Monografia Sobre Abordagem Policial

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  • 7/22/2019 Monografia Sobre Abordagem Policial

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    UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAISCURSO DE ESPECIALIZAO EM ESTUDOS DE CRIMINALIDADE E

    SEGURANA PBLICA

    JLIO CSAR RODRIGUES DE ARAJO

    ABORDAGEM POLICIAL: CONDUTA TICA E LEGAL

    Belo Horizonte2008

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    JLIO CSAR RODRIGUES DE ARAJO

    ABORDAGEM POLICIAL: CONDUTA TICA E LEGAL

    Trabalho de Concluso de Curso apresentadoao Centro de Estudos de Criminalidade eSegurana Pblica/CRISP da Faculdade deFilosofia e Cincias Humanas da UniversidadeFederal de Minas Gerais e SecretariaNacional de Segurana Pblica/SENASP.

    Orientador(a): Prof. Robson Svio Reis

    Souza

    Belo Horizonte2008

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    Foram muitos, os que me ajudaram a concluir este trabalho.

    Meus sinceros agradecimentos...

    ... a PMMG pela oportunidade de crescimento intelectual e profissional na carreira

    policial militar;

    ... ao Centro de Estudos da Criminalidade e Segurana Pblica/ CRISP,

    pela formao;

    ... a Ouvidoria Geral do Estado de MG/ Ouvidoria de Polcia que contribuiu com o

    trabalho disponibilizando dados estatsticos das denncias de cidados contra

    policiais.

    ... ao Professor Robson Svio Reis Souza do Centro de Estudos da Criminalidade e

    Segurana Pblica/ CRISP, pelo esprito paciente, solidrio e generoso que assumiu a

    orientao.

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    O extraordinrio que, provavelmente, nesse momento, algum soldado arrisca avida para cumprir seu dever, honrando a farda que veste, apesar do salrio baixo,

    apesar da imagem deteriorada de sua corporao, a despeito que os companheiroscorruptos lhe causam e da baixa estima, que lhe cava um buraco na alma e di mais

    que a misria, como uma vez me confessou, emocionado, um sargento de coraogeneroso e esprito nobre.

    Mais extraordinrio ainda, e mais perturbador, um outro fato que ameaa toda equalquer classificao, todo esforo de organizao cognitiva e toda ordem moral:

    alguns policiais dessas turmas que desrespeitam os cidados nas revistas, roubam ematam, so os mesmos que, em outros momentos, atuam com disciplina eenfrentam o perigo para salvar um inocente ou simplesmente para cumprir seu dever

    e fazer fruir o prazer incomparvel do reconhecimento, da gratido e do respeito.O fato que, por conta dessas contradies e pela magnitude do descontrole, polcia

    um tema que interessa a todos, a menos que voc tenha mais de quarenta anos,seja branco e rico, e no disfarce sua origem de classe.

    Mesmo assim, voc ter parentes e amigos mais jovens ou ser sensvel aos dramasque o cercam com uma freqncia assustadora.

    Pensando bem, mesmo rico e branco, ou melhor, por conta desses atributos, melhor voc se preocupar tambm, porque a competncia policial decisiva para

    desmontar as quadrilhas de seqestradores, assim como o controle dessa corporao necessrio para evitar que policiais participem dos seqestros.Portanto, sem excees: polcia um tema de interesse geral.

    LUIZ EDUARDO SOARES, em Meu casaco de general.

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    TTULO:ABORDAGEM POLICIAL: CONDUTA TICA E LEGAL.

    RESUMO

    A pesquisa destinou a verificar a abordagem policial, fato primordial no

    desenvolvimento da atividade das instituies policiais. Sempre que um policial

    aborda, por fundada suspeita, uma pessoa, que assim se torna suspeita de infrao

    ou crime, envolve situaes de tenso pessoal e social. Esta abordagem provoca

    reaes no cidado, nos espectadores do ato e, eventualmente, na corporao

    policial. Sero aqui apresentados como a instituio policial tem preparado e treinado

    seus profissionais com o objetivo de executar bem o policiamento ostensivo

    preventivo e orient-los na execuo da abordagem policial correta, de respeitar os

    direitos dos cidados, e manter a boa imagem pblica de seu trabalho e de suafuno social. A hiptese central da monografia estabelece que o treinamento

    constante tem um papel expressivo como um fator capaz de reduzir o uso abusivo da

    fora nos encontros do policial com o cidado e de melhorar a qualidade do servio

    prestado pelo policial de uma maneira geral, aumento o grau de segurana, tanto ao

    policial quanto ao cidado, e diminuindo a exposio de ambos ao risco.

    Palavras-chave: Polcia, Abordagem Policial, Treinamento Policial, Uso da Fora.

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    Lista de Ilustraes

    Grfico 1 Evoluo mensal das denncias .............................................. 54Grfico 2 Distribuio das denncias, de acordo com a regio ................. 55

    Grfico 3 Distribuio das denncias, de acordo com as corporaes ....... 56

    Grfico 4 Distribuio das vtimas de acordo com o sexo ......................... 60

    Grfico 5 Distribuio das vtimas de acordo com a cor ........................... 61

    Grfico 6 Distribuio das vtimas de acordo com a idade ........................ 62

    Grfico 7 Distribuio das vtimas, de acordo com o estado civil ............... 63

    Grfico 8 Distribuio das vtimas de acordo com a escolaridade .............. 64

    Grfico 9 Distribuio das vtimas, de acordo com a renda ....................... 65

    Grfico 10 Distribuio dos denunciados, de acordo com o patente .......... 67

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    Lista de Tabelas

    Tabela 1 Uso da fora contnua pela polcia .................................................... 25

    Tabela 2 Episdios de letalidade da ao policial ............................................. 46Tabela 3 Local dos episdios de letalidade da ao policial .............................. 47

    Tabela 4 Tipo de ao dos episdios de letalidade da ao policial ................... 47

    Tabela 5 Apreenso de armas de fogo nos episdios de letalidade ................... 48

    Tabela 6 Feridos e mortos nas aes policiais ................................................. 49

    Tabela 7 Uso de fora dos episdios de letalidade da ao policial ................... 50

    Tabela 8 Tipo de policiamento nos episdios de letalidade da ao policial ....... 52

    Tabela 9 Classificao das denncias de acordo com a natureza....................... 57Tabela 10 Distribuio das denncias, de acordo com o local ......................... 59

    Tabela 11 Denunciados, de acordo com o efetivo policial de cada corporao.... 66

    Tabela 12 Denunciados da polcia militar, de acordo com unidade..................... 68

    Tabela 12.1 Capital ............................................................................. 68

    Tabela 12.2 Interior ............................................................................ 69

    Tabela 12.3 Regio metropolitana ........................................................ 69

    Tabela 13 Classificao das denncias ............................................................ 70

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    SUMRIO

    INTRODUO ......................................................................................... 9

    CAPTULO 1 ABORDAGEM POLICIAL ................................................... 13

    1.1 POLCIA .................................................................................... 13

    1.2 ABORDAGEM POLICIAL. O QUE ? .............................................. 16

    1.3 USO DA FORA .......................................................................... 22

    1.4 CONDUTA POLICIAL TICA E LEGAL ........................................... 27

    CAPTULO 2 PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS PARA O USO DA FORA... 33

    2.1 NORMAS QUE REGEM A ABORDAGEM POLICIAL ............................... 33

    2.1.1 Misso Constitucional da Polcia Militar ..................... 36

    2.1.2 O Poder de Polcia ...................................................... 34

    2.1.3 A Busca Pessoal .......................................................... 36

    2.1.4 Uso da Fora ............................................................... 38

    2.2 CONTROLE DAS ATIVIDADES POLICIAIS ......................................... 40

    CAPTULO 3 TREINAMENTO POLICIAL PARA O USO DA FORA ......... 42

    3.1 A IMPORTNCIA DO TREINAMENTO ........ ...................................... 423.2 TREINAMENTO COMO INCIO DE UMA MUDANA PROFISSIONAL .... 44

    3.3 RELATRIO OUVIDORIA ................................................................ 46

    CAPTULO 4 RELATRIO ANUAL DA OUVIDORIA DE POLCIA 2006 .. 53

    4.1 DENNCIAS .................................................................................. 53

    4.2 DENUNCIANTES ............................................................................ 60

    4.3 DENUNCIADOS ............................................................................. 65

    4.3.1 Polcia Militar ............................................................. 664.4 SOLUO DOS APURATRIOS RECEBIDOS DOS RGOS CORREG. ........... 70

    CONSIDERAES FINAIS ....................................................................... 71

    REFERNCIA BIBLIOGRFICA ........................................................................ 77

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    INTRODUO

    O saber deve ser um rio, cujas guas doces, grossas,

    copiosas, transbordam do indivduo, e se espraiem,estancando a sede dos outros. Sem um fim social, o saberser a maior das futilidades.GILBERTO FREYRE, 1917 Discurso de Adeus ao Colgio.

    As abordagens so situaes privilegiadas para o estudo, pois envolvem um

    contato imediato entre populao e Polcia que no depende da escolha dos cidados

    (diferentemente, por exemplo, da deciso de registrar uma ocorrncia ou de acionar

    a polcia para resolver um problema). E, acontece fora do contexto da ocorrncia

    criminal, sem informaes concretas para fundamentar a suspeita, estando,

    portanto, mais abertas ao acionamento de esteretipos e preconceitos.

    Em tese, qualquer cidado ou cidad que circule pelas ruas, a p ou em

    qualquer meio de transporte, pode ser parado(a) e revistado(a) em uma ao policial

    rotineira ou especial de preveno da criminalidade. Na prtica, porm, s alguns

    sero escolhidos e sabe-se que essa escolha no aleatria, mas seletiva, que

    depende em larga medida de critrios prvios de suspeio, sejam eles: aparncia

    fsica, atitude, local, horrio, circunstncias, ou alguma combinao desses e de

    outros fatores.

    A populao, por sua vez, tem idias e expectativas acerca dos critrios

    acionados pelos policiais em tais situaes, idias e expectativas que podem ou no

    confirmar-se nos encontros diretamente vividos, podem modificar-se ou no a partir

    das experincias concretas e podem ou no coincidir com o que os cidados pensam

    que a Polcia deveria fazer.O estudo tem por objetivo geral analisar a importncia do treinamento, ou

    seja, o processo de atualizao e aperfeioamento dos conhecimentos referentes as

    prticas policiais, na definio de novos padres de resposta por parte dos policiais

    nas atividades de policiamento. As situaes em que os policiais se envolvem do

    origem a opinies e interpretaes dos atos policiais. Essas opinies e interpretaes

    da comunidade podem ser positivas ou negativas para a organizao policial e para o

    policial alvo da observao. Entre os objetivos especficos busca-se analisar o uso da

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    fora quando da realizao de uma abordagem policial, a tcnica utilizada, bem

    como o treinamento policial como fator de mudana no servio prestado.

    Em toda abordagem policial o uso da fora ser utilizado podendo ser com

    comandos verbais, ou at mesmo com o uso de fora letal em casos de ameaa letal

    ao policial ou a terceiros (outros cidados). Os nveis de fora apresentam seis

    alternativas adequadas ao uso da fora legal. Cada situao enfrentada pelo policial

    nica. O bom julgamento e as circunstncias de cada uma delas ditar o nvel de

    fora que o policial utilizar. As circunstncias so percebidas pelos policiais de

    acordo com o ambiente e a ao do suspeito abordado.

    um trabalho que se justifica pela importncia da discusso sobre o uso da

    fora no letal e as garantias legais para a execuo de uma abordagem policial,

    para que durante o policiamento ostensivo respeite os direitos do cidado abordado.

    Mostrando a importncia do treinamento aos policiais como forma de reduzir o

    emprego abusivo de fora nos encontros da polcia com o pblico, melhorando a

    qualidade do trabalho policial, aumentando a proteo do policial e do abordado.

    Nesse trabalho observa como problema o fato que o policial militar

    desempenha suas atividades operacionais, na maior parte do tempo sem supervisodireta, ou seja, o acompanhamento mais freqente por parte do supervisor, Tenente

    ou Subtenente ou Sargento, em razo da prpria estrutura do policiamento ostensivo

    motorizado. Nesses casos policiais que adotem condutas imprprias, do ponto de

    vista procedimental, que quando no corrigidas tendem a serem incorporadas no

    comportamento e naturalizadas. Desta forma o policial adota posturas erradas com a

    crena que est agindo corretamente. Essa conduta expe o policial ao risco e em

    conseqncia expe ao risco o cidado.A hiptese central do trabalho estabelece que o treinamento constante tem um

    papel expressivo como um fator capaz de reduzir o uso abusivo da fora nos

    encontros do policial com o cidado e de melhorar a qualidade do servio prestado

    pelo policial de uma maneira geral, aumentando o grau de segurana, tanto ao

    policial quanto ao cidado, e diminuindo a exposio de ambos ao risco.

    No estudo sero testadas as seguintes hipteses (H):

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    H1: As garantias legais para o exerccio das atividades de polcia ostensiva so

    suficientes para proporcionar segurana e correo na execuo de uma abordagem

    policial?

    H2: O treinamento policial permanente diminui a possibilidade do policial usar

    a fora de maneira excessiva, contra pessoas submetidas a abordagem policial, o

    que gera uma diminuio nos casos de abuso policial?

    H3: O treinamento policial permanente aumenta a capacidade do policial em

    oferecer proteo ao pblico e em aumentar sua prpria segurana durante as

    abordagens policiais, o que gera diminuio da exposio de ambos ao risco?

    A pesquisa utiliza o mtodo hipottico-dedutivo, ou seja, a partir das

    hipteses formuladas deduz a soluo do problema. Quanto aos objetivos uma

    pesquisa bibliogrfica, para a elaborao do embasamento terico, e quanto aos

    procedimentos uma pesquisa do tipo documental, para a coleta de dados.

    Com relao primeira hiptese (H1) as tcnicas e fontes utilizadas foram

    levantamentos bibliogrficos, principalmente nas fontes relacionadas com normas do

    direito brasileiro e normas da Polcia Militar de Minas Gerais (PMMG), observao de

    normas referente ao uso da fora e treinamento policial. E, na segunda (H2) e naterceira (H3) hipteses foi utilizada pesquisa documental, com acesso a fontes

    primrias, e anlise discricionria do banco de dados estatsticos fornecido pela

    Ouvidoria Geral do Estado (OGE) de Minas Gerais atravs do Relatrio elaborado no

    ano de 2006. Atravs do relatrio da OGE/ Ouvidoria de Polcia o trabalho busca

    analisar os desvios de conduta, principalmente os de uso excessivo da fora quando

    do contato do policial com o cidado no estado de Minas Gerais no ano de 2006.

    Minas Gerais possui vrios rgos que atuam, principal ou acessoriamente, nocontrole da atividade policial, estes no possuem banco de dados estatsticos das

    denncias recebidas, so eles: Comisso de Direitos Humanos da Assemblia

    Legislativa de MG, Comisso de Defesa dos Direitos Humanos da Cmara Municipal

    de Belo Horizonte/MG, Conselho Estadual de Defesa dos Direitos Humanos em Minas

    Gerais, Coordenadoria de Defesa dos Direitos Humanos da Prefeitura de Belo

    Horizonte/MG, e Ministrio Pblico Estadual/ Promotoria de Direitos Humanos. O que

    impossibilita fazer uma anlise das denncias recebidas por estes rgos.

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    Os nicos rgos governamentais de controle da atividade policial, em Minas

    Gerais, em especial com sede em Belo Horizonte/MG, que possuem bancos de dados

    estatsticos das denncias recebidas so a Ouvidoria Geral do Estado de MG/

    Ouvidoria de Polcia, e a Corregedoria da Polcia Militar de MG. Infelizmente, apenas

    a OGE/ Ouvidoria de Polcia concedeu acesso ao seu banco de dados. Portanto,

    ressalto que no trabalho foram observados apenas os dados estatsticos de

    denncias feitas a OGE/ Ouvidoria de Polcia no ano de 2006.

    Os dados estatsticos da Ouvidoria Geral do Estado (OGE)/ Ouvidoria de

    Polcia do estado de Minas Gerais referente ao ano de 2006, dados gentilmente

    cedidos pela Ouvidoria atravs do Relatrio Anual da Ouvidoria de Polcia 2006. O

    Relatrio permite fazer uma anlise discricionria dos principais desvios de

    comportamento policial denunciados pela sociedade mineira no ano de 2006 em

    Minas Gerais.

    O presente trabalho est dividido em quatro captulos. No primeiro captulo

    descreve a abordagem policial, fato primordial no desenvolvimento das atividades

    operacionais das instituies policiais. No segundo apresenta os procedimentos

    operacionais para o uso da fora, estudo das normas legais sobre abordagem policialque o policial militar necessita conhecer para realizar com segurana uma

    abordagem. No terceiro captulo apresenta a importncia do treinamento policial

    para o uso da fora e dados estatsticos do Relatrio sobre Letalidade da Ao

    Policial no estado de MG, relatrio este cedido pela Ouvidoria Geral do Estado/

    Ouvidoria de Polcia. E, no quarto apresenta dados estatsticos do relatrio anual da

    OGE/ Ouvidoria de Polcia no ano de 2006. Por fim, apresentao das consideraes

    finais do trabalho monogrfico.

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    CAPTULO 1 ABORDAGEM POLICIAL

    E no me esquecer, ao comear o trabalho, de me preparar

    para errar. No se esquecer de que o erro muitas vezes sehavia tornado o meu caminho. (...) Mas eu sempre tiveramedo de delrio e erro. Meu erro, no entanto, devia ser ocaminho de uma verdade: pois s quando erro que saio doque conheo e do que entendo. Se a verdade fosse aquiloque posso entender terminaria sendo apenas uma pequenaverdade, do meu tamanho.CLARICE LISPECTOR, em A Paixo segundo G.H.

    1.1 Polcia.

    A paz, a estabilidade e a segurana numa cidade, num Estado ou mesmo

    num pas, em grande medida, dependem da capacidade de suas organizaes de

    aplicao da lei em fazer cumprir a legislao nacional garantindo os direitos e

    exigindo o cumprimento dos deveres da populao. Afinal, a capacidade das

    organizaes na aplicao da lei condio necessria, mas no suficiente, para

    garantir a paz social.ASSIS (2007) utiliza da conceituao de LAZZARINI para definir

    segurana pblica como sendo:

    (...) o afastamento, por meio de organizaes prprias, de todoperigo, ou de todo o mal, que possa afetar a ordem pblica, emprejuzo a vida, da liberdade, ou dos direitos de propriedade docidado. A segurana pblica, assim, limita as liberdades individuais,estabelecendo que a liberdade de cada cidado, mesmo em fazeraquilo que a lei no veda, no pode ir alm da liberdade asseguradaaos demais, ofendendo-a. Citado por LAZZARINI. Direito

    Administrativo da Ordem Pblica. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, p.9-10. (Assis, 2007)

    Discutir segurana pblica no estado democrtico de direito debater e

    validar os termos do consentimento dos cidados diante da possibilidade de coero

    do Estado. assegurar a capacidade do Estado de produzir obedincia at pela

    coao, garantindo os Direitos Humanos e salvaguardando o desmando e a

    clientelizao da fora pblica. pactuar a materialidade do mandato autorizativo da

    polcia no respaldo s leis e na administrao da ordem pblica em nossas cidades.

    consensuar sobre os termos do emprego legal e legtimo da fora policial. acordar

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    sobre o que aceitvel e desejvel na ao policial. Na democracia, isso depende de

    clara definio de quem responde pelo que na Segurana Pblica.

    Segundo o Art.144, 5, da Constituio da Repblica, a Polcia Militar tem

    como misso constitucional o policiamento ostensivo e a preservao da ordem

    pblica. Atuando com base no poder discricionrio de polcia, em aes preventivas

    que visam prevenir a prtica de delitos e as condutas ofensivas ordem pblica. Ou

    seja, ofensivas a uma situao de convivncia pacfica e harmoniosa da populao,

    fundada nos princpios vigentes na sociedade (o direito, o costume e a moral),

    conforme citao de LAZZARINI, lvaro. Direito Administrativo da Ordem Pblica. 3

    ed. Rio de Janeiro. Forense. (Assis, 2007).

    A Polcia Militar de Minas Gerais (PMMG) editou no ano de 2002 a Diretriz para

    a produo de servios de segurana (DPSSP N. 01/2.002-CG) definindo no item

    1.3.1 o papel da PMMG na atividade de polcia ostensiva, ou seja, definindo em que

    momentos a polcia militar mineira atua quando da ruptura da ordem pblica, seja

    prevenindo ou inibindo atos anti-sociais. PACHECO (2007) define atos anti-sociais

    como sendo descrio de problemas de comportamento no especficos, como

    comportamentos delinqentes, agressividade e oposicionismo.Para HOUAISS (2001, p. 29) anti-social quer dizer: 1. contrrio as idias,

    costumes ou interesses da sociedade, 2. transgressor dessas normas. Portanto, ato

    anti-social qualquer ato contrrio s normas legais vigentes no pas, no caso

    policial, pode consider-lo como um ato ilcito (penal).

    No contexto sistmico de Defesa Social, a Polcia Militar assume papelde relevncia na preservao da ordem pblica, prevenindo ou

    inibindo atos anti-sociais, atuando repressivamente na restaurao daordem pblica, adotando medidas de proteo e socorro comunitriosou atuando em apoios aos rgos da administrao pblica, noexerccio do poder de polcia que lhes couber.Em sua ao, a Polcia Militar desenvolve uma srie de procedimentosqualificadores das aes e operaes de policiamento ostensivo: Policiamento Ostensivo Geral; Policiamento de Trnsito Urbano e Rodovirio; Policiamento de Meio Ambiente; Policiamento de Guarda; Atividades de garantia do exerccio do poder de polcia dosrgos da administrao pblica. (MINAS GERAIS, 2002, p. 2-3).

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    Os atos anti-sociais podem ser considerados como qualquer ato que produza

    uma ofensa integridade fsica de uma pessoa ou prejuzo ao patrimnio dessa

    pessoa, sendo considerado tambm como um ato criminoso (ilcito penal).

    Lembrando que a Polcia Militar tem por objetivo a manuteno da ordem pblica,

    atravs do policiamento ostensivo preventivo. Sendo que atua tambm

    repressivamente quando da ocorrncia de um delito. ASSIS (2007).

    (...) oportuno ressaltar que embora seja uma polcia preventiva, aPolcia Militar tambm atua repressivamente quando se depara com aocorrncia de ilcito penal que no conseguiu evitar, na chamada

    represso imediata, visando o restabelecimento da ordem pblicaviolada. Como estabelece LVARO LAZZARINI:

    A ordem pblica, contudo, sendo violada em razo de ilcito penal,

    deve ser restabelecida de imediato e automaticamente pelo rgo depolcia administrativa que tenha a competncia constitucional depreservao da ordem pblica. Cuida-se da represso imediata,que tem o seu fundamento no art. 144, 5, da vigente Constituioda Repblica, porque, se no se conseguiu preservar a ordempblica, o rgo policial que detm a exclusividade dessacompetncia constitucional deve restabelec-la imediata eautomaticamente. Temas de Direito Administrativo. 2 ed. So Paulo:Revista dos Tribunais, 2003, p. 97. (Assis, 2007).

    O Conceito de polcia, segundo BITTNER (2003; p. 240), corresponde

    proposio de que a polcia, e apenas a polcia, est equipada (armada e treinada),

    autorizada (respaldo legal e consentimento social) e necessria para lidar com toda

    exigncia (qualquer situao de perturbao da paz social) em que possa ter que ser

    usada a fora para enfrent-la.

    Atravs desse conceito BAYLEY (2001; p. 20) a partir de BITTNER, conceitua

    Polcia como sendo pessoas autorizadas por um grupo para regular as relaes

    interpessoais dentro deste grupo atravs da aplicao de fora fsica. Esta definio

    possui trs partes essenciais: fora fsica, uso interno e autorizao coletiva.

    Nota-se que a polcia responsvel por manter o pacto social e o respeito s

    leis, garantido a construo da cidadania (direitos civis, polticos e sociais), pois age

    na legalidade, e com o apoio popular. Mas quando a polcia atua? Segundo BITTNER

    (2003, p. 240), a polcia atua quando: algo que no devia estar acontecendo e

    sobre o qual alguma coisa tem que ser feita agora. No desdobramento da

    conceituao observa-se que a polcia atua na soluo de problemas sociais, quandosolicitada, no se restringindo ao fato classificado como ilegal. Busca alternativas de

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    respostas que no se restringem a aplicao da lei. E que no pode esperar

    resoluo posterior, requerendo resposta no tempo presente. E a resposta deve ser

    oportuna, suficiente e adequada.

    Para GREENE (2002, p. 47) a polcia no voltada apenas para incidentes

    criminais, atendem solicitaes de auxilio a pessoas fsicas (ou mentalmente

    doentes), pessoas feridas em acidentes domsticos, pessoas que so mordidas por

    animais, pessoas com tendncia ao suicdio, pessoas envolvidas em acidentes

    automobilsticos, e atendem tambm a pessoas perdidas dentre outros. O acesso,

    por parte da comunidade, ao servio prestado pela polcia militar, muito simples,

    basta ligar 190, ou muitas vezes bastando um aceno para um policial, para esse,

    servir de mediador de conflitos sociais. Conforme apregoa GREENE (2002, p. 47)

    uma polcia como prestadora de um servio social:

    Solicitao de servios no relacionados a crimes mais freqentes eimportantes. Solicitaes de servios no relacionadas a crimes soas que envolvem conflito. Tais solicitaes somam cerca de umquarto de todas as solicitaes de servio e dizem respeito a brigasentre cnjuges, pais e crianas, proprietrios e inquilinos, entrevizinhos, ou entre fregueses e proprietrios de tavernas. Sosituaes em geral bastante carregadas emocionalmente, esolucion-las requer percia e controle do temperamento por parte

    dos policiais, exigncias bem diversas daquelas requeridas para lidarcom a maioria dos incidentes relacionados a crimes.Outra importante categoria de solicitaes a de emergnciasdiversificadas. As foras policiais vo a auxlio de pessoas fsica oumentalmente doentes, pessoas que so feridas em acidentedomsticos ou so mordidas por animais, ou mesmo pessoas comtendncia ao suicdio, ou, ainda, deficientes e idosos em vriassituaes difceis, pessoas perdidas e outros semelhantes. (Greene,2002, p. 47).

    No cumprimento de sua misso constitucional as polcias militares realizam

    vrias operaes preventivas como: blitz, buscas pessoais, dentre outras, com ointuito de evitar a prtica de delitos e garantir a ordem pblica.

    1.2 Abordagem policial. O que ?

    A abordagem policial envolve invaso da intimidade e da privacidade das

    pessoas, podendo, dependendo da pessoa e da situao, produzirem aes

    constrangedoras e muitas vezes reaes emocionais e agressivas. preciso que opolicial esteja preparado para essas situaes e equipado conceitualmente com

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    critrios de aes que incorporem o respeito dignidade humana das pessoas que

    estaro submetidas ao seu poder.

    O trabalho policial envolve sempre relaes interpessoais. O policial opera

    num tecido complexo e extremamente varivel de interaes sociais. So, muitas

    vezes, situaes de conflito, humanas, dramticas, que podem envolver todos na

    comunidade. As pessoas podem aparecer de diferentes maneiras, ora como vitimas,

    ora como agressores, ora como espectadores diretos ou indiretos, outras vezes como

    parceiros ou adversrios, s vezes necessitando de auxlio e proteo, mas todos

    com o objetivo de ter seus direitos resguardados pelos agentes de aplicao da lei.

    As situaes em que os policiais se envolvem do origem a opinies e interpretaes

    dos atos policiais. Essas opinies e interpretaes da comunidade podem ser

    positivas ou negativas para a organizao policial e para o policial alvo da

    observao. Disto se segue relevncia do estudo da abordagem policial sob o

    prisma de sua correo, legitimidade e eficincia.

    Sempre que um policial aborda, por fundada suspeita, uma pessoa, que assim

    se torna suspeita de infrao ou crime, envolve situaes de tenso pessoal e social.

    Esta abordagem provoca reaes no indivduo, nos espectadores do ato e,eventualmente, na corporao policial. Por isso, a abordagem policial, fator

    primordial no desenvolvimento da atividade das instituies policiais.

    Em pesquisa realizada na cidade do Rio de Janeiro por RAMOS (2005, p.37)

    mostra que, para um policial, talvez no haja pergunta mais difcil de responder do

    que esta: O que leva um policial a considerar uma pessoa suspeita? A pesquisadora

    ainda cita no trabalho as falas de policiais militares entrevistados para ilustrar essa

    dificuldade (p.38).Porque ns no temos um detector de bandido, seria muito bom. Agente entrava num nibus ou parava um veculo: Olha, o bandido aquele l. No tem como, bandido no tem cara. Vide essa meninade So Paulo, cometeu aquele crime brbaro, menina de classemdia alta, extremamente bonita. (Oficial de BPM do subrbio)

    No est escrito na testa. (Vrios)O policial no tem bola de cristal. (Vrios)

    Tem policial que tem estrela para farejar. (Praa de BPM do Centro)(Ramos, 2005, p. 38).

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    A pesquisadora (RAMOS, 2005) ainda cita que sendo a suspeita parte intrnseca do

    trabalho policial, o discurso ainda se encontre pouco articulado, mesmo entre oficiais

    de uma gerao mais nova. E, RAMOS (2005, p. 39), ainda cita, Muniz (1999), do

    ponto de vista pragmtico da cultura policial das ruas, suspeitar consiste em uma

    atitude saudvel de todo policial (p.16). E ainda observa:

    De fato, a metfora do espelho (a polcia como espelho dasociedade) acionada no plano discursivo toda vez que o policialreconhece que as definies de elemento suspeito tendem acoincidir com esteretipos negativos relativos idade, gnero, classesocial, raa/cor e local de moradia, sendo a idia do espelhoparticularmente cara a um pensamento progressista dentro da polcia,como assinalam Lengruber, Musumeci e Cano (2003: 50-71).

    Muniz chama a ateno para o fato de que

    consiste em uma espcie de lugar-comum acadmico demonstrar queas categorias policiais acionadas para identificar atores em atividadesuspeita ou com comportamentos duvidosos e ameaadoresrefletem, em boa medida, as estruturas do poder e as desigualdadessociais existentes na sociedade (p. 17). (Ramos, 2005, p. 39).

    Com relao fundada suspeita no uma questo s de discriminao

    policial como na afirmao acima, os agentes encarregados da lei trabalham dentro

    da legislao existente no pas. Na legislao brasileira a abordagem policial estembasada no Art. 244 do Cdigo de Processo Penal:

    Art. 244. A busca pessoal independer de mandado, no caso depriso ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa estejana posse de arma proibida ou de objetos de papis ou papis queconstituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada nocurso de busca domiciliar. (GN)(Brasil, 1941)

    A fundada suspeita citada no dispositivo legal acima onde est centrado o

    poder discricionrio do policial, para decidir quem parar e quando parar. A motivao

    do policial ao abordar elemento necessrio para que o ato de polcia vislumbre a

    legalidade. O Art. 239 do Cdigo de Processo Penal complementa o Art. 244 ao

    definir indcio, nesse caso, tambm h margem para a discricionariedade do policial:

    Art. 239. Considera-se indcio a circunstncia conhecida e provada, que, tendo

    relao com o fato, autoriza, por induo, concluir-se a existncia de outra ou

    outras circunstncias. (GN)

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    A utilizao de tcnicas de abordagens ou at mesmo critrios para

    selecionarem locais e pessoas que sero alvos de revistas policiais esto

    resguardados no poder discricionrio. Faceta tambm relevante que integra a

    discricionariedade do trabalho policial para GOLDSTEIM (2003: p. 107) a

    possibilidade de escolha pela omisso, ou seja, deixar de adotar algum

    procedimento, realiz-lo de forma parcial ou adiar a execuo, conforme eventuais

    convenincias.

    Segundo GOLDSTEIM (2003: p. 38), mascarados por este capuz de legalidade,

    por necessidade, os policiais trabalham de maneira muito mais solta e informal,

    fazendo escolhas freqentes e operando com ampla e vasta liberdade no cotidiano

    do trabalho policial. Esta uma situao perversa para o policial, na ponta da linha,

    porque quando sua ao (ou omisso) resultar numa reclamao, por parte do

    cidado, o julgamento dos procedimentos policiais utilizados, realizar-se- dentro dos

    requisitos formais da legislao.

    Segundo RAMOS (2005, p. 54), um tema onde no existe literatura policial,

    e, por existir uma lacuna, os policiais da ponta da linha se sentem vontade para

    usar a discricionariedade em suas abordagens ou mesmo definir quem o suspeito.Outro aspecto que chama a ateno na pesquisa junto PM

    a pobreza do discurso sobre a suspeita. No s no conseguimoslocalizar um nico documento que definisse parmetros para aconstituio da fundada suspeita (expresso usada reiteradamentepor policiais, mas sem qualquer sentido preciso), como encontramosnas falas de oficiais, antigos ou jovens, de alta ou baixa patente, umaarticulao to precria a respeita desse tema quanto a observada na

    cultura policial de rua expressa pelas praas de polcia. surpreendente, para no dizer espantoso, que a instituio noelabore de modo explicito o que os prprios agentes definem comouma das principais ferramentas do trabalho policial (a suspeita); que

    no focalize detidamente esse conceito nos cursos de formao, nasdocumentaes e nos processos de qualificao, nem o defina demodo claro e objetivo, deixando a merc do senso comum, da

    intuio, da cultura informal e dos preconceitos correntes. (Ramos,2005, p. 54).

    Segundo PINC (2006, p. 33), os policiais esto autorizados a abordar pessoas

    que estejam se comportando de forma a despertar suspeita de que possam vir a

    agredir ou j ter transgredido alguma norma legal. E complementa que a

    fundamentao dessa suspeita pelo entendimento policial legtima. E a autora

    concorda com a citao anterior de RAMOS (2006) ao afirmar que essa capacidade

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    de discernimento do policial gera muita discusso, principalmente pela ausncia de

    conceituao clara do que seja atitude suspeita. E, tambm SILVA JNIOR (2005)

    afirma que no h doutrina sobre a fundada suspeita.

    Esse o problema central do baculejo legal: quando ocorre afundada suspeita? A doutrina no se dedica ao tema. Pelo menos nose dedicava, antes do baculejo virar moda. Hoje, at nacomemorao de gol, tem jogador simulando que est sendorevistado, ironicamente, se identificando com os torcedores ohumor uma forma de resistncia do oprimido. Assim, possvel queo Profissional do Direito Penal possa contar em breve com umabibliografia mais densa sobre o tema.

    Conforme PINC (2006, p. 33), a Policia Militar do Estado de So Paulo, com o

    intuito de orientar a conduta do policial militar, criou uma definio da atitude

    suspeita, alm de descrever algumas condutas tidas como suspeitas.

    Atitude(s) suspeita(s): todo comportamento anormal ouincompatvel com o horrio e o ambiente considerados, praticado porpessoa(s), com a finalidade de encobrir ao ou inteno de praticadelituosa. Alguns exemplos:a. Pessoa que desvia que desvia o olhar ou o seu itinerrio,bruscamente quando reconhece ou avista um policial;b. condutor ou ocupantes de um veculo que olha(m) firmementepara frente na condio na condio de rigidez, evitando olhar para

    os lados, para o policial ou para a viatura, que naturalmente chamama ateno do pblico em geral;c. pessoa(s) que, ao ver(em) ou reconhecer(em) um policial ou umaviatura, iniciam um processo de fuga, como correr, desviar caminhoabruptamente etc;d. pessoa(s) parada(s) defronte a estabelecimentos comerciais,bancrios, escolas, filas etc, por tempo demasiado e sem motivoaparente;e. pessoa que mantm seu veculo parado e em funcionamentodefronte a estabelecimentos bancrios, demonstrando agitao,nervosismo, ansiedade etc;f. veculo excessivamente lotado, cujos ocupantes demonstram

    temeridade em seu comportamento;g. txi ocupado por passageiro, contudo, apresentando luminosoaceso;h. uso de vestes incompatveis com o clima, possibilitando ocultarporte ilegal de armas ou objetos ilegais. (PINC, 2006, p. 33).

    Nos comportamentos acima citados, as circunstncias mais comuns de

    suspeio policial definem-se a partir de trs elementos principais: lugar suspeito,

    situao suspeita e caractersticas suspeitas. o que PINC (2006, p. 33) afirma,

    embora a suspeita esteja fundada na atitude, o fator comportamental associadoao ecolgico que despertar a ateno do policial.

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    O conceito de abordagem policial definido, pelo Manual de pratica policial

    numero um (1), Manual de Abordagem, Busca e Identificao, MINAS GERAIS (1981,

    p. 09), documento doutrinrio e normativo da PMMG. Mesmo estando parcialmente

    revogado pelo Manual de Prtica Policial (2002), a conceituao continua atual.

    Dizem os nossos dicionrios que abordar :acometer e tornar; aproximar-se de; chegar; interpelar.

    No nosso caso, poderamos considerar como sendo:a. Uma tcnica policial...b. Ato de aproximar-se de uma pessoa, ou a pessoas, a p,

    montadas ou motorizadas, e que emanam indcios desuspeio; que tenham praticado ou estejam na iminncia depraticar ilcitos penais; outros...

    c. Com o intuito de: investigar, orientar, advertir, prender,

    assistir, etc.(MINAS GERAIS, 1981, p. 09).

    A pesquisadora da Universidade de So Paulo (USP) e Primeiro Tenente da

    Policia Militar de So Paulo, Tnia Pinc, cita Ramos e Musumeci para definir o

    conceito de abordagem policial, PINC (2007), como:

    Na relao cotidiana entre a polcia e o pblico, a abordagempolicial um dos momentos mais comuns da interface entre essesatores. Ramos e Musumeci a definem como situaes peculiares de

    encontro entre a polcia e populao, em princpio no relacionadasao contexto criminal.

    Acrescento a esta definio que a abordagem representa umencontro entre a polcia e o pblico e os procedimentos adotadospelos policiais variam de acordo com as circunstncias e com aavaliao feita pelo policial sobre a pessoa com que interage,podendo estar relacionada ao crime ou no.

    Essa uma ao policial proativa1, que ocorre durante asatividades de policiamento, cujos procedimentos prevem ainterceptao de pessoas e veculos na via pblica e a realizao de

    busca pessoal e revista veicular, com o objetivo de localizar algumobjeto ilcito, como drogas e armas de fogo. A deciso de agir exclusiva do policial e respaldada por lei. (PINC, 2007).

    Na abordagem policial, o policial aproxima-se de uma pessoa, que esteja em

    situao suspeita, com o objetivo de investigar, orientar, advertir, prender ou assistir.

    O policial tem de entender que sua misso proteger vidas e no colocar temor em

    1 PINC (2007) em sua pesquisa cita Shermam para definir a ao policial proativa, como a relao direta entre ocidado e a polcia podendo ocorrer de duas maneiras: (1) ao policial reativa; quando a iniciativa do cidado

    as ligaes ao 190 so exemplo; e (2) ao policial proativa, quando a iniciativa da polcia como exemplo a

    abordagem. (cf. Bayley; 1985: 36)

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    ningum, ao passo que o cidado precisa acatar as ordens do policial, e no reagir

    bruscamente por qualquer motivo no momento da abordagem. Aps o trmino da

    abordagem, a pessoa que se sentir ofendida pela ao da polcia, pode e deve

    identificar o policial e a sua unidade, para apresentar o caso aos seus superiores ou a

    corregedoria policial.

    No encontro entre polcia e populao, o policial, no cumprimento de sua

    misso constitucional, pode para conter o suspeito utilizar da fora para quebrar a

    resistncia do infrator dentro dos princpios legais.

    1.3 Uso da fora2

    A constituio da Repblica Federativa do Brasil subordina o Estado, e seus

    agentes (os policiais entre eles), ao respeito legalidade e a dignidade humana. Nas

    relaes entre Estado e cidados, os poderes de coero e os meios de constrio

    que a autoridade est legitimamente autorizada a exercer e utilizar s se justificam

    se voltados para a garantia da paz social e do exerccio dos direitos e garantias

    fundamentais. O exerccio do poder est limitado pela Constituio e pela lei e nodeve violar ou agredir ou negar a dignidade humana.

    O policial tem de estar apto a cumprir seu dever de aplicao da lei e de

    prestao de assistncia em situaes em que seja necessrio. Poder e autoridade

    esto relacionados, entre outros, a deteno e uso da fora e da arma de fogo. O

    policial, autoridade legal para empregar a fora, incluindo o uso letal de arma de

    fogo em situaes em que se torna necessrio e inevitvel para os propsitos legais

    da aplicao da lei, cria, em toda ao policial, uma situao na qual policiais emembros da comunidade se encontram em lados opostos. Esse relacionamento ser

    ainda mais prejudicado no caso de uso de fora ilegal, isto , desnecessria e

    desproporcional.

    Anos de boas prticas de policiamento e de confiana da comunidade podem

    ser comprometidos por nico ato de uso excessivo de fora ou menos pela

    2Os Princpios Bsicos sobre o Uso da Fora e Armas de fogo (PBUFAF) foram adotados no Oitavo Congresso

    das Naes Unidas sobre a Preveno do Crime e o Tratamento dos Infratores, realizado em Havana, Cuba, de27 de agosto a 7 setembro de 1.990. Apesar de no ser um tratado, o instrumento tem como objetivo

    proporcionar normas orientadoras aos Estados-membros, sendo o Brasil um deles, na tarefa de assegurar e

    promover o papel adequado dos policiais na aplicao da lei.

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    percepo de seu cometimento. Assim, todo policial deve conhecer os princpios

    essenciais para o uso da fora: Legalidade, Necessidade, Proporcionalidade e

    Convenincia. Legal, o policial deve amparar legalmente sua ao. Necessrio, ao

    utilizada pelo policial a menos danosa para se atingir o objetivo desejado.

    Proporcional, a ao policial est conforme a resistncia do suspeito. Conveniente,

    mesmo sendo legal, necessria e proporcional h de se observar convenincia da

    ao, ou seja, a ao no pode trazer danos a pessoas externas a abordagem.

    Estes princpios exigem respectivamente, que a fora somente seja usada pela

    polcia quando estritamente necessria para fazer cumprir a lei e manter a ordem

    pblica, e que a aplicao da fora seja proporcional, isto , s seja aplicada na

    medida exigida pelos legtimos fins do cumprimento da lei e da manuteno da

    ordem pblica, e que essa fora no atinja a terceiros.

    O uso arbitrrio da fora uma violao aos direitos humanos e,

    conseqentemente, do direito penal. O policial, antes, responsvel por manter e

    preservar direitos, acaba por si tornar um violador de normas, um infrator. Na

    atividade policial o uso arbitrrio da fora, ou uso da violncia, considerado um

    impulso arbitrrio, um ato ilegal, ilegtimo, amador. Enquanto que o uso da fora um ato discricionrio, legtimo, legal, profissional. Segundo Muniz; Proena Jr; Diniz

    (1999):

    curioso que a percepo do problema do uso da fora pela polcia ea discusso de sua propriedade no Brasil se dem com base naingenuidade perigosa que no distingue ou no quer distinguir ouso da violncia (um ato arbitrrio, ilegal, ilegtimo e amador) dorecurso fora (um ato discricionrio, legal, legtimo e idealmenteprofissional). Esta situao agravada pela ausncia de um acervoreflexivo cientificamente embasado e informado pela realidade

    comparativa com outros pases, o que abre espao paracomportamentos militantes e preconceituosos. De fato, intervenestecnicamente corretas do ponto de vista da ao policial tm sidolanadas vala comum da "brutalidade policial" e erigidas emsmbolo de uma mtica banalizao da violncia, que explicaria o atualestado da criminalidade em nossas cidades. O nus desta indistino imenso, sobretudo para as organizaes policiais, que se vem nasituao impossvel de ter que tomar decises em ambientes deincerteza e risco sem qualquer critrio que as oriente quanto propriedade das alternativas adotadas.(Muniz; Proena Jr; Diniz; 1999).

    O policial deve ter sempre em mente, ao executar uma abordagem, que para

    cada grau de risco ou ameaa, corresponde a um nvel de resposta da organizao

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    policial. O policial disciplinado e profissional reconhece a importncia do seu trabalho,

    alinhando sua conduta a questes de natureza tica com o uso da fora. A ao de

    cada policial tem forte relao com a imagem e a percepo da organizao policial.

    O uso de arma de fogo permitido na autodefesa ou na defesa de outros,

    contra a ameaa iminente de morte ou ferimento grave, ou para prender uma

    pessoa que exibe esse tipo de ameaa, quando os meios menos extremados forem

    insuficientes. O uso letal intencional de arma de fogo proibido, exceto quando

    estritamente inevitvel para proteger a vida.

    Numa abordagem o policial desconhece a reao do suspeito quando da

    presena dos policiais, sendo necessrio que reconhea qual situao est presente

    no momento da abordagem. E, dentro dessa situao saiba qual nvel de fora deva

    ser empregada com o intuito de evitar excessos ou abusos. Dentro dessa afirmao

    o Manual de Prtica Policial (2002, p. 78):

    Basicamente os suspeitos com que voc lida se enquadram em umadas seguintes situaes:a) Normalidade

    a situao rotineira do patrulhamento em que no h anecessidade de interveno da fora policial.

    b) Cooperativo

    O suspeito positivo e submisso as determinaes dos policiais.No oferece resistncia e pode ser abordado, revistado ealgemado facilmente, caso seja necessrio prend-lo.

    c) ResistentepassivoEm algumas intervenes, o individuo pode oferecer um nvelpreliminar de insubmisso. A resistncia do sujeito primordialmente passiva, com ele no oferecendo resistnciafsica aos procedimentos dos policiais, contudo no acatando asdeterminaes, ficando simplesmente parado. Ele resiste, massem reagir, sem agredir.

    d) ResistenteativoA resistncia do individuo tornou-se mais ativa, tanto mbito

    quanto em intensidade. A indiferena ao controle aumentou a umnvel de forte desafio fsico. Como exemplo, podemos citar osuspeito que tenta fugir empurrando o policial ou vtimas.

    e) AgressonoletalA tentativa do policial de obter uma submisso lei chocou-secom a resistncia ativa e hostil, culminando com um ataque fsicodo suspeito ao policial ou a pessoas envolvidas na interveno.

    f) AgressoletalRepresenta a menos encontrada, porm mais sria ameaa vidado pblico e do policial. O policial pode razoavelmente concluirque uma vida est em perigo ou existe a probabilidade de grandedano fsico as pessoas envolvidas na interveno, como resultadoda agresso. (Minas Gerais, 2002, p. 78).

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    Para conter o suspeito durante uma abordagem policial necessrio o uso da

    fora para quebrar a resistncia. Os nveis de fora apresentam seis alternativas

    adequadas ao uso da fora legal. O Manual de Prtica Policial descreve que cada

    situao enfrentada pelo policial nica. O bom julgamento e as circunstncias de

    cada uma delas ditar o nvel de fora que o policial utilizar. As circunstncias so

    percebidas pelos policiais de acordo com o ambiente e a ao do suspeito abordado.

    TABELA 1Uso da Fora Contnua pela Polcia

    Nvel de Fora x Nvel de Nvel de ResistnciaPOLICIAL SUSPEITO

    NVEL DE FORA NIVEL DE RESISTNCIA

    Comandos Verbais (1) Atitude Submissa (1)

    Controle de contato (2) Resistncia Passiva (2)

    Tticas de Submisso (3) Resistncia Ativa (3)

    Tticas Defensivas (4) Ameaa Fsica (4)

    Fora Letal (5) Ameaa Letal (5)

    *Obs.: Normalidade a situao rotineira em que no h necessidade de interveno da policia.

    Fonte: MINAS GERAIS. Polcia Militar. Manual de Prtica Policial, 2002.

    Nota-se que a ao policial, nvel de fora, est condicionada ao nvel de

    resistncia do suspeito. A fora somente ser utilizada pela polcia quando

    estritamente necessria para cumprir a lei e manter a ordem pblica, e que aaplicao da fora seja proporcional, isto , somente seja aplicada na medida exigida

    pelos legtimos fins do cumprimento da lei e da manuteno da ordem pblica.

    Segundo Muniz; Proena Jr; Diniz (1999) quando uma ao no observa os

    princpios fundamentais do uso da fora, ou seja, a necessidade e a

    proporcionalidade, a ao policial tende a produzir violncia contra os cidados e

    contra os policiais. Esses tm de conhecer as normas e as tcnicas apropriadas ao

    realizar uma abordagem, de forma a usar a fora quando estritamente necessriapara cumprir a lei e manter a ordem pblica.

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    Ao tomarem, de boa f, a idia de que o uso da fora s se daria deforma episdica, tpica e extrema, os policiais acabam por excluir desuas tcnicas um elemento central para a boa resoluo de seutrabalho: o uso comedido da fora. Assim, a discusso sobre o uso defora tem que estar contido na discusso sobre a "abordagem"

    policial em seu sentido tcnico, a norma ou guia de comportamentona relao entre o policial e uma dada circunstncia. Quando se tentaestabelecer prticas de abordagem em que a fora estaria excludaexceto em direta proporcionalidade pelo uso de fora contra a polcia,retira-se da polcia toda iniciativa de uso comedido e adequado dafora. De fato, acaba por se remover das organizaes policiais umaparte importante de sua superioridade de mtodo diante dassituaes de desordem e ilcito, vulnerabilizando-se os policiais narazo direta da gravidade da ameaa enfrentada. No demaislembrar que os ndices de vitimizao policial tm sido extremamenteelevados nas grandes cidades brasileiras. (Muniz; Proena Jr; Diniz;1999).

    O Brasil como membro da Organizao das Naes Unidas (ONU) est

    vinculado as resolues que criaram o Cdigo de Conduta (CCEAL) e os princpios

    bsicos sobre a utilizao da fora e de armas de fogo pelos funcionrios

    responsveis pela aplicao da lei (PBUFAF). Os princpios bsicos sobre o uso da

    fora e arma de fogo pelos policiais identifica como princpios fundamentais: a

    legalidade, a necessidade e a proporcionalidade na ao policial.

    O exerccio do poder de usar a fora e a arma de fogo pode afetar o direitomais importante que existe, o direito a vida. O uso da fora pela polcia que resulta

    violao ao direito a vida representa um claro fracasso de um dos principais objetivos

    do policiamento, o da manuteno da segurana dos cidados.

    Somente atravs do conhecimento das normas e tcnicas apropriadas para o

    uso da fora que o policial poder exercer, em sua plenitude, sua profisso de forma

    a no restringir direitos dos cidados. No artigo 3. do Cdigo de conduta para os

    Encarregados da aplicao da lei (CCEAL) est estipulado que os encarregados daaplicao da lei s podem empregar a fora quando estritamente necessria e na

    medida exigida para o cumprimento de seu dever, (ROVER, 2006). Em, (ROVER, p.

    273), afirma que as palavras-chave na aplicao da lei sero negociao,

    mediao, persuaso, resoluo de conflitos. Comunicao o caminho

    prefervel para se alcanar os objetivos de uma aplicao da lei legtima.

    So valores ticos e humanos assimilados pelos policiais desde sua formao,

    bem como no treinamento constante de tcnicas de interveno policial favorveis

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    aos direitos humanos, que contribuiro de forma a evitar o uso da fora e de armas

    de fogo numa abordagem.

    1.4 Conduta policial tica e legal

    A Policia Militar definida na Constituio da Repblica, dentre os diversos

    rgos do sistema de defesa social, como organizao responsvel pelo policiamento

    ostensivo e pela manuteno da ordem pblica. O policiamento e a manuteno da

    ordem pblica devem ser compatveis com o respeito e a obedincia as leis, o

    respeito pela dignidade humana, e o respeito e a proteo dos direitos humanos. So

    esses princpios que norteiam a atividade policial tica e legal, e so deles que

    derivam todas as demais exigncias e disposies pertinentes atividade policial.

    O desempenho correto e eficaz da organizao polcia militar depende da

    capacidade profissional dos policiais militares. A aplicao da lei no pode estar

    baseada em prticas ilegais, discriminatrias ou arbitrrias por parte dos policiais.

    Tais prticas destroem a confiana e o apoio popular e serviro para sabotar a

    prpria autoridade das corporaes policiais.Como membros do Estado, os policiais, esto sujeitos s leis do Estado. Alm

    de prestarem contas lei, muitos policiais esto sujeitos as restries e sanes de

    cdigos disciplinares, que so aplicveis no mbito administrativo da instituio, e

    apenas a seus membros. A responsabilizao de um policial pode ocorrer em esferas

    distintas do direito, como: administrativa, civil e penal.

    Ao cumprir seus deveres, os policiais tm de resolver dilemas morais,

    enfrentado situaes em que podem sentir-se justificados a infringir a lei para obterresultados, e esto sujeitos a influncias corruptoras da prpria sociedade, quando

    essa legitima aes ilegais da polcia. SegundoALMEIDA (2007, p. 131):

    A cena todos conhecem bem: o flagrante de um crime, os bandidosfogem, a polcia vai atrs e tenta impedir a fuga atirando. As balasso na direo dos criminosos, mas uma, ou mais de uma, atinge ocidado comum que estava passando. Lavado para o hospital, eleno resiste ao ferimento. No violento dia-a-dia das grandes cidadesbrasileiras, perseguies policiais que resultam na morte de inocentestornaram freqentes.

    Mas basta analisar os manuais e acompanhar o estgio nasvrias academias de polcia espalhadas no pas para se perceber queno esse o treinamento que o policial recebe. Por que, ento, eleage dessa forma? Por que acaba protagonista de uma cena de

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    bangue-bangue moderno? A resposta est no apoio da populao.Toda vez que um tiroteio entre policiais e bandidos vitima uminocente, muitos dos comentrios no dia seguinte deixam clara essaconcordncia:

    Que azar de quem estava na linha de tiro; Uma pena que tenha morrido um inocente; Pelo menos os bandidos foram presos. (Almeida,

    2007, p. 131).

    Nesse sentido, ALMEIDA (2007, p. 45) continua:

    Voc a favor da corrupo? Claro que no? E, por acaso, jse utilizou pelo menos uma vez do jeitinho brasileiro? Sem dvidaque sim. obvio que declararia publicamente ser favorvel acorrupo. Nem mesmo seus principais beneficirios. Porm, hideologias mais complacentes com a corrupo do que outras.

    Para ALMEIDA (2007, p.132), boa parte do que dito pela sociedade defende

    a ao da polcia ao efetuar disparos de arma de fogo contra os criminosos, muitos

    argumentaro que isso compreensvel, uma vez que a sensao de insegurana

    que tomou conta das populaes das grandes cidades motiva os indivduos a

    apoiarem qualquer soluo contra o crime, mesmo que seja no estilo olho por olho,

    dente por dente.

    Segunda pesquisa realizada por ALMEIDA (2007, p.135), quase 40% dapopulao brasileira acham certo que algum condenado por estupro seja vtima do

    mesmo crime na cadeia. E mais, a segunda maior concordncia com a ilegalidade

    ocorre em relao tortura: pouco mais de 1/3 da populao considera correto que

    a polcia bata nos presos para obter confisses de supostos crimes. E com relao

    a polcia matar assaltantes/ladres e a populao linchar suspeitos de crimes,

    contam com a aprovao de, respectivamente, 30% e 28% da populao. E conclui,

    em ALMEIDA (2007, p.275), que o Brasil hierrquico, familista, patrimonialista eaprova tanto o jeitinho quanto um amplo leque de comportamentos similares.

    Por estas razes, muito importante que os padres ticos da corporao

    policial devam ser do mais alto nvel, e sejam claros, entendidos e aceitos pelos

    policiais. Quando os padres ticos profissionais so altos, os policiais estaro

    capacitados para resolver seus dilemas morais, e para resistir s tentaes de agir

    ilegalmente ou de maneira corrupta.

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    ROVER (2006, p. 155-157), no Manual de Direitos Humanos e Direito

    Internacional Humanitrio para Foras Policiais e de Segurana define o temo tica,

    bem como os termos: tica pessoal, tica de grupo e tica profissional.

    ... a disciplina que lida com que bom e mau, e com o devermoral e obrigao... ... um conjunto de princpios morais ouvalores... ...os princpios de conduta que governam um individuo ougrupo (profissional)... ...o estudo da natureza geral da moral e dasescolhas morais especficas.... ...as regras ou padres que governama conduta de membros de uma profisso... ... a qualidade moral deuma ao; propriedade.

    (...) ticapessoal refere-se moral, valores e crenas doindivduo.

    (...) tica de grupo estabelecida e possivelmenteconflitante, com a presso subseqente da escolha entre aceit-la ourejeit-la.

    (...) ticaprofissional, um conjunto de normas codificadasdo comportamento dos praticantes de uma determinada profisso.(Roover, 2006, p. 155-157).

    A tica pessoal do individuo, no caso, do policial, seus valores pessoais de

    saber o que bom ou mau, e o que certo ou errado, deve estar em sintonia com os

    quesitos legais para que a ao a ser realizada esteja correta. Quando um indivduoentra numa organizao sua tica pessoal pode se confrontar com a tica do grupo,

    onde a deciso final aceit-la ou rejeit-la. O conflito existente entre elas no

    necessariamente a determinao de qual a melhor ou pior.

    Assim a tica profissional se faz necessria, principalmente na Polcia Militar,

    cujo compromisso com o cidado um fator primordial. A tica profissional o

    compromisso do homem em respeitar as pessoas com quem se relaciona. Esse

    relacionamento deve estar pautado no respeito, seriedade, justia e valores morais.

    Nesse sentido NETO (2007) estabelece qualidades indispensveis, tica

    profissional, ao policial militar no seu dia-a-dia na prestao do servio pblico de

    segurana pblica.

    Filosoficamente NORBERTO DOS SANTOS3 estabeleceu as seguintesqualidades indispensveis ao policial-militar:Quatro maiores: vocao, integridade, disciplina e coragem;Nove menores: cortesia, lealdade, senso comum, iniciativa, energia,autodomnio, modstia, esprito de justia e cultura profissional.

    3 NORBERTO DOS SANTOS, Antonio. Policiamento. Belo Horizonte: PMMG, 1969, 3.ed.p.25.

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    Estas treze qualidades demonstram o arcabouo que deve compor ocarter do comportamento profissional de um policial brasileiro queatua em cenrios diversos e bastante complexos. (NETO, 2007)

    Dentro dos princpios norteadores da conduta policial, NETO (2007) define oconceito de tica policial militar:

    (...) a tica (ou deontologia) policial militar constituda pelos valorese deveres ticos, traduzidos em normas de conduta, que se impepara o exerccio da profisso policial atinja plenamente ideais derealizao do bem comum, mediante a preservao da ordempblica. Estes valores so aplicados, indistintamente, aos integrantesda Polcia Militar, independentemente do posto ou graduao. Estadeontologia policial deve reunir valores teis e lgicos e valoresespirituais superiores, destinados a elevar a profisso policial-militar condio da misso. (NETO, 2007).

    Complementando o conceito citado podemos dizer que a tica policial militar

    a observncia das regras e princpios que regem a conduta humana do policial, do

    ponto de vista moral e profissional. Na transgresso as regras, temos um desvio, ou

    seja, qualquer ofensa aos princpios ticos e do dever policial militar, o que distingue

    de crime, pois esse tem seus bens juridicamente tutelados na Constituio Federal,

    Estadual e pelos Cdigos diversos.

    Evidentemente que os cdigos no so suficientes para garantir uma sociedade

    tica, principalmente sem educao. As regras e os cdigos continuaro existindo e

    sendo reformados, mas elas, apenas por existirem, no so capazes de garantir

    condutas ticas de efetiva responsabilidade.

    A Polcia Militar uma corporao que tem como princpios basilares a

    hierarquia e a disciplina. A hierarquia uma forma de distribuir responsabilidades

    individuais pelos postos e graduaes, alcanando a cada um, com direitos e

    deveres. A disciplina o acatamento de ordem, de obedincia e de cumprimento dos

    deveres de cada policial militar em todos os nveis hierrquicos. Ela fortalece a

    hierarquia e consolida a convico de obedincia s leis e normas que a sustenta. O

    poder disciplinar um dos mecanismos que esto disposio da instituio para a

    responsabilizao do integrante desviante.

    Vrias profisses, como mdicos, por exemplo, possuem cdigo de tica

    profissional para nortear o desempenho de seus profissionais. Nesse sentido asNaes Unidas adotou atravs de Assemblia Geral a resoluo 34/169, de 17 de

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    dezembro de 1979, o Cdigo de Conduta para os Encarregados da Aplicao da Lei

    (CCEAL), baseado nos instrumentos internacionais de Direitos Humanos e Justia

    Criminal. O Brasil como membro da Organizao das Naes Unidas (ONU) est

    vinculado as resolues que criaram o Cdigo de Conduta (CCEAL) e os princpios

    bsicos sobre a utilizao da fora e de armas de fogo pelos funcionrios

    responsveis pela aplicao da lei (PBUFAF).

    O CCEAL reconhece a importante funo desempenhada, de maneira digna e

    diligente, pelos policiais, de acordo com os princpios dos direitos humanos, e exige

    que os seus padres faam parte da crena de todo policial atravs de educao,

    treinamento e avaliao.

    O Cdigo de Conduta dos Encarregados de Aplicao da Lei possui oito

    artigos, onde cada artigo traz um comentrio, onde podem ser resumidos:

    Artigo 1. Requer dos Policiais o cumprimento do dever que lhes imposto

    pela lei. O termo encarregado de aplicao da lei,policial, definido no Comentrio

    como todo aquele que exerce poder policial, em especial os de priso e deteno.

    Artigo 2. Requer dos policiais, no cumprimento do dever, o respeito e a

    proteo dignidade humana e manuteno e sustentao dos direitos humanos. OComentrio lista os instrumentos internacionais de direitos humanos importantes

    para o policiamento.

    Artigo 3. Requer dos policiais o uso da fora somente quando estritamente

    necessrio e na extenso necessria para o cumprimento do seu dever. O

    Comentrio refere-se ao principio da proporcionalidade no uso da fora e expressa

    que o uso de armas de fogo considerado um recurso extremo.

    Artigo 4. Requer dos policiais a manuteno do sigilo dos assuntos denatureza confidencial dos quais tenham conhecimento, a menos que o desempenho

    do dever ou estrita necessidade judicial exijam o contrrio.

    Artigo 5. Afirma a absoluta proibio sobre o uso da tortura ou maus tratos

    (tratamento cruel, desumano ou degradante). Expressa tambm que nenhum policial

    dever invocar ordens superiores ou circunstncias excepcionais, tais como guerra

    ou perigos a segurana nacional, como justificativa para a tortura.

    Artigo 6. Requer que os policiais garantam a proteo total e a sade daspessoas sob sua custdia.

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    Artigo 7. Probe os policiais de cometer qualquer ato de corrupo, bem

    como, opor-se e combater rigorosamente esses atos.

    Artigo 8. Requer que os policiais respeitem a lei e o Cdigo de Conduta,

    protegendo-os realmente se opondo a quaisquer violaes a eles. Os policiais

    devero denunciar as violaes ao Cdigo.

    A corrupo policial, citada no Artigo 7, incompatvel com a profisso

    policial. Embora a definio de corrupo esteja ligada legislao nacional, pode

    entend-la como a execuo ou a omisso de um ato no desempenho do dever

    policial, em conseqncia de ofertas, de promessas ou de incentivos e a aceitao

    ilcita destes. A lei deve aplicar a todos. Segundo BALESTRERI (2007): um

    verdadeiro policial, ciente de seu valor social, ser o primeiro interessado no

    expurgo dos maus profissionais, dos corruptos, dos torturadores, dos psicopatas.

    As referncias feitas no Artigo 5 do Cdigo de Conduta as ordens

    superiores e a proibio de qualquer ato de corrupo relatada no Artigo 7 e as

    circunstncias excepcionais, e a denncia de violaes como so referidas no

    Artigo 8, so claramente importantes em relao tica do policiamento.

    O Cdigo de Conduta (CCEAL) pode ser encarado como um cdigo de ticaque proporciona orientao sobre como atender as obrigaes legais para a proteo

    e promoo de direitos. Uma polcia arbitrria, violenta e ilegal provoca medo e dio.

    Uma polcia desse tipo no merece e no obtm o apoio e o respeito da populao.

    necessrio entender que a atividade policial requer uma competncia tcnica

    subordinada a valores ticos e legais, portanto, os nveis de eficincia e eficcia no

    podem desprezar tal exigncia.

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    CAP 2. PROCEDIMENTOS OPERACIONAIS PARA O USO DA FORA

    Ao pensar, dezenas de hipteses podem ser avaliadas. Aofazer tudo se reduz ao sim ou no, ao ficar ou partir.

    Carlos Heitor Cony Trecho do livro: A Casa do PoetaTrgico

    2.1. NORMAS QUE REGEM A ABORDAGEM POLICIAL

    2.1.1. Misso Constitucional da Polcia Militar

    A constituio da Repblica Federativa do Brasil subordina o Estado, e seus

    agentes (os policiais entre eles), ao respeito legalidade e a dignidade humana. Nas

    relaes entre Estado e cidados, os poderes de coero e os meios de constrio

    que a autoridade est legitimamente autorizada a exercer e utilizar s se justificam

    se voltados para a garantia da paz social e do exerccio dos direitos e garantias

    fundamentais. O exerccio do poder est limitado pela Constituio e pela lei e no

    deve violar ou agredir ou negar a dignidade humana.

    A Constituio da Repblica Federativa do Brasil (CR) de 1988 classifica a

    segurana como um direito social e dedica a esse assunto um captulo intitulado DA

    SEGURANA PBLICA. No tocante s Polcias Militares (CR, art. 144, inciso V),

    estabelece sua competncia para a execuo da polcia ostensiva e a preservao

    da ordem pblica, seu carter militar, atravs de sua vinculao ao Exrcito

    Brasileiro como Fora Auxiliar; e sua subordinao aos Governadores dos estados.

    Captulo III

    DA SEGURANA PBLICAArt. 144 A segurana pblica, dever do Estado, direito eresponsabilidade de todos, exercida para a preservao daordem pblica e da incolumidade das pessoas e do patrimnio,atravs dos seguintes rgos:...

    V polcias militares e corpos de bombeiros militares.... 5 s polcias militares cabem a polcia ostensiva e apreservao da ordem pblica; (...). 6 As polcias militares e corpos de bombeiros militares, forasauxiliares e reserva do Exrcito, subordinam-se, juntamente com aspolcias civis, ao Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dosTerritrios. (GN). (BRASIL, 1988)

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    Para que a Polcia Militar cumpra sua misso constitucional necessrio que

    seus agentes tenham poderes especiais para agir em nome do Estado, impondo

    normas e comportamentos. o que se denomina Poder de Polcia.

    2.1.2 O Poder de Polcia

    Na expresso poder de polcia est compreendido o exerccio do poder do

    Estado sobre as pessoas e as coisas para atender ao interesse pblico. Estariam

    includas no conceito todas as restries impostas pelo poder pblico aos indivduos,

    em benefcio do interesse coletivo, sade, ordem pblica, segurana e, de modo

    mais intenso, os interesses econmicos e sociais.

    O Estado deve garantir os direitos individuais e coletivos, de maneira cidad.

    Para BONI (2006, p. 632) o poder de polcia um instrumento da autoridade do

    Estado e do prprio povo.

    Ao passo que o Estado deve garantir os direitos individuais ecoletivos, de maneira cidad; dispe do poder de polcia, comoinstrumento da autoridade do Estado e do prprio povo, respaldadono interesse pblico e nas disposies legais que se enquadrem ao

    caso em concreto, servindo para mediao de conflitos, para apreveno e represso dos ilcitos, e de modo geral e amplo paraassegurar a tranqilidade, a segurana, e a salubridade pblica,contra quaisquer ameaas ordem pblica, notadamente quandoexistem direitos conflitantes. (BONI, 2006).

    A noo de polcia ostensiva abriga assim a ordem de polcia que nasce da lei.

    O consentimento de polcia, que vinculado ou discricionrio, quando cabvel. A

    fiscalizao pela qual se verifica o cumprimento da ordem de polcia ou quando atua

    no policiamento e a sano de polcia que se destina represso da infrao. Apolcia de manuteno da ordem pblica, a partir de 1988 passa a deter o poder de

    polcia para a preservao da ordem pblica, o que engloba tanto a manuteno

    como a restaurao.

    Dentro da tica constitucional de Polcia Ostensiva e de Preservao da Ordem

    Pblica, LAZZARINI (1999, p. 72-73, 103-104) afirma que a competncia policial

    militar abrange inclusive aquela residual, obtida mediante remanncia, competindo

    assim, todo universo policial que no seja atribuio constitucional dos demais

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    rgos previstos no art. 144 da Carta de 1988, e tambm a competncia especfica

    na falncia destes rgos.

    BONI (2006, p. 639-640) define a abordagem policial como uma prtica

    realizada por autoridade competente para a ao preventiva e repressiva e

    fundamentada no poder de polcia.

    A abordagem policial, para fins deste estudo, pode sercompreendida como atividade material desempenhada pelasautoridades legalmente investidas nas funes pblicas e dotadas decompetncia para a ao preventiva e repressiva, com fundamentono poder de polcia, visando preservao da ordem pblica.

    Essa atividade material dos atos de polcia administrativa oujudiciria se caracteriza como um ato administrativo, quando

    presentes os requisitos que devem lhe revestir, possibilitando assim,identificar os limites de sua interveno num Estado Democrtico deDireito.

    Nessa forma de interveno policial que atinge as liberdadespblicas, os bens e os direitos dos cidados, o policial utiliza-se deuma vertente do poder de polcia que conferido aos encarregadosde aplicao da lei na esfera policial, para garantia da cidadania,agindo com intensidade varivel, de acordo com a ponderao dosprincpios e direitos conflitantes no caso em concreto. BONI (2006, p.639-640).

    A coercibilidade do ato de polcia justifica o emprego da fora fsica quandohouver oposio do infrator, mas, assim como a discricionariedade, deve ser manter

    dentro dos limites da lei, sendo proporcional resistncia. O atributo da

    coercibilidade no autoriza a violncia desnecessria, caracterizando o excesso como

    abuso de autoridade. A violncia excessiva torna nulo o ato praticado e permite

    aes civis e criminais para reparao do dano e punio dos culpados.

    Tanto a abordagem policial, quanto a busca pessoal configuram o exerccio do

    poder de polcia, porm importante saber que a ao policial deve ser dentro doslimites legais, para a efetiva cidadania, utilizando-se discricionariedade e no

    arbitrariedade. Nesse sentido, BONI (2006, p. 644-645):

    Nesse sentido Cretella Jnior (Lazzarni et. al., 1986, p. 198-199) nos traz a seguinte lio:

    Do mesmo modo que os direitos individuais so relativos,assim tambm acontece com o poder de polcia que, longe de seronipotente, incontrolvel, circunscrito, jamais podendo pr emperigo a liberdade e a propriedade. Importando, regra geral, o poderde polcia, restries a direitos individuais, a sua utilizao no deve

    ser excessiva ou desnecessria, para que no se configure o abusodo poder. No basta que a lei possibilite a ao coercitiva daautoridade para justificao do ato de polcia. necessrio, ainda,

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    que se objetivem condies materiais que solicitem ou recomendem asua inovao. BONI (2006, p. 644-645).

    2.1.3 A Busca Pessoal

    A busca pessoal independer de mandado da Autoridade Judiciria, nos casos

    autorizados pelo art. 244 do CPP, sempre que houver "fundada suspeita de que a

    pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papis que constituam

    corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar".

    Tambm no caso de priso o policial no necessitar de mandado ou autorizao

    para revistar o preso a procura de elementos do corpus delicti ou mesmo dequalquer dos objetos enumerados no 1 do art. 240 do CP. Para uma melhor

    compreenso passamos a transcrever dois artigos sobre a busca pessoal prevista no

    Cdigo de Processo Penal:

    Art. 240. A busca ser domiciliar ou pessoal. 1o Proceder-se- busca domiciliar, quando fundadas razes

    a autorizarem, para:a) prender criminosos;b) apreender coisas achadas ou obtidas por meios criminosos;c) apreender instrumentos de falsificao ou de contrafao e objetos

    falsificados ou contrafeitos;d) apreender armas e munies, instrumentos utilizados na prtica decrime ou destinados a fim delituoso;e) descobrir objetos necessrios prova de infrao ou defesa doru;f) apreender cartas, abertas ou no, destinadas ao acusado ou emseu poder, quando haja suspeita de que o conhecimento do seucontedo possa ser til elucidao do fato;g) apreender pessoas vtimas de crimes;h) colher qualquer elemento de convico.

    2oProceder-se- busca pessoal quando houver fundadasuspeita de que algum oculte consigo arma proibida ou objetosmencionados nas letras ba fe letra hdo pargrafo anterior. (GN).

    Art. 244. A busca pessoal independer de mandado, no caso depriso ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa estejana posse de arma proibida ou de objetos ou papis que constituamcorpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso debusca domiciliar. (GN). (BRASIL, 1941).

    Se utilizarmos a escala do uso da fora contnua e nveis de resposta, que

    vimos no Captulo anterior, a primeira ao policial a posio de abordagem e a

    outra o comando verbal usados para realizar a abordagem policial, que regulado

    por lei. No Brasil a abordagem policial tem fundamento no artigo 244 do Cdigo de

    Processo Penal. Sempre que um policial aborda, o faz utilizando da fundada suspeita

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    que uma pessoa possa a vir transgredir ou j ter transgredido alguma norma legal, e

    nesse fundamento que est centrado o poder discricionrio do policial de decidir

    quem abordar.

    A busca pessoal tem natureza preventiva quando realizada por iniciativa

    policial na atividade de preservao da ordem pblica, nesse sentido, a busca

    pessoal realizada pela Polcia Militar tem natureza preventiva quando realizada antes

    da efetiva constatao do ato delituoso e constitui ato legitimado pelo exerccio do

    poder de polcia. Se realizada aps o ato infracional, ainda que em conseqncia de

    busca preventiva, tambm se busca a obteno de objetos necessrios ou relevantes

    prova da infrao (de crime ou contraveno), ou a defesa do ru (alnea "e", do

    1, do art. 240 do CPP).

    Nos limites da busca pessoal preventiva, ocorre a denominada busca pessoal

    coletivaque contrasta com a convencional busca pessoal individual. Na condio de

    medida excepcional, tolervel em benefcio do bem comum, a exemplo da busca

    pessoal preliminar procedida por policiais militares em todos que pretendem entrar

    em um estdio de futebol. Essa espcie de busca realizada em entrada de eventos

    pblicos. Para CHIBA (1998, p.55):(...) quando um policial faz na entrada de um campo de

    futebol busca pessoal em todas as pessoas, estar utilizando outrosinstrumentos legais: destinao constitucional da polcia militar e osdois poderes instrumentais: Poder de Polcia e Poder Discricionrio.Esse ato tem a presuno de legitimidade, coercitivo e de auto-executoriedade, pois o prprio Estado atuando atravs de seusagentes. (CHIBA, 1998, p. 55).

    A busca em veculo ora pode ser considerada pessoal, ora domiciliar. Depende

    da utilizao do veculo. Quando o veculo utilizado como casa, h necessidade dascautelas inerentes busca domiciliar. J quando a revista for levada a efeito em

    veculos, com destinao exclusiva de meio de transporte, as regras a serem

    observadas so as mesmas da busca pessoal.

    CHIBA (1998, p. 53) argumenta que apenas os dispositivos legais previstos no

    Cdigo de Processo Penal no so suficientes para legitimar todas as formas de

    abordagem e busca pessoal realizada pela Polcia Militar. O autor entende que o

    assunto mais amplo e transcende o previsto no Art. 244 do Cdigo de ProcessoPenal. Para o oficial o tema deve ser analisado dentro de um contexto maior,

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    comeando pela destinao constitucional da Polcia Militar, suas atribuies, leis

    infraconstitucionais e at mesmo nos usos e costumes.

    O autor, CHIBA (1998, p. 55), afirma que quando um policial militar,

    durante um patrulhamento de rua, depara com um determinadoindivduo em situao de fundada suspeitae faz uma busca pessoal;nesse caso sim, estar invocando o dispositivo do artigo 244 doCdigo de Processo Penal. E o autor continua esclarecendo que odispositivo legal citado no se presta na totalidade para legitimartodas as aes que o Policial Militar executa por ser muito restrito eespecfico, pois somente se aplica em casos de fundada suspeita.

    Segundo CHIBA (1998, p.35) os atos do PM precisam estar limitados pelos

    seguintes parmetros: legalidade, legitimidade, razoabilidade, interesse pblico,

    finalidade e impessoalidade. E conclui que ser submetido busca pessoal ou a umavistoria, ser submetido ao prprio Poder do Estado e no do PM, desde que,

    bvio, obedecidos aqueles limitadores princpios constitucionais.

    2.1.4 Uso da Fora

    Como j falamos sobre o uso da fora no Captulo anterior buscaremos

    apenas a definio legal no uso legtimo da fora, a coercibilidade do Poder de

    Polcia. O uso da fora para ser legtimo necessita estar de acordo com alguns

    requisitos, como vimos anteriormente a coercibilidade justifica o uso de fora quando

    houver oposio do infrator devendo a ao policial ser sempre proporcional

    resistncia.

    O Cdigo de Processo Penal brasileiro trata do uso da fora em seus artigos

    284 e 292:

    Art. 284. No ser permitido o emprego de fora, salvo aindispensvel no caso de resistncia ou de tentativa de fuga dopreso.

    Art. 292. Se houver, ainda que por parte de terceiros, resistncia priso em flagrante ou determinada por autoridade competente, oexecutor e as pessoas que o auxiliarem podero usar dos meiosnecessrios para defender-se ou para vencer a resistncia, do quetudo se lavrar auto subscrito tambm por duas testemunhas.

    Sendo necessrio utilizar da fora para conter a resistncia ou a tentativa de

    fuga, e o preso acabar se ferindo, o policial estar amparado pelo instituto da

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    legtima defesa. Sobre o assunto esclarece MIRABETE (2001, p. 182) sobre os

    requisitos para a existncia desta modalidade de excludente de ilicitude:

    So requisitos para a existncia da legtima defesa:

    a) a reao a uma agresso atual ou iminente e injusta;b) a defesa de um direito prprio ou alheio;c) a moderao no emprego dos meios necessrios repulsa; ed) o elemento subjetivo.(MIRABETE, 2001, p. 182).

    Como a abordagem policial uma atividade comprovadamente de alto risco e

    tenso no momento de sua realizao muito grande, mesmo quando estamos

    tratando de policiais treinados para execut-la, tornando-se importante comentarmos

    a respeito da legtima defesa putativa. Segundo MIRABETE (2001, p. 188):

    Legtima defesa putativa existe quando o agente, supondo por erroque est sendo agredido, repele a suposta agresso. No estexcluda a antijuridicidade do fato porque inexiste um dos seusrequisitos (agresso real, atual ou eminente), ocorrendo na hipteseuma excludente da culpabilidade nos termos do art. 20, & 1.Exemplo o do agente que, em rua mal iluminada, se depara comum inimigo que lhe aponta um objeto brilhante e, pensando estar naiminncia de uma agresso, lesa o desafeto. Verificando-se que oinimigo no iria atingi-lo, no h legtima defesa real por no terocorrido a agresso que a justificaria, mas a excludente da

    culpabilidade por erro plenamente justificado pelas circunstncias.Absolveu-se tambm o acusado, proprietrio de um veculo, que, como auxlio de outrem, reagiu violentamente contra a vtima que tentavaabrir, por equivoco, seu veculo, induzindo o agente a supor que setratava de furto. Mesmo nessas hipteses, porm, sempreindispensvel a moderao. (MIRABETE, 2001, p. 188).

    O Cdigo de Processo Penal Militar (CPPM), em seu art. 234, tambm

    regulamenta o uso da fora, deixando patente que s pode ser empregada em casos

    extremos, in verbis: Art. 234. O emprego da fora s permitido quandoindispensvel, no caso de desobedincia, resistncia ou tentativa de fuga (...).

    Quanto ao emprego especfico das algemas, o 1 do mesmo artigo categrico:

    1. O emprego de algemas deve ser evitado, desde que no haja perigo de fuga ou

    de agresso da parte do preso, e de modo algum ser permitido, nos presos a que

    se refere o art. 242.

    O uso de algemas no est regulamentado, por falta de ato normativo que

    explicite o art. 199 da Lei de Execues Penais: O emprego de algemas serdisciplinado por decreto federal, que deve ser entendido como Lei Federal.

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    No Informativo n. 437 do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o Uso de

    Algemas e Constrangimento Ilegal no julgamento unnime do HC 89429/RO,

    Relatora Ministra Carmen Lcia, informa que o uso legtimo de algemas no

    arbitrrio, sendo de natureza excepcional e que deve ser adotado nos casos e com

    as finalidades seguintes: a) para impedir, prevenir ou dificultar a fuga ou reao

    indevida do preso, desde que haja fundada suspeita ou justificado receio de que

    tanto venha a ocorrer; b) para evitar agresso do preso contra os prprios policiais,

    contra terceiros ou contra si mesmo.

    A funo policial ultrapassa a represso criminalidade. O fundamental de

    tudo quanto foi exposto atentar para a busca do equilbrio, da proporo e da

    razoabilidade. E para que seja regra, e no exceo, o uso de algemas, desde que

    consciente e no arbitrrio, deve ser incentivado e no reprimido. Porm, o uso da

    fora deve ser medido, observando-se sempre a proporcionalidade entre o interesse

    social a ser resguardado e as conseqncias de seu uso.

    2.2 Controle das atividades policiais

    O Brasil inaugurou uma nova era no que se refere aos limites e parmetros

    para a atuao das Instituies de Segurana Pblica com a promulgao da

    Constituio da Repblica, em 05 de outubro de 1988. Com a redemocratizao, os

    direitos e garantias individuais foram esculpidos como clusulas ptreas no bojo da

    Constituio da Repblica.

    Decorrente da nova ordem poltica e jurdica, o trabalho policial, passou a ser

    regrado por instncias de controle externo, tais como o Ministrio Pblico, querecebeu da Carta Magna de 1988, competncia legal para realizar o controle externo

    da atividade policial. Nos nveis federal, estadual e municipal, os Poderes Legislativos

    estruturaram Ouvidorias, Comisses e Conselhos de Direitos Humanos, para

    monitorar, fiscalizar e assegurar o respeito aos direitos e garantias individuais.

    Outra forma de controle da atividade policial que surge aps 1988, so as

    Corregedorias e as Ouvidorias de Polcia. A Corregedoria de Polcia busca como rgo

    da prpria instituio policial, ser um canal de comunicao entre a populao e apolcia, onde pessoas podem denunciar/reclamar da atuao de policiais. Tambm

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    o rgo interno na Instituio que busca coibir desvios de conduta por parte dos

    policiais. Denomina-se como desvio de conduta qualquer comportamento (do

    policial) contrrio as normas internas da corporao (regulamentos) e/ou contrrio as

    normas externas (Leis).

    Todas as denncias, apresentadas pela vtima ou testemunha ou outros

    rgos, so investigadas atravs de procedimentos administrativos buscando saber a

    verdade dos fatos. Comprovando a denncia o policial punido no mbito interno,

    no caso de transgresses disciplinares, e aquelas que configuram crime so

    encaminhadas ao Ministrio Pblico para dar incio a ao penal.

    J a Ouvidoria de Polcia um rgo sem nenhum vnculo com a Instituio

    Policial, onde dirigido por um civil, com total autonomia e independncia, onde a

    sua funo ser o porta-voz da populao em casos de desvios de condutas

    praticados por policiais militares e policiais civis.

    A ouvidoria no tem atribuio de apurar, mas sim de acompanhar e de

    contribuir para garantir celeridade e transparncia nas apuraes. O rgo mantm

    sigilo das denncias, reclamaes e sugestes que recebe, garantindo tambm o

    sigilo da fonte da fonte de informao, assegurando, quando solicitada, a proteodos denunciantes.

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    CAPTULO 3. TREINAMENTO POLICIAL PARA O USO DA FORA

    Um passo frente... e voc no est mais no mesmo lugar!"

    (Chico Science).

    3.1. A importncia do treinamento

    O aumento da criminalidade nas ltimas dcadas um fenmeno alimentado

    pala ampla circulao de armas de fogo, inclusive as de uso restrito d