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Projecto Madalena Arrependida

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Uma responsabilidade social e ecológica no Design de Comunicação

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Relatório 5

Introdução 7

1. Design Social vs Design de Consciencialização Social 11

2. O Design e a responsabilidade social 15 2.1) O Autorreferencialismo 15 2.2) O Papel actual do Design 17 2.3) O Poder do Design 20

3. Componente Prática 25 3.1) Ecologia Urbana 25 3.2) Objectivos e Metodologia 27

Conclusão 31

COMPONENTE PRática 33

1. Contaminação 35

2. Graff iti de Musgo 38

3. Cartaz da Indiferença 40

4. Sede Mundial (Infograf ia) 42

5. Brochura Turística da Agência Abreu 44

6. Fanzine “Blue as Hell” 46

7. Kits de Sobrevivência 50

8. CD “Animal Amnesty” 52

9. Ecobags 54

ANEXOS 57

BIBLIOGRAFIA 69

ÍNDICEÍNDICE

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RELATÓRIO

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Todos os dias somos vítimas de inúmeros estímulos visuais que, quer queiramos quer não, condicionam comportamentos, ideologias, rotinas, etc. Absorvemos grande parte dessa informação sem qualquer avaliação crítica prévia, em parte porque se encontra já tão disseminada, isto é, se tornou algo tão comum que a aprendemos a aceitar como natural - o excesso provoca a apatia. Mas quem serão os responsáveis? Assim, e no constatamento destes factos, surgiu este projecto, fruto de um questionamento do papel social do designer de comunicação.

Sendo este responsável por grande parte dos estímulos visuais supracitados, como reage ante a sua contribuição social? Será esta uma contribuição imbuída de uma responsabilidade ética e moral ou limitar-se-á a aplicar os pressupostos de uma lógica de mercado? Sendo o último caso o que mais geralmente se verifica, fá-lo-á de forma consciente ou não, isto é, agirá mais por formatação e/ou ignorância que por verdadeira intenção? A resposta a estas questões não as pretendo resolver através da componente prática deste projecto, reflectindo criticamente sobre elas através do relatório. Servindo como motor de propulsão para o projecto no seu todo, estas questões estimularam a minha motivação no âmbito de um estudo dos recursos do design de comunicação enquanto instrumento catalisador para a activação de uma consciência social, isto é, compreender de que forma a comunicação visual se pode revestir de um carácter activo e educativo - em suma, como poderá o design tornar-se uma prática mais ética.

Em específico, e numa tentativa de compartimentação de categorias de análise, propus-me a explorar o campo da ecologia urbana e consequentes aplicações ao campo do design em estudo.

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IntroduçAão

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Para esse efeito contactei com duas associações culturais portuenses (Agitadoras de Alquimias e Casa da Horta) ligadas à acção ecológica, de cujo contacto resultaram as entrevistas publicadas em anexo. Serviram estas para me contextualizar no âmbito de um campo recém-descoberto, permitindo-me a integração das temáticas abordadas na perspectiva do receptor da informação que eu própria pretendia transmitir.

Este estudo teórico permitir-me-á o enriquecimento estratégico da componente prática do projecto, que por sua vez alimentará, graças à sua componente interventiva, o desenvolvimento teórico através das conclusões que daí poderei tirar.

No âmbito desse mesmo estudo pretendo investigar a génese, bem como a evolução, do conceito de responsabilidade social no design, através de autores como Victor Papanek, Oleh Aristarchus Pranayama, Gui Bonsiepe, etc. Aproveito, aliás, esta introdução, para deixar uma pequena nota biográfica relativa aos mesmos, explicitando, resumidamente, a posição defendida por cada um deles, visto ocuparem uma posição de destaque no desenvolvimento do meu relatório.

Victor Papanek (1927-1998), designer e professor de origem austríaca, foi o maior defensor de uma atitudes social responsável e de uma postura assumidamente ecológica por parte do design. A sua obra “Design for the Real World” (1971) provocou celeuma no mundo do design aquando do seu lançamento, ao expôr abertamente as suas práticas, criticando-as duramente. Afirma Papanek ser o design uma das mais perigosas profissões para a humanidade, daí a exigência de uma maior responsabilidade social e moral por parte do designer. No seu ensaio “Edugraphology : The Myths of Design and the Design of Myths”, Papanek aponta as seis direcções tomadas pelo design gráfico. Por se adaptarem a algumas das posições defendidas, citarei as mais pertinentes na abertura dos capítulos respectivos.

Oleh Aristarchus Pranayama, professor da disciplina de design de comunicação na Faculty of Art and Design da Petra Christian University, pega em muitas das posições defendidas por Papanek, apontando o papel fulcral

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que a educação deverá ter na formação de cidadãos e profissionais do design socialmente e ecologicamente conscientes e responsáveis. Ao longo do seu ensaio “The significance of ecological awareness in visual communication design education”, Pranayama discorre acerca da actual postura assumida pelo design e da sua possível correcção através da alteração de alguns paradigmas estabelecidos pela, entre outros factores, formação de profissionais nesta área.

Gui Bonsiepe (23 de Março de 1934), designer e professor na Escola de Ulm, defende fervorosamente o carácter intrinsecamente político do design, descartando a ideia de uma tão autoproclamada neutralidade do mesmo. Analisando o papel do design no contexto do neoliberalismo económico, aponta-nos uma crise do mesmo, que consiste na importância exagerada atribuída a questões estético-formais em detrimento da função, fenómeno esse decorrente da sua instrumentalização por parte do mercado. Aponta, também, as consequências negandas do autorreferencialismo no seio desta disciplina.

Ao longo desta investigação procurarei estabelecer pontos de ligação entre o já referido conceito de responsabilidade social e as práticas mais estabelecidas da comunicação visual, reflectindo sobre a necessidade de uma aplicação urgente mas gradual do supracitado.

Em suma, o pretendido aqui é realizar um estudo acerca do poder comunicativo do design e de que forma poderá (e deverá) ser esse poder utilizado na obtenção de um objectivo socialmente e ecologicamente responsável.

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“Para desfazer com uma mão aquilo que a outra fez. (Posters anti-poluição, campanhas anti-tabaco)”

Numa primeira fase, e assumindo o design social enquanto portador de uma responsabilidade ética assumida, poderia este projecto, sem conhecimento prévio das implicações adjacentes a tal conceito, ser sob tal rótulo categorizado.

No entanto, questões ligadas à ambiguidade do próprio termo, bem como a sua falta de especificidade, fizeram-me repensar tal rotulação, avaliando os seus pressupostos de forma a poder catalogá-lo o mais correctamente possível.

Prendem-se as questões de ambiguidade supracitadas não só com a definição do termo mas também com a prodigalidade com que é, actualmente, aplicado.

Dirigir-me-ei, por agora, a esta primeira questão. Enquanto que há quem defenda que, ao moldar a realidade envolvente, todo o design é, necessariamente, social - isto é, nascendo e desenvolvendo-se no âmbito da esfera social humana, por definição, todo o design é social - também há quem assim o catalogue aquando da observação da existência de uma clara responsabilidade moral, ética e ecológica motivando a sua criação (esta é, por norma, a definição mais comummente aceite).

Mesmo sendo contraditórias, ambas as direcções apontadas não satisfazem os meus parâmetros de categorização.

Embora o design socialmente responsável exclua por definição a transmissão de mensagens de cariz dúbio a um nível moral, parece-me que tal definição, a ser aqui aplicada, não transmite com total precisão a especificidade deste projecto.

Por mensagem de cariz moralmente dúbio refiro-me à transmissão acéfala

Design Social vs Design de ConscienciaçizaçAão Social

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de informação que apela a um consumismo desenfreado, adormecendo consciências face a uma realidade socialmente irresponsável - a comunicação age, assim, a favor de uma lógica de mercado que pouco ou nenhum valor humano atribui a quem a recebe. Esta lógica contribui e constitui parcialmente um fenómeno social designado por “ ignorância plural” (designação cunhada por Daniel Katz and Floyd H. Allport). Este fenómeno caracteriza-se pela observação de uma situação onde a maior parte dos membros pertencentes a um grupo rejeita secretamente a norma, assumindo, ainda que incorrectamente, que esta é aceite pela maioria. Assim, a consequência é a inacção por parte deste mesmo grupo.

Porém, apenas este fenómeno não é o suficiente para explicar, na minha opinião, a totalidade do fenómeno de um consumismo abusivo, de uma sociedade falha em normas morais, éticas e ecologicamente responsáveis. Questões ligadas ao ambiente envolvente, à omissão de informação, à educação e outros fenómenos têm aqui o seu peso considerável, não devendo ser assumida uma postura de culpabilização do indivíduo, mas sim do seu contexto.

Assim, e segundo Paul Nini, é necessário aproveitar o nosso papel enquanto “comunicadores persuasivos na cultura do consumo” e reverter o uso desse poder a favor de uma lógica consciente, consistente e socialmente responsável.

Para além de estudar as possíveis aplicações das permissas de um design social, ética e ecologicamente responsável, este projecto pretende ainda questionar e testar a ligação entre o processo e o meio à mensagem, isto é, utilizar as ferramentas da comunicação visual enquanto veículos de informação consciencializadora, constituindo-se enquanto agente de um apelo a uma consciência crítica. Através de diferentes media, pretendo demonstrar e, principalmente, estudar, são as diferentes possibilidades de inclusão de uma ambição social na própria mensagem difundida pela meio. Uma mensagem que, não sendo neutra, assume abertamente uma posição positiva à consciencialização ecológica. Convém, no entanto, clarificar que ao assumir uma posição não pretendo impôr uma opinião ou advogar um julgamento, apenas abrir caminho à interpretação e à reflexão.

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Em suma, este ensaio pretende distinguir entre a necessidade do aproveitamento do poder comunicativo do design enquanto catalisador de uma mudança social positiva e uma postura conformista que designa como acção social no design apenas aquilo que um impacto imediato provoca num contexto de sociedade. Por exemplo, é considerado design social a criação de um código de símbolos formais que facilite aos daltónicos a percepção de signos cromáticos. Não desvalorizando a importância de tal iniciativa, creio que o termo design social deveria abranger um campo mais vasto de influência, ser utilizado enquanto ferramenta activa, crítica e informativa no âmbito de um interesse social mais vasto e não apenas quando a uma minoria se refere (posição defendida, aliás, por Victor Papanek).

Por fim, o design social surge muitas vezes em contextos cuja integridade do designer que o produz é dúbia. Isto é, surge muitas vezes apenas como uma espécie de caridade, uma concessão ao altruísmo, mas apenas se tal acção for celebrada através de prémios, reputação ou lucros.

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o design e a responsabilidade social

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O Autorreferencialismo

“Para providenciar prazer ou catarse visual às classes ensinadas a responder “apropriadamente”.”

Gui Bonsiepe afirma que “a pessoa do designer adquiriu mais importância que o próprio design” e que é hoje possível assistir-se a uma verificação do crescimento anómalo do autorreferencialismo no seio deste campo de actividade.

Tal fenómeno dá-se, julgo eu, tanto pela proximidade do design à arte (tornando-se comum o erro da percepção deste enquanto forma de expressão pessoal), como pelo culminar de uma absorção dos actuais paradigmas ideológicos de mercado - em especial, no que à competição diz respeito. A necessidade de afirmar a diferença face aos seus pares relegou para segundo plano aquelas que deveriam ser as principais funções do design - um serviço responsável à sociedade, ao invés de uma mera ferramenta de expressão e criatividade pessoal, surgindo-nos assim o ego em detrimento da função. Acusa Bonsiepe que, no seio dos integrantes deste fenómeno, é desconfortável a pergunta “para que serve um produto?” Aliás, qualquer questão ligada à função, ou, por mais remotamente ligada que esteja a uma preocupação social por parte do design é, por estes mesmos praticantes, relegada para segundo plano e, consequentemente, desacreditada e condenada ao esquecimento confortável. Isto é, apesar de existir, a preocupação com a função aparece desligada de imperativos morais caso estes prejudiquem a componente formal do produto.

o design e a responsabilidade social

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Este grupo afirma a neutralidade do design face às questões sociais, éticas e ecológicas. Porém, surgindo inserido no contexto da actividade humana, até que ponto se poderá falar de uma verdadeira neutralidade do design? Até que ponto a sua suposta neutralidade não age apenas enquanto um silenciador de consciências, permitindo ao design um crescimento egoísta?

Esta lógica gera design que se preocupa apenas com a forma, com a expressão de um individualismo incompatível com os conceitos de responsabilidade social. Ignora, aliás, um dos pólos da dupla dimensão de qualquer artefacto, que, como escreve a historiadora Raimonda Riccini, possui, para além da dimensão instrumental, a dimensão simbólica - condicionada, impreterivelmente, pelo contexto cultural, político, social, religioso, etc que lhe surge associado. Daqui se retira a conclusão que seja uma falácia a assunção de uma verdadeira neutralidade do design.

As consequências desta explosão do ego no design encontram, segundo Papanek, a sua expressão máxima na cisão entre o design e a população. Promovendo a ideia de uma expressão egoísta da criatividade artística do designer, esta disciplina surge, actualmente, associada a um conceito de beleza criado por uma cultura de classes superiores, a chamada “cultura dominante”. Assiste-se, assim, ao fenómeno denominado pelo sociólogo Pierre Bourdieu de “violência simbólica”. Disto resulta, necessariamente, um desfasamento entre aquele que deveria ser o papel do design e aquele que actualmente desempenha, facto pelo qual tem sido acusado do já referido afastamento da população.

Assim, a função do design não deverá ser apenas a de tornar o mundo mais estético. A criatividade, embora importante enquanto factor central na resolução de problemas, não deverá surgir associada ao ego, para que possa encontrar soluções eficazes de aproximação do design à participação.

Esta questão ganha contornos aquando da fase de ensino, em algumas instituições académicas, através da instauração de uma atmosfera de competição mal direccionada entre os estudantes - estes não recebem, na generalidade, quaisquer incentivos no sentido do bom prestamento de serviços, de uma, e segundo James Dyson, “solução inteligente de problemas”, mas sim no sentido de demonstração de um sentido estético ou expressão pessoal mais apurados.

Diz-nos Herbert Spencer que muitas escolas de arte e design se contentam

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em “produzir” apenas profissionais que executam habilmente o seu mestér, descurando a educação para a solução criativa e lógica de problemas.

Conclui-se, assim, que o papel de algumas instituições de ensino contribui para a perpetuação deste mito, deste star system cuja única preocupação consiste na “esteticização” do mundo em prol de um reconhecimento que se traduza na forma de uma carreira brilhante e estabelecida, vencedora de inúmeros prémios cujo significado é tão ou mais supérfluo quanto a prática que glorificam.

O Papel actual do Design

“Para persuadir as pessoas a comprar coisas que não precisam com dinheiro que não têm para impressionar quem não se importa.”

Antecedendo o acto da exploração do papel actualmente desempenhado pelo design, interessa proceder a uma pesquisa histórica, isto é, perceber a sua génese e evolução primordial, ainda que de uma forma breve.

Apesar de, oficialmente, a história do design começar apenas em 1919 com o surgimento da Bauhaus de Walter Gropius, podemos traçar as suas origens ao século XIX e associá-la aos nomes dos pensadores John Ruskin e William Morris, que, na época Vitoriana, reflectiram sobre questões da arte, arquitectura e design relevantes ao pensamento do contexto em estudo. Ambos se identificavam com uma posição fortemente anti-capitalista.

John Ruskin (8 de Fevereiro de 1819 - 20 de Fevereiro de 1900) estabeleceu-se enquanto crítico de arte, pensando já, com relativo interesse e preocupação questões ambientais e de sustentabilidade. Ruskin acreditava que, melhorando esteticamente o mundo, poderia contribuir para a sua melhoria social.

William Morris (24 de Março de 1834 - 3 de Outubro de 1896), designer, artista, escritor e notável pensador socialista, considerava as artes como algo ideologicamente democrático, alargado e multidisciplinar, criticando a separação das mesmas do público em geral, e acusando-as de individualismo. No seu trabalho editorial, procurava a unidade entre todos os elementos da

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página, reflectindo assim, graficamente, as suas posições políticas.Em suma, o que importa daqui reter é a natureza fortemente política do

pensamento socialista de ambos, que tanto influenciou o desenvolvimento primordial da disciplina do design.

Assim, em 1919, surgiu a Bauhaus, cujo objectivo passava pela administração de um ensino direccionado para o socialmente útil, para a construção de uma realidade tecnológica que contribuísse para a melhoria social e ambiental.

Após o seu encerramento, surgiu a Escola de Ulm, contemporânea à explosão dos media, ou, como a denomina Gui Bonsiepe, “indústria de comunicação”. Inserindo este contexto no seu programa, esta escola procurava estudar a relação do design com a ciência, removendo do seu currículo disciplinas ligadas ao movimento Arts and Crafts.

Como podemos então verificar, na sua génese, o design (embora nem sempre a prática reflectisse a teoria) surgia fruto de uma preocupação política assumidamente social, reflectindo nos seus processos a inclusão de um pensamento eticamente responsável. Como podemos explicar, então, a apropriação das ferramentas persuasivas do design pelas estratégias de marketing, que as trata, segundo Bonsiepe, como “auxiliares de segunda ordem”?

De acordo com o autor supracitado, existirá, para além da sobreposição cronológica, uma relação entre a expansão neo-liberal e a actual postura mercantilista do design. Apesar da resistência inicial oferecida a este processo, a comunicação visual deixou-se, gradualmente, infectar por uma lógica de mercado consumista e exploradora e segue agora, segundo Victor Papanek, direcções que podem ser resumidas da seguinte forma: o design gráfico, hoje em dia, é utilizado enquanto ferramenta de persuasão ao consumismo desenfreado, através da promoção de estilos de vida associados a determinado produto, caracterizando-se a sua linguagem enquanto elitista, uma vez que o “bom gosto” do designer é o “bom gosto” da classe dominante. A sua postura é contrária à ecologia, fazendo uso de materiais prejudiciais ao ambiente, tentando redimir-se da sua postura através de concessões pontuais ao altruísmo.

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Inserção no mercado

Servindo principalmente o motor que alimenta a sociedade de consumo, a comunicação visual ajuda a perpetuar mitos adjacentes à lógica capitalista. Assim procedendo, o designer de comunicação desliga do seu trabalho possíveis preocupações éticas. Isto é, concorre directamente para o estabelecimento de uma determinada ideia, promovendo visualmente um conjunto de conceitos e princípios que, à custa de tal divulgação, deixaram de ser questionados e são hoje aceites como norma por parte de uma grande maioria.

Importa aqui esclarecer que a culpa, ainda que alguma lhe possa ser imputada, não será do designer enquanto indivíduo. Em primeiro lugar, porque é apenas mais uma engrenagem num sistema gradualmente mais vasto e complexo, dominado por corporações gigantes que se apropriam dos serviços do design sem respeito pela sua integridade.

Em segundo lugar, porque se não se questiona activamente e criticamente acerca de possíveis implicações e consequências do seu trabalho, parte dessa culpa deverá ser atribuída ao seu contexto. Quer isto dizer que, encontrando-se no seio dessa mesma sociedade, submetido aos seus padrões e normas, parte dessa consciência crítica encontra-se abafada no âmbito destas matrizes. Referindo Papanek, estes mitos foram perpetuados através da sua educação, bem como da sua formação enquanto designer. Assim, e tal como é defendido também por Pranayama, parte desta mudança e construção de consciência crítica deverá ser instigada através de uma formação possuidora de uma forte componente de responsabilidade social, ética e ecológica.

Se a situação acima mencionada não é suficiente para apelar ao altruísmo da população em geral, seja feito o apelo ao ego - este mesmo sistema capitalista tende a colocar o seu foco no valor capital do indivíduo, ao invés de o considerar enquanto possuidor de valor humano. Oleh Pranayama contrapõe precisamente os conceitos de pessoa e consumidor. O design deve, na sua opinião, incluir os paradigmas de comércio e sociedade, bem como um novo - o ecológico - agindo em prol de sociedades de pessoas, não de consumidores.

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Provas históricas

A lógica predominante é assumidamente a contrária, visto que não há uma preocupação directa com os valores morais associados à mensagem perpetrada, utilizada geralmente para obscurecer a verdadeira realidade do produto/serviço cujo consumo publicita. Uma prova desta afirmação poderá ser encontrada na história do branding, disciplina tão importante no contexto do design de comunicação. Este surgiu na tentativa de estabelecer uma imagem de marca de comida enlatada para os militares e, através desta estratégia, levar as pessoas a consumir este tipo de produtos, compensando através da narrativa visual a naturalidade que lhes falta a nível de confecção. Na Arte Nova, este processo atingiu o seu auge - graficamente, o produto em si era relegado para segundo plano, interessando mais a promoção de um determinado estilo de vida, de uma realidade onírica que a este subrepticiamente assim se associava.

Porém, o branding não foi a única área do design que cresceu e encontrou significativas mudanças de paradigma aquando do período da I Guerra Mundial - a publicidade como hoje a entendemos também registou aqui o seu nascimento. Segundo Joshua Blackburn, no seu artigo “Design can Save the World”, não é coincidência que o pai da publicidade moderna tenha sido também o chefe do de propaganda do departamento de guerra dos EUA. Este processo permitiu às corporações a percepção do verdadeiro poder influenciador do design, pelo que foi a partir daí que o passaram a utilizar enquanto ferramenta integrante do seu processo de expansão económica.

Concluindo, esta falta de transparência nos processos de comunicação visual, posta ao serviço de interesses mercenários, choca em todas as frentes com as suas origens socialistas, faltando-lhe honestidade até na admissão da sua actual postura política, negada em prol de uma neutralidade inexistente.

O Poder do design

Educados e habituados a uma lógica de imediatismo, as nossas acções reflectem a necessidade de uma satisfação a curto-prazo. Gradualmente mais sequiosos de estímulos, perdemos a noção de consequências que se traduzam

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após o impacto inicial dos mesmos. O comunicador visual não é excepção - as consequências mais profundas do seu trabalho diluem-se numa lógica de superfície. Associado à já referida elitização do design, este processo torna-se uma perigosa ferramenta de controlo social. Segundo Pranayama, podemos dizer que o nosso trabalho está concluído após a resolução do problema do cliente. Esta perspectiva imediatista impede uma correcta planificação e consciência do impacto social e ecológico que esse trabalho poderá ter. Importa por isso colocar um certo número de questões e a partir daí desenvolver o trabalho, não satisfazendo apenas o cliente, mas também um imperativo moral relacionado com a responsabilidade social.

As “Mitologias” de Roland Barthes

Esta reflexão sobre o poder do design de comunicação não é novidade, e surge inclusivamente noutros contextos disciplinares, como é, por exemplo, o caso da Semiologia. Ao reflectir sobre o papel do design de comunicação, interessa atribuir-lhe o papel de “mitologista”, tal como é definido por Roland Barthes. Barthes reflecte na relação que o “mitologista” adquire face à sociedade e às mitologias nas quais se centram os seus estudos : este, ao discriminar-lhes todos os seus possíveis significados, automaticamente se excluí destas mesmas estruturas. O mito surge como a “transformação de valores históricos específicos da classe regente em verdades naturalizadas, eternas e universais”(Neil Badmington). Na sua obra, “Mitologias”, Roland Barthes denuncia uma série de mitos burgueses e a inserção do mesmo no âmago de uma sociedade que por ele se deixa normalizar e universalizar. Enquanto conceito basilar de toda a obra, creio ser fundamental uma definição mais aprofundada do conceito de mito, segundo Roland Barthes, e de que maneira a criação do mesmo se relaciona com a disciplina da Semiologia. Para tal, é necessário efectuar antes um esclarecimento acerca do que é o signo linguístico, tal como Ferdinand de Saussure o definiu, no seu “Curso de Linguística Geral”(1915).O signo linguístico não é senão a combinação arbitrária de um conceito (o significado) e uma imagem sonora/representação linguística (o significante). Extrapolando desta definição a sua própria ideia de mito, Barthes explica que este tem as suas raízes na linguagem, ao qual algo é posteriormente adicionado.

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Assim, enquanto que uma palavra (ou outra unidade linguística) é formada pela conjugação de um som com um significado, gerando um signo, no mito o signo é utilizado enquanto significante, sendo-lhe posteriormente adicionado, não arbitrariamente, um novo significado, através de um conjunto de imagens/ideias cuidadosamente manipulados pelos “fabricantes” de mitos (estruturas sociais que provocam impacto sobre um vasto número da população, como os media) para actuar nas vontades e valores de uma sociedade que por eles se deixa manipular sem aparente resistência. Através das pesquisas efectuadas no âmbito da antropologia estrutural, concluí que tal fenómeno talvez se verificasse através da proposição de Lévi-Strauss de que a cultura se define por um conjunto de signos de tal forma partilhados que “controlam” e estruturam o funcionamento intelectual. É referido por Baudrillard que “a sociedade se faz maternal para que melhor preserve uma ordem de coerção”. Que ordem fictícia é esta? Recorrendo a Barthes e à sua obra “Mitologias”, respondo que esta corresponde à ordem social normalizante do signo, habilmente preservada através de mitos (surgidos devido à necessidade de tornar perpétua a imagem de uma sociedade que deve estruturar a sua conduta pelas ideologias das classes regentes). Estes mitos, segundo Baudrillard, levam-nos a crer que a sociedade se adapta totalmente a nós para que nela nos integremos, reciprocidade essa que é meramente fictícia.

O Poder persuasivo do Design

Daqui retiramos que o poder do Design se revela extremamente efectivo na propagação de valores e ideais. A consequência? A exploração de milhares de seres humanos, à custa de um adormecimento da população face a uma lógica estabelecida - estabelecimento para o qual a comunicação visual contribuiu parcialmente. O design visual é utilizado massivamente pelas grandes multinacionais que percebem o seu poder de comunicação de ideais. Ora, grande parte destas mesmas multinacionais que se tornaram, graças ao design, tão estabelecidas no nosso quotidiano visual enquanto marcas, em prol dos lucros não se importam de sacrificar o ambiente e até mesmo vidas humanas. Vemos aqui o design a contribuir para o estabelecimento de uma lógica nociva, ao mesmo tempo que “disfarça” os seus aspectos negativos. O poder

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do design consiste precisamente nessa capacidade de manipulação e persuasão, contribuindo, actualmente, para o estabelecimento de uma lógica de apelo ao hiperconsumismo.

Assim, surge a questão que impulsionou todo este projecto - de que forma poderemos inverter esta tendência obscurantista e utilizar o poder do design para um objectivo socialmente responsável? Referindo novamente Joshua Blackburn, no seu artigo “Design can Save the World”, o papel do design enquanto ferramenta de propaganda ao consumismo surgiu posteriormente - na sua génese esteve sempre a mudança política e social. Blackburn defende, assim, um retorno às origens, o design utilizado como veículo para a propagação de ideais sociais e políticos, e não apenas uma arma de negócio.

Tal como foi concluído, é falacioso falar-se de uma neutralidade do design, pelo que daqui poderemos retirar que, qualquer que seja a sua origem, todo o design terá um impacto. E está na mãos de quem o produz o controlo parcial (parcial porque é imprevisível a reacção do público a determinado produto ou mensagem) se este se trata de um impacto positivo ou negativo, ultrapassando, nesta análise, os estigmas de uma visão contemporânea de resultados a curto- -prazo. Assim, é necessária uma reforma na educação do design e a inserção de disciplinas que possibilitem a reflexão crítica no âmbito de uma mudança de paradigmas, fomentando o crescimento de uma componente ética tão necessária à utilização de qualquer ferramenta de poder. É imperativa a criação de um esforço consciente para um afastamento do design dos mitos estruturantes, forçando-o a percorrer o caminho contrário, de encontro à participação social activa no seu processo.

O poder catalisador do design, tal como anteriormente, poderá voltar a ser utilizado enquanto ferramenta de mudança social positiva. Porém, enquanto for escravo de ditames corporativistas, esse poder encontrar-se-á virado sobre si mesmo, orgulhoso do seu esplendor e ignorante da sua posição de mero lacaio, tal qual o grupo de revolucionários caricaturado por Fyodor Dostoevski em “Demónios”.

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componente prática

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Ecologia Urbana

Por definição, a ecologia urbana é uma subdisciplina da ecologia que estuda a relação entre os organismos naturais com o ambiente urbano, percebendo como e de que forma são estes afectados pelo último.

Porém, no processo de desenvolvimento deste projecto, foquei-me no estudo de um ramo da ecologia urbana menos canónico, menos científico, mas, porém, mais participativo. Procurei contactar com iniciativas no âmbito do centro urbano do Porto que se pudessem conjugar com uma tentativa no sentido de promover uma atitude mais ecológica por parte dos cidadãos, estudando alternativas urbanas a práticas geralmente associadas a um modo de vida mais rural.

Interessou-me estudar de que forma estas iniciativas, geralmente conectadas a associações culturais, procuravam uma alternativa ecoconsciente ao estilo de vida consumista estabelecido, adaptando ao ritmo urbano as suas práticas, ideais, filosofias e objectivos.

Assim, pelo que pude depreender, as iniciativas tomadas por parte destas associações podem passar pela apropriação de terrenos urbanos desaproveitados com o intuito de os cultivar, pela restauração de edifícios devolutos através de alternativas ecologicamente responsáveis, pela realização de workshops nos quais procuram transmitir à população valores e práticas ecoconscientes, ou, até mesmo pela promoção de um regime alimentar vegetariano.

A horta urbana será, talvez, a primeira particularidade deste género de iniciativas que nos vem à cabeça quando a estas fazemos referência. A adaptação

componente prática

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de práticas agrícolas rurais e totalmente naturais, por oposição à produção agrícola em massa através do uso de agentes químicos nocivos, o recurso a técnicas como a permacultura (disciplina que promove a exploração sustentável da terra e o equilíbrio do ecossistema), ou a aplicação das filosofias de Masanobu Fukuoka (trabalhar a terra o menos possível) reflectem uma atitude consciente da importância da preservação de uma identidade local resistente à produção massificada que efeitos tão nocivos tem aos níveis ambiental e social. Estas hortas são, geralmente, mantidas num regime de auto-sustentabilidade, promovendo a troca de ideias e/ou produtos com a comunidade.

O que mais me interessou foi, precisamente, e até pela sua conexão com o projecto que pretendia desenvolver, estes laços criados pelas associações com a população circundante, gerando, através de um sistema de workshops (entre outros), um interesse gradualmente crescente por estas áreas, consciencializando, ainda que não através de uma atitude doutrinária, a população para práticas mais sustentáveis cujo conhecimento se foi perdendo com a introdução no ritmo urbano. Outro ponto a reter desta interacção é o esforço aplicado no sentido do estabelecimento de um sentido de comunidade, tão importante à propagação e desenvolvimento de ideias e soluções inovadoras.

Esta exploração levou-me ao questionamento de outras manifestações, menos perceptíveis talvez, entre ecologia e urbanismo, despertando o meu interesse no sentido de explorar possíveis intervenções gráficas no âmbito da consciencialização para esta realidade. De que forma poderia eu obter, através da conjugação da forma, função e mensagem, uma adaptação gráfica aos princípios da ecologia?

Em suma, fortemente enraizados nos princípios destas associações culturais encontram-se ideais ligados à preocupação da manutenção do ecossistema urbano a um nível que, não sendo exclusivamente ecológico, se caracteriza pelo seu carácter de responsabilidade social e de luta pela preservação de um ambiente comunitário saudável, algo que eu procurei transpôr conceptualmente através do meu projecto.

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Objectivos e metodologia

Após o estabelecimento dos limites do campo de actuação da componente prática do projecto, ficou por decidir qual ou quais os media que, no âmbito do Design de Comunicação, faria sentido explorar na transmissão da mensagem pretendida. Isto é, partindo da área da ecologia urbana e responsabilidade social, qual seria o resultado gráfico da minha reflexão.

Numa primeira fase, tornou-se imperativa uma pesquisa de campo, pelo que efectuei entrevistas às associações culturais anteriormente mencionadas (Agitadoras de Alquimias e Casa da Horta). Desta forma, pude perceber quais as suas especificidades e inserir-me num contexto para mim relativamente novo. As perguntas por mim endereçadas às supracitadas associações procuraram estabelecer um carácter de pesquisa, ao invés de transmitirem o reflexo de uma tomada de opinião, com o objectivo de posicionar no contexto da associação quem quer que, como eu, pouco ou nenhum contacto tivesse experenciado com estas realidades.

Na associação Casa da Horta, são de salientar as actividades desenvolvidas em comunidade com o intuito de fomentar o interesse pelas alternativas sustentáveis ao mercado de consumo estabelecido e a preocupação com a origem dos materiais utilizados na confecção das refeições vegetarianas que servem diariamente.

Despertou-me o interesse principalmente a associação Agitadoras de Alquimias, uma vez que uma das suas integrantes, com uma licenciatura em Arquitectura, procurava adaptar os conhecimentos adquiridos no contexto deste curso a alternativas ecológicas à reabilitação de uma habitação devoluta. O meu interesse foi despertado por, precisamente, poder estabelecer um certo paralelismo entre estes objectivos e aqueles patentes neste projecto.

Pelo que pude depreender, após as entrevistas concluídas, ambas as associações atribuem um poder muito grande à força de mudança social que é a comunidade. Resumidamente, a combinação da possibilidade da aplicação de uma disciplina como a Arquitectura à resolução de problemas ecológicos, bem como o desafio de atingir a comunidade com o intuito de provocar movimento numa direcção sócio-ecológica mais responsável e sustentável, forneceram os

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ingredientes conceptuais necessários para o arranque da reflexão prática.Se numa primeira fase me encontrava decidida a explorar a animação

como forma de transmissão de algumas ideias-chave utilizando como base as entrevistas efectuadas, rapidamente me apercebi que as condicionantes temporais me não permitiriam atingir os resultados ideais. Após uma conversa com o meu orientador, o professor Ricardo Lafuente, ficou decidido que a componente prática se situaria dentro de um universo de experimentação, através da utilização das diversas ferramentas associadas ao design de comunicação.

Assim, a relevância prática do meu projecto prende-se sobretudo com a exploração gráfica de diferentes meios de atingir um objectivo: o de promover uma consciência ecológica e social não só no campo do design de comunicação, mas também a um nível mais vasto, acessível a quem quer que entre em contacto com a mensagem. O objectivo assumido é o de reflectir experimentalmente sobre as várias vertentes do design gráfico e a sua capacidade de fazer passar uma mensagem, testando o poder do design; pegar no poder de influência habilmente exercido pela comunicação visual e tornar esse processo de transmissão de ideias transparente e acessível.

Importa referir que, com estas experiências, a ideia é, precisamente, a de perceber de que forma estes media exercem a sua influência, quais os mais efectivos segundo os objectivos a que me proponho, quais as suas diferentes particularidades e de que forma poderei explorar estas conclusões no âmbito de uma adaptação de estratégia.

Tem também interesse, e assumindo o carácter experimental, perceber quais as estratégias que falham e perceber porquê - seja através da falta de acessibilidade da mensagem, problemas na adaptação da estratégia de comunicação utilizada ao público-alvo ou mesmo por dificuldades técnicas. Por exemplo, uma das estratégias testadas foi a do graffiti de musgo - uma técnica de guerrilla que não teve os resultados expectáveis devido a uma falha na preparação dos materiais e que, devido à morosidade do processo de crescimento do musgo, tornou impossível uma nova tentativa.

Esta procura era, porém, necessária, pois outro dos objectivos auto-propostos foi a exploração de materiais que me ajudassem a transmitir a

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mensagem. Isto é, de que forma pode o design ajudar à libertação crítica social, à dita consciencialização, seguindo, à partida, as premissas de uma sustentabilidade prática? Ou seja, como poderia eu moldar o projecto materialmente conforme os ideais que o próprio advoga - a forma segue o conteúdo/mensagem. Não basta transmitir a ideia, convém também aplicar as suas premissas. Uma das soluções encontradas foi a supracitada experiência no campo da chamada guerrilla gardening. Outra foi, por exemplo, e na componente projectual prática que envolvia o uso de autocolantes, substituir o papel de autocolante comum por papel reciclado colado através de uma substância caseira produzida a partir de farinha, água e vinagre.

Neste processo de pesquisa de soluções alternativas, deparei-me com algumas dificuldades a nível de soluções de impressão. Porém, o abandono completo das mesmas não era, para mim, uma opção. Segundo Susan S. Szenasy, editora-chefe da revista Metropolis, a solução não é a eliminação completa destes processos, antes uma reformulação dos seus mecanismos e materiais, por forma a torná-los ecologicamente mais seguros.

Assim, possíveis soluções passariam pela impressão através de tintas de soja, que, para além da menor emissão de químicos tóxicos para a atmosfera aquando do processo de impressão, são ainda facilmente removíveis aquando do processo de reciclagem; pelo cuidado na escolha do papel, sendo factores diferenciadores a sua reusabilidade, a sustentabilidade dos processos de exploração dos recursos florestais de origem e o tempo que se demora a decompôr na atmosfera, e pela selecção adequada e responsável de materiais, procurando evitar o desperdício.

No entanto, as tintas de soja não se encontram ainda disponíveis a uma escala mundial e a falta de transparência no processo de venda do papel tornaram pouco acessíveis a adopção das soluções desejadas, não tendo outra escolha senão a de recorrer a alternativas mais verdes apenas quando a realização prática das ideias a isso se propiciava.

Houve uma tentativa de exploração dos diversos campos de acção do design, procurando imaginar possíveis situações de trabalho para cliente que se inserissem nas premissas estabelecidas (por exemplo, a produção do artwork de um cd), situações de trabalho auto-proposto cuja função exclusiva fosse a transmissão de uma mensagem através do humor (por exemplo, o desenho de

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embalagens de kits de sobrevivência) e, até mesmo, culture jamming ao estilo dos Adbusters. Neste ponto, convém ainda referir a inserção da minha participação no concurso “Recicl’arte”, promovido pela Sociedade Ponto Verde, no âmbito do projecto. Este concurso consistia no redesign dos já conhecidos ecobags e a sua inserção justifica-se pois considerei que esta proposta deverá ser considerada enquanto reflexão gráfica do papel do Design de Comunicação na consciencialização para processos ecológicos no seio de um contexto urbano.

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Esta minha pesquisa e exploração gráfica permitiram-me, sobretudo, uma perspectiva mais alargada das possibilidades comunicativas ao meu dispor através de um uso consciente das ferramentas visuais associadas ao design gráfico. A percepção do seu poder cristalizou certas conclusões (gráficas e conceptuais) justificativas de uma tomada de posição.

Se numa fase anterior ao início e desenvolvimento deste projecto a minha opinião relativa à neutralidade do design de comunicação se encontrava ainda mal definida, num estado de latência cuja falta de informação não tinha ainda permitido desenvolver, a sua convicção fundamentou-se aquando deste processo de estudo e da análise do fenómeno comunicativo contemporâneo.

Demarcando-me das aproximações mais fundamentalistas e radicais associadas ao activismo ecológico e social (o que, na minha opinião, mais do que atingir a população, estimulando o seu pensamento crítico, a afasta), creio ter atingido os objectivos auto-propostos relativamente à adopção de uma postura mais descontraída e menos extremista, procurando afastar-me o mais possível de estereótipos que adoptam o tom doutrinário e o julgamento como estratégia.

Admitindo, e como já foi referido, que todos nós nos inserimos no contexto de um sistema capitalista, julgo ter clarificado que a não-isenção na posição tomada face a questões sócio-políticas e culturais, não implica, necessariamente, a não-isenção do julgamento doutrinário, pois não faz sentido apontar o dedo quando todos estamos, de uma forma ou de outra, envolvidos (e muitas vezes de maneiras que não temos, nem nunca teremos, consciência). Procurando a adopção de uma postura inclusiva, que passe positivamente a informação e, em determinados casos, a utilização de um humor crítico que não procura ofender, acredito ter cumprido a premissa de que a mordacidade não tem, necessariamente, de ser ofensiva e/ou chocante.

Explorando diversos media e processos comunicativos, a particularidade a destacar deste projecto é a sua capacidade de interagir, a diversos níveis, com o meio, permitindo um estudo contínuo de conclusões que se definem pela pluralidade de alternativas conceptuais e materiais, aperfeiçoando, por sua vez, a definição de estratégias.

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CONCLUSao

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componenteºprática

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componenteºprática

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A minha ideia para esta experiência foi a de reflectir graficamente sobre a “contaminação”, utilizando os autocolantes como metáforas dessa mesma propagação, dado que o aumento da poluição dos solos prevê um crescimento destas espécies - uma versão contemporânea das pragas do Egipto.

CONTAMINAçãao

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GRaffiti de musgo

Através esta experiência pretendia espalhar os Direitos Universais da Natureza (versões por mim adaptadas de exemplos retirados da Declaração Universal dos Direitos do Homem) pela cidade do Porto, utilizando a técnica de guerrilla gardening denominada por graffiti de musgo. Infelizmente, a preparação da receita encontrada não correu conforme o desejado, pelo que não obtive os resultados esperados. Deixo, no entanto, as fotografias da experiência, por considerar a sua importância no processo global do projecto.

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GRaffiti de musgo

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Cartaz da indiferença

Este cartaz pretende mimetizar um cartaz de propaganda farmacêutica, num estilo algo vintage, apelando à cura para todos os males, a indiferença, atitude que procuro apontar à sociedade actual e que todos acabamos por usar como arma de defesa, muitas vezes sem nos apercebermos das suas consequências.

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Cartaz da indiferença

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sede mundial (InFografia)

Através desta infografia pretendo transmitir uma informação clara de factos que à escassez mundial de água se referem. Optando por uma linguagem gráfica que prima pela simplicidade, o objectivo é o de captar a atenção do espectador, chamando-o a atenção para algumas situações que o surpreendem pela sua escala, previamente ignorada.

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brochura turística da agência abreu

Adoptando uma linguagem em tudo semelhante à utilizada pela Agência Abreu, procuro explorar o efeito de culture jamming, sensibilizando para a existência de uma acumulação de plástico de proporções gigantescas no meio do Oceano Pacífico através da sua publicitação como possível destino de férias. O objectivo é atingir o público-alvo pela surpresa e inesperado.

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FANZINE 'BLUE AS HELLã'

Apropriando-me da frase “Goddam money. It always ends up making us blue.” da obra “The Catcher in the Rye” de J.D. Salinger, desenvolvi uma série de ilustrações que pretendem relaccionar os efeitos negativos do sistema económico neo-liberal com a extinção de algumas espécies.

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KITS DE SOBREVIVÊncia

Através da criação do “Pack Camelo” e do “Pack Sereia” pretendo alertar para dois dos maiores perigos ambientais que ameaçam actualmente o planeta: a desertificação e a subida do nível dos oceanos.

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CD ã'ANIMAL AMNESTY'

Este projecto pretende reflectir acerca do perigo de extinção que ameaça actualmente diversas espécies terrestres. Através da criação de um imaginário que remete para as compilações artísticas com um objectivo social, imaginei possíveis formações musicais constituídas pelas supracitadas espécies, escrevendo as letras da sua perspectiva relativa aos perigos que ameaçam a sua existência. Como exemplo, deixo a letra elaborada “pelo” lince ibérico.

Web Lynx - Lest the mighty shot might kill

Oh, how I’ll miss the minty breezeThe eerie dance of leavesThe feeble encounter of feathersThe song that winter weavesAnd heaving my sorrows darklyHeap them in song I willLest the mighty shot might killThe wind that starts the mill.My shadow’s but a swift swindleIn the pale azure of dawnThe shot then blesses lightlyThe lofty echo’s spawn

Rosemary stains the air with her mistress-like perfumeThe eglantine’s complexion, is one that I assumeAnd this completeness in non-beingLest I cease to live at allPrevents me from receivingA shot from minds so small.

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ECOBAGS

Desenvolvi este projecto no âmbito do concurso “Reclicl’arte”, promovido pela Sociedade Ponto Verde, procurando a criação de linhas simples, que facilitassem a distinção das diversas embalagens e respectiva separação.

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anexos

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anexos

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Entrevista realizada à associação Agitadoras de Alquimias, no dia 10 de Abril de 2012. Membros presentes: Riça, Sílvia e Pedro.

Lídia - Em primeiro lugar, e para quem n conhece as Agitadoras, como apresentariam a associação e respectiva actividade?

Riça - Como é que apresentamos as Agitadoras? As Agitadoras são um projecto que surgiu a partir do momento em que vemos com uma certa experiência e com uma certa vida e conhecimento a sociedade em que vivemos. E, no fundo, a nossa experiência de vida que rejeita o estilo de vida consumista, a crença que os recursos naturais são infinitos e que estão neste planeta para durar até à eternidade, sabendo nós que não é verdade, a exploração, por exemplo, para nós aqui na Europa... podemos viver bem, não nos damos conta, mas sabemos que é verdade, que estamos a explorar 80 % da humanidade, sobretudo nos três continentes mais desfavorecidos...e uma série de coisas, seja por esse estilo de vida que nos é imposto hoje em dia; nós passámos um bocado da crítica à posta em prática de uma alternativa, porque também achamos que, ou somos nós as pessoas que vão pôr em prática os seus ideais... e não vamos estar à espera que ninguém venha fazer por nós. Por isso começámos. Este é um princípio muito básico mas acho que muito importante daquilo que nós somos.

Lídia - Pois, tinha precisamente aqui apontado que a vossa associação surgiu enquanto uma procura de alternativas ao estilo de vida consumista. Acreditam que este sentimento se poderá propagar nos próximos tempos, gerando mais iniciativas do género?

Riça - Isso só as pessoas é que podem falar por elas, não é? Acho que de qualquer das formas, da ideia de que nós não andamos isolados do mundo, as pessoas que estão a sentir esta crise e que estão a ver que ela se está a arrastar demasiado e que ainda vai piorar, porque de facto é uma crise diferente das outras que aconteceram na história da humanidade...acho que as pessoas também não têm muita alternativa porque a partir do momento em que o sistema capitalista não consegue dar emprego a todas as pessoas, logo, não consegue dar maneiras de sobreviver a todas as pessoas, as pessoas têm que trabalhar um bocado a sua própria forma autónoma. Algumas hão-de ir por aí, um bocado por arrasto e por obrigação. Outras, que são aquelas com quem

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nós nos identificamos mais, são aquelas pessoas que por convicção sabem que todo este sistema que está montado e que nos apresentam na televisão pela publicidade e, a seguir a publicidade, através dos programas, onde as pessoas que apareceram na publicidade aparecem como pessoas de sucessa e nós acreditamos...E as pessoas que recusam isso e que sabem perfeitamente que isso é uma grande mentira e que querem criar um estilo de vida diferente... identificamo-nos muito mais, à partida, com essas pessoas.

Lídia - Vocês falam de roubo do conhecimento. Como é que procuram combater esse roubo, através das iniciativas da associação?

Sílvia - Respondendo à segunda pergunta... Como conseguimos colocar as pessoas a actuar? Acho que também é um processo, acho que é a intenção de criar essa consciência e conseguir ultrapassar a fase da apatia, da incapacidade em passar da teoria à prática e depois chegar de facto à fase em que acho que é a fase em que nós estamos, ou seja, passamos do blábláblá e demos às nossas vidas algo diferente. É passar a essa prática. O nosso projecto não pretende ser nem um modelo a ser reproduzido em todos os seus moldes, na sua metodologia...é uma maneira, é uma alternativa entre muitas outras. Mas acontece na cidade, no meio urbano, Porque também os meios que nós vamos utilizando... por exemplo a questão da horta, da arquitectura ecológica, a questão de ter um maior contacto ou tentar reconquistar o contacto com uma certa ruralidade ou práticas rurais, através de sistemas de subsistência mais directos... essa, digamos, essas similitudes, são meramente formais. Como alguns projectos que acontecem mais no meio rural, porque nós não pretendemos só alterar, só criar uma alternativa para nós. Nós queremos, mesmo e o desafio era esse, era fazer isso no meio urbano onde há mais pessoas, onde é um maior desafio. Poder apresentar uma alternativa viável e poder convencer. Mostrar que é possível uma alternativa ao estilo de vida capitalista e de consumo. Por isso, nós pretendemos ter um papel transformador, mas ao mesmo tempo não queremos chegar com uma doutrina.

Lídia - Vocês pretendem então criar essa rede de acção estimulando o sentido crítico de quem vos conhece?

Riça- E de quem nos quer conhecer!Sílvia - Eu acho que as pessoas devem ter a noção de que não bastam

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protestos pontuais, voltando à antiga rotina...a questão é essa. Muitas pessoas, mesmo assim, por exemplo, têm uma actividade no meio associativo, são voluntários, participam no movimento social...ao mesmo tempo que há essa participação, a grande maioria destas pessoas, no seu dia a dia, continua a fazer parte deste sistema e desta rotina. Eu acho que é uma parte mais importante... As pessoas têm que interiorizar que, se querem mudar, vão ter que perceber que isso implica também uma mudança do seu estilo de vida. E é uma questão muito complicada, porque é ir muito mais abaixo do nível da superfície... É ir muito, muito abaixo e mudar os hábitos de vida, ou seja, pôr em causa, por exemplo...tu tens uma plataforma de precários que anda revoltado porque não tem condições de trabalho...A questão é essa, as pessoas estão a reivindicar um direito ao trabalho num sistema baseado na exploração...Isso mostra ainda mais o desespero em que estão as pessoas: é o imediato, é uma reacção, e estão a ser atingidas individualmente. Já nem é a questão do estilo de vida, estão a ser atingidas na sua sobrevivência no dia a dia. A crítica deveria ir muito mais além e acho que também é um dos futuros objectivos, depois da casa estar pronta, conseguir potenciar conteúdos de outros ou produzir por nós para chegar às pessoas e eventualmente provocar alguma reacção, para as pessoas interiorizarem que o estilo de vida delas também resulta da exploração de milhares de pessoas, que nós não vemos no dia a dia. As nossas roupas, a nossa comida, o nosso carro...e esse conforto que está mais do que adquirido, nós não colocamos em questão os nossos comportamentos. Estamos completamente habituados. Mesmo nós, levando mais a fundo essa crítica, temos ainda muito trabalho pela frente. Claro que não se pode começar tudo de uma vez.

Riça- A questão está em procurar um bocado o equilíbrio.Lídia - Se calhar agora perguntava-vos acerca dos processos utilizados na

construção da casa, na exploração da horta, etc?Riça - Na horta estamos a experimentar, estamos a aprender, não crescemos

agricultores. Lemos muita coisa e trocamos muita informação com muit a gente, no âmbito da permacultura. Por acaso é bom não estarmos a trabalhar muito a terra, a permacultura é precisamente não trabalhar muito a terra. Estamos a ver como a terra funciona e queremos ter uma horta que nos possa dar o máximo de rendimento, de uma forma sustentável. E para isso não há uma

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fórmula mágica...Podes aplicar a permacultura, podes aplicar a agricultura convencional, não usando químicos...Sinceramente, não há uma fórmula. A nossa única certeza é não deitar nada químico. Por isso, sementes transgénicas nem pensar, é lógico, e pesticidas, etc. De resto, procuramos sempre soluções naturais, dos mais diversos sítios, seja através da internet, de outras pessoas com hortas, etc. E produzimos nós próprios as nossas sementes.

Sílvia - Sobre a casa... Não foi inocente, ou seja, nós não construímos uma casa de raíz. Poderíamos, há muitas técnicas acessíveis. Nós optámos por recuperar uma casa antiga, de granito, tem mais de cem anos, e isso tem a ver com um fenómeno que é muito forte cá em Portugal, sobretudo na área metropolitana do Porto e Lisboa, mas que é uma tendência visível em todos os países europeus, que é a questão do abandono do património construído antigo, e que cá em Portugal, sobretudo em termos de habitação, há milhares e milhares de casas abandonadas e prédios a cair. A questão é essa, as pessoas não se apercebem, a população em geral, isto é, que há uma tal riqueza associada a edifícios antigos que tem a ver com estruturas, tem a ver com serviços, tem a ver com os comércios, com as redes locais e com as próprias comunidades que já existem. Os prédios abandonados já existem dentro destas realidades, não é preciso construí-los de raíz. A riqueza, o tecido construído antigo poupa- -nos...aliás, nem que seja por uma questão social ou de ecologia urbana, mas mesmo por uma questão meramente económica - seria muito mais barato se todos reaproveitássemos estas construções vazias, por isso decidimos não construir de novo e aproveitar o tecido social que existia à volta desta casa. Relativamente à questão da reabilitação. Para cada tipo de material, há uma maneira diferente de reabilitar. Cada material tem a sua lógica. O que acontece e que uma pessoa ao reabilitar o edifício tem que perceber como funciona a preexistência. A preocupação não passa apenas por usar materiais ecológicos, mas que também respeitassem a pré existência e que conseguissem trabalhar a pedra e não prejudicassem a sua estrutura. Depois, a questão das técnicas construtivas ecológicas e, o mais possível, com materiais locais. Que, acho que de todas, é a parte mais difícil. Se formos a ver, não conseguimos construir uma casa, ou reabilitar uma casa a 100% com materiais locais. Isso tem a ver com a realidade do mercado. É preciso puxar pela cabeça para encontrar alternativas e

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materiais mais locais possíveis para usar aqui. Inicialmente, quando começámos o trabalho na casa, procedemos à fase de desmantelamento, com a tentativa de reaproveitar o material que estava em boas condições. Por exemplo, as telhas do telhado antigo que nós estamos a reaproveitar depois dentro da casa e na parte da horta. As janelas serão aproveitadas para uma estufa...ou seja, aproveitar ao máximo: a terra que nós tivemos que tirar para fazer o piso do rés-do-chão, estamos actualmente a aproveitá-la para fazer as paredes divisórias. Por isso é um processo mais demorado e tem que ser muito bem planificado. Existe uma certa flexibilidade e ao longo do processo houve alterações. Depois, os principais materiais com os quais estamos a trabalhar são a madeira, a palha, a cal e a terra. São estes os quatro materiais. Claro que depois há as ferragens, os pregos, os parafusos...são indispensáveis. No campo da electricidade e da água temos que ir buscar matérias plásticas, não há muita alternativa. A casa ainda não acabou, mas já temos noção dos materiais que vamos utilizar. Acho que conseguimos dizer que, a 90%, os materiais são completamente ecológicos. As madeiras, a palha e a terra são locais. Depois há aquele erro, aquela confusão que se faz, entre a preocupação de produzir com materiais locais e aquela campanha nacionalista exacerbado de consumir português. A questão da nacionalidade não é o nosso critério.

É preciso muita imaginação, muita criatividade, muita loucura, e também é um exercício para o cérebro, que é um músculo...”pensar fora da caixa”: custa começar, mas uma vez que se adquiriu esse hábito, as coisas já não parecem tão complicadas ou tão difíceis de atingir. Por exemplo, o projecto não surgiu de nada, cada um teve o seu itinerário, cada um teve que desaprender, ou seja, criar essa consciência crítica... cada um de nós, tem a sua história pessoal e houve aquele “clique”:”ok, a teoria é boa mas temos que passar à prática” e depois há um tempo de gestação. E não foi de um dia para o outro. Tem que se pensar e, degrau a degrau, vais-te consolidando, vais consolidando a tua confiança naquele caminho que não é o caminho usado pela maioria, não é o caminho seguido pela maioria e, muitas vezes, enquandt tu vais seguindo este caminho, o resto aponta. Ao início uma pessoa tem que, de facto, tapar os ouvidos e concentrar-se. Por outra questão, pois em geral, o tempo dá-nos sempre razão. Lídia - Como surgiu a associação Casa da Horta.

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Entrevista realizada à associação Casa da Horta, no dia 7 de Maio de 2012. Membros presentes: Nêzia Alexandra e Pedro Gonçalves.

Lídia - Como surgiu a associação Casa da Horta?Nêzia - Bem, nós tínhamos interesses em comum, criar uma cooperativa.

Eu, o Pedro e a Diana. Queríamos criar não só um espaço, mas um colectivo diferente, de que pudéssemos também viver, criar o nosso emprego, mas de maneira a que não tívéssemos que ter um patrão, não tívéssemos que estar dentro do sistema normal. E então começamos a falar sobre isso e pronto. No início queríamos mesmo criar uma cooperativa com outras pessoas, mas entretanto as coisas foram mudando.

Pedro - A questão burocrática impediu-nos um bocado. Nós queríamos aliviar essa pressão. Quanto mais burocracia, para nós, pior era.

Nêzia - Nós queríamos algo o menos burocrático possível. Mesmo a associação...

Pedro - ... já tem a sua burocracia. Mas é mais simples, é muito mais simples.

Nêzia - A cooperativa era complicada. Então decidimos optar pela associação. A nossa ideia era um bocado termos a parte do restaurante e termos as actividades. E no fundo conseguimos. Também queríamos ter outras coisas, como a Feira de Trocas, como outros projectos em paralelo que, pronto...também sentimos que perdemos muito tempo na parte do restaurante e que nem sempre conseguimos fazer essas actividades e outros projectos. Nós queríamos mais do que ser um restaurante, ser um espaço onde as pessoas pudessem vir e ver outro tipo de coisas, não fosse só chegar aqui, comer e ir embora.

Lídia - Sim, eu tenho visto muitas vezes, na vosssa página do Facebook, pessoas a dizer que se sentem em casa quando cá estão. Acho que há muito esse sentimento, não é?

Pedro - Sim, que isto não seja um sítio-restaurante, onde alguém te está a servir e tu vens para cá com aquela atitude mais burguesa, digamos, e formal. A ideia é contrariar isso, não há empregados, isto é um espaço aberto.

Nêzia - Claro que no início as pessoas têm essa tendência, de nos tratar

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como empregados. Mas acho que aos poucos vão percebendo. Acho que da primeira vez que vens aqui se calhar tens uma atitude; da segunda, terceira e quarta já tens outra e já começas a perceber.

Pedro - Se não gostas, não apareces mais! Nêzia - Sim, mas tentamos de maneira a fazer com que as pessoas se sintam

em casa e nós também.Lídia - Claro, até têm ali a biblioteca... E aqueles livros, fazem parte da vossa

colecção pessoal?Pedro - Alguns são.Nêzia - No início eram todos. Cada um de nós trouxe alguns livros e

disponibilizávamos mas antes não tínhamos a biblioteca a funcionar para as pessoas requisitarem livros. Entretanto começámos a receber voluntários e a ter mais pessoas a colaborar e um dos voluntários criou mesmo a biblioteca e agora podes consultar mesmo e levar para casa.

Gostaria de esclarecer a questão do “comércio justo”. Nós no início tínhamos produtos de comércio justo, mas começámos a achar que se calhar o mais justo eram os produtos locais, e não os de comércio justo.

Pedro- Sempre achámos isso, mas há produtos que nunca são locais. Por exemplo, chocolate ou café. E isto é uma reflexão que faço agora, não sei até que ponto o comércio justo é realmente justo. Houve uma cisão mais fundamental quando decidiram ter café no comércio justo, mas “Delta”, ou seja, estão a dar azo a uma empresa que tem um comércio não justo, que tem exploração de trabalhadores, que 0,01 da sua produção é comércio justo. Mas ao mesmo tempo a empresa está a fazer publicidade, e a partir desse ponto nós começámos a questionar mesmo qual é o objectivo do comércio justo. Mas claro, há sempre essa questão, há produtos que iríamos obter sem ser locais.

Nêzia - Sim, utilizamos café e utilizamos chocolate. Então tentamos medir o que para nós é mais justo, mas mesmo assim temos dúvidas.

Pedro - Há muitas contradições.Nêzia - Temos uma pessoa agora a colaborar connosco que está a fazer visitas

a supermercados e a explicar a pessoas o que podes comprar, o que não podes comprar, de onde é que as coisa vêm, etc.

Lídia - Quando entrevistei as Agitadoras falamos precisamente na questão

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do consumo local, desde que a produção seja justa, isto é, não confundir o local com o nacionalismo exacerbado.

Pedro - Sim, sim, local não tem a ver com nação, não é? Tem a ver com o estar perto. Essa questão é perigosa, até porque agora com a crise anda toda a gente: “Ah vamos consumir produtos nacionais.” e até que ponto é mesmo nacional? Mas por exemplo, até que ponto não é mais ecológico virem produtos da Galiza que do Algarve?

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Bibliografia

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Bibliografia

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