesse

em quebrar tal consenso e em expor-se; por outro, inexistem terceiros com conhecimento dos

factos e, mesmo existindo, nada têm a “ganhar” com a denúncia, podendo até sofrer

consequências pessoais ou profissionais pela delação”84

.

E ainda, citando Tony Kwok Man-Wai85

“The offenders can be equally as

professional as the investigators and know how to cover their trails. The offenders can be

also very powerful and ruthless in enforcing a code of silence amongst related persons

through intimidation and violence to abort any investigation”.

Como se pode depreender, os Autores acima referenciados são unânimes no

pensamento de que nos crimes de corrupção para além da difículdade probatória, raramente é

feita a denúncia dos mesmos, o que se deve ao carácter secreto em que tanto o corrupto assim

como o corrompido se recusam a deixar marcas da ocorrência do crime, isto por um lado. Por

outro lado, é que tendo em conta o facto de este tipo de criminalidade ocorrer, na maioria das

vezes em ambientes privados quase que nunca existem testemunhas dos factos e, havendo-as,

estas não prestam a sua colaboração às autoridades por receio de represálias ou então por

81

Jorge dos Reis Bravo, ob. cit., pág. 72. 82

Idem, pág. 73. 83

Ricardo Lamas, ob. cit., pág. 114. 84

Idem.

85

Tony Kwok Man-Wai, Investigation of Corruption Cases, disponível na Internet: <URL:

http://www.unafei.or.jp/english/pdf/Rs-N079/N079-19VE-Man-Wai2.pdf>. [Consult. 06.02.2017], pelas 12h e

25 mns.

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30

terem alguma relação de proximidade com os autores do crime ou ainda por entenderem que

neste tipo de criminalidade dificilmente se chega à condenação dos envolvidos por

“inoperância” do sistema judiciário, ou então porque o seu silêncio pode resultar no

recebimento de contrapartidas monetárias.

Com efeito, em Moçambique, embora a Lei n.°6/2004, de 17 de Junho preveja a

possibilidade de que sejam feitas denúncias anónimas, respeitando-se e assegurando-se a

efectividade do direito à liberdade de expressão e denúncia de factos relativos à possibilidade

de existência de corrupção ou outras irregularidades, meio passo andado para a investigação

dos crimes de corrupção, entendemos que não raras vezes poderão ocorrer casos de denúncias

caluniosas86

, manchando o “bom nome” dos supostos agentes correndo sérios riscos de serem

investigados por crimes que não cometeram e a sua imagem e dignidade manchadas para

sempre pondo em causa a sua nomeação para cargos públicos, se considerarmos aqueles

países em que a verdadeira democracia se caracteriza pelo controlo que a comunidade exerce

sobre os seus representantes.

Não é por acaso que Renzo Orlandi87

se refere ao facto de se dever “usar uma

cautela particular no controle das notícias de crime em face de <homens de poder>, mais

expostos do que os cidadãos comuns a partidárias campanhas de imprensa ou a ataques

políticos”.

Mas, mais do que isso, julgamos que o mais importante é a criação de mecanismos

adequados de recolha de queixas a nível da administração pública e de protecção dos

potenciais denunciantes de modo a que estes se sintam seguros e certos de que ao

apresentarem uma denúncia não serão alvo de retaliações e que a investigação será levada a

cabo até ao desfecho final do caso, com a consequente condenação dos que se provar terem

praticado este tipo de actividades criminosas88

.

86

Até porque segundo afirmação de Elena Burgoa, Outros Desafios no Combate À Corrupção: Reflexões A

Propósito do Acórdão “Bargão e Domingos Correia C. Portugal” (TEDH 2012), in Os Crimes de Fraude E A

Corrpução no Espaço Europeu, ob. cit., pág. 199, “É uma constatação histórica que os processos por corrupção

se fazem acompanhar frequentemente do surgimento de acções por difamação”. E, acrescenta a mesma Autora

que “Esta tendência é documentada no elevado número de queixas entradas e julgadas nos tribunais portugueses

e no que diz respeito a litigação transnacional constata-se que quando os tribunais nacionais falham, o uso do

Tribunal Europeu dos Direitos Humanos face às situações de violação do direito à liberdade de expressão

constitui, cada vez mais, um recurso credível”. 87

Cfr. Renzo Orlandi, ob. cit., pág. 390. 88

Até porque o artigo 33º da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção estabelece que “Cada Estado

Parte deverá considerar a incorporação no seu sistema jurídico interno de medidas adequadas para assegurar a

protecção contra qualquer tratamento injustificado de quem preste, às autoridades competentes, de boa-fé e com

base em suspeitas razoáveis, informações sobre quaisquer factos relativos às estabelecidas em conformidade

com a presente convenção”.

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31

Em Moçambique temos a Lei n.°15/2012 de 14 de Agosto que “Estabelece

mecanismos de protecção dos direitos e interesses das vítimas, denunciantes, testemunhas,

declarantes ou peritos em processo penal e cria o Gabinete Central de Protecção à Vítima”.

No entanto, ao que nos parece esta Lei não se mostra totalmente eficaz à protecção dos

sujeitos beneficiários da mesma pois um dos pressupostos da sua aplicação é que o crime seja

punível com pena de prisão superior a dois anos89

.

Como se pode ver a lei acima citada está condicionada a molduras penais, e não

abrange a todas as manifestações da corrupção. É que, olhando para as disposições que

punem os crimes de corrupção (activa e passiva) e o crime de aceitação de oferecimento ou

promessa, encontramos situações em que a pena aplicável é de prisão e multa, portanto,

inferior a dois anos de prisão (cfr. artigos 501º, n.°1; 502º, n.°1, 503º, n.°1 e 2 e 509º, n°s1 e

2), o que a priori deixa transparecer que nem todas as manifestações de corrupção, os seus

denunciantes merecem protecção da lei, o que é um equívoco legislativo porque a corrupção

é simultaneamente um acto anti-jurídico e anti-ético-moral.

Geralmente, os agentes da corrupção são titulares de cargos públicos a quem basta

uma condenação judicial, independentemente da moldura penal aplicável para lhes arruinar a

personalidade, a habilidade, a capacidade e a legibilidade para a assunpção de cargos

públicos. Em suma, perdem a sua credibilidade perante a sociedade. Daí que entendemos que

não se pode condicionar a protecção dos beneficiários desta lei a molduras penais.

Já em Portugal, temos a Lei n.°93/99, de 14 de Julho (Lei de Protecção de

Testemunhas), que foi posteriormente alterada pelas Leis n.°29/2008, de 4 de Julho e

42/2010, de 3 de Setembro, que visa proteger as testemunhas do poder de pressão e de

intimidação que muitas das vezes é exercido por organizações criminosas que se envolvem

em práticas de corrupção.

No Brasil temos a Lei n.°9.807, de 13 de Julho de 1999 (Lei de Protecção a Vítimas e

Testemunhas), considerada uma lei de extrema importância pois permite levar a cabo as

investigações da polícia para a instrução do processo garantindo a redução da impunidade dos

infractores.

2. Objecto da prova

2.1. Noção:

O objecto da prova “São todos os factos jurídicos relevantes para a existência ou

inexistência do crime, a punibilidade ou não punibilidade do arguido e a determinação da

89

Cfr. art. 3º da Lei n.°15/2012, de 14 de Agosto.

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32

pena ou da medida de segurança, bem como os factos de que se possa inferir a existência de

outros”90

.

2.2. Finalidade da Prova

Segundo ensina Guilherme de Sousa Nucci91

“(…) a finalidade da prova é a

produção do convencimento do juiz no tocante à verdade processual, vale dizer, a verdade

possível de ser alcançada no processo, seja conforme a realidade, ou não”.

Por isso é que em todo e qualquer TLC para que se chegue à condenação dos

implicados/indiciados torna-se necessário que os factos constantes da acusação e pronúncia

sejam levados a julgamento de modo a que o tribunal possa obter as condições necessárias

para firmar a sua convicção sobre a existência ou inexistência dos factos e das situações que

se mostrarem relevantes e com interesse para a decisão da causa92

.

Segundo ensina Figueiredo Dias93

“Muitas legislações do passado, receosas de que

o juiz facilmente incorresse em erro na valoração dos meios de prova a utilizar, reputavam

indispensável prescrever regras de apreciação da prova, assentes em regras da vida e da

experiência que tradicionalmente eram tidas por seguras, e através das quais se fixava ou se

hierarquizava o valor dos diversos meios de prova, segundo a força que a cada um se

atribuía”.

No Direito Processual Penal vigente no ordenamento jurídico moçambicano, à

semelhança do que acontece na generalidade de outros ordenamentos jurídicos vigora o

princípio da livre apreciação da prova94

, na medida em que não há critérios legais acerca do

valor a atribuir a prova. O julgador deve valorar a prova segundo as regras de experiência95

e

da sua livre convicção96

, para a busca da verdade material, devendo a decisão ser sempre

90

Cfr. Enrique Eiras, ob. cit., pág. 71. 91

Guilherme de Souza Nucci, Provas no Processo Penal, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2009, pág.

16. 92

Neste sentido, cfr. Jorge de Figueiredo Dias, Direito Processual Penal – Clássicos Jurídicos, 1ª Edição,

Coimbra Editora, 2004, págs. 198 a 199. 93

Idem, pág. 199. 94

O princípio da livre apreciação da prova, segundo refere Luís Miguel Gonçalves Fernandes Campos, ob. cit.,

pág. 20, “Insere-se num processo de estrutura acusatória, em que há separação de poderes entre o poder de

investigar e o poder de julgar, para que o juiz possa, verdadeiramente, actuar como um terceiro imparcial.

Assim, caberá à acusação reunir todas as provas que considere relevantes para fundamentar a tese da

culpabilidade do acusado, que terá o direito fundamental à defesa”. 95

As quais, “Servem para produzir prova de primeira aparência (prima facie evidence), na medida em que

desencadeiam presunções judiciais (praesumptio judicis), simples, naturais, de homem, de facto ou de

experiência (…), que são aquelas que não são estabelecidas pela lei, mas se baseiam apenas na experiência da

vida”. Cfr. Paulo de Sousa Mendes, A prova penal e as regras da experiência, in Direito da Investigação

Criminal e da Prova, Coimbra, Edições Almedina, 2014, pág. 129. 96

No entanto, importa esclarecer que a livre convicção do juiz deve sempre ter por base a prova careada nos

autos. E, tal como ensina Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt. 6), pág. 202, “(…) a liberdade de apreciação da

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33

fundamentada, para se evitarem arbitrariedades. A excepção ao princípio da livre apreciação

da prova só se verifica quando a lei estabelecer de modo contrário, por ex., o que sucede com

o valor probatório da confissão e (dos documentos autênticos)97

.

Ora, ao falar-se de decisão, deve ter-se em conta que se trata de uma decisão judicial,

a qual é caracterizada por Hermann Isay, “(…) como um (querer) que, (sendo uma

aspiração, se baseia num sentir de valores”98

. Na opinião deste mesmo Autor “o valor da

justiça é (manifestamente inapreensível para a razão) e, por outro lado, porque a decisão,

como acto jurídico, se dirige à justiça, essa decisão tem de aparecer necessariamente como

(irracional), ou seja, como (produzida pelo sentimento jurídico)”99

.

Não podemos, porém, olvidar o facto de que ao se falar de decisão judicial deve

sempre ter-se em conta o magistrado judicial, a quem cabe administrar a justiça, através da

condução e julgamento dos processos judiciais que se encontrem sob a sua alçada,

assegurando a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos.

Daí que sendo a decisão judicial tomada pelo homem, ela não depende inteiramente

da ciência ou da técnica, subordinando-se a outros elementos que têm a ver com a sua

natureza racional, livre e social e, como tal, deve ser motivada para que ninguém duvide da

razão porque o juiz decidiu de uma determinada forma e não de outra.100

2.3. Meios de Prova

Os meios de prova caracterizam-se pelas suas aptidões para, através da percepção,

formar e fundamentar um juízo101

, como sejam, as declarações dos ofendidos, das

testemunhas, dos documentos, e outros.

Em processo penal, para a demonstração da veracidade dos factos alegados é admitida

a prova directa102

e a prova indirecta103

que pode culminar com a condenação ou a absolvição

dos indiciados da prática de qualquer TLC, incluindo os crimes objecto do presente estudo.

prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada verdade material -

, de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos, portanto, em geral

susceptível de motivação e de controlo (possa embora a lei renunciar à motivação e ao controlo efectivos”. 97

Pois, segundo ensina Paulo de Sousa Mendes, ob. cit. (nt. 95), pág. 126, em relação a este tipo de documentos

”O legislador deu forma legal à regra de experiência comum segundo a qual, em princípio, merecem crédito os

factos que forem testemunhados por uma entidade credenciada, que lavrou o documento (…)”. 98

Cfr. Hermann Isay, apud, Karl Larenz, Metodologia da Ciência do Direito, 3ª Edição (Tradução de José

Lamego), Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian, 1997, págs. 80 a 81. 99

Idem. 100

Sobre a necessidade de motivação da decisão judicial – cfr. art. 158º, n.°1, do CPC. 101

Neste sentido, cfr. Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal II, 4ª Edição, Lisboa/São Paulo,

Editorial Verbo, 2008, pág. 113. 102

Definida por Jorge dos Reis Bravo, ob. cit., pág. 165 como sendo “aquela que resulta de documentos,

testemunhos, confissão, perícia ou inspecção do facto criminoso”.

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34

Ora, como foi referido na parte introdutória, nos crimes de corrupção lato sensu

raramente se chega à condenação dos indiciados por ser difícil a comprovação dos factos

alegados e, havendo condenação esta é muita das vezes forçada.

Mais ainda, é que mesmo que o réu confesse o crime e não havendo nos autos outros

elementos de prova que corroborem a sua confissão dificilmente se chegará à condenação

tendo em conta o estabelecido no artigo 174 do CPP104

. Daí que não raras vezes os

implicados são absolvidos com fundamento no princípio in dúbio pro reo. Trata-se de um

princípio relativo à prossecução processual, segundo o qual existindo alguma dúvida sobre os

factos imputados ao arguido, esta deve ser sempre valorada a favor do mesmo, atendendo e

considerando que o juiz não pode terminar o julgamento com um non liquet, ou seja, se a

prova produzida em julgamento não for suficiente para firmar a convicção do juiz no sentido

da culpa ou inocência do arguido, então este deve ser absolvido.

Até porque, segundo ensina Cláudia Santos105

há certas formas de delinquência que

“pela complexidade das condutas que a integram, plurilocalização das infracções, limites no

acesso a contas bancárias, dispersão da responsabilidade dos indivíduos que actuam no

interesse da organização, complexidade dos registos contabilísticos e pelas próprias dúvidas

doutrinais sobre muito do crime de colarinho branco, colocam grandes dificuldades que

constituem fortes entraves à efectividade da punição”. E nestas situações muitas vezes os

suspeitos são absolvidos sendo, por isso, escassa a jurisprudência em termos de condenações

por crimes de corrupção. Mas, apesar dessa escassez, e no âmbito da pesquisa que nos

propusemos levar a cabo, trazemos aqui alguns exemplos de jurisprudência sobre casos de

corrupção que foram provados em tribunal106

.

103

“A prova indirecta é aquela que permite a passagem de um facto conhecido ao facto desconhecido”, cfr.

Paulo de Sousa Mendes, ob. cit. (nt. 95), pág. 121. 104

Onde se estabelece que “A confissão do arguido desacompanhada de quaisquer outros elementos de prova

não vale como corpo de delito. § único. Ainda que o arguido tenha confessado a infracção, o juiz deverá

proceder a todas as diligências para o apuramento da verdade, devendo investigar, com todos os elementos de

que dispuser, se a confissão é ou não verdadeira”. 105

Cláudia Santos, apud, Jorge Marques, Métodos de Investigação da Criminalidade Económico-Financeira”,

in RMP, N.°110, Ano 28, Propriedade e Edição: SMMP, Lisboa, Abr-Jun., 2007, pág. 90. 106

De Moçambique: trazemos o Proc.n.°126/16, em que o Tribunal Judicial da Cidade de Lichinga, numa

decisão proferida pelo Juiz Khaled Varinda, condenou o autarca de Lichinga, Saíde Amido, a 18 meses de

prisão, convertidos em multa e a indemnizar o Estado em 200.000,00 Mt (duzentos mil meticais), por dois

crimes de corrupção passiva para a prática de acto lícito e um crime de abuso de poder por este, na qualidade de

Presidente do Município, ter recebido 150.000,00Mt (cento e cinquenta mil meticais) para autorizar a emissão

de uma licença para a construção de três “take away”, infringindo as normas de atribuição de licenças para o

efeito e ainda por ter recebido, nessa mesma qualidade, uma outra quantia de 200.000,00Mt (duzentos mil

meticais), dos quais 125.000,00Mt (cento e vinte e cinco mil meticais) foram-lhe entregues pelo co-réu Jonas

Pedro (sendo este arguido que procedeu a divisão dos 500.000,00Mts que recebeu dos denunciantes) e os

restantes 75.000,00 Mts (setenta e cinco mil meticais) depositados na sua conta bancária pelo co-réu Adérito

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É incontestável a importância destas decisões por, segundo cremos, fazerem parte das

poucas em que os indiciados foram condenados pela prática de crimes de corrupção e, na

generalidade dos casos, em concurso com outros TLC.

Reportando-nos aos casos “Mensalão” e “Lava Jato”, são crimes que adquiriram uma

enorme dimensão na investigação e tiveram um grande impacto/eco não só no Brasil, mas

também em todo o mundo, por envolverem figuras muito importantes da arena política,

André, neste caso para autorizar a continuação de um projecto de construção de barracas em frente ao Mercado

de Lichinga, o qual havia sido embargado pelo anterior Edil.

Temos também o Proc. n.°376/11, em que o Tribunal Superior de Recurso de Maputo, numa decisão proferida

em primeira instância, pela desembargadora Gracinda Muiambo, condenou um Magistrado do Ministério

Público, pelo crime de corrupção passiva para a prática de acto ilícito em concurso com um crime de abuso de

cargo ou função, por este ter recebido, indevidamente, das mãos do denunciante, uma quantia de 5.000,00Mt

(cinco mil meticais) para destruir um processo que lhe havia sido distribuído. O arguido confirmou a recepção

do valor em causa mas negou que o mesmo se destinasse à prática de um qualquer acto alegando que o

denunciante lhe havia prometido oferecer a referida quantia, a título de ajuda, depois de, dias antes, ter

manifestado aflição quando por mera casualidade se encontraram na zona do Café Continental, na baixa da

cidade, pelo facto de ter recebido uma ordem de corte de fornecimento de água por dívida para com a Empresa

Águas de Maputo, no valor de 8.000,00Mt (oito mil meticais), mas que naquele momento não dispunha de

fundos para arcar com aquela despesa porque estava a atravessar dificuldades financeiras.

De Portugal: tazemos o exemplo, do Proc. Comum Colectivo n.°712/00.9JFLSB, em que o Tribunal Colectivo

do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras condenou, para além de outros arguidos,

Isaltino Morais na pena única de 7 anos de prisão pela prática, em concurso de um crime de corrupção passiva,

um crime de abuso de poder e um crime de branqueamento de capitais. Este arguido foi ainda condenado na

pena acessória de perda de Mandato referente as funções de Presidente da Câmara Municipal de Oeiras, no

pagamento de 463.368,12 Euros, dentre outras imposições legais. Relativamente ao crime de corrupção passiva

o tribunal considerou provado que na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de Oeiras, o arguido

autorizou o licenciamento para a construção de 2 edifícios com áreas de construção superiores às aprovadas pela

CMO no alvará de loteamento, em troca de benefício patrimonial (recebeu um cheque no valor de

4.000.000$00, o equivalente a 19.952,91 Euros). Cfr. o conteúdo da sentença disponível na Internet: <URL:

http://www.inverbis.pt/2012/ficheiros/doc/casoisaltinomorais-trl-04-24t.pdf> [Consult. 28/11/2017], pelas 14

horas.

Do Brasil: Temos o caso “Mensalão” – Acção Penal (AP) 470/STF, relacionado com a existência de um

esquema de pagamento de propina a parlamentares aliados ao (Partido Trabalhista) que recebiam R$ 30 mil

mensais para votar de acordo com os interesses do então governo de Lula da Silva. Neste caso, julgado pelo

plenário do Egrégio Supremo Tribunal Federal (Relator Min. Joaquim Barbosa), foram julgados 37 e

condenados 25 arguidos pelo seu envolvimento no esquema, sendo que os restantes 12 foram absolvidos. Cfr. o

conteúdo da decisão disponível na Internet: <URL: http://www.stf.jus.br/portal/ap470/InteiroTeor_AP470.pdf>.

[Consult. 27/10/2017], pelas 22 horas e 30 minutos. No entanto, tendo em conta que se trata de um acórdão

bastante longo e complexo (8.405 páginas) e com características epecíficas próprias não nos é possível fazer

uma análise detalhada do mesmo, pelo que fizemos a nossa apreciação baseando-nos na “ementa” do Acórdão

disponível na Internet: <URL: https://www.conjur.com.br/dl/ementa-acordao-mensalao.pdf>. [Consult.

27/10/2017], pelas 12h e 30 minutos.

Trazemos também o caso “Lava Jato” relacionado com um conjunto de investigações levadas a cabo pela

Polícia Federal do Brasil, visando apurar um esquema de lavagem de dinheiro que movimentou biliões de reais

em propina. A operação começou em 2014, está em curso e já passou por várias fases operacionais, autorizadas

pelo Juíz Sérgio Moro. Neste processo que iniciou com o número 5043130-64.2014.404.7000 e que foi

desmembrado em vários processos, informação disponível na Internet: <URL: http://www.mpf.mp.br/para-o-

cidadao/caso-lava-jato/autuacao-na-1a-instancia/denuncias-do-mpf>. {Consult. 28/11/17}, pelas 14 horas e 35

minutos, já foram condenadas 116 pessoas por diferentes crimes, como é o caso, por ex., de Luiz Inácio Lula da

Silva, ex-presidente da República, condenado a 9 anos e 6 meses por crimes de corrupção passiva e lavagem de

dinheiro, pela 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba, no Proc. n.°5046512-94.2016.04.04.7000/PR. (decisão

consultada em formato físico).

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membros do poder executivo e legislativo Federal do Brasil, bem como de outras áreas

administrativas.

Em termos processuais, importa fazer um comentário em relação aos meios de prova

que conduziram à condenação dos indiciados nos processos que citamos como exemplos.

Relativamente ao caso “Mensalão”, denunciado pelo então deputado Federal Roberto

Jefferson, para a condenação dos implicados, dentre os quais o considerado mentor do crime,

o ex-Ministro Chefe da Casa Civil José Dirceu, condenado pelo crime de corrupção activa, e

outros membros da cúpula do Partido dos Trabalhadores, foram consideradas “dentre as

provas e indícios as várias reuniões mantidas entre os corréus no período dos factos

criminosos, associadas as datas de tomadas de empréstimos fraudulentos junto a instituições

financeiras cujos dirigentes, a seu turno, reuniram-se com o organizador do esquema (…)”.

Considerou-se ainda que, “A organização e o controle das actividades criminosas foram

exercidos pelo então Ministro-chefe da Casa Civil, responsável pela articulação política e

pelas relações do Governo com os parlamentares (…)”. Neste caso, para fundamentar a sua

decisão, o Supremo Tribunal Federal socorreu-se da teoria do domínio do facto, entendida

como sendo o “dever de saber” e do domínio da organização, entendida como sendo a

situação de “estar ou ocupar uma posição de destaque ou de liderança” no seio de uma

determinada organização onde se cometem os factos puníveis. No entanto, julgamos nós que

o tribunal não fundamentou em que se baseou a participação de cada um dos condenados em

termos de acção ou omissão e nem sequer fez a distinção entre os autores e cúmplices, tendo

sido condenadas todas as pessoas em posição de destaque e que concorreram para a

ocorrência do crime. De referir que o método aqui usado não é consensual pois, o simples

facto de se estar ou ocupar uma determinada posição de destaque no seio de uma

organização, nem sempre nos permite ter o conhecimento ou o domínio dos factos, sendo

certo que esta teoria pode, até certo ponto, conduzir a uma situação de incerteza ou

insegurança jurídica para quem se encontre numa posição de destaque. Até porque, sendo a

responsabilidade criminal individual, cada um deve responder pelos seus próprios actos e não

se pode descurar o facto de que numa sociedade democrática deve respeitar-se o direito a

uma boa adminstração da justiça o qual não pode ser sacrificado por razões de oportunidade.

Relativamente ao “caso “Lava Jato”, o tribunal baseou-se na prova documental

encontrada na residência do réu, no depoimento das testemunhas ligadas ao Grupo OAS e ao

condomínio, que ao que segundo consta, comprovaram que o imóvel em causa pertencia ao

ex-presidente e sua esposa. O tribunal considerou ainda que, apesar do imóvel não estar

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registado em nome do ex-presidente, o mesmo foi alvo de reformas “personalizadas” que

demonstram que o mesmo passou a pertencer ao presidente, para além do facto de ter

prestado declarações que contradizem os documentos e não ter apresentado esclarecimentos

concretos. Como se pode ver, parece-nos que o tribunal fundamentou a sua decisão não só

com base na prova testemunhal e documental, mas também na prova indiciária, apoiando-se

nas regras de experiência comum. Não havendo da nossa parte nenhuma “oposição”.

Relativamente ao Processo n.° 712/00.9 JFLSB, em que foi condenado Isaltino

Morais e outros arguidos, constatamos que o tribunal considerou como meios de prova, as

declarações prestadas pelo próprio réu e os depoimentos prestados pelas testemunhas da

acusação e da defesa, que na sua maioria encontravam-se ligadas ao réu por um vínculo

profissional e estavam numa relação de dependência em relação ao arguido, por serem

funcionários da Câmara onde o mesmo era presidente.Tais meios foram aliçercados no

princípio da livre apreciação da prova, prespectivado como um dever, o de alcançar a verdade

material, e também na prova documental analisada nos autos, em conjugação com a prova

testemunhal. Pelo que julgamos ser consensual a utilização dos meios de prova aqui usados

pelo tribunal.

Quanto aos Processos 126/16 e 376/11, os tribunais que os decidiram consideraram

como meios de prova os respectivos autos de denúncia (que até prova em contrário fazem fé

em juízo), as declarações prestadas pelos arguidos, os depoimentos das testemunhas, o

conjunto de toda a prova examinada em julgamento e de todos os documentos analisados

conjugados com os depoimentos dos ofendidos, para além de terem também se baseado nas

regras de experiência comum. Mais ainda é que a apreensão do valor no caso do Magistrado e

a devolução do valor recebido no caso do autarca de Lichinga e ainda o facto deste, ter

confirmado a recepção de 15 mil meticais na sua conta bancária, constituíram a prova que

decisivamente confirmou as denúncias feitas em ambos os casos. De referir que sendo a

convicção do juiz livre e não contrariando a lógica, a razoabilidade ou o bom sensu, nada

temos a desabonar relativamente aos meios de prova considerados pelos tribunais para a

condenação destes réus, pelos crimes de corrupção, tal como foram considerados pelas

respectivas instâncias.

Ora, não é nenhuma novidade que a tarefa de julgar não é nada fácil, acima de tudo,

quando se está perante casos de grande multiplicidade de factos e quando os mesmos são

praticados em ambientes ocultos e sem ninguém que os possa testemunhar, impossibilitando

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ou dificultando a descoberta da “verdade absoluta”107

e a consequente punição dos suspeitos.

Pelo que, por estas e outras razões, e como única possibilidade de se ultrapassar o vazio

muitas vezes criado pela falta de prova directa deve recorrer-se à prova indirecta, que tem

muita importância no processo penal visto que, sem o recurso a ela, muitos crimes ficariam

impunes.

Até porque, recorrendo ao que diz Renzo Orlandi108

, “A corrupção, se sabe, é crime

difícil de provar, porque todos aqueles que participam têm interesse em ocultar ou

dissimular a conduta ilícita. Daí a necessidade de apuração por via indirecta”.

Outrossim, embora a regra seja a da primasia da prova directa sobre a prova indirecta,

Guilherme Nucci109

ensina que “Uma prova indirecta pode ter mais força que a directa,

desde que impulsione o convencimento do magistrado. Este, no entanto, no sistema da

persuasão racional, deverá fundamentar o porquê da aceitação da prova indirecta em

detrimento da directa, afinal esta última, em tese, é mais autêntica (…)”.

A este propósito, interessa trazer aqui um julgado com o seguinte conteúdo: “A prova

se faz não só de maneira directa, mas também por indícios e presunções, que devem ser

analisados como todo e qualquer outro elemento de convicção, à luz do princípio do livre

convencimento do juiz. Os indícios, quando não contrariados por contra-indícios, ou por

prova directa, autorizam o juízo de culpa do acusado e sua condenação”110

.

Por isso é que, Euclides Dâmaso Simões111

refere que “(…) a prova indirecta,

indiciária, circunstancial ou por presunções (…) tem que ganhar adequada relevância

jurisprudencial e dogmática também entre nós. Sob pena de a justiça não se compatibilizar

com as exigências do seu tempo e de se agravar insuportavelmente o sentimento de

impunidade face aos desafios criminosos de maior complexidade e desvalor ético”.

É de salientar que a doutrina e a jurisprudência espanhola do Tribunal Constitucional

e do Tribunal Supremo, aplaudidas pela doutrina, entendem que a eficácia probatória da

107

Que não é a que se pretende, por não ser possível alcançá-la, mas sim uma verdade provável, isto é, uma

verdade que conduza o julgador a firmar uma forte convicção sobre a certeza da verdade dos factos. Neste

sentido, veja-se o Ac. do TRL; Proc. n.°679/06.0GDTVD.L1-3; Relatado por João Carlos Lee Ferreira; onde se

decidiu que: “A verdade a que se chega no processo não é a verdade verdadíssima, mas uma verdade judicial e

prática, uma<<verdade histórico-prática e, sobretudo, não [é] uma verdade obtida a todo o preço, mas

processualmente válida>>. Trata-se de uma verdade aproximativa ou probabilística, como ocorre com toda a

verdade empírica, submetida a limitações inerentes ao conhecimento humano e adicionalmente condicionada

por limites temporais, legais e constitucionais. (…)”. Disponível na Internet: <URL:

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/8e6a4b734855238b80257a3a00628c9f?Open

Document>. [Consult.14.11.2017] pelas 10 horas e 15 minutos. 108

Renzo Orlandi, ob. cit., pág. 380. 109

Guilherme de Souza Nucci, ob. cit., pág. 21. 110

Cfr. (JTACrim,7:105), in Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha, Da Prova no Processo Penal, 5ª Edição,

São Paulo, Editora Saraiva,1999, pág. 206. 111

Euclides Dâmaso Simões, apud, Jorge dos Reis Bravo, ob. cit., pág. 165.

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prova indiciária112

está dependente da verificação de quatro requisitos: 1º Prova dos indícios;

2º Concorrência de uma pluralidade de indícios (…), 3º Raciocínio dedutivo e 4º Motivação

da sentença113

:

Ora, embora sejamos de opinião que a justiça penal não deve ser realizada a todo o

custo, concordamos com a posição doutrinária e jurisprudencial que defende que deve ser

dada relevância à prova indiciária, indirecta ou por presunções, de modo a que se possam

esclarecer certas realidades criminais, tendo em atenção ao facto de em alguns casos ser

difícil a obtenção da prova directa, pelas razões acima mencionadas. A este propósito,

trazemos aqui dois exemplos de acórdãos em que na decisão se deu relevância à prova

indiciária114

.

Como se pode depreender, nos exemplos aqui citados os tribunais deram relevância à

prova indiciária permitindo a realização da justiça em situações em que caso não se

recorresse a este tipo de prova o fim seria a absolvição dos indiciados, em respeito ao

princípio in dúbio pro reo. De referir que a prova indiciária, indirecta ou por presunções, a

designação é indiferente, à semelhança da prova directa não é isenta de erros, mas não restam

112

Paulo de Sousa Mendes, ob. cit. (nt. 95), pág. 121, ensina que “é no campo da prova indiciária que as regras

de experiência se tornam necessárias, na medida em que ajudam à realização da passagem do facto conhecido ao

facto desconhecido”. 113

Detalhando: 1º Prova dos indícios: os indícios devem estar plenamente provados por meio de prova indirecta

e não serem meras conjecturas ou suspeitas, por não ser possível construir certezas sobre probabilidades; 2º

Concorrência de uma pluralidade de indícios (…): salvo em casos excepcionais, um único facto (indício)

impede a formulação de uma convicção judicial com base na prova indiciária. Para além dessa pluralidade

exige-se ainda que os indícios sejam periféricos relativamente ao facto a provar, assim como estejam

interligados com o facto nuclear carecido de prova e que não percam força pela presença de contra-indícios que

neutralizem a sua eficácia probatória; 3º Raciocínio dedutivo: entre os indícios provados e os factos que deles se

inferem deve existir um nexo preciso, directo, coerente, lógico, racional (…); 4º Motivação da sentença: o

tribunal deve explicitar na sentença o raciocínio em virtude do qual partindo dos indícios provados chega à

conclusão da culpabilidade do arguido. Por isso “a sentença baseada em indícios deve ter uma extensa e

abundante motivação”. Cfr. Banner, Manual de Boas Práticas no Combate à corrupção, disponível na Internet:

<URL: http://dciap.pgr.pt/Estudos/07_00/Area_trabalho.html>. [Consult. 24/10/2015], pelas 16 horas. Vide,

igualmente, Jorge dos Reis Bravo, ob. cit., pág. 168.

114

1º. Ac. da Relação de Évora, Proc.n.°621/01-I; relatado por Ribeiro Cardoso; em 29/11/2005; onde se decidiu

que “O juízo valorativo do tribunal tanto pode assentar em prova directa como em prova indiciária da qual se

infere o facto probando, não estando excluída a possibilidade do julgador, face à credibilidade que a prova lhe

mereça e as circunstâncias do caso valorar preferencialmente a prova indiciária, podendo esta só por si conduzir

à sua convicção, sendo certo que, não raras vezes, o julgamento da matéria de facto não tem correspondência

directa nos depoimentos concretos, resultando antes da conjugação lógica de outros elementos probatórios que

tenham merecido a confiança do tribunal”. Disponível na Internet: <URL:

http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/7065232571dae4e780257de100574844?Open

Document>. [Consult. 14/11/17], pelas 10 horas e 45 minutos.

2º - Ac. do Tribunal da Relação de Lisboa, Proc. n.°10693; relatado por Carlos Almeida; onde se decidiu que

“(…). VII – Embora se trate de uma prova de natureza indutiva que, como todo o conhecimento baseado em

raciocínios desta natureza, só proporciona um conhecimento provável, não é, por isso, e à partida, menos fiável

do que a prova directa, que também pressupõe operações de natureza indutiva” Disponível na Internet: <URL:

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/bee6a8a04b2fd883e8025754000391013?Open

Document>. [Consult.14.11.17], pelas 10 horas e 15 minutos.

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dúvidas de que constitui uma mais-valia para a redução das “cifras negras” e do défice de

responsabilização dos agentes deste tipo de criminalidade.

No entanto temos de salientar que na nossa jurisprudência, a tomada de decisões com

base na prova indiciária é quase que inexistente, quiçá por se entender que esta não constitui

um meio de prova ou então por ser considerada de “menor” valor em relação à prova directa.

E, mesmo nos casos em que se decide com base nela, a fundamentação não é suficientemente

esclarecedora quanto aos requisitos que a fundamentam.

2.4. Elementos que devem ser provados nos crimes de corrupção lato sensu:

2.4.1. A qualidade de funcionário e o cargo que exerce;

Nos crimes de corrupção, o processo deve conter elementos suficientes que

comprovem que o agente visado está vinculado a uma determinada instituição, na qualidade

de servidor público e que ao solicitar ou receber a peita ou suborno, fá-lo como resultado de

uma contra-partida pela prática, que pode ser futura ou passada, de um acto concreto

(positivo ou negativo) que se insere nos poderes do seu cargo devendo para tal provar-se as

funções ou o cargo que o mesmo exerce na administração pública.

Já em relação ao crime de aceitação ou oferecimento de promessa, deve provar-se que

o agente visado está vinculado a uma determinada instituição, na qualidade de servidor

público e o cargo ou funções que exerce, de modo a aferir-se se a peita ou o suborno foi

recebido no exercício ou por força do exercício das funções do agente visado pela actividade

criminosa, ou seja, baseia-se no simples facto de a vantagem lhe ser atribuída em razão de

estar investido no exercício de funções públicas115

.

2.4.2. Demonstração da origem e destino da vantagem

Nos crimes de corrupção, torna-se necessário provar que a vantagem solicitada ou

recebida pelo servidor público destina-se a prática de um acto em concreto que implique

violação dos deveres do cargo ou a omissão ou demora de um acto que o mesmo tenha o

dever de praticar.

No crime de aceitação de oferecimento ou promessa, torna-se importante demonstrar

que o acto pretendido pelo particular está relacionado com a função exercida pelo servidor

público, e que cabe no âmbito das suas competências e, não se provando a correspondência

entre o acto e a função, estar-se-á perante uma conduta atípica.

115

Neste sentido, cfr. Rita Maria Meira Niza, ob. cit, pág. 17.

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2.4.3. Existência ou não de algum interesse do particular relacionado com a actividade

exercida pelo funcionário;

Nos crimes de corrupção é necessário que se faça a prova de que a vantagem recebida

pelo servidor público destinava-se à realização de um acto compreendido nas suas

competências ou, pelo menos, nos “poderes de facto” dela decorrente.

Nos crimes de oferecimento ou promessa, não basta que o particular ofereça uma

benesse ao servidor público, é necessário que se prove que aquele tinha algum interesse

relacionado com a actividade exercida pelo servidor público, ainda que não seja determinada

de imediato, podendo até destinar-se a criar um ambiente de permeabilidade.

2.4.4. Existência ou não de solicitação vs aceitação ou dádiva vs promessa.

Relativamente a este aspecto, tanto num como noutro TLC, o que se pretende é saber

o que realmente aconteceu e como é que os factos se deram, v.g., se houve ou não alguma

solicitação feita pelo servidor público e como foi feita; se houve aceitação do suborno e saber

em que é que se traduziu (por ex., se houve entrega de algum valor ou se houve transferências

bancárias feitas) devendo, embora não seja essencial para a qualificação da conduta do agente

infractor saber o valor exacto do suborno.

2.4.5. Existência ou não de dolo por parte do servidor público.

Nos crimes de corrupção é necessário que se prove que o servidor público tinha

conhecimento e vontade de obter uma vantagem que não lhe era devida como contrapartida

de uma actuação que viole os deveres do seu cargo, solicitando ou aceitando uma peita ou

suborno e, em relação a quem oferecia a peita ou suborno se conhecia a qualidade do servidor

público e sabia que a vantagem não lhe era devida.

No crime de aceitação de oferecimento ou promessa, é necessário saber se o servidor

público visado agiu ou não com dolo, que se traduz no conhecimento de que a vantagem não

lhe era devida e que lhe era oferecida em razão das suas funções e na vertente do particular, o

dolo traduz-se no conhecimento de que o agente conhecia a qualidade do servidor público e

que as benesses que lhe eram oferecidas não lhe eram devidas, mas que consubstanciavam

uma certa contrapartida de vantagens presentes ou futuras, embora não sendo determinadas

de imediato.

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3. Meios de Obtenção de Prova

3.1. Definição:

Segundo ensinamento de Germano Marques da Silva116

“Os meios de obtenção de

prova são instrumentos de que se servem as autoridades judiciárias para investigar e

recolher meios de prova; não são instrumentos de demonstração do thema probandi, são

instrumentos para recolher no processo esses instrumentos”. E, segundo ensina o mesmo

Autor “Os meios de prova caracterizam-se pela sua aptidão para serem por si mesmos fonte

de convencimento, ao contrário do que sucede com os meios de obtenção da prova que

apenas possibilitam a obtenção daqueles meios”117

.

3.2. Métodos proibidos de obtenção de prova

Em termos de legislação penal os ordenamentos jurídicos adoptaram dois sistemas o

das provas taxativas (como a portuguesa e a moçambicana) e o das provas enunciativas,

como acontece no Brasil, em que a lei processual indica as provas legais, não vedando a

produção de outras provas possíveis, sendo que a Constituição Federal estabelece no art. 5º,

LVI que “São inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. E, por força

deste preceito constitucional o art. 157º do CPP brasileiro estabelece que “São inadmissíveis

devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em

violação a normas constitucionais ou legais”. Esta proibição aplica-se não só no processo

penal, mas em qualquer tipo de processo, quer seja judicial, quer seja administrativo.

A CR de Moçambique estabelece no artigo 65º, n.°3, que “São nulas todas as provas

obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva

intromissão na sua vida privada e familiar, no domicílio, na correspondência ou nas

telecomunicações” fixando, deste modo, o quadro de provas proibidas.

Por outro lado, o art. 173º do CPP estabelece que “O corpo de delito pode fazer-se

por qualquer meio de prova admissível em direito”, o que significa que tudo aquilo que não

for vedado por lei é permitido.

Em Portugal, o art. 32º, n.°8, da CR, estabelece que “São nulas às provas obtidas

mediante tortura, coação, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva

intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações”.

Por seu turno, o art. 126º, n.°1 e n.°3, do CPP estabelece que “São nulas, não podendo ser

utilizadas, as provas obtidas mediante tortura, coação ou, em geral, ofensa da integridade 116

Germano Marques da Silva, ob. cit. (nt.101), pág. 233. Vide, igualmente, Paulo de Sousa Mendes, ob. cit.

(nt.18), pág. 179. 117

Idem (Germano Marques da Silva), pág. 233.

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física ou moral das pessoas e que ressalvados os casos previstos na lei, são igualmente nulas

as provas obtidas mediante intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência

ou nas telecomunicações sem o consentimento do respectivo titular”.

Como se pode depreender, nos diferentes ordenamentos jurídicos, a tortura, a coacção

ou a ofensa da integridade física ou moral da pessoa humana são métodos considerados

absolutamente interditos/proibidos, o que deriva, directamente, do princípio da dignidade

humana, que deve ser sempre preservada.

E, tal como ensina Figueiredo Dias118

“têm de considerar-se proibidos e

inadmissíveis em processo penal todos os meios de interrogatório e de obter declarações que

importem ofensa à dignidade da pessoa humana, à integridade pessoal (física ou moral) do

arguido, em especial os que importem qualquer perturbação da sua liberdade de vontade e

decisão”.

No entanto, torna-se importante salientar que apesar da proibição de obtenção da

prova através de certos métodos ilícitos, há que ter em conta que o exercício dos direitos e

liberdades podem ser limitados em razão da salvaguarda de outros direitos ou interesses

protegidos pela Constituição – cfr. art. 56º, n.°2, da CRM, como por ex., nos casos de

realização de buscas autorizadas.

Mas, mesmo assim, e como refere Jorge Reis Novais119

, “Desde sempre, haverá

sempre níveis mínimos de respeito, protecção e promoção da autonomia, liberdade e bem-

estar individuais que, enquanto exigências directamente determinadas pela dignidade da

pessoa humana, terão de ser observados sob pena de inconstitucionalidade”, v.g, mesmo no

caso de realização de buscas autorizadas estas devem obedecer ao regime legalmente

estabelecido, sob pena de nulidade.

Não é por acaso que Guilherme de Souza Nucci120

refere que “Afinal, o que é

injusto, ilegal, contrário ao ordenamento jurídico, não deve ter a força suficiente para gerar,

no espírito do julgador, a convicção de culpa ou de inocência. A busca pela geração da

certeza dos factos alegados limita-se pela limpidez dos argumentos, calcados em provas

igualmente lícitas”.

De referir que a proibição dos métodos de obtenção de prova, não só vincula o

tribunal como também o MP bem como as autoridades policiais, independentemente da fase

em que se encontrar o processo.

118

Cfr. Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit., (nt. 92), págs. 454 a 455. 119

Jorge Reis Novais, A Dignidade da Pessoa Humana, Dignidade e Direitos Fundamentais, Coimbra, Edições

Almedina, 2016, Vol. I, pág. 179. 120

Guilherme de Sousa Nucci, ob. cit., pág. 15.

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44

Aqui chegados, o que se pode dizer é que no processo penal só podem ser valoradas

as provas que forem obtidas por meios lícitos devendo considerar-se nulas e de nenhum efeito

todas as provas obtidas ilicitamente.

Destarte, importa deixar claro que o posicionamento acima reflectido não goza de

aceitação generalizada, e um dos Autores que com ele discorda é Costa Andrade121

, por

entender que “A lei portuguesa dita as proibições de prova e determina as suas

consequências em termos que não apelam para uma ponderação com os valores

subjectivados sub nomine e no interesse da realização da justiça penal”.

E, como que a concordar com a afirmação deste Autor, podemos recorrer ao que diz

Figueiredo Dias122

que na doutrina portuguesa “Na análise de um caso da vida tudo se

reconduz cada vez mais a saber se nele intervém ou não uma proibição de prova segundo os

termos imediatos da legislação ou da doutrina aplicáveis. E, caso a resposta seja afirmativa,

não se tem posto em dúvida o carácter absoluto daquela proibição e a consequente

invalidação sem resto da prova alcançada e produzida (…)”.

Mas, no entender daquele Autor, as proibições de prova não podem ser consideradas

em termos absolutos devendo, em cada caso, ponderar-se os interesses em conflito no

interesse da realização da justiça penal.

No entanto, indo pela posição da proibição, em absoluto, da prova obtida ilicitamente

e da sua consequente invalidação, surge uma outra questão que é a de saber se deve ser

considerada inválida apenas a prova obtida ilicitamente ou também aquela que se obtém por

força da prova proibida123

.,

Em função do que foi acima expendido, a resposta parece ser muito simples e, seria

no sentido de se considerar nula, toda a prova obtida a partir da prova proibida. E, durante

muitos anos foi esta a posição adoptada em vários países.

Na doutrina norte-americana existe a chamada “the fruit of the poisonous tree” que

significa “fruto da árvore envenenada”, que faz comunicar o vício da ilicitude da prova obtida

ilicitamente (com violação das regras do direito material) a todas as demais provas

produzidas a partir daquelas. Portanto, parte-se do pressuposto segundo o qual se a árvore

está envenenada então os seus frutos estarão também envenenados. Aqui a prova é

121

Costa Andrade, apud, Jorge de Figueiredo Dias, Revisitação de algumas ideias-mestras da teoria das

proibições de prova em processo penal, in Revista de Legislação e de Jurisprudência – Secção de Doutrina,

Ano 146, N.° 4000, Setembro – Outubro, 2016, pág. 11. 122

Idem. 123

A este propósito, podemos citar como exemplo, um caso em que a Polícia de Investigação Criminal ou o MP

conseguem obter a confissão do arguido num crime de homicídio e do local onde aquele escondeu o cadáver e

as armas usadas, ao qual se chegou através de uma escuta telefónica não autorizada.

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45

considerada ilícita por derivação. A mesma doutrina é conhecida na Alemanha como

“Fernwirkung des Beweisverbots” que significa “efeito à distância”, que torna ilegítimas as

provas obtidas em consequência da prova proibida.

No entanto, e como refere Francisco Marcolino de Jesus124

“o fenómeno da

globalização, o impacto negativo que a regra da proibição de usos de todos os meios de

prova que sejam obtidos com origem e meio de prova proibido exerce sobre “a confiança do

Povo no Poder Judicial”, o fenómeno terrorista que se faz sentir em determinados países,

que culminou com os ataques de 11 de Setembro, “forçaram” a doutrina e a jurisprudência

de alguns países, máxime dos EUA, a introduzir limites, sob a forma de excepções ou

restrições, à regra da proibição, aplicada sem qualquer limitação”.

De referir que estas restrições à regra da aplicação da doutrina dos frutos proibidos

não só começaram a ser aplicadas nos EUA, mas também em outros países.

Segundo refere José Maria Alcaide González, o Tribunal Constitucional Espanhol,

influenciado pela jurisprudência dos EUA também acabou por se afastar da via securitária e

reconhecer que “a aplicação indiscriminada da teoria reflexa da árvore envenenada

acabaria por frustrar o ius puniendi do Estado, a cuja aplicação se encontra vinculado o

próprio Tribunal Constitucional”.125

E mais, Francisco Marcolino de Jesus126

refere que “Também em Portugal, se

considera que as provas com origem em provas proibidas que, em princípio são nulas,

podem ser válidas se, de forma telegráfica: Tiverem o seu fundamento em fontes de prova

independentes e, por isso puderem ser destacadas da prova inválida anterior; A descoberta

desses novos e posteriores factos se mostre inevitável mediante o decurso de outras

diligências de prova, que já decorriam anteriormente ou em simultâneo; Não obstante a

prova recolhida derivar de prova ilegal podia ter sido alcançada através de meios de prova

autónomos e distintos desta última, em termos tais que produzam uma decisiva atenuação

da ilegalidade precedente”.

Outrossim, a mais recente jurisprudência alemã salienta que “Para além dos casos em

que a proibição de utilização estiver expressamente prevista na lei, a invalidade da prova só

deverá ter lugar quando essa solução conduzir a uma ponderação que, <atendendo às

124

Francisco Marcolino de Jesus, Os Meios de Obtenção de Prova em Processo Penal, 2ª Edição (Revista,

Actualizada e Ampliada), Coimbra, Edições Almedina, 2016, pág. 109. 125

Neste sentido, José Maria Alcaide González, apud, Francisco Marcolino de Jesus, ob. cit., pág. 109. 126

Francisco Marcolino de Jesus, ob. cit., págs. 119/120.

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circunstâncias do caso concreto, tenha em conta todos os factores relevantes e a globalidade

dos interesses em conflito> ”127

, não sendo esta uma fácil tarefa.

Como se pode depreender, a jurisprudência dos diferentes países abraça a teoria da

proibição de valoração da prova obtida por força da prova proibida, mas ao mesmo tempo

entende que essa doutrina não pode ser considerada em termos absolutos, devendo ser

ponderados, em cada caso concreto, os interesses conflituantes entre (a violação do direito

individual e o interesse do Estado).

Até porque no exemplo que demos acima, não seria razoável que a confissão do

arguido no crime de homicídio fosse invalidada pois, a mesma é corroborada por outros

elementos de prova, como sejam, o corpo da vítima, as armas usadas para a prática do crime,

impressões digitais do arguido obtidas no corpo da vítima, apesar destes elementos de prova

terem sido obtidos por via de uma escuta não aurorizada. Mas também é preciso realçar que a

investigação criminal perante um caso concreto poderá facilmente identificar quem foi o

autor de um determinado crime e desencadear as diligências que se reputarem oportunas ou

necessárias para a localização do arguido ou arguidos.

Não é por acaso que Figueiredo Dias128

entende que “Uma tal invalidade

generalizada conduziria à negação em bloco do interesse colectivo que precisamente

justifica a existência do MP e/ou de outros órgãos de perseguição penal. Por conseguinte,

também aqui será decisiva, relativamente à prova consequencial em questão, a configuração

concreta do caso e o peso e o relevo que nela deva ser conferido à violação do direito

individual por conexão com o valor comunitário que ao Estado cumpre proteger”.

Chegados a este estágio o que se pode concluir é que são proibidas as provas obtidas

ilicitamente. No entanto, podem, excepcionalmente, ser aceites as provas alcançadas por

força da prova obtida ilicitamente, quando não haja uma lei expressa que estabeleça o

contrário, não se podendo em caso algum sacrificar a dignidade da pessoa humana, devendo

sempre analisar-se as circunstâncias do caso em concreto para se poder valorar a ponderação

dos interesses conflituantes de modo a que se possa fazer a justiça com respeito aos direitos

fundamentais dos cidadãos implicados.

Até porque, se não se impusessem limites à teoria da proibição de valoração das

provas obtidas por força da prova proibida continuar-se-ia a assistir ao não esclarecimento de

grandes crimes e a impunidade dos criminosos. E mais, não se deve olvidar o facto de o

127

Cfr. BGHSr, 54, 59, n.°47, e BGHSr, 58, 84, n.°32, apud, Jorge de Figueiredo Dias, in RLJ, ob. cit. (nt.121),

pág. 12. 128

Jorge de Figueiredo Dias, ob. cit. (nt.121), pág. 15.

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47

crime organizado tender a ser “perfeito”, quanto à sua execução, exigindo um tipo de

investigação mais apurada, o que pode passar necessariamente pela utilização deste tipo de

provas.

4. Meios Admissíveis de Obtenção de Prova

4.1. Em Moçambique

O Código de Processo Penal estabelece um leque de métodos de obtenção de prova e

os seus respectivos regimes, para todo o tipo legal de crimes, incluindo os crimes de

corrupção, designadamente: Os exames - (artigo 175º a 201º); As buscas e apreensões (202º a

213º), e as escutas telefónicas.

4.1.1. Exames - (arts. 175º a 201º);

Os exames são meios de obtenção de prova através dos quais se podem obter

elementos de prova para o processo. Eles consistem na observação de plantas devidamente

conferidas, decalques, fotografias ou quaisquer outros processos ou vestígios que possa ter

deixado a infracção, o estado do lugar em que foi cometida e todos os indícios relativos ao

modo como foi praticada e às pessoas que a cometeram.

De referir que caso a autoridade judiciária (autor do exame) não tenha

conhecimentos técnico-científicos sobre a coisa observada esta deve ser submetida à perícia.

O CPP não faz a distinção entre exames e perícias, sendo certo que tanto os

primeiros assim como os segundos são realizados por peritos. Mas, enquanto a perícia é um

meio de prova que conforme ensinamento de Adalberto José J. T. de Camargo Aranha

“somente se justifica quando há necessidade da emissão de uma opinião especializada sobre

um fato, do socorro de alguém que tenha um conhecimento técnico específico”129

, o exame

constitui um meio de obtenção de prova através do qual se podem obter elementos de prova.

4.1.2. Buscas e apreensões (arts. 202º a 213º)

As buscas são um meio de obtenção de prova e traduzem-se na realização de

diligências materiais em locais reservados ou cujo acesso não seja livre ao público quando

existam indícios de que nele se encontrem papéis ou outros objectos cuja apreensão seja

necessária para a instrução do processo; ou quando o arguido ou outra pessoa que deve ser

presa se encontre nele escondido.

129

Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha, ob. cit., pág. 170.

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48

Esta diligência é susceptível de colidir com certos direitos fundamentais130

dos

cidadãos, como sejam o direito à reserva sobre a intimidade da vida privada131

e o da

inviolabilidade do domicílio132

.

De referir que não existe um conceito fixo do que seja a vida privada. No entanto,

segundo ensinamento de Pires de Lima e Antunes Varela, “Há, todavia, duas bases

objectivas a que este deve atender. Uma assenta na natureza do caso, dado que a divulgação

dos factos da vida íntima da pessoa pode ofender em maior ou menor grau o seu decoro,

respeitabilidade ou bom nome. Outra reporta-se à condição das pessoas, pois varia bastante,

de acordo com ela, a reserva que as pessoas guardam ou exigem quanto à sua vida

particular”133

.

Em relação ao princípio da inviolabilidade do domicílio, sabe-se que o domicílio é

onde qualquer um tem e faz a sua vida privada, razão pela qual só em casos excepcionais é

que a lei permite a entrada de terceiros neste espaço contra a vontade dos seus ocupantes. Até

porque não se pode permitir que o mesmo seja usado como esconderijo de objectos que

podem servir como prova do crime ou para o refúgio de criminosos. Porém, se a entrada não

for autorizada ou resultar de necessidade imperiosa da lei estar-se-á perante um ilícito

criminal designado (Introdução em casa alheia) – cfr. art. 261º do CP.

Desta forma, e para evitar a lesão dos direitos acima mencionados o legislador

estabeleceu um regime especial de buscas que possam permitir a realização da justiça,

descobrindo-se a verdade material mas sem ferir os direitos fundamentais dos cidadãos.

Daí que para a realização de buscas e apreensões em casa habitada impõe-se a

obrigatoriedade de que a sua realização tenha de ser autorizada por uma autoridade

competente, que é diferida ao juiz da instrução criminal o que deverá ser feito, em despacho

130

Segundo definição de Miguel José de Faria, Direitos Fundamentais e Direitos do Homem, 3ª Edição, Lisboa,

Instituto Superior de Ciências Policiais e Segurança Interna, 2001, pág. 1, “São direitos fundamentais em

sentido formal os que a Constituição específica como tais; em sentido material são os que constituem a base

jurídica da vida humana no seu nível actual de dignidade, as bases principais da situação jurídica de cada

pessoa, quer estejam consagrados na Constituição, nas leis, ou nas regras aplicáveis de direito internacional,

como ensinou o Prof. Castro Mendes”. 131

O direito à reserva sobre a intimidade da vida privada está consagrado no art. 41º da CRM, no art. 80º do CC

e nos arts. 4º da Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, 12º da Declaração Universal dos Direitos

do Homem e 17º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. No entanto, há que referir que o art.

80º da CRM não protege apenas a reserva da vida privada, mas também o direito à honra, ao bom nome, à

reputação e a defesa da imagem pública. 132

O princípio da inviolabilidade do domicílio está consagrado no art. 68º da CRM e nos arts. 4º da Carta

Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, 12º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e 17º do

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. Porém, importa salientar que o art. 68º da CRM não se

cinge apenas à inviolabilidade do domicílio, mas também à inviolabilidade da correspondência ou outro meio de

comunicação privada. 133

Cfr. Fernando Andrade Pires De Lima, João De Matos Antunes Varela, Código Civil Anotado,Coimbra

Editora, 1967, vol. I pág. 60 (anotações ao art. 80º).

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fundamentado, devendo conter as razões que a justificam, nomeadamente, a existência de

indícios de que alguém tem em seu poder, em lugar não livremente acessível a qualquer

pessoa, papéis ou outros objectos cuja apreensão se mostrar necessária para a instrução do

processo134

.

De referir que o requerimento para a realização de buscas deve ser feito a pedido do

MP, da parte acusadora ou do arguido admitido a intervir no processo- cfr. art. 203º CPP.

Por outro lado se a busca e apreensão tiver de ser levada a cabo em casa habitada, não

poderá ser feita antes do nascer do sol nem depois do pôr-do-sol, salvo se a pessoa em poder

de quem se encontra o edifício o consentir, tendo em atenção ao princípio segundo o qual

“não se prejudica a quem consente” – cfr. art. 204º CPP.

De referir que diferentemente do que acontece no CPP Português, a lei processual

moçambicana não estabelece o prazo de validade do despacho que ordena ou autoriza a

busca, o que quanto à nós constitui uma lacuna de lei visto que o mesmo poderá ser usado ao

“belo prazer” da autoridade que o tiver a seu dispor, podendo até tornar morosa a celeridade

processual, pondo em casua a certeza e a segurança jurídica que se pretendem.

4.1.3. Escutas telefónicas.

As escutas telefónicas são um meio de obtenção de prova, cujo elemento probatório

coincide com o seu conteúdo, i.e, com o teor da conversa escutada135

.

As escutas telefónicas são também consideradas meios ocultos de obtenção de prova,

na medida em que elas são desconhecidas pelos visados, e como tal, podem causar lesão aos

direitos fundamentais dos cidadãos.

No ordenamento jurídico moçambicano, a permissão das escutas telefónicas, pode

inferir-se do disposto no artigo 210.º do CPP onde se refere que “(…) poderá o juiz, por sua

ordem, ter acesso às repartições telefónicas para interceptar ou impedir comunicações,

quando seja indispensável à instrução da causa, observando-se as disposições deste código

em tudo o que não for regulado na respectiva legislação”, sendo certo que até à entrada em

vigor da Lei n.°4/2016, de 03 de Junho não existia nenhuma lei especial que regulava o

regime das comunicações telefónicas.

134

A este propósito, trazemos aqui uma decisão do (JTACrim, 53:247), apud, Adalberto José Q. T. Camargo

Aranha, ob. cit., pág. 252, onde se decidiu que “Indamissível e ilegal é a realização de busca domiciliar sem

mandado. Ao Estado não se pode permitir a violação da lei, a pretexto de colheita de elementos probatórios,

máxime porque o direito de prova, meramente adjetivo, não se sobrepõe às garantias individuais de natureza

constitucional-substantiva”. 135

Neste sentido, cfr. Vera Lúcia Raposo, Segredo de Justiça: Caixinha de Segredos ou Segredos à Solta, in

RMP, Ano 31, N.°121, Propriedade e Edição: SMMP, Lisboa, Janeiro/Março de 2010, pág. 102.

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50

O n.°1, do art. 68º da Lei n.°3/97, de 13 de Março (Lei sobre o Tráfico e Consumo de

Estupefacientes), é que estabelece expressamente que “A autoridade judiciária competente

nos termos do Código de Processo Penal pode ordenar a intercepção e gravação de

conversações e comunicações telefónicas e intercepções telemáticas (…)” e o art. 40º, n.°1,

al. b), da Lei n.°7/2002, de 5 de Fevereiro (Lei sobre o Branqueamento de Capitais),

estabelece que “As autoridades judiciais devem autorizar, mediante processo-crime em

investigação (…) a colocação de escuta telefónica ou da correspondência telecopiada”, não

havendo nenhuma referência nesse sentido quando se trate de investigação de crimes de

corrupção lato sensu.

Agora temos a Lei n.°4/2016, de 03 de Junho (Lei das Telecomunicações), que

estabelece no seu art. 66º, com a epígrafe “Sistema de intercepção legal de

telecomunicações”, que: “1. Todo o operador de telecomunicações nos termos da presente

Lei deve ter um sistema devidamente operacional e eficiente de intercepção legal de

comunicações, para efeitos de investigação criminal. (o sublinhado é nosso). 2. A

intercepção mencionada no número anterior só pode ser autorizada por despacho de um juiz

da instrução criminal”.

Como se pode depreender, o legislador moçambicano não estabeleceu o leque de

crimes que podem ser objecto de escutas telefónicas, pressupondo-se que este meio de

obtenção de prova pode ser usado para a investigação de qualquer TLC, no estrito e

necessário limite à salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente

protegidos, como na situação em que o Estado pretende, através dos seus agentes levar à cabo

a investigação de factos criminalmente relevantes e a consequente responsabilização dos seus

agentes, no exercício do seu poder punitivo, realizando deste modo, a almejada justiça,

recorrendo-se ao estabelecido no art. 56º da CRM.

4.2. Em Portugal:

A lei processual portuguesa estabelece um catálogo de meios da obtenção de prova

típicos (Título III do Livro III), e os seus respectivos regimes, designadamente: os exames

(art. 112º e segs); as revistas e buscas (art. 174º e segs), as apreensões (art. 178º e segs) e as

escutas telefónicas (art. 187º e segs).

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4.2.1. Exames

Os exames visam a inspecção de vestígios que possam ter sido deixados no momento

da prática do crime e de todos os indícios relativos ao modo e ao lugar onde o mesmo foi

praticado, as pessoas que o cometeram e a maneira como o mesmo foi cometido.

Os exames, contrariamente à perícia não exigem do seu autor “conhecimentos

especiais de índole científica, técnica ou artística, caso em que há lugar a perícia e não a

exame.” O resultado do exame sujeita-se à livre apreciação do julgador e o juízo constante do

relatório da perícia presume-se subtraído à livre apreciação do julgador e sempre que houver

uma divergência entre a convicção deste e o juízo contido no parecer dos peritos, deve

fundamentar a divergência – art. 163 do CPP.

Segundo ensina Germano Maques da Silva136

“os exames podem ter lugar antes de

iniciado o procedimento, como providência cautelar quanto aos meios de prova”, para evitar

que haja alteração ou desaparecimento dos vestígios do crime antes de serem examinados.

Os exames são meios de obtenção de prova que podem ter por objecto pessoas,

lugares ou coisas, sempre que tal se mostre necessário para a investigação de um caso

concreto, cabendo à autoridade competente para o efectuar a responsabilidade de averiguar se

o exame é necessário, adequado e proporcional aos fins da investigação criminal, sempre que

o mesmo recaía sobre pessoas de modo a evitar a violação de certos direitos individuais,

como por ex., o direito à reserva da vida privada.

4.2.2. Revistas

Nos termos do disposto no art. 174º, n.°1, do CPP pode ser feita revista (às pessoas)

“quando houver indícios de que alguém oculta na sua pessoa quaisquer objectos

relacionados com o crime ou que possam servir de prova”, como por ex., uma arma que

tenha sido usada para praticar um crime (qualquer que seja). Esta arma pode vir a servir como

um meio de prova.

Importa porém referir que a revista não visa somente os supostos autores do crime,

podendo recaír sobre qualquer outra pessoa que oculte objectos relacionados com o crime ou

que possam servir de meio de prova, devendo em qualquer dos casos respeitarem-se os

direitos individuais constitucionalmente consagrados.

136

Germano Marques da Silva, ob. cit. (nt. 101), pág. 235.

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4.2.3. Buscas

O n.°2, do artigo 174 do CPP, autoriza que se realize busca “quando houver indícios

de que os referidos objectos ou o arguido ou outra pessoa que deva ser detida se encontram

em lugar reservado ou não livremente acessível ao público”. De referir que as buscas podem

ser domiciliárias e não domiciliárias, sendo as últimas as que são realizadas fora do

domicílio.

As buscas são pois, meios de obtenção de prova que visam a detenção do arguido ou

de outra pessoa que deva ser detida ou a descoberta de objectos relacionados com a prática de

um determinado crime ou que possam servir de prova no processo, podendo ser realizadas no

domicílio do visado e, como tal, são susceptíveis de colidir com direitos individuais,

consagrados na Constituição e nas demais leis ordinárias, v.g. o direito à intimidade da vida

privada, devendo por isso, antes de ser autorizada verificar-se se estão preenchidos todos os

pressupostos legais para tal.

A lei processual portuguesa admite a realização de buscas, excepcionalmente

autorizadas por órgão de polícia criminal, para os casos de terrorismo, criminalidade violenta

ou altamente organizada quando hajam fundados indícios, da prática iminente de crime que

ponha em grave risco a vida ou a integridade de qualquer pessoa – cfr. art. 174, n.° 4, al. a).

Entretanto, a realização desta diligência nos casos acima referidos deve ser comunicada ao

órgão competente (juiz de instrução), para apreciá-la e validá-la, sob pena de nulidade, cfr.

art. 174º, n.°5, do mesmo Código.

Nos casos de terrorismo ou criminalidade especialmente violenta ou altamente

organizada, as buscas domiciliárias podem ser realizadas, entre as 7 e as 21 horas, sob pena

de nulidade, cfr. n.°1, e al. a), do n.°2, do art. 177º do CPP.

Aqui, a lei impõe que o despacho que ordena ou autoriza a busca tenha um prazo de

validade de 30 dias, sob pena de nulidade – cfr. n.°4, do art. 174.

Ora, atendendo e considerando que os crimes de corrupção se inserem no âmbito do

que se considera criminalidade altamente organizada, entendemos que estas regras aplicam-se

para a obtenção de prova nestes TLC.

4.2.4. Apreensões

Nos termos do disposto no art. 178º, n.°1, devem ser apreendidos “Os objectos que

tiverem servido ou estivessem destinados a servir a prática de um crime, os que constituírem

o seu produto, lucro, preço ou recompensa, e bem assim todos os objectos que tiverem sido

deixados pelo agente no local do crime ou quaisquer outros susceptíveis de servir a prova”.

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53

Os bens apreendidos são colocados à disposição do processo, para servirem como meios de

prova.

A apreensão é um meio de obtenção de prova e como tal, deve ser autorizada,

ordenada ou validada por autoridade judiciária – cfr. n.°3, do mesmo artigo.

As apreensões podem, excepcionalmente, ser efectuadas pela autoridade judiciária, no

âmbito das diligências de revistas ou de buscas ou quando haja urgência ou perigo na demora,

sendo essas apreensões sujeitas a validação pela autoridade judiciária, no prazo de 72 horas –

cfr. art. 178º, n.°5.

De referir que as apreensões podem colidir com direitos individuais e

constitucionalmente consagrados, só podendo esta diligência ser levada a cabo se estiverem

preenchidos os pressupostos legais. E, os bens apreendidos são restituídos a quem de direito,

logo que se torne desnecessário manter a apreensão para efeito de prova, - cfr. art. 186, n.°1

do CPP.

4.2.5. Escutas telefónicas

No direito processual penal português, as escutas telefónicas são utilizadas como um

meio excepcional de obtenção de prova137

. Considera-se que a sua utilização deve estar

rodeada das maiores cautelas, dado a intromissão na privacidade dos visados138

, e não só, mas

também na privacidade de terceiros que entrando em contacto com os visados, também são

escutados sem saberem.

No entanto, e segundo refere Cristina Ribeiro139

“Apesar da reconhecida natureza

lesiva dos direitos fundamentais dos cidadãos, é hoje pacífica a necessidade de utilização

deste meio de obtenção de prova como forma de eficazmente fazer face a uma criminalidade

cada vez mais complexa, mais organizada, com maior expansão geográfica, grande

capacidade de mobilidade e com acesso a avultados recursos financeiros e tecnológicos”.

137

A este propósito, podemos aqui citar o Ac. do Tribunal da Relação do Porto; 494/09.0 GAVLG.PI; JTRP000;

Relatado por Francisco Marcolino; onde se decidiu que “A escuta telefónica deve ter carácter excepcional,

senão mesmo residual, de última ratio: só se deve a ela recorrer se e quando os fins da prova não poderem ser

alcançados com o uso de meios menos danosos para os direitos fundamentais ou seja, quando constitua uma

<medida necessária, adequada e proporcional numa sociedade democrática para salvaguardar a segurança

nacional, a defesa, a segurança pública e a prevenção, a investigação, a detecção e a repressão de infracções

penais>” – [art. 15º da Directiva 95/46/CE]. Disponível na Internet: <URL:

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/42af22f8c0dbc13e80257b2f005e8c70?OpenD

ocument>. [Consult. 14.11.2017] pelas 10 horas e 30 minutos. 138

Neste sentido confira, Vera Lúcia Raposo, ob. cit., pág. 102. Veja também, Inês Ferreira Leite, O novo regime

das escutas telefónicas. Uma visão panorâmica sobre a reforma de 2007, in Direito da Investigação Criminal e

da Prova, ob. cit., pág. 257, onde refere que “(…). Por se tratar de um meio de obtenção de prova demasiado

invasivo, é necessário que assuma um carácter excepcional”. 139

Cristina Ribeiro, Escutas Telefónicas: Pontos de discussão e perspectivas de reforma, in RPM, Propriedade e

Edição: SMMP, Ano 24, N.°96, Outubro/Dezembro, 2003, pág. 88.

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Por isso é que a lei processual estabelece restrições ao impor que a intercepção e a

gravação, só podem ser autorizadas quando se trate de crimes elencados no art. 181º, n.°1, e

só podem incidir contra às pessoas indicadas no art. 187º, n.°4, que são: suspeito ou arguido,

pessoa que sirva de intermediário e vítima do crime, mas neste caso, mediante o respectivo

consentimento, efectivo ou presumido.

De referir que a intercepção e a gravação podem ser autorizadas independentemente

da titularidade do meio de comunicação utilizado (que pode ser do próprio, de terceiro ou

público), sob pena de nulidade cfr. - art. 190º do CPP.

Mais ainda, é que embora se deva respeitar o princípio da não auto-incriminação, a lei

processual penal admite na al. a) do art. 187º, que o arguido possa ser escutado desde que se

verifiquem todos os pressupostos e requisitos legais para tal.

Tratando-se de crimes de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada,

a autorização das escutas telefónicas pode ser solicitada ao juiz dos lugares onde

eventualmente se puder efectivar a conversação ou da sede da entidade competente para a

investigação criminal, e não ao juiz que estiver a trabalhar com o processo. Entretanto, a

autorização deve ser levada ao conhecimento do juiz do processo, no prazo máximo de 72

horas, para a prática dos actos jurisdicionais subsequentes, cfr. n.° 2 e 3, do art. 187º do CPP.

E, à semelhança do que dissemos em relação às buscas, entendemos que as escutas

telefónicas, como meio de obtenção de prova, podem ser levadas a cabo nos crimes de

corrupção, por se enquadrarem no conceito de criminalidade organizada.

4.2.6. Acções Encobertas

Em Portugal, o actual regime jurídico das acções encobertas para fins de prevenção e

investigação criminal regulado pela Lei n.°104/2001, de 25 de Agosto, abriu a possibilidade

de realização de acções encobertas, para fins de prevenção criminal, em relação a um

catálogo de crimes, dentre os quais, constam os crimes de corrupção activa e passiva, cfr. art.

1º, n.°1, al. e) da Lei acima mencionada, por se entender que tais crimes são muitas vezes

praticados com recurso a estruturas altamente organizadas, e numa relação de sigilo

“profissional” provocando efeitos nefastos à sociedade onde tais grupos se encontram

inseridos.

Embora a lei acima citada não faça menção ao crime de recebimento indevido de

vantagem, entendemos que o regime jurídico das acções encobertas para fins de prevenção e

investigação criminal regulado por aquela, também se aplica ao crime de recebimento

indevido de vantagem tendo em conta que ao falarmos dos crimes de corrupção “lato sensu”

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também se abrange aquele TLC. Até porque não seria razoável a não aplicação das regras de

investigação criminal ao crime de recebimento indevido de vantagem, por também fazer parte

dos crimes de corrupção “lato sensu”. Destarte, como se disse acima, tanto nos crimes de

corrupção assim como no de recebimento indevido de vantagem existem as mesmas

dificuldades relativamente à obtenção de prova. E, as regras vertidas nesta lei pretendem

reforçar o combate à corrupção em sentido amplo e a outros crimes específicos que exigem

dos investigadores maiores cautelas dada a forma quase que perfeita da sua execução.

De referir que a Lei n.°104/2001, de 25 de Agosto, estabelece um regime especial de

recolha de prova, a quebra de segredo profissional e a perda de bens a favor do Estado, ao

que passamos de seguida a analisar:

4.2.6.1. Recolha de prova:

Relativamente à recolha de prova a doutrina portuguesa bem como as modernas

legislações que visam o combate à corrupção admitem, excepcionalmente, a utilização do

agente infiltrado140

, como meio de obtenção de prova, para fins de prevenção e de

investigação criminal. A figura do agente infiltrado só é admissível quando se trata de

investigação criminal relativa aos crimes elencados no art. 1º, n.°1, da lei acima citada, muito

embora existam algumas posições desfavoráveis por entenderem que se trata de um meio de

obtenção de prova enganoso - logo ilícito.

No entanto, a posição dominante vai no sentido de que a actuação do agente infiltrado

deve ser considerada admissível sempre que se mostrar necessária, proporcional e adequada

para a prevenção e combate a certo tipo de criminalidade, mas sem pôr em causa os direitos e

liberdades dos cidadãos.

Diferentemente da figura do agente infiltrado, já não é aceitável a figura do agente

provocador141

, pois a sua actuação, em maior ou menor medida, precipita a ocorrência do

crime, na medida em que, sem a sua intervenção o mesmo não se verificaria. No entanto, há

quem discorde com esta posição, por entender que quem aceita ser aliciado é porque já existia

em si essa vontade formada, o que quanto a nós, não pode ser aceite linearmente, tendo em

conta que qualquer pessoa é susceptível de praticar boas ou más obras, dependendo das

circunstâncias que o podem conduzir a agir de uma ou de outra forma. E, não é por acaso que

140

Segundo ensinamento de Germano Marques da Silva, apud, Sandra Pereira, A recolha de Prova por Agente

Infiltrado, in Prova Criminal e Direito da Defesa, Coimbra, Edições Almedina, 2011, pág. 141, “O agente

infiltrado se caracteriza por não participar na prática do crime, <<a sua actividade não é constitutiva, mas apenas

informativa>>”. 141

“Aquele que utiliza a provocação como instrumento de actuação, ou seja, ele << não revela um crime e um

criminoso, mas cria o próprio crime e o próprio criminoso” - Idem.

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é costume dizer que “a ocasião faz o ladrão”. Logo, concordamos que a sua utilização não

pode ser legitimada como um meio de combate ao crime organizado.

4.2.6.2. Quebra de segredo profissional:

Quanto à quebra de segredo profissional, a Lei n.°104/2001, de 25 de Agosto abre

espaço para que nas fases de inquérito, instrução e julgamento de processos relativos aos

crimes previstos no n.°1, do art. 1º, o segredo profissional das entidades mencionadas no art.

2º, n.°1, da mesma Lei, possa ceder, se houver razões para se acreditar que as respectivas

informações têm interesse para a descoberta da verdade material.

4.2.6.3. Perda de bens a favor do Estado:

Relativamente à perda de bens a favor do Estado, a Lei n.°104/2001, de 25 de Agosto,

permite que caso alguém seja condenado pela prática de qualquer um dos crimes

mencionados no n.°1, do art.1º, da referida Lei, os bens que se presumirem constituir

vantagem de actividade criminosa (diferença entre o património do arguido e o que se

presume congruente com o seu rendimento lícito), possam ser declarados perdidos a favor do

Estado.

De referir que o n.°1, do art. 109º do CP, estabelece que “podem ser declarados

perdidos à favor do Estado os objectos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir

para a prática de um facto ilícito típico, ou que por este tiverem sido produzidos, quando,

pela sua natureza e pelas circunstâncias do caso, puserem em perigo a segurança das

pessoas, a moral ou a ordem públicas, ou oferecerem sério risco de ser utilizados para o

cometimento de novos factos ilícitos”.

E, face às especificidades dos crimes elencados nesta Lei, os serviços de registo

públicos, como por ex., Conservatórias de Registo Predial, Automóvel e Comercial,

desempenham um papel bastante relevante na medida em que através delas é possível obter o

conhecimento público dos factos jurídicos que tiverem sido lá registados e que podem vir a

servir de meio de prova.

Aqui há uma razão para dizer que em Portugal “O crime não compensa”, porquanto

todas as vantagens económicas obtidas pelo agente do crime através da sua actuação ilícita

não o beneficiarão, mas sim serão revertidas a favor do Estado.

4.3. No Brasil:

A constituição Federal de 1998, estabelece no art.5º que “Todos são iguais perante a

lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros

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residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e

à propriedade, nos termos seguintes (EC n. 45/2004)”.

LVI “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”.

Ora, tendo em conta o estabelecido na constituição, parece resultar da mesma que

poderão ser usados quaisquer meios de obtenção de prova, desde que não sejam ilícitos ou

incompatíveis com o sistema geral do Direito Positivo.

E, como refere Guilherme Nucci142

“O universo ilícito constitui-se das variadas

formas de lesão aos preceitos diversificados no ordenamento jurídico. O ilícito abrange toda

e qualquer ofensa à Constituição Federal, por óbvio, e à legislação em geral”.

Como se pode depreender, no ordenamento jurídico brasileiro há uma abertura legal

através da qual se podem usar quaisquer meios de obtenção de prova, o que pode ser feito em

todas as fases processuais, desde que se respeitem as garantias e direitos individuais, tal como

se prevê no art. 5º da Constituição Federal.

5. A valoração da prova nos crimes de corrupção

Em todo e qualquer tipo legal de crime, para que se chegue à condenação dos

indiciados torna-se necessário que os factos denunciados e investigados sejam levados a

julgamento em respeito ao princípio do contraditório que é essencial para a valoração da

prova em termos tais que a prova que não lhe for submetida não pode ser usada para firmar a

convicção do tribunal143

.

Importa ter presente que “O facto só pode ser julgado provado ou não provado após

a submissão dos meios de prova ao contraditório em audiência. Antes disso, os meios

probatórios podem ter um valor indiciador, servirem para formar uma suspeita, mas não

para a prova dos factos. É que ao iter probatorium faltará então o contraditório e, por isso,

o meio de prova não será admitido para formar validamente a convicção do julgador, isto é,

a prova, enquanto resultado”144

.

Mas, como se disse acima, nos crimes de corrupção, raramente se chega a condenação

dos indiciados, por se mostrar difícil a comprovação dos factos. Por isso é que em alguns

casos, havendo condenação está é muita das vezes forçada, sendo certo que a prova não deve

ser procurada a qualquer preço mas sim através de meios lícitos145

. Até porque, enquanto não

142

Guilherme de Souza Nucci, ob. cit., pág. 30. 143

Neste sentido, cfr. Germano Marques da Silva, ob. cit. (nt.101), pág. 116. 144

Idem. 145

E, para alicerçar esta afirmação, podemos-nos socorrer do Ac. STJ, 11JUL2001, CJ-Acs STJ, Ano IX, 2001,

T. III, p. 167, in Germano Marques da Silva, ob. cit. (nt. 101), págs. 130 e 131, “Se o resultado final a que o

colectivo chegou se pode, por esta via, dizer de algum modo em contrapé com o interesse público na

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for possível provar a culpabilidade do arguido deve respeitar-se o princípio da presunção de

inocência, o qual é identificado por muitos autores com o princípio in dúbio pro reo146

, sendo

certo que na doutrina não há unanimidade acerca do entendimento sobre a natureza da relação

entre os dois princípios. Porém há que referir que para além deste posicionamento, há os que

entendem que o princípio da presunção de inocência é bem mais amplo que o do in dubio pro

reo, sendo este princípio corolário do primeiro e os que entendem que não existe nenhuma

relação entre ambos, discussão para a qual não entraremos sob pena de nos desviarmos do

nosso estudo.

5.1. Ilustração de alguns exemplos:

a) Supondo que um particular faça uma denúncia contra um servidor público (como

por ex., o caso de um servidor público que trabalha na Conservatória do Registo Civil com a

função de verificação dos documentos necessários para a emissão de Bilhete de Identidade),

acusando-o de lhe ter solicitado o pagamento de suborno para facilitar a emissão do seu

Bilhete de Identidade, pois não tinha toda a documentação necessária e não apresenta

elementos de prova que fundamentem a sua denúncia. Posteriormente, o particular entra em

contacto com o servidor público convidando-o a um café no “Jardim da Paz”, não tendo o

servidor público anuído ao convite.

Depois de várias chamadas insistentes, o servido público acaba por aceitar o convite e

vai ao encontro do particular, no local combinado. Este, por sua vez alerta a polícia para se

fazer presente, na data, local e hora combinados para o café.

Enquanto tomam o café, o particular retira do seu bolso um envelope contendo 5 mil

meticais e entrega-o ao servidor público, sendo que a Polícia que já havia sido alertada pelo

particular para se fazer presente ao local, efectua a detenção daquele.

Será válida a prova obtida nestas circunstâncias? Neste caso, parece que há aqui uma

situação de flagrante delito, porquanto o indiciado é detido na posse do “suposto” valor da

peita ou suborno. No entanto, não se pode considerar que houve verdadeiramente uma

situação de flagrante delito pois tal facto só terá acontecido por ter havido “incitamento” à

prática do crime pelo próprio denunciante.

perseguição dos criminosos, da segurança dos cidadãos e das garantias que devem provir de um Estado de

Direito, não é menos verdade que o fim do processo, na interpretação independente dos tribunais não é apenas a

descoberta da verdade a todo o transe, mas a descoberta, usando regras processualmente admissíveis e

legítimas”. 146

Neste sentido, vide Germano Marques da Silva, ob. cit., (nt.101), pág. 123.

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59

Na verdade, se este não tivesse insistido com o Servidor Público para que juntos

fossem tomar o café, este nem sequer teria ido ao local, o que só aconteceu devido as várias

chamadas do particular insistindo que deviam tomar juntos um café.

Mais ainda, é que para além deste elemento, não se conseguiu provar que o Servidor

Público tenha exigido o que quer que seja ao denunciante para a prática de um qualquer acto

relacionado com as suas funções.

Mesmo supondo que em sede de julgamento se prove a existência de outros elementos

constitutivos do TLC de corrupção, a prova obtida desta forma, não poderia ser validada,

porquanto houve aqui uma espécie de instigação, que se assemelha à figura do agente

provocador, o tal que determina outrem à prática de um crime que de outro modo não

cometeria, com o objectivo de o incriminar por um acto por ele provocado. Pelo que, deve ser

julgada nula a prova assim obtida, não podendo ser utilizada.

b) Supondo que um particular faça uma denúncia contra um agente da polícia,

alegando que este pediu-lhe uma determinada quantia monetária para não passar-lhe uma

multa por condução ilegal, e porque não tinha nenhum valor disponível, prometeu pagar

numa outra altura e combinou encontrar-se com o agente da polícia num certo restaurante

para um almoço, onde seria pago o valor prometido.

Acto contínuo, o denunciante dá a conhecer à polícia sobre os factos, sendo que esta,

por sua vez fotocopia as notas equivalentes ao valor supostamente solicitado pelo agente da

Polícia, a título de suborno e entrega-as ao denunciante para fazê-las chegar às mãos daquele.

O particular, já na posse das notas fotocopiadas liga avisando ao agente da polícia que

já tinha o valor disponível. O agente da polícia faz-se ao local do encontro e, depois de o

denunciante entregar as notas àquele a polícia persegue-o e procede à sua detenção.

Será válida a prova obtida nestes moldes? Pela forma como o funcionário é detido,

parece haver uma situação de quase flagrante delito, pois o agente do crime é perseguido e

detido logo após a recepção das notas e na posse das mesmas, as quais lhe foram entregues

pelo denunciante, supostamente como pagamento de subormo. No entanto, em sede de

julgamento o agente da polícia nega que o valor que recebeu tivesse em vista o pagamento de

suborno e o tribunal, não consegue provar o contrário, ficando-se na palavra de um contra a

do outro.

Ora, não existindo nos autos outra prova indiciária que associada as notas

fotocopiadas encontradas na posse do funcionário sustentem a acusação, nada mais restará ao

tribunal senão absolver o indiciado, em respeito ao princípio in dúbio pro reo. Daí que a

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prova obtida não poderá ser validada, sendo por isso nula e de nenhum efeito, por se tratar de

um flagrante delito induzido ou forjado.

Esta situação assemelha-se à da entrega controlada, que é a possibilidade, dada por

lei, de se retardar a intervenção policial, diferindo-se a efectivação da prisão em flagrante,

para que exercendo-se um monitoramento e uma vigilância sobre a actividade criminal, se

consiga obter maiores elementos de prova, melhorando a eficácia policial. No entanto, deve

haver prova indiciária suficiente para que a prisão e a prova obtida nestas condições sejam

validadas.

c) Supondo um caso em que o denunciante junta uma série de correspondência em

que, por ex., o servidor público solicita o pagamento de suborno para a emissão de DIRE

(Documento de Identificação de Residente Estrangeiro). A par desta solicitação o

denunciante responde e aceita pagar a quantia no final do mês, alegando que só nessa altura

poderia satisfazer o pedido; o servidor público aceita e fixa a data, o local e a hora em que lhe

deverá ser entregue o valor do suborno. Toda esta negociação é feita através da troca de

correspondência, chamadas telefónicas e de alguns encontros entre ambos, e tudo

acompanhado por um agente da polícia de investigação criminal, uma vez que o denunciante

deu a conhecer à polícia a pretensão do agente do crime.

Na data marcada para o encontro, o servidor público é detido logo após a recepção do

valor do suborno e na posse do mesmo.

Será que a prova obtida nestas condições deve ser valorada? Neste caso, o indiciado é

detido em flagrante delito, na posse do valor do suborno, cfr. art. 288º do CPP, sendo por isso

justificável a sua privação de liberdade de modo a evitar a perturbação da instrução do

processo.

No entanto, em sede de audiência de discussão e julgamento o indiciado confessa que

recebeu o valor em causa mas nega que o tenha recebido a título de suborno. Porém, existem

nos autos elementos suficientes que sustentam a acusação, como sejam, a troca de

correspondência entre o denunciante e o servidor público; o valor do suborno, para além da

prova de que o particular tinha um certo interesse relacionado com a actividade desenvolvida

pelo funcionário, isto é, o cidadão estrangeiro estava a residir ilegalmente em Moçambique e

pretendia obter, ilegalmente um DIRE.

Neste caso, até se pode considerar que a actuação da polícia (que se assemelha a de

um agente infiltrado) consubstanciou uma acção encoberta, na medida em que em nada

contribuiu para o surgimento do desígnio criminoso por parte do agente do crime, tendo

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apenas acompanhado os factos e presenciado a entrega do valor do suborno e, como tal, o seu

testemunho poderá ser usado validamente como meio de prova.

Portanto há aqui prova suficiente que pode levar o julgador a tomar uma decisão

condenatória, devendo por isso, ser considerada válida a detenção do servidor público nestas

condições assim como a prova obtida considerada válida, por ser legal.

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CONCLUSÃO

A corrupção ocorre quando uma actividade profissional é prestada, essencialmente,

em função da obtenção de um “bem externo” (peita ou suborno), em prejuízo de um “bem

interno” (exercício do cargo ou função) na administração pública, o que leva a que os

cidadãos percam a confiança nas instituições do Estado;

Como forma de combater este mal que põe em risco as sociedades constituídas

democraticamente, e considerando os seus efeitos que, sem margem para dúvidas, provocam

uma intensa danosidade social, vários ordenamentos jurídicos modernos adoptaram algumas

leis que visam a prevenção e o combate às várias formas de corrupção;

Nesse âmbito, o legislador inventou uma nova incriminação, denominada “Aceitação

de oferecimento ou promessa”, convista a abranger as várias manifestações da corrupção,

evitando a isenção de responsabilição criminal pois, diferentemente do que se exige nos

crimes de corrupção stricto sensu em que se deve fazer a prova do acto concretamente

pretendido pelo agente em troca do recebimento da vantagem, com a nova incriminação o

legislador não exige a verificação do nexo de causalidade entre a vantagem e o acto do

agente, mas sim a prova de que a vantagem foi recebida por este no exercício das suas

funções ou por causa delas;

Em termos de similaridade, os crimes de corrupção têm de comum o facto de

poderem ser cometidos por servidores públicos, no exercício de funções na administração

pública. Daí que, o legislador alargou o conceito de “funcionário público” de modo a abanger

todas as condutas que possam consubstanciar a prática de corrupção evitando lacunas de

punibilidade que, por razões de identidade e igualdade das situações, não se justificassem;

Mais ainda é que o conceito de funcionário só tem validade quando o exercício de

funções seja eficaz, isto é, o agente do crime, em função da natureza do cargo público que

ocupa a sua conduta possa ser susceptível de preencher o correspondente ilícito criminal,

sendo que no crime de aceitação de oferecimento ou promessa, o acto a praticar pelo agente

deve ser feito no exercício de funções ou por força das mesmas e não estar completamente

alheio às funções públicas por ele exercidas, o que não é fácil de provar;

A possibilidade de se ultrapassar a dificuldade de obtenção de prova nos crimes de

corrupção depende, em sede de investigação, da utilização criteriosa dos meios previstos na

lei pois, as normas processuais penais constituem os limites das actividades dos

investigadores. No entanto, e tendo em atenção à natureza secreta e a complexidade destes

TLC, vários ordenamentos jurídicos têm recorrido a técnicas especias de investigação, dentre

elas a delação e a colaboração premiada, por as considerarem eficazes no combate à

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criminalidade organizada, pois através delas se pode quebrar o silêncio dos arguidos

ajudando, deste modo, a desmantelar as grandes redes criminosas inseridas no seio da

sociedade e que se dedicam a este tipo de crimes evitando a prática de outros crimes por essas

mesmas organizações;

É importante, definir-se como se deve proceder relativamente aos eventuais TLC

associados ao crime de corrupção, dectectados desde o iníco da investigação e durante o

decorrer da mesma de modo a facilitar a sua gestão, atendendo e considerando a dificuldade

de se investigar vários TLC num único processo, tornando-o num “mega-processo” (que é de

difícil gestão), que se vai prolongar no tempo, o que muitas vezes termina com resultados

decepcionantes. Até porque não se deve descurar o facto de que quanto mais rápida for

tomada uma decisão, mais legitimidade ganha o sistema;

Os crimes de corrupção são de natureza pública, podendo a sua denúncia ser feita por

qualquer pessoa e a detenção do infractor pode ocorrer em flagrante delito ou fora deste. Por

isso, julgamos que se deve promover o encorajamento da denúncia da corrupção por parte das

pessoas que a testemunham por ser uma das formas de a poder combater;

E, dada a dificuldade de obtenção de prova neste TLC, para o seu esclarecimento a

doutrina e a jurisprudência de alguns países, como por ex., Espanha e Portugal entendem que

se deve dar primasia à prova indirecta, indiciária ou por presunções, sob pena de se continuar

a cair na impunidade dos que se envolvem na prática deste tipo de criminalidade (a despeito

da falta ou insuficiência de prova e ainda com fundamento no princípio in dúbio pro reo),

aumentando, deste modo, o número de “cifras negras”;

É um facto assente que a corrupção pode estar associada a outros TLC, sendo por isso

complexas e diversas as condutas a serem investigadas. Daí que para o sucesso da

investigação se deve fixar qual é o seu objecto para que se possam saber quais os elementos

de prova que devem ser recolhidos e quais são os meios/métodos de obtenção dos mesmos,

em tempo útil, isto é, dentro dos prazos legalmente prescritos, sem ferir os direitos

fundamentais, de modo a que a prova assim obtida possa ser valorada pelo tribunal;

O regime das proibições de prova constitui uma garantia do respeito pelos direitos

fundamentais dos cidadãos e a violação das normas que o corporizam e estabelecem os

modos de a obter conduz a nulidade da prova assim obtida. Destarte, e para o sucesso da

investigação neste tipo de criminalidade deve haver uma estreita colaboração e articulação

entre os players da investigação, nomeadamente, os magistrados do Ministério Público, os

magistrados judiciais e os agentes investigadores da polícia, desde o início da investigação de

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modo a que possam definir conjuntamente a estratégia a desenvolver no decurso da

investigação;

E, mais, na actividade de investigação a coordenação entre os três órgãos deve ser

feita com o respeito que é devido pelas competências de cada um, respeito pela legalidade, e

não se deve olvidar o aspecto da afirmação, no sentido de que tem de haver sempre alguém

para tomar a decisão e esse alguém é o juiz que nos termos da Lei garante o controle dos

direitos fundametais através de mecanismos formais e normativos por via da intervenção

jurisdicional;

A inadmissibilidade da prova obtida através da prova ilícita não deve ser aceite em

termos absolutos, isto é, devem excepcionalmente ser aceites as provas alcançadas por força

da prova obtida ilicitamente, quando não haja uma lei expressa que estabeleça o contrário,

não se podendo, em caso algum, sacrificar a dignidade da pessoa humana e analisarem-se as

circunstâncias de cada caso de modo a que se possam valorar os interesses conflituantes e se

possa fazer justiça respeitando os direitos fundamentais dos cidadãos implicados.

Em face dos desafios colocados aos sistemas jurídicos pela criminalidade organizada,

em que se enquadram os crimes de corrupção (objecto do nosso estudo), parece-nos ser curial

a especializaçãos dos magistrados e dos agentes investigadores para lidarem com este tipo de

realidades criminais, sendo também importante o recurso aos meios especias de investigação

criminal, como por ex., utilização de agente infiltrado, quebra do segredo profissional, etc, os

quais podem eficazmente ajudar a superar a dificuldade na obtenção de prova nos crimes de

corrupção.

E, para terminar, importa deixar bem claro que em qualquer TLC a investigação

criminal constitui uma das condições que determinam uma eficaz e atempada realização da

justiça; E, nesse âmbito devem ser tidas em conta várias técnicas de obtenção de prova, sendo

certo que devem ser respeitados os direitos fundamentais dos cidadãos investigados para que

a prova assim obtida possa ser validada pelo tribunal, partindo do princípio de que em

processo penal o arguido presume-se inocente até que seja julgado e condenado por uma

decisão transitada em julgado.

E, como forma de reduzir os índices de corrupção, não se deve apenas olhar para o

pacote legislativo mas sim devem ser introduzidas reformas sistemáticas de modo a reduzir o

desequilíbrio existente entre a camada social e os detentores de cargos públicos, em termos

de acesso aos bens essenciais para a sobrevivência de um ser humano, garantindo a

responsabilização criminal dos titulares de cargos públicos, em caso de prevaricação e

garantir que se reconquiste a confiança dos cidadãos nas instituições do Estado.

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2ª Edição, Editorial Verbo, 2008.

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LEGISLAÇÃO

Constituição da República de Moçambique de 2004.

Constituição da República Portuguesa de 1976.

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

Código Penal de Moçambique, aprovado pela Lei n.°35/2014, de 31 de Dezembro.

Código Penal aprovado pelo Decreto de 16 de Setembro de 1886.

Código Penal de Portugal

Código Penal do Brasil

Código de Processo Penal de Moçambique, publicado pelo Departamento de

Investigação e Legislação em Janeiro de 1993.

Código de Processo Penal de Portugal, aprovado pelo Decreto-Lei, n. 78/87, de 17 de

Fevereiro, com as alterações introduzidas pela Lei n.48/2007, de 29 de Agosto.

Código de Processo Penal do Brasil, aprovado pelo Decreto-Lei n. 3.689, de 03 de

Outubro.

Lei n.°6/2004, de 17 de Junho (Introduz mecanismos complementares do combate à

corrupção)

Decreto n.° 22/2005, de 26 de Junho (Regulamento da Lei n.° 6/2004, de 17 de Junho)

Lei n.°16/2012, de 14 de Agosto (Lei de Probidade Pública)

Lei n.° 14/2009 (Estauto Geral dos Funcionários e Agentes do Estado)

Lei n.°3/97, de 13 de Março (Define e estabelece o regime aplicável ao tráfico e

consumo de estupefacientes e substâncias psicotrópicas, precursores e preparados ou

outras substâncias de efeitos similares).

Decreto-Lei 35.007, de 13 de Outubro de 1945 (remodela alguns princípios básicos do

processo penal).

Lei n.°15/2012, de 14 de Agosto (Estabelece mecainismos de protecção dos direios e

interesses da vítimas, denunciantes, testemunhas, declarantes ou peritos em processo

penal e cria o Gabinete Central de Protecção à Vítima).

Lei n.°93/99, de 14 de Julho (Lei de Protecção de Testemunhas), com as alterações

introduzidas pela Lei n. 29/2008, de 04 de Julho e Lei n. 42/10, de 03 de Setembro –

Portugal.

Lei n.°9.807, de 13 de Julho de 1999 (Lei de Protecção a Vítimas e Testemunhas) –

Brasil.

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Lei n.°7/2002, de 05 de Fevereiro (Lei do branqueamento de capitais).

Lei n.°4/2016, de 03 de Junho (define as basese gerais do sector das

telecomunicações.)

Lei n.°101/2001, de 25 de Agosto (Estabelece o regime jurídico das acções encobertas

para fins de prevenção criminal) – Portugal.

Código Civil Anotado de, Fernando Andrade Pires De Lima e João De Matos Antunes

Varela, Coimbra Editora, 1967, Vol. I

Código de Processo Civil de Moçambique, com as alterações introduzidas: DL

1/2005; DL 1/2009.

Lei n.°12.850/13, de 02 de Agosto (Lei de Combate às Organizações Criminosas) -

Brasil.

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INSTRUMENTOS INTERNACIONAIS

Convenção da União Africana sobre a Prevenção e o Combate à Corrupção, Assinada

em Adis-Abeba, Etiópia, e adoptada em 11 de Julho de 2003, em Maputo, pela 2ª

Sessão Ordinária da Conferência da União Africana, e ratificada pela Resolução

n.°30/2006, de 2-8, da Assembleia da República.

Protocolo da SADC Contra a Corrupção (denominado por Protocolo da Comunidade

para o Desenvolvimento da África Austral), Assinado em Blantyre, a 14 de Agosto de

2001, e ratificado por Moçambique através da Resolução n.°33/2004, do Conselho de

Ministros, de 20 de Junho de 2004.

Convenção da ONU Contra a Corrupção (denominada Convenção de Mérida),

adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 31 de Outubro de 2003,

Ratificada por Moçambique, através da Resolução, n.°31/2006, de 26 de Dezembro.

Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos.

Declaração Universal dos Direitos do Homem.

Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos.

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DOCUMENTOS ELECTRÓNICO CONSULATADOS:

OLIVEIRA, Renata Dominguese de, Metododlogia da pesquisa Aplicada ao Direito

com ênfase na Elaboração de Artigo Científico, SP, Faculdade de Ciências Sociais e

Agrárias de Itapeva, 2011. Disponível na Internet: -

http//www.fait.edu.br/recursos/4/files/gradecurricularpdf/Apostila1.pdf. [Consult.

04/04/2015], pelas 14 horas e 45 minutos.

1° Relatório Anticorrupção da União Europeia, elaborado pelo GRECO. Disponínel

na Internet: http://www.cpc.tcontas.pt/documentos/relatorio_anticorrupcao_eu.pdf.

[Consult. 2017/10/22], pelas 19h e 15 minutos.

Relatório Anual Índice de Percepção da Corrupção. Disponínel na Internet:

https://www.transparency.org/news/pressrelease/indice_de_percepcaeo_da_corrupcae

o_2016_circulo_vicioso_de_corrupcaeo>. [Consult. 13/10/2017], pelas 9 horas e 15

minutos.

Relatório do GRECO do Conselho da Europa. Disponível na Internet:

https://www.coe.int/en/web/greco/about-greco/priority-for-the-coe> [Consult.

28/11/2017], pelas 12 horas e 45 minutos.

Felipe Faoro Bertoni, Entenda a diferença entre delação premiada e colaboração

premiada. Disponível na Internete: https://canal ciênciascriminais.com.br/diferenca-

delacao-colaboracao-premiada/>.[consult. 15/09/2017], pelas 14 horas e 30 minutos.

Luiz Flávio Gomes, Há diferença entre entre colaboração e delação premiada?

Disponível na Internet: https://www.cartaforense.com.br/conteudo/colunas/ha-

diferenca-entre-colaboracao--e-delacao-premiada/14756> [Consult. 15/09/2017],

pelas 14 horas e 15 minutos.

Jurídicocerto, Aspectos fundamentais da Colaboração Premiada. Disponível na

Internet: https://juridicocerto.com/p/cayonperes/artigos/aspectos-fundamentais-da-

colaboração-premiada-948. [Consult.2017/09/15], pelas 15 horas.

Denúncia feita pelo Procurador-Geral da República contra Michel Miguel Elias

Temer Lulia (presidente da República Federativa do Brasil) e Rodrigo Santos Da

Rocha Loures (ex-deputado Federal). Disponível na Internet:

http://m.dw.com/downloads/39J432330/denuncia-temer.pdf>. [Consult. 28/11/2017],

pelas 13 horas e 25 minutos.

Mafalda Matos, O Direito Premial no Combate ao Crime de Corrupção. Disponível

na Internet:

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73

http://repositorio.ucp.pt/bitstream/10400.14/16884/1/Trabalho%20Final%20de%Mes

trado.pdf . [Consult. 22/02/17], pelas 13 horas e 45 minutos.

A Delação premiada no Direito Brasileiro. Disponível na Internet:

http://www3.pucrs.br/pucrs/files/uni/poa/direito/graduacao/tcc/tcc2/trabalhos2006_1/r

icardo.pdf.> [Consult.08.02.2017], as 9 horas e 30 minutos.

Colaboração Premiada – Caso Lava Jato, Acordos de colaboração com investigados

e réus. Disponível na Internet: http://www.mpf.mp.br/para-o-cidadao/caso-lava-

jato/autuacao-na-1a-instancia/investigacao/colaboracao-premiada>. [Consult.

28/11/2017], pelas 13 horas e 30mns.

Tony Kwok Man-Wai, Investigation of Corruption Cases. Disponível na Internet:

http://www.unafei.or.jp/english/pdf/Rs-N079/N079-19VE-Man-Wai2.pdf>. [Consult.

06.02.2017], pelas 12h e 25 mns.

Banner, Manual de Boas Práticas no Combate à Corrupção. Disponível na Intenet:

http://dciap.pgr.pt/Estudos/07 00/Area trabalho.html. [Consult. 24/10/2015], pelas 16

horas.

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JURISPRUDÊNCIA:

Sentença proferida no Proc. n.°126/16, pelo Tribunal Judicial da Cidade de Lichinga.

Sentença proferida no Proc.n.° 376/11, pelo Tribunal Superior de Recurso de Maputo.

Acórdão proferido no Proc. Comum Colectivo n.°712/00.9JFLSB, pelo tribunal

Colectivo do 2º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras.

Disponível na Internet: http://www.inverbis.pt/2012/ficheiros/doc/casoisaltinomorais-

trl-04-24t.pdf>.[Consult. 28/11/2017], pelas 14 horas.

Acção Penal (AP) 470/STF, julgada pelo Plenário do Egrégio Supremo Tribunal

Federal ( relator Min. Joaquim Barbosa). “ementa” do acórdão. Disponível na

Internet: https://www.conjur.com.br/dl/ementa-acordao-mensalao.pdf>. [Consult.

27/10/2017], pelas 12h e 30 minutos.

Proc. n.°5046512-94.2016.04.04.7000/PR, proferido pela 13ª Vara Fereral Criminal

de Curitiba.

Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa; Proc. n.°679/06.06.OGDTVD.L1-3;

relatado por João Carlos Lee Ferreira. Disponível na Internet:

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/bee6a8a04b2fd883e

8025754000391013?OpenDocument>. [Consult.14.11.17], pelas 10 horas e 15

minutos.

Acórdão da Relação de Évora, Proc. n.°621/01-I; relatado por Ribeiro Cardoso.

Disponível na Internet:

http://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/7065232571dae4e7

80257de100574844?OpenDocument>. [Consult. 14/11/17], pelas 10 horas e 45

minutos.

Acórdão da Relação de Lisboa, Proc. n.°10693; relatado por Carlos Almeida.

Disponível na Intenet:

http://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/bee6a8a04b2fd883e

8025754000391013?OpenDocument>. [Consult.14.11.17], pelas 10 horas e 15

minutos.

Acórdão do Tribunal da Relação do Porto; Proc. n.°494/09. PI;JTRP000; relatado por

Francisco Marcolino. Disponível na Internet:

http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/42af22f8c0dbc13e8

0257b2f005e8c70?OpenDocument>. [Consult. 14.11.2017], pelas 10 horas e 30

minutos.

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