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Trabalho de Conclusão de Curso
O SENSO COMUM NA FALA DOS ADOLESCENTES DA ESCOLA ESTADUAL DOM BOSCO DE CORUMBÁ-MS
Evelyn da Silva Campos1 Resumo: O presente trabalho teve como objeto de pesquisa a Escola Estadual Dom Bosco localizada em Corumbá-MS. E teve como objetivo compreender a percepção dos estudantes, do ensino médio, em relação ás minorias sociais especificamente: negros, mulheres, homossexuais, pobres e bolivianos. Buscou-se entender como os jovens enxergam estas minorias e se eles reproduzem um pensamento preconceituoso do senso comum em relação á elas, conhecer quais os meios de comunicação que estes jovens utilizam para se informar que contribuem na formação da sua visão de mundo, se os estudantes vivenciam o preconceito no ambiente escolar e se a escola aborda estes temas. Para alcançar estes objetivos foram aplicados questionários com uma amostra de 100 alunos. Após a análise dos resultados podemos perceber que a maioria dos jovens utilizam os mesmos meios de informação, ficando restritos as grandes emissoras como a Globo e aos grandes sites como G1, Youtube e Facebook, dificultando que tenham uma visão de mundo mais crítica, pela falta de variedade de canais que utilizam. Em relação à visão dos jovens sobre as minorias sociais os dados mostram que o preconceito está presente na fala deles nem sempre em maior número, porém existe, principalmente em relação aos bolivianos e homossexuais. E quase a metade dos entrevistados afirmou já ter sofrido preconceito dentro da escola e 72% deles disse já ter presenciado uma situação de preconceito contra homossexuais no ambiente escolar. Esta pesquisa se faz necessária no sentido de levar até a escola estes fatos e fomentar atividades que trabalhem estas temáticas, buscando a construção de uma escola mais democrática e que respeite as diferenças. Palavras-chave: Senso Comum. Minorias. Adolescentes. Escola. Corumbá. 1 INTRODUÇÃO
No ano de 2009 foi realizada a pesquisa Preconceito e Discriminação no ambiente escolar,
que teve como objetivo analisar de maneira global a incidência de preconceito e discriminação nas
1 Especialista em Gestão Pública, formada em Ciências Sociais e professora de Sociologia no Estado de Mato Grosso do Sul. Email: [email protected]
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escolas públicas, para isso foi realizado um estudo quantitativo em 501 escolas públicas de todo o
Brasil através de entrevistas com mais de 18,5 mil alunos, pais e mães, diretores, professores e
funcionários, o resultado revelou que 99,3% dessas pessoas demonstram algum tipo de preconceito
étnico-racial, socioeconômico, aos portadores de necessidades especiais, gênero, orientação sexual
e outros. (FIPE/INEP/MEC, 2009)
Uma pesquisa como esta mostra como o preconceito é quase generalizado no ambiente
escolar e está em todos os segmentos. Uma realidade que precisa ser combatida imediatamente,
por isso a necessidade de pesquisas de campo que contribuam para ampliar o conhecimento sobre
as diversas instituições escolares e principalmente sobre os educandos que a compõe, que tenham
como finalidade criar propostas específicas para a instituição combater da melhor maneira os seus
problemas.
Pensando nestas questões este trabalho foi elaborado com o intuito de compreender a visão
de mundo dos estudantes hoje, em relação à sociedade em que estão inseridos, em especial neste
trabalho sobre as minorias sociais, e como esta visão está sendo formada. No intuito de construir
uma escola democrática que trabalhe com respeito às diversidades, contribua na formação do aluno
não apenas como profissional, mas também como um cidadão. Assim como afirma Junqueira
(2009, p. 163) Uma política pública educacional com propósitos inclusivos deve procurar subverter os valores hegemônicos e as relações de poder que nortearam a edificação de uma escola para poucos. Igualmente, precisa investir no debate dos critérios que habitualmente adotamos para avaliar e classificar o mundo, as coisas, as pessoas e suas atitudes. Por isso, também deve se voltar para a reconstrução dialógica de regras e formas de convívio, além de repensar continuamente os currículos e conceber novas maneiras de ensinar e aprender.
Na tentativa de encontrar respostas sobre esta problemática foram aplicados questionários
com os alunos do ensino médio da Escola Estadual Dom Bosco, situada em Corumbá- Mato Grosso
do Sul, esta escola atualmente é a maior escola da rede estadual em relação ao número de alunos,
é também uma escola confessional Católica e recebe muitos alunos estrangeiros, especialmente
vindos da Bolívia. A escola reúne estas características peculiares que fizeram com que a mesma
fosse escolhida como campo de estudo. Como amostra para esta pesquisa foram selecionadas três
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turmas do período matutino do ensino médio, as turmas 1°A, 1°B e 2°A, totalizando 100 alunos.
Nas figuras 1 e 2 é mostrado a aplicação do questionário.
Figura 1. Alunos do 1°A respondendo o questionário.
Fonte: Foto produzida pela própria autora (2016)
Figura 2. Aluno do 2°A respondendo o questionário.
Fonte: Foto produzida pela própria autora. (2016)
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O questionário pode ser dividido em três partes: a primeira parte eram perguntas
relacionadas aos meios de informação mais utilizados pelos alunos e pela sua família, a segunda
parte eram questões de valores, crenças e atitudes em relação ao preconceito e discriminação e a
terceira parte eram perguntas sobre a prática do preconceito no ambiente escolar e sugestões de
como a escola pode lidar com este problema. Foi composto de doze questões e uma destas questões
eram 25 frases em que eles deveriam marcar se: discordavam muito, discordavam pouco,
concordavam muito ou concordavam pouco. As frases representavam pensamentos do senso
comum disseminados em relação às minorias sociais, como por exemplo: mulheres são as únicas
responsáveis pelo serviço doméstico, a homossexualidade é uma doença, os negros são mais
violentos dos que os brancos e etc.
Ele foi elaborado com o intuito de descobrir quais as fontes de informação mais utilizadas
por estes jovens e se de alguma maneira elas contribuem na cristalização dos preconceitos em
relação ás minorias sociais, se estes compartilham de uma visão do senso comum disseminada em
relação ás minorias: pobres, mulheres, negros, bolivianos, homossexuais e beneficiários do
programa bolsa família e se eles vivenciam situações de preconceito no ambiente escolar, como a
escola lida com estas questões e como eles gostariam de trabalhar estes temas no cotidiano escolar.
Por mais que estejamos no século XXI estes temas ainda se fazem presentes no nosso
cotidiano seja na mídia, na escola e na sociedade em geral. Um relatório feito pela Ong SaferNet
em 2014 mostra que mais de 86 mil casos de ódios à negros e outras etnias foram relatados e estes
números representam um aumento de 34,15% em relação ao ano de 2013 e o Mapa da Violência
2015 mostra que a violência atinge principalmente o jovem, negro e pobre e que em 2012 morreram
2,5 mais negros do que brancos, em relação aos homossexuais o Brasil lidera um ranking
internacional feito pela Associação Internacional de Gays e Lésbicas como o país campeão de
assassinatos da população LGBT, sendo o responsável por 44% das morte de LGBT de todo o
mundo e em relação á violência contra mulher os dados também não são positivos o Mapa da
Violência Contra a Mulher de 2015 revela que num grupo de 83 países o Brasil ocupa a 5° posição
em taxa de homicídios de mulheres.( MATSUURA, 2015) (ALESSI, 2015) (MELLO, 2014)
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Estes são apenas alguns dados que comprovam o quanto as minorias sociais não são
respeitadas no nosso país e que o preconceito muitas vezes tratado de forma irrelevante acaba
gerando cada vez mais vítimas fatais na nossa sociedade, como afirma Andrade (2009, p. 20):
A humanidade deveria não mais permitir nenhuma manifestação de intolerância com o diferente, pois a intolerância não é apenas questão de não tolerar as opiniões divergentes; ela é agressiva e com frequência assassina no seu ódio à diversidade alheia.
Mesmo com o poder público criando leis e políticas de combate as diversas formas de
preconceitos e violência percebemos que ainda não têm sido suficientes para transformar esta
realidade. Por isso precisamos de pesquisas no sentido de desvendar os fatores que podem gerar
todo este problema. E que estas pesquisas gerem práticas pedagógicas comprometidas com uma
educação voltada para os direitos humanos na perspectiva intercultural, levando em conta que “O
respeito à diversidade é elemento imprescindível para se garantir a formação para a cidadania e a
qualidade do processo de ensino-aprendizagem, em favor de cada pessoa”. (Junqueira, 2009, p.
168)
2 MÍDIAS E PRECONCEITO
O processo de coleta de dados aconteceu nas dependências da Escola Estadual Dom Bosco.
Foi explicado previamente aos alunos sobre o tema da pesquisa e após a assinatura do Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido foram entregues os questionários para serem respondidos
durante o período da aula. Como foi informado anteriormente os questionários foram respondidos
por cem alunos do ensino médio do período matutino das turmas 1°A, 1°B e 2°A.
Podemos começar traçando um perfil dos entrevistados. Em relação ao sexo 50% eram do
sexo masculino e 50% do sexo feminino, em relação á cor/raça a maioria se declarou parda cerca
de 60,6%, 25,5% branca e 12,8% negra, mesmo sendo uma escola confessional católica nem todos
os entrevistados seguem o catolicismo, 66% são católicos, 27% evangélicos e somando 7% ateu e
outras religiões, por ser uma escola localizada numa cidade de fronteira e que recebe muitos
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bolivianos foi perguntado a nacionalidade dos entrevistados e 96% são brasileiros e apenas 4%
estrangeiros.
Um ponto que chama atenção no perfil dos estudantes que responderam o questionário foi
o fato de apenas 12,8% serem negros, num país como o Brasil profundamente marcado pela
desigualdade racial este dado se torna muito significativo. O artigo sobre desigualdade racial
produzido pelo Instituto Unibanco (2015) mostra que o percentual de jovens negros matriculados
no ensino médio aumentou nos últimos anos de 36% em 2005 para 51% em 2014, porém continua
abaixo do percentual de jovens brancos matriculados que é de 65%. E a evasão escolar também é
um problema que atinge principalmente os estudantes negros, na faixa etária de 15 a 17 anos o
percentual de jovens fora da escola chega a 17% entre os negros e 13% entre os brancos.
Após traçar o perfil do entrevistado, o questionário buscava descobrir informações sobre os
meios de comunicação mais utilizados pelos alunos e os seus familiares no intuito de relacionar
estes meios á disseminação do senso comum em relação às minorias sociais no ambiente escolar,
ou seja desvendar se a reprodução do preconceito pode estar relacionado aos canais de informação
mais utilizados pelos estudantes.
O resultado da pesquisa mostrou que a principal fonte de informação utilizada pelos
entrevistados é a internet com 49%, seguida da televisão com 48% e livros, revistas e rádio
somaram apenas 1%. Este primeiro resultado já mostra uma tendência do século XXI que é a
substituição da televisão pela internet, principalmente em se tratando do público jovem com a onda
dos smartphones, em que a todo o momento eles estão conectados.
Em relação aos canais mais assistidos na televisão a emissora que aparece em primeiro
lugar é a Globo com 63,6%, seguida pelos canais fechados com 22,2%, SBT com 9,1% e a Record
com 5,1%. Foi perguntado também quais os sites mais utilizados na busca de informações e apesar
da pergunta ser aberta as resposta se repetiram.
E quando perguntados se eles acreditavam que tudo aquilo que era transmitido pela mídia
era verdadeiro ou eles preferiam buscar outras fontes de informação 73,4% responderam que
buscavam várias fontes de informação, 16% disseram acreditar em parte na mídia e 10,6% disseram
acreditar totalmente.
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Analisando os dados podemos perceber que mesmo que a principal fonte de informação
tenha deixado de ser a televisão e passado a ser a internet, as práticas relacionadas ao seu uso
continuam as mesmas. Na televisão o telespectador ficava restrito na TV aberta á uma quantidade
limitada de canais que acabavam sendo a sua única fonte de informação não deixando muito espaço
para um olhar mais crítico, já que as programações das emissoras eram muito parecidas. Assim
como afirmou Pierre Bourdieu que a televisão privilegia o entretenimento, em prejuízo da
informação e da cultura e que ainda inibe o raciocínio abstrato e confere muito pouca importância
ao juízo crítico. (Bourdieu, 1997)
Diferente da televisão a internet promete uma variedade de opções, as pessoas podem
acessar milhares de conteúdos diferentes, podem criar a sua própria programação e buscar a
informação onde e quando quiserem, porém como a pesquisa revela o uso da internet acaba sendo
parecido com o da televisão por mais que os entrevistados possam ter acesso a uma grande
variedade de conteúdo eles acabam utilizando os mesmos sites, no caso os mais populares em
média sete sites diferentes.
No caso do questionário aplicado aparece em primeiro lugar o site da Globo que acaba
sendo apenas uma extensão do canal de televisão, em segundo o Facebook que na verdade é uma
rede social que as pessoas usam principalmente para expor informações da sua vida pessoal e em
terceiro o Wikipedia que é um site de pesquisa, mas não muito confiável já que qualquer pessoa
pode alimentá-lo com informações e são citados outros sites de canais de televisão como o R7 da
Record, de jogos e até whatsapp que na verdade é um aplicativo. Como mostra o gráfico 1.
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Gráfico 1. Sites mais utilizados.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora. (2016)
Como foi explicado anteriormente a segunda parte do questionário eram perguntas
relacionadas aos valores, crenças e atitudes em relação ao preconceito racial, social, de gênero, de
orientação sexual e cultural. A primeira pergunta era se o entrevistado se considerava uma pessoa
preconceituosa e 99% respondeu que não, ou seja quase que a totalidade afirma não ter preconceito.
A questão tinha como intuito analisar se a resposta estaria de acordo com o discurso do entrevistado
nas outras questões.
As primeiras questões foram sobre o preconceito racial. E as repostas que chamaram mais
atenção foram aquelas relacionadas á questão da violência e do estudo. Foi questionado se os
entrevistados concordavam com a afirmação que os negros são mais violentos que os brancos e se
os brancos, em geral, são mais estudiosos que os negros. A porcentagem de concordância é
mostrada nos gráficos 2 e 3.
Podemos perceber que o estereótipo do negro como criminoso e violento permanece no
pensamento de muitos ainda, um estigma que não consegue ser superado, herança de uma
mentalidade escravocrata que não encontra embasamento científico nenhum. Assim como a
imagem do negro como provido de menos inteligência ou capacidade que o branco. A concordância
com estas afirmações contribui para a manutenção de uma sociedade que oferece oportunidades
desiguais para brancos e negros, tanto no mercado de trabalho como nas instituições escolares.
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Gráfico 1. Negros são mais violentos que os brancos.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
Gráfico 2. Os brancos, em geral, são mais estudiosos que os negros.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
O segundo tema foi o preconceito de gênero e as frases que tiveram maior aprovação são
aquelas que estão relacionadas à liberdade da mulher. Como mostra o gráfico 4 e 5. Por mais que
os entrevistados sejam jovens entre 15 e 17 anos, podemos perceber um pensamento antigo sobre
o comportamento que a mulher deve ter para ser considerada respeitável e o mais preocupante a
culpabilização da vítima em casos de violência sexual. No caso da afirmação do gráfico 5 a
quantidade de meninos e meninas que discordaram totalmente da frase foi igual e na afirmação da
figura 4, 76% das meninas discordaram totalmente da frase enquanto os meninos apenas 60%.
Podemos perceber que o machismo não é uma exclusividade do homem, mas desde cedo já está
presente no pensamento da mulher também.
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Uma pesquisa encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública realizada em
2016 com 3.625 mil pessoas em todo o país revelou que 30% dos entrevistados concordavam com
a afirmação “mulher que usa roupas provocativas não pode reclamar se for estuprada”, num país
como o Brasil que a cada 11 minutos uma mulher é estuprada este pensamento machista colabora
para a manutenção deste dado. (MENA, 2016)
Gráfico 3. A mulher que sai com vários homens não é para casar.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
Gráfico 4. Mulheres que usam roupas curtas estão mais sujeitas a sofrerem um estupro.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
Em relação ao preconceito de orientação sexual apenas 58,2% dos entrevistados diz
discordar totalmente da afirmação da figura 6, os outros 41,2% afirmam ter algum grau de
concordância com a frase. O que demonstra que a homofobia está presente no ambiente escolar e
é um tema que deveria ser mais discutido. O que acontece atualmente são apenas ações isoladas
nas escolas, nada que garanta pelos Parâmetros Curriculares Nacionais que o tema seja
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obrigatoriamente trabalhado, até porque essa medida não seria suficiente já que “sem forte
investimento na formação de professores(as) para a promoção da diversidade sexual, de pouco
servirão as diretrizes para os sistemas, pois elas não produzirão automaticamente sujeitos dispostos
ou aptos a implementá-las” (JUNQUEIRA, 2009 P.165)
Gráfico 5. Eu não aceito a homossexualidade.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
O outro tema abordado foi à questão do preconceito social e as repostas chamam bastante
atenção, pois coincidem com a ideologia disseminada na sociedade em relação à desigualdade
social, como sendo mais um problema pessoal do que fruto de questões históricas. Como mostra o
gráfico 7, 60.06% dos entrevistados acreditam que no Brasil todos temos as mesmas oportunidades
e que o esforço individual é o suficiente para se progredir na vida. Esta afirmação não leva em
conta as desigualdades inerentes ao sistema capitalista e nem a falta de assistência do Estado com
a população mais pobre.
E quando questionados sobre o Programa Bolsa Família 36.04% dos entrevistados
apresentaram uma visão negativa sobre o programa, como mostra o gráfico 8. Mais uma vez uma
visão simplista da pobreza que atribui apenas ao indivíduo a culpa por estar naquela situação.
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Gráfico 7. Todos nós temos as mesmas oportunidades basta se esforçar.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
Gráfico 8. O Programa Bolsa Família faz com que os pobres fiquem preguiçosos.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
O preconceito cultural também foi um tema levantado pelo questionário, como foi
explicado anteriormente a E. E. Dom Bosco recebe muitos alunos da fronteira da Bolívia e por isso
as questões foram direcionadas á esta população. As respostas demonstraram que apesar dos
estudantes brasileiros conviverem com os estudantes e o povo boliviano existe muito preconceito
contra esta cultura, como mostram os gráficos 9 e 10. Na figura 10, por exemplo, 37% dos
entrevistados concordam em algum grau que preferem não conviver com os bolivianos. Algumas
explicações, sobre esta visão dos estudantes corumbaenses em relação aos bolivianos, podemos
encontrar na pesquisa etnográfica realizadas em Corumbá por Costa (2015, p. 6) em que ele afirma:
[...] o boliviano se constrói no imaginário brasileiro fora dos parâmetros que definem os valores "civilizados". Nesse contexto, a imagem do "outro" ganha
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contornos específicos em Corumbá, na medida em que a Bolívia é vista por parte da população como símbolo do atraso, da pobreza e da falta de "civilidade", de higiene, das leis. Esses estigmas podem ser resumidos nas categorias identitárias de "chocos", "collas" ou simplesmente "índios" ou "bugres". Percebe-se, em inúmeras conversas com moradores de Corumbá, que a Bolívia é representada como um lugar "sem lei" e "corrupto".
Gráfico 9. Bolivianos são menos higiênicos que os brasileiros.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
Gráfico 10. Não tenho preconceito, mas prefiro não viver perto dos bolivianos.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
3 A ESCOLA
A terceira parte do questionário foram perguntas referentes ao preconceito dentro do
ambiente escolar, se os alunos vivenciam ou presenciam este preconceito. E se eles têm interesse
em estudar mais sobre estes temas.
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Quando perguntados se eles já sofreram algum preconceito dentro da escola 51,5%
respondeu que não e 48,5% disse que sim, como podemos ver quase a metade dos entrevistados
diz já ter sido vítima de preconceito no ambiente escolar. Infelizmente muitas vezes a escola é uma
instituição que reproduz o preconceito existente fora dela.
Foi perguntado também se eles já presenciaram casos de preconceito contra as diferentes
minorias. Os resultados aparecem na tabela 1. Mais uma vez o preconceito aparece presente na
escola, principalmente contra bolivianos e homossexuais. Infelizmente a homofobia está muito
presente na escola, como afirma Junqueira (2009, p. 166):
Como observa Guacira Lopes Louro, a homofobia é consentida e ensinada nas escolas.Tratamentos preconceituosos, medidas discriminatórias, ofensas, constrangimentos, ameaças e agressões físicas ou verbais têm sido uma constante na vida escolar e profissional de jovens e adultos LGBT. Essas pessoas veem-se desde cedo às voltas com uma “pedagogia do insulto”, constituída de piadas, brincadeiras, jogos, apelidos, insinuações e expressões desqualificantes – poderosos mecanismos de silenciamento e de dominação simbólica. A escola configura-se, assim, como um espaço institucional de opressão, o que se deve, ainda, à participação ou à omissão dos sistemas de ensino, da comunidade, das famílias, da sociedade, das instituições e do Estado.
Em contrapartida devemos lutar pela construção de uma escola democrática e tolerante,
como afirma Diniz e Lionço ( 2009, p. 9):
A discriminação é uma prática social que marca o cotidiano das escolas. Opera a
desqualificação do outro, podendo acarretar graves danos pessoais e sociais. Entende-se a prática discriminatória como a valoração das diferenças de modo a promover desigualdades ou prejuízos para as partes desqualificadas. A educação é uma ferramenta política emancipatória, que deve superar processos discriminatórios socialmente instaurados, a fim de transformar a realidade pela reafirmação da ética democrática. Nesse sentido, a escola é um espaço de socialização para a diversidade.
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Tabela 1. Preconceito na escola
Já viu algum aluno da escola ser
humilhado por ser: Sim Não
Mulher 16,2% 83,8%
Pobre 44,9% 55,1%
Negro 61,9% 38,1%
Boliviano 70% 30%
Homossexual 72% 28% Fonte: Tabela produzida pela própria autora (2016).
Com o intuito de descobrir se a escola está fazendo o seu papel na promoção do respeito às
diferenças e no combate ao preconceito os alunos foram questionados se na escola eram trabalhados
temas como: preconceito cultural, racial, de gênero, orientação sexual e desigualdade racial, 80.8%
responderam que ás vezes, 14.1% sempre e 5.1% nunca. E ainda foi perguntado se eles gostariam
que estes temas fossem mais trabalhados e 86.9% respondeu que sim e 13.1% que não. O que
podemos perceber é que a inserção destes temas na escola acaba ficando a critério de cada
professor, pois mesmo que existam recomendações que eles sejam trabalhados acaba que não são
obrigatórios e muitas vezes são deixados de lado, mas vemos que existe uma demanda por parte
dos alunos que sentem a necessidade desta inserção.
No gráfico 11 é mostrado qual o tema que os alunos mais gostaria que fosse trabalhado e
em primeiro lugar aparece a desigualdade social seguido de orientação sexual. Nota-se que este
resultado vai justamente ao encontro a proposta da Especialização Educação, Pobreza e
Desigualdade Social que defende que o tema pobreza seja inserido no currículo escolar, e se rompa
com uma visão moralista que traz consequências para a escolarização dos pobres.
Enquanto a pobreza for pensada como uma questão moral, os currículos para os(as) pobres continuarão sendo pensados para moralizá-los(as), não para garantir o direito deles(as) ao conhecimento, às ciências e às tecnologias. Serão currículos pobres de conhecimentos e repletos de bons conselhos morais de esforço, trabalho, dedicação e disciplina. (Brasil, 2014)
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Gráfico 11. Qual destes temas você gostaria de estudar mais.
Fonte: Gráfico produzido pela própria autora (2016).
4 CONCLUSÃO
O interesse em pesquisar o senso comum na fala de adolescentes surgiu tendo como
primeiro objetivo entender as recentes ondas de ódio, disseminadas pelas redes sociais, contra as
minorias e a desqualificação de qualquer grupo que defenda o respeito às mesmas. Basta navegar
alguns minutos pelo Facebook e podemos nos deparar com posts desrespeitosos contra as mulheres,
os homossexuais, negros, pobres e etc. E os grupos ou pessoas que se posicionam contra estas
atitudes são taxados de vitimistas, radicais, defensores de uma causa que não existe e por aí vai.
Vivemos um momento em que defender direitos iguais para todos se tornou uma pauta
considerada de esquerda e que defender os direitos humanos o torna defensor de bandidos. Por
mais que as condições de desigualdade que vivenciam as minorias estejam estampadas nos
noticiários em casos principalmente de violências que produzem vítimas fatais, como o assassinato
de mulheres, negros e homossexuais, as pessoas preferem reproduzir um discurso superficial de
que vivemos em plena igualdade e que todos temos as mesmas oportunidades basta apenas se
esforçar, a chamada meritocracia.
Motivada por estas questões resolvi levar este tema até a escola e descobrir se estes
discursos reproduzidos pela sociedade tinham adeptos também dentro do ambiente escolar, entre
os alunos. E se a escola era um ambiente de reprodução ou combate do senso comum contra as
minorias sociais.
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O primeiro objetivo era descobrir os meios de informação mais utilizados pelos jovens e
como isto poderia contribuir na disseminação do senso comum. Podemos notar que os estudantes
ficam restritos á poucas opções e á canais e sites mais populares que geralmente não tratam de
forma aprofundada e embasada os assuntos relacionados aos problemas sociais e ainda pior muitas
vezes reproduzem na sua programação estereótipos e preconceitos sobre as minorias, ao restringir
aos negros papéis secundários em novelas e filmes, ao objetificar a mulher e impor um padrão de
beleza a todas, ao criar personagens homossexuais estereotipados e etc.
Sendo a internet e a televisão grandes veículos de informação, a última considerada até por
alguns o quarto poder no país, obviamente que ela têm grande influência na formação dos mais
jovens e se a sua programação transmite uma visão pouco crítica sobre a sociedade muito serão
influenciados e reproduzirão isto nos ambientes em que vivem, inclusive na escola.
Através da análise dos questionários aplicados podemos perceber que o preconceito está
presente na fala dos adolescentes, mesmo que estes não admitam ou não enxerguem, já que quando
questionados se consideravam preconceituosos 99% respondeu que não, apenas 1 estudante
respondeu que sim, porém as respostas não condizem com este dado. Este número pode se aplicar
a realidade brasileira, o preconceito é um tema difícil de ser tratado no Brasil, pois grande parte
dos brasileiros só enxergam o preconceito quando praticado pelo outro.
Ainda que a maioria dos entrevistados tenha apresentado uma opinião contrária a grande
parte das frases preconceituosas do questionário, o preconceito está presente entre os estudantes.
Na questão racial em média 20% demonstrou um grau de concordância com as frases
preconceituosas, na questão de gênero chegou a quase 40%, na questão da homossexualidade
chegou a 42%, em uma das questões sobre a pobreza o grau de concordância com a frase chegou a
quase 80% e uma das questões que tratavam sobre os bolivianos a concordância com a frase
preconceituosa chegou a 70%.
Vemos que a sociedade está avançando em relação a alguns temas, como a questão racial e
de gênero que geralmente são temas mais discutidos na escola que ao longo dos anos vem sendo
mais trabalhado e gerando bons resultados mesmo que a passos curtos. A homossexualidade ainda
é um tabu na nossa sociedade e em relação a Escola Estadual Dom Bosco, que por ser uma escola
confessional católica, o tema não é devidamente discutido o que pode contribuir para a
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porcentagem de alunos que não aceitam a homossexualidade. Mas os dados que mais chamam
atenção é em relação à pobreza e aos bolivianos.
O preconceito em relação aos bolivianos não é uma característica da E.E. Dom Bosco, mas
sim da cidade de Corumbá e por mais que os estudantes convivam diariamente com os bolivianos
que estudam na escola o preconceito aparece presente nas suas falas, o que certamente é uma
reprodução daquilo que ouvem foram da escola, é um tema que merece uma atenção maior por
parte da gestão escolar e dos professores.
A questão da pobreza já era de se esperar que grande parte dos alunos concordassem com
o discurso hegemônico, que culpabiliza unicamente o indivíduo pela sua condição social, já que
este discurso é amplamente reproduzido pela grande mídia e tem muitos adeptos na sociedade.
Como foi amplamente discutido durante a Especialização Educação, Pobreza e Desigualdade
Social é necessário levar este tema para dentro da escola e aprofundar os estudos sobre as causas
da pobreza na nossa sociedade.
Infelizmente o preconceito não está presente apenas nos discursos dos estudantes, quase
50% disseram ter sofrido preconceito na escola e também já o presenciaram, principalmente contra
os homossexuais e os bolivianos. São vítimas que muitas vezes ficam em silêncio que sofrem
durante todo o período escolar.
Um dado animador é que 86,9% dos estudantes tem interesse em estudar mais sobre os
temas mencionados no questionário, o que vai contra as propostas do atual governo federal para a
educação, uma delas a Reforma do Ensino Médio que defende retirar do currículo obrigatório as
disciplinas Sociologia e Filosofia, que são justamente as que mais discutem estes temas, sem falar
no Projeto de Lei Escola Sem Partido que proíbe que determinados temas sejam discutidos, como
gênero e homossexualidade.
E indo ao encontro de tudo que foi discutido durante a especialização o tema que a maioria
dos alunos 41,4% gostaria de estudar mais é a desigualdade social. Interessante que os próprios
alunos enxerguem a necessidade da inserção deste tema na escola, que muitas vezes é tratado de
forma superficial, o que gera uma população sem consciência de classe e que entende que os
programas sociais são assistencialismo do Estado e não uma obrigação de oferecer condições iguais
para todos.
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Todos os dados colhidos na pesquisa serão levados para a gestão escolar com o objetivo de
que a instituição tenha conhecimento do preconceito presente na escola e como ela pode trabalhar
para combater esta problemática. Claro que a escola não é uma instituição isolada da sociedade e
por isso existe a necessidade de que ela trabalhe com as outras instituições, mas é de grande
importância que a escola combata todas as formas de preconceito e contribua na formação de uma
sociedade mais justa e menos intolerante.
No entanto, não há como escapar do fato de que numa sociedade plural, que se queira manter assim, o intolerante não poderá estufar o peito e defender o ataque ao diferente como um direito seu. Para ficar ainda mais claro. A sociedade, se quer ser respeitosa da diferença, não pode admitir que o homofóbico brade: - Odeio gays e por isso os espanco; não será possível fechar os olhos a velhos ditados, em briga de marido e mulher não se mete a colher, e permitir que mulheres sejam cotidianamente mortas ou espancadas em nome da honra do machista; não poderá conviver com declarações racistas: - Negros fedem como macacos. A tolerância tem imites e o mais claro deles é o ódio à diversidade alheia, a intolerância”. (Andrade, 2009, p. 23)
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Trabalho de Conclusão de Curso
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