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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO ALESSANDRA NOGUEIRA PALMA HIPOTIREOIDISMO EM CÃO DA RAÇA COCKER SPANIEL – RELATO DE CASO CURITIBA - PR 2009

HIPOTIREOIDISMO EM CÃO DA RAÇA COCKER SPANIEL – … · Hipotireoidismo é uma endocrinopatia muito comum que é resultado da destruição irreversível da glândula tireóide,

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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO SEMI-ÁRIDO

ALESSANDRA NOGUEIRA PALMA

HIPOTIREOIDISMO EM CÃO DA RAÇA COCKER SPANIEL – RELATO DE CASO

CURITIBA - PR 2009

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ALESSANDRA NOGUEIRA PALMA

HIPOTIREOIDISMO EM CÃO DA RAÇA COCKER SPANIEL

CURITIBA - PR 2009

Monografia apresentada à Universidade Rural do Semi-Árido - UFERSA, Departamento de Ciências Animais como requisito parcial para obtenção do título de especialista em Clínica Médica de Pequenos Animais. Orientador: Prof. M.Sc. Valéria Teixeira

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RESUMO Hipotireoidismo é uma endocrinopatia muito comum que é resultado da destruição irreversível da glândula tireóide, promovendo prejuízo na produção e na secreção dos hormônios tireoidianos diminuindo a taxa metabólica. O relato de caso é de um cão cocker spaniel, fêmea de cinco anos de idade, atendida no consultório veterinário Amigo Fiel - Joinville/SC. O animal apresentava obesidade, letargia e intolerância ao exercício. Apresentava expressão trágica (mixedema) e parecia prostrada. Foram realizados exames para mensurar T4, T4 livre e TSH, que resultaram alterados (T4: 0,41 ng/dl, TSH: 0,03 ng/dl). A partir desses resultados, somados ao histórico do animal e aos sinais clínicos, chegou-se ao diagnóstico de hipotireoidismo. Instituiu-se o tratamento com T4 (levo- tiroxina) na dose de 0,025 mg/kg b.i.d. Na primeira semana, utilizou-se um quarto da dose anteriormente citada e na segunda semana a metade da dose. Após esse período, a paciente apresentava maior vivacidade, estava mais ativa e alerta, e sem a expressão trágica na face. Na terceira semana de tratamento ajustou-se a dose do T4 para a dose total de 0,025mg/kg b.i.d de uso contínuo. O animal continua sendo acompanhado periodicamente. Palavras-chaves: hipotireoidismo, tireóide, T4, obesidade.

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ABSTRACT Hypothyroidism is a very common endocrine disorder that is resulted of the irreversible destruction of the thyroid gland, promoting damage in the production and the secretion of tireoidianos hormones diminishing the metabolic rate. This is a case report of a cocker spaniel dog, female of five years old, attended at Amigo Fiel - Joinville/SC. The animal presented obesity, lethargy and exercise intolerance. It presented tragic expression (mixedema) and prostration. Examinations had been carried through to measure T4, free T4 and TSH, that results alterations (T4: 0.41 ng/dl, TSH: 0.03 ng/dl). From these results, added to the history and clinical signs, the diagnosis was defined as hypothyroidism. The treatment started with T4 (levo- tiroxin) in the dose of 0,025mg/kg twice a day. In the first week, a quarter dose was used, and in the second week the half of the dose. After this period it was observed that the patient presented greater vivacity, was more active and alert, and the tragic expression in the face disappeared. In the third week the dose of T4 for the total dose of 0,025mg/kg was adjusted to lifelong treatment. The animal periodically continues being followed. Key words: hypothyroidism, thyroid,T4, obesity.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 01 - cocker spaniel fêmea com obesidade..................................................... 24

Figura 02 - cocker spaniel, fêmea com mixedema.................................................... 25

Figura 03 - cocker spaniel após tratamento.............................................................. 27

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SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO.....................................................................................................7 2. OBJETIVOS.........................................................................................................8 3. REVISÃO DE LITERATURA ...............................................................................9

3.1 ANATOMOFISIOLOGIA DA GLÂNDULA TIREÓIDE............................................ 9 3.2 DEFINIÇÃO.............................................................................................................. 10 3.3 ETIOLOGIA.............................................................................................................. 10

3.3.1 Hipotireoidismo Primário .................................................................................... 10 3.3.1.1 Tireoidite linfocítica ..................................................................................... 11 3.3.1.2 Degeneração idiopática da tireóide................................................................ 11

3.3.2 Hipotireoidismo Secundário ................................................................................ 11 3.3.3 Hipotireoidismo Terciário.................................................................................... 12

3.4 INCIDÊNCIA ............................................................................................................ 12 3.5 SINAIS CLÍNICOS.................................................................................................... 12

3.5.1 Diminuição do Metabolismo................................................................................ 13 3.5.2 Sintomas Dermatológicos .................................................................................... 13 3.5.3 Sintomas Neurológicos........................................................................................ 14 3.5.4 Sintomas Reprodutivos ........................................................................................ 15 3.5.5 Sintomas Cardiovasculares .................................................................................. 16 3.5.6 Sintomas Oftálmicos............................................................................................ 16

3.6 DIAGNÓSTICO ........................................................................................................ 17 3.6.1 Hemograma......................................................................................................... 17 3.6.2 Perfil Bioquímico Sérico ..................................................................................... 17 3.6.3 Concentração de Hormônios Tireoideanos Totais Basais (T3 e T4)...................... 18 3.6.4 Concentração Sérica de Hormônio Tireóide Estimulante (TSH)........................... 19 3.6.5 Testes Autoimunes da Tireóide............................................................................ 20 3.6.6 Teste de Estimulação com Hormônio Tireóide-Estimulante ................................. 20 3.6.7 Diagnóstico por Imagem...................................................................................... 21 3.6.8 Biopsia Tireoidiana ............................................................................................. 21 3.6.9 Diagnóstico Terapêutico ...................................................................................... 21

3.7 TRATAMENTO ........................................................................................................ 22 3.8 PROGNÓSTICO........................................................................................................ 23

4. RELATO DE CASO ..............................................................................................24 4.1 ANAMNESE ............................................................................................................. 24 4.2 EXAME CLÍNICO .................................................................................................... 25 4.3 EXAMES LABORATORIAIS................................................................................... 25 4.4 TRATAMENTO ........................................................................................................ 26 4.5 EVOLUÇÃO ............................................................................................................. 26

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................28 REFERÊNCIAS.........................................................................................................29

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1. INTRODUÇÃO

A glândula tireóide produz os hormônios tiroxina e triiodotironina, que

estimulam o metabolismo. Estes hormônios estimulam a respiração e a oxidação das

mitocôndrias de todas as células. No embrião, influeciam no crescimento corporal e

desenvolvimento do sistema nervoso.

O hipotireoidismo é um doença que afeta principalmente a espécie canina,

com maior incidência em cães de raças de grande porte e de meia idade. Pode ser

causada por destruição da glândula tireóide, ocorre em 95% dos casos

(hipotireoidismo primário); diminuição na secreção de hormônio tireóide-estimulante

(TSH), corresponde a 5% casos (hipotireoidismo secundário).

Nesta endocrinopatia ocorre diminuição na produção de hormônios

tireoidianos que prejudica o metabolismo corpóreo; afetando todos os sistemas, com

conseqüente variedade de sinais clínicos. Desenvolvem-se letargia, intolerância a

exercícios, ganho de peso, alterações neurológicas, cardiovasculares, efeitos no

sistema reprodutivo, entre outros.

O hipotireoidismo é uma doença endócrina de grande importância e muito

freqüente na clínica médica de pequenos animais. Por tanto, o reconhecimento e um

diagnóstico adequado é fundamental para o clínico, principalmente por suas

alterações dermatológicas e não menos importantes as alterações sistêmicas.

Esta doença é de bom prognóstico e de fácil tratamento, com resultado rápido

e evidente.

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2. OBJETIVOS

Este trabalho tem como objetivo descrever as características clínicas de um

caso de hipotireoidismo em um cão, cocker spaniel de cinco anos de idade, fêmea.

Esta enfermidade é de grande importância no contexto médico veterinário em

animais de companhia, uma vez que sua ocorrência é freqüente, principalmente em

decorrência de problemas cutâneos, além de suas repercussões sistêmicas.

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3. REVISÃO DE LITERATURA

3.1 ANATOMOFISIOLOGIA DA GLÂNDULA TIREÓIDE

A tireóide é uma glândula endócrina, de origem endodérmica, que se

desenvolve precocemente na porção cefálica do tubo digestório. Produz os

hormônios tiroxina (tetraiodotironina) e triiodotironina, que estimulam o metabolismo.

Situa-se na região cervical, adiante da traquéia, e apresenta-se constituída por dois

lobos unidos por um istmo (JUNQUEIRA; CARNEIRO, 1995). As glândulas não

podem ser palpadas em cães saudáveis (DUNN, 2001).

A tireóide é considerada a glândula endócrina mais importante para a

regulação metabólica. A ingestão adequada de iodo é o pré-requisito para a síntese

dos hormônios tireoidianos por parte da glândula tireóide (DUNN, 2001).

A união de duas moléculas de diiodotirosina dá origem a tetraiodotironina (T4)

e a união de uma molécula de monoiodotirosina com uma de diiodotirosina, dá

origem a triiodotironina (T3), que são os principais hormônios tireoidianos

(CUNNINGHAM, 2004). A secreção de hormônios da tireóide é controlada pela

liberação de tirotropina (TSH), que é controlada pela ação do hormônio liberador de

tirotropina (TRH) da glândula pituitária posterior. O mecanismo de feedback que

controla a produção de tiroxina está relacionado à concentração de tiroxina livre no

plasma. Qualquer redução no nível de hormônio da tiróide livre (não-ligado) estimula

a glândula pituitária liberar TRH, ao passo que, um excesso de hormônio reduz a

secreção de TRH (MEYER et al., 1995).

Os hormônios tireoidianos afetam muitos processos metabólicos,

influenciando a concentração e atividade de numerosas enzimas; o metabolismo de

substratos, vitaminas e minerais; a secreção e degradação de outros hormônios e a

resposta dos seus tecidos a eles. Os hormônios tireoidianos são fundamentais no

desenvolvimento fetal, particularmente nos sistemas nervoso e esquelético. Esses

hormônios estimulam a calorigênese, síntese de proteínas e enzimas, e também

todos os aspectos do metabolismo de carboidratos e lipídeos, incluindo síntese,

mobilização e degradação. Também possuem influência nos efeitos cronotrópicos e

inotrópicos do coração; estimulam a eritropoiese; estimulam a renovação óssea,

aumentando a formação e reabsorção do osso. Resumindo, nenhum tecido ou

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sistema orgânico escapa de efeitos adversos do excesso ou insuficiência desses

hormônios (FELDMAN; NELSON, 2004).

3.2 DEFINIÇÃO

O hipotireoidismo causa tipicamente a perda simétrica de pêlos, letargia e

obesidade. Mixedema, estupor e coma são expressões clínicas extremas de

hipotireoidismo. O reconhecimento e tratamento imediatos são essências para

prevenir a morte. Bioquimicamente, um aumento no colesterol, aumento nos

triglicerídeos e uma diminuição em T4 (ou deficiência de resposta ao TSH) sustenta

o diagnóstico (MEYER et al., 1995).

No hipotireoismo, o prejuízo na produção e na secreção dos hormônios

tireoidianos resulta em diminuição na taxa metabólica. Esse distúrbio é mais comum

em cães, mas também se desenvolve raramente em outras espécies, incluindo gatos

e animais domésticos grandes (MANUAL MERK, 2001).

Nos cães, o hipotireoidismo é um distúrbio multisistêmico comum. A

deficiência de hormônios tireioidianos afeta virtualmente todos os sistemas

corporais, resultando em variedade ampla de sinais clínicos (BIRCHARD;

SHERDING, 2003).

3.3 ETIOLOGIA

3.3.1 Hipotireoidismo Primário

O hipotireoidismo primário, resultante de uma destruição gradual da glândula

tireóide, é responsável por mais de 95% dos casos (BIRCHARD; SHERDING, 2003).

Quase todas as causas de ocorrência do hipotireoidismo em cães adultos são

atribuídas à destruição irreversível da glândula tireóide. Histologicamente, o

hipotireoidismo primário é dividido em duas principais categorias: tireóide linfocítica e

degeneração idiopática da tireóide (atrofia folicular idiopática). A proporção de

ocorrência entre essas duas doenças é de aproximadamente 1/1 (GRAHAM et al.,

2007).

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3.3.1.1 Tireoidite linfocítica

A tireoidite linfocítica, também referida como tireoidite auto-imune, é

caracterizada por uma infiltração de linfócitos na glândula tireóide com progressiva

destruição secundária dos folículos tireoidianos. A destruição progressiva da

glândula leva três a quatro anos para se tornar completa. Acredita-se que os sinais

clínicos do hipotireiodismo são notados quando mais de 75% da glândula é

destruída, demonstrando que a maior parte do período de destruição não está

associada a nenhum sinal clínico (FELDMAN; NELSON, 2004).

3.3.1.2 Degeneração idiopática da tireóide

A degeneração idiopática da tireóide é caracterizada pela perda de

parênquima tireoidiano, o qual é substituído por tecido adiposo ou fibroso. Sua

causa ainda não está bem definida e é provável que esta categoria represente uma

coleção de condições patológicas primárias, mas existem evidências que pelo

menos uma parte desses casos represente uma forma de estágio final da tireoidite

linfocítica (GRAHAM et al., 2001).

3.3.2 Hipotireoidismo Secundário

O hipotireoidismo secundário (hipofisiário) é causado por um prejuízo na

secreção de hormônios tireóide-estimulante (TSH). Essa etiologia corresponde a

menos de 5% dos casos.

• Tumores hipofisiários. Destruição das células tireotróficas hipofisiárias

normais por meio de invasão neoplásica.

• Bolsa de Rathke cística. Essa forma ocorre em pastores alemães anões

hipofisiários e se associa com deficiências hormonais intercorrentes, incluindo

deficiência de hormônio do crescimento, hipoadrenocortismo e hipogoadismo

(BIRCHARD; SHERDING, 2003).

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3.3.3 Hipotireoidismo Terciário

O hipoteireoidismo terciário (hipotalâmico) resultante de uma deficiência de

produção com ou sem liberação de hormônio liberador de tireotrofina (TRH) ainda

não documentado nos cães (BIRCHARD; SHERDING, 2003).

3.4 INCIDÊNCIA

Esta é primariamente uma doença do cão, sendo rara em outras espécies

(KERR, 2003).

A maioria dos casos de hipotireoidismo primário ocorre em cães de raças de

grande porte e com mais de dois anos de idade (WILLEMSE, 1998).

A prevalência do hipotireoidismo canino relatada nos mais recentes estudos é

de 0,2% a 0,8% (DIXON et al., 1999; PANCIERA, 1994). O hipotireoidismo canino

ocorre tipicamente em animais de meia-idade e de raça pura (PANCIEIRA; CARR,

2007). A idade média para diagnóstico são sete anos, com variação de 0,5 a 15

anos. As raças descritas como predispostas incluem o retriever dourado, o

doberman, o setter irlandês, o schnauzer miniatura, o dachshund, o cocker spaniel

inglês e americano e o airedale terrier. Geralmente não parece haver nenhuma

predileção sexual, mas o risco de desenvolvimento de hipotireoidismo parece ser

maior em cadelas castradas que em intactas (MANUAL MERK, 2001).

3.5 SINAIS CLÍNICOS

Os sinais clínicos de hipotireoidismo têm início insidioso, devido à destruição

gradual da glândula tireóide. Os sinais são diversos e variam de leves a severos

(BIRCHARD; SHERDING, 2003).

Muitos dos sinais clínicos associados como o hipotireoidismo canino se

relacionam diretamente com retardamento do metabolismo celular. Desenvolvem-se

embotamento mental, letargia, intolerância a exercícios e ganho de peso sem

aumento correspondente no apetite. Em alguns cães desenvolve-se obesidade leve

a acentuada (MANUAL MERK, 2001). As alterações dermatológicas também são

bastante comuns em cães com hipotireoidismo.

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Menos comum, mas tão bem documentadas estão as manifestações de

anormalidades neurológicas, efeitos no sistema cardiovascular e efeitos no sistema

reprodutivo de fêmeas. Manifestações clínicas atribuídas ao hipotireoidismo incluem:

mudanças de comportamento, infertilidade dos machos, distúrbios oculares,

coagulopatias e disfunção gastrointestinal (SCOTT-MONCRIEFF, 2007).

3.5.1 Diminuição do Metabolismo

Os hormônios tireóideos aumentam o metabolismo e o consumo de oxigênio

da maioria dos tecidos, portanto, a deficiência desses hormônios resulta em sinais

de diminuição do metabolismo (GRECO et al., 1998). Esses sinais incluem alguns

graus de debilidade mental, letargia, intolerância e/ou resistência ao exercício, maior

propensão a ganho de peso sem aumento do apetite ou da ingestão de alimento e

intolerância ao frio (DIXON et al., 1999; PANCIERA, 1994).

Os sintomas metabólicos são talvez os mais difíceis de identificar pelo

proprietário, em parte porque são graduais e sutis. A severidade desses sintomas

também está diretamente relacionada com a duração do hipotireoidismo, podendo

não estar evidentes na história e serem difíceis de reconhecer durante o exame

físico, especialmente se esses animais estão sendo examinados pela primeira vez

(FELDMAN; NELSON, 2004).

3.5.2 Sintomas Dermatológicos

Os hormônios da tireóide são extremamente importantes para a manutenção

das funções normais da pele, e as anormalidades dermatológicas são relatadas em

60 a 80% dos cães hipotireoideos (DIXON et al., 1999; PANCIERA, 1994). Sinais de

diminuição do metabolismo em conjunto com anormalidades dermatológicas devem

aumentar a suspeita de hipotireoidismo. Os hormônios da tireóide são necessários

para o início da fase anágena do crescimento de pêlos; portanto, cães com

hipotiroidismo podem apresentar alopecia e falha na repilação após arrancamento

(DIXON et al., 1999).

Os cães hipotireóideos que são apresentados principalmente em decorrência

de problemas cutâneos, comumente têm a pele seca e descamativa, com alguma

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alopecia e hiperpigmenteção, e uma pelagem esparsa, com pêlos quebradiços e

facilmente epilados. Muitos cães apenas apresentam uma seborréia grave, que

(embora o hipotireoidismo esteja usualmente associado a problemas cutâneos não

pruriginosos) pode resultar em prurido considerável. Pode ocorrer uma piodermite

secundária acompanhada de colaretes (WILLEMSE, 1998). A alopecia começa

freqüentemente na cauda e no pescoço (áreas de fricção), pode progredir para uma

alopecia truncal bilateralmente simétrica, poupando a cabeça e as extremidades

(BIRCHARD; SHERDING, 2003). Hiperqueratose, hiperpigmentação, formação de

comedões, otite ceruminosa, dificuldade de cicatrização de ferimentos e aumento de

contusões também são relatados. Essas mudanças podem estar relacionadas com a

diminuição da síntese protéica, atividade mitótica e oxigenação da pele, que resulta

na atrofia epidermal e das glândulas sebáceas e anormalidades de queratinização

(CAMPBELL; DAVIS, 1990).

Nos casos moderados a graves, ocorre espessamento cutâneo secundário a

acúmulo de glicosaminoglicanos (predominantemente ácido hialurônico) na derme.

Em tais casos, mixedema torna-se comum na testa e na face, resultando em

aparência inchada e espessamento nas dobras cutâneas ao redor dos olhos. Esse

inchaço, com queda ligeira da pálpebra superior, confere a alguns cães expressão

facial “trágica” (MANUAL MERK, 2001). Em humanos, é associado com uma

mortalidade de 15 a 50%. É caracterizado por letargia, progressivo estupor e coma,

falha respiratória e hipotermia. Pode ser precipitado por terapia medicamentosa

incluindo diuréticos, prolongada exposição ao frio e infecção. Os cães afetados

apresentam bradicardia, hipoventilação, depressão mental, espessamento da pele e

hipotermia severa sem calafrio (GAVIN, 1991; WARTOFSKY, 2000).

3.5.3 Sintomas Neurológicos

A manifestação neurológica mais comum apresenta-se no sistema nervoso

periférico, mas o sistema nervoso central também pode ser afetado. A causa da

disfunção neurológica no hipotireoidismo ainda não é bem conhecida. A deficiência

de ATP dificulta a atividade da bomba sódio/potássio causando atraso no transporte

axonal e disfunção do nervo periférico. Os sinais de sistema nervoso central podem

ocorrer devido à arteriosclerose vascular, mudanças no metabolismo neuronal, e

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anormalidades na excitabilidade neuronal atribuída a neurotransmissão. Também

pode existir uma falha local no transporte do hormônio tireóideo no cérebro

(HIGGINS et al., 2006).

A neuropatia periférica é a manifestação mais bem documentada no

hipotireoidismo (INDRIERI et al., 1987; JAGGY et al., 1994). Uma neuropatia

generalizada pode causar fraqueza, ataxia e propriocepção anormal; neuropatia

vestibular; neuropatia facial, freqüentemente intercorrente com sinais vestibulares;

claudicação de membro anterior unilateral, com dor na articulação glenoumeral. Um

megaesôfago é bastante raro e pode ocorrer secundariamente a miopatias,

neuropatias ou miastenia grave intercorrente. Fraqueza inespecífica e intolerância a

exercícios podem ser causadas por miopatias ou neuropatias leves. Tem-se descrito

anormalidades comportamentais, incluindo agressão, junto com hipotireoidismo

(BIRCHARD; SHERDING, 2003).

A duração dos sintomas clínicos é de duas a oito semanas com progressão

lenta que vai de leve déficit na deambulação a paraparesia ou tetraparesia

observada na maioria dos cães. Menos comumente, o início dos sintomas pode

ocorrer mais rápido. O exame neurológico tipicamente revela depressão, fraqueza

generalizada, déficit de propriocepção em membros pélvicos (100%) e torácicos

(63%), diminuição de reflexos de membros pélvicos (90%) e torácicos (45%)

(JAGGY et al., 1994).

O coma mixematoso, síndrome rara, corresponde à expressão extrema de

hipotireoidismo grave. Seu curso pode se desenvolver rapidamente; a letargia

progride para estupificação e depois coma (MANUAL MERK, 2001).

3.5.4 Sintomas Reprodutivos

Raramente anormalidades reprodutivas se apresentam como manifestações

clínicas iniciais ou únicas da disfunção tireóidea. Os hormônios tireóideos são

necessários para secreção de FSH e LH (FELDMAN; NELSON, 2004).

Em cães intactos, o hipotireoidismo pode causar vários distúrbios

reprodutivos. Em cadelas, esses distúrbios incluem falha em ciclar (anestro) ou

ciclagem esporádica, infertilidade, aborto ou sobrevivência de ninhada deficiente; e

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nos machos, eles incluem falta de libido, atrofia testicular, hipospermia ou

infertilidade (MANUAL MERK, 2001). Em fêmeas intactas pode ocorrer galactorréia.

Segundo o estudo realizado por PANCIERA (1994), o hipotireoidismo de curta

duração não interfere no intervalo de estro, na concepção, no tamanho da ninhada

ou na duração da gestação em cadelas. Entretanto, o parto é prolongado, os filhotes

são menores e frágeis ao nascimento.

Diminuição testicular, subfertilidade ou esterilidade foram relatadas em uma

colônia de beagles com tireoidite e orquite (FRITZ et al., 1976).

3.5.5 Sintomas Cardiovasculares

Sinais clínicos relacionados com alterações no sistema cardiovascular não

são comuns. Anormalidades identificadas no exame físico podem incluir bradicardia,

batimentos fracos e raramente, arritmias associadas com cardiomiopatias

(FELDMAN; NELSON, 2004). Diminuição de amplitudede onda R, bloqueio

atrioventricular de primeiro grau; em cães com hipotireoidismo, pode ocorrer

raramente uma fibrilação atrial (BIRCHARD; SHERDING, 2003).

3.5.6 Sintomas Oftálmicos

Alterações oculares reportadas em cães com hipotireoidismo incluem lipidose

corneal, ulceração corneal, uveíte, efusão lipídica no humor aquoso, glaucoma

secundário, lipemia retiniana e destacamento retiniano (KERN; RIIS, 1980; CRISPIN;

BARNETT, 1978). Essas alterações acontecem devido a hiperlipidemia e parecem

ser raras em cães hipotireóideos (MILLER; PANCIERA, 1994). Ceratoconjuntivite

seca tem sido relatada associada ao hipotireoidismo, porém, atualmente não existem

evidências que sustentem essa associação (PANCIERA, 2001).

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3.6 DIAGNÓSTICO

Devido aos sinais clínicos diversos e as dificuldades na interpretação dos

testes de função tireoidiana, o hipotireoidismo é freqüentemente diagnosticado

inapropriadamente. Muitos fatores não-tireoidianos podem influenciar os testes de

função tireiodiana, resultando em concentrações séricas de hormônios tireoidianos

em cães eutireóideos. O diagnóstico depende tanto de sinais clínicos compatíveis

quanto de testes de função tireoidiana anormais, com nenhum teste sozinho

(BIRCHARD; SHERDING, 2003).

Embora as manifestações clínicas e a história possam ser convincentes, o

diagnóstico deverá ser confirmado pelas determinações de T4 e TSH no plasma

(WILLEMSE, 1998).

3.6.1 Hemograma

Anemias não- regenerativas (normalmente suaves) são vistas freqüentemente

no hipotireoidismo (MEYER, 1995). Um hemograma completo mostra uma anemia

normocítica em 30% dos casos (BIRCHARD; SHERDING, 2003).

3.6.2 Perfil Bioquímico Sérico

A anormalidade bioquímica sérica clássica é hipercolesterolemia, que ocorre

em 80% dos cães com hipotireoidismo. Como a determinação sérica de colesterol

constitui marcador bioquímico sensível e barato no caso de hipotireoidismo em cães,

esta se torna um teste de triagem excelente (MANUAL MERK, 2001).

Aproximadamente 30% dos cães hipotireóideos têm níveis séricos de colesterol

normal ou discretamente elevado, de modo que um resultado normal de colesterol

nunca exclui o hipotireoidismo (KERR, 2003).

As anormalidades menos comuns incluem um leve aumento na fosfatase

alcalina, alanino aminotransferase e na creatina quinase (REUSCH et al., 2002).

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3.6.3 Concentração de Hormônios Tireoideanos Totais Basais (T3 e T4)

Toda concentração sérica de T4, tanto ligada à proteína quanto livre, é

formada na glândula tireóide. Portanto, T4 é o melhor hormônio para avaliar a

função da glândula. Em contrapartida, a maioria de T3 e T3 reverso (Rt3) é formado

pela deiodinação de T4 em sítios extra tireóideos, mais notadamente no fígado, rins

e músculos.

A concentração de T3 é um pobre indicador da função tireóidea em cães

porque, sua quantidade secretada pela glândula tiróide é menor em comparação

com T4 (FELDMAN; NELSON, 2004). O T3 é o mais potente hormônio tireóideo

produzido a nível celular, entretanto, em cães, uma grande proporção (40 a 50%)

não é produzida diretamente pela glândula tireóide além de não ser o hormônio

tireóideo predominante na circulação (PETERSON et al., 1997; DIXON; MOONEY,

1999). A sensibilidade e acurácia da mensuração de T3 total são baixas. Desta

forma os imunoensaios solicitados para medir T3 livre têm pouco valor diagnóstico

(HILL et al., 2001).

Uma concentração sérica de T4 total baixa encontra-se presente quase

sempre em um hipotireoidismo. Se T4 total permanecer normal, um hipotireoidismo

será bastante improvável (BIRCHARD; SHERDING, 2003). A determinação da

concentração de T4 total no soro por radioimunoensaio descarta o hipotiroidismo se

o valor estiver normal ou elevado (LURYE et al., 2002). Os valores normais de T4

variam de acordo com o laboratório devido aos diferentes kits comerciais utilizados.

Para a maioria dos laboratórios a concentração de T4 sérica em cães saudáveis fica

entre 1,5 a 3,5 µg/dl (FELDMAN; NELSON, 2004).

A diálise de equilíbrio é o melhor procedimento para medir T4 livre

(FERGUSON, 1995). Esse teste é mais lento e é mais caro para aquisição e uso,

que imunoensaios análogos para T4 livre. Apesar da ampla variedade de condições

médicas, incluindo a presença de drogas e a presença de anticorpos anti-T4, o teste

da diálise direta mostrou uma acurácia diagnóstica de 95%, com especificidade de

93%, representando os mais altos valores associados com qualquer teste de função

da tireóide isolado (DIXON; MOONEY, 1999; PETERSON et al., 1997).

A concentração sérica de T4 livre mede o T4 metabolicamente ativo e não

deve ser influenciado pelos efeitos da conjugação sérica. No entanto, a medição de

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T4 sérico livre pela maioria dos ensaios ainda não provou ser mais confiável que a

concentração de T4 total no diagnóstico do hipotireoidismo (DUNN, 2001).

Infelizmente, a concentração basal desses hormônios é afetada por vários

outros fatores, alterando a acurácia das mensurações no diagnóstico (FELDMAN;

NELSON, 2004). A concentração sérica de T4 pode também estar alterada por

doenças não relacionadas à tireóide em cães e gatos. Condições conhecidas por

produzir a diminuição na quantidade de hormônios da tireóide em circulação incluem

diabetes melito, o hipoadrenocorticismo, o hiperadrenocorticismo, a insuficiência

renal, doença hepática e neoplasias sistêmicas. Entre as drogas que podem causar

diminuição da concentração sérica de hormônios da tireóide incluem-se os

glicocorticóides, particularmente administrados por um longo período; drogas

aintitireoidianas, tais como o profiltiouracil e os corantes radiológicos; antipiléticos,

tais como difenilhidantoína e o fenobarbital; e outras poucas drogas como a

fenilbutazona e a furosemida também tem sido relacionadas (MEYER, 1995).

3.6.4 Concentração Sérica de Hormônio Tireóide Estimulante (TSH)

A concentração sérica de TSH aumenta na maior parte dos casos de

hipotireoidismo primário devido à perda da retroalimentação de T3 e T4 na glândula

hipófise.TSH sérico alto e T4 ou T4 livre séricas baixas são diagnósticos de

hipotireoidismo. A concentração sérica de TSH permanece normal dêem 20% - 40%

dos cães hipotireóideos. A concentração sérica de TSH pode aumentar em cães

eutireóidos com enfermidade não- tireoidiana (BIRCHARD; SHERDING, 2003).

Vários estudos têm levantado questões sobre a sensibilidade da mensuração

de TSH porque aproximadamente um quarto dos cães hipotireoideos tem valores

normais do mesmo. O imunoensaio de quimioluscência mostra a melhor precisão e

certamente a melhor sensibilidade ( DIXON; MOONEY, 1999; EVANS, 1997;

PETERSON et al., 1997; RAMSEY; REESE, 2005).

O uso da concentração de TSH sozinho não é interessante nos cães com

hipotireoidismo primário como é para pacientes humanos (PETERSON et al., 1997;

DIXON; MOONEY, 1999; HOENIG; FERGUSON, 1997).

20

3.6.5 Testes Autoimunes da Tireóide

Ocasionalmente pacientes com todos os sinais clínicos de hipotireoidismo

podem apresentar valores aumentados T3 e T4 ou ambas. Isto ocorre em pacientes

com tireoidite imunomediada em que se desenvolvem anticorpos contra a tiroxina.

Estes anticorpos interferem com o radioimunoensaio e resultam num valor elevado

falso. Em tais pacientes, pode ser usado um teste antitiroglobulina pode ser

determinado em alguns laboratórios veterinários. Títulos positivos são observados

em cerca da metade dos pacientes caninos, com hipotireoidismo quando eles

apresentam uma tireoidite imunomediada (MEYER, 1995).

Auto-anticorpos direcionados ao hormônio tireóideo ocorrem ocasionalmente

em cães com tireoidite linfocítica. A importância do auto-anticorpo do hormônio

tireóideo reside na habilidade de interferir com a mensuração da T4 e T3 sérico

dependendo do método de dosagem utilizado. Normalmente uma falsa elevação do

T4 e T3 é encontrada quando este é dosado pelo método de radioimunoensaio. O

T4 livre por diálise deve ser utilizado para avaliar a função tireóidea na presença de

auto-anticorpos de T4. Tais auto-anticorpos também atuam como marcadores de

tireoidite auto-imune (PANCIEIRA; CARR, 2007).

3.6.6 Teste de Estimulação com Hormônio Tireóide-Estimulante

O método mais confiável de confirmação do diagnótico de hipotireoidismo em

cães é a demonstração de uma T4 em repouso baixa que falha em aumentar após a

administração de TSH (BICHARD; SHERDING, 2003).

Este teste é conduzido pela mensuração da T3 e T4 exatamente oito horas

após a administração de TSH intramuscular à taxa de 5 unidades/20 lb de peso

corpóreo, ou exatamente antes e quatro horas após a injeção intravenosa de 0,1

unidades de TSH/lb. Os níveis de tiroxina sérica devem, pelo menos dobrar após

sobre terapia tireoidiana, poderá ser necessário interromper a terapia por 10 dias a

duas semanas antes de submetê-lo ao teste (MEYER, 1995). A estimulação com

rhTSH em cães é interessante em casos de suspeita de hipotiroidismo onde os

testes convencionais não são elucidativos (DAMINET et al., 2007).

21

3.6.7 Diagnóstico por Imagem

A radiografia cervical não é eficiente para determinar o status da glândula

tireóide. Se o hipotireoidismo evoluir para destruição da glândula por um tumor

invasivo, entretanto, uma radiografia torácica deve ser feita para avaliar possíveis

metástases (FELDMAN; NELSON, 2004).

A ultra-sonografia da tireóide é indicada na identificação das massas,

diferenciação de lesões sólidas e císticas e determinação da extensão das mesmas.

Ela fornece informações anatômicas, porém não funcionais. Então, o exame

sonográfico deve acompanhar a dosagem dos níveis séricos de T3 e T4, assim

como de hormônio tireóide-estimulante. Também é recomendado que se realizem

cintilografia e biopsia por aspiração ou por fragmentos, para a obtenção de um

diagnóstico mais preciso (CARVALHO, 2004).

Segundo um estudo realizado por De Marco; Larsson (2006) a ultra-

sonografia cervical possibilitou evidenciar a presença de atrofia da glândula tireóide

na totalidade dos casos de hipotireoidismo; a ultra-sonografia das glândulas tireóides

mostrou-se exequível, provando ser meio semiológico indireto de grande valia no

auxílio do diagnóstico de tireoidepatias caninas.

3.6.8 Biopsia Tireoidiana

Embora não seja em geral realizada, a biopsia tireoidiana constitiu um meio

útil e confiável de diagnóstico e diferenciação das formas primária e secundária de

tireoidismo (MANUAL MERK, 2001).

3.6.9 Diagnóstico Terapêutico

Em alguns casos, os testes diagnósticos são equivocados, e pode-se

proceder com uma prova terapêutica com levotiroxina (L-T4). A prova terapêutica

deve ser considerada somente quando existem sinais clínicos. A evidência mais

forte da doença é obtida pela observação da resposta ao tratamento com L-T4 e

recaída quando o mesmo é retirado (FERGUSON et al., 2003).

22

3.7 TRATAMENTO

O tratamento de cães com hipotireoidismo consiste em uma administração

diária de hormônios tireoidianos. Observa-se uma resposta ao tratamento

geralmente dentro de uma a duas semanas, com aumento na atividade e melhora na

atitude. A perda de peso e as anormalidades neurológicas começam a se resolver

geralmente dentro de uma a quatro semanas após o início do tratamento, enquanto

as alterações dermatológicas podem exigir quatro a seis semanas para melhorar e

meses para se resolver completamente. Uma falha em responder dentro de seis a

oito semanas após o início do tratamento deve estimular uma reavaliação do

diagnóstico e razões para uma falha terapêutica possível (BIRCHARD; SHERDING,

2003).

Em cães, a tireoxina (T4) corresponde ao composto de reposição de

hormônios tireoidianos de escolha. Com poucas exceções, a terapia de reposição

torna-se necessária por toda vida do cão; tornam-se essências diagnóstico inicial

cuidadoso e ajustamento do tratamento. As doses de reposição descritas quanto à

T4 em cães variam de uma dose de 0,02 a 0,04 mg/kg, por dia, administradas em

s.i.d ou divididas em b.i.d (MANUAL MERK, 2001).

A seborréia e o pioderma deverão ser tratados separadamente. Estes

problemas usualmente persistem por mais tempo que os sinais sistêmicos do

hipotireoidismo (WILLEMSE, 1998).

Recomenda-se que o manejo dietético seja limitado a restrição calórica para

aqueles cães acima do peso (MASKELL; GRAHAM, 1994).

O tratamento de esturpor de mixedema e coma consiste de uma administrção

IV de L-T4 (0,06mg/kg), aquecimento passivo, fluidoterapia criteriosa,

suplementação de glicocorticóides e ventilação mecânica, se for necessário. O

prognóstico é reservado (BIRCHARD; SHERDING, 2003).

23

3.8 PROGNÓSTICO

O prognóstico para cães hipotireoideos depende da causa subjacente. A

expectativa de vida de um cão adulto com hipotireoidismo primário que está

recebendo tratamento adequado deve ser normal. A maioria dos sintomas, se não

todos, vai desaparecer com a suplementação hormonal (NELSON; COUTO, 2001).

24

4. RELATO DE CASO

4.1 ANAMNESE

Uma cadela cocker spaniel de cinco anos de idade foi atendida no consultório

veterinário Amigo Fiel no dia 22 de agosto de 2007. A queixa principal era a

obesidade, letargia e intolerância ao exercício. O proprietário referia também que o

animal parecia estar sempre apático, alheio ao meio e com frio. Relatou cios

irregulares e muitas vezes ausentes.

Figura 01 - cocker spaniel fêmea com obesidade.

Fonte: Consultório Veterinário Amigo Fiel.

A paciente apresentava expressão trágica (mixedema) e parecia prostrada.

Não apresentava alterações significativas na pele ou pêlos, apenas uma leve

seborréia e pêlos pouco abundantes para os padrões normais da raça. Estava

pesando 18kg no dia da primeira consulta.

25

Figura 02 - cocker spaniel, fêmea com mixedema.

Fonte: Consultório Veterinário Amigo Fiel.

4.2 EXAME CLÍNICO

Ao exame clínico os parâmetros encontravam-se dentro da normalidade.

4.3 EXAMES LABORATORIAIS

Foi realizada coleta de sangue para dosagem de T4, T4 livre e TSH, dos

quais os dois últimos mostraram-se alterados (T4 livre- 0,41 ng/dl, TSH- 0,03 ng/dl).

Esses exames foram realizados por quimioluminescência. Foi solicitada também a

realização de hemograma e glicemia. O primeiro apresentou uma discreta alteração,

no hematócrito (34%) e hemoglobina (11,20 g/dl). A glicemia estava dentro dos

padrões de normalidade.

26

4.4 TRATAMENTO

A partir desses resultados, somados ao histórico do animal e aos sinais

citados anteriormente, chegou-se ao diagnóstico de hipotireoidismo. Instituiu-se o

tratamento com T4 (levo- tiroxina) na dose de 0,025 mg/kg duas vezes ao dia, pela

manhã em jejum. Na primeira semana, utilizou-se um quarto da dose anteriormente

citada. E na segunda semana a metade da dose. Após esse período o animal

retornou ao consultório para avaliar a eficácia do tratamento. Observou-se que o

paciente apresentava maior vivacidade, estava mais ativa e alerta, e não tinha mais

a expressão trágica na face.

Na terceira semana de tratamento ajustou-se a dose do T4 para a dose total

de 0,025mg/kg bid de uso vitalício.

4.5 EVOLUÇÃO

Após dois meses de tratamento, foi realizada coleta de sangue para mensurar

novamente T4, T4 livre e TSH, todos apresentavam-se dentro do padrão de

normalidade (T4- 3,20 ug/ml,T4 livre- 2,31 ng/dl, TSH- 0,54ng/dl). Neste período o

animal estava muito mais ativo e estava pesando 17 kg. Foi prescrita ração para

redução de calorias para auxiliar na redução de peso (principal queixa do

proprietário).

27

Figura 03 - cocker spaniel após tratamento.

Fonte: Consultório Veterinário Amigo Fiel.

O animal continua sendo acompanhado periodicamente. Os proprietários não

instituíram a dieta com redução de calorias, e não houve mais perda significativa de

peso. Os demais parâmetros continuam dentro da normalidade.

28

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O hipotireoidismo tem-se tornado muito comum na clínica de pequenos

animais, apesar de, em muitos casos, serem equivocadamente diagnosticado. Pois,

sabe-se que para realizar um correto diagnóstico da doença deve-se levar em

consideração o somatório de anamnese, exame clínico e exames laboratoriais para

mensuração de hormônios tireoidianos: T4, T4 livre (que se apresentaram

diminuídos) e TSH (que se apresentou aumentado). Além de métodos laboratoriais

que podem resultar na mensuração de TSH inadequada.

Esta uma doença endócrina de bom prognóstico e de fácil tratamento, com

resultado rápido e evidente. Que após ser instituído, de forma vitalícia, o animal leva

uma vida normal, sem nenhum sintoma ou seqüela da doença.

A falha no tratamento em oito semanas, deve levara uma reavaliação do diagnóstico

e possíveis causas de falha no tratamento.

29

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