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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE OLIVIA MORGAN LAPENTA Efeito da Neuromodulação em ritmo Mu durante Observação e Mentalização de Movimentos Biológicos e Não-Biológicos São Paulo 2012

neuroestimulação motora

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  • UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE

    OLIVIA MORGAN LAPENTA

    Efeito da Neuromodulao em ritmo Mu durante Observao e

    Mentalizao de Movimentos Biolgicos e No-Biolgicos

    So Paulo

    2012

  • OLIVIA MORGAN LAPENTA

    Efeito da Neuromodulao em ritmo Mu durante Observao e

    Mentalizao de Movimentos Biolgicos e No-Biolgicos

    Dissertao de Mestrado apresentada

    ao Programa de Ps-Graduao em

    Distrbios do Desenvolvimento da

    Universidade Presbiteriana Mackenzie

    como requisito para obteno do ttulo

    de mestre.

    Orientador: Prof. Dr. Paulo Srgio Boggio

    So Paulo

    2012

  • L311e Lapenta, Olivia Morgan

    Efeito da neuromodulao em ritmo Mu durante observao e mentalizao

    de movimentos biolgicos e no-biolgicos Olivia Morgan Lapenta. 2012 85 f. : il. ; 30 cm

    Dissertao (Mestrado em Distrbios do Desenvolvimento) -

    Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2012.

    Referncias bibliogrficas: f. 69-79.

    1. Mentalizao motora. 2. Observao e ao. 3. Ritmo Mu. 4. Estimulao transcraniana por corrente contnua. 5. Sistema neurnios-

    espelho. 6. Crtex motor primrio. I. Ttulo.

    CDD 611.8

  • OLIVIA MORGAN LAPENTA

    Efeito da Neuromodulao em ritmo Mu durante Observao e

    Mentalizao de Movimentos Biolgicos e No-Biolgicos

    Dissertao de Mestrado apresentada

    ao Programa de Ps-Graduao em

    Distrbios do Desenvolvimento da

    Universidade Presbiteriana Mackenzie

    como requisito para obteno do ttulo

    de mestre.

    Aprovada em _______________________

    BANCA EXAMINADORA

    Prof. Dr. Paulo Srgio Boggio Orientador

    Universidade Presbiteriana Mackenzie - UPM

    Prof. Dr. Elizeu Coutinho de Macedo

    Universidade Presbiteriana Mackenzie UPM

    Prof. Dr. Felipe Fregni

    Harvard Medical School

  • AGRADECIMENTOS

    Aos meus pais, Joo Lapenta Neto e Silvia Helena Mele Morgan Lapenta, pela

    liberdade de escolha, pelo incentivo, apoio e amor incondicional e minhas irms Bruna

    Morgan Lapenta e Julia Morgan Lapenta, por ouvirem milhares de vezes meu trabalho e

    o acharem incrvel ainda que tudo que descrevam sobre ele seja: Neurnios-Espelho.

    Agradeo especialmente ao Prof. Dr. Paulo Srgio Boggio por permitir que eu ousasse

    no tema e por incentivar todos os meus projetos, assim como pelo auxlio e dedicao

    em todas as etapas deste e de todos os outros estudos desenvolvidos em seu laboratrio.

    Agradeo basicamente ao trabalho impecvel como orientador, pois seria impossvel

    descrever minha gratido em termos de crescimento profissional e pessoal.

    Ao grupo do laboratrio de Neurocincia Cognitiva e Social da UPM por

    transformarem o ambiente de trabalho praticamente em uma segunda casa. Sou grata,

    alm da amizade, pelo trabalho cooperativo e todas as discusses e crticas que

    engrandeceram esse e tantos outros projetos desenvolvidos pelo grupo. Em especial as

    tartarugas velhas Cludia Aparecida Valasek que escreveu comigo o captulo de um

    livro que inspirou parte desse trabalho e Nathalia Ishikawa Baptista e Ana Carolina

    Alem Giglio por salvarem as ilustraes do trabalho.

    Aos integrantes da banca, Prof. Dr. Elizeu Coutinho de Macedo e Prof. Dr. Felipe

    Fregni pelas grandes contribuies durante a construo dessa dissertao.

    minha irm de corao, Mara De Lamonica Guimares pelas eternas risadas e

    grande amiga Patrcia Renn pelo ponto de apoio prximo a faculdade. Agradeo a

    ambas pelas sesses de desabafo e os momentos de alegria garantidos. Tudo sempre se

    torna mais leve com a presena de vocs!

    Yuri Freire Basdadjian pelo apoio, pacincia e carinho nesse caminho que vem sendo

    traado.

    Por fim agradeo a todos os voluntrios de pesquisa sem os quais este projeto jamais

    sairia do papel.

  • A percepo do desconhecido a mais

    fascinante das experincias. O homem que no

    tem os olhos abertos para o mistrio passar

    pela vida sem ver nada.

    Albert Einstein

  • Apoio:

  • Resumo

    A teoria de simulao mental sugere ativao da rede neural motora durante

    mentalizao e execuo de movimentos, de maneira anloga ativao em observao e

    execuo de aes, o que mediado pelo Sistema de Neurnios-Espelho. Esta ativao pode ser

    mensurada por supresso do ritmo Mu registrado por eletroencefalografia. proposto que a

    ativao de reas motoras e, portanto, o aumento de excitabilidade cortical em cortex motor

    primrio e a dessincronizao do ritmo Mu ocorram em consequncia de insumo proveniente do

    Sistema Neurnios-Espelho pr-motor. A estimulao transcraniana por corrente contnua

    consiste numa tcnica de neuromodulao por facilitao e inibio de disparo neuronal levando

    a aumento e reduo de excitabilidade cortical, respectivamente. Assim, foi proposto avaliar os

    efeitos polaridade dependentes desta tcnica sobre ritmo Mu durante tarefas de observao e

    mentalizao de movimentos biolgicos e no biolgicos. Para tal, aplicamos estimulao

    andica, catdica e placebo em 21 homens destros (idade mdia de 23.8+3,06), sobre crtex

    motor primrio esquerdo (2mA por 20min) e, em seguida foi feito o registro

    eletroencefalogrfico considerando os eletrodos C3, C4 e entorno de C3 e C4 e Cz. A anlise de

    C3 e C4 apresentou efeitos significativos quanto ao tipo de Movimento (p=0.005) e ainda

    quanto as interaes entre tipo de estimulao e hemisfrio (p=0.04) e tipo de estimulao, de

    movimento e hemisfrio (p=0.02). A anlise dos eletrodos do entorno revelou efeito

    significativo para a interao entre tipo de estimulao, condio da tarefa e tipo de movimento

    (p=0.03). Assim, os principais achados do estudo foram i. supresso de Mu para movimento

    biolgico (em mentalizao e observao) da regio da mo em hemisfrio contralateral aps

    estimulao placebo, ii. efeitos inversos para eletrodos de entorno em condio de mentalizao

    e iii. neuromodulao polaridade dependente de ritmo Mu. Os resultados de oscilao de Mu

    so discutidos considerando ERD focal/ ERS entorno de acordo com o tipo de tarefa.

    Conclumos que h dessincronizao contralateral focal de Mu durante observao e

    mentalizao de movimentos biolgicos, acompanhada por sincronizao de reas

    motoras no envolvidas na tarefa apenas na condio de mentalizao e que a

    estimulao transcraniana por corrente contnua tem efeito sob toda a superfcie do

    eletrodo e difere de acordo com a polaridade aplicada. O uso da estimulao

    transcraniana por corrente contnua combinada com tarefas de observao e

    mentalizao pode conferir uma estratgia interessante de interveno em distrbios

    envolvendo comprometimento das habilidades motoras bem como comprometimento de

    habilidades de imitao e compreenso das aes do outro.

    Palavras-chave: mentalizao motora, observao de ao, ritmo Mu, estimulao

    transcraniana por corrente contnua, sistema neurnios-espelho, crtex motor primrio.

  • Abstract

    The Mental Simulation theory suggests activation of the motor network during imagery

    and execution of movements, similarly to the activation during observation and execution of

    actions, which is mediated by the Mirror Neuron System. This activation can be measured using

    eletroencefalography register of Mu rhythm suppression. It is propose that motor network

    activation and therefore increase of cortical excitability at primary motor cortex and Mu

    dessynchronization are due to premotor Miror-Neuron System inputs. Transcranial direct

    current stimulation is a neuromodulation technique that induce facilitation and inhibition of

    neural firing leading to enhance or decrease in cortical excitability, respectively. Thus, we

    propose to evaluate the polarity dependent effects of this technique in the Mu rhythm during

    biological and non-biological movements observation and imagery tasks. Therefore we applied

    anodal, cathodal and sham stimulation in 21 male subjects (mean age 23.8+3,06), over left

    primary motor cortex (2mA for 20min) and immediately after we registered the

    electroencephalography considering the electrodes C3, C4 and surrounding C3 and C4 and Cz.

    Analyses of C3 and C4 showed significant effects according to Movement (p=0.005), and also

    for the interactions between type of stimulation and hemisphere (p=0.04) and type of

    stimulation, movement and hemisphere (p=0.02). Surrounding electrodes analyses revealed

    significant effect for the interaction between stimulation type, task condition and movement

    type (p=0.03). Thus, the main findings of this study were i. Mu suppression for biological

    movement (in both imagery and observation) of the hand region in the contralateral hemisphere

    after sham stimulation, ii. reverse effect for the surrounding electrodes during imagery condition

    and iii. polarity-dependent neuromodulation of the Mu rhythm. The results are discussed

    considering focal ERD/ surrounding ERS according to the type of task. We concluded that there

    are contralateral focal Mu dessynchronization during observation and imagery of biological

    movements together with syncronizarion of the motor areas not involved in the task only for the

    imagery condition and that transcranial direct current stimulation has a significant effect under

    the entire electrode and according to the applied polarity. The use of transcranial direct current

    stimulation followed by observation and imagery tasks might be an interesting intervention

    strategy for disturbances involving motor ability impairment as well as deficits related to

    imitation and comprehension of others actions.

    Key-words: motor imagery, action observation, Mu rhythm, transcranial direct current

    stimulation, mirror-neuron system, primary motor cortex.

  • LISTA DE ABREVIAES

    CP Crtex Parietal

    CPD Crtex Parietal Direito

    CPE Crtex Parietal Esquerdo

    CPP Crtex Parietal Posterior

    EEG Eletroencefalografia

    EMT - Estimulao Magntica Transcraniana

    ERD Dessincronizao Relacionada ao Evento (Event-Related Desynchronization)

    ERP Potencial Evocado Relacionado ao Evento (Event-Related Potential)

    ERS Sincronizao Relacionada ao Evento (Event-Related Synchronization)

    ETCC Estimulao Transcraniana por Corrente Contnua

    M1 Crtex Motor Primrio

    MB Mentalizao Biolgica

    MEP Potencial Motor Evocado (Motor-Evoked Potential)

    MM Mentalizao Motora

    MNB Mentalizao No-Biolgica

    MNS Sistema Neurnios-Espelho (Mirror-Neuron System)

    NMDA N-Metil-D-Aspartato

    OB Observao Biolgica

    ONB Observao No-Biolgica

    RMF Ressonncia Magntica Funcional

    SNC Sistema Nervoso Central

    STS Sulco Temporal Superior

    TEA Transtorno do Espectro do Autismo

  • LISTA DE ILUSTRAES

    Figura 1: Desenho Experimental ..................................................................

    Figura 2: Poder de Mu nos eletrodos C3 e C4 para Movimento Biolgico

    e No-Biolgico ...........................................................................................

    Figura 3: Poder de Mu nos eletrodos do entorno para as condies de

    Mentalizao e Observao em movimento Biolgico e No-Biolgico ....

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  • LISTA DE TABELAS

    Tabela 1: ANOVA para medidas repetidas relativa ao poder de Mu em

    rea envolvida na tarefa ...............................................................................

    Tabela 2: ANOVA para medidas repetidas relativa ao poder de Mu em

    reas no envolvidas na tarefa ......................................................................

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  • SUMRIO

    1. Introduo ...................................................................................................

    1.1 Imagem Mental Motora ................................................................

    1.1.1 Mentalizao Motora e o Sistema Neurnios-Espelho ..

    1.1.2 Excitabilidade Cortical durante Imagem Mental ..........

    1.2 Estimulao transcraniana por corrente contnua (ETCC) ........

    1.3Mentalizao Motora, Estimulao No-invasiva e Reabilitao.

    1.4 Eletroencefalografia .....................................................................

    1.4.1 Frequncia Mu ..............................................................

    1.4.2 Supresso das ondas Mu por Mentalizao Motora......

    2. Objetivos .....................................................................................................

    2.1 Objetivos Gerais ...........................................................................

    2.2 Objetivos Especficos ...................................................................

    3. Mtodo .......................................................................................................

    3.1. Participantes .................................................................................

    3.2. Instrumentos ................................................................................

    3.2.1 De caracterizao da amostra .......................................

    3.2.2 De modulao do processamento neurofisiolgico.........

    3.2.3 De Coleta e Anlise de dados Eletroencefalogrficos....

    3.2.4 Tarefa de Observao e Mentalizao de Movimento ...

    3.3 Procedimento ...............................................................................

    3.4 Consideraes ticas ....................................................................

    3.5 Anlise Estatstica ........................................................................

    4. Resultados ...................................................................................................

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    5. Discusso .................................................................................................... 55

    6. Concluso ................................................................................................... 67

    7. Referncias ................................................................................................. 69

    ANEXOS

    A.Inventrio de Dominancia Lateral de Edimburgo ........................ 80

    B. Termo de Consentimento Livre-Esclarecido ............................... 81

    C. Carta de aprovao do Comit de tica ...................................... 83

  • 11

    1. Introduo

    1.1 Imagem Mental Motora

    1.1.1 Mentalizao Motora e o Sistema Neurnios-Espelho

    Imagem mental (termo em ingls, imagery) consiste na mentalizao de entradas

    sensoriais e motoras, podendo ser definida como um processo ligado percepo em

    ausncia de estmulo real externo (ANNETT, 1995; FARAH, 1984; KOSSLYN et al.,

    2001). A gerao de uma imagem mental de movimento, referida como mentalizao

    motora (MM) (em ingls, motor imagery), baseada em propriocepo e mentalizao

    visual.

    Para Decety e Grzes (2006), a imaginao, ou produo de imagem mental,

    apresenta vantagens adaptativas evolucionrias por permitir planejamento e antecipao

    das aes do outro, bem como o estabelecimento de empatia com o outro.

    A teoria de simulao mental traz como ideia bsica que a rede neural motora

    seja ativada tanto na mentalizao de aes motoras quanto na execuo dessas mesmas

    representaes (JEANNEROD, 2001), de maneira anloga ativao em observao e

    execuo de aes, o que mediado por um sistema neuronal chamado de Sistema de

    Neurnios-Espelho (Mirror Neuron System - MNS) (RIZZOLATTI, FOGASSI,

    GALLESE, 2001; RIZZOLATTI, 2005).

    Os neurnios-espelho so um tipo especial de neurnios que disparam tanto

    quando um indivduo realiza uma ao quanto quando ele observa uma ao semelhante

    realizada por outro individuo, ou ainda, na apresentao de palavras relacionadas a ao

    (e.g., chutar), que ativa reas cerebrais relacionadas execuo da mesma (HAUK e

    PULVERMULLER, 2004) mostrando, dessa forma, integrao multimodal dos sistemas

  • 12

    auditivo, visual e motor (RIZZOLATTI, 2005; LE BEL, PINEDA, SHARMA, 2009). O

    sistema responsvel por essa ativao foi inicialmente descoberto na rea F5 do crtex

    pr-motor de macacos, porm fortes evidncias sugerem a existncia de um sistema

    comparvel na regio homloga do crtex pr-motor humano (FADIGA et al., 1995).

    O MNS composto por uma rede de reas, incluindo a pars opercularis do giro

    frontal inferior e sua rea adjacente ventral (crtex frontal inferior), o lbulo parietal

    inferior e o sulco temporal superior (STS), que so ativadas durante a observao e

    imitao de uma ao (HADJIKHANI et al., 2006).

    Segundo RIZZOLATTI; FOGASSI; GALLESE (2001) este sistema parece

    unificar no mesmo mecanismo neural, uma variedade de fenmenos que vo alm dos

    comportamentos elementares, como facilitao da resposta, podendo tambm

    desempenhar um papel crtico em funes cognitivas superiores, como aprendizado da

    imitao e compreenso da ao e desenvolvimento da linguagem. A regio de Broca,

    tradicionalmente vista como uma rea relacionada linguagem expressiva (fala), tem se

    demonstrado ativa nos estudos de neuroimagem, nos seres humanos, tanto na

    observao quanto na execuo de aes sendo identificada como uma das regies

    contendo neurnios-espelho (ARBIB, 2005).

    Gallese e Goldman (1998) levantaram ainda a hiptese de que alm de ser parte

    ou realizar uma funo precursora da habilidade geral de compreender o estado mental

    do outro (e.g. percepes, objetivos, crenas e expectativas) por mecanismos similares

    de observao e internalizao da ao de outro indivduo, os neurnios-espelho possam

    constituir parte de um sistema capaz de modular um plano para a execuo de certa ao

    por meio da simulao mental da mesma, ou seja via mentalizao motora (MM).

    Estudos de MM abordam duas tcnicas de mentalizao (i) em primeira pessoa

    (e.g. imaginar-se realizando aes) e (ii) em terceira pessoa (e.g., imaginar o outro

  • 13

    realizando aes) (RUBY, DECETY, 2001). Alguns autores no consideram a

    mentalizao em terceira pessoa como MM por no produzir no participante a sensao

    de realizao do movimento (DECETY, 1996; MUNZERT et al, 2009), outros

    demonstram que esse tipo de tarefa apresenta resultados prximos e to relevantes

    quanto a mentalizao em primeira pessoa (FOURKAS et al., 2006).

    Devido relevncia dos estudos de mentalizao em terceira pessoa e das bases

    bem estabelecidas quanto ao funcionamento dos neurnios-espelho e o destaque que

    estes estudos vm recebendo, consideraremos MM como tarefas de mentalizao de

    movimento prprio e do outro, pois estas MMs bem como a observao de ao, podem

    ativar mltiplas reas sensoriais e motoras, parecendo eliciar atividade cortical motora

    na ausncia do movimento propriamente dito.

    Acredita-se que estas tarefas representem um estgio sutil da execuo da ao

    delineada por reas corticais tipicamente envolvidas em planejamento e execuo

    motora, como rea motora suplementar, crtex pr-motor e crtex motor primrio (M1)

    (JEANNEROD, 2001). Sendo que o crtex pr-motor parece intimamente envolvido a

    trs processamentos, (i) execuo motora, (ii) observao da ao (RIZZOLATTI,

    CRAIGHERO, 2004) e (iii) mentalizao motora (MICHELON, VETTLE, ZACKS,

    2006).

    O estudo desses processamentos tem recebido destaque em funo do avano na

    compreenso dos mecanismos neuroplsticos consequentes de leses medulares e, por

    sua vez, do uso de tcnicas de MM como ferramentas que auxiliam ou funcionam como

    guia para efeitos plsticos bem-adaptados.

    Na ltima dcada, diversos estudos mostraram os efeitos neuroplsticos mal-

    adaptativos ps leso medular (FLOR, NIKOLAJSEN, JENSEN, 2006). Nessa direo,

    j bem estabelecido que tarefas motoras com componente supra-espinal podem ser re-

  • 14

    aprendidas por circuitaria espinal aps leso medular e, dessa forma, as intervenes

    visando reabilitao devem considerar aspectos fundamentais do aprendizado motor.

    Ademais, o objetivo de toda interveno de reabilitao a de prtica de habilidades

    que possam ser transferidas a situaes do cotidiano, para ento, aumentar a funo

    efetiva em novas situaes (MARSH et al., 2011). O tipo de treinamento a ser aplicado,

    no entanto, desafiador, uma vez que o sistema perifrico est comprometido e

    disfuncional.

    Pensando na tripla ativao de reas motoras durante mentalizao, observao e

    execuo de aes motoras, citada previamente, a MM pode representar uma alternativa

    interessante em interveno/reabilitao e esta atividade, bem como observao de ao,

    vem sendo crescentemente utilizada como tcnica auxiliar de reabilitao motora, at

    porque, o processo de mentalizao da ao no dependente da capacidade de executar

    um determinado movimento (DECETY, 1996). Isto abre margem para seu uso no

    aprendizado de novas habilidades ou auxlio no direcionamento dos mecanismos

    neuroplsticos adaptativos ps leso medular.

    Estudos de imagem mental inicialmente utilizavam medidas comportamentais

    como tempo reportado para mentalizao da ao e tempo real utilizado para a execuo

    da ao em si (e.g. mentalizao e execuo de caminhada). Esses estudos obtiveram

    resultados similares de mdia de tempo em ambas as tarefas. Foi demonstrado, tambm,

    que artefatos sonoros e de fadiga muscular afetam ambas as situaes em mesma

    proporo (para reviso ver MUNZERT et al., 2009).

    Os estudos mencionados utilizaram medidas subjetivas por apresentarem a

    desvantagem de depender do sujeito para dar a resposta aps tarefa de imagem mental.

    Testes mais sofisticados de rotao mental, baseados em medidas implcitas, consistem

    em uma extenso de durao mental de movimentos por requererem simulao mental

  • 15

    da tarefa de rotao sendo anloga a rotao fsica tanto de objetos no biolgicos (e.g.,

    figuras abstratas e letras) (DESROCHER, SMITH, TAYLOR, 1995), quanto de

    membros corporais (e.g., mo) (GANIS et al., 2000) no espao. Assim, segue-se a

    premissa de que execuo e mentalizao motora de rotao mental apresentam bases

    representacionais comuns e so menos propensas alternativas de estratgias. Ademais,

    nestes possvel elaborao e registro computadorizado permitindo mensurao

    comportamental mais precisa (MUNZERT et al., 2009).

    Os avanos em neurocincias na ltima dcada tornaram possvel o estudo das

    interaes multimodais (HUETTEL, SONG, McCARTHY, 2004) por meio de medidas

    de ativao neural que auxiliam na melhor compreenso quanto a gerao e sustentao

    de MM e seu impacto em performance motora posterior.

    Diversas tcnicas como ressonncia magntica funcional (RMF) e tomografia

    por emisso de psitrons (TEP), por estimulao cerebral no invasiva (EMT e ETCC),

    eletroencefalografia (EEG) e magnetoencefalografia (MEG) confirmam ativao de

    reas motoras e evidenciam o envolvimento do MNS tanto durante a execuo do

    movimento quanto em MM e observao de ao.

    Cramer et al. (2007) ilustra essa ativao comparando 10 controles saudveis

    com 10 pacientes com leso na medula espinhal e tetra paraplegia. Os dois grupos

    foram submetidos avaliao antes e aps 7 dias de treinamento por MM para lngua e

    ps. Observando melhora significativa em velocidade do movimento dos msculos no

    paralisados e maior recrutamento de estruturas como o putmen esquerdo, registrado

    por RMF, demonstrando que a MM melhora o comportamento motor independente de

    controle motor voluntrio e feedback perifrico.

    Michelon, Vettel e Zacks (2006) em tarefa de mentalizao de movimento de

    rotao da mo, observaram ainda, por RMF, ativao contralateral (em relao mo

  • 16

    imaginada) em MM e preparao motora bem como em execuo motora em crtex

    motor primrio (M1), rea motora suplementar (AMS) e tlamo, e cerebelo ipsilateral.

    Esses dados corroboram os achados de Decety et al. (1992) de ativao de AMS em

    tarefa de mentalizao de sequncia de movimentos de dgitos indicando que AMS tem

    um papel importante para a programao interna e simulao de sequncias motoras

    complexas.

    H ainda evidncias do envolvimento do crtex parietal posterior (CPP) durante

    MM. O CPP parece ser essencial para manter uma representao interna do

    estado/posio do membro efetor de movimento (e.g. mo) necessrio para produzir

    uma relao consistente durante a execuo da ao, tendo assim papel de unir as

    informaes da atividade neural relacionada trajetria e meta do movimento

    (DECETY, GREZES, 2006; MULLIKEN, ANDERSEN, 2009). Alm disso, imagem

    por TEP tem contribudo para evidenciar que o CPP desempenha um papel

    importante na realizao de processos necessrios para a rotao mental

    (HARRIS et al., 2000).

    Alm disso, estudos com RMF reportam ativao de redes fronto-parietais, pr-

    motoras e frontais durante simulao mental de movimentos simples (e.g. flexo e

    extenso) e complexos (e.g. tocar piano) tanto em MM quanto na execuo da ao

    propriamente dita (DECETY, 1996; MEISTER et al., 2004). Diversas pesquisas nessa

    linha demonstraram resultados semelhantes de MM, alm de terapia do movimento,

    biofeedback eletromiogrfico e robtica em pacientes com acidente vascular cerebral

    (AVC) (para reviso ver RABADI, 2011).

    O uso de ferramentas como EMT e ETCC tm sido empregado na compreenso

    das estruturas motoras recrutadas em tarefas de mentalizao e observao de ao, dos

    valores de excitabilidade cortical e dos mecanismos de neuroplasticidade assim como

  • 17

    novas estratgias de reabilitao, ou de aumento na velocidade de aprendizado de novas

    habilidades interferindo na melhora de desempenho, seja este comportamental ou

    cognitivo em sujeitos normais ou com patologias neurolgicas e dficits

    neuropsicolgicos (ROSSI, ROSSINI, 2004; WANG et al., 2010).

    1.1.2 Excitabilidade Cortical durante Imagem Mental

    As tcnicas de estimulao cerebral no invasiva podem alterar representaes

    corticais motoras dos membros e, duas abordagens vm sendo exploradas visando

    reabilitao por meio de ETCC e EMT i.e., aumento da excitabilidade cortical do

    hemisfrio afetado usando estimulao ipsilateral (FREGNI et al., 2005; HUMMEL,

    COHEN, 2006) e reduo da inibio interhemisfrica provocada pelo hemisfrio

    preservado sobre o hemisfrio lesionado por meio de estimulao contralateral

    (BOGGIO et al., 2007; FREGNI et al., 2005; MANSUR et al., 2005).

    A EMT possibilita, alm de neuromodulao, a mensurao de excitabilidade

    cortical via potencial motor evocado (motor evoked potential MEP), geralmente

    registrado por eletroneuromigrafo em diversos msculos das mos e braos (NAJIB et

    al., 2011). EMT de pulso nico permite medir a excitabilidade e condutividade

    corticoespinal de vias motoras, quando a mesma aplicada em M1. J EMT de pulso

    pareado permite investigar mecanismos intracorticais de facilitao e inibio (ROSSI,

    ROSSINI, 2004). Dessa maneira, a EMT confere uma medida biolgica importante de

    ativao de reas corticais envolvidas em diversas atividades.

    A intensidade do estmulo magntico aplicado para acessar o limiar motor o

    minimamente necessrio para evocar MEPs e assim no se espalha para reas

    subjacentes (MATSUMOTO et al., 2010). Assim, esta nova tecnologia tem ganhado

    espao nessa rea de pesquisa, no apenas por seu potencial de facilitao em

  • 18

    determinadas tarefas e por apontar reas cruciais de determinadas funes cognitivas e

    motoras (via produo de leses virtuais), mas principalmente, no caso da MM por

    fornecer uma medida precisa dos efeitos de interveno.

    Fadiga et al. (1999), utilizaram EMT para investigar se a excitabilidade do

    sistema cortico-espinal seletivamente afetada por MM. Foram realizados registros de

    MEP do msculo das mos e braos direito e esquerdo durante simulao mental de

    movimentos de flexo e extenso e EMT em crtex motor direito e esquerdo durante

    MM de abertura e fechamento contralateral das mos. A MM foi conduzida por som

    (i.e., fase de aumento da frequncia sonora indicava que deveriam mentalizar abertura

    da mo e em fase de diminuio da frequncia indicava que deveriam mentalizar

    fechamento da mo). O padro de excitabilidade durante MM simula de forma dinmica

    o ocorrido durante a execuo do movimento, isto , a excitabilidade cortical durante

    MM similar ao observado durante movimentao real. Alm disso, EMT no crtex

    motor esquerdo aumentou a excitabilidade crtico-espinal em MM ipsilateral e

    contralateral e EMT em crtex motor direito levou a facilitao do efeito induzido por

    MM apenas nos movimentos contralaterais. Tais resultados mostram, com o uso de

    EMT, o papel da MM como estratgia de neuromodulao de estruturas cerebrais

    motoras.

    Estudo posterior avaliou efeito da MM em movimento abdutor do polegar por

    registro de MEPs com EMT. Foi realizada a mensurao no apenas dos msculos

    envolvidos na tarefa, no caso o msculo abdutor curto do polegar (ipsilateral e

    contralateral), mas tambm de um msculo controle, no envolvido na tarefa, para

    averiguar se a mentalizao teria um efeito msculo-especfico de acordo com o

    movimento instrudo na tarefa. A mentalizao levou a aumento da amplitude dos

    MEPs apenas no msculo do abdutor do polegar contralateral, confirmando

  • 19

    especificidade focal. Alm disso, este estudo avaliou ainda o limiar motor antes e aps a

    tarefa verificando reduo deste, o que est de acordo com aumento de excitabilidade

    cortical (FACCHINI et al., 2002). Essa especificidade muscular confirmada por

    aumento de excitabilidade em M1 concomitante a reduo de inibio intracortical tanto

    em MM quanto em observao de movimento de flexo de dedo prprio ou de outro

    indivduo (PATUZZO, FIASCHI, MANGANOTTI, 2003).

    Conforme comprovada a excitabilidade cortical aumentada durante MM em

    tarefas simples, pesquisas avanaram para tarefas de imagem mental mais complexas,

    envolvendo movimentao biolgica e no biolgica, em primeira e em terceira pessoa,

    com e sem envolvimento de objetos e ainda combinando aes dirigidas ou sem sentido.

    Nessa direo, Fourkas et al. (2006) comparou MEPs nos msculos intersseo

    dorsal e abdutor do dedo mnimo durante a aplicao de EMT de pulso nico durante

    quatro tarefas: de MM realizadas em primeira e terceira pessoa, imagem mental visual

    (i.e. movimento no biolgico) e imagem mental esttica (i.e., perspectiva, em primeira

    pessoa, de mo imvel). MM em relao a imagens estticas resultou em aumento da

    excitabilidade no msculo intersseo dorsal, mas no em abdutor do dedo mnimo.

    A facilitao demonstrada pelo aumento dos MEPs em msculo intersseo

    dorsal foi observada na condio de imagem mental de terceira pessoa (na qual a ao

    foi claramente atribuda a outra pessoa). Os autores atribuem os resultados obtidos na

    mentalizao do movimento em terceira pessoa ativao do sistema de neurnios-

    espelho (FOURKAS et al., 2006).

    Roosink e Zijdewind (2010), ao realizarem o estudo comparando a

    excitabilidade cortico-espinal durante observao de movimento sequenciado simples e

    complexo dos dedos indicador, mdio, anelar e mnimo em trs condies e suas

    combinaes (MM, execuo e observao), observaram que a excitabilidade foi

  • 20

    aumentada em todas as condies em relao excitabilidade de repouso, sendo este

    aumento maior durante a observao ativa em relao a passiva e MM visual ou

    cinestsica. A dificuldade da tarefa tambm influencia na mudana da excitabilidade

    cortical de modo que tarefas mais complexas resultaram em excitabilidade maior. Os

    autores sugerem ainda que o aumento da excitabilidade cortico-espinal encontrado

    durante a observao ativa e durante a MM pode ser o resultado de um aumento da

    atividade cortical combinado com alteraes a nvel da coluna vertebral.

    Ademais, Vargas et al. (2004) demonstraram com uso de EMT que posio

    postural compatvel ao movimento a ser mentalizado pode resultar em maximizao do

    efeito mensurado por MEPs (i.e., potenciais maiores e abrangendo maior rea) enquanto

    posies incompatveis resultam em minimizao deste efeito, tendo ainda correlao

    com o tempo levado para execuo da tarefa, i.e., em posturas compatveis a

    mentalizao mais rpida.

    Shimura e Kasai (2002) propem que a posio facilitatria do membro

    aumentaria a excitabilidade cortical e espinal devido a um maior insumo sensorial

    perifrico. Ainda que essa hiptese no possa ser excluda, o efeito modulatrio da

    posio do membro pode ser decorrente puramente do SNC j que a posio da mo

    real daria um sinal discrepante ao da postura a ser mentalizada.

    Nas pesquisas com ao dirigida e com uso de objetos so levantadas hipteses

    acerca do conhecimento ttil de um objeto ou, ainda, da presena deste em mos durante

    a tarefa de imagem mental. interessante ressaltar alguns estudos elaborados visando

    avaliar possveis influncias destas circunstncias na excitabilidade crtico-espinal.

    Mizuguchi et al. (2009) propuseram que os participantes se imaginassem apertando

    uma bola, ora com a bola em mos, ora sem ter nada nas mos. A comparao e

    monitoramento de MEPs no msculo dorsal intersseo (mo) nas duas situaes aps a

  • 21

    aplicao de EMT no crtex motor permitiu verificar maior amplitude na condio com

    bola em mos. Tal resultado sugere que o toque da bola reforce a MM, sendo este

    originado por algumas mudanas da via cortico-espinal e no da via aferente do crtex

    somatossensorial, uma vez que potenciais evocados somatossensorias foram medidos e

    no houve modulao dos mesmos na situao segurando a bola (MIZUGUCHI et al.,

    2009).

    Seguindo a mesma premissa, Cesari, Pizzolato e Fiorio (2011) sugerem que

    durante MM, o sistema cortico-espinal seja modulado de forma msculo-

    especfico/compresso especfica. Aps EMT sobre M1, os autores avaliaram os MEPs

    dos msculos intersseo dorsal, abdutor do dedo mnimo e flexor superficial dos dedos

    em duas tarefas execuo motora de preenso de esferas de diferentes dimenses e

    MM de preenso destas mesmas esferas, com o advento que assim j teriam

    conhecimento do material e dimenso do objeto que deveriam mentalizar em mos. Foi

    observado mesmo padro de ativao para esferas pequenas (i.e. flexor intersseo dorsal

    mais ativado em relao ao abdutor do dedo mnimo e flexor superficial) e esferas

    grandes (i.e. maior ativao de abdutor do dedo mnimo e flexor superficial) para ambas

    as situaes.

    Estas ativaes so explicadas pela tendncia de preciso na preenso de objetos

    pequenos, levando a preenso em pina e, em contraste, para objetos grandes

    necessrio usar os cinco dgitos, gerando este padro de ativao muscular. No caso das

    esferas mdias todos os msculos foram ativados de forma similar, um padro ocorrido

    quando se utilizam mais de dois dgitos na preenso de objetos (ANSON et al.,2002;

    HASEGAWA et al., 2001; TINAZZI et al., 2003).

    Aparentemente o processo predominantemente necessrio para planejamento de

    preenso ocorre principalmente por ativaes musculares de acordo com as

  • 22

    propriedades do tipo de movimento e forma da mo mais adequada para tal movimento

    (CESARI, PIZZOLATO, FIORIO, 2011). J em relao aplicao de fora, estudos

    indicam que este planejamento ocorra de forma separada j que a ativao motora

    obtida neste tipo de tarefa, mais precisa durante execuo da ao em relao a

    facilitao registrada durante MM (CESARI, PIZZOLATO, FIORIO, 2011; PARK, LI,

    2011).

    Enquanto as alteraes de excitabilidade parecem ter sido bem esclarecidas se

    tratando de tarefas de movimentos simples de articulao nica, se tratando de

    movimentos do dia-a-dia envolvendo diversos msculos, so encontradas divergencias

    entre ndivduos quanto a ativao msculo-especfica.

    Por meio de projeo de movimentos (i.e., o estmulo previamente filmado era

    projetado de forma que o movimento observado parecesse estar sendo realizado pelo

    prprio indivduo), foi encontrada maior excitabilidade cortical em relao condio

    repouso, porm em diferentes magnitudes de focalidade para cada sujeito. Apesar das

    variaes entre indivduos o padro foi constante para todas as tarefas no mesmo

    indivduo, sugerindo que alguns indivduos tenham maior habilidade de preciso no

    mapeamento dos movimentos observados em seu prprio repertorio motor e que esse

    tipo de resposta seja vlida para diversas aes do dia-a-dia, ou ainda que este resultado

    se deva a diferentes direcionamentos de ateno durante a observao (HETU et al.,

    2010).

    Com isso, a partir dos estudos feitos at ento, podemos concluir que a EMT

    confere medidas precisas de excitabilidade cortical e confirma o aumento da atividade

    bem como a reduo de limiar motor em reas corticais motoras durante o processo de

    imagem mental relacionada motricidade. Tais achados so importantes na medida em

  • 23

    que sinalizam a possibilidade de estratgias de mentalizao como ferramenta de

    neuromodulao e recrutamento de estruturas cerebrais motoras.

    Alm das reas motoras, devido tcnica de mentalizao envolver

    visualizao mental e controle da trajetria mental dos movimentos, como

    mencionado previamente o CPP uma rea tambm envolvida. Alguns estudos com

    EMT foram feitos buscando investigar o papel dessa estrutura cortical na MM.

    Fleming et al. (2010) realizaram dois experimentos a fim de investigar o

    envolvimento do crtex parietal nas funes de MM. No primeiro estudo, participantes

    realizaram mentalizao de motricidade de membro superior durante RMF. Os autores

    observaram ativao de CPD e CPE. No segundo experimento, os participantes foram

    instrudos a imaginar a mesma sequncia de movimentos enquanto recebiam a EMT no

    crtex parietal direito ou esquerdo. Ao final de cada mentalizao, deveriam posicionar

    o membro no modo correto com a sequncia mentalizada. Os autores observaram

    prejuzo no desempenho da tarefa aps EMT ativa em relao a placebo e, com isso,

    argumentam que EMT interferiu nos processos de mentalizao da sequncia motora.

    Diversos trabalhos com EMT buscaram tambm responder questes de

    assimetria inter-hemisfricas relacionadas MM, entretanto os resultados so bastante

    divergentes. Fadiga et al. (1999), encontraram maiores efeitos de MEPs no hemisfrio

    motor dominante. Outros estudos encontraram maior excitabilidade do hemisfrio no

    dominante (YAHAGI, KASAI, 1998; KUHTZ-BUSCHBECK et al., 2003). E, por

    vezes, as assimetrias inter-hemisfricas no so observadas (FACCHINI, 2002;

    FLEMING et al., 2010).

    Considerando que MM induz mudana na excitabilidade cortical sendo est

    passvel de mensurao com o uso de EMT, alguns autores tm investigado a relao

    entre MM e excitabilidade cortical em algumas patologias especfica.

  • 24

    Liepert et al. (2009, 2011) investigaram tal relao em pacientes com paresia

    psicognica. Em contraste com os dados de aumento da excitabilidade em M1 e CP

    durante tarefas de imagem mental, estudos em sujeitos com paresia psicognica de

    membro superior e inferior mostraram diminuio de excitabilidade cortical em M1

    durante mentalizao de ao dos membros afetados. Os pacientes em questo

    apresentam MEPs de MM inferiores aos MEPs de repouso, sugerindo inibio do

    sistema motor durante a tarefa, e aumento regular de excitabilidade motora durante

    observao de outro sujeito realizando o mesmo movimento; em consonncia com o

    que geralmente encontrado tanto em sujeitos saudveis como em pacientes

    neurolgicos. Os autores especulam que essa discrepncia possa constituir o substrato

    eletrofisiolgico da inabilidade de se mexer voluntariamente em distrbios de converso

    motora, mostrando o envolvimento crucial da mentalizao no planejamento da ao e,

    levantam ainda o papel importante da perspectiva em terceira pessoa sugerindo, nesses

    casos, que o foco de ateno do paciente em outra pessoa possa ser a melhor forma de

    aplicao teraputica (LIERPERT et al.,2009; LIEPERT et al., 2011).

    Outra condio que vem sendo investigada dessa forma o autismo. Em estudo

    de avaliao dos MEPs em tarefa de observao de movimentao de dedos, realizada

    em grupo controle e grupo autista pareados por sexo e idade, foi demonstrado que no

    grupo de autistas a excitabilidade cortical significativamente menor em comparao

    ao grupo controle e, alm disso, a observao dos movimentos dos dedos facilitou o

    potencial evocado motor gerado por EMT no grupo controle, mas no no grupo de

    autistas. Os achados so discutidos a luz de estudos prvios sobre o comprometimento

    do MNS nesse grupo (THORET et al., 2005). Tais resultados sinalizam novas

    possibilidades de se investigar as bases neurais dos dficits cognitivos e sociais

    caractersticos no autismo.

  • 25

    Sendo assim, os substratos neurais envolvidos na compreenso e realizao

    dessas tarefas podem estar comprometidos e as tcnicas de modulao cerebral se

    apresentam como ferramentas que modulam a excitabilidade, podendo aument-la

    nesses casos, o que possivelmente resultaria em efeito facilitatrio nesses grupos com

    funcionamento cortical anormal e, dessa forma, funcionando como ferramenta de

    interveno.

    1.2 Estimulao transcraniana por corrente contnua (ETCC)

    A histria do uso de corrente eltrica aplicada em seres humanos remonta a

    perodos anteriores prpria descoberta de como se gera corrente eltrica. Scribonius

    Largus, mdico na Roma antiga (43-48 DC) observou sbita letargia transitria e

    concomitante alvio de dor ao colocar um peixe eltrico vivo sobre o escalpe de paciente

    com dor de cabea, direcionando, desta forma, uma forte corrente eltrica direta.

    Plinio, o velho, e Claudius Galeno reproduziram estes resultados, percebendo

    que o benefcio deveu-se ao torpor e efeito narctico induzido pela transferncia de

    eletricidade do peixe eltrico (PRIORI, 2003).

    Alessandro Volta em 1792 reconheceu que o estimulo eltrico de duraes

    variadas pode evocar diferentes efeitos fisiolgicos; desenvolveu, ainda, a pilha

    voltaica, permitindo a gerao de eletricidade e seu uso sistemtico (BOGGIO, 2006). A

    partir dos estudos de Luigi Galvani, na Bolonha (1791-1797), que foram um marco nas

    pesquisas com eletricidade, foi criado o termo correntes galvnicas para a induo de

    corrente direta em tecidos. Assim, aps estes experimentos, as correntes galvnicas

    foram prontamente aplicadas em medicina clnica, particularmente em distrbios

    mentais (PRIORI, 2003).

  • 26

    Aldini realizou estudos preliminares tambm em cadveres e na cabea de

    humanos recentemente guilhotinados, obtendo contrao muscular facial nos mesmos.

    Augistin e Grapengiesser tambm utilizaram correntes galvnicas como tcnica de

    tratamento por estimulao ou sedao (PRIORI, 2003).

    A histria da eletrofisiologia tem inicio com a descoberta dos efeitos biolgicos

    da estimulao transcraniana, sendo esta muito efetiva na modulao do disparo

    neuronal espontneo (PRIORI, 2003). A renovao e elaborao de novas tcnicas tm

    gerado um novo destaque estimulao transcraniana por corrente contnua (ETCC)

    nos estudos atuais (BOGGIO, 2006).

    A ETCC utilizada como ferramenta no invasiva de neuromodulao via

    polarizao cerebral. Utiliza-se o uso de corrente eltrica de baixa densidade (1-2mA)

    por meio de dois eletrodos (usualmente 5x7cm ou 5x5cm) no escalpe (BOLOGNINI;

    PASCUAL-LEONE; FREGNI, 2009). A carga eltrica flui sem mudana de direo,

    polarizando tecidos; at mesmo fraca corrente contnua passa pelo escalpe e influencia a

    atividade cerebral humana (PRIORI, 2003).

    Os efeitos modulatrios da atividade cerebral decorrente da estimulao direta

    no escalpe por corrente eltrica podem surgir atravs de diversos mecanismos bsicos

    que concorrem para alterar a funo da membrana neural (ARDOLINO et al., 2005).

    O tecido exposto polarizado e a ETCC modifica a excitabilidade e atividade

    neuronal espontnea por meio de despolarizao ou hiperpolarizao do potencial de

    repouso da membrana (NITSCHE et al., 2008).

    Os efeitos de longa durao so dependentes de sntese de protenas

    acompanhado de modificaes intracelulares de nveis de clcio e AMPc (NITSCHE et

    al., 2008). Mudanas nas propriedades e nmero de canais de ons podem afetar a

  • 27

    propagao neuronal da atividade e contribuir para a plasticidade no-sinptica

    (ARDOLINO et al., 2005).

    Um importante fenmeno induzido por corrente contnua nos tecidos a

    eletrlise da gua, H+ e OH- gerados por eletrlise e dissociados poderiam mudar o

    balano cido-base pela induo de acidose ou alcalose que, por sua vez, notavelmente

    afeta a membrana, o receptor, e a funo da clula. Como as mudanas do pH

    intracelular e de [Ca+] so intimamente correlacionadas, a hiptese de N-metil-D-

    aspartato (NMDA) como receptor-mediador da depresso sinptica a longo-prazo um

    possvel mecanismo. Os resultados devem, entretanto, ser interpretados com cuidado,

    pois o dextrometorfano em altas doses pode tambm inibir, de forma no especfica,

    canais de voltagem dependente ou no de NMDA (ARDOLINO et al., 2005).

    Mudanas de pH sobre a polarizao do eletrodo poderia tambm afetar a funo

    da membrana externa da sinapse direta e indiretamente, assim modificando a atividade

    do sistema NMDA (ARDOLINO et al., 2005).

    Aplicao transcraniana at mesmo com corrente fraca direta induz o fluxo de

    corrente intra-cerebral o suficiente para ser eficaz na alterao de atividade neuronal e

    comportamental (NITSCHE et al., 2008).

    A eficcia nesta modificao depende da densidade da corrente, que determina a

    intensidade do campo eltrico induzido, e tamanho do eletrodo. Tambm relevante o

    tempo de estimulao, que determina a ocorrncia e durao de efeitos de longo prazo.

    Outro parmetro importante a orientao do campo eltrico, que geralmente

    definido pelo posicionamento e polaridade dos eletrodos. A corrente flui do eletrodo

    carregado negativamente para o eletrodo carregado positivamente, assim do ctodo para

    o nodo (NITSCHE et al., 2008). Segundo PURPURA e McMURTRY (1964)

    estimulao andica produz uma despolarizao do corpo celular de neurnios

  • 28

    piramidais; j a estimulao catdica gera resultados opostos, produzindo uma

    hiperpolarizao, assim, estimulao andica do crtex aumenta a excitabilidade

    cortical podendo induzir melhora de desempenho em algumas tarefas devido a aumento

    da atividade da rea estimulada, enquanto o oposto ocorre pela estimulao catdica

    (NITSCHE, PAULUS, 2000).

    Evidncias de que a ETCC no escalpe pode tambm induzir mudanas

    prolongadas de excitabilidade cerebral que persistem aps o trmino da estimulao,

    abre a possibilidade de novos estudos sobre seus efeitos em diferentes distrbios

    neurolgicos. Alguns estudos sinalizam que seu efeito pode induzir mudanas

    persistentes na excitabilidade cortical podendo durar at cerca de 1h (PRIORI, 2003).

    importante, tambm, ressaltar que a tcnica considerada segura e com efeitos

    colaterais mnimos. Segundo NITSCHE et al. (2008), a ETCC aplica correntes com

    intensidades muito mais baixas, sendo danos ao tecido bastante improvveis.

    A gerao de toxinas produzidas e a dissoluo de produtos dos eletrodos

    poderiam ocasionar leso cerebral pela formao de produtos txicos causados pela

    interao dos eletrodos com o crtex cerebral (NITSCHE et al., 2003), entretanto os

    eletrodos da interface eletrodo-tecido esto em contato direto apenas com a pele e no

    com o crtex cerebral oferecendo riscos apenas no contato com a pele, pois no h

    interface crebro-eletrodo; sendo a tcnica realizada com eletrodos envoltos em esponja

    mergulhada em gua salina, as reaes qumicas na interface de pele e eletrodos so

    minimizadas, no apresentando riscos (NITSCHE et al., 2008).

    POREISZ et al. (2007), revisaram e resumiram os efeitos adversos encontrados

    em estudos laboratoriais em 567 sesses de ETCC. Os autores encontraram mais

    comumente leve sensao de formigamento, fadiga moderada e coceira leve sob os

    eletrodos durante as sesses. Aps a estimulao dores de cabea, nuseas e insnia

  • 29

    foram reportadas muito raramente e, em geral, so encontradas tambm aps ETCC

    placebo.

    Assim, sugerido que a aplicao de ETCC sobre reas corticais motoras e no-

    motoras (occiptal, parietal e temporal), seguindo as diretrizes de segurana da tcnica,

    provoca efeitos adversos relativamente pequenos em humanos (POREISZ et al., 2007).

    1.3 Mentalizao Motora, Estimulao No-invasiva e Reabilitao

    Na literatura foram encontrados poucos estudos utilizando ETCC concomitante a

    MM. O primeiro estudo nessa direo est relacionado movimentao e mentalizao

    motora (QUARTARONE et al., 2004) e outro mais recente aborda o uso concomitante

    das tcnicas para o tratamento de dor neuroptica (SOLER et al., 2010).

    Investigando os efeitos da ETCC e MM, Quartarone (2004) realizou aplicao

    de ETCC sobre M1 correspondente ao primeiro msculo intersseo dorsal direito

    avaliando excitabilidade cortical com MEPs de repouso e de MM de abduo do dedo

    indicador antes e 10, 20, 30 e 60min aps 5 minutos de ETCC a 1mA (catdica, andica

    e placebo) e compararam com o efeito da mesma tarefa de MM sem ETCC. A

    estimulao andica (ETCCa) apresentou efeito significativo apenas em MEP de

    repouso sem efeitos em MEP de MM. Os autores justificam esses achados considerando

    que a MM por si s produz aumento na excitabilidade cortical e que, sendo assim, pode

    ter ocorrido efeito teto. J aps a estimulao catdica (ETCCc), foram observadas

    reduo de amplitude em 30% em MEP de repouso, e em 50% em MEP com MM.

    Aps 10 min de estimulao os MEPs de repouso retornaram aos valores de linha de

    base enquanto os MEPs de MM se mantiveram suprimidos por 30 min, mostrando

    efeitos mais prolongados na combinao dessas estratgias. A estimulao placebo

  • 30

    (ETCCp) no provocou alteraes de MEP em relao ao grupo que realizou

    mentalizao sem uso da estimulao (QUARTARONE et al., 2004).

    Os autores sugerem ainda, baseados em estudos de neuroreabilitao por

    estimulao cortical no invasiva, que a ETCCa possa reforar a fase de aquisio e

    consolidao de aprendizado motor em pacientes neurolgicos e, sabendo-se que a MM

    auxilia de maneira anloga a estes, a combinao dessas tcnicas pode ainda ser eficaz.

    Quanto a ETCCc, discutido seu uso acerca da regulao de excitabilidade durante

    tarefas manuais em condies de aumento anormal de disparo neuronal e aprendizado

    motor anormal (QUARTARONE et al., 2004).

    Na investigao dos efeitos de MM e ETCC sobre dor neuroptica, Soler et al.

    (2010) elaboraram uma forma de MM com tcnicas de observao por espelho virtual

    i.e., pacientes sentados observavam a parte superior corporal em espelho comum e a

    parte inferior corporal em um espelho virtual gerando imagens de caminhada. Pacientes

    com leso medular foram divididos em 4 grupos: ETCCa + iluso visual de caminhada

    (combinao), ETCCa + iluso controle (ETCC); ETCC placebo + iluso visual de

    caminhada (iluso visual) ou ETCCp + iluso controle (placebo). As sesses de

    estimulao tiveram durao de 20 minutos e a corrente aplicada foi de 2mA. Foi feita a

    comparao dos efeitos de tratamento isolado e combinado de MM e ETCCa sobre M1

    por meio de escalas de dor e medidas de excitabilidade cortical, com EMT, antes e

    depois do tratamento e ainda na 2, 4 e 12 semana aps o tratamento. Foi constatada

    melhora significativamente maior no grupo que recebeu combinao dos tratamentos

    em relao a todas as outras situaes, sendo que essa melhora persistiu at a 12

    semana. Tal resultado demonstra a eficcia da combinao de neuromodulao por

    ETCC com MM no tratamento de dor neuroptica ps leso medular, com efeitos

    colaterais mnimos.

  • 31

    1.4 Eletroencefalografia

    Uma forma no invasiva de mensurar a atividade cerebral por meio da tcnica

    de eletroencefalografia (EEG) que mede diretamente a atividade cerebral, registrando os

    campos eltricos e magnticos gerados por populaes neurais, atravs da captao por

    eletrodos fixados no escalpe sendo, portanto, uma avaliao no-invasiva (OTTEN,

    RUGG, 2005). Os dados eletrofisiolgicos apresentam como vantagem principal em

    relao a tcnicas de neuroimagem, como a ressonncia magntica funcional, medidas a

    alta preciso temporal (MICHEL et al., 2004; LANTZ et al., 2003; MENENDEZ et al.,

    2004; ORTIGUE et al., 2004).

    Segundo Galambos (1992) h diferentes tipos de atividade oscilatria, ou seja,

    de variaes na atividade cerebral que ocorrem por questes fisiolgicas bsicas ou em

    decorrncia de alteraes do meio: espontnea (totalmente no relacionada condio

    experimental), induzida (relacionada condio experimental, mas no estritamente ao

    momento do estmulo) e evocada (estritamente relacionada ao momento da condio

    experimental dos eventos apresentados, tem a mesma fase em cada repetio do

    estmulo).

    Dessa forma, h dois tipos de medidas geralmente analisadas em condio

    experimental, os potenciais evocados relacionados a eventos (Evoked-Related Potencial

    ERP), que consistem em oscilaes mensuradas em segmentos de milissegundos

    relacionadas a fases de processamento de estmulos externos evocados no momento de

    apresentao do evento, e dessincronizao/sincronizao relacionada a eventos (Event-

    Related Desynchronization/Synchronization ERD/ERS), que consistem em oscilaes

    das amplitudes em faixas de frequncia de atividade eltrica cerebral, registradas em

    reas especficas do crtex, estas so geralmente analisadas em segmentos de segundos

  • 32

    e podem trazer insights sobre correlaes cognitivas funcionais desses sinais induzidos

    por condio experimental (RIPPON, 2006).

    Ambos os potenciais evocados mencionados consistem em sinais produzidos e

    registrados que representam uma somatria de ativaes locais e so importantes para

    mensurao e compreenso de processamentos motores e cognitivos (OTTEN, RUGG,

    2005), sendo que os potenciais evocados podem ser considerados resultados de

    reorganizao das fases dos sinais de EEG em andamento (SAYERS et al.,1974) devido

    a estmulos internos e externos.

    Em seu primeiro relato sobre EEG, Hans Berger (1929) descreveu as ondas alfa

    e beta, estas apresentam oscilaes de aproximadamente 10 Hz e 12-30 Hz,

    respectivamente. As ondas alfa parecem associadas a diversos processos cognitivos

    sendo os mais importantes: memria, ateno, e conscincia visual. Ainda que

    pesquisadores suponham que os geradores de atividade alfa estejam no crtex, eles so

    provavelmente orientados por clulas talmicas (HERRMAN, GRIGUTSCH, BUSCH,

    2005).

    Desde este estudo, sabe-se ainda que certos eventos podem bloquear ou

    dessincronizar as ondas cerebrais e, portanto, o padro oscilatrio das frequncias de

    ondas, restritos a um perodo (PFURTSCHELLER, LOPES DA SILVA, 1999). Assim,

    esses fenmenos relacionados a eventos representam alteraes especficas da atividade

    corrente de EEG consistindo, em termos gerais, em diminuio ou aumento do poder

    (amplitude) de certa faixa de frequncia, o que parece ser decorrente de diminuio

    (ERD) ou aumento da sincronia (ERS) das populaes neurais subjacentes,

    respectivamente (PFURTSCHELLER, 1977; PFURTSCHELLER, ARANIBAR, 1977;

    PFURTSCHELLER, 1992).

  • 33

    Os fatores que determinam as propriedades oscilatrias descritas so: as

    propriedades intrnsecas da membrana neuronal e a dinmica do processo sinptico, a

    fora ou extenso das interconexes entre elementos da rede, comumente formados por

    loops de feedback tlamo-cortical ou crtico-cortical e as influncias de modulao de

    sistemas neurotransmissores gerais ou locais (PFURTSCHELLER, LOPES DA SILVA,

    1999).

    Em resumo, podemos definir que ERPs representam respostas de neurnios

    corticais a alteraes de atividade aferente, enquanto ERD/ERS refletem alteraes da

    atividade de interaes locais entre neurnios principais e inter-neurnios que controlam

    a frequncia dos componentes do EEG em andamento.

    1.4.1 Frequncia Mu

    Diferentes faixas de frequncia so distinguveis dentro da faixa de extenso de

    alfa, sendo definidos dois padres distintos que podem ser observados: dessincronizao

    menor de alfa, que consiste em uma faixa de freqncia vai de aproximadamente 7a

    10Hz e dessincronizao maior de alfa, que consiste em uma faixa de freqncia de

    aproximadamente 10 a 12Hz. A primeira obtida em resposta a quase todo tipo de teste

    e topograficamente generalizada na rea recrutada do escalpe, provavelmente

    refletindo demanda ao teste e processos atencionais. J a segunda faixa comumente

    restrita topograficamente e se desenvolve durante o processamento de informao

    sensorial-motora especfica em reas parieto-ociptais (PFURTSCHELLER, LOPES DA

    SILVA, 1999). A frequncia alfa (maior e menor) referente a insumos sensrio-motores,

    registrada na regio de C3 e C4 por sua especificidade recebeu a nomenclatura prpria

    de frequncia Mu.

  • 34

    A frequncia Mu foi descrita inicialmente por Gastaut e Bert (1954) e

    denominada ritmo mu ou rolndico ou ainda ritmo em arco (rhythms en arceau). Os

    autores notaram supresso desse ritmo quando sujeitos se identificavam com

    personagens, observados em um filme, que estavam realizando movimentos. Foi ento

    denotada como atividade registrada na ausncia de processamento sensorial ou atividade

    motora (GASTAUT, BERT, 1954; NEIDERMEYER, 1999; WOLPAW et al., 2002).

    H divergncias quanto ao valor adotado da faixa de frequncia de Mu, sendo

    mais comumente aceito que as ondas Mu consistem em oscilaes de cerca de 8-13Hz

    com durao de curtos perodos (de 0.5s a 2s) (PINEDA, 2008). Como j mencionado,

    est na mesma faixa de frequncia das ondas alfa, porm essas ondas recebem diferentes

    nomenclaturas por refletirem diferentes atividades e serem registradas em reas

    cerebrais distintas (HERRMAN, GRIGUTSCH, BUSCH, 2005).

    Essa faixa de frequncia pode ser observada durante estado de repouso em reas

    sensrio-motoras e, dados recentes evidenciam que as alteraes desse padro de

    frequncia parecem refletir de forma indireta a atividade dos neurnios do crtex pr-

    motor (HARI, 2006; PINEDA, 2008; PERKINS et al., 2010).

    Os ritmos Mu aparecem geralmente associados com ritmo beta (McFARLAND

    et al., 2000; WOLPAW et al., 2002); por vezes estas duas oscilaes se apresentam de

    forma harmnica porm, alguns estudos mostram que estes so separveis por

    topografia e tempo parecendo caractersticas independentes do EEG (McFARLAND et

    al., 2000).

    As ondas Beta apresentam faixa de frequncia acerca de 12-30 Hz e so

    investigadas no contexto de aes motoras, sendo suprimidas durante a realizao de

    movimentos, porm aumentadas aproximadamente 1 s aps o trmino do movimento, o

    que denominado de efeito rebote. registrada topograficamente prxima s regies

  • 35

    sensrio-motoras da parte corporal envolvida no movimento efetuado (HERRMAN,

    GRIGUTSCH, BUSCH, 2005). Sua fonte principal parece ser o cortx motor primrio,

    enquanto as fontes geradores das ondas Mu parecem localizados no crtex

    somatosensorial (CHEYNE et al., 2003; HARI et al., 1998; ROSSI et al., 2002), ainda

    que sua supresso seja um reflexo da atividade do crtex motor primrio.

    1.4.2 Supresso das ondas Mu por Mentalizao Motora

    A supresso do ritmo mu registrado pelo EEG parece refletir o sistema

    subjacente a funes de mentalizao, observao e execuo. Dados neurofisiolgicos

    humanos mostraram que a atividade rtmica de reas sensrio-motoras primrias,

    especificamente as ondas Beta (~20 Hz) e Mu (~10 Hz), exibem modulao consistente

    com a hiptese de que estes substratos neurais tm um papel funcional no sistema

    neurnios-espelho humano (HARI et al., 1998; JARVELAINEN et al., 2001;

    MUTHUKUMARASWAMY, JOHNSON, 2004).

    Em 1994, Pfurtscheller e Neuper relataram que ambos movimento e MM

    produzem dessincronizao de Mu e Beta nas reas sensrio-motoras contralaterais

    (PFURTSCHELLER, NEUPER, 1994). Assim, a mentalizao vem sido abordada

    como uma maneira efetiva de controlar as amplitudes dos ritmos Mu e Beta, podendo

    ter um papel importante na comunicao baseada em EEG e, na interface crebro

    mquina (WOLPAW, McFARLAND, 1994; McFARLAND et al., 2000) .

    McFarland et al. (2000) porm, levantam as diferenas topogrficas das ondas

    Mu e Beta, sendo Mu focada em CP3 e CP4 e Beta com foco mais difuso em torno do

    vrtex sendo ento argumentado que a atividade de Beta no seja um resultado

    harmnico da forma no sinusoidal da atividade rtmica de Mu mas sim uma atividade

  • 36

    independente. Dessa forma, iremos priorizar as pesquisas com supresso do ritmo Mu

    que vem sendo extensamente estudado desde ento.

    A reatividade dos ritmos corticais rolandicos proporciona uma janela acessvel

    para a interessante conexo entre percepo e ao e, s relaes do sujeito com o meio

    e outras pessoas. Diversos estudos tm utilizado essa medida eletrofisiolgica na

    investigao do papel dos neurnios em espelho durante testes motores e cognitivos

    avaliando ainda balanceamento inter-hemisfrico e relao entre excitao e inibio

    cortical (para reviso ver HARI, 2006).

    proposto que o aumento de excitabilidade cortical em M1 e consequentemente

    a dessincronizao no ritmo Mu ocorra devido ao insumo proveniente do MNS pr-

    motor, pois dados neurofisiolgicos humanos mostram que a atividade rtmica de reas

    sensrio-motoras primrias exibe modulao consistente com a hiptese de que estes

    substratos neurais tenham papel funcional no MNS humano (JARVELAINEN et al.,

    2001; MUTHUKUMARASWAMY, JOHNSON, 2004). A reatividade do cortx motor

    reflete, ainda, funes do giro frontal inferior (IFG) que, possivelmente com o lobo

    parietal inferior, pode ter um papel de interface para conexes de percepo-ao e para

    modelos internos de avano e retrocesso (NISHITANI et al., 2005).

    Devido ao ritmo Mu ser um indicador indireto de possvel atividade dos

    neurnios-espelho por inferncia de que a dessincronizao de neurnios sensrio-

    motores seja decorrente da atividade do MNS, o EEG um dos mtodos que vem sendo

    utilizado para investigar a atividade do MNS humano tanto em populao saudvel

    quanto em autistas (PERKINS et al., 2010).

    A ativao dos neurnios pr-motores e o consequente aumento de

    excitabilidade cortical e ERD de Mu ocorre em decorrncia de diversos mecanismos.

    Alm da realizao do movimento em si, situaes de observao de movimentos

  • 37

    (BUCCINO et al., 2001; MUTHUKUMARASWAMY, JOHNSON, 2004), observao

    de pontos de luz agrupados de forma que simulem movimento humano (ULLOA,

    PINEDA, 2007), mentalizao de movimentos prprio ou do outro (McFARLAND et

    al., 2000; RUBY, DECETY, 2001; FOURKAS et al., 2006; FRANCUZ, ZAPALA,

    2011), e at mesmo percepo de movimento em imagens estticas (GIROMINI et al.,

    2010; PINEDA et al., 2011) resultam em aumento de excitabilidade cortical do crtex

    pr-motor e consequente reduo da amplitude das ondas Mu. Essa atividade provoca

    disparos neuronais assincrnicos que resultam em reduo na oscilao do ritmo Mu no

    crtex sensrio-motor, ou seja, ERD ou supresso do ritmo Mu.

    As correspondncias de ao-percepo intra e inter indivduos, so refletidas na

    reatividade do crtex motor j na primeira infncia (FECTEAU et al., 2004; LEPAGE,

    THORET, 2006). Lepage e Thoret (2006) investigaram se em crianas com idade

    abaixo dos 11 anos j se podia observar a supresso do ritmo Mu identificada em

    adultos durante observao de ao/movimento das mos. Os autores observaram um

    sistema de observao/execuo relacionado atenuao do ritmo Mu nessa populao,

    que sabe-se estar em processo de maturao cerebral.

    Francuz e Zapala (2011) elaboraram tarefa de mentalizao baseada na

    habilidade de identificar objetivos das aes motoras; um dos principais elementos da

    teoria de neurnios espelho (RIZZOLATTI, SINIGAGLIA, 2008). Para tal, os sujeitos

    aprendiam movimentos de um peo em tabuleiro de xadrez e ento realizavam tarefa em

    duas condies, em observao do movimento completo ou mentalizao, aonde inicio

    do movimento era apresentado e o sujeito deveria mentalizar a finalizao do

    movimento, sendo que este movimento apresentado poderia ser realizado com o peo

    apenas ou com o peo sendo movimentado por mo humana. Os resultados mostram

  • 38

    supresso de Mu similar para ambas as condies tendo o efeito maior magnitude na

    condio de observao (FRANCUZ, ZAPALA, 2011).

    Nessa linha, Oberman et al. (2005, 2007) tambm investigaram a relao de

    frequncias entre 8-13Hz durante tarefas de observao e execuo. Em voluntrios

    saudveis, observa-se supresso desta banda de frequncia durante execuo e

    observao de aes. Porm, estudos com voluntrios autistas, mostram padro

    eletrofisiolgico diferente (OBERMAN et al., 2005; BERNIER et al., 2007) e, apesar de

    esta supresso anormal de Mu no ser bem conhecida e estabelecida em populao com

    autismo (RAYMAEKERS, WIERSEMA, ROEYERS, 2009) os estudos realizados

    mostram dados bastante importantes.

    Oberman et al. (2005) apresentaram vdeos de movimento biolgico (e.g., mo)

    e no biolgico (e.g., esferas) e pediram que os sujeitos realizassem movimentos com

    suas mos. O registro eletroencefalogrfico concomitante a essas tarefas foi feito em

    participantes com diagnstico de autismo e bom desempenho cognitivo e grupo

    controle, pareados por sexo e idade. O grupo controle apresentou supresso no ritmo

    Mu tanto na tarefa de observao quanto na de execuo de movimentos com a mo. J

    os participantes com diagnstico de autismo apresentaram supresso do ritmo Mu

    durante execuo, mas no durante observao, sustentando a hiptese de um MNS

    disfuncional no autismo.

    Bernier et al. (2007) investigaram os padres de atenuao do ritmo Mu durante

    observao, execuo e imitao de movimentos e correlacionaram com testes

    comportamentais de imitao. Foram comparados 14 adultos com diagnstico de

    autismo de alto funcionamento com 15 adultos pareados por QI e idade. Na tarefa de

    imitao, os adultos com autismo apresentaram desempenho pior; na tarefa com EEG,

    os dois grupos apresentaram atenuao do ritmo Mu na tarefa de execuo de ao; j

  • 39

    para a tarefa de observao, os autistas apresentaram reduo de atenuao significativa

    no ritmo Mu quando comparado com o outro grupo; os autores observaram correlao

    entre a tarefa de imitao e o grau de atenuao das ondas Mu.

    Com isso, os diferentes resultados para supresso de Mu em populao com

    autismo sugerem que h uma disfuno no sistema de observao/execuo em pessoas

    com autismo e, que isto se relaciona com grau de prejuzo nas habilidades de imitao

    (BERNIER et al., 2007), conferindo suporte adicional a teoria do envolvimento dos

    neurnios espelho, visto que diversos trabalhos defendem prejuzo nesse sistema para

    esta populao especfica (IACOBONI, MAZZIOTA, 2007; CATTANEO,

    RIZZOLATTI, 2009; OBERMAN, RAMACHANDRAN, 2007).

    Ademais, alguns estudos reportam diferenas inter-hemisfricas quanto a

    magnitude do efeito de supresso de Mu (OBERMAN et al., 2007) enquanto outros

    reportam que no h diferenas significativas (ULLOA, PINEDA, 2007). Quanto a essa

    questo, o estudo de Francuz e Zapala (2011) levanta uma questo metodolgica

    importante que parece influenciar esse dado. Ao avaliar diferena de supresso

    considerando o registro de 8 eletrodos, em cada hemisfrio, ao redor de C3 e C4 no

    foram observadas diferenas enquanto em anlise de apenas dois eletrodos, C3 e C4

    propriamente ditos, foi observado efeito mais robusto de mentalizao do lado direito

    do escalpe. Para ambas as anlises os demais efeitos observados so os mesmos. Assim,

    quanto maior o nmero de eletrodos analisados, maior a varincia e menor a

    probabilidade de encontrar diferenas inter-hemisfricas (FRANCUZ, ZAPALA, 2011).

    Vale ressaltar, tambm, que a supresso de Mu de 15-20% mais robusta para

    observao ao vivo em relao s observadas em vdeo (JARVELAINEN et al., 2001).

    Por fim, dado que os sinais eletroencefalogrficos provenientes da MM esto

    associados a reas corticais diretamente conectadas aos canais motores cerebrais e estes

  • 40

    serem suprimidos em condio de movimento ou preparao para movimento,

    particularmente no hemisfrio contralateral (PFURTSCHELLER e NEUPER, 1994;

    MCFARLAND et al., 2000), sugerido que o ritmo Mu consista em um bom sinal de

    medida de ativao do MNS e, ainda, para comunicao baseada em EEG, podendo

    suportar mecanismos de interface entre crebro e mquina (WOLPAW et al., 2002).

    Quanto combinao da tcnica de imagem mental com estimulao no-

    invasiva, visando maximizar os efeitos j conhecidos, apenas um estudo avaliou este

    impacto. Por meio de medidas de EMT e EEG, foi observada maior excitabilidade

    cortical em M1 e maior ERD de Mu na condio andica e menor excitabilidade

    cortical em M1 e menor ERD na condio catdica em relao ao placebo

    (MATSUMOTO et al., 2010).

    Portanto, a combinao de ETCC e MM parece uma interessante alternativa.

    Contudo, a amostra do trabalho foi de apenas 6 sujeitos e a anlise estatstica foi

    realizada de forma pouco criteriosa (e.g., utilizando diferentes tipos de post hoc: ora

    LSD, ora teste t). Ademais esses dados no foram comparados a situaes de

    observao ou execuo do movimento. Sendo assim, o presente estudo se justifica pela

    possibilidade de elucidar os efeitos da ETCC sobre uma amostra maior para possvel

    inferncia dos efeitos sobre a populao geral e ainda, verificar os efeitos da ETCC em

    ondas Mu na observao do movimento e sua comparao com a situao de

    mentalizao.

  • 41

    2. Objetivos

    2.1 Objetivos Gerais

    Avaliar o efeito da estimulao transcraniana por corrente contnua em registro

    eletroencefalogrfico de ondas Mu durante tarefa de observao e mentalizao de

    movimentos.

    2.2 Objetivos Especficos

    Avaliar efeitos polaridade dependente de ETCC andica, catdica e placebo em

    supresso de ritmo Mu durante condies de observao e mentalizao de

    movimento biolgico e no biolgico.

    Avaliar a supresso do ritmo Mu durante tarefas de observao e mentalizao

    de movimento biolgico comparando com a condio controle.

    Avaliar a supresso do ritmo Mu durante tarefas de observao e mentalizao

    de movimento no biolgico comparado a situao controle.

    Comparar supresso de Mu durante observao e mentalizao de movimento

    biolgico e no biolgico.

    3. Mtodo

    3.1 Participantes

    Participaram do estudo 21 voluntrios do sexo masculino, destros (atestado pelo

    inventario de lateralidade de Edimburgo reduzido), com idade mdia de 23.8+3,06, com

    ensino superior completo ou em curso, viso normal ou corrigida e no portadores de

    doenas neurolgicas ou psiquitricas.

  • 42

    3.2 Instrumentos

    3.2.1 De Caracterizao da Amostra

    Foram coletados dados de caracterizao scio-demogrfica por meio de

    preenchimento de ficha de dados scio-demograficos e em seguida foi aplicado o

    Inventrio de Dominncia Lateral de Edimburgo verso reduzida (anexo A) para

    confirmar que os voluntrios recrutados fossem todos destros.

    3.2.2 De modulao do processamento neurofisiolgico

    Equipamento de estimulao transcraniana por corrente contnua.

    O equipamento utilizado para gerar corrente contnua constitudo basicamente

    por quatro componentes principais: eletrodos (nodo e ctodo), ampermetro (medidor

    de intensidade de corrente eltrica), potencimetro (componente que permite a

    manipulao da intensidade da corrente) e um jogo de baterias para gerar a corrente

    aplicada.

    A fonte de energia eltrica obtida atravs da associao em srie de 3 baterias de

    9 volts resultando em uma tenso total de 27 volts. Esta tenso aplicada nos extremos

    de um potencimetro (reostato) com resistncia igual a 100 kOhms. A funo do

    potencimetro de possibilitar uma tenso ajustvel variando de 0 at 27 volts.

    Os eletrodos fazem com que a corrente eltrica se transmita do fio metlico para o

    participante; so feitos de borracha condutora de eletricidade e no momento da

    estimulao so envolvidos em esponja embebida em soluo fisiolgica. Os eletrodos

    utilizados neste experimento tm dimenses de 5cmx7cm.

    Utilizam-se, ainda, cintas elsticas para fixar os eletrodos no escalpe.

  • 43

    3.2.3 De Coleta e Anlise de dados Eletroencefalogrficos

    Equipamento de EEG

    a) Aparelho de Eletroencefalografia de 128 canais da marca Electrical

    Geodesics, Inc (EUA) modelo EEG System 300.

    Este equipamento composto por amplificador modelo Net Amps 300,

    transformador com isolamento, brao articulado para suporte do amplificador, licena

    para software de aquisio e anlise dos dados Net station, 6 redes de eletrodos modelo

    hydrocel da Geodesic (tamanhos: beb, peditrica pequena, peditrica grande, adulto

    pequeno, adulto mdio, adulto grande), CPU Macintosh para aquisio dos dados,

    monitor de 23 para acompanhamento dos dados, cmera de vdeo digital Sony,

    software para clculo de fontes geradores dos sinais (GeoSource Estimation Software),

    pacote para Potencial Evocado relacionado a Evento (PST, Inc - EUA), estao de

    trabalho E-prime para acoplar ao EEG (Net Station), computador de mesa Dell,

    hardware para os experimentos (microfone, caixa de repostas, cabos, adaptador para

    barra de resposta para o sistema EGI), monitor LCD 17 com vdeo splitter e switch,

    barra de resposta para EGI, single clock, AV device.

    b) EGI Net Station software para aquisio, visualizao e anlise dos dados

    de EEG coletados.

    E-Prime

    Software para sincronizao com a coleta do EGG que permite a apresentao

    dos estmulos (vdeos) da tarefa.

  • 44

    3.2.4 Tarefa de Observao e Mentalizao de Movimento

    A tarefa composta por duas condies experimentais uma condio controle

    para cada situao (observao e mentalizao), sendo a situao de observao sempre

    seguida de sua mentalizao correspondente (e.g., observao de movimento biolgico

    seguida de mentalizao de movimento biolgico). Cada condio apresentada por

    duas vezes, de forma randomizada. A tarefa total tem durao aproximada de 18minutos

    (Figura 01).

    Observao

    a) Observao de Movimento Biolgico (OB)

    Instruo de observar atentamente o movimento e contar quantas vezes o

    mesmo pausa. O vdeo consiste em movimento de pina de alta amplitude com

    frequncia de aproximadamente 1 Hz, realizado com a mo direita - 2 blocos de

    vdeos de 80s, sendo apresentadas de duas a quatro vezes, figuras estticas do

    movimento por 1s.

    b) Observao de Movimento No-Biolgico (ONB)

    Instruo de observar atentamente o movimento e contar quantas vezes o

    mesmo pausa. O vdeo consiste em duas esferas de mesmo tamanho se

    aproximando e distanciando em mesma angulao da condio biolgica com

    frequncia de movimento de 1 Hz - 2 blocos de vdeos de 80s, sendo

    apresentadas de duas a quatro vezes, figuras estticas do movimento por 1s.

    c) Controle 1

    Instruo de observar atentamente o movimento. O vdeo consiste em

    rudo branco 2 blocos de vdeos de 80s.

  • 45

    Mentalizao

    a) Mentalizao de Movimento Biolgico (MB)

    Instruo de fechar os olhos e imaginar-se realizando com a mo direita o

    movimento de abertura e fechamento em pina na mesma frequncia do

    movimento observado na condio de observao de movimento biolgico. Para

    guiar a mentalizao foi utilizada pista sonora de metrnomo, constituindo 2

    blocos de mentalizao biolgica de 80s, sendo cada sesso apresentada em

    seguida da condio de observao de movimento biolgico

    b) Mentalizao de Movimento No-Biolgico (MNB)

    Instruo de fechar os olhos e imaginar a visualizao do mesmo

    movimento de esferas observado na condio de observao, com a mesma

    frequncia de tal. Para guiar a mentalizao foi utilizada pista sonora de

    metrnomo, constituindo 2 blocos de mentalizao no-biolgica de 80s, sendo

    cada sesso apresentada aps cada uma das sesses da condio de observao

    no biolgica.

    c) Controle 2

    Instruo de fechar os olhos e imaginar a visualizao de rudo branco.

    Foi utilizada a mesma pista sonora dos demais blocos garantindo que esse fator

    no interferisse na avaliao das tarefas. Foram apresentadas 2 blocos de

    mentalizao controle de 80s, sendo cada sesso apresentada aps cada uma das

    sesses de condio de observao controle.

  • 46

    Para evitar efeitos sonoros na tarefa, na condio de observao

    apresentado o mesmo som da pista sonora de metrnomo da condio de

    mentalizao.

    3.3 Procedimento

    Participantes que contemplaram todos os critrios de incluso e excluso

    descritos anteriormente foram convidados a participar do estudo. Para tal, foi solicitado

    o consentimento livre esclarecido de cada participante aps serem-lhe explicados os

    objetivos, mtodos, benefcios e riscos potenciais do estudo.

    Assim, ao chegarem ao laboratrio os sujeitos responderam a ficha de dados

    demogrficos.

    Em seguida, os participantes foram encaminhados a uma sala preparada para os

    procedimentos, com iluminao adequada e sem interferncia de rudos ou

    movimentao/circulao de pessoas. Foi medida a circunferncia da cabea do sujeito

    e marcados o vrtex e M1.

    Anterior ao registro de EEG, os sujeitos receberam em cada um dos trs dias de

    teste um tipo diferente de estimulao (placebo, andica ou catdica), descritas a seguir,

    por 20min. A ordem das estimulaes foi randomizada e contrabalanceada entre os

    sujeitos. Os participantes foram alertados para o fato de que poderiam receber tanto

    estimulao placebo quanto ativa, porm no sabiam em que momento se daria cada

    uma delas.

    Estimulao andica do crtex motor primrio (ETCCandica) nodo

    posicionado em C3 conforme sistema internacional 10-20 de EEG e ctodo supraorbital

    contralateral;

  • 47

    Estimulao catdica do crtex motor primrio (ETCCcatdica) ctodo

    posicionado em C3 conforme sistema internacional 10-20 de EEG e nodo supraorbital

    contralateral;

    Estimulao placebo (ETCCplacebo) - nodo posicionado em C3 conforme

    sistema internacional 10-20 de EEG e ctodo supraorbital contralateral;

    Na estimulao placebo, o aparelho de ETCC foi ligado por 20 segundos para

    que o participante tivesse as mesmas sensaes das outras etapas e, em seguida o

    aparelho foi desligado. Tal procedimento vem sendo continuamente descrito e tem se

    mostrado eficaz na conduo de estudos com grupo placebo.

    Imediatamente aps a ETCC, foi colocada a touca de 128 canais do EEG na

    cabea do voluntario, a touca previamente preparada ficando por 5 min imersa em

    soluo 1L de gua morna com 11g de cloreto de potssio e 5ml de xampu neutro

    infantil. O tempo para o posicionamento e verificao do funcionamento da touca foi de

    10-15min.

    O participante sentou-se em poltrona confortvel a 110cm do monitor do

    computador, e recebeu instrues orais detalhadas para a execuo da tarefa. Em

    seguida, teve inicio a tarefa, que foi realizada trs vezes (em verses randomizadas) por

    cada voluntrio em dias diferentes, sendo esses encontros separados por intervalo

    mnimo de 48h.

    O desenho experimental do estudo est ilustrado na figura 1.

  • 48

    Figura 01 Desenho Experimental. A ordem dos vdeos de observao foi randomizada, sendo exibido, em seguida, a mentalizao correspondente. Os eletrodos de entorno so: entorno de C3

    (29, 30, 35, 37, 41, 42), Cz e entorno de C4 (87, 93, 103, 105, 110, 111) do sistema de EEG de

    128 canais da marca Electrical Geodesics, Inc (EUA) modelo EEG System 300. O smbolo

    sonoro indica os momentos em ocorria o estimulo auditivo do metrnomo.

    3.4 Consideraes ticas

    Os procedimentos experimentais adotados para o estudo obedeceram s normas

    estabelecidas pelo Comit de tica em Pesquisa da Universidade Presbiteriana

    Mackenzie que aprovou este projeto de pesquisa registrado no SISNEP (Processo

    CEP/UPM no 1423/11/2011 e CAAE n

    o 0117.0.272.000-11).

    Todos os participantes foram orientados, tendo pleno conhecimento dos

    objetivos e mtodos do experimento e deveriam ler a carta de informao ao sujeito de

    pesquisa e fornecer seu consentimento livre esclarecido por escrito. Foram tambm

    devidamente avisados de que todas as informaes fornecidas so estritamente sigilosas.

  • 49

    3.5 Anlise Estatstica

    O registro do EEG inicialmente passou por uma fase de pr-processamento que

    contm: a) filtro de 1Hz (Highpass Filtering); b) filtro de 30Hz (Lowpass Filtering); c)

    segmentao - remoo dos 10s iniciais e finais de cada bloco (eliminando a

    possibilidade de efeitos transitrios atencionais devido ao incio e trmino do estmulo)

    e segmentao do traado em janelas de 2000ms; d) deteco de artefatos - foram

    considerados artefatos e, consequentemente removidos: i) os canais com variao Max-

    Min maior que 200V, ii) aqueles com mais de 20% de artefatos, iii) segmentos com

    mais de 10 canais ruins ou com excessiva piscagem; e) combinao dos segmentos -

    gerando uma mdia para os trials de cada condio; f) re-referenciamento dos eletrodos;

    g) correo de linha de base a partir de 200ms anteriores a cada segmento.

    Aps o pr-processamento foi realizado o ps processamento. Neste momento

    foi integrada a taxa de poder de amplitude de 8-11Hz aplicando Wavelet Analyses

    (utilizamos janela do tipo Cosinus com comprimento de onda de 0.10s; considerando

    frequency step=0.98Hz e frequency scale factor=11.00). Em seguida, o dado foi

    extrado e calculamos a razo do poder de Mu durante observao e mentalizao

    experimental pelo poder de Mu em controle 1 e controle 2, respectivamente. Por fim,

    para todas as condies de ETCC foi aplicado logaritmo de base dois na razo obtida

    (condio experimental/condio controle). Esse mtodo tem sido amplamente aplicado

    em anlises de poder do ritmo mu (OBERMAN et al., 2005, 2007; GIROMINI et al.,

    2010; PINEDA et al., 2011)

    A partir dos dados obtidos na fase de ps-processamento, foi realizada anlise

    estatstica com o pacote statistica 8. Foram realizadas duas anlises de ANOVA para

    medidas repetidas considerando como fatores: ANOVA1 - condio (observao vs.

    mentalizao); movimento (biolgico vs. no-biolgico), estimulao (ETCCa vs.

  • 50

    ETCCc vs. ETCCp), hemisfrio (C3 (eletrodo 36) vs. C4 (eletrodo 104)); ANOVA2

    condio (observao vs. mentalizao); movimento (biolgico vs. no-biolgico),

    estimulao (ETCCa vs. ETCCc vs. ETCCp), eletrodos (entorno de C3 (eletrodos 29-

    30-35-37-41-42) vs. entorno de C4 (eletrodos 87-93-103-105-110-111) vs. Cz)).

    Anlise post hoc foi realizada quando encontrados efeitos significativos. Adotamos

    =5%.

    4. Resultados

    Todos os participantes recrutados completaram o experimento completo e

    tiveram seus dados utilizados na anlise. Nenhum participante relatou desconforto ou

    apresentou efeitos adversos pela aplicao da ETCC.

    A seguir esto apresentados os dados relativos ao poder de Mu considerando

    condio, movimento, hemisfrio (eletrodos relacionados rea envolvida na tarefa) e

    tipo de estimulao. Esta anlise diz respeito aos efeitos observados nos eletrodos C3 e

    C4.

  • 51

    Tabela 01 ANOVA1 para medidas repetidas considerando os Fatores ETCC, Condio, Movimento e Hemisfrio (eletrodos das reas motoras envolvidas na tarefa C3 e C4).

    Fatores F p p2

    ETCC 0.41 0.67 0.02

    Condio 1.05 0.32 0.05

    Movimento 10.20 0.005 0.34

    Hemisfrio 0.22 0.65 0.01

    ETCC*Condio 2.70 0.08 0.12

    ETCC*Movimento 1.20 0.31 0.06

    Condio*Movimento 0.20 0.66 0.01

    ETCC*Hemisfrio 3.41 0.04 0.15

    Condio*Hemisfrio 0.03 0.85 0.002

    Movimento*Hemisfrio 0.92 0.35 0.04

    ETCC*Condio*Movimento 1.39 0.26 0.07

    ETCC*Condio*Hemisfrio 0.46 0.63 0.02

    ETCC*Movimento*Hemisfrio 4.18 0.02 0.17

    Condio*Movimento*Hemisfrio 1.42 0.25 0.07

    ETCC*Condio*Movimento*Hemisfrio 0.13 0.88 0.006

    Como pode ser observado na Tabela 01, foram encontrados efeitos significativos

    para o fator Movimento (F1,20=10.2; p=0.005; p2=0.3) e para as interaes

    ETCC*Hemisfrio (F2,40=3.4; p=0.04; p2=0.1) e ETCC*Movimento*Hemisfrio

    (F2,40=4.2; p=0.02; p2=0.2). Foram realizadas anlises post-hoc com teste Fisher LSD

    para as interaes significativas.

    Como pode ser observado na Figura 02 a anlise post-hoc para interao

    ETCC*Hemisfrio mostrou diferena significativa entre ETCCc e ETCCa no eletrodo

  • 52

    C3 (p=0.016), i.e. ETCCc sobre C3 resultou em supresso de Mu nesta rea em relao

    ETCCa independente do tipo de movimento.

    A anlise post-hoc da interao ETCC*Movimento*Hemisfrio mostrou

    diferena significativa entre C3 e C4 no movimento biolgico em ETCCa (p=0.001),

    i.e. ausncia de supresso de Mu em C3 concomitante a supresso de Mu