O CORPO DE BOMBEIROS NO PARÁ _ AUTOR JOSÉ MENEZES (1)

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  • O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Apresentando a segunda edio deO Corpo de Bombeiros no Par

    Uma segunda edio deste livro j se fazia necessria, quer pelo fato de a primeira edio, lanada em 1998, ter se esgotado, quer pela avidez com que os novos bombeiros, sobretudo alunos da nossa Escola de Formao de Oficiais (EFO) e do Centro de Formao, Aperfeioamento e Especializao (CFAE), buscam se inteirar da histria do Corpo de Bombeiros paraense e conhecer um pouco da histria dos Bombeiros no Mundo e no Brasil.

    Nesta edio, toda ela revisada e atualizada, mantivemos a mesma diviso em captulos da edio anterior, apenas reordenando alguns assuntos, e acrescentamos nos Anexos duas novas leis, a de Organizao Bsica e a do Efetivo que em alguns artigos j foram modificadas, mas, no geral, continuam em vigor.

    Para a realizao desta segunda edio, manifesto meus agradecimentos minha filha Ana Luiza Barroso Magno, que colaborou na digitao e reviso dos textos e renovo meus sinceros agradecimentos ao hoje Subtenente BM/RR Manuel Moraes dos Santos, sem cuja colaborao no teria sido possvel a primeira edio desta obra.

    Agradeo tambm o apoio dos Coronis BM/RR Raimundo Nonato da Costa e Orlando Sarmanho Frade, ex-Comandantes Gerais do CBMPA e do atual Comandante, Cel BM Paulo Gerson Novaes de Almeida, bem como do Major BM Carlos Reis, ex-chefe da 5 seo e atual Diretor de Ensino e Instruo do CBMPA.

    Belm novembro de 200Jos Pantoja de Menezes

  • O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Apresentao ................................................................. 17

    Captulo 1 As Origens .............................................................22

    Tecnologia romana ......................................................... 23 Santos Padroeiros .............................................................. 24 Na Idade Mdia ................................................................. 25

    Captulo 2 No Brasil ..................................................................27

    D. Pedro II cria o 1 Corpo de Bombeiros do Pas ............ 30 Os Bombeiros e a Abolio ............................................... 31 Com baldes e latas ............................................................. 32

    Captulo 3 No Par ......................................................................34

    Precedentes ........................................................................ 34 Dos aguadeiros ao Corpo de Polcia ................................. 36 Homens e material do Rio para Belm ............................. 41 Nasce a Companhia de Bombeiros ................................... 43 Companhia passa a Corpo ................................................. 45

    Captulo 4 A Era Lemos .......................................................47

    Bombeiros passam a ser municipais ................................. 47 Escritura do terreno do QCG ............................................. 48

    ndice Remissivo

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    A construo do novo quartel ............................................ 51 Mudana por causa das obras ............................................ 52 Inaugurado Quartel da Joo Diogo ................................... 53 A marcha ............................................................................ 54 A nova sede dos Bombeiros .............................................. 56 A Sucursal da Cremao ................................................... 62 As escolas de Ginstica e Esgrima .................................... 68

    Captulo 5 Os Bombeiros e as revolues no Par (Parte I) ...........................................71

    Adeso Repblica ........................................................... 71 A Revolta de Cacaolinho ................................................... 72 Na Guerra de Canudos ...................................................... 73 A Queda de Lemos ............................................................ 76 A Revolta contra Enas Martins ........................................ 79

    Captulo 6 Regulamentos, Uniformes, Armamentos e Viaturas......................83

    Primeiros Planos de Uniformes ......................................... 85 Primeiros armamentos e equipamentos ............................. 90 Primeiras bombas e viaturas .............................................. 91

    Captulo 7Curiosidades sobre os

    primeiros Bombeiros ..............................94 Segundo comandante era paraguaio .................................. 94 Estrangeiros no efetivo ...................................................... 95 Alcoolismo e indisciplina .................................................. 97 Compras e notas curiosas .................................................. 98

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Captulo 8 Dia a dia dos Bombeiros (1) ........100

    Trotes j naquela poca ................................................ 103

    Captulo 9 As tragdias .......................................................105

    A Casa Frank da Costa & Cia ......................................... 105 Repercusso na imprensa ................................................ 107 Sede da Loteria do Estado ............................................... 110 Outros graves acidentes ....................................................111

    Captulo 10 Estadual ou Municipal ? .................115

    A legislao confusa desde os tempos de Lemos at hoje ............................................... 115 O AI-5 e o R-200 ......................................................... 117 Fora Militar .................................................................... 119 O efetivo ao longo da Histria ........................................ 120

    Captulo 11 Patronos, Medalhas, Smbolos e Hino ...........................................130

    D. Pedro II, patrono nacional .......................................... 130 A medalha D. Pedro II ................................................. 131 Antnio Lemos, patrono local ......................................... 132 A medalha Antnio Lemos .......................................... 133 O Hino do Soldado do Fogo ............................................ 134 Resumo biogrfico dos autores ....................................... 136

    Captulo 12 Crimes no Quartel ...................................138

    Comandante assassinado ................................................. 138

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    Soldado mata Cabo ......................................................... 142 Barjonas, a testemunha .................................................... 144

    Captulo 13 Dia a dia dos Bombeiros (2) ........145

    Fim dos bons tempos ....................................................... 147 Salrios atrasados. O Tenente Drago. .............................. 148 Outras atividades ............................................................. 150 Formao e Instruo ...................................................... 154

    Captulo 14 Os Bombeiros e as revolues no Par (Parte II) ......................................156

    A Revolta de 1924 ........................................................... 156 A Revoluo de 1930 ...................................................... 157 A Revolta de 1932 ........................................................... 159 A Revoluo de 1935 ...................................................... 161 A tomada do quartel em 1951 ......................................... 162 O quebra-quebra de 1954 ............................................ 164

    Captulo 15 A Banda de Msica .................................165

    Origem e evoluo .......................................................... 166 Banda de Msica no Brasil ............................................. 167 A Banda dos Bombeiros no Par ..................................... 168 Presidente da Repblica visita os Bombeiros ................. 171 Crise da Borracha atinge a Banda ................................... 172 Banda de novo reorganizada ........................................... 173 A fase atual, o Conjunto Os Tropicais e a Banda CBM ............................................................... 176

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    Captulo 16 Os Bombeiros na PM ...........................179

    Dias difceis ..................................................................... 181 Tombamento do prdio do QCG ..................................... 183 Desincorporao da PM .................................................. 183

    Captulo 17 O Corpo de Bombeiros hoje .......186

    Estrutura .......................................................................... 187 Quadro Complementar .................................................... 189 Quadro de Sade ............................................................. 190 Capelanias ....................................................................... 191 De 1991 a 1994 ............................................................... 193 Ano de 1995 A interveno .......................................... 194 Centro de Formao, Aperfeioamento e Especializao (CFAE) ................................................. 195 Escola de Formao de Oficiais (EFO) ........................... 196 Apoio Setorial ................................................................. 198 Unidades de Execuo .................................................... 199 O novo Quartel do Comando Geral ................................ 200 Histrico de algumas Unidades BM ............................... 202 Os Guarda-Vidas ............................................................. 206

    Captulo 18 A Mulher no Corpo de Bombeiros .....................................................208

    Quadro Feminino ............................................................ 208 As duas primeiras Oficiais BM ....................................... 209 Cabos Femininos Auxiliares de Enfermagem ................. 210 A admisso passo a passo ................................................ 211 A Mulher Militar ............................................................. 212 A Mulher Bombeiro-Militar ............................................ 212 As primeiras Oficiais BM Combatentes .......................... 213 As primeiras Soldados BM .......................................... 214 A escada Magirus ............................................................ 216 Orao do bombeiro ........................................................ 216

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    Captulo 19 Grandes Incndios ...................................217

    Produtos Perigosos .......................................................... 220 Produtos Radioativos ...................................................... 221 A Pior Tragdia (Ilha do Brao Forte) ............................. 221 Maiores incndios urbanos no Par ................................. 222 Outras curiosidades: Salamandra e os Bombeiros .......... 223 A guarita .......................................................................... 224

    Captulo 20 Os Comandantes ....................................... 226

    Captulo 21 Os Voluntrios .............................................. 230

    Captulo 22 Os Projetos Sociais ..................................235

    A Defesa Civil ................................................................. 237 O Museu ....................................................................... 240

    Honra ao mrito ............................................................... 243

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Anexos Principais Leis, Portarias e Regulamentos histricos

    Decreto Imperial n 1.775 de 2 de julho de 1856 (cria o primeiro Corpo de Bombeiros no Brasil) ............... 244 Posturas Municipais (Ttulo Dcimo) ............................. 252 Decreto Imperial n 7.766 de 19 de julho de 1880 .......... 253 Lei estadual n 708 de 8 de abril de 1872 ........................ 253 Lei estadual n 1.074 de 2 de novembro de 1882 ............ 254 Lei estadual n 1.101 de 8 de novembro de 1882 ............ 255 PORTARIA de 24 de novembro de 1882 (cria a primeira Companhia de Bombeiros no Par) ........ 256 Regulamento da Companhia de Bombeiros .................... 270 Decreto Federal n 35.309 de 2 de abril de 1954 (institui o Dia do Bombeiro Brasileiro) ........................... 270 Decreto Lei n 667 de 2 de julho de 1969 ....................... 270 R-200 (Regulamento para as Polcias Militares e Corpos de Bombeiros Militares) ................................... 272 Decreto n 7.682 de 15 de setembro de 1971 (integra os Bombeiros Polcia Militar) .......................... 273 Os Bombeiros na Constituio (Federal e Estadual) ....... 275 Decreto n 6.781 de 19 de abril de 1990 (desvincula os Bombeiros da Polcia Militar) ................... 278 Lei n 5.731 de 15 de novembro de 1992 (LOB - Lei de Organizao Bsica do CBMPA) .............. 280 Lei n 6.005 de 23 de dezembro de 1996 (Lei do Efetivo) .........294

    Glossrio... ....................................................................... 297Bibliografia ..................................................................... 301Fotos ......................................................................................... 303

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    O Corpo de Bombeiros Militar do Par, criado no final do Sculo XIX, acaba de entrar no Terceiro Milnio com muito pouco de sua mais que centenria histria preservada e registrada. exceo de Orlando Moraes Rego

    (1),

    autor de uma Resenha Histrica de pouco mais de 50 pginas, em 1969, quando os Bombeiros ainda formavam um Corpo Municipal, ningum mais se preocupou em coletar os documentos que compem a histria desta gloriosa Corporao.

    Pelo contrrio, - e o prprio Moraes Rego nos informa sobre isso no prefcio de sua obra -, em 1952, quando comandava a Corporao o Tenente-Coronel Manuel Maurcio Ferreira

    (2),

    importantes e valiosos documentos correspondentes prpria histria dos Bombeiros no Par foram destrudos, queimados. O pouco que restou at final dos anos 90 era guardado sem os mnimos cuidados necessrios para que no se perdesse no futuro.

    Quando fui contratado para colaborar com o CBMPA na funo de assessor de imprensa, em maro de 1994, pelo ento Comandante Geral, Coronel BM Gilberto Fernandes de Sousa Lima, preocupou-me o fato de quase nada, ou nada mesmo, na Corporao, favorecer uma pesquisa sobre as origens dos Bombeiros no Par e os fatos mais importantes da histria do CBMPA, que em novembro daquele ano fazia 112 anos. Hoje so mais de 125.

    Com apoio do Coronel Gilberto e ajuda inestimvel do ento 3 Sargento BM (hoje Subtenente da reserva) Manuel Moraes dos Santos, comecei a coletar alguns relatrios do final do sculo XIX e do incio do sculo XX que, no por fora de expresso, estavam literalmente jogados num canto da sala onde funcionava a 5 Seo do Estado Maior da Corporao, no antigo Quartel do Comando Geral, na Rua Joo Diogo.

    Outros documentos de valiosa importncia poucos, verdade, para os mais de 125 anos de existncia dos Bombeiros

    Apresentao

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    no Par encontramos, o Sargento Moraes e eu, no Arquivo da BM-1 (1 Seo). Alguns se perderam em 1952 e outros sobretudo relatrios oficiais s existem na Biblioteca Pblica do Estado.

    Justo ressaltar aqui, tambm, a colaborao, para a primeira edio desta obra, em 1998, da psicloga Maria do Socorro Malheiros, neta do ex-Comandante Geral, Tenente-Coronel Djalma Antnio de Sousa

    (3), que no af de coletar

    material para seu Trabalho de Concluso de Curso (TCC) sobre a mo-de-obra feminina no Corpo de Bombeiros Militar do Par, e depois para uma tese sobre o mesmo assunto num Congresso Interamericano de Psicologia, em So Paulo, em 1996, muito contribuiu para a descoberta de valiosos documentos histricos para nossa pesquisa.

    Por conta das dificuldades nas pesquisas e at na conferncia da autenticidade dos documentos compulsados, Moraes Rego advertia que sua obra representava apenas um delineamento de outro trabalho mais desenvolvido, para o qual este primeiro constitua o alicerce, pela originalidade e procedncia das fontes em que nos baseamos.

    Infelizmente, entretanto, ficamos apenas no alicerce. Moraes Rego faleceu sem completar sua obra.

    Tal como os documentos, muitas peas, hoje histricas, dos primrdios do Corpo de Bombeiros em Belm, fomos encontr-las no grande depsito em que, lamentavelmente, estava transformado o Instituto Histrico e Geogrfico do Par

    (4),

    para o qual haviam sido doadas, justamente no compromisso do IHGP preserv-las e editar o que Moraes Rego fez uma smula histrica da Corporao.

    Sempre com apoio do Sargento Moraes, entramos em contato com a direo do Museu da Universidade Federal do Par, ao qual tinham sido doadas outras peas. Conseguimos reaver capacetes de fibra e de metal, floretes e mscaras de esgrima, placas indicativas de hidrante, extintores e outras peas usadas ainda no final do sculo XIX e, portanto, com mais de 100 anos de existncia. Todo esse material aguarda, ainda, uma oportunidade para compor o acervo do futuro museu do CBMPA, agora um sonho teoricamente menos distante, com a transferncia do Quartel do Comando Geral para o prdio onde funcionou, at dezembro de 2003, o Servio Regional de Proteo ao Vo (SRPV), do Comando da Aeronutica, na esquina das avenidas Jlio Csar com Pedro lvares Cabral, e a proposta de transformao pelo menos de parte do velho casaro vermelho da Rua Joo Diogo em espao cultural.

    Mas afora a guarda desse material histrico, para a primeira edio de O Corpo de Bombeiros no Par moveu-me a preocupao com a prpria histria da Corporao.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Constatamos que mesmo entre os oficiais, poucos conheciam os feitos histricos e hericos dos Bombeiros paraenses ao longo dos seus mais de 125 anos de histria. Hoje a histria da Corporao faz parte dos cursos de formao dos futuros bombeiros, mas mesmo assim ainda h quem pense que as lembranas do passado nada acrescentam.

    O historiador paraense Theodoro Braga (5)

    , cujo centenrio de nascimento ocorreu em 1972, nas suas Apostilas de Histria do Par, de 1915, j escrevia sobre o valor das relquias histricas como principal meio de incentivar o patriotismo e esclarecer os pontos da histria regional.

    Com que ternura se liga ao nosso corao um velho farrapo que serviu de testemunha, que se prendeu a um fato grandioso ou no, da histria ainda que singela da ptria.

    Nada melhor para cultivar este religioso respeito, este puro amor terra do bero e sua histria do que o lugar recatado e tranqilo em que se vo agrupando lentamente todos os fragmentos do passado, cheios de tantas lembranas, fixando datas histricas, conservando feitos dignos, guardando, enfim, tangveis e constantes, os episdios da histria que se vo concatenando e acumulando um a um, como ensino e estmulo aos psteros, para manter sempre vivo e ardente o amor do torro natal.

    E prossegue: ...as relquias histricas, na sua mudez esttica, nos fazem saber tanta verdade

    ignorada e despertar as reminiscncias daquilo que passou. Quantas vezes, e com que mgoa, vemos os que melhor deviam conhec-lo ignorar o passado de sua terra, falta de organizao sistemtica da sua histria por documentos palpveis,...como uma lio muda, todavia eloqente.

    A histria dos Bombeiros no Par isso, uma lio muda e ao mesmo tempo eloqente, um livro repleto de pginas de patriotismo, herosmo, sacrifcio, lealdade e determinao.

    Alm de sua atividade fim o combate a incndios, Bombeiros paraenses participaram de vrios movimentos populares em defesa da ordem e da Constituio; ajudaram a sufocar motins militares e revoltas polticas alimentadas pelo dio partidrio que marcou o incio do sculo XX; sob a farda da Polcia Militar do emblemtico Coronel Fontoura combateram em Canudos o fanatismo de Antnio Conselheiro

    (6) e

    at hoje integram uma Corporao que, como bem definiu em 1994 o ento governador Jder Barbalho, num discurso durante a formatura da primeira turma da Escola de Formao de Oficiais (EFO), se distingue da Polcia, porque enquanto esta chega para bater e prender, os Bombeiros chegam com o charme de salvar vidas....

    No foi -toa que uma pesquisa realizada pela Revista Veja, em 1994 apontou os Bombeiros de um modo geral como uma das instituies mais confiveis no Brasil. Outra pesquisa, mais recente, do Instituto Acertar - Consultoria & Pesquisa,

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    realizada apenas em Belm e divulgada no dia 1 de fevereiro de 2004 pelo jornal O Liberal, mostra que os bombeiros esto entre os trs servios pblicos mais eficientes e confiveis do Estado. O servio dos Bombeiros ficou em terceiro lugar na pontuao geral, com 7,6 pontos, atrs apenas da Empresa Brasileira de Correios (ECT - 8 pontos, mas que federal) e o Centro de Hemoterapia e Hematologia do Par (Hemopa), com 8,1 pontos.

    Como a primeira edio, esta segunda tornada possvel, quase dez anos depois, graas ao apoio do atual Comandante Geral, Cel BM Paulo Gerson Novaes de Almeida tambm no tem a pretenso de uma produo histrica e muito menos literria. Muita coisa merece ainda uma pesquisa mais acurada. Trata-se apenas de uma colaborao jornalstica para com os homens e mulheres que fazem do Corpo de Bombeiros uma Corporao herica em todos os sentidos, e que muitas vezes no tinham onde encontrar a no ser nos empoeirados arquivos da Biblioteca Pblica do Estado elementos sobre sua prpria histria.

    Neste livro esto narrados, segundo documentos ou provas testemunhais, fatos memorveis, tragdias, grandes feitos hericos, mas tambm pequenas aes dirias dos Bombeiros no passado.

    Vale lembrar que os primrdios da histria dos Bombeiros no Par esto intimamente ligados histria do Intendente Antnio Lemos, o maranhense que no final do sculo XIX e incio do sculo XX se transformou numa das maiores lideranas polticas e foi um dos maiores administradores que Belm j teve.

    Por conseguinte, tanto na primeira edio, como nesta, a histria dos Bombeiros no Par est dividida em duas partes: a era Lemos e a era ps-Lemos, e esta se subdivide em mais duas: a fase como corporao integrante da Polcia Militar e a fase da Corporao autnoma.

    Neste trabalho, tratamos com mais profundidade da histria mais remota da Corporao e apenas como registro, para pesquisas futuras, dos fatos mais recentes.

    Procuramos preencher uma lacuna no que se refere a uma coletnea de fatos relacionados criao das primeiras organizaes de Bombeiros na Antigidade, passando por Roma Antiga, a Europa Medieval, o Brasil Colnia e o Brasil Imprio, e posteriormente os precedentes e as diversas fases dos mais de 125 anos de existncia do Corpo de Bombeiros em Belm, e de seu desenvolvimento e sua expanso a outros municpios do Estado do Par.

    Numa outra parte, que denominamos de Anexos, esto tambm, na ntegra, e com

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    a ortografia da poca em que foram editadas, as principais leis relacionadas com a criao e as transformaes do Corpo de Bombeiros no Brasil e no Par.

    Elaboramos ainda, para facilitar a compreenso do leitor, um Glossrio com palavras usadas antigamente, algumas das quais no se encontram nos dicionrios atuais.

    Acompanha o livro uma seo de fotos antigas, extradas dos relatrios de Lemos no incio do Sculo XX.

    Jos Menezes Novembro de 200

    NOtAs dA APReseNtAO1 Orlando Luciano Martins de Moraes Rego Membro do Instituto Histrico e Geogrfico do Par (IHGP) e da Fundao Cultural do Par (no mais existente) e primo j falecido do professor e ex-governado do Estado Clvis Silva de Moraes Rego.

    2 Manuel Maurcio Ferreira Duas vezes Comandante Geral do Corpo de Bombeiros, a primeira, como Major, de 21 de julho de 1952 a 15 de dezembro de 1953; a segunda, de 9 de abril de 1956 a 19 de outubro de 1959.

    3 Djalma Antnio de Souza 28 Comandante do Corpo de Bombeiros. Assumiu o cargo como Tenente-Coronel a 20 de outubro de 1959 e foi substitudo em 14 de novembro de 1963.4 O Instituto Histrico e Geogrfico do Par est localizado Rua Tomsia Perdigo, ao lado da Assemblia Legislativa do Estado, no velho solar do Baro de Guajar, na Praa D. Pedro II.5 Theodoro Jos da Silva Braga Professor, historiador, escritor e artista plstico paraense nascido em 8 de junho de 1872 e falecido em So Paulo em 31 de agosto de 1963 com 91 anos de idade.

    6 Antnio Vicente Mendes Maciel, ou Antnio Conselheiro Fantico lder da Guerra de Canudos, na qual intervieram tropas paraenses.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Desde que o homem descobriu a forma de fazer o fogo, logo teve de buscar o modo de apag-lo, porque no raras vezes a at hoje isso ainda ocorre esse elemento extrapola a capacidade de controle, se transformando em grandes incndios. H informaes, entretanto, que o homem de Pequim do perodo paleoltico (500.000 a 130.000 AC) foi o primeiro a usar o fogo e que seus contemporneos pr-histricos j dominavam incndios na floresta, provocados por raios, embora s cerca de 7.000 AC, j no perodo neoltico, viesse a dominar as tcnicas para produzir o fogo.

    Nos rituais do solstcio, j na Babilnia, as festas eram realizadas em torno do fogo. Camponeses acendiam tochas e corriam com elas pelos campos com o objetivo de espantar pragas, doenas e maus espritos, e batiam com o fogo no cho e nas rvores para aumentar a fertilidade. As cinzas eram espalhadas pelos campos e os ties eram guardados em casa para proteger contra raios, incndios e bruxarias.

    O imperador babilnico Hamurabi, no Sculo XVII a.C. teria sido o precursor, no seu famoso Cdigo de leis, do primeiro conjunto de normas de preveno e de intervenes em casos de incndios e calamidades. Muitos artigos do Cdigo de Hamurabi se tornaram leis e esto em vigor at hoje.

    Foram os hebreus, na poca de Abrao, e os gregos, aproximadamente no Sculo X a.C. que criaram os primeiros vigias noturnos (vigiliae nocti) encarregados de efetuar rondas e dar alarmes em caso de incndio. Mas registros foram encontrados na China dando conta que no ano de 564 a.C. j havia um grupamento de homens treinados para combater incndios.

    Na antiga Roma esse servio foi conservado e melhorado, havendo documentos histricos

    (1) de que o primeiro corpo de

    bombeiros estruturado como tal, funcionou em Roma no primeiro sculo antes de Cristo. Foi organizado no ano 22 a.C. pelo Imperador Otvio Augusto

    (2) (27 a.C. a 14 a.C.) e se compunha de

    Captulo 1 As origens

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    soldados e 600 escravos. Eram os triumviri nocturni, que asseguravam o policiamento durante a noite contra os malfeitores eram os farmiones e davam o alerta e o combate no caso de incndios, realizando tambm salvamentos com equipamentos que at hoje os bombeiros modernos ainda utilizam como as machadinhas (dalobrae), escadas (scalar) e as redes ou pra-quedas (cantones).

    Quase 30 anos depois, no ano 6 d.C., esse servio foi reorganizado pelo mesmo Csar, passando ento a contar com 10 mil legionrios-bombeiros subordinados a uma estrutura militar idntica do exrcito romano (Guarda Pretoriana). Essa estrutura se manteve at o fim da Idade Mdia, quando comearam a surgir os primeiros bombeiros modernos.

    Em 64 d.C., Roma assistiu a um dos maiores incndios de que o mundo teve notcia at hoje, provocado por Nero. Comeava a decadncia, que culminou, algumas dezenas de anos mais tarde, com a queda do Imprio Romano.

    Tecnologia RomanaEm 2004, aps escavaes realizadas em Titz, no Vale do Reno, Alemanha,

    arquelogos descobriram uma bomba dgua de apagar incndios da poca dos romanos. Segundo o arquelogo alemo Bernd Paeffgen, essa descoberta um dos testemunhos mais antigos da existncia de bombeiros durante a dominao romana da Germnia, hoje Alemanha. Segundo ele, o extintor encontrado prova que os romanos j usavam tecnologia h mais de 1.650 anos e no apagavam incndios apenas com cubos dgua (espcie de baldes feitos de madeira que passavam de mo em mo).

    Nas escavaes, Paeffgen encontrou finos tubos de ferro de 1,10 m de comprimento completamente oxidados e quebrados em vrias partes. Primeiro pensamos que se tratava de uma lana, mas depois encontramos, na literatura cientfica, descries e desenhos de bombas para apagar incndios utilizadas pelos romanos nas quais esse tubo se encaixa perfeitamente, disse o cientista.

    Junto com o tubo foram encontrados dois esqueletos, provavelmente de um chefe bombeiro e seu ajudante que podem ter sido vtimas de saqueadores. Segundo Paeffgen, nos ano 335 d.C. o Vale do Reno vivia um perodo muito agitado, os francos saqueavam os campos e incendiavam as propriedades rurais.

    J Frank Willer, restaurador do Museu Regional de Bonn, informa que os bombeiros romanos j contavam, na poca, com um equipamento muito eficiente, com uma presso de trs atmosferas, que podia lanar gua a at 25 metros de distncia. O canho dgua era ligado a uma bomba de mbolo, presumivelmente por uma mangueira de couro de animais. A bomba era montada sobre rodas e transportada at o local do incndio. Em vez de passar os cubos dgua de mo em mo, as pessoas enchiam o tanque da bomba e os bombeiros trabalhavam com esse tubo de ferro, que era relativamente leve e resistente ao calor.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Santos PadroeirosSo dessa poca as referncias aos primeiros santos declarados padroeiros dos

    militares ou dos bombeiros.O dos militares em geral Santo Expedito, em cuja honra o CBMPA mandou erigir

    tudo na base de doaes uma capela no terreno do prprio Quartel do Comando Geral, na Av. Jlio Csar.

    Expedito, segundo a tradio, era armnio, no se conhecendo o lugar de seu nascimento, mas parece provvel que seja Metilene, localidade onde sofreu seu martrio. A Armnia uma regio da sia Ocidental, situada ao Sul do Cucaso, entre o Mar Negro e o Mar Cspio, nas margens dos Rios Tigre e Eufrates.

    Na regio, que fazia parte do Grande Imprio Romano, Expedito era comandante-chefe da XII Legio Romana, cognominada Fulminante - nome dado em memria de uma faanha que se tornou clebre - e aquartelada no distrito de Melitene, na Capadcia, sede de uma das provncias romanas da Armnia, no final do sculo III. Hoje uma pequena localidade chamada Melatia. A legio era formada em sua maioria por soldados cristos, sendo sua funo primordial defender as fronteiras orientais contra os ataques dos brbaros asiticos. Expedito destacou-se no comando dessa legio por suas virtudes de cristo e de chefe ligado a sua religio, a seu dever, ordem e disciplina.

    Antes de sua converso ao Cristianismo, tinha uma vida devassa e, quanto prestes a converter-se, apareceu-lhe um esprito do mal, na forma de um corvo, grasnando cras - que em latim significa amanh - mas Expedito pisoteou o corvo, bradando hodie, que significa hoje, confirmando sua urgente converso.

    Convertido, assim como toda sua tropa, Expedito tornou-se alvo do dio do imperador Diocleciano

    (3) (284 a 305 d.C.), no Sculo III. Foi preso e flagelado at sangrar e depois decapitado com espada. Era o dia 13 das calendas de Maio, isto , 19 de Abril de 303 d.C. pelo calendrio gregoriano de hoje. Outros cristos pereceram com ele do mesmo modo, supondo-se serem seus companheiros de armas e de martrio: Hermgenes, Caio, Aristnio, Rufo e Glatas.

    Hoje popularmente considerado o orago das causas justas e urgentes e padroeiro dos militares, Santo Expedito apresentado com traje de legionrio, vestido de tnica curta e de manto jogado militarmente atrs das espduas com postura marcial. Em uma mo sustenta uma palma e na outra uma cruz que ostenta em letras visveis a palavra Hodie, em referncia ao episdio do esprito do mal, que surge para adiar sua converso. Calca com o p vitorioso um corvo que se consome lanando seu grito habitual Cras.

    J o padroeiro dos bombeiros, segundo informa o jornal Bombeiros do Brasil, de Curitiba, Paran, edio XVI de 1997, Floriano, natural da Baviera (ustria), onde at hoje festejado no dia 4 de maio.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Embora de origem estrangeira vindo do que hoje a ustria Floriano era militar do exrcito romano e at hoje representado no estilo de um centurio, com uma lana na mo e uma bandeira desfraldada na outra. Tal como Expedito, viveu no tempo do imperador Diocleciano, quando Aquilino era o comandante do exrcito romano na regio do Danbio, onde existiam numerosas colnias romanas e vrios batalhes, cuja misso principal era defender as fronteiras do vasto imprio.

    Floriano era cristo e ajudava a difundir a nova crena entre os prprios colegas militares. O Cristianismo j tinha feito, na poca, muitos mrtires em Roma, a maioria deles sob a perseguio de Diocleciano, que se deixava influenciar por Galrio, seu genro e amigo e fantico inimigo dos cristos.

    Floriano tinha um verdadeiro sentido de proteo contra incndio e saa de casa em casa orientando as pessoas sobre o risco que o fogo oferecia. Era conhecido como um bombeiro de rua.

    poca, para conter a expanso do Cristianismo, Diocleciano baixou uma ordem exigindo que todo militar devia prestar juramento de fidelidade exclusiva ao Imperador. Muitos se recusaram a faz-lo e foram sumariamente executados. Assim aconteceu na Glia, na Capadcia, no Egito, na frica e na regio do Danbio, onde Floriano comandava um contingente e foi colocado diante da opo: Cristo ou Diocleciano.

    Todos se decidiram por Cristo e foram denunciados ao Imperador, sendo condenados a serem jogados no rio Ens com uma pedra amarrada no pescoo. O corpo de Floriano foi depois resgatado por admiradores que o tinham como protetor contra incndios e sepultado mais tarde com honras de heri.

    Na Idade MdiaNa Idade Mdia no se tem muitas informaes sobre os servios de extino

    de incndios. H registros, entretanto, da poca do feudalismo, de grandes batalhas seguidas de grandes incndios. As cidades da poca favoreciam a isso. Segundo Socorro Malheiros, citando Cotrin (1996), as cidades ...eram superlotadas, barulhentas, escuras e tinham cheiro de estbulos. S as ruas mais largas eram pavimentadas; as outras eram sujas com estercos e lama, na maioria eram apenas vielas estreitas onde no se podia passar com duas mulas sem derrubar os quiosques dos vendedores ou os toldos e tabuletas dos que anunciavam seus servios. As casas de trs ou quatro andares, eram construdas de materiais inflamveis, paredes de madeiras e galhos e tetos de palha ou junco, que ardiam em poucos momentos. Se por um lado os incndios geravam prejuzos para os moradores, por outro eram benficos, pois amenizavam as condies de sujeira das cidades medievais .

    H de se considerar tambm que na mentalidade medieval, sob forte influncia do clero, o fogo era considerado um elemento sagrado e houve poca em que a Igreja

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    no permitia a interveno humana para extingu-lo. Era um castigo dos cus que s poderia cessar com oraes e procisses, nas quais, muitas vezes, era levado em andor, at o local do sinistro, o prprio bispo da localidade para rezar e pedir aos cus a extino das chamas, segundo afirma um estudo do Coronel Prudente, publicado na revista do centenrio do Corpo de Bombeiros da Bahia.

    A enciclopdia Lello Universal, ao se referir Inquisio, confirma que aps o grande incndio de Lisboa, em 1755, mais de 1.500 sobreviventes da catstrofe foram paradoxalmente enviados para a fogueira por achar o Tribunal do Santo Ofcio que eles escaparam indevidamente de um castigo que lhes era destinado.

    na passagem da Alta para a Baixa Idade Mdia, no Sculo XIV, quando Portugal e Espanha surgem como grandes potncias da poca, que se voltaram a registrar em documentos algumas atividades de extino de incndio.

    No dia 25 de agosto de 1395 uma Carta Rgia de Dom Joo I (4) restabelecia em

    Portugal os vigias noturnos e definia sua finalidade: extino de incndios, misses de carpinteiros e machados, conduo de gua (que seria de competncia das mulheres) e ainda um servio de polcia para evitar os saques que malfeitores, aproveitando-se dessas ocasies, sempre procuravam efetuar.

    Dois fatos, provavelmente isolados, contriburam para o melhoramento dos servios ditos de bombeiros na Europa. Em 1671, o holndes Jan Van der Heyden inventou em Amsterd as mangueiras. Antes eram utilizados vasilhames diversos para apagar incndios. Era o comeo da modernidade para a atividade de bombeiros. E em 1829, na Inglaterra, entraram em funcionamento as primeiras viaturas a vapor para combate a incndio, tornando obsoletas as carroas de trao animal.

    J no sculo XX, as duas grandes Guerras Mundiais, com suas nefastas conseqncias para as populaes civis, incentivaram o aprimoramento dos Corpos de Bombeiros na Europa e nos Estados Unidos, cuja estrutura serviu de base, depois, para a reorganizao desses servios.

    NOtAs dO CAPtulO 11 Documentos citados de Major BM John Paul Brito, do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, no artigo Salvamento Uma Arte, publicado pela revista Heris do Fogo em 1994.2 Caius Julius Caesar Octavianus Segundo a coleo Grandes Imprios e Civilizaes (Edies Del Prado, 1966), foi Otvio Augusto, o segundo dos 12 csares, quem organizou a primeira brigada Roma contra incndios com 7.000 vigiles, sob a direo de um prefeito, qite.

    3 Gaius Aurelius Valerius Diocletianus ou simplesmente Diocleciano (236 a 305 d.C.) foi um dos ltimos imperadores romanos e se celebrizou pela perseguio aos cristos, na chamada era dos mrtires.

    4 Dom Joo I pertencia dinastia de Aviz. Dcimo rei de Portugal, nasceu em Lisboa a 11 de abril de 1357 e morreu na mesma cidade a 14 de Agosto de 1433.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    A arte de apagar incndios chegou ao Brasil com os portugueses, que traziam em suas caravelas os marinheiros denominados vigias do fogo, com a misso de combater eventuais incndios nessas embarcaes, todas de madeira.

    A 10 de novembro de 1555 adentra a Baa da Guanabara o vice-almirante francs Nicolau Durand de Villegagnon com o encargo de fundar nas terras portuguesas uma Frana Antrtica. Os invasores se estabeleceram nas ilhas de Laje e Serigipe e em 1560 foram banidos por Mem de S, sendo incendiado o fortim que haviam construdo. Em 1567, nova invaso francesa e Mem de S novamente destri, com o fogo, as aldeias e fortins franceses. Uma terceira incurso em 1615 e novamente os incndios foram usados como armas. Eram operaes de guerra que no careciam da contrapartida do combate ao fogo.

    Segundo o professor Herculano Gomes Mathias (1)

    , do Instituto Histrico e Geogrfico do Brasil, alm de grandes incndios urbanos, havia no perodo Colonial gigantescos incndios florestais e o historiador Vieira Fazenda, bibliotecrio do IHGB, em suas Antiqualhas descreve incndios medonhos. dessa poca um atentado contra a casa do padre Loureno de Mendona. Inimigos seus no se sabe por que atearam fogo sua casa utilizando um barril de plvora. O padre e seus vizinhos perderam tudo, embora ningum tenha morrido.

    Com a criao do Arsenal de Marinha da Bahia, no ano de 1651, que propiciou o desenvolvimento da indstria naval no Brasil, tanto na construo de novas embarcaes como na reforma das j existentes, adotou-se o mesmo sistema de vigilncia contra incndios trazido de Portugal.

    Em 1710, Duclerc (2)

    comanda nova invaso no Rio de Janeiro. Em conseqncia da luta, grandes incndios destroem a Alfndega e, parcialmente, o Palcio do Governador Francisco de

    Captulo 2 No Brasil

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Castro Morais, que manda incendiar tambm o trapiche da Ordem da Penitncia, a fim de impedir o desembarque dos franceses.

    Pouco depois, o corsrio Ren Duguay-Trouin ataca a fortaleza de Villegagnon e incendeia-lhe o paiol. O almirante portugus Gaspar Atade, para no perder os navios para os franceses, incendiou-os todos.

    Por um descuido de um padre, frei Salvador da Trindade, que deixou um fumo de rolo aceso em uma das celas (pequenos quartos de dormir dos religiosos) o Mosteiro de So Bento quase foi totalmente destrudo por um incndio em 1732. E o Recolhimento de Nossa Senhora do Bom Parto, tambm foi arrasado pelo fogo em 24 de agosto de 1789. Esses incndios mobilizaram inclusive o vice-rei Luiz de Vasconcelos e Souza, que comandou pessoalmente o combate s chamas.

    Consta que o grande incndio que destruiu completamente o Recolhimento de Nossa Senhora do Bom Parto

    (3) causou o mais profundo impacto junto populao

    e s autoridades. O incndio, bem como a origem e finalidade da edificao, foram descritos por notveis cronistas da poca como o Dr. Joaquim Manoel de Macedo e Vieira Fazenda.

    A edificao de trs pavimentos possua duas compartimentaes distintas: a Capela Conventual e o Recolhimento. Neste ltimo funcionava um reformatrio para mulheres, que era habitado por velhas, indigentes, jovens desobedientes e outras acusadas da prtica de adultrio, segundo Vieira Fazenda.

    Para maior segurana o andar trreo era destitudo de porto para o exterior e os pavimentos superiores eram circundados por grades. A edificao se estendia pela Rua dos Ourives (atual Rodrigo Silva e Miguel Couto), desde a rua N. S. do Porto (trecho entre a rua So Jos e o Largo da Carioca), at a rua da Cadeia (atual Assemblia).

    O incndio foi provocado por uma das adlteras de nome Ana Campista, com o propsito de empreender uma fuga junto com o seu amante Gil Soares. O casal, entretanto, foi interceptado pelo pai e pelo marido da reclusa, que lhes deram sumio. Nunca mais foram vistos. Foi o maior incndio da poca.

    Na madrugada do dia 20 de Julho de 1790, outro incndio atingiu todo o sobrado de propriedade do Dr. Francisco Teles Barreto de Menezes, no Largo do Carmo, onde funcionava desde 1757 o Senado da Cmara da cidade do Rio de Janeiro, descrito assim por Jos Joaquim da Cunha de Azeredo Coutinho

    (4): ...reduziu a cinzas todas

    as suas alfaias e o seu precioso arquivo, em que se continham as suas leis econmicas, as provises, as cartas, as ordens e decretos de S. Madge.; os antigos ttulos das suas doaes rgias, dos seus privilgios, honras e isenes com que os Augustssimos Reis predecessores de S. Madge. Premiaram os seus relevantes servios e a sua a todos bem conhecida fidelidade.

    Vale citar aqui tambm que quase vtima de um incndio foi o delator da Inconfidncia Mineira, o Coronel Joaquim Silvrio dos Reis, contra o qual se levantara

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    o dio do povo da cidade do Rio de Janeiro. Ele prprio narrou sua desdita em carta dirigida ao Ministro Martinho de Melo e Castro: Depois destes fatos aconteceu proximamente que morando eu por cima de um armazm onde estavam quantidades de barris de alcatro, introduziram uma mecha de pano de linho com azeite e fogo, que foi Deus servido que, pelas 8 horas da noite se descobrisse aquele incndio, o qual se atalhou por serem ainda horas em que todos estavam de p. Eu no tenho notcia de quem foi o agressor deste delito, nem certeza de que este mal se destinava para mim, porm, como me vejo cercado de inimigos, sempre vivo em aflio e desconfiana.

    Diante da necessidade de dotar a capital do Vice-Reino de um sistema de combate a incndios mais organizado, o Alvar Rgio de 12 de agosto de 1797, determinava que o Arsenal de Marinha passasse a ser o rgo pblico responsvel pela extino de incndio. Esta escolha se deu em razo da experincia que os marinheiros possuam na extino de fogo em embarcaes, com homens treinados e equipamentos apropriados. Em 1808 foi criado o cargo de Inspetor do Arsenal de Marinha, cabendo a este dirigir pessoalmente os servios de extino de incndio na cidade.

    Na noite de 25 de maro de 1825 o Teatro So Joo (5)

    sofreu um grande incndio, que irrompeu ao trmino de sesso solene de Juramento da Carta Imperial, gerando suspeitas de que se tratava de um atentado contra o Imperador D. Pedro I.

    Incndio famoso e que teria sido criminoso foi o da Casa da pera, do Padre Ventura, quando nela se apresentava a pea Os Encantos de Media.

    O memorialista Luis Edmundo assim se referiu ao sinistro: A Casa da pera acabou um dia numa apoteose de labaredas quando nela se apresentava a pea do patrcio Antnio Jos da Silva, Os Encantos de Media. H quem afirme que o portugus, irritado com a nota nacionalista do padre, invejoso ainda do novo sucesso do teatro, foi quem mandou mo criminosa atear-lhe fogo. Injusta acusao. Injustssima, conclui Luis Edmundo.

    Curiosamente, o autor da pea, Antnio Jos da Silva, de alcunha O Judeu, advogado e dramaturgo carioca residente em Lisboa, acabou seus dias numa fogueira do Tribunal da Inquisio da capital portuguesa, acusado de prticas de judasmo.

    No dia 11 de agosto de 1825 a Casa da Moeda foi atingida por um violento incndio. Em 1841 o fogo destruiu o pavilho de festas do campo da Aclamao e em 1851, e posteriormente em 1856, novamente o Teatro So Joo sofreu dois grandes incndios.

    Em 26 de julho de 1849, o Ministro da Justia, Eusbio de Queiroz, expediu um aviso determinando que o combate aos incndios seria comandado pelo oficial de patente mais alta que se encontrasse no local, comeando a um conflito de autoridade e competncia com o Ministrio da Marinha que desembocaria na reorganizao dos Servios de Extino de Incndios e criao do Corpo Provisrio de Bombeiros da Corte, em 2 de julho de 1856.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Em 20 de maio de 1850 foi nomeado Inspetor do Arsenal de Marinha o Capito de Mar e Guerra Joaquim Jos Igncio, que no concordou com o disposto pelo Ministro da Justia. Segundo ele, marinheiro apagar incndio feria a dignidade de sua corporao.

    A propsito, em ofcio de 26 de maro de 1851 o Inspetor se queixava ao Ministro da Marinha da pouca importncia de seu comparecimento aos locais de incndio e aps denunciar uma campanha contra a dignidade dos marinheiros, sugeria que os servios de extino de incndios deveriam passar responsabilidade da Repartio de Obras Pblicas, que deveria ter pessoal prprio treinado para esse fim.

    Com o crescimento da cidade, as ocorrncias de incndio se sucediam e j intervinham nesse combate no apenas os marinheiros, mas o pessoal do Arsenal de Guerra, da Repartio de Obras Pblicas e at da Casa de Correo.

    D. Pedro II cria o 1 Corpo de BombeirosReunindo sob uma s administrao esses servios, foi, por Decreto Imperial n.

    1775 de 2 de julho de 1856, assinado por Dom Pedro II (6)

    , criado o primeiro corpo de bombeiros do Pas, o Corpo Provisrio de Bombeiros da Corte.

    Vinte e quatro dias mais tarde, a 26 de julho, foi nomeado diretor geral do Corpo de Bombeiros o major do Corpo de Engenheiros do Exrcito, Joo Batista de Castro Moraes Antas

    (7), que em ofcio de 13 de maro de 1857, comunicou ao Ministro da

    Justia, conselheiro Dr. Jos Thomaz Nabuco de Arajo, ter organizado o Corpo de Bombeiros.

    Em relatrio de 30 de maro desse mesmo ano, dizia o major Antas: O Governo pde, sem augumento de despeza, chamar para o servio do Corpo de Bombeiros os africanos livres da casa de Correo, e as praas do corpo de artfices; mas se quizer alistar trabalhadores paisanos dos arsenaes sem dar-lhes por isso uma gratificao alem dos jornaes que percebem, no poder contar com essa gente...(sic).

    O Decreto n 2.587 de 30 de abril de 1860 deu como aprovado o Regulamento definitivo do Corpo de Bombeiros, dividindo-o em cinco sees, sendo duas permanentes, que constituam o Corpo propriamente dito, e trs auxiliares, que eram acionadas s em caso de incndios de maiores propores.

    O Corpo Provisrio de Bombeiros, organizado em 1856, ficou sob a jurisdio do Ministrio da Justia e assim continuou ainda depois de reorganizado definitivamente pelo Regulamento de 1860, at que, por aviso desse ministrio, de 11 de maro de 1861, foi comunicada a sua transferncia para o Ministrio da Agricultura, Comrcio e Obras Pblicas, de acordo com o item 6 do artigo 10 do decreto n. 2.748 de 16 de fevereiro do mesmo ano, que organizou essa secretaria de Estado.

    Nessa poca o Corpo de Bombeiros j era comandado pelo major Juvncio Manoel

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Cabral de Menezes em substituio ao comandante interino Joo Igncio da Cunha, que assumira o comando no dia a 01 de outubro de 1857, quando faleceu Moraes Antas, e comandou a corporao at 20 de setembro de 1859.

    Os Bombeiros e a AbolioSocorro Malheiros conta em seu trabalho apresentado Universidade Federal do

    Par em maro de 1997, com base tambm na Histria do Corpo de Bombeiros do Rio de Janeiro, que durante o perodo da escravido, muitos viam no recm-criado Corpo de Bombeiros um local de abrigo e liberdade.

    Este foi o caso do escravo Valrio, que tentando se livrar do extenuante trabalho escravo e dos castigos que lhe infligiam os seus feitores, refugiou-se no Corpo de Bombeiros.

    A 7 de fevereiro de 1887, conforme os apontamentos da poca, apresentou-se voluntariamente ao Corpo de Bombeiros um preto dizendo chamar-se Antnio Manoel de Oliveira, ter 20 anos, ser casado e filho de Bernardino Moraes de Oliveira. Como profisso, pintor.

    Includo no Corpo, recebeu o n. 60 e foi para a 3. seo como aprendiz. Feliz por se encontrar liberto, empregava-se com destemor e esmero nas tarefas de combate a incndio e nas atividades internas, sendo alvo de admirao de seus superiores.

    Aps um breve perodo, um dos agentes captores o encontrou no Corpo de Bombeiros. Descoberta a artimanha do falso Antnio, o Comando do Corpo de Bombeiros deu cincia do ocorrido ao Ministrio da Agricultura, sob cuja jurisdio se encontrava na poca.

    No dia 25 de abril de 1887, o Ministrio, atravs de documento protocolado sob o n 90, aps um minucioso relato, resolveu, conferir a carta de liberdade ao dito escravo frustando os esforos dos seus captores. A proprietria do escravo, entretanto, foi indenizada pelas companhias de seguros da Corte.

    Igual sorte no teve o negro Faustino Vieira dos Santos, Bombeiro n 13, paraense, solteiro de 22 anos, calafate de ofcio, filho de Cndida Maria da Conceio que aparentemente procurou o Corpo de Bombeiros do Par tambm para fugir da escravido. Incorporou no dia 6 de maio de 1886, conforme a Ordem do Dia n 53, citada no Livro Mestre

    (8) (de assentamentos).

    S que Faustino era dado ao vcio do alcoolismo e foi preso por mais de uma vez, uma das quais conforme citado em seus assentamentos por quatro dias em solitria e mais trs dias no quartel por ter se apresentado ao servio com quatro horas de atraso e em completo estado de embriagus.

    Por causa disso, foi excludo e entregue ao seu senhor, por ser um reconhecido escravo, no dia 12 de junho de 1886. (Ordem do Dia n 67).

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Com Baldes e LatasContam-nos algumas publicaes antigas que primitivamente os incndios,

    no Brasil, - e no Par no foi diferente eram combatidos e extintos pelas pessoas prejudicadas ou por populares que colaboravam espontaneamente no combate s chamas, utilizando-se para tal de baldes, latas, etc. Na verdade essa colaborao no era to expontnea assim.

    Breve Notcia, uma publicao de 1906 sobre a fundao e desenvolvimento do Corpo de Bombeiros da cidade do Rio de Janeiro relata que o Regulamento do Corpo Provisrio de Bombeiros de 1860, obrigava a comunidade como um todo a colaborar no combate aos incndios e at multava e punia quem se recusasse a faz-lo.

    Dizem o pargrafo 16 e seguintes do ttulo 10, seo 2 desse Regulamento: Quando haja incndio ser obrigado cada vizinho do quarteiro e dos quatro lados a mandar immediatamente um escravo com um barril de gua a apagar o incndio... Os que no mandarem um escravo sero multados em 4$...

    ... Estando as ruas s escuras, devero todas as janellas iluminar-se... sob pena de 4$000.

    Os proprietrios que tiverem poos nas immediaes dos incndios sero obrigados a franquear a entrada para se tirar gua... Os infratores sero multados em 20$000.

    As pessoas que vendem gua em pipas ou em barris conduzidos em carroas ou carros sero obrigadas a conserv-los de noite cheios dgua a fim de acudirem com promptido a qualquer incndio... Os infratores sero multados em 20$000.

    Os alarmes de incndios sinais de fogo, como se dizia poca eram dados, no Rio de Janeiro, inicialmente por tiros de pea de artilharia de grosso calibre, pelo toque dos sinos das igrejas e pelo iamento nos mastros das reparties militares de uma bandeira encarnada (vermelha). noite usava-se uma lanterna tambm encarnada. No Rio, esses sinais foram substitudos em 1862 pelos servios de telegrafia.

    A propsito dos sinais de incndio dados pelos sinos das igrejas, o livro O Rio de Janeiro no tempo dos vice-reis

    (9) assim descreve:

    Sino, gazeta de bronze, divulgador de boas e ms notcias. O sino s queria saber do fato. Por vezes, noite, ouviam-se toques violentos, em rebate. J se sabia: Fogo! Ponham as luzes nas janelas!

    A ordem era do Senado da Cmara para que socorros no labirinto das vielas desprovidas de iluminao no se chocassem, prejudicando o servio.

    Os quadrilheiros, homens de balde e os das carroas dgua, toda, vinham por sua vez gritando pelas ruas: Luzes! Luzes! Luzes!

    E o sino a danar, nervosamente, na sua saia de bronze, no descansava: Bam, tam, tam! Bam, tam, tam! Bam, tam, tam! No fosse ele e a cidade talvez ardesse toda. Incansvel e barulhenta sentinela.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    O historiador carioca Vieira Fazenda, bibliotecrio do Instituto Histrico e Geogrfico do Rio de Janeiro, ao referir-se ao incndio do Senado da Cmara, fez o seguinte comentrio: devia ser muito deficiente naqueles tempos o servio de extino de incndios: consistia em umas bombas de espirro e nas carroas dos aguadeiros.

    Em 1877 foi instalado o primeiro aparelho telefnico e em 1879 foram instaladas as primeiras caixas de aviso de incndios.

    A pessoa que primeiro informasse sobre um incndio tinha direito a uma gratificao e os donos de pipas ou carroas com barris de gua tinham direito a requerer dos cofres da Cmara um pagamento de 20$000 (vinte mil ris).

    Durante as ocorrncias, as ordens aos Bombeiros eram dadas por meio de apitos, at o ano de 1870, quando foi adotada a corneta militar.

    Dos toques de corneta, o mais curioso o que foi apelidado de toque da cachaa, usados nos tempos antigos para, no final de um incndio, chamar o bombeiro para tomar um gole de aguardente ou conhaque a fim de evitar os resfriados to freqentes nos homens molhados e cansados.

    Em 1870 entraram em servio as primeiras viaturas puxadas a cavalos ou burros. As primeiras viaturas automveis s entraram em atividade depois da virada do sculo XX.

    Esses prembulos se fazem necessrios para se entender o estgio de desenvolvimento do servio de Bombeiros na ento capital do Brasil no momento em que, no Par, os administradores se mobilizavam para importar, justamente do Rio, o know-how necessrio para criar em Belm do Par, em 1882, a primeira organizao destinada a combater incndios.

    NOtAs dO CAPtulO 21 Herculano Gomes da Silva Incndios no Rio de Janeiro Colonial, palestra proferida em 29 de junho de 1989 pela passagem dos 133 anos do CBERJ.2 Jean Franois Duclerc capito de fragata francs que no comando de seis navios chegou a desembarcar em Guaratiba e marchou at o Largo do Carmo, atual Praa XV de Novembro.3 O prdio, j demolido, foi reconstrudo anos depois por Mestre Valentim da Fonseca e Silva, um dos principais artistas e urbanistas do Brasil colonial.4 Jos Joaquim da Cunha de Azeredo Coutinho, procurador no Brasil da Corte de Lisboa.5 Atual Teatro Joo Caetano. Inaugurado em 13 de outubro de 1813 com o nome de Real Theatro de So Joo.6 ntegra do Decreto Imperial n 1.775 de D. Pedro I nos Anexos desta edio7 Joo Batista de Castro Moraes Antas faleceu em 1 de outubro de 1857, sendo substitudo no comando do Corpo de Bombeiros pelo ajudante Joo Igncio da Cunha.8 Livro ainda hoje existente nos arquivos da 1 seo do CBMPA.9 Livro do escritor Lus Edmundo, citado pelo professor e historiador Herculano Gomes Mathias, no CBERJ, em 1989.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    A histria do Corpo de Bombeiros no Par comea muito antes de sua criao oficial em 1882. At 1994/95 no havia um consenso em torno da verdadeira data de criao do Corpo de Bombeiros no Par. At esse ano, a criao da Corporao era comemorada erroneamente no dia 8 de novembro, e um opsculo preparado para subsidiar o processo de desincorporao dos Bombeiros da PM cita mais duas datas como sendo as da criao: 2 de julho de 1856 (data da criao dos Bombeiros, mas no Rio de Janeiro e no no Par) e 8 de abril de 1872 (quando o Presidente da Provncia mandou que o servio de combate a incndios no Par fosse feito por praas da Polcia). Para completar a confuso, sem qualquer explicao lgica, Paes de Carvalho cita o 12 de novembro como data de criao do Corpo de Bombeiros.

    O coronel Orvcio Deolindo da Cunha Marreca, autor de Histria da Polcia Militar do Par, de 1940, afirma erradamente, logo no segundo pargrafo de seu respeitvel livro, que os Bombeiros foram criados em 24 de novembro de 1822 (ano da Independncia), quando o correto seria 1882. Acertou no dia, errou no ano. Um engano de apenas 60 anos.

    Evidentemente, antes de 1882 j havia combate a incndios, mas no um Corpo organizado para combat-los.

    Mesmo antes de 1856, quando o Decreto Imperial n 1775 criou o Corpo Provisrio de Bombeiros da Corte, no Rio de janeiro, e reorganizou o Servio de Extino de Incndios nas provncias inclusive no Gro-Par j havia referncias a grandes incndios em Belm e luta que travavam os aguadeiros e membros do Arsenal de Marinha no combate s chamas que, vez por outra, ameaavam a florescente cidade cujos casares e casas de comrcio, todos de madeira ou tabique, refletiam nas guas da baa do Guajar um grau de desenvolvimento invejvel

    Captulo 3 No Par

    Precedentes

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    para a poca.Em discurso proferido em abril de 1994, quando foi paraninfo de uma turma de

    sargentos condutores e operadores de viaturas do CBMPA, o ex-deputado federal Carlos Alberto de Arago Vinagre

    (1) deu um mergulho na Histria e reportou-se ao

    ltimo Governador e Capito-General das provncias do Gro-Par e do Rio Negro, Antnio Jos de Souza Manoel de Menezes Sevarim de Noronha, que ficou mais conhecido como Conde de Vila-Flor, como possvel criador da primeira corporao de Bombeiros no Par, j no incio do Sculo XIX.

    O stimo Conde de Vila-Flor, do Conselho de Sua Majestade Fidelssima, seu copeiro-mr, Comendador da Ordem de Cristo, Cavaleiro da Ordem da Torre e Espada, Brigadeiro de cavalaria do Exrcito, mais tarde Duque da Terceira, governou o Par no perodo de 16 de outubro de 1817 a 1 de julho de 1820. E dele consta no Arquivo Pblico do Estado do Par, uma correspondncia datada de 17 de abril de 1820, enviada ao Major Jos Antnio Nunes segundo Vinagre, comandante dos Bombeiros, mas segundo Domingos Rayol (Motins Polticos) e Antnio Ladislau Monteiro Baena (Compndio das Eras), comandante do Corpo de Artilharia , com o seguinte teor:

    Para o Major Comd do Corpo dArtilharia Remetto a Vmce o Requerimento incluzo de Franc Miz Sold do Corpo

    de Bombeiros, para qe. Vmce o conserve prezo at o dia 25 do corrente, em qe. Dever ser solto; ficando Vmce na intelligencia

    de que lhe poder effectuar a passagem para o 1 Regimento de 2 Linha, se delle no tiver precizo.

    Deos Ge a Vmce. Para, 17 de Abril de 1.820Conde de Villa Flr S.r Jos Antnio Nunes

    Afirmou Vinagre, em 1994, que essa referncia do Conde a um Corpo de Bombeiros seria uma prova da existncia, j no incio do sculo XIX, dessa Corporao que depois teria desaparecido em funo da decadncia administrativa dos sucessores de Vila-Flor.

    falta de outra referncia que pudesse respaldar as afirmaes do professor Vinagre, passou-se a pesquisar o significado da palavra Bombeiro e descobriu-se no Dicionrio da Lngua Portuguesa, de 1848, de Jos Fonseca, que bombeiro aquele que faz e arroja bombas.

    O Novo Dicionrio da Lngua Portuguesa, de Francisco Solano Constncio, mais antigo que o primeiro, de 1831, diz que bombeiro o artilheiro que atira bombas ou faz bombas de atirar e, numa segunda opo, o que serve bombas para apagar incndios.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Mas a Enciclopdia Delta Larousse, no verbete bombeiro, diz entre outras coisas que essa era uma designao que se d no Brasil aos artilheiros especializados em fazer tiro de bomba, ou aos artfices que fabricam bombas para esse fim. E finaliza afirmando que bombeiro o mesmo que artilheiro.

    Em 1748, o brigadeiro Jos Fernandes Pinto Alpoym (brasileiro) fez publicar em Lisboa o seu Exame de Bombeiros, que se referia no aos combatentes de incndios, mas a soldados que manejavam morteiros, pequenas peas de artilharia para lanar bombas, granadas e fogos de artifcio.

    O general Francisco de Paula Cidade, em sua monografia Sntese de Trs Sculos de Literatura Militar Brasileira deixa bem claro o sentido da palavra bombeiro no perodo colonial: ... Bombeiro no designava aquele que tem a misso de apagar incndio, mas o soldado ou oficial que manejava as peas que lanavam bombas...

    Assim, fcil concluir que a correspondncia do Conde de Vila Flor citada pelo professor Carlos Vinagre se referia na verdade a um bombeiro fazedor de bombas, artilheiro, e no a um apagador de incndios, anulando a tese de que j existia um corpo de bombeiros organizado no Par no incio do Sculo XIX.

    Dos Aguadeiros ao Corpo de PolciaEm Belm, no perodo colonial, o servio de extino de incndios era feito

    precariamente pelos aguadeiros (com baldes e latas) ou por uma bomba do Arsenal de Marinha, mais tarde reforada por outra da Companhia de Navegao e Comrcio do Amazonas.

    A precariedade dos equipamentos e o despreparo de seus integrantes, agravados com a desorganizao dos que chefiavam, comprometiam a eficincia dos servios ao mesmo tempo em que o clamor pblico aumentava diante da ocorrncia, cada vez mais a mide, de novos incndios.

    Em 8 de abril de 1872, a Lei n 708, assinada pelo presidente da Provncia do Par, Dr. Abel Graa

    (2), determinava que o servio de extino de incndios seria feito, a

    partir de ento, por um pequeno destacamento do Corpo de Polcia, destinando para isso oito praas de cada uma das quatro companhias existentes na poca. Acredita-se que a medida foi mais uma resposta poltica, j que foi adotada em decorrncia de um grande incndio que no dia 13 de fevereiro de 1872 destruiu completamente o palacete residencial (no local onde fica hoje a Assemblia Legislativa do Estado) do influente poltico Dr. Jos Coelho da Gama e Abreu, o Baro de Maraj

    (3), que viria depois ser

    presidente da Provncia, de 1879 a 1881.Em 5 de maio de 1880, surgiu, atravs da Lei municipal n 1.028, o primeiro Cdigo

    de Posturas de Belm que no seu Ttulo III tratava da Segurana e da Tranqilidade Pblica e no Captulo XV, artigos n 95 a 100, tratava dos casos de incndios. Eis o

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    que diziam esses artigos:Artigo 95 Os sacristes ou sineiros de todas as igrejas so obrigados a tocar os

    sinaes de incndio conforme o regulamento policial, logo que lhes seja transmitida a notcia de algum, sob pena de 30 mil ris de multa.

    Artigo 96 Os aguadeiros so obrigados a conservar suas pipas cheias durante a noite e a conduzi-las aos lugares de incndio logo que ouvirem os sinaes, sob pena de 20 mil ris de multa.

    Artigo 97 Os aguadeiros que se recusarem a conduzir suas pipas aos lugares de incndio, quando forem chamados, incorrero na multa de 30 mil ris.

    Artigo 98 Os 03 aguadeiros, que com suas pipas comparecerem em primeiro ao lugar de qualquer incndio, sero premiados com a quantia de 20 mil ris cada um, vista de atestado da autoridade policial do districto.

    Artigo 99 Toda e qualquer pessoa que descobrir um incndio obrigada a particip-lo imediatamente ao sineiro da igreja mais prxima, sob pena de 20 mil ris de multa.

    Artigo 100 Aquele que no se prestar com seus servos ou recusar a fornecer gua de seus poos ou depsitos para apagar incndios em sua vizinhana incorrer na multa de 30 mil ris.

    Assim, nesse clima de preocupao que dominava a cidade e tendo sentido pessoalmente os nefastos efeitos do grande incndio que destruiu seu palacete residencial em 1872, Gama e Abreu, j presidente da Provncia, cria, atravs de uma Portaria de 7 de outubro de 1880, o Regulamento de Apagamento de Incndios, que tinha o objetivo de oficializar a Lei n 709 de 8 de abril de 1872, determinando que o Comandante do Corpo de Polcia deveria enviar para o local de qualquer incndio um piquete comandado por um oficial e dois inferiores para ficarem sob as ordens da pessoa incumbida da direo do servio de extino de incndio. Esta pessoa designada era um engenheiro da repartio de Obras Pblicas da Provncia.

    importante ressaltar que o aviso de incndio dado pelas igrejas, previsto no Cdigo de Posturas e tambm includo no Regulamento de Apagamento de Incndios, obedecia a uma seqncia, j que as igrejas tinham uma certa hierarquia e os sinais deveriam ser dados da seguinte maneira: Igreja da S duas badaladas; Igreja de SantAnna trs badaladas; Igreja da Trindade quatro badaladas; Igreja de Nazar cinco badaladas. Aps a extino do incndio deveria ser dado um repique de sinos para informar o trmino dos trabalhos.

    Mesmo com o Cdigo de Posturas e o Regulamento de Apagamento de Incndios, os servios continuavam deficientes e os jornais da poca (de 1880 a 1882) relatam que as autoridades, em decorrncia dos incndios que vinham acontecendo de forma quase sistemtica, reconheciam as falhas e as atribuam ao incipiente conhecimento terico e prtico dos homens que executavam esses servios. Alm disso, havia a cobrana dos

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    comerciantes e da populao da Provncia, sobretudo da capital, que exigiam a criao de um Corpo de Bombeiros.

    Nesse anseio por um servio de combate a incndio mais eficiente, chega-se ao ano de 1882, o da criao da primeira Corporao voltada especificamente para esse ofcio no Par. Vale, porm, ressaltar que antes de sua criao oficial, em 24 de novembro de 1882, vrios fatos ocorreram que levaram os governadores da poca a tomarem decises relacionadas com as atividades dos bombeiros.

    preciso lembrar tambm, para perfeito entendimento dos fatos, que s no ano de 1882 a Provncia do Gro-Par teve nada mais nada menos que oito presidentes (governadores), alguns nomeados por Carta Imperial, outros interinos. Governaram o Par em 1882:

    Dr. Manoel Pinto de Sousa Dantas, nomeado por Carta Imperial em 26 de fevereiro de 1881. Assumiu o governo em 27 de abril de 1881 e ficou no governo at 4 de janeiro de 1882. Portanto governou ainda por quatro dias no ano de 1882.

    Dr. Jos da Gama Malcher (interino), governou o Par de 4 de janeiro a 27 de maro de 1882.

    Dr. Joo Jos Pedrosa, nomeado por Carta Imperial em 28 de janeiro de 1882, assumiu em 27 de maro e faleceu em 19 de maio do mesmo ano.

    Dr. Domingos Antnio Raiol, Baro de Guajar, (interino). Governou desde a morte de Pedrosa, em 19 de maio de 1882, at 26 de junho.

    Dr. Joo Rodrigues Chaves (tambm interino) substituiu Domingos Raiol de 26 de junho a 25 de agosto de 1882.

    Dr. Justino Ferreira Carneiro, nomeado por Carta Imperial em 23 de junho de 1882, assumiu o governo no dia 29 de agosto e ficou no poder at 6 de dezembro do mesmo ano.

    Dr. Joo Rodrigues Chaves (interino pela segunda vez). Governou a Provncia de 6 a 16 de dezembro.

    Dr. Rufino Enas Gustavo Galvo, Baro de Maracaju. Nomeado por Carta Imperial em 20 de novembro de 1882, assumiu o poder em 16 de dezembro e governou o Par at 24 de junho de 1884.

    Neste emaranhado de governadores nomeados e interinos, foi o Dr. Joo Jos Pedrosa, no relatrio de 23 de abril de 1882, quem, com o objetivo de melhorar e organizar a estrutura do servio de extino de incndios solicitou ao comandante do Corpo Provisrio de Bombeiros da Corte, no Rio de Janeiro, tenente-coronel Joo Soares Neiva, os esclarecimentos necessrios sobre a despesa provvel com a aquisio de material e do pessoal necessrio para a criao de um ncleo de Corpo de Bombeiros na Provncia do Par.

    Pedrosa justificava sua preocupao citando o grande crescimento econmico e populacional da Provncia com diversos estabelecimentos pblicos e importantes casas

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    comerciais e se referia tambm s presses da imprensa, que exigia um bem aparelhado servio contra incndios. Assim, ele solicitava ao comandante dos Bombeiros da Corte que, para no onerar muito os cofres pblicos, mandasse profissionais com comprovada experincia terica e operacional para treinar as praas da Companhia de Polcia da Provncia do Gro-Par na misso de Bombeiro.

    Um grande incndio ocorrido na noite de 4 de julho de 1882 serviu para apressar as providncias palacianas na direo da criao de um Corpo de Bombeiros. O incndio, de propores gigantescas, destruiu dois prdios e toda a mercadoria dos estabelecimentos comerciais situados no trreo, de propriedade da viscondessa de Souza Franco (viva do visconde e ex-ministro da Fazenda Bernardo de Souza Franco)

    (4), na Rua do Imperador (hoje Boulevard Castilhos Frana), esquina com a

    travessa Ocidental do Mercado.O jornal O Liberal do Par

    (5) do dia 6 de julho de 1882 transcreve um ofcio

    dirigido pelo Chefe de Polcia da provncia ao Governador Dr. Joo Rodrigues, com o seguinte teor:

    Cumpro o dever de ministrar a V. Excia. os esclarecimentos que obtive sobre o incndio havido ontem a que me referi em meu ofcio desta data sob n 440.

    Eram 8 e horas da noite quando o incndio manifestou-se, tendo comeado sem saber-se ainda a causa, na cozinha da casa onde residem e tm estabelecimento os senhores Fernandes e Belo.

    Embora acudissem de pronto, as bombas dos Arsenais de Marinha e de Guerra e da corveta Bahiana, da oficina de Coelho & Cia e duas da Companhia (de Navegao) do Amazonas, no puderam funcionar logo por falta de gua, de modo que o fogo ateou-se e tomou grandes propores, envolvendo quase todo o prdio de sobrado, que propriedade da Viscondessa de Souza Franco e no qual, alm daqueles comerciantes se acham estabelecidos os seguintes: Esteves & Dias, Domingos Lopes Pereira Guimares & Cia., Cunha & Bastos, Joo Henrique Vidigal, Vidigal Soares & Cia. , Igncio Jos da Silva & Cia. e Abel Augusto Cezar de Arajo.

    Todos esses estabelecimentos comerciais sofreram prejuzos e tambm o de Teixeira Bastos & Irmos, em outro prdio, sendo que ainda no recebi comunicao das companhias de seguro a respeito dos que estavam segurados.

    O fogo s pde ser dominado pelas 3 horas da madrugada, tendo destrudo grande parte do prdio.

    Quase ao amanhecer, ia-se ateando outra vez, dando as igrejas novos sinaes de incndio, com o fim de voltarem as carroas de gua. Continua-se ainda, at agora (2 e da tarde) nos trabalhos de extino.

    Como V. Excia., estive presente no lugar at depois das 3 horas da madrugada e l encontrei o 1 e 2 delegados e sub-delegados do 1 e 4 districtos da Guarda Urbana, pessoal das ditas bombas, piquetes dos diversos Corpos existentes na capital, etc.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Sinto no poder declinar os nomes de todos quantos se distinguiram neste servio. Indicou, porm, o Comandante Geral da Guarda Urbana os seguintes cidados: Baro de Maraj, Jaime Abreu, diretor e ajudante do Arsenal de Guerra, 1 tenente Oton de Carvalho Bulhes, 2 tenente Dito Farias, Sargento do Arsenal de Marinha Hemetrio Pimentel e Mestres Damasceno, Nunes, Paiva e Lobato, diversos oficiais da corveta Bahiana; quase todos os engenheiros da Provncia, dois caixeiros da Bastos & Irmos; os seguintes empregados da Companhia do Amazonas: gerente Manoel Pereira de Figueiredo, superintendente Manoel de Jesus Silva, Antnio da Silva pena Worffer, chefe das oficinas Eduardo Paulo (e) imediato Jos Campos de Magalhes.

    As autoridades policiais e oficialidade dos Corpos de Polcia e Urbanos prestaram, com a melhor boa vontade, todos os servios a seu alcance.

    Foram feridas, mui levemente, seis pessoas.No tenho razes para crer que deixasse de ser casual o incndio. Dias depois, outro grande incndio irrompeu em dois prdios comerciais no Largo de

    Santana. Devido a esse novo desastre, o Presidente da Provncia, Joo Rodrigues Chaves, procurou apressar as providncias j iniciadas pelo seu antecessor Joo Jos Pedrosa e enviou, na data de 15 de julho, a importncia de 15:000$ (15 contos de ris) ao Corpo Provisrio de Bombeiros da Corte, solicitando toda a brevidade possvel na vinda de uma pessoa com o devido material, para organizar em Belm uma companhia de Bombeiros.

    Conforme relatos do jornal O Liberal do Par de 15 de julho de 1882, Rodrigues Chaves enfrentava forte campanha da imprensa e era cobrado pelos grandes comerciantes, um dos quais pedia apoio da prpria direo do jornal:

    ... os abaixo-assinados, membros de uma comisso nomeada por diversos cavalheiros reunidos ontem com o fim de organizar Companhia de Bombeiros para extino de incndios, tomaram a liberdade de levar essa ocorrncia ao conhecimento de V. Senhoria e ao mesmo tempo pedir o valioso apoio de seu conceituado jornal.

    V. Senhoria compreender a necessidade vigente que h em organizar uma Companhia de Bombeiros nesta capital, onde os incndios vo se tornando cada vez mais freqentes, sem que se disponha de material e pessoal habilitado para domina-los...

    A criao da Companhia de Bombeiros tem dois fins altamente humanitrios: garantir as vidas e capitais sujeitos aos riscos de incndios e proteger, por meio de um montepio, os bombeiros que se invalidem no servio.

    A comisso, cnscia de que encontrar todo apoio por parte do jornal de que V. Senhorias so mui dignos redatores, subscreve com a mais alta considerao de V. Senhorias.

    Amando R. da Fonseca, Francisco Xavier Rodrigues de Souza, Jos Pereira Henrique, Joaquim Jos Pereira Soares, Antnio da Rocha Romariz, Jos Maria Guedes Mouro, Jos Antnio Arantes Braga, Manoel Teixeira Pinto dos Santos, J. M. Alves (e) Jos Travassos da Rosa...

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Homens e Material partemDo Rio para Belm

    No dia 10 de agosto de 1882, a bordo do paquete (navio a vapor) Bahia partia do Rio de janeiro o capito Antnio Verssimo Ivo de Abreu, acompanhado do sargento Antnio de Souza Pinto, do cabo Joo Alberto da Silveira e do bombeiro Fortunato Sanches. Traziam o seguinte equipamento: um carro de pessoal e material, uma bomba a vapor inglesa da marca Marryweather & Sons, com capacidade para 500 gales de gua; uma bomba manual vienense com capacidade para 100 gales; uma bomba manual inglesa com capacidade para 50 gales, um aparelho de salvao a espiral francs, uma escada com gancho para assalto, uma escada prolongvel, um pra-quedas de lenol ingls, dois tanques de lona, um dos quais com capacidade para 100 litros, 14 quilos de cido sulfrico, 28 quilos de bicarbonato de sdio e demais peas sobressalentes, incluindo-se posteriormente um carro pipa e uma carroa de material. Esse era o material com que contaria a futura Companhia de Bombeiros para iniciar suas atividades na capital paraense.

    Joo Rodrigues Chaves deixou o governo em 25 de agosto e quatro dias depois, em 29 de agosto, assumiu o governo o Dr. Justino Ferreira Carneiro. As crticas da imprensa e a presso dos comerciantes continuavam, destacando todos que, a capital paraense, notvel pelo seu comrcio e riqueza e j possuindo importantes edifcios pblicos e particulares, no dispunha de um servio ao menos regular de extino de incndios.

    Relatrio do dia 25 de agosto de 1882 ressalta ...a impotncia das autoridades e a inutilidade de seus esforos em presena desses lamentveis desastres, (que so os incndios) por falta de meios que a cincia aconselha e que so comumentes usados para domin-los e evitar seus mais funestos resultados...

    Alm da cobrana da imprensa e dos comerciantes, havia o receio de que os incndios se reproduzissem propositadamente e por meio criminoso de forma a sanar embaraos comerciais, exigindo das companhias de seguros valores fictcios.

    De novo outro incndio, se prejuzos trouxe, tambm serviu para agilizar as providncias para a criao do Corpo de Bombeiros. No dia 6 de setembro o fogo irrompeu na Alfndega de Belm.

    No jornal Dirio de Notcias (6)

    de 7 de setembro de 1882 j h referncias ao Corpo de Bombeiros (ainda no oficialmente criado) mas que j estava em fase de preparao e treinamento sob o comando do capito Ivo. Diz o jornal:

    ... Por ocasio de abrir-se ontem a Alfndega, s 7 e horas da manh, verificou-se a existncia de um incndio num dos armazns trreos, que estava apinhado de diversos volumes, na maior parte bagagens. O incndio foi extinto quase imediatamente e apenas por trabalhadores e funcionrios da repartio.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Calcula-se em 10 a 19 contos e ris os prejuzos causados pelo fogo e pela gua empregada para domin-lo e que avariou-se muitas mercadorias existentes nos corredores e noutros armazns.

    Compareceram ao lugar as bombas dos Arsenais, da Companhia do Amazonas e do Corpo de Bombeiros, com os respectivos pessoaes, inspetores da Alfndega e da Tesouraria, Chefe de Polcia, Diretor do Arsenal de guerra e muitas outras autoridades....

    Atravs de ofcio de 15 de setembro de 1882, constante nos Relatrios do Presidente da Provncia e j sendo presidente o Dr. Justino Ferreira, foi ordenado ao engenheiro Antnio Joaquim de Oliveira Campos que efetuasse adaptaes no andar trreo do Palcio da Presidncia (posteriormente Palcio Lauro Sodr, hoje sede do Museu do Estado), em cujas dependncias j se encontrava o material do Servio de Extino de Incndios, para acomodar a futura Companhia de Bombeiros.

    Segundo Manoel Baena em Informaes sobre as Comarcas da Provncia do Par, de 19 de setembro de 1884, essas primeiras instalaes dos Bombeiros estavam localizadas exatamente na parte inferior do lado oriental do Palcio do Governo, ao lado da Tezouraria da Fazenda, local onde depois foi descoberta a existncia de uma capela.

    Outubro passa sem nenhum registro de incndio e no dia 2 de novembro de 1882(7)

    , o Dr. Justino Ferreira Carneiro sanciona a Lei n 1.074 (ver fac-smile

    (8)), pela qual

    a Assemblia Legislativa Provincial autoriza a Presidncia a criar e organizar uma companhia de bombeiros para o servio de extino de incndios na capital. Durante muitos anos o Corpo de Bombeiros tomou erroneamente essa data como a de sua efetiva criao.

    No dia 8 e novembro, o Dr. Justino Ferreira sancionou outra Lei, a de n 1.101 (ver fac-smile)

    (9), mandando vigorar para o exerccio 1882-1883 a Lei n 1.061 de 25 de

    junho de 1881, elevando o efetivo do Corpo de Polcia, distribuindo 345 homens para a Infantaria e 30 para a Cavalaria e retirando 30 dos designados da Infantaria para formarem uma Companhia de Bombeiros, a qual ser comandada por um Capito que servir sob as imediatas ordens do Presidente da Provncia.

    Contudo, se oficialmente os Bombeiros ainda no existiam, na prtica j estavam em intensos preparativos desde agosto. Tanto assim que o jornal O Liberal do Par de 10 de novembro de 1882 relata a informao de ter o Capito encarregado da estao de bombeiros remetido a folha do respectivo pessoal para pagamento dos vencimentos relativos ao ms de outubro ltimo na importncia de 449$100 ris

    Infelizmente, comeavam tambm as crticas. O Dirio de Notcias de 16 de novembro de 1882 reclamou da demora do executivo na criao do Corpo de Bombeiros, que j estava autorizada pela Lei n 1.074 e para o qual j havia um efetivo designado pela Lei n 1.101.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    Na seo Chouria Diria, o jornal trata do oramento provincial e da Companhia de Bombeiros e adverte: ... tempo de lembrarmos ao presidente da Provncia urgncia na execuo desta Lei (n 1.074). Sucedem-se os incndios e o que se faz atualmente que no pode ter o nome de servio porque nunca vimos cousa alguma to desservial no pode continuar....

    Tem sua Excia. mo todos os meios necessrios para realizar o importante melhoramento iniciado pelo honrado senhor Conselheiro Chaves autorizao, material, organizador e verba no oramento. Pouco que falta, e s de que sua Excia. depende.

    Nasce a Companhia de BombeirosNo dia 24 de novembro de 1882, o Dr. Justino Ferreira Carneiro, sob

    presso da imprensa e da Assemblia Legislativa da provncia baixou portaria (ver fac-smile nos Anexos) criando finalmente e oficialmente a Companhia de Bombeiros.

    curioso observar que a criao dessa primeira Companhia era fruto de uma Portaria e no de uma Lei. As duas leis, que deram origem portaria a de n 1.074 e a n 1.101, de 2 e 8 de novembro de 1882, respectivamente , no podiam ser consideradas como datas da criao dos Bombeiros, como erradamente acontecia at 1994, embora tenham aplainado e compactado o terreno para a Portaria que efetivamente os criou, no dia 24 de novembro.

    Observe-se tambm que a Companhia de Bombeiros, embora integrada por homens do Corpo de Polcia, j nascia independente e autnoma, subordinada diretamente ao Governador (presidente da Provncia, na poca).

    O documento legal que determina finalmente o nascimento da Companhia de Bombeiros no Par muito sucinto. Ei-lo na ntegra (com ortografia atualizada):

    Portaria de 24 de novembro de 1882Cria uma Companhia de Bombeiros e d-lhe o competente regulamento.O Presidente da Provncia, autorizado pelas leis provinciais n 1.074 e 1.101 de

    2 e 8 do corrente ms, resolve criar uma Companhia de Bombeiros para o servio de extino de incndios nesta cidade e dar-lhe o seguinte regulamento: (na seo de anexos).

    De fato, a Portaria de Justino Ferreira Carneiro veio acompanhada do primeiro Regulamento da Companhia de Bombeiros

    (10) , com 11 captulos e 72 artigos e

    mais um quadro com a distribuio do efetivo e duas tabelas sobre vencimento e fardamento.

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    O primeiro efetivo da Companhia de Bombeiros era composto por 29 homens:Comandante: capito Antnio Verssimo Ivo de Abreu;1 Sargento (chefe do servio): Antnio de Souza Pinto;2 Sargento (chefe de turma): Joo Alberto da Silveira;Cabo dEsquadra (chefe de bomba): Fortunato Sanches;Bombeiros: Luis Ferreira da Cunha, Estcio Sampaio Braga, Antnio Manoel

    Vasques Pereira, Geraldo Jos de Souza, Theodoro Abadia, Manoel de Nazar Machado, Lus Jackson, Manoel Pedro Lopes, Joo Rolindo dos Santos, Serafim Antnio dos Reis, Francisco Amaro, Manoel dos Passos da Costa Ferreira, Jorge Justino Leo, Manoel Vieira da Rocha, Lrio Pedro Ferreira, Manoel Esteves dos Santos, Antnio Jos Pedro, Joo Antnio de Castro, Laurindo Antnio da Costa, Antnio da Silveira Dutra, Estefnio Antnio de Jesus, Francisco Antnio de Vilhena, Manoel Jos de Santana, Martinho Pereira. O 29 homem era um corneteiro.

    E assim, com esse pessoal, com o material trazido do Rio de Janeiro pelo capito Ivo e mais algum aproveitado do Servio de Extino de Incndio, comeava a funcionar a Companhia de Bombeiros no Par nas dependncias adaptadas do Palcio da Presidncia da Provncia.

    Logo, porm, o capito Ivo comeou a sentir os efeitos do pouco espao destinado Corporao no Palcio do Governo e assim exps o problema num relatrio enviado ao Presidente da Provncia no dia 6 de dezembro, por acaso o ltimo dia de Justino Ferreira no governo:

    ...penso que ser de convenincia pblica a transferncia da atual estao (local) para um prdio melhormente adaptado formao disciplinar das praas no exerccio tcnico de preparao habitual, providncia esta imprescindvel concepo das vantagens e interesse pblico de que a instituio do mesmo servio cogitou...

    Convm que o Capito Comandante da Companhia resida no mesmo prdio em que ele tenha de funcionar, condio que, no verificada, determinar perturbaes freqentes na realizao completa de comparecimento nas estaes de incndio e com a celeridade disciplinada que deve exprimir a superioridade no servio tecnicamente organizado para aplicaes excepcionais da mais caracterizada emergncia.

    A indicada transferncia determinar igualmente a vantagem de ficar o Palcio da Presidncia isento dos possveis inconvenientes que resultaro do expediente e trabalho efectivo da companhia e da assistncia necessariamente constante do pessoal na estao independente.

    Durante os primeiros anos a Companhia de Bombeiros procurou atender a todos os chamados com a maior eficincia possvel, mas enfrentava limitaes, a maior das quais, a falta de espao, s foi resolvida pelo governo 14 anos depois, j na Repblica, em 1896, conforme veremos mais adiante.

    No ms de maro de 1886, o 1 Sargento Antnio de Souza Pinto foi promovido

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    ao posto de 1 tenente coadjuvante e o 2 Sargento Joo Alberto da Silveira, ao posto de Alferes instrutor.

    Durante o ano de 1887 o efetivo foi reduzido para 27 homens dois a menos que na data de criao e no dia 27 de julho desse mesmo ano foi concedida exonerao ao Tenente Antnio Souza Pinto, sendo nomeado para substitui-lo o Alferes Joo Alberto da Silveira, e para a vaga deste, o Sargento Theodor Bergh (que era alemo).

    Mas a maior baixa da nova Corporao de Bombeiros ocorreria em 1888. Nesse ano, em 23 de abril, o Capito Ivo de Abreu, gravemente enfermo, foi exonerado e retornou ao Rio de Janeiro. No dia 1 de maio assumiu o comando o Tenente Joo Alberto da Silveira, que foi em seguida promovido a Capito e, dois anos depois, no dia 3 de julho de 1890, ao posto de Major, permanecendo no comando dos Bombeiros at 20 de junho de 1894.

    No dia 17 de novembro de 1889, dois dias depois do fim do Imprio e um dia aps o Par ter aderido Proclamao da Repblica, no dia 16, foram fornecidas Companhia de Bombeiros, pelo 15 Batalho de Infantaria, as primeiras seis carabinas Comblain acompanhadas dos respectivos sabres, bandoleiras, cintures com cartucheiras, patronas, etc. No dia 20 de novembro, chegaram do Rio de Janeiro, pelo navio a vapor Pernambuco, 30 capacetes de couro da Rssia, com distintivos e emblemas de metal fornecidos pela firma Cunha Guimares & Cia. nessa poca, todo o fardamento dos bombeiros era confeccionado pelo Instituto Paraense de Educandos Artfices

    (11).

    Em 1890, no dia 25 de abril, foi criada no mbito da Companhia de Bombeiros, a Escola Regimental, e no dia 18 de dezembro, a Banda de Msica, que veremos mais adiante num captulo dedicado somente a ela.

    Juntamente com a promoo do comandante da Corporao ao posto de Major, no dia 3 de julho de 1890, foram promovidos tambm: a Tenente, o Alferes Theodor Bergh; a Alferes, os 2s Sargentos Francisco Feliciano Barbosa e Sabino Antnio Barbosa. Tambm foi admitido como Alferes o ex-2 Sargento do Corpo de Aprendiz de Marinheiro Manoel Baptista Cordeiro.

    Companhia passa a corpoNo dia 16 de junho de 1891, nove anos aps sua criao, a Companhia de Bombeiros

    foi elevada categoria de Corpo atravs do Decreto n 355 do 3 Governador do Estado, o Capito-Tenente Duarte Huet Bacelar Pinto Guedes

    (12). Nesse ano o efetivo

    da Corporao era j de 118 homens, todos integrados Fora Pblica do Estado. O Decreto n 355 determinava tambm que o Corpo de Bombeiros deveria ser comandado por um Major. Antes, o comando da Companhia era de um Capito.

    Em razo de seu crescimento natural, em 1892 a Corporao dividida em duas

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    O CORPO DE BOMBEIROS NO PAR

    companhias. A primeira era comandada pelo Tenente Manoel Baptista Cordeiro e integrada ainda pelos seguintes Bombeiros: Tenente graduado Pedro Marcellino da Luz; Alferes Manoel Alexandre da Cmara; 1 Sargento Jlio Joaquim da Silva; 2s Sargentos Raimundo de Oliveira Coutinho, Clementino de Oliveira Coutinho e Jos Loureno Carneiro da Cunha (corneteiro); Cabos Casemiro Antnio de Barros, Joo Baptista Rego, Manoel Francisco C. de Lima, Anselmo Pereira Gomes, Antnio Pinheiro da Silva e mais 69 Soldados Bombeiros.

    A segunda Companhia tinha como comandante o Tenente Francisco Feliciano Barbosa e mais o seguinte efetivo: Alferes Francisco Marques Coutinho Canavarro, 2s Sargentos Francisco Jos Teixeira e Lus de Albuquerque Veras; Cabos Manoel Vieira da Rocha, Martinho Manoel Nogueira,