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Transformação de Um Exército. a Cultura Na Modernização e No Desenvolvimento Do Exército Chileno
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ESCOLA DE COMANDO E ESTADO MAIOR DO EXRCITOESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO
Cel Cav JOS JOAQUN CLAVERA GUZMN Exrcito do Chile
Transformao de um Exrcito. A cultura na modernizao e no desenvolvimento do Exrcito Chileno
Rio de Janeiro
2013
2(INTENCIONALMENTE EM BRANCO)
Cel Cav JOS JOAQUN CLAVERA GUZMNExrcito do Chile
Transformao de um Exrcito. A cultura na modernizao e no desenvolvimento do Exrcito Chileno
Dissertao apresentada Escola de Comando e Estado-Maior do Exrcito, como pr-requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre em Cincias Militares.
Orientadora: Prof. Dra. Valentina Gomes Haensel Schmitt
Rio de Janeiro2013
Ficha catalogrfica
Cel Cav JOS JOAQUN CLAVERA GUZMN
G 986 Guzmn, Jos Joaqun Clavera.
Transformao de um Exrcito. A cultura na
transformao do Exrcito Chileno./ Jos
Joaqun Clavera Guzmn. Rio de Janeiro, 2013.
131 f.: il; 30 cm.
Dissertao (Mestrado) Escola de Comando
e Estado-Maior do Exrcito, Rio de Janeiro,
2013.
Bibliografia: f. 128-131.
1. Cincias Militares. 2. Gesto Estratgica.
Transformao de um Exrcito. A cultura na modernizao e no desenvolvimento do Exrcito Chileno
Dissertao apresentada Escola de Comando e Estado-Maior do Exrcito, como requisito parcial para a obteno do ttulo de Mestre em Cincias Militares.
Aprovado em____de_______de 2013
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
- Dra Valentina Gomes Haensel Schmitt. Presidente
Escola de Comando e Estado-Maior do Exrcito
_________________________________________
- Dr Paulo Roberto de Mendona Motta. Membro
Fundao Getlio Vargas/EBAPE
_________________________________________
- Dr Luis Moretto Neto. Membro
Universidade Federal de Santa Catarina/IMM-ECEME
As mulheres da minha vida, minha esposa Gabriela
e a Nossa Senhora de Aparecida por acompanhar-me e proteger-me sempre
nesta terra.Muito Obrigado.
AGRADECIMENTOS
ECEME, pela compreenso demonstrada ao longo da elaborao do presente
trabalho.
Ao Exrcito do Chile, por dar-me a oportunidade de servir e conhecer o Exrcito
Brasileiro e seus futuros desafios.
Aos colaboradores e entrevistados, que cederam parte de seu tempo para responder
as consultas realizadas.
Academia de Guerra do Exrcito do Chile, pela sua colaborao para aplicar o
questionrio aos alunos do 2 ano do Curso Regular de Estado Maior e por ter dado
a devido importncia a esta pesquisa para futuros processos institucionais.
Doutora Valentina Gomes Haensel Schmitt, que me orientou desinteressadamente
desde o incio do programa e valorizou o esforo que tive no cumprimento do
trabalho e na sua concluso.
minha famlia, por seu constante estmulo para que eu continuasse com o
programa em detrimento de suas prprias intenes.
A Nossa Senhora da Aparecida, por sua intercesso diante de Deus para proteger a
mim e a minha famlia nesta maravilhosa terra.
RESUMO
O presente trabalho teve como objetivo analisar o processo de transformao do
Exrcito do Chile, a partir da perspectiva da cultura organizacional. Esse estudo foi
desenvolvido por meio de uma reviso do estado da situao institucional, prvio ao
processo de transformao, acompanhada de uma anlise dos principais fatos e
eventos selecionados, como os mais transcendentes desse processo e de uma
avaliao de valorizao do impacto de cada um deles na cultura institucional. Com
isso, observou-se que a transformao do Exrcito chileno foi o resultado de um
processo inicial centrado em uma educao com forte conotao cultural, aspecto
este que possibilitou posteriores e sucessivas modificaes em diferentes reas,
entre as quais se destaca a mudana de um paradigma territorial por um
operacional, tendo um grande impacto na estrutura e na cultura organizacional da
instituio. Este dado permitiu ainda demonstrar, em ltima anlise, que o processo
de transformao institucional e especialmente o cultural foram objeto de
circunstncias tanto planejadas como tambm no planejadas que, de qualquer
forma, contriburam para a consolidao e a continuidade, at os dias de hoje, do
prprio processo, levando-se em considerao a sua condio atual de "contnuo".
ABSTRACT
The following investigation had as an objective to analyze the process of
transformation of the Chilean Army from an organizational culture perspective. The
previous information was gathered through a revision of the state of the situation of
the institution before the transformation process, followed by an analysis of the main
milestones and events selected as the most significant of the process and, by an
impact valuation assessment of each one on the institutional culture.
With it as a base, it was established that the transformation of the Chilean Army was
the result of an initial process centered on a culturally based education, which
allowed previous and subsequent changes in different areas, among which stand out
the change of territorial paradigm by an operational one, which had a great impact on
the structure and the organizational culture of the institution.
All of the above, finally, further allowed to demonstrate that the process of institutional
and, particularly, cultural transformation were the object of planned and unplanned
circumstances, which non the less, contributed to the consolidation and continuity, to
this day, of the process itself and its current continuous condition.
RESUMEN
El presente trabajo tuvo como objetivo analizar el proceso de transformacin del
Ejrcito de Chile, a partir de la perspectiva de la cultura organizacional. Lo anterior
se obtuvo por medio de una revisin del estado de situacin institucional, previa al
proceso de transformacin, seguido de un anlisis de los principales hitos y eventos
seleccionados como los ms trascedentes del proceso y, de una evaluacin de
valoracin de impacto de cada uno de ellos en la cultura institucional.
Con base en ello se pudo establecer que la transformacin del Ejrcito chileno fue el
resultado de un proceso incial centrado en la educacin de fuerte conotacin
cultural, aspecto que posibilit posteriores y sucesivos cambios en diferentes reas,
dentro de los cuales se destaca el cambio de paradigma territorial por uno
operacional, el que tuvo un gran impacto en la estructura y en la cultura
organizacional de la institucin.
Todo lo anterior, en definitiva, permiti demostrar adicionalmente, que el proceso de
transformacin institucional y el cultural en particular, fueron objeto de circunstancias
planeadas y otras no planeadas, las que no obstante, contribuyeron en la
consolidacin y continuidad hasta el da de hoy, del propio proceso en su condicin
actual de contnuo.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 Comparao de paradigmas de transformao 26Quadro 2 Visualizao de perspectivas da teoria de transformao
organizacional do Dr Motta e os elementos centrais de
transformao do Exrcito do Chile........ 32Quadro 3 Tipos de mudana... 35Quadro 4 Seleo e avaliao preliminar de marcos e eventos... 38Quadro 5 Coleta de dados.. 42Quadro 6 Relao de dados, coleta e tratamento. 43Quadro 7 Limitaes do mtodo. 44Quadro 8 Exrcito territorial a Exrcito operacional.. 69Quadro 9 Representao da ao transformadora. Adaptao Dr Paulo
Motta.. 99
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 Grfico de ao transformadora. Adaptao do modelo Dr. Garca
Covarrubias............................ 99
Figura 02 Grfico de representao ao transformadora. 100Figura 03 Grfico da resposta pergunta N 1 Plano Alczar... 105Figura 04 Grfico da resposta pergunta N 2 Projeto de Aquisio de
Sistemas Leopard 1-V.... 106Figura 05 Grfico da resposta pergunta N 3 Disponibilidade de Recursos
da Lei Reservada de Cobre.................... 107Figura 06 Grfico da resposta pergunta N 4 PREDEFE..... 108Figura 07 Grfico da resposta pergunta N 5 Desenvolvimento de Massa
Crtica............................................................................................. 109Figura 08 Grfico da resposta pergunta N 6 Exrcito Territorial a Exrcito
Operacional...... 110Figura 09 Grfico da resposta pergunta N 7 Criao da Diviso
Doutrina... 111Figura 10 Grfico da resposta pergunta N 8 OPAZ no Haiti...... 112Figura 11 Grfico da resposta pergunta N 9 Incorporao do Processo
de Lies Aprendidas..... 113Figura 12 Grfico da resposta pergunta N 10 Novo Sistema de Instruo
e Treinamento...................................... 114Figura 13 Grfico da resposta pergunta N 11 Difuso da Doutrina O
Exrcito e A Fora Terrestre..... 116Figura 14 Grfico da resposta pergunta N 12 Acidente de Antuco.... 117Figura 15 Grfico da resposta pergunta N 13 Diretriz Geral do
Exrcito. 118Figura 16 Grfico da resposta pergunta N 14 Lei de Transparncia e
Informao Pblica..... 119Figura 17 Grfico da resposta pergunta N 15 Difuso da Nova Doutrina
Operacional................. 120Figura 18 Grfico da resposta pergunta N 16 Terremoto e tsunamis de
27 de fevereiro de 2010. 121Figura 19 Grfico da resposta pergunta N 17 Lei Antidiscriminao. 122
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Avaliao do Impacto.................................................103
Tabela 2 Resultado da avaliao.....................................................104
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACAGUE Academia de Guerra do ExrcitoCGL Capito GeneralCJE Comandante do ExrcitoCOT Comando de Operaes TerrestresDIVDOC Diviso de DoutrinaECEME Escola de Comando e Estado Maior do Exrcito do BrasilEDCH Exrcito do ChileFAH Fora de Ajuda HumanitriaMADOC Centro de Doutrina do Exrcito de Terra da EspanhaPREDEFE Plano de Racionalizao de Estrutura e Desenvolvimento da
Fora SIE Sistema de Instruo e TreinamentoSILAE Sistema de Lies Aprendidas do ExrcitoSLTP Soldado de Tropa ProfissionalTRADOC Training Doutrine, Exrcito dos EUAOPAZ Operao de PazFA Foras Armadas
SUMRIO
1 INTRODUO. 151.1 TEMA. 161.2 O PROBLEMA. 161.3 OBJETIVOS. 171.4 HIPTESE... 171.5 VARIVEIS.. 171.6 DELIMITAO DO ESTUDO 181.7 RELEVNCIA DO ESTUDO. 182 REFERENCIAL TERICO 192.1 O PROCESSO DE TRANSFORMAO.... 192.1.1 Usando trs pilares da transformao....... 222.1.2 A natureza da mudana... 252.2 A CULTURA ORGANIZACIONAL MILITAR... 272.3 A ORGANIZAO..... 332.4 A DOUTRINA... 353 METODOLOGIA.. 383.1 TIPO DE PESQUISA.. 413.2 UNIVERSO E AMOSTRA.. 423.3 COLETA DE DADOS.. 423.4 TRATAMENTO DE DADOS.. 43
3.5 LIMITAES DO MTODO.. 434 SITUAO INSTITUCIONAL PRVIA... 454.1 ASPECTOS GERAIS.. 454.2 CONSIDERAES ESPECFICAS. 454.2.1 Forte dependncia do emprego territorial........ 464.2.2 Determinismo geogrfico 474.2.3 Falta de eficincia para o adequado emprego dos
recursos..........................................47
4.2.4 No se marcava um centro de esforo claro. 484.2.5 Foras no aptas para tarefas mltiplas........ 484.2.6 Falta de padronizao..... 494.2.7 Unidades incompletas. 494.2.8 Ausncia de sistemas operativos integrais.. 504.2.9 Falta de especializao do pessoal..... 514.2.10 Pouca operacionalidade.. 514.4 CONCLUSES PARCIAIS 525 MARCOS E EVENTOS DA TRANSFORMAO CULTURAL 535.1 ASPECTOS GERAIS. 535.2 O PLANO ALCZAR, INCIO DA TRANSFORMAO
CULTURAL..53
5.3 A INCORPORAO DO MATERIAL DE TANQUES LEOPARD
1-V.....................................55
5.4 A DISPONIBILIDADE DE RECURSOS DA LEI RESERVADA
DE COBRE............................57
5.5 O PLANO DE RACIONALIZAO DA ESTRUTURA E
DESENVOLVIMENTO DO EXRCITO (PREDEFE).................58
5.6 A CRIAO DE UMA MASSA CRTICA.... 625.7 A CRIAO DA DIVISO DE DOUTRINA............. 635.8 DE UM EXRCITO TERRITORIAL A UM EXRCITO
OPERACIONAL..67
5.9 AS EXPERINCIAS DAS OPERAES DE PAZ (HAITI)......... 705.10 O PROCESSO DE LIES APRENDIDAS....... 735.11 NOVO SISTEMA DE INSTRUO E TREINAMENTO........... 765.12 A DOUTRINA, O EXRCITO E A FORA TERRESTRE.... 775.13 O ACIDENTE DE ANTUCO.. 795.14 A DIRETRIZ GERAL DO EXRCITO................ 815.15 A LEI DE TRANSPARNCIA E INFORMAO PBLICA..... 845.16 DIFUSO DA NOVA DOUTRINA OPERACIONAL.......... 855.17 O TERREMOTO DE 27 DE FEVEREIRO DE 2010.. 875.18 LEI ANTIDISCRIMINAO... 955.19 CONCLUSES PARCIAIS 976 IMPACTO INSTITUCIONAL DOS MARCOS E EVENTOS DA
TRANSFORMAO CULTURAL......102
6.1 ASPECTOS GERAIS, UNIVERSO E AMOSTRA......... 1026.2 CONSULTAS REALIZADAS E CRITRIOS UTILIZADOS.. 1026.3 RESULTADOS OBTIDOS. 1046.4 ANLISE DOS RESULTADOS OBTIDOS PELA 104
PERGUNTA.6.5 CONCLUSES PARCIAIS 1237 CONCLUSES 125
BIBLIOGRAFIAAPNDICES A e B - ENTREVISTAS
1 INTRODUODurante as duas ltimas dcadas, as Foras Armadas de diferentes pases
sul-americanos comearam a desenvolver processos de modernizao, baseados
fundamentalmente na aquisio de novos sistemas de armas que foram
incorporados a suas respectivas foras e nas estratgias adotadas para enfrentar
novos cenrios internos e externos. Os exrcitos, em particular, passaram de
simples modernizaes a estgios superiores de mudanas de uma maior
complexidade que foram denominadas de transformaes. Estas transformaes,
que na prtica foram traduzidas em mudanas orgnicas, de estrutura e de doutrina,
permitiram a incorporao de novos conceitos que influram e orientaram, em grande
parte, as mudanas ou transformaes indicadas. O Exrcito do Chile, que
atualmente avana em um processo de transformao, no foi exceo. Neste
sentido, vivenciou momentos nicos de modernizao com a incorporao de
grandes avanos tecnolgicos baseados em sistemas de armas, at uma profunda
transformao de grande impacto em toda a instituio. Nesse contexto, a
transformao de maior relevncia e que foi o alicerce de todo o processo foi a
mudana cultural vivenciada pela instituio em todos os nveis, possibilitando a
incorporao de novos conceitos, ideias e, especialmente, de lideranas que
permitiram a sua implementao a partir da tomada de decises em diferentes
momentos de seu desenvolvimento.
A mudana cultural que ocorreu no Exrcito obedeceu s mudanas
doutrinrias introduzidas em diversos documentos, com princpios de valores
sociais, que sustentaram grande parte da transformao, fazendo, portanto, parte
dela. Contudo, existem tambm outras foras culturais que pressionaram a
organizao para introduzir novas modificaes. Estas foras ou presses culturais
foram geradas a partir de mbitos externos ou ambientais, que obrigam a adequar-
se ao entorno social, econmico e poltico e tambm dentro da prpria instituio,
por meio da introduo de novo conhecimento e do estado da arte internacional,
que diversos oficiais ao terminar seus cursos ou ao retornar de misses no exterior,
introduzem no desempenho interno da instituio. No se pode deixar de mencionar
a introduo no Exrcito da doutrina de Lies Aprendidas, que gerada na prpria
fora e que, atravs de diferentes nveis de anlise, finalmente se converte em
hbito, em procedimento, em doutrina e em parte integrante da cultura militar.
Com este propsito, portanto, cabe analisar os fatores que impulsionaram o
processo iniciado no Exrcito do Chile, estabelecendo se esta transformao
implicava uma mudana cultural da organizao para adequar-se aos novos
cenrios ou para antecip-los, constatando o grau de importncia que teve a
vontade do comando institucional em seu impulso, a ingerncia dos valores e cultura
organizacional e como estas permitiram possibilitar os objetivos traados para a
mudana. Dentro disso, foi necessrio destacar o grau de receptividade e aceitao
dos novos conceitos e se estes outorgaram a flexibilidade necessria para continuar
em ciclos contnuos, aceitando a realidade de que uma vez iniciado um processo de
transformao, este gera - atendendo velocidade em que se transforma a
sociedade e aos avanos tecnolgicos constantes que modificam o campo de
batalha - uma dinmica permanente no tempo de ajuste organizacional com
caractersticas, implicaes e limitaes que a particularizam.
Em consequncia, a presente pesquisa pretende verificar o impacto do
processo de transformao na doutrina e na organizao como elementos centrais
da mudana cultural do Exrcito do Chile.
1.1 TEMA
Transformao de um Exrcito. A cultura militar na modernizao e no
desenvolvimento do Exrcito Chileno.
1.2 O PROBLEMA
A modernizao original da instituio, at converter-se em uma
transformao de amplo espectro, como foi o caso da transformao do Exrcito do
Chile, gera impactos e presses em diferentes mbitos tais como: na doutrina, na
organizao e, especialmente, na cultura institucional, sendo necessrio avali-la e
consider-la para a tomada de decises nas etapas subsequentes e permanentes
que so geradas a partir de toda transformao.
Portanto, a pergunta que orienta a pesquisa :
Quais foram os impactos de alcance cultural na doutrina e na organizao do
Exrcito Chileno derivados da modernizao e da transformao?
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Objetivo geral Analisar o processo de transformao do Exrcito do Chile, a partir da perspectiva
da cultura organizacional.
1.3.2 Objetivos especficos
Descrever a situao institucional prvia e os conceitos tericos utilizados para
desenvolver a transformao do Exrcito;
Analisar a sequncia de marcos e eventos de carter cultural ocorridos durante
o processo de transformao do Exrcito;
Analisar os impactos na cultura organizacional e sua importncia na
transformao do Exrcito.
1.4 HIPTESE
Os processos de modernizao e/ou de transformao levados adiante
impactam as organizaes a que servem. No mbito da defesa e, em particular dos
exrcitos, estes processos se refletem na doutrina e na estrutura organizacional.
Neste estudo, pretende-se demonstrar que a transformao teve um importante
efeito dentro da cultura organizacional. Como consequncia, foi formulada a
seguinte hiptese de pesquisa:
- A implementao da transformao do Exrcito Chileno provocou uma
mudana cultural de profundo impacto na doutrina e na organizao institucional.
1.5 VARIVEIS
Esta pesquisa apresentou trs variveis ou conceitos de maior relevncia
relativa em termos do seu impacto na cultura organizacional, que foram estudados
em profundidade:
Varivel independente (ou varivel 1) Transformao do Exrcito chileno.Definio constitutiva Processo integral de mudana institucional realizado pelo
Exrcito Chileno.
Definio operacional Processo pelo qual o Exrcito Chileno passou de um
paradigma territorial a um operacional. Seu estudo se desenvolveu atravs da
seleo de marcos e eventos da transformao e sua avaliao foi feita a partir de
uma anlise dos resultados da aplicao de um questionrio.
Varivel dependente (ou varivel 2) Doutrina.Definio constitutiva processo que d forma s mudanas das competncias
militares atravs de uma nova combinao de conceitos, potencialidades,
organizaes e cultura organizacional (Doutrina, o Exrcito e a Fora Terrestre,
2010).
Definio operacional Desenvolvimento da nova doutrina e aplicao de seus
contedos para o aprofundamento da mudana cultural.
Varivel dependente (ou varivel 3) Organizao.Definio constitutiva Estrutura que permite o cumprimento ou a realizao dos
objetivos de uma determinada entidade (Doutrina, o Exrcito e a Fora Terrestre,
2010).
Definio operacional Organizao direcionada para o emprego territorial e/ou
organizacional orientada para o emprego operacional e seu impacto na cultura
institucional.
1.6 DELIMITAO DO ESTUDO
O estudo est centrado nos impactos que a transformao do Exrcito
produziu na cultura institucional, em particular, na doutrina e na organizao, no
perodo compreendido entre 1992 at o presente ano, evidenciando aqueles
aspectos mais relevantes que permitiram alcanar o estado atual.
1.7 RELEVNCIA DO ESTUDO
Permitiu uma visualizao do impacto que teve a transformao do Exrcito
Chileno na cultura institucional, especificamente, na doutrina e na organizao, e de
como este impacto, ao mesmo tempo, possibilitou o aprofundamento e o xito dos
objetivos deste processo, conhecimento que vlido para a tomada de decises em
outras organizaes e instituies de Defesa, no Chile ou em outros pases.
2 REFERENCIAL TERICOPara realizar uma abordagem terica que permita o desenvolvimento da pesquisa,
necessrio deter-se e analisar, em particular, quatro conceitos nos quais a pesquisa se
estrutura: a transformao como processo, a cultura organizacional militar, a doutrina e a
organizao.
2.1 O PROCESSO DE TRANSFORMAO
A morfologia do termo transformao deriva do latim: transformatio, que significa uma ao ou efeito de transformar ou transformar-se/ mudana de forma, na aparncia, na natureza ou no carter1,
Considerando esta definio, se deduz uma estreita e ntima relao com a mudana.
A transformao das organizaes, independente de sua funo em particular,
um tema que congrega grande ateno e que exige uma anlise cuidadosa, j que o xito
ou a sobrevivncia da prpria organizao depende disso.
Quando as organizaes se adaptam a seu entorno por meio de mudanas
superficiais, que no alcanam ou no so suficientes para continuar o seu
desenvolvimento ou para cumprir com a tarefa designada, ento possvel dizer que
necessitam transformar-se para prosseguir com a sua funo e permitir que sobrevivam.
Logo, transformar-se permitir, em primeiro lugar, a sobrevivncia da organizao e,
posteriormente, embora no disassociado do anterior, que seja mais eficiente.
Neste sentido, vrios estudos analisaram o processo centrado, em grande parte, na
problemtica empresarial e, em segundo plano, na problemtica pblica. Entretanto,
poucos se detiveram em observar e analisar os processos de transformao das Foras
Armadas como processo individual e que como tal possui particularidades que claramente
o diferenciam. Entre estas, pode ser mencionada a cultura organizacional militar que tem
importantes especificidades, levando em considerao a prpria vida militar, e pelo fato de
que seus integrantes esto dispostos a dar a sua vida em caso de conflito.
Esta voluntariedade de sacrifcio mximo condiciona, de maneira crtica, todo o
processo de transformao no que tange s Foras Armadas, de tal forma que
inevitavelmente o fator cultural se encontrar gravitando ao redor de todo o processo de
transformao e, sobre este conceito, se estrutura a totalidade da cultura organizacional.
1 FERREIRA, Aurlio Buarque de Holanda. Aurlio (edio especial): O dicionrio da lngua portuguesa. Curitiba. Positivo, 2008. 2 ed, Pp 786.
Esta mesma cultura organizacional militar tem como principal alicerce a doutrina,
na qual se nutre com princpios, valores, tradies e conhecimento militar especfico
relativo ao emprego da fora e onde estejam claramente definidas as hierarquias, a
disciplina, as estruturas e as inter-relaes, estreitamente vinculadas ao cumprimento de
suas tarefas e misses.
Na teoria da transformao desenvolvida pelo Dr. Paulo Motta (2001), estabelece a
ruptura dos modelos do passado como um dos fatores decisivos para a transformao,
permitindo introduzir, no ambiente, novos conceitos, ideias e/ou paradigmas, em suma,
introduzir um processo de permanente evolucionismo2.
A partir desta perspectiva, toda mudana organizacional militar supe uma ruptura,
em que certos esquemas e estruturas hierrquicas militares tradicionais de toda ordem
sero afetadas e, consequentemente, a doutrina sofrer igualmente modificaes. Agora,
se a doutrina for submetida a uma mudana progressiva, originalmente superficial, at
uma mudana completa, radical e absoluta dela, demonstrariam da mesma maneira, uma
ruptura com antigas formas de compreenso do contexto militar, ttico, operacional e
estratgico.
Segundo Burguess (2010), uma transformao militar: um ajuste condio do Exrcito para atender melhor as exigncias do prximo sculo3,
dando um efeito temporal ao transformadora, com uma perspectiva determinada no
tempo e que, portanto, pode ser alterada conforme as previses que a prpria
organizao pudesse ter com respeito ao seu futuro e sua sobrevivncia.
Para outros, a transformao: um processo atravs do qual os indivduos, os grupos e as organizaes se adaptam, se desenvolvem e crescem4
Na Doutrina O Exrcito e a Fora Terrestre do Exrcito Chileno, se considera que
a transformao, dentro do mbito militar, corresponde ao processo que d forma s mudanas das competncias militares atravs de uma nova combinao de conceitos, potencialidades, organizaes e cultura organizacional5
2 MOTTA, Paulo Roberto. Transformao Organizacional. Edies Uniandes. Bogot, Colmbia. Ed. 2001. Pp 8.
3 BURGESS, Kenneth. A Transformao e a Lacuna do Conflito Irregular. Military Review. Ed. Brasileira Maro-Abril 2010. Pp 18.
4 CIVOLANI, Fernando. O Gerenciamento do Processo de Transformao do Exrcito Brasileiro para uma Organizao Flexvel. Escola de Comando e Estado Maior do Exrcito. Rio de Janeiro.2005. Pp 39.
5 EXRCITO DO CHILE. DD 10001 O Exrcito e a Fora Terrestre. Instituto Geogrfico Militar. Santiago. Chile. 2010. Pp 17.
O que supe uma mudana de paradigma organizacional.
Do mesmo modo, indica-se que esta transformao: pode ser entendida, no nvel estratgico, como um enfoque diferente de como enfrentar uma crise e fazer a guerra, e de como participar como instrumento da poltica externa do Estado. No nvel operacional, como a identificao de uma nova doutrina de emprego da fora; e no nvel ttico, como a incorporao de novos sistemas de armas e recursos tecnolgicos, que modifiquem os procedimentos, as tcnicas e as funes de combate6,
Portanto, incorpora a varivel doutrinria condicionada transformao no nvel
operacional, incorporando, ainda, efeitos no nvel estratgico (viso) e ttico (tecnolgico).
Finalmente, indica que: o elemento de coeso e central da transformao est representado pela unidade de esforo no emprego da fora terrestre e, como fim ltimo, pela adaptao da forma de pensar de seus componentes7,
Atribuindo, portanto, um valor fundamental e ltimo (entendido como mximo nvel),
abarcando tambm a mente dos integrantes da instituio, sua forma de pensar, isto ,
a cultura profissional militar da mesma.
Esclarecidos os conceitos de ruptura e cultura militar, necessrio verificar e
selecionar dentro de certos modelos tericos paradigmticos8 qual o que se aplica
transformao de um Exrcito.
Para isso, sero analisadas duas teorias principais: a do Dr. Paulo Motta (2001),
pois permite analisar a transformao em perspectiva ampla, em particular, a sua viso
focada na empresa e; a teoria do Dr. Garca Covarrubias (2007), pois est orientada de
maneira explcita para a Defesa e as Foras Armadas, mesclada com as concepes
clssicas: a clausewitziana das Foras Armadas e de Sun Tzu relativa doutrina.
2.1.1 Usando trs pilares da transformaoO clssico terico militar, Carl Von Clausewitz, em sua obra Da Guerra, evidencia
diversos postulados que prevalecem at hoje, embora com diferentes matizes, em sua
interpretao e em vigor. Pela importncia histrica e cultural deste autor, conveniente
rever e analisar a pertinncia para os processos de transformao de alguns de seus
postulados, relacionando-os com a teoria da transformao militar na defesa, elaborada
pelo Dr Garca Covarrubias.
6 Ibid.7 Ibid.8 Para Thomas KUHN, a discusso paradigmtica e o estabelecimento de um paradigma so
necessrios para resolver problemas que ningum resolveu completamente.
Em sua teoria de transformao militar, o Dr. Garca Covarrubias (2007) se baseou
em trs pilares: a natureza das FA, o marco jurdico (ou legalidade) e as capacidades
(militares) para o cumprimento de suas tarefas e misses9. Sobre estes trs elementos, o
autor generaliza com relao ao fenmeno da transformao militar, tal como Clausewitz
se inspira para sua segunda trindade: o povo, o governo e o exrcito, para explicar o
fenmeno da guerra.
Em primeiro lugar, para Clausewitz, a supremacia da poltica na guerra por sobre a
militar10, com relao vontade de faz-la, de mant-la ou termin-la (a guerra), constitui
uma premissa superior. De fato, isto possvel evidenciar quando, em seu clebre
tridente, se refere ao governo como a expresso que engloba a poltica ou em seu
tambm clebre aforismo de que a guerra a poltica por outros meios.
De fato, quando se indica como responsvel a poltica pela direo da guerra e os
militares pela conduo da batalha, se diferenciam dois nveis: o poltico e o estratgico.
O nvel poltico transcende no tempo, diferente do estratgico, que cobra vida pouco antes
da iminncia ou do conflito na batalha propriamente dita. Ento, cabe ao poltico ou a
poltica servir de provedora dos insumos necessrios para enfrentar a guerra e, portanto,
dos recursos para mant-la operacional em tempo de paz e, ao militar cabe a gesto (na
paz) e o emprego (a fora operacional) para ganhar (a guerra e a batalha).
Um aspecto importante com relao transformao do texto de Clausewitz o
fato de que foi dada uma importncia pequena tecnologia para ganhar a guerra,
destacando que no um assunto primordial. Em contrapartida, Garca Covarrubias
(2007) d um valor de alta transcendncia ao inclu-la em seu postulado relativo s
capacidades.
A complexidade que hoje atribumos a estes processos de transformao no era
assim no sculo XIX, j que as mudanas que se desenvolviam eram fundamentalmente
melhorias de carter tcnico (tecnolgico), de baixo alcance e de longa durao. Hoje,
entretanto, isso se inverteu, passando a ter avanos de amplo alcance, mas de curta
durao. A esse respeito, Garca Covarrubias (2005), comenta que:hoje as mudanas so to rpidas que cada dois anos se exige que se faam as revises que antes eram feitas a cada 40 anos11.
9 GARCIA COVARRUBIAS, Jaime. Os Trs Pilares de uma Transformao Militar. Military Review. Ed Novembro Dezembro 2007. Pp 16.
10 BORRERO, Armando. A Atualidade do Pensamento de Carl von Clausewitz. Revista de Estudos Sociais. Ed. nr. 16. Outubro de 2003. Pp 25.
11 GARCA COVARRUBIAS, Jaime. Transformao da Defesa: o Caso dos EUA e sua aplicao na Amrica Latina. Military Review. Ed Maro-Abril 2005. Pp 25.
Por outro lado, com relao ao surgimento da tecnologia como fator relevante na
transformao, este pesquisador afirma que:A evoluo das FA natural e est basicamente determinada pela sua dependncia tecnolgica..A tecnologia, mesmo assim, vem tendo um impacto na ttica e esta, por sua vez, na estratgia. Produz-se ento uma sequncia de fatos ou de circunstncias que vo impactando e que vo obrigando s alteraes12
aspecto no qual coincidem vrios outros estudos que indicam que:o alcance das transformaes tecnolgicas afetam ou incidem no mbito ou
esfera da estratgia13
e, portanto, incide no desempenho das foras para ganhar as batalhas, funo atribuda
aos militares na teoria de Clausewitz. Sobre isso, possvel compreend-lo quando
contextualizado, considerando que os avanos nessa poca eram em sua maioria de
ndole tcnica, e tal como foi indicado, de alcance limitado somente para o mbito ttico e
de longa durao. Logo, a sua incidncia era exclusiva no mbito militar tanto na paz
como na guerra.
Hoje em dia, as tecnologias e seus avanos so de alta incidncia, de impacto at
estratgico e de curta durao. Ao ser compreendido dessa forma, possvel estabelecer
que a relao entre o estratgico (estratgia) e a poltica se d na denominada
Interpenetrao poltico-estratgica14, por meio da qual se aceita uma viso estratgica
na poltica e, mesmo assim, obriga a considerar aspectos polticos na estratgia.
Como consequncia, quando se fala de transformao se fala de estratgia e se
deduz que faz parte de uma poltica determinada ou que seu alinhamento est baseado
em uma diretriz desse nvel. Por outro lado, no se concebe uma estratgia de
transformao se no estiver devidamente esboada e implementada desde a paz e que
seja concorrente a um objetivo poltico determinado, elaborado tambm desde a paz e
que, por sua vez, tenha sido estruturado com o propsito de ganhar a guerra, dando
cumprimento teoria de Clausewitz, isto , que a guerra depende dos fins polticos que
so definidos.
A representao deste conceito o respectivo ordenamento jurdico, em que
existem leis, decretos presidenciais e polticas de estado e/ou de governo que normatizam
o desempenho das Foras Armadas e que, definitivamente, fundamentam qualquer
processo de transformao. Em suma, a poltica que tem a primazia; na poltica que
12 Ibid. Pp 17.13 MURRAY, Williamson y MILLET, Allan. Military Innovation in the Interwar Period. Ed. Cambridge
University Press. 2010. Pp 268.14 CHEYRE ESPINOSA, Juan Emilio. A Interpenetrao Poltico-Estratgica. Publicao do Exrcito
do Chile. Ed 1986. Pp 92.
se discutem e decidem as tendncias que orientam o processo; na poltica que,
portanto, se definem os objetivos a serem alcanados e; na estratgia que cabe serem
definidas as capacidades que devem ser desenvolvidas, mantidas ou suprimidas para
alcanar tais objetivos, produzindo-se uma interao estreita, poltica-estratgica, que
possibilite alcanar tais capacidades e que, futuramente, os recursos necessrios devam
ser designados para este propsito, sendo confirmado pelo prprio ex Secretrio de
Estado dos EUA, Donald Rumsfeld, ao comentar que:..transformar s as FA estril, mas se transforma o setor Defesa em sua globalidade.15
Como consequncia, encontramos os dois primeiros elementos da transformao
que coincidem: o governo (Clausewitz) e a norma jurdica (Garca Covarrubias), como
primeiro elemento e; como segundo, o Exrcito (Clausewitz) e as capacidades (Garca
Covarrubias).
2.1.2 A natureza da mudanaCom relao natureza da mudana organizacional, o Dr. Motta (2001) estabelece
cinco paradigmas16:
Compromisso ideolgico.
Imperativo ambiental.
Reinterpretao crtica da realidade.
Inteno social.
Transformao individual.
O compromisso ideolgico, cujo objetivo a idealizao, comprometendo as
pessoas com o ideal administrativo, poderia ser considerada. Contudo, fica em uma
posio de segundo ou terceiro plano, considerando que as FA, em sua essncia, no
so organizaes administrativas puras.
O imperativo ambiental, cujo objetivo um redirecionamento para readaptar a
organizao s necessidades provocadas pelo ambiente, serve como paradigma para o
estudo da transformao de um Exrcito, j que as condies externas ou ameaas
ambientais so fatores crticos para as FA. Alm disso, serve quando definido em
termos de um eventual inimigo o qual deva ser enfrentado e porque permite a anlise dos
fatos que so constitutivos do que faz ou fez, buscando causas e projet-lo ao futuro.
15 GARCA COVARRUBIAS, Jaime. Transformao da Defesa: O Caso dos EUA e sua aplicao na Amrica Latina. Op cit. Pp 26.
16 MOTTA. Op cit.Pp 35.
A reinterpretao crtica da realidade, cujo objetivo a emancipao, recriando
novos significados organizacionais, est alheia s FA.
A inteno social, cujo objetivo alterar as relaes sociais e influenciar outras
organizaes, poderia ser considerada, contudo, de maneira secundria, j que a
prioridade de toda fora armada est centrada na coero.
Finalmente, a transformao individual, cujo objetivo a criao e a
transcendncia, buscando uma nova viso de si mesma, tambm se descarta, j que a
viso da defesa e do papel das FA no est em discusso, mas sim o que se discute
como ser mais eficiente para alcanar o objetivo final do processo de transformao.
Em consequncia, o paradigma de mudana organizacional para uma
transformao de um Exrcito deveria estar relacionado, em sua natureza, com um
imperativo ambiental, com os fatos e com o prprio sistema como objetos de anlise,
buscando causas e explicaes.
Conforme foi comentado na teoria do Dr. Garca Covarrubias (2007), a
transformao conta com trs pilares: a natureza, as capacidades e a norma jurdica, de
tal forma que se for alterado qualquer um deles estaria sendo produzida uma
transformao.
Com relao natureza da transformao, este pilar, de acordo com a sua viso,
est basicamente relacionado com o nascimento de um Exrcito. Estrutura-se com base
no cumprimento de uma tarefa que concedida pela sociedade e, consequentemente, se
esta designa uma tarefa distinta ou diferente, dever estar consignada no documento
principal que toda nao elabora para definir a sua prpria institucionalidade, isto , a
Constituio Poltica da Repblica. Logo, o fato de produzir uma mudana, sendo a
Constituio o documento pelo qual o povo ou a nao dispe as tarefas para as suas
instituies, naturalmente, vai desencadear uma transformao em qualquer uma de suas
FA.
Em sntese, ambas as concepes paradigmticas da natureza da mudana para a
transformao so aplicveis transformao em toda Fora Armada e,
consequentemente, a todo Exrcito. Entretanto, ambas diferem no nvel e na
periodicidade. Considerando o paradigma da mudana como imperativo ambiental de
Motta (2001), uma transformao poderia ser produzida devido a restries ambientais
que periodicamente so produzidas pela natureza transformadora destas restries ou da
ameaa, em particular, tal como ocorre hoje em dia a nvel global e, em funo disto, seu
nvel estar mais focado no estratgico e nas capacidades que a fora deve manter. Por
sua vez, a natureza de Garca Covarrubias (2007) tem uma periodicidade claramente
menor considerando que alteraes constitucionais so geradas depois de processos
muito distantes no tempo, j que as constituies em si mesmas so de longo flego por
condio natural e, porque qualquer modificao ser no nvel poltico. A partir disto, se
deduz o seguinte quadro com relao natureza da transformao:
ANTECEDENTE AUTORDr Motta Dr Garca Covarrubias
Paradigma Dentro da natureza: a mudana como um imperativo ambiental.
Natureza, propriamente.
Periodicidade da transformao
Conforme evolui a ameaa. Pode ser breve no tempo.
Longo prazo. Muito distante um do outro no tempo.
Nvel Estratgico. Definido, iniciado, impulsionado e gerenciado pela prpria instituio armada.
Poltico. Para reformar a constituio.
Probabilidade de transformao
Muito provvel. Pouco provvel.
Principal rea que aborda
Capacidades militares. Misses e tarefas fundamentais.
Quadro N 1 - Comparao de paradigmas de transformao.
Fonte: O autor.
2.2 A CULTURA ORGANIZACIONAL MILITAR
Para compreender a cultura militar necessrio, em primeiro lugar, definir a cultura
como tal:A cultura pode ser definida como um padro de suposies bsicas compartilhadas, apreendida por um grupo na medida em que solucionava seus problemas de adaptao interna e externa17.
Alm disso, existem diversas categorias para descrev-la: como normas de grupo,
com base em valores, como filosofia formal, como regras de um jogo, como clima,
significados compartilhados, entre outras18.
Por sua vez, e conforme j tinha sido comentado, a cultura militar na transformao
de um Exrcito fundamental. Por essa razo quando se trata o tema da transformao
costuma-se pensar que aquilo que est sendo realizado est no mbito da tecnologia e do
tcnico exclusivamente, isto , trocando o material blico antigo por novo. A esse respeito,
Garca Covarrubias (2007), comenta que:
17 SCHEIN, Edgar H. Cultura Organizacional e Liderana. Ed Atlas. So Paulo. 2009. Pp 16.18 Ibid. Pp 12.
a transformao uma reforma profunda, representa uma ruptura do status quo, significa mudar o direcionamento, de fato, empreender um novo caminho19,
E, neste sentido, atribui-se a transformao outro elemento crucial: o dos valores que so
os aspectos distintivos da cultura militar:
que constituem a alma da natureza20
das Foras Armadas, da mesma forma que Clausewitz, quando se refere s Foras
Morais onde indica que esto entre os assuntos mais importantes da guerra.
Para o Dr. Motta (2001), uma perspectiva de anlise, que tem como tema
prioritrio as caractersticas de singularidade que definem a identidade, a comunicao e
o relacionamento grupal e; como unidades bsicas de anlise, os valores individuais e
coletivos.
Para Garca Covarrubias (2007), so trs valores fundamentais ou cardinais: a
valentia, o patriotismo e a honra; e para Clausewitz so: o talento do comandante, as
caractersticas militares das foras e o esprito nacional, entendido, por sua vez, como o
entusiasmo, o fervor, a f e a convico. em funo destas foras morais ou de
valores que um exrcito obtm sua fora profunda, permitindo constituir-se em uma das
bases de qualquer transformao, conforme argumenta Garca Covarrubias (2007), alm
de servir de perspectiva de anlise organizacional para Motta (2001) e permitir a vitria na
guerra, conforme indica Clausewitz. Um aspecto interessante da teoria de Clausewitz
que o valor moral de um exrcito tambm tem o prprio povo a quem serve, aspecto que
o vincula com sua teoria no que se refere ao povo no tridente. Sem deter-se na anlise
de cada uma, fato que escapa do propsito da pesquisa, pode entender-se claramente
que existe uma quase perfeita simetria em ambos os postulados, isto , pode-se concluir
que todo o processo de transformao deve considerar que este pode afetar os valores
morais e ticos profundos de toda fora e, portanto, em seu processo deve estar
propenso a proteg-los, increment-los ou, avaliando se necessrio, modific-los de
acordo com a poltica de estado definida.
O terceiro elemento do postulado de Garca Covarrubias (2007) constitui-se nas
normas jurdicas que regem seu desempenho na paz e na guerra e que so traduzidas
nas legislaes nacionais relativas s Foras Armadas, onde fundamentalmente, so
definidos os papeis ou funes especficas que cabem a elas, sendo tambm
estabelecidas as tarefas e as misses em diferentes mbitos, vinculado, ao mesmo
tempo, com o pilar da natureza, tal como foi explicado anteriormente. Especificamente,
19 GARCIA COVARRUBIAS, Jaime. Os Trs Pilares de uma Transformao Militar. Op Cit. Pp 22.20 Ibid. Pp 19.
como j foi comentado, so estabelecidos os objetivos a serem cumpridos, tanto em
tempo de paz como de guerra Tarefa, que embora poltica, se ajustam norma, isto , ao
marco jurdico de desempenho das foras e da competncia exclusiva da poltica como
elemento absoluto na conduo poltica das Foras Armadas (entendendo a poltica como
a expresso soberana do povo e no a poltica partidarista).
Por sua vez, Clausewitz tambm entendeu que a guerra depende de premissas
polticas determinadas e que no uma atividade autnoma e sem lgica21, deduzindo-se
que a legitimidade da guerra para Clausewitz vem da preeminncia poltica que para
Garca Covarrubias (2007), outorga o marco ou norma jurdica, realizado pela prpria
poltica. De fato, a norma jurdica obedece expresso poltica da vontade do povo em
que se estabelece o que se quer alcanar com os exrcitos e/ou suas Foras Armadas.
Ela estabelece o objetivo, o propsito e as tarefas que devem ser desenvolvidas atravs
das polticas de estado que orientam o desempenho. Atravs das legislaes, se
estabelece a forma que adotam e atravs dos oramentos, do vida idealizao poltica
elaborada.
No casual que grandes objetivos sem recursos no conduzem a alcanar os
objetivos propostos, entendendo por recursos, os humanos e materiais, que compem as
Foras Armadas. Aqui, ento, surge o principal elemento que sustenta o vnculo
Clausewitziano com a teoria de Garca Covarrubias (2007), isto , que para que
estabeleam uma relao dos objetivos (derivados da norma jurdica e da poltica) com as
necessidades para enfrentar com xito e alcan-los na guerra, se exige uma coerncia
poltico militar entre o objetivo e as capacidades que so solicitados. Em outras palavras,
o objetivo poltico impe a necessidade de manter ou desenvolver capacidades militares
para o seu cumprimento e estas, por sua vez, guardam relao com o estado da situao
atual e com aquilo que devam ter, espao a ser coberto por adaptaes, modernizaes
ou transformaes, dependendo do grau de profundidade, amplitude ou diferena
existente entre o que se tem e o que deve ser alcanado.
A norma jurdica, consequentemente, tem importncia para as transformaes ao
apresentar ou proporcionar a legitimidade necessria para o processo, em particular, para
a tomada de decises que faz parte fundamental do processo. Nisto, existe coincidncia
entre ambas as teorias. A relao poltico-estratgica, bem como a norma jurdica faz ou
deve fazer parte da cultura organizacional. Em razo disto, se observa a importncia de
incorporar a qualquer anlise cultural a norma jurdica por vincular-se com outras anlises
21 BORRERO, Op Cit, Pp 25.
como, por exemplo, a das capacidades e da relao poltica estratgica que define,
doutrinariamente, os diferentes nveis de deciso.
Logo, a primeira fundamental para a tomada de decises (a relao poltico-
estratgica), em qualquer dos nveis em que esta seja adotada com relao
transformao; e a segunda oferece os marcos funcionais para a transformao, isto ,
para transformar a organizao, cumprindo da melhor forma a funo para a qual foi
criada e dentro da norma estabelecida para ela.
Em outra viso, embora no distante da anterior, Dr. Motta (2001) prope para
aqueles que a cultura tenha uma importncia como uma perspectiva de anlise
organizacional, definindo-a de acordo com temas prioritrios de anlise:caractersticas de singularidade que definam a identidade ou a programao coletiva de uma organizao22
Alm de estabelecer como unidades bsicas de anlise:Valores e hbitos compartilhados coletivamente
A partir desta perspectiva, Dr. Motta (2001) comenta que a transformao cultural
tem por objetivo internalizar novos valores e que o seu treinamento constitui um
instrumento importante do processo de socializao. Da mesma forma, Dr. Motta (2001)
comenta que com a cultura deve-se ter cautela por ser alvo de crticas quando os
processos falham e porque se entende e compreende como um conceito
extraordinariamente amplo.
De fato, a cultura aludida de maneira negativa como um processo pendente a ser
desenvolvido quando no se alcana o objetivo previsto, justificando que a cultura no
estava preparada para uma mudana dessa magnitude. Isto, na realidade, no
problema da cultura, um problema do desenho da prpria transformao por no
consider-la com um papel relevante em todo o processo.
Ser necessrio, ento, o seu estudo e anlise de maneira prvia e detalhada tal
como sugere Dr. Motta (2001), com a finalidade de prevenir falhas posteriores no
processo de transformao. Releg-la a estudos ou previses de segundo plano poderia
expor a totalidade do processo a um eventual fracasso.
Kotter (1997) apresenta oito causas principais que conduzem aos processos de
mudana ao fracasso:
Permitir a complacncia excessiva (eternos ajustes ou postergaes, inexistncia
do sentido de urgncia),
Comentar sobre a criao de uma aliana forte (com autoridade para produzir a
mudana),22 MOTTA. Op cit. Pp 62.
No possuir uma viso estratgica,
No comunicar a viso de forma eficiente e em todos os nveis da organizao,
Permitir a existncia de obstculos que dificultem a implementao da nova viso,
No planejar conquistas em curto prazo,
Declarar vitria do processo de transformao prematuramente e
No incorporar as mudanas na cultura da organizao23.
Tanto a existncia de obstculos como no incorporar as mudanas cultura, se
encontram estreitamente vinculados com o xito da transformao. De fato, a cultura
pode dificultar ou obstaculizar, como tambm pode facilitar qualquer processo ao
incorporar as mudanas.
Um exemplo disto a reduo da resistncia mudana, que uma resistncia
cultural que interfere, cria obstculos ou impede a transformao organizacional. Quando
se reduz o problema, a resistncia, ao contrrio, facilita a mudana e alcana a
compreenso e a adeso estreita.
Quando se analisa o que foi comentado sobre a cultura pelo Dr. Garca
Covarrubias (2007) e pelo Dr. Motta (2001), se observa uma grande coerncia com os
princpios, valores, tradies e marcos e se percebe, tambm, o valor que cada um deles
atribui transformao.
Entretanto, em ambos os casos, eles no mencionam a doutrina como parte da
cultura organizacional, toda vez que, tanto nas organizaes civis como militares, a
doutrina, a norma ou o padro fixem e estabeleam certos parmetros em que so
desempenhadas certas atividades ou tarefas, que no caso do Exrcito apresenta
caractersticas crticas para o conhecimento do emprego da fora em sua condio de
fora armada, aspecto que na perspectiva da transformao das FA, poderia ser
considerada como uma fragilidade terica. A doutrina contm em si a cultura
organizacional militar e toda atividade de um Exrcito gira entorno doutrina. O que est
fora da doutrina, portanto, est fora do Exrcito. Mais adiante, ser abordada a doutrina
em particular e sua importncia fundamental na cultura organizacional.
Em sntese, a abordagem cultural do Dr. Motta (2001) parece mais adequada ao
posicionar em um mesmo nvel a cultura com outras perspectivas, permitindo em um
processo de transformao contar com uma viso global do problema a ser resolvido e da
forma que se enfrenta at a sua soluo ou superao. Para confirmar isso, hoje
23 KOTTER, John P. Liderando a mudana. Rio de Janeiro. Ed Campus, 1997. Pp 48
possvel ver claramente as perspectivas do Dr Motta (2001), nos elementos centrais
definidos pelo Exrcito para sua transformao, como se observa no quadro seguinte:
PERSPECTIVAS DA TEORIA DE TRANSFORMAO ORGANIZACIONAL DO DR MOTTA (2001)24
ELEMENTOS CENTRAIS DO PROCESSO DE TRANSFORMAO25
PERSPECTIVAS Tema prioritrio de anlise
Objetivos prioritrios da mudana
ELEMENTOS mbito
Estratgica Interfaces da organizao como meio ambiente
Coerncia da ao organizacional.
Estrutura superior
Com um novo enfoque capacitado para enfrentar misses advindas da funo defesa, segurana e cooperao internacionais e responsabilidade social.
Estrutural Distribuio de autoridade e responsabilidade.
Adequao da autoridade formal.
Organizao funcional
Para o exerccio da funo militar, transversal em sua gesto.
Tecnolgica Sistema de produo, recursos materiais e intelectuais para o desempenho das tarefas.
Modernizao das formas de especializao do trabalho e da tecnologia.
Tecnolgica Os novos sistemas de armas incorporam novas tecnologias e modificam os procedimentos de combate.
Humana Motivao, Motivao, Mudana Impe uma
24 Ibid.25 Ver http://www.ejercito.cl/fora-terrestre.php.
PERSPECTIVAS DA TEORIA DE TRANSFORMAO ORGANIZACIONAL DO DR MOTTA (2001)
ELEMENTOS CENTRAIS DO PROCESSO DE TRANSFORMAO
PERSPECTIVAS Tema prioritrio de anlise
Objetivos prioritrios da mudana
ELEMENTOS mbito
atitudes, habilidades e comportamento individuais, comunicao e relacionamento em grupo.
satisfao pessoal e profissional e mais autonomia no desempenho das tarefas.
cultural mudana nas competncias militares.
Cultural Caractersticas de singularidade que definam a identidade ou programao coletiva de uma organizao.
Coeso e identidade interna em termos de valores que refletem a evoluo social.
MudanaculturalDoutrina operacional
Veja o anterior.Provida para outorgar uma base intelectual e orientar a organizao.
Poltica Forma pela qual os interesses individuais e coletivos so articulados e adicionados.
Redistribuio dos recursos organizacionais de acordo com novas prioridades.
Gesto e processos
Facilita a tomada de decises para que seja acordada e oportuna.
Quadro N 2 Visualizao de perspectivas da teoria de transformao organizacional do Dr Motta (2001) e
os elementos centrais de transformao do Exrcito do Chile.
Fonte: Adaptao do autor.
A cultura organizacional, de acordo com os pilares do Dr. Garca Covarrubias
(2007), fica relegada a um segundo plano dentro da natureza de uma organizao militar,
no em termos de importncia, mas sim em termos de viso global da transformao.
Em ambas as posturas, a doutrina no considerada, explicitamente, aspecto que
para a transformao militar a base cultural mais importante, seguida pelos princpios,
os valores, as tradies e os costumes coletivos.
2.3 A ORGANIZAO
Todo processo de transformao gera alteraes organizacionais importantes, mas
fundamentais. Neste sentido, um exemplo muito estudado o do Exrcito de Terra da
Espanha, que iniciou, durante o ano de 2006, um processo de transformao, mediante o
qual fez desaparecer o conceito orgnico tradicional de Diviso, ficando a Brigada como
elemento fundamental de manobra26. Um elemento fundamental deste processo era que
estas unidades estivessem completas, j que posteriormente foram somadas mudanas
relativas ao apoio da fora. Em sntese, passou-se de uma organizao territorial para
uma funcional. Em consequncia, da prxis espanhola, foi possvel estabelecer a
existncia de uma relao entre a transformao, a criao das Brigadas completas
(como sistemas integrais) e a mudana de paradigma organizacional de terrestre para
funcional, em clara sintonia com a Estratgia Nacional de Defesa que estabeleceu o
marco poltico para essa tarefa.
Da mesma forma, esta nova concepo impactou a doutrina com conceitos
orgnicos, tais como o desaparecimento da Diviso, do termo areo transportvel de
unidades que no tinham valor operacional e/ou que no contribuam em nada com a
nova estrutura e eficincia do Exrcito27. Mudanas com evidentes implicaes
doutrinrias e que so geradas no mais alto nvel das organizaes operacionais como
a Brigada como unidade completa de costume, que em outras palavras se organiza como
Sistema Operacional, com as implicaes que isto reveste para suas estruturas
orgnicas internas menores, da mesma forma que a sua estrutura superior, que supe um
processo de adaptao, em que a estratgia demanda profundas adaptaes em
aspectos operativos ou operacionais.
Descompondo etimologicamente o termo sistema operacional, temos do
dicionrio da lngua portuguesa, como sistema: conjunto de elementos, concretos ou abstratos, intelectualmente organizados.
Tambm como: conjunto de regras ou leis que fundamentam determinada cincia, apresentando uma explicao para uma grande quantidade de fatos28.
Por sua vez, no mesmo dicionrio, operacional (de operativo em espanhol):Em condies de realizar ou de ser utilizado em operaes militares29.
Em consequncia, um sistema operacional pode ser definido como: uma
organizao militar altamente coordenada entre suas unidades componentes e prontas
para atuar em qualquer cenrio para os quais tenham sido concebidas. Esta conceituao
altamente relevante toda vez que se direciona para o ltimo objetivo da transformao,
isto , o engajamento da guerra, em que todos os esforos de transformao realizados
26 HERNNDEZ, Vctor. O Plano Exrcito XXI, Alcana seu Equador. Revista Espanhola de Defesa. Ed. N 179. Madri. Espanha. 2008. Pp 26.
27 Ibid. Pp 17.28 DICIONRIO HOUASSIS, da Lngua Portuguesa. 1. Ed 2009. Pp 1.752. 29 Ibid. Pp 1.390.
pelos exrcitos contribuem para isto e que, entre outros aspectos, passaram de maneira
imperiosa por uma mudana em sua cultura institucional.
Ento, se apresenta uma nova perspectiva de acordo com a concepo do Dr.
Motta (2001): a perspectiva estrutural.
De acordo com isto, deveria ser analisada a distribuio de autoridade e de
responsabilidades, tendo como unidades bsicas os papeis e o estado. Logo, se
atribumos esta perspectiva de anlise ao que ocorreu no Exrcito de Terra da Espanha,
podemos chegar concluso de que a modificao da Diviso para Brigada, como
unidade bsica de costume e sistema operacional integral, uma modificao resultante
de uma anlise estrutural ou de uma perspectiva estrutural, implicando modificaes de
nveis de autoridade e de responsabilidade.
A deciso adotada como resultado da anlise da perspectiva estrutural no deve
ser isolada, pois tem implicaes estratgica, tecnolgica, humana, cultural e poltica.
Portanto, a deciso tem caractersticas globais para a organizao. A viso
multidimensional do Dr Motta (2001) destas perspectivas se enriquece com a viso da
natureza da mudana ou da razo para a transformao, de tal forma que permite evitar
desvios no propsito final da transformao.
Definitivamente, esta perspectiva de anlise permite definir a necessidade de uma
transformao organizacional, sua pertinncia e alcance. A esse respeito, podem ser
visualizados diferentes tipos de mudanas:
TIPO DE MUDANA
Tamanho Micromudana.Focada dentro da organizao.Exemplo: Redefinio de cargos em uma fbrica ou desenvolvimento de um novo produto.
Macromudana.Visualiza a organizao inteira, incluindo suas relaes com o ambiente. Exemplo: Reposicionamento no mercado ou alterao de todas suas instalaes fsicas.
Gerao e controle
Espontnea.No gerada nem controlada pelos dirigentes das organizaes. originria das aes do dia a dia e guiada por pessoas que no ocupam uma verdadeira posio de autoridade.
Planejada.Ocorre de maneira programada, isto , regida por um sistema ou um conjunto de procedimentos que devem ser seguidos.
Dirigida.Necessita de um guia com posio de autoridade para supervisionar a mudana e garantir a sua implementao.
Quadro N 3 Tipos de mudana.
Fonte: Adaptao de Lima e Bressan (2003) e Pinto e Couto-de-Souza (2009).
possvel compreender que o processo espanhol uma macromudana, pelas
notveis mudanas de estrutura e de organizao, tendo sido planejada e dirigida. Logo,
faz parte de um plano altamente detalhado e que necessita de uma permanente direo
para controlar o correto desenvolvimento da mudana.
2.4 A DOUTRINA
A doutrina no outra coisa que a forma em que as organizaes distribuem suas
tarefas e funes, estabelecem relaes, estabelecem suas autoridades e constroem o
seu conhecimento coletivo entre os quais esto: os valores, os princpios e o costume
como bem cultural da organizao. Esta doutrina normalmente se traduz em instrues ou
procedimentos de cumprimento geral.
Por sua vez, a doutrina em sua vertente militar, se vincula diretamente com os
exrcitos, constituindo para alguns a alma explcita das instituies e um verdadeiro
depsito de toda incumbncia das instituies, onde se estabelecem os conceitos e
preceitos que normatizam a vida militar, a forma de atuar das tropas em combate, sua
forma de comando e emprego, compreendendo tambm os princpios de valores da
prpria carreira das armas e o uso do emprego militar dos prprios sistemas de armas.
Para Sun Tzu, o terico militar clssico, comentava que:A doutrina tem que ser compreendida como a organizao do Exrcito, as graduaes e postos entre os oficiais, a regulao das rotas de abastecimentos e a proviso de material militar do Exrcito30,
portanto, estabelecia uma relao entre doutrina, organizao e armamento.
Por sua vez, Clausewitz, o terico militar do sculo XIX, sustentava que:
a doutrina somente serve para os exrcitos para os quais foi criada31.
Este autor argumenta que o valor militar de uma fora pode ser obtido de duas
formas: uma :
as campanhas e as vitrias (a guerra em si), e a outra o treinamento intenso32,
aspecto que tem direta relao com a organizao e com estruturas capazes de enfrentar
um inimigo determinado, que se afirma tambm, pelo seu valor moral, sem o qual no
contaria com capacidades de maneira global.
A doutrina to relevante para os exrcitos que todos, sem exceo, contam com
unidades de diversas categorias que desenvolvem, avaliam e difundem a doutrina das 30 UNIVERSIDADE NACIONAL DE DEFESA DA CHINA. A Arte da Guerra de Sun Tzu. Ed. 2010. 31 EXRCITO DO CHILE. Op Cit. Pp 13.32 ROGERS A., L. Clausewitz. Trechos da sua Obra. Rio de Janeiro. Brasil. 1988. Pp 87.
instituies, de tal forma que a cultura apresenta uma tendncia natural para a mudana,
de acordo com as restries que imperam no contexto em que cada organizao, seja
militar ou civil, se desenvolve.
Em consequncia, a doutrina faz parte do acervo cultural de qualquer organizao
e, portanto, deve fazer parte de qualquer processo de transformao que se desenvolve,
aspecto que outorga a estes processos credibilidade ao ter embasamento doutrinrio e,
especialmente, facilidades ao possibilitar a incorporao e assimilao dos mesmos como
uma necessidade da qual no se deve por resistncia e que, pelo contrrio, necessrio
adicionar entusiasmo e compromisso. Como parte da cultura, a doutrina deve ser o
objetivo primeiro de qualquer processo transformador e de no faz-lo, as organizaes
se expem ao repdio, gerando diversas incongruncias tais como: a dissidncia, a apatia
e o ressentimento33.
A dissidncia se resume negao da verdade transformadora como equvoca e
para a qual se conta com uma soluo prpria.
A apatia, em termos gerais, pode ser resumida a um ato de indiferena e de
desprezo pela ao transformadora.
Finalmente, o resentimento, pelo qual possvel prejudicar seriamente o processo
de transformao por acreditar que esse processo os exclui e prejudica.
Todos os processos indicados como incongruncias podem ser abordados a partir
da doutrina, gerando espaos de mudana, outorgando flexibilidade, criatividade e,
especialmente, profundidade conceitual, em que os integrantes compreendem os
processos e se somam a eles.
Em sntese, a fundamentao cultural baseada na doutrina constitui um articulador
da transformao.
3 METODOLOGIA
33 MOTTA. Op cit. Pp 166.
O tema da pesquisa foi desenvolvido atravs de um estudo analtico-descritivo de
marcos e eventos selecionados.
Em primeiro lugar, foi necessrio contextualizar todo o processo de transformao
do Exrcito, a fim de verificar qual foi a origem do processo que atualmente est sendo
desenvolvido.
Posteriormente, ao ter a viso geral do fato no tempo sob a forma de Carta de
Gantt, foi possvel identificar progressivamente os marcos e eventos que de alguma
maneira proporcionaram alguma mudana na cultura e na estrutura da organizao,
aspecto que permitiu ordenar e gerar uma sequncia, facilitando o estudo posterior. Esta
seleo inicial foi elaborada com base nos documentos disponveis para a consulta do
Exrcito, diferentes publicaes do Exrcito do Chile, a prpria entrevista realizada com o
Comandante do Exrcito (que centralizou os questionrios remetidos a diferentes
autoridades) e a prpria experincia profissional militar do autor. Os marcos e os eventos
foram selecionados preliminarmente, conforme a rea de mudana e a incidncia, como
se observa a seguir:
MARCO OU EVENTO REA DE MUDANA INCIDNCIA34
DOUTRINA ORGANIZAO MBITO NVELPlano Alczar
Enfoque,
viso.
Estratgico
Incorporao de
material de tanques
Leopard 1-V
Tecnolgico Ttico
A disponibilidade de
recursos da Lei
Reservada de Cobre
Enfoque,
viso.
Estratgico
O Plano de
Racionalizao da
Estrutura e
Desenvolvimento do
Exrcito (PREDEFE)
Enfoque,
viso.
Estratgico
A criao de uma
massa crtica
Enfoque,
viso.
Estratgico
A criao da Diviso
Doutrina
Doutrina Operacional
34 Ver pgina 21, sobre como pode ser entendida a transformao de acordo com a Doutrina, o Exrcito e a Fora Terrestre do Exrcito do Chile.
MARCO OU EVENTO REA DE MUDANA INCIDNCIADOUTRINA ORGANIZAO MBITO NVELDe um Exrcito
territorial a um Exrcito
operacional
Enfoque,
viso.
Estratgico
As experincias das
operaes de paz
(Haiti)
Doutrina Operacional
O processo de lies
aprendidas
Doutrina Operacional
O novo sistema de
instruo e
treinamento
Doutrina Operacional
A Doutrina, o Exrcito
e a Fora Terrestre
Doutrina Operacional
O acidente de Antuco Doutrina OperacionalA Diretriz Geral do
Exrcito
Doutrina Operacional
A Lei de Transparncia
e Informao Pblica
Enfoque,
viso.
Estratgico
Difuso da Doutrina
Operacional
Doutrina Operacional
O terremoto de 27 de
fevereiro de 2010
Enfoque,
viso.
Estratgico
A Lei Antidiscriminao
Enfoque,
viso.
Estratgico
Quadro N 4 Seleo e avaliao preliminar de marcos e eventos.
Fonte: O autor
Em seguida, foi necessrio encontrar um apoio terico para compreender o
processo desenvolvido, para que o embasamento dos marcos e eventos identificados
pudesse proporcionar uma relao com a teoria disponvel. Consequentemente, era
necessrio estabelecer a teoria que se utilizaria para este propsito. Ao ser analisada a
teoria existente, foi possvel comprovar que existem inmeras teoria de aplicao
estritamente civil e focada para o mundo empresarial e a administrao pblica, que no
abordam a problemtica particular da defesa. Entretanto, se selecionou o Dr. Paulo Motta
(2001) e sua respectiva teoria da transformao, j que permite analisar o fenmeno
antes da transformao. Isto , sob a forma de planejamento com objetivos e reas a
serem desenvolvidos, de gesto do processo, de viso global e de retrospectiva do
processo em seu conjunto. Alm do Dr. Motta (2001), conta com vasta bibliografia em
espanhol (idioma nativo do autor), portugus e ingls, portanto cumpre com os
parmetros necessrios para o estudo. Por outro lado, era necessrio estabelecer um
segundo autor cuja teoria, especificamente, possa servir para analisar o processo do
Exrcito Chileno. Foi selecionado o Dr. Garca Covarrubias (2007), j que permitia
contrastar sua teoria com a do Dr. Motta (2001). Sendo um ex-oficial do Exrcito chileno,
ele aponta a problemtica militar de forma exclusiva e sua teoria foi elaborada com
conhecimento dos processos de transformao das diferentes foras armadas da Amrica
Latina e dos Estados Unidos, em cujo pas este militar cumpre funes no Departamento
de Defesa do governo.
Com a seleo dos autores indicados que cumpriam com os requisitos gerais
indicados para o propsito da pesquisa, se conseguia evitar uma extenso excessiva do
marco terico, que no contribua muito para a compreenso do fenmeno militar
individual ocorrido no Exrcito do Chile. Entretanto, o Referencial Terico foi
fundamentado a partir de autores clssicos tais como Clausewitz, Sun Tzu, Lima e
Bressan (2003), Pinto e Couto-de-Souza (2009), Moretto (2012) e Thomas Kuhn (1975),
dos quais foram extradas importantes observaes que contriburam para enriquecer o
Referencial Terico e consolidar com outras ideias as principais teorias.
Posteriormente, foi feita uma anlise, em particular, cada um dos eventos e marcos
identificados, para que fosse possvel compreender o seu valor relativo e seu impacto
potencial no processo de transformao do Exrcito do Chile, valorizando cada um dos
aspectos nos quais se percebia que havia sido gerado algum tipo de dinmica cultural de
importncia ttica, operacional ou estratgica na instituio e, eventualmente, na poltica,
garantindo que tivesse sido efetiva a participao no processo. Com este propsito, se
revisou inmeras bibliografias, fundamentalmente, artigos em publicaes militares e as
prprias entrevistas realizadas, sendo relevante, neste sentido, a entrevista realizada com
o prprio Comandante do Exrcito do Chile, que centralizou as entrevistas a outras
autoridades institucionais, aspecto que permitiu obter uma viso institucional objetiva e
oficial. Merece ressaltar que durante esta parte da pesquisa, comearam a aparecer
diferentes antecedentes classificados como reservado e que, portanto, foram omitidos,
embora no tenham afetado a fundo o propsito da prpria pesquisa.
Concluda a etapa anterior, foi realizada uma pesquisa de campo para verificar, de
forma criteriosa, o impacto efetivo dos marcos e eventos da transformao na cultura
institucional, seguida de uma anlise dos resultados estatsticos compilados com o
questionrio aplicado, aspecto que permitiu confirmar a hiptese de maneira efetiva.
Por fim, foram elaboradas as concluses da pesquisa e definida uma linha de
pesquisa que permitisse aprofundar o tema com relao transformao do Exrcito
chileno.
3.1 TIPO DE PESQUISA
O presente trabalho de pesquisa se constitui em uma pesquisa ex post fato, do tipo
no experimental transacional.
Foi considerada do tipo no experimental, j que no existe a necessidade de
manipular as variveis definidas, mas sim analis-las com respeito ao impacto produzido
em sua interao efetiva.
Foi transacional, j que os antecedentes que foram sendo obtidos, independente
da natureza destes, pertencem a um determinado momento no tempo, isto , a partir de
1992 at hoje em dia, considerando toda a informao disponvel no nvel do Exrcito do
Chile, centralizada na entrevista com o Comandante do Exrcito do Chile e, por sua vez,
nas experincias e vivncias profissionais adquiridas pelos prprios entrevistados tanto
como integrantes de algum processo, em particular, como parte de uma amostra da
instituio.
3.2 UNIVERSO E AMOSTRA
Procurou-se confirmar ou refutar a hiptese, em funo dos objetivos apresentados
atravs da anlise do contexto global da transformao do Exrcito Chileno por meio de
marcos e eventos relevantes e dos impactos organizacionais e doutrinrios que incidiram
na mudana cultural, para que pudesse visualizar o efeito institucional na tomada de
decises.
O universo utilizado foi o de oficiais, que tivessem cumprido funes nas unidades
do pas como subalternos de diferentes armas de combate, de apoio e de servios, de tal
forma que sua informao possa representar o impacto de cada um dos marcos e
eventos.
A amostra est representada por 21 oficiais que atualmente cursam o segundo ano
do Curso regular de Estado Maior da Academia de Guerra do Exrcito do Chile, sendo
que estes prestaram servios como subalternos em distintas guarnies e unidades do
pas, antes de ingressar na Academia de Guerra.
As entrevistas foram realizadas pessoalmente e atravs de email, tentando
centralizar ao mximo a informao mediante a obteno de antecedentes, quando
possvel, de uma s fonte que centralizasse como aconteceu com o prprio Comandante
do Exrcito.
3.3 COLETA DE DADOS
Com relao aos dados, estes foram coletados de maneira quantitativa
(questionrio) e qualitativa (entrevistas), fundamentalmente aqueles que se referem aos
conceitos aplicados por autoridades que lideraram e lideram os processos atravs de
questionrio especfico. As entrevistas foram elaboradas com perguntas abertas.
O questionrio aplicado aos oficiais da Academia de Guerra foi do tipo fechado,
escalonado, utilizando a escala de razo de Likert35.
Objetivos Tipo de Pesquisa Dados Coleta
a
Obter antecedentes relevantes com relao origem e ao desenvolvimento do processo de transformao.
ex post fato De fontes diretasEntrevistas e documentos
b
Determinar as mudanas geradas na doutrina, consequncia direta da transformao.
ex post fato ex post fato
Entrevistas, questionrio
e documentos
c
Determinar as mudanas geradas na estrutura organizacional do Exrcito Chileno.
ex post fato ex post fato
Entrevistas, questionrio
e documentos
d Determinar os impactos gerados no Exrcito chileno. ex post fato ex post fatoQuestionrio e entrevista
Quadro 5 - Coleta de dados
Fonte: O autor.
3.4 TRATAMENTO DE DADOS
O tratamento dos dados coletados foi realizado atravs de um registro detalhado
de fichas, diferenciando as entrevistas e pesquisas das obtidas em documentos e
literatura disponvel, sendo registradas em fichas bibliogrficas.
Dados Coleta Tratamento
TransformaoDocumentos e
entrevista semiestruturada
Anlise e tabulao
Doutrina Documentos e entrevista
Anlise e tabulao
35 CONSTANT VERGARA, Sylvia. Mtodos de Coleta de Dados no Campo. So Paulo. Editora Atlas S.A. 2009, Pp 51.
Dados Coleta Tratamento
semiestruturada
OrganizaoDocumentos e
entrevista semiestruturada
Anlise e tabulao
Quadro 6 Relao dado, coleta e tratamento
Fonte: O autor.
3.5 LIMITAES DO MTODO
A limitao do mtodo estava relacionada com a temporalidade da pesquisa, isto ,
existem processos atualmente em desenvolvimento, uma vez que alguns efeitos ou
consequncias no tenham sido visualizados ainda e, em consequncia, atualmente
objeto de anlise detalhado na instituio.
O estudo est focado na realidade do Exrcito do Chile, portanto, no incluiu, em
sua fase conclusiva, experincias de outros exrcitos.
Coleta Tratamento Limitao do mtodo
Literatura
Anlise do contedo
Limitada ao acesso da literatura disponvel.
Questionrios e entrevista semiestruturada Aspectos sigilosos.
Dados estatsticos Aspectos sigilosos.Quadro 7 Limitaes do mtodo
Fonte: O autor.
4 SITUAO INSTITUCIONAL PRVIA4.1 ASPECTOS GERAIS
A situao institucional prvia ao incio da transformao do Exrcito, em termos
gerais, pode ser considerada estreitamente vinculada a um emprego territorial36, isto ,
concentrada em um determinismo geogrfico, com unidades incompletas, com grande
dependncia da mobilizao, sem sistemas operacionais, com pouca operacionalidade e
focado unicamente na dissuaso e no conflito37.
4.2 CONSIDERAES ESPECFICAS
Independente da viso geral que, em termos de perspectiva, pode ser realizada, a
situao prvia do Exrcito do Chile pode ser fragmentada luz de vrios fatores, que
definitivamente formaram um quadro geral, detalhado precedentemente e que foi
elaborado com base nas seguintes consideraes principais:
Em primeiro lugar, depois de 17 anos de participao das Foras Armadas no
governo, finalmente no ano de 1990, tinha sido apresentado o poder poltico da nao s
autoridades democraticamente eleitas38. Esta particular conjuntura tornou evidente que
at este momento uma grande quantidade de pessoal, em particular, de oficiais que
36 Refere-se a uma forma de organizao e emprego de unidades que privilegia a distribuio delas, em toda a extenso do territrio nacional, postergando ou relegando, portanto, uma viso ou emprego destas segundo uma viso mais operacional ou de engajamento operacional de guerra.
37 ENTREVISTA ao Comandante do Exrcito do Chile. Abril de 2013.38 Ibid.
desempenhavam diversas responsabilidades na administrao pblica e que, portanto,
cumpriam papeis de responsabilidade poltica, situao que fez com que boa parte da
oficialidade se concentrasse na preparao para a gesto pblica, afastando-se da
problemtica que institucionalmente devia ocup-los. Esta situao se prolongou por 17
anos de governo das Foras Armadas, de 11 de setembro de 1973 at maro de 1990.
Inevitavelmente, durante este perodo a conjuntura poltica do pas convocou a todos que
desempenhavam funes nestas condies. Contudo, a grande parte da instituio, que
apoiava fielmente os princpios e a vocao superior, em benefcio do pas, mantinha o
governo das Foras Armadas. Dessa maneira, qualquer perspectiva interna que se
desenvolva, poderia ter sido considerada como mesquinha ou egosta e alheia prpria
vocao de sacrifcio e patriotismo que inundava o ambiente cultural militar. Por outro
lado, a prpria instituio premiava com a confiana do governo aos seus melhores
homens, instalando-os, precisamente, em postos de alta relevncia tanto da
administrao pblica como em atividades de ordem poltica associadas ao governo
dentro do pas.
Em segundo lugar, tornou-se evidente que, ao regressarem todas essas
autoridades militares para a instituio, comeou a ser desenvolvida e disseminada,
rapidamente, a ideia de que devia ser realizada uma modernizao institucional, que na
prtica no era outra coisa que voltar a focar o olhar crtico e construtivo para a prpria
instituio, uma vez que a tarefa institucional em benefcio do pas j tinha sido
desenvolvida e com absoluto xito, instaurando-se novamente um regime democrtico
com a funo de reger os destinos da nao.
Foi ento que certas realidades comearam a ser detectadas e que passaram a
constituir parte da anlise crtica que levou a desenvolver o denominado Plano Alczar
para modernizar a instituio. Entre os aspectos que fizeram parte da anlise,
destacando-se as seguintes caractersticas da instituio no momento:
Forte dependncia de emprego territorial.
Determinismo geogrfico.
Falta de eficincia para o adequado emprego dos recursos.
No se marcava um centro de esforo claro.
Foras no aptas para tarefas mltiplas.
Falta de padronizao.
Unidades incompletas.
Ausncia de sistemas operacionais integrais.
Falta de especializao do pessoal.
Pouca operacionalidade.
4.2.1 Forte dependncia de emprego territorial39. Estas caractersticas no s provinha das apreciaes do sculo passado, onde as
unidades se desdobravam vinculadas ao desenvolvimento do pas e a certas restries
estratgicas que permitiam um alto grau de engajamento militar na fronteira em extenso
e que durante o governo das Foras Armadas teve uma maior importncia, levando em
conta as consideraes polticos-conjecturais direcionadas a diversas medidas de ordem
interna do pas, em que as Foras Armadas e o Exrcito, em particular, tiveram amplas
responsabilidades.
4.2.2 Determinismo geogrfico40. Caractersticas estreitamente vinculadas com a anterior e que se materializava
mediante a presena militar em praticamente todo o territrio nacional, aspecto que
implicava um enorme esforo organizacional para a transmisso de diretrizes do tipo
militar e, especialmente, para uniformizar, estandardizar e controlar os nveis adequados
de treinamento. Por outro lado, este determinismo geogrfico, somado s
responsabilidades de ordem interna do pas, fez que, com o tempo, estas assumissem um
papel central e preponderante nas tarefas e atividades que desenvolviam as unidades ao
longo do pas. Em muitos destes casos, os prprios comandantes de unidades eram
nomeados em paralelo, como autoridades comunais, provinciais e inclusive, regionais,
razo esta que explica com maior fora esta caracterstica institucional prvia.
4.2.3 Falta de eficincia para o adequado emprego dos recursos41
Por sua vez, esta presena fsica em muitos lugares, no necessariamente
contribua para o conceito de eficincia tanto humana como material. De fato, o emprego
de recursos em unidades muito reduzidas com relao a pessoal e que no podiam se
manter nos perodos de treinamento muito complexos se deve que entre outros aspectos
no contavam com pessoal suficiente para realizar a custdia dos quarteis, aspecto que
reduziu sensivelmente a cultura do treinamento de combate permanente, substituindo-o
por perodos curtos de treinamento e em certas pocas do ano. Do mesmo modo, os
39 Ibid.40 Ibid.41 Ibid.
recursos econmicos eram muito reduzidos, toda vez que o foco do esforo no gasto
pblico estava direcionado a satisfazer exigncias sociais prioritrias e de carter
nacional. Sobre isso, desenvolveu-se uma cultura institucional de mxima austeridade e
que foi traduzida em termos de recursos humanos e materiais em que, por um lado, o
pessoal era muito reduzido para cumprir com as diversas tarefas e, por outro, o material
era antiquado e no podia ser substitudo, pois o pas no estava em condies de faz-
lo, permitindo que, paulatinamente, o material e o treinamento fossem degradando-se,
apesar dos esforos que foram feitos para mant-los em uso.
4.2.4 No se marcava um centro de esforo claro42
A instituio avocada conjuntura interna de maneira prioritria, somada ao
determinismo geogrfico e a presena territorial, no permitiam, ento, estabelecer com
clareza qual era o centro do esforo institucional, elemento chave e necessrio para
elaborar as polticas e projetos. Por um lado, poderia ser dito que o centro do esforo
institucional estava parcialmente claro, isto , a conjuntura interna e social do pas, por ter
sido este o centro do esforo como se presume, sendo cumprido com o trabalho.
Contudo, constitucionalmente43, o trabalho principal das Foras Armadas est na defesa
da integridade e soberania nacionais, acima de outras consideraes, parecendo,
portanto, um contrassenso manter a afirmao anterior. Na verdade, possvel sustentar,
parcialmente, que, na verdade, a situao interna do pas foi uma preocupao constante
e permanente durante o governo das Foras Armadas e que seu esforo, sem dvida,
esteve direcionado para satisfazer qualquer demanda que, neste sentido, fosse
percebida.
4.2.5 Foras no aptas para tarefas mltiplas44
Se a situao com relao aos recursos era precria, a disposio para manter,
em termos de equipamento, instruo e treinamento, a fora institucional para
desenvolver outras tarefas, tambm eram igualmente precrias, embora muitas vezes
forma desenvolvidas outras atividades ou tarefas. Estas implicavam um grande esforo e
normalmente terminavam por absorver toda a disponibilidade de recursos, como, por
exemplo: as funes de segurana interna que muitas unidades desenvolveram,
42 Ibd.43 CONSTITUIO POLTICA DA REPBLICA DO CHILE. 1980. Elaborada e aprovada mediante
plebiscito universal durante o governo das Foras Armadas do Chile.44 ENTREVISTA. p. cit.
implicando que toda a cultura militar diria era vertida em funo desta e os oramentos
disponveis. Da mesma forma, estavam direcionadas para satisfazer necessidades neste
sentido. Em consequncia, as unidades no contavam com flexibilidade suficiente para se
adaptarem a condies mutveis, aspecto que em termos culturais fez com que algumas
unidades mudassem totalmente a sua vocao de guerra por uma vocao de segurana
interna.
4.2.6 Falta de padronizao45
Tal como foi comentado, as carncias de recursos tanto humanos como materiais,
bem como a conjuntura interna nacional, fizeram com que, com o passar do tempo, tanto
os equipamentos, os sistemas de apoio, a logstica e as comunicaes perdessem
operacionalidade e especialmente passassem a ficar obsoletos apesar dos diversos
esforos que foram desenvolvidos para minimizar. Por outro lado, fruto disto e de outras
restries internacionais, fizeram com que fosse impossvel a padronizao institucional,
aspecto de grande importncia para o planejamento do engajamento operacional para a
guerra. A falta de p