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8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
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A entrevista de
tipo
qualitativo: considerações
epistemológicas teóricas e metodológicas·
•
tlparl
No que é considerado como um dos primeiros manuais de metodologia associa
dos aos trabalhosda Escola de Chicago, Palmer (1928) defende
que
a possibili
dade de interrogar o alOrese utihzá-Ios enquanto recursoEra a compreensão ã
l
rea.
a es socia;sconstitui uma das grandes vantãgens das i ~ n i s oclais
glbre
ãSci iiêiãSQâ natureza, as se interessam por objetos desprovidosde palavra.
Abordan o a questão da relação entreconhecimento leigo e conhecim nto ci ntl
fico, Bourdi u, Chambor don Pass ron (1968: 56) ddend m o contn1rio
isto
a
despdtõ
d todas a;-;;o-m:rovérsias qu U I ; ; - l ~ m a Ç ã o possa levantar -
que
t
talvez, a maldição das citncias
do
homem, a de ter relação
COm
um
obJelo que
I fula ;-pól ;J enrao,orisco égrana . e v r a ciência cõnfundiras interpretações qu os
tor 5 dão da reaLidade com a realidade tal e qual.
Esses comentários
sobre
a entrevista sobre o 5tatUlo do material coletado
ilustram bem toda a ambiguidade ligada ao uso de
um
dos instrumentos de pes
quisa tido como um dos mais freqüentem nte em reEados nas c i ~ n c i . ociais.
D um lado, as entrevistas constituem uma
porLa
de acesso às realidades sociais,
apostando na capacidadede
entrar
em relação com asOutras, Do OUtrO, essas rea
lidades sociais não se deixam facilmente apreender, sendo transmitidas atravês
do
jogoe das ucstO s das int raçOessociais que a
rdação
de entrevista necessa
riamente implIca, assim com
do
jogocompl xo das muluplas IOt rpretaçOes
produzidas pelos discursos. -
Longe d 5gotaro conjunto dasren«xôes conc m ntesao uso das ntrt\'IStas,
5t anigo tratará d três temasrdativamente ao estatutOda wtrevisLa, t masestes
não sem rdação com o aspectos acima mencionados. Prim irament , examinare.
os argumentos de ordem epist molôgica e ético-politica, alegados, comumente,
l 'parajustifica .o recmso à entreViSlll de upo qualllativo,já que, para além da ques
tões de método, o emprego deste in trum nto acarreta diferentes conc pçôes da
Gostam de
agradecer a
meus
colaborDdores
p squis
lRnis Btliveau MyltncJaccoud c
i c h ~ l e
Lalonde: e
tambtOl
aJocelync Dorion revisora porsua
ajuda
revisão fmal
desle
l l
5
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clencia e da pesquisa; paradepois, então, deter-me nos argumentos de ordem m. :..
todológica. Abordarei de passagem algumas controvérsiassuscitadas por essesar
gumentos. Num scgundo momenLO exporei um certo número de principiO que
o, em geral, tidos
como
adquiridos e correntemente associados à
arte'
de fazer
05 outros
falarem e de realizar uma entrevista.
Ai r e s i d i r ~
a
op nunidadede
abor
daras diversasestratég13se o diversoselemenlo de encenaçào',ao quais recor
rem os entrevistadores, com o objellvo, denlre OUlros, de levar os entrevistados a
colaborar, e a sentirem-se confiantes e à vontade na situaçãn
de
entrevisla. E, por
fun, tratarei da unponãncia da questãO
dos
vieses nos debates sobre as entrevisL.'s,
demodo a
apomar
como algumas lradições metodológicas e epistemológicas ten
taram resolve-la, ou, ainda, formulá-Ia diferentemente. Esta seçã p mlitirá abor
dar sumariamente um relativo numero e dimensões fundamen ais
lais omo a
de erminá
ªº
do conlexto na produção
d o d ' CUTSO,-O p a ~ e l
da subjetividade do
pesquisador no processo
de
pesquisae a
inauéncia
dos processos
de
transcrição na
produçãO
d_os
relatos elnográftcos.
o argumemos dc ordem epistemológica, elicG-politica e metodológica como
base
do
recurso à entrevista de tipo qualitativo
00
exame das justificativas habltualmeme alegadas pelos pesquisadores para
recorrer à entrevista de tipo quahtativo, trés tipos de argumentos se destacam. O
primeiro é de ordem epistemológica. a enlrevista
de
tipoqualitativo seria necessá
rLa, uma vez que
uma
'Ploração
em
r 9 r u d i d a ~ a
perspectiva dos a t o ~ e s so
ciais é considerada indispensável para uma exata apreensão e compreensao as
condutas
sociais. O segundo tipo de argumenLo ê deordem etica e olft ica: a enlre
vista de tipo qualitativo parece necessária, porque ela abriria a possibilidade de
t compreender e conhecer imemameme os dilemas e queslões enfrentados elos
á i o r e ~ s o c I D s ~
Destacam-se,
por
fim os argumentosmetodológicos: a entrevista de
tipo qualitativo se imporia entre as ferramentas de
informação'
capazes de elu
cidar as realidades sociais, mas,
pnncipalmente,
como instrumemo privilegiado
de ac Oà expenê.ncia dos atares. Deve-se certamente observar
que
esses trés u
pos
de
argumentos c aplicam igualmente a
conjumo
do métodos qualitativos,e
abordá-los aqui me parece tndispensàvel para compreenderos multipio usos que
se pretende fazer das entreVlSlas
Aanalise d s realidades so i is segltlldo a perspectiva dos arares so i is
Voltemos primeiramente ao argumenLo
de
tipo epistemológico. O uso dos mé
todos qualilativos e da entrevista, em particular.
roi
e a inda ho je é tidocomo um
meio de darcoma d pomo de vista dos aLores sociais c de c o n s i d e r ~ l o para com
preender e interpretar as suas realidades. As condutas sociais não poderiam scr
compreendidas, nem explicadas, fora da perspectiva
do
aloressociais. A entrevis-
216
ta
ena,
a sim, indispensável, não somenle
como
método para apreendera expe
rién ia dos outros, mas, igualmeme,
como
insrrumemo
que
perrmle elucidar
suas
condutas, na medida em que estas só podem
ser
inlerpretadas, considerando-se a
própria perspectiva dos atares,
ou
seja, o sent ido que eles mesmo conferem às
suas
aç6es . abe-seo
quamo
esse argumemo foi rundamemal, na sociologia amen
cana, paraJusti ficaro recur o aos método quali tativos. Dentre o exemplos mais
frequememente citados, há, evidentememe, Thomas (J923), em razão da impor
tJlncia
que
ele
ambui à
consideração da maneira pela qual
os
aLOres
definem suasi
tuação. neve-se também mencionar Mead (1934) c Blu_mer (J
969)
e,em
sua
linha
gem, os inlo:' ,cionislas,
que
lambém insislem na necessiJadede explorar o sentido
que
os-ªtores dão
às
suas ações. Poder-se-ia, po r 11m, acresce ntar os elnorneLOdol;;
gistas, jã que eles buscam, no prolongamemo dos trabalhos de Garl1nkel (1967),
Jwreender .as Categorias do senso comum e explorar a maneIra
cama
os ~
constroem
sua realida< e, ao longo de suas
~ n l d a d e s
cotidIanas.
Essa posição epistemológica
encomra
Sua comrapartida no plano metodol gi
coo Para apreenderas realidadessegundo O
ponLO de VI
tados
atares
sociais, é pre
cISO amda um metod que o permi ta .E com base em tal argumemoque o sociólo
gos da Es o la Chicago, e, em sua continuidade, os inleracionislas justificamO
-recurso aos métodos qualitativos (POUPART,
1979-l980).
Assim, conforme o su
geriam Park
cC
BRESLAU, 1988) e Beckere eer (J957), mis turar-se às atiVlda
des cotidianasdos alores, com a ajuda da observaçãO participame. constitui Ome
UlOr mela de ercebersuas prállcas e interações, como também de lI1terrogá-los
durame a Por sua vez, Thomas preconizavaanalisar a correspondencia priva
da,as autobiografIas e os diários fmimos, insisllndo no
fa
de
que
estes maleriais
correm menos risco
de ser 'contaminados'
pelo pesquisador -
conduta
esta que,
segundo ele, pcrmite assim apreender diferemes dimensões, como as atitudes e os
valores. inalmeme, há uma opiniãO amplameme divulgada na maioria das tradi
ções sociolõgicas, segundo a qual o recurso
às
entrevistas, malgrado seus limites,
continuasendo
um dosmelhoresmeios para apreendero sentido
que
os
aLOres
dão
às suas c nthttas (oscomportamentos nào falam por s. mesmos), a maneira como
elesse representam o mundo e como eles vivem suasituação, com osa(Ores sendo
VIstOS
como
aqueles em melhor posiÇão para falar disso.
Esse
primeiro
lIpO
de Jusllficallva está na origem de diferemes mdagaçõcs
controvérsias, que não podemser abstraidas a pantr
do
mamemo em que sejulga
necessario realizar emrevistas e se pergunta seriamente 0... lue
se
busca e O que
J>
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1. Parol um exemplo, enrre outros, deste upo de
poslç O
ver rthelot (1990)
2. Para uma aprc:srntaçto das posições eplStemolglcos positivista, p ó s p o s i t i ~ ; s t . a . conslJUtivisla e
q couta, v rro
exceltOu:
arugo
de Guba
e Uncoln
(1994).
Como Alvaro Pires me razIa observar. aspa·
SIÇÕG
eplslemológlcas,
pnncipalmentea p ó s ~ l U v i s ~ ea
conslruUV\Sla,
nao são ~ m p r c : : Lio radi·
ol1rnC:Qc distintaS.
na
prática. como se aprOOta abirualmenle:-
mdc),
assUD 05 pesquisadores,
rrequentc.menlC:,de unu perspectiva à ourra.
I (
r r
fenomenologia, tem razão em defender que as condutas sociais não são somente
condicionadas pelo exterior por uma série de determinantes sociais, e que é preci
so necessariamente interpretã-Ias à luz da perspectiva dos atares,justificando, as
sim, o recurso aos métodos qualitativos?
Isso
nos leva aodebate tradidonal entreas erspectivas subjetivistas e objetivis
tas nas citncias sociais; debate travado diferentemente, segundo as tradições teóri
cas,ainda que uma tendtncia fone, ao longo das últimas décadas, tenha sido, cena
mente, a de dizer que seria preciso unir essas perspectivas, o que impedIria de criar
falsas dicOlomias . Por outro lado, é importante notar que as posições nâo são, tal-
vez tão categóricas como se o pretende. Assim, censuraram-se, por vezes,05 intera
cionist3S de não
se
mteressarem senão em evidenciar a perspectiva dos en
quanto, na realidade, eles também insistem na importância do papel do contexto so
cial- por exernplo, uma instituição ou os grupos de penencimento- na construção
dosenudo e na formação das trajetórias sociais. EassIm que, emsuas pesquisasres
pectivas sobre a carreIra moral do doente mental e sobre os fumantes de maconha,
Goffrnan (1961) e Becker J963) tentaramdescrevera maneira
Como
as cxperitn
cias soclllis são marcadas, simultaneamente, pelas interpretações que os atares dão
sobre elas e pelas coerções que Omeio lhes impõe. Em contrapartida, reprovou-se
Bourdieu poradatar um modelo de análisemuito focadosobre os determinantes so-
dais, não levando suficientemente em conta a perspectiva dos atares, enquanto ele
lenta, de fato, reconciliar as abordagens objetivista e subjelivista, por meio de sua
noção de
habit
(ver, emre outros, BOURDIEU, 1992).
OUlra controvérsia de natureza epistemológica que despena o inleresse pela
perspectiva dos atores: ual reconhecimento atribuirao saber leigo, em relaçãO ao
saber cienlfl1co? Trata-se ai de uma questãO que surgiu desde queseco etam-de
poimentos, pois, por meio destes, os atores fornecem segurameme interpretações
de sua experiência e do universo que os cerca. Além de suas próprias interpreta
ções, o pesquisadorse encontra, portanto, diante não de uma, mas de váriasinter
pretações de uma mesma realidade, j á q ue cada pessoa
ou
grupo é capaz de dar
uma interpretação diferentesobre ela. Qual crédito, então, atribuir a essasdifgen
tes versões da realidade, e em virtude dequaIS cmérios ou de quais principias as
versões dilas cientificas, ou algumas delas, deveriam sobrepor-se às outras?
A esse respeito, ao menos tres posições distintas se destacam, posições estas
que eu
me
contento em apresentaraqui, sumariamente . Uma primeirase inscreve
na corrente do pós-p sit ivismo, e a obra de Bourdieu, Chamboredon e Passeron -
e nt ude so iologlle (1968) me parece ser uma boa expressão, Para es es auLO
res, as i n t e r p r ~ ç ~ e s que osatares sociais dã desua própria realidade não devem
ser conIunClidascom a realidade tal qual ela t , O fato deque osatares sejam dire
tamente implicados nessas realidades não é, em si, uma garantia da e.xatidão de
suas interpretações. Bem ao contráno, isso pode obstaculizar os verdadeiros deter
minantes de suas condut3S. Nesse sentido, O conhecimento cientifico é uperior àS
explicações originárias dos atar pelo
falO
de queatnda que ele mesmo continue
sendo uma construção da realidade,ele é, todavia, o resultadode um esforçosiste
mático da
pane
do pesquisador para romper com o pressupostos do senso co
mum ec m aqueles da citncia estabelecida, e também para elaborar interpreta
ções
que
se baseiam
em
construções te ncassubmetidas nãoapenas
à
critica, mas
igualmente ã prova da veriftcação emp,rica. No mesmo veio, algumas terpreta
ções cientlficassãomaiS plausfveisou,em todo caso, men s
falsas
do que
OUtras
por estarem mais em desacordo Com as explicações onginárias,e serem mais con
sistentes teoricamente falando, e mais fundamentadas empiricamente
Contrariamenle a essa posiÇão, citemos os argumemos apresentados por al-
guns p ó s e s t r u t u r a l i s ~ como Clough (1992). Definindo-se como
fClIllnlSta
ela
defende que
interpretações da realidade elaboradas tanto pelos atares oeiais
como pelos dentistas,são relatos, histórias que apresentam ver óes diferentes da
r ~ a l i d a d e Para a autora, eslas histórias, quese pretendem descrições realistaS da rea
l idade, nã são ,de fato, senão projeçõesdesta realidade, se m verdadeira relação
com ela. O desejo de uns e de outros de apresentar a realidade sob a forma de um
retrato realista responde a necessidades de ordem psfquica . Para lough,as di
ferenças, em termos da credibilidade, entre a versão dada pelos iel1lislaS sobre o
mundo das pessoas pesquisadas e a versão destas últimas, e entre o fato de queas
interpretações dos primeiros tf m mais chance de se impor incontestavelmente do
que as dos segundos, devem-se mais posiÇão social privilegiada dos cientistas
do que
à
superioridade de seu saber,
1
Uma terceira posiçãO,similar ao pós-modernismo, defende que os pesqUIsado
res deveriam, em seus relatórios etnográficos, não só tratar as pessoas omosuj -
3. Para uempl05de cnuca em r e l a ~ o aopontode vista póS-posiuvista. ver Oartigo de Finger (1989)
ea excelente introduçâo de Dumont e Gagnon 9n . ao mimero tb revisca Rcchtrchts sociographl-
qUt dedicado ao vivido. 1nce.rrogando--se sobre os crittnos cU supenoridade do conhecimentoelen·
lífico em
relaç:1o ao
conheomcnlo ordmário. e emicando correntessociológicas que explicam o
sodal rom da cx.pcrifnc13 dosatares, Dumom (Gagnon
insIstem
na I m p o r ~ n C 3
de tnSUluir
uma O
t1ologla queseja capaz ao lIl
E te
ponto de
V\S
St: une terceira
po5lçtO,
apresemada nos PTÓX IDOS pan1graJos.
ss
posiç:lopro oca vivas comrovérstaS, p;articUtarmenle:no intcnor da corrente
remmiSta. Ver,
so
bretudo. Odeb.llc corre Oougb (1993) e.Smith (1993), no qual Oough crilica a aboTcl3gem do
scand-
pomt de Smuh. VlS3Jldo R:produzir a expcriblcia dosatores,no caso, aexpcritllcla das mulh(res, privi·
tegiando
seu pomode visa Por
sua
vu mnh
censura
loughde negarqualquerreiaçAo entre
dlSCUr
50 c TC licbde e de: não conceber OUlr l
realidade
do que a
própria
realtdade dos discursos
218
2 9
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tos capazes de analisar sua própria situação, mas igualmente produziranálises de
'múltiplas vozes ; isto é, análisescm que o ponto de vista dos diferentesataresque
participam da pesquisa se encontre expresso. Em lugar de dar urna versão única
sobre a realidadedos oUlros buscando se impor,as análises deveriam ser o resulta
do de uma construção mútua, Oproduto
, m
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pações espec[fi as de determinados
gmpos,
assim como das discriminações de
toda ordem das quais eles são vítimas,suscitam, evidentemente, cliversas questóes.
Limito-me, aqui,a enfatizaralgumas delas. Assim, além da questãOabordada, mais
acima, de saberse a empatia, e mesmo o envolvimento, em relaçãoaos grupos pes
quisados, favorece, ou, ao contrário, impede a objetivação de suas condições de
existCncia, pode. e pergumar o que acontece
quando
o pesquisador abraça uma
opimão dJferente daquela das pessoas o u d e determinados gmpos envolvidos no
processo de pesquisa. Para resolver essa clificuldade, basta apresentar todos os
pomos
de vista contrários, com o objetivo
de
relativizar mais o
pomo
de vista de
cada um, incluindo o do pesquisador? Deve-se, além disso, limitar as pesquisas aos
grupos pelo qua is nutre-se
um
minimo
de
simpatia
oude
empatia? A questão é
pertinente, sobre tud porque alguns avaliam que ao se pretender denunciar as si
tuações deopressão e de d criminação
seria
preferfve.l
tomar
c moobj et ode estu
do os grapos no poder, consIderados responsãveis por essas situaçóes.
As
con
vicções do pesquisad r influem, portanto, em suas atitudes em re.lação aos grupos
pesquisados, o que, diga-se, renete na maneira como s:lo produzidos os dados.
Uma erramenw de i ifonnaçd sobre as entidades sociais e um instrumento
privilegi o
de exploraçãO
do vivido
dos OlOres
sociais
Além das ju tlficativas de ordem epistemológica e ético-politica, dois argumen
tos
de
ordem metodológica são, geralmente, alegados para legitimar a entrevista de
tipo qualitativo, podendoser invocados, simulUlneamente, em uma mesma pesqui
sa. O primeiro, válidoigualmemepara a entre.vis18 estruturada, é o de quea entrevis
ta
de
tipo qualitativoconstituiria um meioeficazpara, apesar de todaa ambigüidade
- da expressão, coletar informações sobre as estruturas e o funcionamento de urp
grupo, uma instituição, ou, mais globalmente, uma formação social determinada .
Na falta ele outras fontes de dados. tais como a análise documental e a observação di
reta, ou ainda, paralelameme a elas, o entrevistado é visto como um informan
te-chave, capaz precisamente de i n ~ r não sósobre as suas próprias práticas e
as
suas
próprias maneiras de pensar, mas também- na medida
em que
eleé conside
rado como representativo de seu grupoou de uma fração dele-sobre os c ivel5Os
e,2 lponentes de sua SOCiedade e sobreseus diferentes meios
de ~ t e n c i m e n t o
Nes-
a
última acepção, Oinfonnanle é tido
como uma
testemunha privilegiada, um oh-
servador, de .cena forma, de sua sociedade, c?m base em q t l ~ um Outro observa
dor, o pesqUIsador, pode tentar ver e reconsOlU a reabdade .
11. Para rdluOes acerca dos nfveis de re:.tlidade
possfveis,
ou rn Ia de apreender pelasentrevistas
DO
eontexto das histórias de vida, ver Gngnon eJean (I 975), Bemux
(I986)
e Peneff(1990).
12.
Pára
uma
apresentação
em lrngun francesa da noção de
informanle-chave,
ve r
artlgo
c1ãssICO de
Tremblay
(1968).
Paro
wna análise
das
dificuldadesque:l questão
d 5 i n ~ rmanles
propOe,
ve.r
Rabl
now
(1977).
222
Presente lama na antropologia
quanto
na sociologia, essa concepção positivis
ta do entrevistado, considerado como um informante-chave permitindo descrever
o
quese
passa em
uma
sociedade, está longe de ter
unanimidade entre
as diversas
tradições teóricas e epistemol gicas. Certamente, reconhece-se, amiúde, que os
entrevistados são os
melhor
colocados para falar s
bre
o
que pensam, sentem,
e,
em cena meclida, fazem;
em
suma, para descrever sua experiência. Porém, não há
concordandasobre o créclitoa s dado ao
I n f o r m a n t e ; i s t ~ ~ s o º r e
a p o s s j b J f i ~ -
de que ele possaTornecer informações confiáveis, ou informações,
simplesmeme
J
sobre o
fundonamento
passado
ou presente
de
um grupo,
de
uma
orgartiza
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dos trab,l1hos
de
Palmer (1928) e
de
Roethlisberger e Dickson (1943 ). Eu me
~ l - L e n L . r r e . i , aqui, em sintetizá-los, LOmando como
ponlo
de refere.ncia a entrevista
não-dirigida, esta forma
de
entreV1Sta na qual o entrevistador, depois
de
ter dado
uma
instntç.l0 inicial, visando nortear o entrevistado sopre o tema da
p e s s t J ~ J ,
con[ere-IheOmáximo de liberdadeno que diz respeito
à
maneira de tratarO
s s u ~
to, e tenta orientar seus relances sobre as dimensõesabordadas pelo interlocutor
(MICHElJIT, 1975; GHIGLlONE&: MATALON,1978). Mesmo
MO
sendo a mais
utilizada, a entrevista não-dirigida me parece a que melhor ilustra os principias
subjacenles
às
entrevislas
de
tipo qualitativo.
egundo a opinião do pesquisadores no qualitativo - opiniões compartilha
das, cm certa medida, pelos partidários da entrevista estruturada -, a entrevista
não-dirigida apresenta inicialmente a vantagem de se basear e q u m e n ~
realidade
do
entrevistado. Gozando de
um
máximo de liberdade para se expressar
sobreo ou os temas da pesquisa, ele é mais capaz de fazê-lo segundosuaspróprias
categorias e sua própria linguagem. Esta primeira vantagem é, em geral, alegada
por oposição ao questionário e
à
entrevista estruturada, estratégias que compor
tam - e is
lO
mesmo quando o pesquisador
faz
uma investigaçãopreliminare testa
previamente seu instrumento - riscos de pré-estruturação
do
discurso, elevados
em razào da forma predeterminada das questões e das respostas.
Contudo, tendo em conta os próprios limites da não-diretividade , o pesqui
sador não elimina totalmente os riscos
de
pré-estruturação do discillso do
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perttnc:ia.do enlIevisrado, Efenvamente, além de trazer informações concernentes
às suas caraeterí ticas,com o sexo, a idade, o pertencimelllo émico ou de classe, e
de possibilitarindagarde maneira mais ou menos diretasobre sua traj tória
sodal
de modo a melhor compreender situar seu discurso , a entrevista não-dirigida
se prestaria a uma exploraçãO em profundidade.do contexto de vida e do meio de
penendmcnto
do entrevistado, resultando em um mmeria que permite mais ade
quadamente circunscreversua experiência e seu P de vista, bem como eviden
ciá-Ias, Ainda graças
à
sua nexibilidade,
O
método também permitiria ao entrevis
tado estabelecer as ligações que ele julga úteis enlIe os diversos elementos de sua
vida,
or
exemplo, em uma pe qui a sobre o desemprego, ele poderia se exprimir
sobre a maneira pela quaL esta condição transforma, ou não, assuas relações com o
trabalho, a familia e os amigos,
Enf1m,
as entre\'ÍStas de ripo qualitativo são vistas como mais apropriadas
à
pesquisa de determinados grupos ou objeLOs, AsSIm, para tomar dois exemplos
clássicos, nãose
vê
como,armado de questionário, Becker
l 9 6 3 ~
teria podido rea
lizarsatisfatoriamemeseu estudosobre osfumant de maconha, e Whyte (1943),
porsua vez,a pesquisa
tr t
Comer
o iety
Damesma forma, parecediflcil fazer a
análise dasaspiraçõesde carreira,como no caso de minha investigaçãosobreos jo
gadoresde to h y (Poupan, 1978),sem adotar Uma estratégia de entrevista de tipo
retrospectivo, permitindo retraçar no t
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No
c ntexLO das entrevistas, particularmente de tipo qualitativo, um detemli
nado nllmero de princlpios- que são,em geral, tidos como adquiridos, no entido
elnomeLodoiógi Odo termo - são,de
faLO,
omument alegados,com o objetivo de
fazer com que o entrevIstado possa verdadeiramenLe dar conta desua visão ou de
sua experiência: obter a melhor colaboração do entrevistado; colocá-lo Omais
à
vonLade posslvel na situação de entTevista; ganhar sua confiança e, enfim, fazer
com queele fale espontaneameme e aceIte se envolver. Aaplicação desses pnncl-
pi s, que tentam, ao menos
em
parte, reproduzir a condições d uma relação de
familiandade e de cumplicidade emre as pessoas, evidenLemenLe só ocorre porque
a relação de entrevista põe em cantata pessoas que habITualmenLe não se conhe
cem e que nem sempre lem muitas coisas em comum. AI m dISSO, essa relação
pressupõe um contexLo de inLerações com o qual a mai ria dos entreVlSLados esLá
pouco familiarizada, sem contar que essas tnLerações se desenvolvem, em geral,
em
um
lapso de tempo relativamente curto.
Obter a colaboraçdo
enLrevislado
Um
primeiro pnncipio, tido como fundamenlal
na
arte de bem fazer falar 05
outros, refere-sc ã Importância de obLer a olaboração do. enlrevistado. Para que a
entrevista seja válida, entendida no sentido de produção de
um
discurso quesejao
maisverdadeiro e o mais aprofundado possível, considera-secssencial que o entre
vistado aceiteverdadeiramente cooperar, jogar oJogo, não apenas consentindo na
emrevÍSta, mas também dizendo o que pensa, no decorrer da mesma.
Em Leoria,
Oreferido princIpio parece evidente. Na prática, conludo, obter a
cooperação do entrevistado não é coisa simples. Primeiramel1le, como fazer com
que ele aceite ser indagado e, particularmenle, como vencer as mllltiplas re istên
ciasque ele poderia manifestar- tais como a falta de tempo e de imeresse, o semi
menta deservirde cobaia, o temor dever invadida a sua intimidade,de não
altura, ou de sofTerconsequéncias negativas por causa da entrevista e
que
pode
nam
tradUZir-se numa recusa ou
numa
d nCla? DepoIS, mesmo que Oentre
vi
tado consinta na entrC\'ista, comosaber se ele quer verdadeiramente colaborar?
Quais o, além
dISSO,
as razões queo I vama aceitar? be-se
que
os entrevistados
podem se ubmeter asentrevistas pormotivos que,
à
primeira vista, too pouco ou
ãsvezes mesmo nada a ver com o tema da pesquisa, lalS como a polidez,a vontade
de prestarserviço, o medo de represãlias, a esperançade retirar delas um beneucio
qualquer (por exemplo, uma vantagem monetária ou profissional),ou ainda o de
sejo de fazer como os OUtrOS, ou de simplesmente passar o tempo. Essas diversas
consIderações capazes de motivar a aCeltaç Ode uma entrevista não mvalidam
em
I OconLeúdo
do
di curso que o entrevistado estabelecerá. Ao contrário, elas são
importantes para esclareCê-lo. Por exemplo, para um detemo o fato de con.se ltir
228
numa entrevi ta paraO upar Otempo, ou para enContrarpessoasde fora da prisão,
diz muito sobre as condições de ua detenção .
colaboraÇão dos entrevistados, tida como necessária, requer, evidentemen
te, v á r ~ iaçõ.e5. que podem
OCOrrer
Lanto anLes quanto durante a entrevis
ta CU INGHAM-BURLEY,
1985) enamente, a colabornçao dos entrevista.
dos nunca é definll1vamente adquLrida, e eles podem manifestar suas reticencias por
meto de diferentes sinais de impacifucia, Lais
Como
consultar seus relõglos, ou per
guntar aoemrevistadorse ainda restam
muiLos
outros pomosa abordar
Essas
nego
ciações imphcam também uma quesLão de estatuto, pois OS entreVIStados, c mo os
entrevistadores, podem estar emsltuaçao de poder, uns em relaÇ ão aos outros.
Para levar as pessoas solicitadas a colaborar na pesquisa, o entreVIstadores re
correm a várias e5IT3Iegias A mais comum onsisl em tentar num pnmeiro mo-
mento, convencê-Ias do interesse e da mihdade da investigação, defendendo, por
exemplo,
que
esta permitirá fazer avançar 05 conhecimentos, fazer valer uma cau-
, ou atnda, expressar
05
seus pontos de vist. ' sobre o lema da
pesqUIS3.
Uma vez
qu os interessese os enfoques do entrevistados e dos entrevi tadores raramente
são Identicos, pode-se bem imagmarque essa estratégia nem sempreé suficiente.05
enlrevistad res apostam, portanlO, em utros recursos ,que,sendo totalmente ex
teriores a naLUreza mesma da pesquisa, podem revelar-se determinantes para garan
tira cooperaçao dosentrevistados. Éeste o caso, sobretudoquando
fazem
inter
vir a redesocial e seapóiamsobreos laços de reCIprocidade. tais como asconsidera
ções de arn4i de, famillares u p ~ o f i s s i o n i s para o recrutamemo de d te.nninados
entrevistados. Na falla de tais laços de reCiprocidade, alguns entrevistadores
tenLam
criá-los, fazendo-se aceitar no
mei
pesquisado, ou estabelecendo relações de amiza
de com membros da comunidade, como no caso das pesquisas classica deWhyte
(1943) e de Uebow (1967).
Se
as condições não o permitem, como quando há so
mente um únko
enconlro
om o entrevistado os enLrevisl3 dores
lentarão
estabe-
lecer lai laços,durante a entrevista, através de atitudes comoa escuta e a empatia.
Porfim, nãoé raro queos entrevistadoresapelem para a aULOndade de um terceiro,
para levar os eventuais entrevistados a partlClparem da entreVISta, por exemplo,
apoiando-se em untaorganizaçao para lllVestigar eus membros, ou tirando provei
da credIbilidade de uma p oa, para solicitar a de uma outra.
EV1denlemente,essasvárias trat gias uscitam, no plano élico, um conjunto
dequestões, principalmente noque diz respeito às abordagens que podem seracei
távelS para solicilar a colaboraÇãO dos entrevistados e para a existência de uma re
ciprocidade alllêntica entre o entrevisLadores e os entrevistados Por outro lado,
se o principIO da colaboraçao parecese mlpor para que o entrevislado possa dIZer
verdadeiramente o que pensa, ele levanta, na pratica, várias mdagaçõesem termo
do valor dosdados.
~ n m e i r o
lugar,comosaberse o entrevistado co pcra real-
9
Estl
úllima observação se baseia em um come:nuno df: Mlchi:lc: LaJonde
22 3
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
9/19
mente? Esta colaboração é, em geral, Lida
como
adquirida, pelosLmples fato de que
os entrevi tados aceilam falar. Além disso, salvo as recusas direLas, os entreviSLa
dores
são nisso frequenLemenLe reduzid 5,
como
nas
conversas comuns.
a se re
meLer a alguns indicias, tais como as
amude <
dos entrevistados,
durante
a entre
VlSLa; inriJcios
esLes
por
OU TO
lado, diIlceis de perceber e que, em geral,
permane
cem implícilos. A seguir, qual é o grau de colaboração julgado suficiente para que
o ~ d a d o s
coJetaclos sejam considerados
coJllO..Yáh
los? e as recusas
em
responder
a algumas questões, ou as reticências em colaborar, da pane dos entTe\'ÍStadOs,são
em
S
reveladoras , e se, a lém
do
mais,
os
entrevisladores espt'-ram, geralmenle,
ompensara falta de coopt'-ração de uns, poruma maIOr cooperação de outros, não
menOs verdadeque o nivel de colaboração do entrevistadonão é simples deavali-
ar e coloca mais globalmente a
queslào
da relaçãO que o
pesquisador
estabelece
com o grupo das pessoas pesquisada, e do efeito
que
i lO pode ler, ainda aquI, so
bre a
produção
dos dados.
o loc r o entrevistatlo d vonladepor elemcntos de encenaçdo
m egundo
pnncipio
consId erado LDd Spensável à fala do entrevistado se re
fere à c o m ~ c ç ã o de que elesó chegará de falo a se
expres
ar
bem,
se eleesliverver
dadeiramente vontade na situação de entreviSla. Sendo esta uma situaçáo
um
lantO arúfic13I,Cõnsi era-se
que
o pesquisa
or
eve
tentar reconfortar
seu
LDlerlo-
ulor, panindo, ainda aqUi, da tdéia de que quanlo mais ele ficar
à
vonlade, mais
ele falará com facilidade e abordará queslões que lhe são igTIlficalivas.
Para chegar a
15S0,
os entrevistadores farão intervir,
de
modo mais
ou
menos
conscienle,o quese poderia
denominar,
s,egundoa fórmula de GofIman (1973),
elememos de encenação da entrevista. EfeLivameme, podem-sedesignar dessa for
ma as várias disposiçõesLOmadas pelos entrevistadores com o objelivo de fazer
com que os entrevi tados esqueçam tudo o
que,
no conrcxlo da entrevista, possa
obstaculizar a enunciação de seus discursos, ou, melhor ainda,
com
a intenção de
proporcIonar um ambiente favorável c nfidtncia. Cert.,mente, o sucesso e a mar
gem de manobra
do
enlreviStadores nessa encenação dependem d as i lu açôe s e
das pessoascnvolvldas. e
em
panicularda reação dos entrevistados, tanto é que ge
ralmente e acous lha aos entrevistadores para que façam o
máxtmo
paracriar
um
amb,ente e
um
conteXlO favorávC1S à entreVI ta
Entr e es v ário el ementos de encenação figura, primeIramente, ~ o l do
momenlO mais propIcio à entrevisla.de
modo
que Oentrevistado. ei entrevislador
se
sintam
verdadeiramente disponivei o primelfo
tenha lempo
uEiciente para
se expressar. Outro e lemento de rep res n ta ola: encontrar o lugar mais favorável
ao adequado desenvolvimento da enrrevista. ugere-se, assim,
quese
rea
lZe
a eD-
rr 20.
Ver
Pollak (1986) sob..-e. I m ~ t ã n c : . ~ o ulSlldor
de
se: t n d a ~
sobre as rellclncias
dos
c:ntre\-;st:tdos
em
f a I 3 r . ~ l d a ,
_sobre: o s e n r . i d ~ d ~ _ s e : _ .Ilndo
sobre:
determina questOes.
230
[revista na casa do entrevistado, em eu local
ele
trabalho, ou
em
espaços semipú
bllco , para desorientá-lo o menos passivei em relação aos seus hábnos de v ida . e
colOCá-Ia numa
snuação
de , ada, evitando, por exemplo:
r ~ e r
uma entrevista
com uma pessoa sindicalizada, nos
escnlónos
reservados ao patrões. Recomen
da-se, igualmente, escolher
um
local calmo,
em que
os riscos de
que
elementosex
ternos venham prejudIcar o
andamento
da enlrevista sejam menores.
Damesma forma, o entrevistad r seesforçaráem reduzir o efeilo possIvelmente
negativo
dos
i ns rr umen t d e r e ist ro se contentarácom que os entrevistados pos
sam, na medidado possrvel, esque er a sua presença. Se ele desejar utihzar o grava
dor, ele deverá, digamos, fazê-lo com o máximo de discrição, nexibihdade eficácia,
e segundo um ritual que não atrapalhe demasiadamente o desenvolvllnenlo
d:
en
trevista. Nos casos em que ele proceda tomando nolaS,loda uma rie de habilidades
serão
consideradas
necessánas para fazer
com
que este meio de regi Iro seja sufi
ctentemente
confiave e penurbe o menos posstvel a entrevista em
curso
Mas , os e lementos de
encenação
da enrrevista não se reslTingem apenas às
queslões C ~ e l ] l e n t e s ao mo=n o lugar Llé.D1icas de regiStro. Efellvamente.
aconselhar-se-á os entrevistadores a também levar em
cont; aspeclo ,como
o ves
l ~ á ~ Partindo da idéia de que mesmo os detalhes mais
anódmos
podem criar
uma dis tAncia e que IOda
reuni
o social compona suas convençôe., recomen
dar-se-á adolar uma
indumentária
adaptada
às
circunstâncias da entrevista, de
modo, por exemplo,a atenuar
as
diferençasd p siçãosocial ,sem, para tanto ,
che-
gar - : ~ u n á - l 3 ? - -
Por
fim, uma dunensão fundamental da encenação da entTevista
concerne
ao
que se considera S ~ l l i P ~ (l ' eo ent revislad r é obr igadoa desempenhar. Mes
mo sem sempre haver, como
já
o vimos,
concordância
sobre as atitudes que e le
deve
adotar durante
a entrevista, el deveria,
segundo
as r e g r . ~ e r a l m e n t e preco
n izadas , e sforça r- e colocar o ent revistado à
v O ~ l a d e
e
enCOrajá.:i o
a fular:,)an
do-lhe
prgyas e ane, de um máximo de
eSCUla
empalia e inleresse pelo que
este
último
diz.
.Ile
t a m b é l ~ l deveria evitar
intcrromper
o entrevistado, f.lZer julga
menl 5
sobre
aquilo
quulj:Jbe
revela, e, evidentemente, abster- e de
argumentar
com ele,
ou
de conteslá-lo Paraalém
dos
conselhos, inúmeras vezes,
rependos. no
que
se
refere o papel
que
deveria cumprir o entrevistador, ha também, como o oh-
21.A
ma
ri
dos
manuais
de
mtlodol t (ver, por exemplo.
LOFlAND.
1971) compara as vant. lgens
respecnvas da
uliltzaçio
do
gravador c
das
anotações
EI
larn.Jxm
dào
const.lhos sobrt amanelna
de
explorar
bem ess s ItoUcas
em nos
delttmo
questões, observemos, contudo, que,
cada l
maIS, n:c mmda·se o tmprego do \oideo. que pcrmmria dar mdhor
nla
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
10/19
serva Si verman 1973), várias expeclauvas tmpltcitas quanto ã maneua pela qual
deve
se
desenrolar a entrevista, e
à
uLilizaÇãO que poderá er
felLa
do que nela for
dilO. Assim, a maioria das pessoas entrevistadas supõe que seja o entrevistador
quem propõe as quesLões, e elas se Itmitam habitualmente a respondê-las. Além
disso, elas presumem
que
seja o entreVlStado quem imcia e finaliza a entrevista, e
elas lhedelegam Ocuidado de depoIS interpretar suas falas c de fazer bom uso de
las, introduzindo desta forma, comO o ressalta i1verman, uma assimetria na rela
ção
enge
o
e n L r e v i s t a d ~ E
ellgevij;tado..
Gallhar a
cQllfiall a
do elltrcvislCldo
De uma forma geral, considera-seque não basta convencer uma pessoa a parti
cipar
pesquisa,e nem
cnar
um contexlO que lhep
rmiLa
estar
à
vontade na
SiLU-
ação de entrevisLa. É ainda preciso que ela
se
sinla suficieOlemente confiante para
a eitar verdadeiramente falar , Outro princípio considerado primordial para O
êxllo da
e n U ~
AqUI ainda, os entrevistadoresrecorrem, com maior ou menor sucesso, a Me
rentesesLratégla , visando Lranqúilizaros entrevisLados quanto as uas boas inlen
çõese quanto aO uso que serã
feiLo
de suas palavras. Primeiramente, elesse apres
sam
- a inda
que esLe
não sejao caso
em
todas
as pesqulS3S-em garantir
aos entre
vistados o anODlm.to,
de
modo
que
esLes não tenham a lemer pelas eventuais con
sequências de
seus
depoimentos. Em segUida, eles tenLam convencê-los de s ua
n utralidade , insiSLindo, por exemplo, n faLO de
que
sua pesquisa é lOdepen
deme , principalmenle dos grupos e das organizações das quais os emrevisLados
poderiam depender, ou com as quais eles poderiam Ler
um
conniLO
de
imeresses.
Os
entrevistadores também podem serlevadosa apla ar os recei de seus inLcrlo
cutores
quanto
utilização
que
poderá ser feila de
suas
falas, assegurando-lhes
que
estas serão apresentad corretameme e de forma anõDlma. Asslln como é o c aso
nas enLrevistas de opo chnico, eles também se esforçam, peJa man if tação da es
CUla da
empana
e do mLeresse, em eslabelecer,
durante
a entrevisLa,
uma
relação
calara
a, também ela capazde
comnbwr
para suscitar a confiançad entrevislado,
Enfim, para favorecer o estabeledmenLO de
uma
boa r el açã c mo s emrevisLado ,
os entrevistadores dobram-se às regras elememares de sociabilidade, Lais como
aceilar uma bebida, ou dispor
de
tempo para falar de uma coisa e
oULra
anLes
que
a
entrevista comece. última dimensão,
que
passa geralmenle dC >apercebida, re
quero
conhccimento
implíciLO
dasconvenções sociaise a capacidadede se acomo
dar a elas. Ela ilusLra
bem
em que a realização de entrevislas pressupoe
que
os en
lrcvistadore5 recorram ao conjunto de
S l S ompelên i s
sociais,
om
o objeLivo
de eSLabelecer relaçoes com os oULro .
232
Uvar o trevistadoa
tomar a iniciativa do rtla e
a
se envolver
DOIS
outros pnndpi O
comumenle
associados ao sucesso de uma entrevista.
O
pnmeiro
consisleem Lentar levar o emrevislado a lomar a micimiva
do
relalo. Tal
pnnclpio
se b SCJa na id la de que quanto mais o di s ur so é csp Dlãneo, menos ele
poderá se r maculado pelo
do
pesquis.,dor, permitindo assim a aproximação
ao
Ideal
pesquisado,o de
um
dIScurso'verdadeiro . Eu lerei oponunidad d vol ta rmaisde
talhadamente a esse assuntO, um pouco maIS adiante. Para facilitar a espOntaneida
de, vários procedimenLos
su
ciladas pelas regras da não-diretividade são preconiza
dos: evitar imerromper o entrevistado,
enqu IltO
ele Íala (ROETHUSBERGER :
K N 1943 ; respenar os momeDlos de si ncio, de modo que ele possa enca
dea ras id ias
po r
si mesmo,
se
necessãrio
u
; utilizar as técnicas da reformulaçãOcom
o objetivo de lhe explicitar
ou
esclarecer os temas abordados.
O egundo princípIO visa favorecer o maior envolvimentoposslvel do entrevis
tado. Segundo MlchcJal 1975), o discurso mais ignif icativo é aquele no qua l o
entrevisLadose envolve mais, ou , em outras palavras, aquel
em
que ele se refereo
mais posslvel aoseu prõprio vlvldo. No contcxto,
por
exemplo,
das
pesquisas re
laLivas a Lemas como a família , o lrabalho e o lazer , a entrevista será considerada
como mc hor , e as falas do entrevislado
como
maIS reveladoras, se ele abordar
esses Lemas
de
uma maneira
mais pes oal e falar mais parricularrnenLe de
sua
fami
ha, de
seu
trabalho e uslazeres, na condição, evidentemente, de que essas di
mensões façam
>cnLido
para ele. Esse
pnneípio,
baseado em Rogerse transpostoda
emrevisla clínica, coloca, cntretamo, um ceno número de dificuldades, já que ele
equivale
ou
poderia equivaler a resLringirexclusivamente aos discursos nos quais
O indivíduos seenvolvem , aqueles dis ursos
que
sãosocialmcntesignificativos.
As referidas observações sobre os principias e as esLratégias, amiúde Lidas
como essenciaisà realização de entrevistas, são, sem dúvida, uficientes parailus
Lrar
alguns paradoxos da entrevista de pesquisa: primeirameme, o da elahoração
de um irlStrumenLO que, no plano técnico, pretende-se o maIS r igoroso e o mais
cICDtlfico paSSivei, mas que, ao me mo Lempo, busca reproduztr, do
melhor
modo, as
condições das trocas narurais e espontâneas . Paradoxo
lambém
de
um irlSlfUmento que, para além das lecnicas de conduLa de entrCVlSLa utilizadas,
aposLa tanto nos
faLOS
quanto nas compelências ooais do entrevisLador, no SCD
tido fenomenológiCO do LemlO Lais como a capacidadede estabelecer relações,
de
lançar mão, se neces ária, de seus recursossociaIS e culturaIS , para favorecer a
colaboraçãO dos entrevlSLados, e de se adaplar às diversas imposições e ao caráler
inslável
da
siLuação
de
entreviSLa.
22. Sobre os diferentes
t p s
de siltnclo, ver Legras 1971 .
233
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
11/19
Reflexões sobre os vieses e a con trução social do discursos
Na concepção
correnLe
e
pOSilivisUl de
entrevista o enLrevistado
é
visto
o o
detentor de uma ve rdade a slla evidenlemeL1le mas também por meio da sua a
deseu grupo ou a desua comunidade. Segundo essa concepção, é passivei apTeen
der essa verdade essencialmente pela utilização correta
do
instrumentos adequa
dos. Se, nes a ótica, o objeLivoda entrevisla parece claro saber, o deapreender a
verdadeira experiência e o verdadeiro p
mo
de vista
do
entrevistado a forma de
alcançá-lo o é menos, conforme o atestam os múltiplos questionamentos de
que
essa técnica se tornou objelO. Como superar, efelivamente, os diversos obstáculos
quese interpõem a essa busca e conquista da verdade? Particularmente, como fa-
zer com que esse disposiLivo de pesquisa permita atingir os objeLivos da pesquisa
sem f li eaT a própria natureza das narrarivas coleladas? Se, como muitos
O
aftr
mam, a entrevistaconstillli uma forma de interaçãosocial ultrapassando o ãmbito
estrito das trocasverbais, como impedir - e eria passivei impedif
que
esta forma
ele intera
ãO
nào acabe contaminanelo os dadosproduzidos?
Em
uma, como o diz
Blondiaux 1991), a propósito dos dUemas cnfrentados pelos sondadores de opi
niãoentre 1935e 1.950, quanto vaUdade deseu instrUmento, como estarcerto de
que Oque dizo entrevistado, ao longo de uma entrevista, reflete verdadeiramente
o
que
ele pensa ou o que elesente, e como estar scguro de
que
seu discurso não é
um artefato da situação de pesquisa?
Ainda que em diferentes graus, conforme as épocas, essa questão Telativa aos
viesescapazesde pervertera entrevista não deix u d preocuparos pesquisadores.
Pode-se dizer, efetivamente, que uma boa parte das reflexões em torno da cientifi
cielade desse método diziae ainda
diz
respeito a essa questão. Desde os anos 1920,
aUlores como Palmer 1928), Roelhlisberger e Dickson 1943) interrogaram-se
sobre o modo como os dois principais tipos de entreVIStas, as entrevistas padroni
zadas
ou
estruturadas, de
um
lado, e as entrevistas qualitativas, de outro, podiam
alterara nanlreza elo que era dilO, e e perguntavam qual dess tipos era capaz de
melhor dar conta do ponto de vista dos entreVIstados. Nosanos 1940 e 1950, tra
balho> Importantes,como os de Hyman et
aI.
1954), foram Tealizados com o obje
tivo de medir Oefeito que podia ter a rt:iação entrevistador-entrevistado sobre o
comeüdo do discurso prodUZIdo, e também de encontrar, como se verá mais adi
ante, soluções para 05 diversos problcmas I vantados pelaexisténcia de viés. Ainda
que um bom numero dos fatores capazes
ele
alte.rar o mate.rial proveoientede en
trevistas já tenha sido ressaltado desde os anos 1950, a reflexão sobre os vieses
prosseguiu, Com a diferença essencial entreo período dos 25 últimos anos e os pe
ri dos precedentes residindo, talvez, menos na precisão do inveotári dos vieses,
do que na muelança d perspectiva frente a essa questão.
Com efeito, é pc ível destacar duas tendências na maneira de considerar a
questão dos vieses. Aprimeira d minou até O final dos ano 1960 ese art iculaa uma
concepção positivista da ciência.
Ela
tenla resolver a questão dos vieses, trazendo,
4
para tanto, soluções fundamentalmente técnicas. Asegunda tendência apareceu nos
anos 1970 e se baseia em perspectivasmais coostruLivistas, taiscomo o interaci nis
mosimbólico e a em melOdologia, assim como nas renexôes oriundas, mais recen
temente, das correntes feminista, pós-estTUturalista e pós-modema. Ela trata, dife
rentemente, a questão d s vieses, indagando sobre a maneira pela qnal, até o mo
mento, haviam sido considerado alguns tipos de vieses, lais como a subjetividade
do pesquisador, e, sobretudo, preslandouma maioratenção forma pela qual osdis
cursossão socialmenteconstruidos Enquantoa primeira tendência reside na bus a
de um discurso verdadeiro , isentode viése a salvo de todas
as
innuências contex
tuais; a segunda pretende, preferencí:llmenle, mostrar que os discursos são indi -
ciáveis de seu contexlO de produção e de enunciação.
A
reflexlJ O
em 1 mo
tia quesllJ o
dos vieses
Evidentemente. não
é
o caso deapresentar,aqui, o conjuntodas pesquisas re
[erentes aos viesespossíveis na entrevista. Excetuando os trabalhos clássicos de
Hyman etal. 1954),existe uma Uteratura abundantesobre esse as.sunto KANDEL,
1972; GHlGUONE
MATALON,
1978; MISHLER, 1986; BLONDlAUX, 1991. .
me contentarei e m fazer n
breve
chamado concernente
à
natureza desses viescs
com O
objeLivo
de esclarecer o modo como se tentou resolvê-los.
Os
diferentes lipo de vieses
Esquematicamente, é possivel destacar três tipos de vieses: os vieses ligados
ao dispositivo de investigaçãO, os vieses associados à relação entrevistador-entre
vistado e
à
sua respectiva situação social, e, por
fim,
os vieses referentes ao contex
to de pesquisa. Os vieses possivelmente devidos ao dispositivo de investigação re
metem
às
deformações que poderiam engendrar, por exemplo, a maneiTa de inda
gaT o conteúdo e a forma das questões),
as
técnicas de registro dos dados anota
ções, gravador, video), ou as circunstancias de tempo e de lugar nas quais seefe
tu U
a investigaçãO. Este primeiro tipo de viés e Tefere, portanto, em boa parte,
ao que eu denominei anteriormente de elementos de encenação da entrevista.
Esses vieses são
suficientemente
conhecidos, para
que
eu nãotenhade me
deter
tleles; eu me limitarei a sublinhar que não é absolutamente fáeU avwar seus efei
tos, na prática.
No que diz respeito aos vieses que poderiam
ser
atribuíveis ao enlrevi lador,
cabe dizer que muito se indagou obre as conseqüéncias que podiam ter sobre o
entrevislado as suas intervenções, lanto verbais quanto não-verbais, lais como os
hum-hum , os meneio de cabeça, ossorrisos, asdiferentes posturas corporais, e
mesmo assuas atitudesao longoda entrevista, comoa exislência ou a falta de ime
ressemanifestado
em
relação ao Telatod entrevistado. Tambémmuito se questio
nousobreo efeitoque podiamproduzirseus pressupostos quanto ao objeto dees-
Z35
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
12/19
lUdo
ou
àS
pessoas concernidas, tanto em sua maneira de colocar as questões,
como na forma de interpretar as respostas. De modo mais geral ainda, pergun
lou-se qual peso podiam ter a sua situaçãoe as suas diversas caractel;sticas sociais
- idade, sexo, etnia, classe social, e OUlras as quais são capazes de se revdar por
meio de vários
indicio
taiscomo a apartncia flsica, a linguagem e a posiÇão social
ocupada Kandel 972) lembra, com razão, como j no iniciodos anos 1940, KalZ
1941) bavia mostrado que as respostas dos entrevistados podiam vanar conside
ravelmente segundo as caraclerisucas do entrevistador.
Dessa
lisL \
não exaustiva dos vários elementos que relação ao enlrevi5la-
dor, sãocapazes deinfluenciaro discursodo entrevistado, vamos nos deterno ulti
mo aspecto apomado, o da caractelÍst icas sociais do ntrevi tador e dos efeitos
que elas podem ter quanto ao conteúdo da entrevista, independememente da von
13de
dó enrrevistad r
ou
de sua competência técnica. Essa questão sempre ocupa,
com efeito, o topo da cena,
Pata minimizar as distãncias entre os discursos imputáveis às diferenças de si
tuação e de posição sociais, pensou-se, primeiramente, em apltcar
O princ.fpLO
da
maior homologia paSSivei emre os entrevistadores e os entrevistados, Tratava-se,
digamos, de selecionar os emrevistad res em função das aracte.rlsticas principais
do
gmpo
pesquisado. Assim, parecia preferivel que mulheres fossem pesquisadas
por mulberes, jovens porjovens, autóctones por autóctones, pobres por pobres,
etc.,
em
razão de uma maior proximidade de linguagem. de cultura e de preocupa
ções. Acreditava-se que uma maior proximidade não someme reduziria o riscos
de intrusão de viés,de ln ompreensão e de etnocenlrismo, mas também faria com
que OentTevistado
fo
e ainda mais longe
na
exploração de seu vivido.
Levado ao extremo, es e ponto de vista reafiTma que um pesquisadorsó
é
real
mente habilitado apesquisar os
gmpos
com
os
quais ele tem um máximode simili
tudes sociais,o que invalida, depronto, um bom numerode estudos passadose re
cemes, Na prática, entretanto, bem poucos pesquisadores adotam uma posiÇãO tão
radical.
Em
verdade, a proximidade devida a um mesmo penencimentosocial, ou
adquirida no campo de pesquisa, é, em geral, percebida, como uma condi ão que
favorece uma boa compreensão do
grupo
pesquisado. Em
contrapanida
ela é
igualmeme vista como capaz de consrituir um obStáculo, na medida em que uma
demasiada familiaridade com o grupo poderia impedtr o pesqUlsador de tomaT a
dlStãncla necessária para reconsiderar as evidencias ou as racionalizações prõprias
aogrupo. Nesse sentido, para um pesquisador, o fala de pertencera um outro gru
po do queaquele pesquisado poderia ser um trunfo precioso, umavez que isto fa-
cilitaria
l e ~ a r
em consideração as diferenças culturaIS e sociais de cada um,
m
r ai recipro idade das perspectivas sõ seria, no entanto, possivel, caso o pesquisa
dor fosse bastante próximo ao grLIpo pesquisado.
Concluindo, nào há regras simples, no quediz respeito a essa queslão da ho
mologia entre entrevistador e enrrevislado. Mesmo que não seja fá
ii
dellnir em
236
funç Ode quais critério se deva constitUlr essa homologia, e que uma homologia
perfeita seja dificilmente imaginável, ela não impede que as questões de estatuto
possam intervir,a nãoser precisamente pelofato de que os estatuLos relativamente
idênticos possam fazer com que algumas realidades sejam tidas como adquiridas.
Além disso,
há
algumas vantagens
em
combinar
os
estallltos, apresentando, ao
mesmo tempo. as Irnilitudes e as diferenças com
O grupo pesqUIsado. Chap ulie
1 9 8 ~ I.embra ainda que Hughes sugeriaaosseus alunos que pesquisassemos gru
pos aos quai> eles estivessem naturalmente afiliados, aproveitando o dIstancia
mento que lhes oferecia a sua condição de e tudame.
E
para lentarobjeuvar me
lhor a situação desses
grupos llughes
apostava em
OUlra
coisa além da proximida
desocial, preconizando, sobretudo,Orecurso às [erramemas c nceituais, ao méto
do comparativo e
à
capacidade refiexiva do pesquisador.
Em resumo, as imervenções, as atitudes e as caracterlsticas do entrevistador
são capazes de marcaras falasd entrevistado. Da mesma r rma, a percepção queo
c n r r e v i s t . ~ d o r
tem da pOS1Ção social do entrevi tado pode igualmente inauir sobre
suas réplicas,
e
mais globalmente,sobre a natureza de suas Illterpretações.Quanto
ao entrevistado, é ImpOrtante observar que, apesar do que se tende muito freqüen
temente a crer, ele tem apenas um papel passivo e readonal
na
siruação de entrevis
UI. Como Odão a emender v rinsanálises, seu discurso pode ser fortemente infiuen
ciado não sõ pela representação que ele constroi sobre o que e o entrevistador, e so
bre o que
ele
busca saber, mas também pela percepção que
ele
tem dogmpo que
re-
presenta este último CHABROL 1982),
ou
dos outro alorespresentes na pesquisa,
e ujospomosde visla
sã
,provavelmente,diferentes do seu,
Em
oUlras palavras, a
esttatégia de argumemação do entrevistado pode ser fotjada tamo em função do en
trevistador como terceiras pessoas imaginadas ou reais Assim em uma investi-
gação sobre as condições de encarceramemo, alguns detentos p dcm denun iar
funcionamemo das prisões, na esperança de eremouvid s por m iadapesquisa e
de queseus
pontOS
de vista possam favorecer algumas mudanças.
Este último aspecto po síbilita introduzir o terceir lipo de viés, refereme ao
comexto da pe:.quisa e
às
suas repercussões passiveis, tantO no discursos dos en
trevistados, como nos dos entre istadores, Para tOmar
O
exemplo dos entrevista
dos, sabe-se que suas percepções dos enfoques que uma pesquisa representa para
eles são pasSiveis deafetarsuficientemente o que elesp dem dizer, ou decidir não
dizer. Em sua investigação
junto
a um grupo de trabalhadores, Roethlisberger e
Dickson 1943) já
colocavam a possibilidade de que seussujeitos pudessem men
tir por temor de represálias, e também calar acerca de sua apreciação real sobre o
funcionamento da empresa queo empregava. Emre o pesquisad res tradidonai
voltados
à
pesquisa de um discurso verdadeiro , que dá conta do que realmente
pensa o entrevistado, a preocupação principal parece precisamente ser a de detec
tar os fatores que podem levar este último a modificar, conscientementeou não,
seu discurso, e a de descobriT se ele disse mesmo a verdade.
Em
resumo, seria pre
ciso não somente tentarinseriro entrevistado em um contexto que lhe permitisse
237
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
13/19
dizer abertamente o qu e pensa, e, melhor ainda, tudo o que pensa, como também
procurar,
por
diferentes procedimentos, revelar se ele mente,
ou
verificar
se
o que
ele diz corresponde verdadeirnmente à realidade tal qual ela é. Essa preocupação
exiSte tanto entre os adeptos da entrevista pad.ronizada BLONDIAUX,
1991 ,
quanto entre os defensoresda entrevista qualitativa, como o atestam, aliás, os
ani
gos de Dean e Whyte 195B) e de Becker
l95B sobre
a onfiabilidade
do
depoi
mentOS das pessoas pesquisadas.
Reprotlllçc1o
<
contexto ,lo laboratório
em
oposi
<
coleta de discursos l a-
tur is
Uma vez delimitado os vieses geralmente associados às entTevistas de pesqui
sa, como se tentou remediá-los?
Na
perspectiva de inspiração positivista, as solu
ções consideradas tomaram
duas
direções
OpOStas. Os
partidários da entrevista pa
dronizada esforçaram-se em criar condições que lhes permitissem realizar entre
vistas em um contexto que
se
aproximasse Omaispossfvel daquele que caracteriza
as experiências de laborat rio. Os pesquisadores no qualitanvo tentaram, ao con
trário, realizarsuas entrevistasem condições semelhantesãquelas que exi tem nas
siruações naturais, devendo o depoimentos coibidos aproximar-se, assun, das
fa-
las espontâneas, como é o caso nas cooversas comuns.
Como o enfatizam Cicourel
1964 ,
Blanchet et aI.
1985 ,
Misbler 1986) e
Blondiaux 1991), a propósito das pesquisas
que
se inserem na Unha dos trabalhos
de Hyman et aI., durante os anos 1950, pensou-se que a melhor soluçãO para con
tornar os riscos que representavam os vieses consistia em reproduzir um modelo
de prática da entrevistaquese assemelhasseo mais passivei ao contexto do labora
tório. Para tanto, duas estratégias foram consideradas. Primeiramente, buscou-se
padronizar as condições de pesquisa, Com o cuidado, por exemplo, de que as en ·
trevistas fossem realizadas em um local idêntico e conforme a mesma fomla de
contato
ou a mesma técniCa de registro dos dados. Essa padronizaçãO das técnicas
tinha por função garamir Oexerclcio de um melbor controle sobre as variáveis
capazes de alteraro teor dosdiscursos. Na referida I gica, toma-se totalmente con
tra-indicado entrevistar uma pessoa na presença de uma outra. As entrevi tas de
grupo são também imediatamente excluidas, na medida em que fica difldl medir
precisamente o efeito que isso possa ter, e, ainda, que se complicam proporcional
mente as comparaçõe eventuais entre as entrevistas.
A segunda estratégia preconizada
foi
a de padronizar as intervenções do entre
vistador, tantO no que diz respeito à forma e ao conteúdo das perguntas, quanto no
que se refere à maneira de coligir as respostas. om as perguntas e as respost s sen
do
estruturadas previamente, pensava-seem contera subjetividade do entrevistador
e impedi-lo de se entregar a improvisaçOes e interpretações duvidosas, diminuindo
proporcionalmente os ri cosde ingerência e de deformação.
Os
partidários da entre
vista padrorlizada estavam conscientes de que uma tal padronização comportava o
238
risco de deformar o ponto de vista do entrevistado, mas acrcditavam ser possível re
duzi-lo por meio de uma pré-investigação e de um pré-teste. Eles avaliavam, sobre
lUdo, que esse inconveniente cra amplamente compensado pelas vantagens que a
padronização devia proporcionar no plano da generalização dos resultados .
Comentando
os trabalhos de Hyman
et aI.
1954), que ele julga represemati
vos de tal posição, Cicourel 1964) considera que adotar o referido modeloequiva
le exatamente a querer substilUiro entrevistador porum autOmato capazde inte
raçOes unifomles com os entrevistados. Segundo esse modelo ideal, o entrevi ta
dor
deve
5< mpre
formular as perguntasda mesma maneira, para que os entrevista
dosreajam a um mesmo estimulo, e wmbém deve
ser
capaz de reagir uniformcmen
teás respostasdestes últimos, para evitar que as mesmas sejam detllrpadas por suas
próprias interpretaÇÕeS. Uma semelhante intençào remete, segundo Blondiaux 991),
a querer
fazer
uma ciência sem aLores
Porsua vez, os pesquisadoresque privilegiam as entrevistasdeupo qualitativo
quiseram resolver o problema dos vieses
seguindo
uma perspectiva oposta. A
fim
de r produzir o mais integralmente e fielm nte passivei o ponto de vista dos atO-
res, esses pesquisadores alegam dois
pnncipios
fundamentais. Eles apostam, em
primeiro lugar, na uperioridade dos discursos coletados em seu contexto naLUral.
Por aí, eles reconhecem as condiçõesque mais se aproximam daquelas da vida co
tidiaml dos entrevistados, de modo que
os
artuicios da situação de pesquisa sejam
atenuados e estes
últimos
sesintam o mais ã vontade passiveI.
s
·conversas natu
rais , tal como
se
desenvolvem no dia-a-dia PALMER, 1928), ou ainda as conver
sas colhidas ao vivo, no contexto da obscrvação in
si
t BECKER GEER, 1957,
1958), são por muitos consideradas como superiores. egundo Becker e Geer, a
observação in
sinl permite
ao p quisador, sobre tl ldo, indagar
os
atores sobre o
que eles estão fazendo ou dizendo, apenas observando diretamente as condutas.
Visw
sob
esseãnoulo, a situação ideal seria aquela
em
que os atores envolvidos, ao
terem tomado conhecimento dos interesses
do
pesquisador, aceiwm colaborar es
pontaneamente, explicando o mais sinceramente passivei aquilo que eslá aconte
cendo. Nessa perspectiva, e contrariamente ao
que
é preconizad
na
ab rdagem
voltada à padronização, entrevistar uma pessoa na presença de uma terceira. por
exemplo,
um
cOnjuge,
ou
ainda, como o
aponta
Burgess
984 ,
fazer entrevistas
de gntpO,
não
são mais situações vistascomo inapropriadas, pois elas são propiCIas
a tipO de interações difíceiS de apreender diferentemente.
D.
No dcb e
que
lrndlclonnlmem opOs os parudanos
dos métOdos
qwl lIallvQS aos
do quanllUluvo.
uJumos admitem,habilualmeme, que.oqualitativo pOSSibllíl4t
3 ançar
IDo.Ils r c l m ~ n t e um con-
teúdo maJ5 Mrko cmais prOX imo 30 Ylvldo dOS310rcs. assim om primeiros
admitem
IgUJlmentC
as v3nt lgens
de
umacerta
pad roniznçào
As pnncipais discordttnclas concernem tnal5 a
qUe5I/\IJ de S
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
14/19
o segundo principio é o da superioridade dos discurso espoOlãneos , em
relação aOS discursos suscitad s pelo pesquisador. Para
autores
como Palmer
(1928),Beckere Geer (1957), assim como Schatzman e trauss (1973), o dtScurso
mais verdadeir cOOlinua sendo aquele menos afetado pelas intervenções do I es
qUlSador . Asituação idealseria, ainda aqui, aqueL,
em que
os atores pe quisad s,
COtlSClentes
dos inleress de pesquisa
do
pesquisador, ou, melhor ainda, incons
cIentes desses intere es paraeviLar a pré-estrutUTaçao de seu dIscurso. consenti
nam em narraro matS espontaneamente possrvel a
sua
experiencta. Na falta de po
der encontrar espoOlaneamente essa esp ntaneidade , buscou-se, mão, repro
duzi-la pelo disposnivo de investigação, obreLudo peja forma de ind ga ão. Ê
efeLivameme, sobre essa imen ã de limitar o efeitos das iOlervenções do entre
vistadorsobre o
enLrevi
tado, qu Rogers l945 se baseia para justificaro recurso
ã
entre visLa
não-dirigida no conLexto das investigações nasciencias oeiais, reco
ohecendoSimplesmente que essa forma de lnteração não é em si natural.
Em suma, tanto do lado quantiLativo como do qualitativo, buscou-se resolver
o problema dos V eses na entrevista. Porém, quer se tralaSse de reproduzir o con
texto de I.boralório, ou, ao contrário. de obLer o discurso mais natural possivel,
assoluçõesconsiderada porUllS e outrospermaneccm, em primeiro lugar, e antes
de Ludo de ordem
Lécnica
Os
mitos d p drolll z çdo e d ndo-drrerividadc
A par ti r d 5 atlos 1970,
e
sobretudo, nos anos 1980, tanto a padrolllzação
quanto a não-diretividade foram objeto de severas críticas, aparecendo defltlltiva
mente como milos: mito, primeiramellle, no
que
se refere à possibilidade de arin
gir, na prática, a perfeita padronizaçãO ou a perfeita não-diretividade; mito, em e
guida, qualllo à sua capacidade de resolver a questãO do vieses. NUIll prinleiro
momento,enfatizarei, principalmente, as criticasde ordem metodológica dirigidas
contraa padronizaçãoe a não-diretividade, para, num segundomomento, ater-me
ã criuca que, no plano epIStemológico, pode ser fonnulada em relaçãO ã perspecti
va pOSlllvista sobre a questão dos Vieses
As crfticas endereçadas ã padronizaç o
Por ser, na prática, difícil, e mesmo impossível de atingir, OIdeal da padroniza
ção foi freqüentemente desacreditado, mUIlO o vendo mais como um mitodo que
2
Em V1Slad1sso,
Palmer (1928)
conside.rava
quemalS valia IOttrvirde uma maneira
não-vubal.
ou
quase nao-vc:rbal. comt l por
meneios
de
cabeça,sorrisos.
hum-huns do
que
verbalJlle.nle;
sendo
as
intervençôcs do pomeiro
tipo V151aS
como menos capazes de
innuenciar as ralas do
CnlrCVl5lado. Eu
já
apontci,antcrionnente,
que próprias
atitudes nâo-verbais
do
enlrevísl3dor
sâonmlüde conSide
radas como
uma fonte:
de ytts
240
como uma realidade. Em uma obra na qual critica O pressuposLoS da entreVISta
padronizada, Mishler (1986) resume várias pesquisas precisamente voltadas a
mostrara existência de Imp rtantes desigualdades na fonna de realizar aseOlrevis
taS eja enLre diferenLes entrevisLadores, ou em um mesmo. Malgrado os esr rço
empreendidos para eliminá-las, invesLindo, por exemplo. em uma melhor fom a
ção dos enLrCV1stadores parece dificil, senão impossível, segundo Mishler,
supn-
mi-las
LOtalmeOle
A própria padrolllzação também pode ser r ntede vieses. Estes podem ser 111-
troduzidosduranLe a análise, por exemplo, com a omissão de lUdoo que nã se i n
sere nas categorias esLabelecida prevtamente, ou com a
enonne
importância
aLri-
buída à busca de COnSLantes
évy
(1974) aponta, nesse eOlido, a tendencia nas
análises de comeúdo convencionais, baseadas em 8erelson, em enfatizaras regu
landades , ocultando, assim, Oque
é
considerado como irregularidades , bem
como tudo o que parece aáplco. Esses vieses impuLavelS ã padronização podem
igualmente se prodUZir dUTaOle a coleta dos
dado,
pelo fat de que uma aborda
gem padronizadacorre o risco de não ter suftcientementeem onta particularida
des própna às sl[lIaçOes e às pessoas. P13get Já havia pressenudo esse problema.
Assim, desde os anos 1920, OIUOo r portalU Ghiglione e Matalon (1978: 74), ele
havia proposto um método clinico no qual preconizava uma atilude do experi
mentadorque não fosse inteiramente padronizada, mas que buscassese adaptar a
cada sujeito, adoLando, na medida do
POSSlvel
seus conceitos e sua representa áo
da situação; portanto, uma amude radicalmente posta ã padronização dos
Lestes
ou dos procedtmenLos experimentais . RlSCOS de deformações devidas ã padroni
zação lamb m surgem
no
casodas pesqUIsas qualaauvas, quando os emrevtStado
res devem se submeter às instntções padronizada de Lomada de contato com os
enrrevistados e de inicio de entrevista. A esse respeiLo, Palmer (1928) avaliava er
preferível modificar e adaptar Lais
instntçOes, em função das particularidades e ca
raclerisdcas dos grupos ou das pessoas pesquisadas .
A cnuca mais Importante a respeito da padronização concerne, no entanto, à
Impossibilidade de esta elíJnjnar Oque, na perspectiva positivista, denomina-se os
·efeu s do conLexto . Baseando-se em uma per pe uva interaciolllsta e eU1Ome-
Lodológica, Cicourel
l964,
1987) e Misbler (1986) insisLem, ambos, na maneira
e mo O
onLe XLO
impregna o conteúdo das perguntas e dasrespostas. e isto mesmo
25.
Professor
convidado
p:l1 3 umde
meus
semin.uios. Chnsl13n OtbUYSl, da
Escola
de Cnmlnologia
da Universidade:
Calól1ca de
louvam,
tr.l=ia O exemplo
dos
lestes
de.
mtelJgenci.a par3
pontar os b
mites da padronizaçto.
Para
tVllaros nstosde
vits
e pennuira compa.l1lç:lo, esses lestes de\ enamser
todos
admmlsLrados da mesma
Comla
Ora,
o
que fazer quando
o U cnico se
d 1
contade que Omdiví
duo
ao qual
ele aplicou o teste compreende
mal as m lntçÕes ou
njo se sente
à vontade?
Ele deve
modificar
sua
aborcL.tgem,
de
modoa guranur
que
e le tlllimo façn o leSte
no
melh r
de
suas cllpacl
dades,
ou
ele deve se
prender inslruçOcs est:lbe.le.cidas
Nesta
ultima
evenlU3hdadc:, de 0:.\0
corre
na orisco
de Inlroduzir um viés
na medida cm
que
os Trsu rodo5 do
decolTtnam
tanto da
forma
comoeste admmlSLJ 3do,
quanlo das
capacidades
da
pessoa
e.m
q u s ~ o
241
8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
15/19
no mbito da entrevi ta padronizada. Cicourel,
por
exemplo, argumenta que,
numa entrevista estruturada, a natureza das imervenções, tanto da parte do emre
vistadorquanto da
do
entrevistado, deve-se ao modo como seorganizaa totahdade
da entrevista. Assim, não se pode ISolaro
jogo
das perguntas e das respostas, da
tO-
talidade das trocas verbais e não-verbais durante a entrevista, assim como, mais
globalmente, do contextosocial particular no qual esta se desenvolve. Baseada no
COTlStrullvlsmo, essa nticaserá retomada mais adiante, a propõsito dos limites da
posição posinvista concernente aos vieses
As criticas endereçadas
não-diretividade
Se a padronização
o
objeto de virulentas criticas, a não-diretividade tamp u
co escapou delas . Assim comoocorreu em relaçãO à padronização. alguns aponta
ram,pflmeiramente, que a perCeita não-direnvidade e apenas um mitO. De fato, é o
pesqUISador quem define o lema
ou
os temas da entre,'ista. Além disso,apesar dos
principias
professado,
não é sempre conCortável para um pesquisador aLer-se ex
c1usivamenle aos temas introduzidos, na seqüênCla, pelo entrevistado. MaIS Cun-
damentalmente ainda, as intervenções do entrevi tador cor rem. apesa rd tudo, o
nsco de serem marcadas
por suas
própriaspreo upações e pressupostos. Não mais
do que no caso da padronização, a Connação dos entrevistadores e a autocrítica
sO
podem unicamente garanur que essa imperCeição possa
ser
cvitada.
Por
outro
lado, a entrevista não-dirigida não
é
t Oneu l ra
como bem
se o
quer
fazer crer. Basta ter praticado pouco que sejaessa teenica, parase darconw de que,
a despeito das precauções tomadas para que caela um se sinta à vontade, esse tipo
de entrevistacria uma situação que está
I
nge de ser empre percebida como naru
ral pelo emreviswdo, e, até certo pontO, pelo entrevistador. Assim, Oentrevistado
pode se sentir coagido a Calar sem contar, por outrO lado, o lequede reações passi
veis a esse gênero de abordagem, rcaçOes que variam confonne os ind iv íduo e os
grupo sociais, em virtude, principalmente, como o apomam Schatzman e Strauss
1955 ), de uma relaçãO diCerente com a linguagem disso, a entrevISta
não-dirigida raramente corresponde
imagem que os eotrevistados Cazem de uma
entreVISta de pesquISa. Como estes ultimas, geralmente, esperam que se lhes pro
p
nham
questões, o entrevistador se eocontra amiude
na
obrigação de
Cazer
escla
recimentOS
quanto
aogênero de emre 1SLa
. perado.
Enfim, mesmo as retomadas
aparentementemais neutras, istoé, aquela que visam essencialmeoteque o entre
vistado expliclle
ou
esclareça o que
c Jsse,
podem influir em seu discurso. Nesse
sentido, Blancbet (19 mostra bem como as variações na prõpria Corma das re-
26. Pal
t.xe.mplos r uo
à
n ~ o d l r t l t v i d 3 d e .
\ .r BourdJe:u, hambom lone
Passc ron
1968 ,
Bt Dche< t982). Ch.brol 988).
27.
Ver 3
apre:sentaç1o
e n
tradução
desse lexto
em
Bourdlcu. Cbamboredon e Pa.sse.ron 1968:
222-237).
4
fonnulações onduzem o entrevistado a modificar sensivelmeme O comeudo de
seu
dis
ur o. assim como seu grau de envolvimento
em
seu
rela
lO.
A cfl tiea mais severa em relaç o à entrevista nào-diriglCla foi fom1Ulada por
Kandel (1972). Ela argumenta, efeLivameme, que esta forma de entrevista não
pode
impedir
o
jogo
dos vários
componemes
da iDleração envolvidos na situação
de pesquisa, taIS como a intervenções não-verbais do entrevistador, ou ainda, as
r pecuvas percepções
do
entrevistador e
do
entrevistado, em função de suas ca
racterísticas sociais reais
ou
presumidas.
Se
a entrevista nào-dingida é meno pas
s vel
de
produzir
um
malerial
que
constitulTia o fato
do
pesqUISador,
SSO
não im
pede a intervençãode outras dimensões, independememeOlc da boa vomade da
competênCIa
do
entrevi tador.
A entrevista eo oo discurso so i lmente constnúdo
A observação de Kandel (1972) possibilita introduzir diretamente a cTíuca
epistemologiea cOTlStrulda relativamente ao ponto de vista posiLivlSw sobre os vie
ses,segundo o qual, deve-se vISara produção de um discurso depurado d todas a s
mfluências contextuais, e enLão buscarreproduzir Overdadeiro
pomo
de vista dos
entrevistados, eliminando, por precauç es t ~ c n i c a s principalmentena escolha do
tipode entrevista, essas influênciasdilas extenores e vistas corno fontes potenciaiS
de viés A própria idéia
de
que
possivel fazer
com que
o contexto não intervenha
de netlhuma
Corma
na produçã dos dados e no discurso mantido pelo entrevista
do O Conemente contestada a parur dos anos 1970, entre outro, por autores de
orientação COTlSlrutlvista. A fim de dar c oma de s eu pontos de vista, retomarei
aqui os argumentos alegados por PCohl (197B), no que se refere ao modo como as
pesqlllsas de orientação positivista temaram resolver a qu tão dos vieses capazes
de
Calsear
os diagnõsticos profISsionais. Essa criuca me parece perfeitamente trans
portável para o ãmbitO das entrevistas.
Com base numa perspeCtiva etnometodológica,
PCohl
analisa, primeiramente,
asconsiderações e o mecanismos que podem intervir na construção dos dIagnós
ticos,
tais
como osjogos
de
poderentre profi ionais, o sistemade categonasutilt
zado para reconstruir os casos, a maneira como fonnulam os diagnósticos para
da r
a aparência da objetividadee para garantir
que
elessejam aceitos pelas instân
cias de isórias. Em resumo, PCohl busca mostrar a inUuência
do
que, numa pers
pectiva positivista, seria considerado
como
vieses a eliminar, os quai
,a
redita-se,
impedemde decidir obre a natureza real dos casos. Ele considera, no entanto,que
é tOtalmente ilusório querer supnmtr o jogo das interaçõcs e relações sociais que
intervêm naconstituição dos d13gnosueos,Já que ele é merente ao
própno
proces
so do diagnO tico. Segundo Pfohl, todo diagn rico urna cODStrução
so
ial, nã
somente porque pressupõe o recurso a um sistema de categorias, mas também por
que toma OnT a por meio
do
jogo e das questões das múltiplas interações sociais
própriasao contexto particular no qual ele é produzido.
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8/20/2019 POUPART Jean a Entrevista Do Tipo Qualitativo Consideracoes Epistemologicas Teoricas e Metodologicas
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uma retórica própria às ciências sociaLS, os pesquisadores tenUtm, atravês desses
relatos, convencer Oleilor da justeza
de
sua interpretação, bem como impor a sua
própria visão da realidade.
Essa r rent ede ref lexãosusci ta , no enlamo, controvérsias, pois não há abso
lutamente acordo sobre a quesl Ode saber e os
la tos
etnográficos podem, ou
não, reproduzIr a experiêncIa dos atores. Alguns, como Oillord (1986) ou Van
Maanen
(1988),
lenlam tomar distância em relação ao
POntO de visLa
p siúvLSta,
que acrediLa na possibilidade de reproduZIT a experiência tal qual ela é. Eles não
consideram
os lalOS
dos pesquisadores como tradu ões da realidade, avahando
preferencialmente
que
eles SÓ podem ser versóes parciais e parcelares dessa reali
dade. No mesmo sentido, Denzm (1994) argumenta, por sua vez, que não pode ha
versenão múltiplas versões da realidade, segundo a perspectiva teórica e epistemo
logica adoLada. Outros, como C10ugh (1992), que eu
já
haVia mencionado, adolam
uma POSiçãO exlrema e recusam a própria existênciade uma correspondência possi
vel entre 05 relatos dos pesquisadores e a experiência dos atores, Além de Smith
(1993), aULOres como Atkinson e Hammersley (]994), e Altheide eJohnson (1994)
reconhecem, de sua pane, a contribuição da corrente pós-modema, quando ela cha
ma atenção para a imporlância de considerar devidamente o papel do processo de
escriLa e da retonca na exposição que 05 pesquisadores fazem da realidade. assim
como a necessidade de examinar a maneira como os cientistas buscam, por meio de
eus lextos, impor e apresenLar
uma
imagem de uma
ciênda
objetiva. Eles lemem,
contudo, que essa corrente vá muito longe, ao consideraros
lexLOS
de pesquisa estri
tamenle sob o ãngulo de uma produção lextual e negar qualquer fundamemo a
5
procedimentos
que
visam
darcoma
da experiênCia
do
atores.
Con lusão
Neste capitulo, apresentei o