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2074 DESVIOS FONÉTICOS E/OU FONOLÓGICOS: UMA CLÍNICA FONOAUDIOLÓGICA DE EMPRÉSTIMOS. “Entender os termos lingüísticos para não deslizar diagnósticos”. Maria Andressa Lacerda Dantas Pereira da Costa SMS-Maceió/AL/PE/UNICAP/UFAL Introduzindo o Problema A fonoaudiologia é uma área de estudos relativamente nova que recebe de outras ciências, como a lingüística, a neurologia e a psicologia, contribuições teóricas para fundamentar sua prática clínica-terapêutica que, muitas vezes, não são devidamente consideradas, o que leva a conseqüências na formação dos fonoaudiólogos. É o que acontece quando determinados conceitos destas ciências são incorporados à prática clínica, utilizados de forma mecânica e superficial e suas reais definições e origens desconhecidas. Na área da reabilitação – fonoterapia – é muito comum a utilização de termos lingüísticos para a conceituação das desordens de fala e linguagem, como é o caso dos desvios fonéticos e fonológicos. Para Castro (2006) estes desvios podem ocorrer concomitantemente comprometendo a articulação e o conhecimento internalizado do sistema de sons da língua. Os desvios fonéticos (antigo distúrbio articulatório) são decorrentes das alterações anatomofisiológicas dos Órgãos Fonoarticulatórios (OFAS) e de dificuldades sensoriais (perda auditiva) que comprometem a produção dos sons da língua. Os desvios fonológicos (antiga dislalia) não são considerados uma incapacidade articulatória propriamente dita, mas uma organização falha do sistema (dificuldade em se perceber os contrastes) dos sons da língua que compromete a sua emissão (DA COSTA, 2006). Por se tratarem de alterações com causas distintas, a reabilitação é particular para cada uma delas. Segundo Pessoa e Cabral (2006), na prática clínica, uma alteração fonética deve receber tratamento a fim de modificar os gestos – ponto e modo – articulatórios e, no caso de uma alteração fonológica, é necessária a tomada de consciência por parte da criança de que sua fala é comunicativamente inadequada e, nesse caso, será necessário adquirir um novo contraste de sons. Nesse caso, cabe ao fonoaudiólogo a busca teórica para a compreensão da natureza de todos os desvios de fala e linguagem, porque é apenas essa compreensão que pode levá-lo a um bom diagnóstico e, conseqüentemente, a elaborar um planejamento terapêutico apropriado para cada caso. Porém, como essa busca nem sempre acontece e os empréstimos para a conceituação e compreensão dos desvios de fala e linguagem são muitos e de muitas ciências, muitos profissionais, por falta de conhecimento, lançam mão de “receitas” para enquadrar as dificuldades da criança na coluna fonética (com alteração orgânica) ou fonológica (sem alteração orgânica). Como resultado, muitos desvios fonéticos são diagnosticados como fonológico e vice-versa, o que interfere no planejamento e sucesso terapêutico. Tratar o desvio fonético como fonológico, assim como o contrário, pela inexistência de um diagnóstico diferenciado, trará sérias conseqüências à reabilitação, como, por exemplo, um maior tempo destinado à terapia. Logo, uma criança que passaria até seis meses em reabilitação pode acabar passando mais de um ano, o que trás transtornos familiares e frustração profissional. Nesse trabalho, especificamente, trataremos de refletir sobre os conceitos “desvio fonético” e “desvio fonológico” entendidos por muitos fonoaudiólogos como simples “etiquetas” para as trocas articulatórias ou dislalias e as conseqüências desta simplificação. A conseqüência mais visível, como se verá ao longo do texto, refere-se a confusões terminológicas que pode levar a dificuldades no diagnóstico diferencial com graves conseqüências na reabilitação de fala e linguagem. 1. A Pesquisa Diante da realidade apresentada e para que fosse possível discutir a importância da lingüística na formação fonoaudiológica, aplicou-se um questionário a fonoaudiólogos com experiência mínima

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DESVIOS FONÉTICOS E/OU FONOLÓGICOS: UMA CLÍNICA FONOAUDIOLÓGICA DE EMPRÉSTIMOS.

“Entender os termos lingüísticos para não deslizar diagnósticos”.

Maria Andressa Lacerda Dantas Pereira da Costa – SMS-Maceió/AL/PE/UNICAP/UFAL Introduzindo o Problema A fonoaudiologia é uma área de estudos relativamente nova que recebe de outras ciências, como a lingüística, a neurologia e a psicologia, contribuições teóricas para fundamentar sua prática clínica-terapêutica que, muitas vezes, não são devidamente consideradas, o que leva a conseqüências na formação dos fonoaudiólogos. É o que acontece quando determinados conceitos destas ciências são incorporados à prática clínica, utilizados de forma mecânica e superficial e suas reais definições e origens desconhecidas. Na área da reabilitação – fonoterapia – é muito comum a utilização de termos lingüísticos para a conceituação das desordens de fala e linguagem, como é o caso dos desvios fonéticos e fonológicos. Para Castro (2006) estes desvios podem ocorrer concomitantemente comprometendo a articulação e o conhecimento internalizado do sistema de sons da língua. Os desvios fonéticos (antigo distúrbio articulatório) são decorrentes das alterações anatomofisiológicas dos Órgãos Fonoarticulatórios (OFAS) e de dificuldades sensoriais (perda auditiva) que comprometem a produção dos sons da língua. Os desvios fonológicos (antiga dislalia) não são considerados uma incapacidade articulatória propriamente dita, mas uma organização falha do sistema (dificuldade em se perceber os contrastes) dos sons da língua que compromete a sua emissão (DA COSTA, 2006). Por se tratarem de alterações com causas distintas, a reabilitação é particular para cada uma delas. Segundo Pessoa e Cabral (2006), na prática clínica, uma alteração fonética deve receber tratamento a fim de modificar os gestos – ponto e modo – articulatórios e, no caso de uma alteração fonológica, é necessária a tomada de consciência por parte da criança de que sua fala é comunicativamente inadequada e, nesse caso, será necessário adquirir um novo contraste de sons.

Nesse caso, cabe ao fonoaudiólogo a busca teórica para a compreensão da natureza de todos os desvios de fala e linguagem, porque é apenas essa compreensão que pode levá-lo a um bom diagnóstico e, conseqüentemente, a elaborar um planejamento terapêutico apropriado para cada caso. Porém, como essa busca nem sempre acontece e os empréstimos para a conceituação e compreensão dos desvios de fala e linguagem são muitos e de muitas ciências, muitos profissionais, por falta de conhecimento, lançam mão de “receitas” para enquadrar as dificuldades da criança na coluna fonética (com alteração orgânica) ou fonológica (sem alteração orgânica). Como resultado, muitos desvios fonéticos são diagnosticados como fonológico e vice-versa, o que interfere no planejamento e sucesso terapêutico.

Tratar o desvio fonético como fonológico, assim como o contrário, pela inexistência de um diagnóstico diferenciado, trará sérias conseqüências à reabilitação, como, por exemplo, um maior tempo destinado à terapia. Logo, uma criança que passaria até seis meses em reabilitação pode acabar passando mais de um ano, o que trás transtornos familiares e frustração profissional.

Nesse trabalho, especificamente, trataremos de refletir sobre os conceitos “desvio fonético” e “desvio fonológico” entendidos por muitos fonoaudiólogos como simples “etiquetas” para as trocas articulatórias ou dislalias e as conseqüências desta simplificação. A conseqüência mais visível, como se verá ao longo do texto, refere-se a confusões terminológicas que pode levar a dificuldades no diagnóstico diferencial com graves conseqüências na reabilitação de fala e linguagem. 1. A Pesquisa

Diante da realidade apresentada e para que fosse possível discutir a importância da lingüística na formação fonoaudiológica, aplicou-se um questionário a fonoaudiólogos com experiência mínima

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de dois anos em reabilitação de fala infantil, pós-graduados em linguagem e com experiência distintas de disciplinas voltadas inteiramente à lingüística em suas graduações.

O questionário destacava aspectos relacionados à formação em lingüística na graduação e conhecimentos sobre desvios fonéticos e/ou fonológicos em duas perguntas simples e diretas. Cada profissional, em momentos distintos, recebeu um questionário e respondeu a punho a questões expostas abaixo.

1) Em sua graduação você cursou alguma disciplina voltada inteiramente à lingüística? 2) Em sua opinião, qual a diferença entre distúrbio articulatório, dislalia, desvio fonético e desvio

fonológico?

O objetivo da primeira pergunta justifica-se pela possibilidade de se realizar uma correlação entre uma boa ou má diferenciação dos desvios e uma suficiente ou não formação/investimento pessoal em lingüística durante a formação profissional. A abordagem quanto à diferença questionada entre desvio fonético, desvio fonológico, distúrbio articulatório e dislalia, realizada na segunda questão, justifica-se pela necessidade de se constatar a grande dificuldade tida por muitos fonoaudiólogos na diferenciação dos desvios citados. Para compor os dados (corpus) a serem descritos, analisados e discutidos neste artigo, foram selecionados quatro questionários de forma aleatória e nomeados de A, B, C e D. Uma característica positiva dos questionários analisados é o fato de terem sido respondidos por profissionais com formação em diferentes instituições (FIR- Faculdade Integrada do Recife/PE, UNICAP – Universidade Católica de Pernambuco/PE e UNCISAL- Universidade Estadual de Ciências da Saúde de Alagoas/AL) e todos funcionários do Sistema único de Saúde (SUS). 2. A Descoberta

As respostas do questionário A foram desenvolvidas por uma fonoaudióloga, graduada pela UNCISAL em 2006, onde cursou as disciplinas Lingüística Geral e Lingüística Aplicada à Fonoaudiologia. No momento da aplicação do questionário cursava o primeiro ano do mestrado de Letras/Lingüística da UFAL e possuía dois anos de experiência em fonoterapia. Questionário: A

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Com relação à distinção das alterações, a terapeuta reconheceu os termos dislalia e distúrbio articulatório, apesar de não correlacioná-los aos desvios fonéticos e fonológicos. Na distinção destes termos, existiu uma boa diferenciação e aceitável conceituação, apesar da falta de citação quanto à possibilidade de alterações sensitivas (perdas auditivas) serem, também, causas do desvio fonético. Apesar da boa diferenciação e aceitável conceituação, o seu esquecimento, ou falta de conhecimento, sobre a possibilidade de a perda auditiva causar o desvio fonético, pode levá-la, mesmo diante de uma boa avaliação clínica, a diagnosticar um desvio fonético causado por déficit sensorial (alteração orgânica “invisível”) como sendo um desvio fonológico (sem alteração orgânica) e, por fim, desenvolver uma conduta terapêutica inapropriada. No questionário B, encontram-se as respostas da fonoaudióloga graduada pela UNICAP em 2003, onde cursou a disciplina Introdução à Lingüística. Aluna especial do Programa de Pós-Graduação em Letras e Lingüística da UFAL, com pós-graduação em Patologias da Linguagem e dois anos e seis meses de experiência em fonoterapia. Questionário: B

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A terapeuta supracitada preferiu conceituar os termos distúrbio articulatório e dislalia, (conceitos antigos e há anos substituídos por desvios fonéticos e fonológicos) mesmo reconhecendo os seus correspondentes. Pode-se pensar que a preferência pelos termos antigos deve-se ao fato de sua graduação ter ocorrido na UNICAP, universidade que possui o curso de Fonoaudiologia mais antigo de Pernambuco, assim como, o seu corpo docente. Não se pode deixar de citar que tal preferência, também, possa ser pela falta de “intimidade” com a própria lingüística. A fonoaudióloga fez boa conceituação dos distúrbios articulatórios, mas, da mesma forma que a anterior, não fez menção à possibilidade da perda auditiva ser causa da alteração em questão. Ao conceituar a dislalia, refere que esta seria “trocas fonêmicas resultantes de dificuldades na formação de palavras (fonemas) à nível mental, não havendo componente orgânico”. Esta última conceituação não condiz com desvio fonológico e a terapeuta confunde termos lingüísticos, chega a entender “palavra” como sendo “fonema”. Apesar da consciência da diferença entre dislalia e distúrbio articulatório, esta terapeuta, também, lança mão de “receitas” para diferenciar os desvios. Àqueles na presença de alteração orgânica são considerados fonéticos e, na ausência de alterações orgânicas, são considerados fonológicos. Esta diferenciação simplificada pode levar ao erro, pois uma alteração sensorial leve, não percebida na avaliação clínica, ou pela falta da solicitação do exame auditivo, permitirá diagnósticos falhos. O questionário C foi respondido por uma fonoaudióloga, também formada pela UNCISAL em 2002, onde, assim como a terapeuta do questionário A, cursou duas disciplinas voltadas à lingüística. Aluna do mestrado de Distúrbio da Comunicação da UNCISAL e com mais de seis anos de experiência em fonoterapia. Questionário: C

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Da mesma forma que a terapeuta do questionário A, formada pela mesma universidade, a fonoaudióloga reconhece os termos distúrbio articulatório e dislalia, mas conceitua os termos desvio fonético e desvio fonológico. Diferentemente do curso de fonoaudiologia da UNICAP, onde se formou a profissional do questionário B, o curso da UNCISAL é relativamente recente, assim como, o seu corpo docente, o que pode justificar a preferência desta fonoaudióloga, e daquela do primeiro questionário, pelos termos atuais. A terapeuta nomeia o desvio fonético como “desvio fonética” – deslize possivelmente explicado pela Análise do Discurso – e, também, refere esta alteração como sendo originada, apenas, pela presença de alterações em OFAS e não refere como possibilidade de causa as perdas auditivas. O mesmo risco de “deslizes de diagnósticos” referido às terapeutas anteriores, também, aplica-se a este caso. Ao conceituar desvio fonológico, refere que os OFAS estão íntegros, contudo, com alterações em processos fonológicos que diz ser uma associação entre grafema/fonema. Neste caso, mais uma vez, confusões são feitas na utilização de termos lingüísticos, pelo fato da profissional entender processos fonológicos como uma associação entre grafemas (neste caso acreditando ser fonema o seu sinônimo) ou entre grafemas e fonemas (neste caso misturando, grosseiramente, fala e escrita). Sem complexidades, processos fonológicos, segundo Castro (2006, p. 34), “é uma simplificação da regra que requer análise para se entender como e por que a fala é ininteligível. A dificuldade pode estar relacionada com a representação mental do som, com o armazenamento do som e/ou com a produção do som” e não do grafema, como referido. Por fim, o último questionário analisado foi respondido por uma fonoaudióloga formada pela FIR, onde cursou duas disciplinas voltadas à lingüística, mestra em ciências da linguagem, doutoranda em lingüística e com experiência de quatro anos em fonoterapia. Questionário: D

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Esta terapeuta soube conceituar e diferenciar os desvios fonéticos e fonológicos (exemplificando clínica e linguisticamente cada caso) e correlacioná-los aos antigos conceitos. Acredita-se que sua formação ou seu investimento pessoal possa ter fornecido base para uma boa resposta ao quesito segundo, o que, provavelmente, não a fará deslizar diagnósticos. 3. Refletindo sobre a Questão Fica claro que uma boa formação em lingüística pode levar, aos fonoaudiólogos, um maior suporte teórico para a diferenciação das alterações de fala e linguagem e conduzir ao diagnóstico mais seguro e a terapias adequadas.

Todas as divergências encontradas nos questionários analisados poderiam ser resolvidas com uma boa e padronizada formação em lingüística, pois a complexidade, como já referida, inexiste. Afinal, a fonética e a fonologia são áreas da lingüística que estudam os sons da fala e por terem o mesmo objeto de estudo, são ciências relacionadas (MUSSALIN, BENTES, 2005) e têm sido consideradas por grande parte dos estudiosos da linguagem como duas disciplinas interdependentes.

A fonética é um ramo da lingüística que se preocupa com o estudo dos sons da linguagem como entidades físico-articulatórias (MALMBERG, 1954). Ela descreve os sons da língua e analisa suas particularidades articulatórias, acústicas e perceptivas e se distingue da fonologia por considerar

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os sons independentes de suas oposições paradigmáticas (ex: vaca, faca) e de suas combinações sintagmáticas (ex: Roma, amor). Sua unidade de análise é o som da fala (CALLOU, LEITE, 1995).

O estudo das propriedades físicas dos sons propriamente ditos chama-se fonética acústica, em outras palavras, seria a investigação das propriedades físicas das ondas sonoras criadas pela atividade do aparelho fonador e que se transferem no ar – de falante para ouvinte. O estudo da forma como os ouvintes apreendem esses sons entende-se por fonética auditiva, ou seja, é o estudo da maneira como os sons da fala são percebidos e identificados pelo ouvido e cérebro do ouvinte. A fonética articulatória, por sua vez, estuda como o trato vocal produz os sons da língua, como é feita a investigação e classificação dos sons da fala produzidos pelos órgãos fonoarticulatórios (LYONS, 1981).

A fonologia estuda os sons do ponto de vista funcional, como elementos que integram um sistema lingüístico determinado. Esta, por sua vez, estuda as diferenças fônicas intencionais, distintivas, isto é, que se vinculam a diferenças de significação, estabelece como se relacionam entre si os elementos de diferenciação e quais as condições em que se combinam uns com os outros para formar morfemas, palavras e frases. A unidade de análise da fonologia é o fonema (CALLOU, LEITE, 1995, p. 11). Logo, ao se falar em desvio fonético, decorrente de alterações em OFAS, apenas é possível devido a contribuições da fonética articulatória que nos permite reconhecer os pontos e modos articulatórios. Em outras palavras, nos faz compreender que um palato ogival (profundo) pode ser causa de uma distorção ou substituição dos fonemas alveolares, que uma má-oclusão classe III (prognatismo mandibular) provavelmente dificultará os fonemas lábio-dentais e que uma insuficiência velofaríngea alterará a componente nasal dos fonemas. Não diferentemente, com a ajuda da fonética acústica e auditiva, diante de uma perda auditiva, pode-se justificar e visualizar as trocas, omissões e distorções de fonemas, principalmente, daqueles de baixa intensidade como os fricativos. Da mesma forma, só reconhecemos um desvio fonológico e classificamos os processos fonológicos patológicos pelo fato de termos adquirido, de duas grandes áreas da lingüística (fonética e aquisição da linguagem), conhecimentos sobre sistema fonológico e o seu desenvolvimento. Considerações Finais

Os resultados obtidos permitiram concluir que: existe confusão terminológica quanto aos termos oriundos da lingüística; o grau de formação em lingüística interfere no domínio dos conceitos abordados e três, dos quatro fonoaudiólogos, não definiu com exatidão os desvios e tiveram respostas semelhantes, apenas, na conceituação de desvios fonéticos.

Os resultados obtidos por meio da revisão de literatura, abordados nas reflexões do artigo, vão contra uma possível idéia de complexidade tida por muitos clínicos diante do diagnóstico destes desvios, demonstrando uma relação direta entre os termos lingüísticos e as finalidades fonoaudiológicas.

A grande preocupação que fica ao final desta pesquisa, e que serve de contribuição acadêmica para mudança de posturas, é que: se houve dificuldades na conceituação de dois desvios de fala (fonético e fonológico), essa dificuldade deve ser ainda maior diante de todas as outras alterações de fala e linguagem possíveis na clínica fonoaudiológica (disartria, disartrofonia, apraxia, disfemia, disfluência etc.).

A ausência de uma boa formação em lingüística durante a graduação não pode justificar a falta de conhecimento por falta dos profissionais a ponto de terem suas terapias comprometidas, visto que, uma das fonoaudiólogas (questionário D), que teve apenas uma disciplina voltada à lingüística em sua graduação, com ajuda ou não da pós-graduação ou pela possibilidade de investimento pessoal, não teve dificuldade na distinção e conceituação dos desvios estudados.

Todavia, sem dúvida alguma, acredita-se que uma boa formação em lingüística daria maior suporte para que os fonoaudiólogos compreendessem melhor as “patologias” de fala e linguagem e, de forma segura, desenvolvessem diagnósticos e não os deslizassem. Logo, é urgente a necessidade de se rever as grades curriculares dos cursos de fonoaudiologia e, com isso, possibilitar uma formação lingüística adequada e voltada à prática clínica. Referências

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CALLOU, Dinah e LEITE, Yonne. Iniciação à fonética e à fonologia. 5 ed. Rio de Janeiro : Jorge Zahar, 1995. CASTRO, Márcia Mathias. Distúrbio Fonológico. In: SILVA, Patrícia Barbosa; DAVID, Rejane Helmlinger Fernandes (Org.). Cadernos da Fonoaudiálogo. Linguagem. Volume 1. São Paulo: Lovise, 2006. DA COSTA, Maria Andressa Lacerda Dantas Pereira. Diretrizes para a criação de um software aplicativo de apóio à avaliação dos desvios fonéticos e/ou fonológicos em crianças, 2005. Dissertação (Mestrado). Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP, Pernambuco. LYONS, John. Linguagem e lingüística. Rio de Janeiro: Editora Guanabara S.A, 1981. MALMBERG, Bertil. A fonética no mundo dos sons da linguagem. Lisboa: Edição livros do Brasil, 1954. MUSSALIN, Fernanda, BENTES, Anna Christina. Introdução à lingüística: domínios e fronteiras. 5ª ed. São Paulo: Cortez, 2005. PESSOA, Ana Cláudia Rodrigues; Cabral, Janusy Wedlla. Realização de diagnóstico diferencial entre alterações fonéticas e fonológicas: um estudo comparativo de estudos desenvolvidos com fonoaudiólogos da cidade do Recife. In: 7º Encontro Nacional sobre Aquisição de Linguagem, 2006, Porto Alegre. Livros de Resumos, Porto Alegre: PUCRS, 2006. p. 205 e 206.