O PACTA SUNT SERVANDA X A FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO

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  • 7/28/2019 O PACTA SUNT SERVANDA X A FUNO SOCIAL DO CONTRATO

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    O PACTA SUNT SERVANDA X A FUNOSOCIAL DO CONTRATO

    Uma anlise do art. 421 do Cdigo Civil Brasileiro

    Ester Beiriz Viana Alves

    RESUMO

    Analisando sua evoluo histrica, percebe-se que a figura do contrato sobreviveu no

    tempo e passou por diversas transformaes moldando-se sociedade em que esteve

    inserido. Passou do Estado liberal ao Estado social modificando seus preceitos

    fundamentais. Atualmente, o contrato visto como um produto da alterao da

    realidade social, e a concepo do princpio da funo social do contrato, inserido no

    art. 421 do Cdigo Civil Brasileiro, fruto dessa nova realidade. O presente estudo tem

    a finalidade de analisar a aplicao do princpio da funo social como limitador da

    autonomia da vontade, relativizando o princpio do pacta sunt servanda nos casos de

    descumprimento da lei. Como a aplicao deste novo preceito matria muito

    complexa, esta pesquisa busca entender como possvel equilibrar os princpios da

    fora obrigatria e da funo social dos contratos, sem extinguir o carter da relao

    privada, evitando o prejuzo social advindo de tal relao.

    Palavras-chave: Contrato; Princpios Contratuais; Obrigao; Funo Social.

    1 INTRODUO

    Estudando a parte histrica dos contratos e seus princpios norteadores, denota-

    se que sob a gide do Cdigo Civil de 1916, nenhuma importncia foi dada aos fatores

    sociais que envolviam a elaborao de um negcio jurdico. Isso porque a sociedade

    havia sado recentemente de um perodo escravocrata e iniciado a Repblica. Desta

    forma, os valores mais importantes na poca, eram a propriedade e o materialismo

    existencial, que de forma geral, indicavam o individualismo e o conservadorismo da

    sociedade de ento.

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    Somente aps o perodo de democratizao do pas, que sucedeu o longo

    perodo ditatorial, abriu-se um novo horizonte na esfera civil.

    O combate ao individualismo, e a predominncia da destinao social, foram

    estabelecidos no ordenamento brasileiro, com o advento do Cdigo Civil de 2002.

    Enfocando os preceitos da liberalidade com destinao coletiva, o legislador estabelece

    no art. 421 do Cdigo Civil o princpio da funo social do contrato.

    Este princpio impe o interesse coletivo em detrimento do individual, e foi

    inspirado no art. 5, inciso XXIII da Constituio Federal, que limita o direito de

    propriedade ao atendimento da funo social.

    Porm, a lei no definiu o que vem a ser a funo social do contrato, de modo

    que, a este dispositivo infraconstitucional, podem ser dadas diversas interpretaes,

    propiciando a declarao de nulidade de determinadas clusulas contratuais, e at

    mesmo de todo instrumento.

    Assim, o pacta sunt servanda, princpio tradicional que permeia a

    obrigatoriedade das relaes contratuais, perdeu fora com a limitao da funo social

    do contrato.

    Este trabalho busca esclarecer como o princpio da funo social do contrato

    pode conviver com o pacta sunt servanda, sem que o negcio jurdico perca sua

    segurana e credibilidade.

    Para a compreenso do tema, esta pesquisa trar inicialmente a definio decontrato e sua evoluo histrica, dando nfase passagem do liberalismo adotado no

    cdigo napolenico at a interveno estatal do Estado social.

    Aps a compreenso acerca do contrato, sero analisados os princpios

    contratuais, suas atuaes como preceitos fundamentais da formao contratual, e, em

    alguns casos, como normas diretivas no ordenamento jurdico.

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    O terceiro tpico, foco desta pesquisa, explicitar uma anlise do contrato no

    Estado liberal, e sob a tica do Estado social com a positivao da funo social do

    contrato. Este tpico abordar ainda, a anlise da liberdade contratual prejudicando a

    funo social do contrato, e um breve estudo da terminologia do art. 421 do Cdigo

    Civil de 2002.

    Por fim, registrar a aplicao da funo social do contrato pelos magistrados

    atravs de julgados de tribunais brasileiros.

    Esta pesquisa aplicar o mtodo indutivo, empregando a tcnica da pesquisa

    bibliogrfica, utilizando as doutrinas, legislaes e jurisprudncias acerca do tema.

    2 CONTRATO

    2.1 O CONCEITO E A IMPORTNCIA DO CONTRATO PARA O DIREITO CIVIL

    No h uma definio absoluta sobre contrato. De forma geral, pode ser

    definido como negcio jurdico estabelecido entre as partes contratantes gerando efeitos

    entre si. Venosa (2003, p. 361) ao definir o contrato, disserta sobre o negcio jurdico:

    Quando o homem usa de sua manifestao de vontade com a intenoprecpua de gerar efeitos jurdicos, a expresso dessa vontade constitui-senum negcio jurdico [...] Ser negcio jurdico, porm, todo o ato lcito,

    que tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou

    extinguir direitos (grifos do autor).

    Em sua obra, Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 11), do uma concepomais moderna clssica definio de contratos, quando incluem os princpios da funo

    social e da boa-f objetiva:

    [...] entendemos que o contrato um negcio jurdico por meio do qual aspartes declarantes, limitadas pelos princpios da funo social e da boa-f

    objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir,

    segundo a autonomia das suas prprias vontades (grifos do autor).

    Englobando os conceitos j elencados, pode-se dizer que o contrato a

    manifestao de vontades entre as partes sobre o mesmo objeto, com o intuito de

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    constituir, modificar, regular ou extinguir uma relao jurdica. Observados os

    princpios limitadores desta relao, ter validade o efeito jurdico desta pretenso.

    Cabe ressaltar a importncia do contrato no Direito Civil, e seu emprego na

    sociedade. Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 1/2) observa-se seu

    valor:

    Trata-se, em verdade, da espcie mais importante e socialmente difundida denegcio jurdico, consistindo, sem sombra de dvidas, na fora motriz dasengrenagens scio-econmicas do mundo.Desde os primrdios da civilizao [...] o contrato passou a servir, enquantoinstrumento por excelncia de circulao de riquezas, como a justa medidados interesses contrapostos.[...] poucos institutos sobreviveram por tanto tempo e se desenvolveram sobformas to diversas quanto o contrato, que se adaptou a sociedades comestruturas e escalas de valores to distintas quanto s que existiam naAntiguidade, na Idade Mdia, no mundo capitalista e no prprio regimecomunista.[...] nenhum instituto jurdico socialmente to adaptvel.

    Percebe-se, portanto, que o contrato a espcie mais importante dentre os

    negcios jurdicos, capaz de sobreviver ao tempo e adaptar-se aos moldes da sociedade

    em que se encontra.

    2.2 O HISTRICO DOS CONTRATOS

    Analisando a parte histrica dos contratos, observa-se que desde o surgimento

    do homem h indcios da existncia dos pactos. Os homens viviam em tribos, onde

    existiam regras comuns de convivncia, e para estes restavam cumpri-las. Verifica-se,

    portanto, a forma mais primitiva de contrato.

    Rizzardo (2005, p. 18) cita alguns relatos de existncia dos contratos nos

    tempos antigos:

    No antigo Egito, conheciam-se formas rudimentares de contratos, unsdisciplinando o casamento, exigindo a sua inscrio no registro pblico, paraestabelecer a filiao; outros, relativos translao da propriedade. [...]A partir do Sculo V antes de Cristo, iniciaram a fluir importantes leis, [...]Foi justamente na Tbua VI que apareceu a origem da obrigao e do

    contrato, ao consignar a norma cum nexum faciet mancipiumque uti lnguanuncupassit ita jus esto. O vocbulo nexum exprime um elo, uma cadeia,significando, tambm contrato. O conceito de obrigao emana desta regra,

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    induzindo a concluir que o credor podia dispor do corpo do seu devedor nocaso de impontualidade ou de inadimplemento da obrigao.

    Apesar dos indcios da existncia dos contratos desde o surgimento do homem,

    este s recebeu a devida importncia no direito romano. Conforme ensina Loureiro

    (2005, p. 31) foram os romanos, os primeiros a classificar o ordenamento contratual, em

    conveno, pacto, e, em contrato propriamente dito:

    De fato, contractus (contractus negotii), significava a relao que seconstitua com base num acordo se no o prprio acordo; no qualqueracordo sobre objetos e relaes jurdicas, mas apenas aquele que originavaobrigaes entre partes. O termo contractus no abrangia os negciosdestinados a criar apenas e exclusivamente o contrato obrigatrio. O acordo,

    isso , o elemento subjetivo das vontades que se encontram, era designadopor conventio, conventum, pactio, e tinha o significado mais amplo deconsensus. Mas, ao lado deste, a conventio e opactio, tinham um significadomais restrito e preciso, quando passaram a designar toda srie de acordos(pacta) que, privado das formas e das solenidades prescritas pelo direito,ficavam fora da categoria de contratos. De qualquer forma, ospacta, emborano gerassem ao e no estabelecessem vnculo obrigatrio, recebiam uma

    proteo indireta do pretor, mediante a exceptio pacti conventi.

    Assim, conclui-se que a conveno era o gnero, sendo o pacto e o contrato as

    espcies.

    Na Idade mdia, o direito cannico foi fundamental para a formao das

    doutrinas da autonomia de vontade, do consensualismo e da fora obrigatria. Nesse

    sentido discorre Santiago (2005, p. 26):

    Firmou-se na idade mdia, por influncia do direito cannico, o conceito decontrato como acordo de vontades, pelo qual os indivduos instauram umarelao jurdica, valorizando-se o consensualismo em detrimento da forma.Os canonistas alaram a vontade condio de elemento essencial docontrato, fundando-se, entretanto, em razes teocrticas para o cumprimentoda vontade manifestada. Para os telogos do direito, o fato de prometer e nocumprir a promessa, mentindo palavra empenhada, era pecado contra adivindade, o que ensejava as penas eclesisticas.

    Na idade moderna, um marco importante para o direito contratual foi

    concepo do cdigo napolenico, estabelecido aps a revoluo de 1789. Neste

    instrumento, o contrato disciplinava os diversos modos de aquisio de propriedade.Venosa (2003, p. 362), a esse respeito edita em sua obra:

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    O contrato, o acordo de vontades, representava, na verdade, uma garantia

    para os burgueses e para as classes proprietrias, que a nova classe dominanteno pretendia destruir, mas promover, numa relao de aliana subalterna(Roppo, 1988:46) [sic]. A transferncia de bens passava a ser dependenteexclusivamente da vontade. A classe de comerciantes passava a deter o poder

    econmico e, portanto, a ter condies de impor sua vontade. Por outro lado,os proprietrios, juridicamente, no poderiam ser privados de seus bens, semsua manifestao de vontade.

    O contrato que surge neste perodo o ponto mximo do individualismo. Ele

    vale e obrigatrio (pacta sunt servanda), pois assim estabeleceram as partes.

    O Estado liberal se solidifica com a autonomia da vontade ganhando status de

    lei. Todo o poder da vontade humana, como criadora de obrigaes, vem assentado no

    art. 1.134 do Cdigo de Napoleo, quem [sic] emprega uma forte redao: as

    convenes legalmente formadas tm o valor de leis para aqueles que a fizeram

    (LOUREIRO, 2002, p. 42).

    Porm, o contrato no se limitava a criar obrigaes, os jusnaturalistas1[1]

    deram ao contratualismo um grande destaque. Conforme ressalta RIZZARDO (2005, p.

    9), Rousseau baseava no contrato a prpria estrutura estatal, onde era possvel criar,

    modificar ou extinguir, inclusive os direitos reais.

    Todas as codificaes que se seguiram no sculo XIX navegaram em guas domodelo francs, estando nessa situao o revogado Cdigo italiano e a grande maioria

    dos Cdigos latino-americanos (VENOSA, 2003, p. 362).

    Ainda no sculo XIX, uma importante modificao no mbito contratual

    ocorreu com a concepo do cdigo alemo. Segundo VENOSA (2003, p.363) no

    cdigo alemo, o contrato passa a pertencer a uma categoria mais geral. Ele

    1[1] Jusnaturalistas so adeptos do direito natural que defendem os princpios fundamentais deproteo ao homem.

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    estampado como subespcie da espcie maior, que o negcio jurdico. Ele traz as

    regras aplicveis ao negcio jurdico, assim como descreve as regras que se aplicam ao

    contrato em geral e suas espcies. Esse sistema foi adotado pelo Cdigo Civil Brasileiro

    de 1916 e mantido no instrumento atual.

    No sculo XX, o consumismo impulsionado pelo capitalismo, provocou a

    escassez do contrato paritrio dando lugar aos contratos de massa (contratos de adeso).

    Esse novo direito privado exigiu reflexes dos dogmas clssicos. Diante desse cenrio,

    o legislador procurando incutir na norma a realidade em que vivemos, fez presentes no

    novo cdigo, a limitao da liberdade de contratar e a funo social do contrato. Essa

    inovao representou a clara preocupao com a tutela dos interesses sociais daqueles

    que cotidianamente esto contratando. (VENOSA, 2003, p. 366-368).

    A autonomia privada na sua concepo tradicional, pedra angular do

    liberalismo contratual reinante aps a Revoluo Francesa, d lugar ao Estado Social

    delineado na Constituio de 1988, com o regulamento da ordem econmica e social, e,

    com o emprego da funo social do contrato no contedo do Cdigo Civil.

    (SANTIAGO, 2005 p. 72/73)

    3 PRINCPIOS CONTRATUAIS

    3.1 CONCEITO DE PRINCPIOS

    O termo princpio denota a noo de norma nuclear do sistema. Os princpios

    constituem os preceitos fundamentais da formao contratual.

    Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 27), discorrem acerca dos princpios, e

    conotam sua importncia no direito positivado ao definirem Por princpio, entendam-se

    os ditames superiores, fundantes e simultaneamente informadores do conjunto de regras

    do Direito Positivo. Pairam, pois, por sobre toda a legislao, dando-lhe significadolegitimador e validade jurdica.

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    Os princpios so mandamentos superiores que inspiram a formao das

    normas jurdicas. Estas so elaboradas respeitando os ditames dos princpios. Barros

    (2005, p. 213/214) em sua obra, diferencia o princpio, de uma norma jurdica, quando

    explica:

    O princpio lana sua fora sobre todo o ordenamento jurdico, atuando numarea muito mais ampla do que a norma, pois esta se limita a regular situaesespecficas.Os princpios so as premissas ticas que inspiram a elaborao das normas

    jurdicas. So mais do que normas, pois sua funo primordial servir comocritrio de interpretao destas, devendo ser observados pelo legislador,quando elabora as leis; pelos juzes, quando as aplica; e pelo cidado, quandorealiza o negcio jurdico.

    Ainda, segundo BARROS (2005, p. 213) importante ressaltar, que os

    princpios, s vezes, podem estar contidos numa norma. Quando isso ocorre, d-se a

    esta, o nome de norma diretiva, pois orienta o hermeneuta, quando existe dvida a cerca

    da adoo de uma ou outra interpretao.

    Alguns exemplos de normas diretivas so: o art. 422 CC, que traz os princpios

    da probidade e boa-f, e o art. 421 CC, que trata o princpio da funo social, tema desta

    pesquisa.

    3.2 CLASSIFICAO DOS PRINCPIOS CONTRATUAIS

    No h unanimidade entre os doutrinadores, quanto classificao dos

    princpios no sistema contratual. Porm, destacam-se os seguintes princpios elencados

    na obra de Barros (2005, p. 214):

    a) Princpio da autonomia da vontade;

    b) Princpio da supremacia da ordem pblica;

    c) Princpio do consensualismo;

    d)Princpio da obrigatoriedade ou pacta sunt servanda ou princpio da fora

    vinculante dos contratos;

    e) Princpio da relatividade;

    f) Princpio da boa-f;g) Princpio da funo social.

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    Por sua importante conotao no contexto deste trabalho, estes princpios sero

    analisados separadamente em tpicos prprios.

    3.2.1 Princpio da autonomia da vontade

    Desde o surgimento do contrato, o princpio da autonomia da vontade sempre

    foi apregoado. Representava um acordo de vontades livres e soberanas, no suscetvel

    de modificaes geradas por terceiros que no fizessem parte da relao contratual.

    No cdigo napolenico a autonomia da vontade elevou-se a categoria de lei,

    quando determinou em seu diploma que as convenes tinham valor de lei entre as

    partes (RIZZARDO, 2005, p. 10).

    O conceito absolutista do princpio da autonomia da vontade passou por um

    processo de transformao ao longo do sculo XX, buscando o equilbrio social. A este

    respeito Loureiro (2002, p. 39) sabiamente traz a pauta:

    O absolutismo do princpio da autonomia da vontade e da doutrinaeconmica liberal foi objeto de crticas durante o sculo XX. Combatidos

    pela doutrina e pela jurisprudncia, os postulados tericos revelaram sua faceoculta: a liberdade e a igualdade ideais do modelo humano abstrato que osfundamentavam ocultavam a dependncia e a desigualdade material dosindivduos e dos grupos sociais. Os desequilbrios contratuais decorriam doexcesso de individualismo e do voluntarismo. Perdendo seu estatuto de valorem si, a vontade deveria de agora em diante servir a justia e a utilidadesocial sob o olhar vigilante do direito objetivo. A noo de ordem pblica,limite tradicional da liberdade contratual, foi aprofundada. ordem pblicade direo cdigo moral e social de interesse geral se acrescentou aordem pblica de proteo leis de equilbrio dos interesses particulares emluta contra as injustias sistmicas.

    Atualmente, este princpio encontra-se limitado pela norma de ordem pblica.

    A interferncia estatal mostra-se crescente e progressiva, nas relaes contratuais

    privadas.

    Como examina Venosa (2003, p. 375/376), a autonomia da vontade submete-se

    ao contedo social desprendido do Cdigo vigente:

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    No contrato de nossa poca, a lei prende-se mais contratao coletiva,visando impedir que as clusulas contratuais sejam injustas para uma das

    partes. Assim, a lei procurou dar aos mais fracos uma superioridade jurdicapara compensar a inferioridade econmica.[...] Por esse prisma, realando o contedo social do novo Cdigo, seu art.421 enuncia: A liberdade de contratar ser exercida em razo e nos limites

    da funo social do contrato . O controle judicial no se manifestar apenasno exame das clusulas contratuais, mas desde a raiz do negcio.

    Neste aspecto, acrescenta Barros (2005, p. 214/215):

    De acordo com esse princpio, as partes so livres pra estipular as clusulascontratuais e o tipo de contrato.[...] O princpio da autonomia da vontade, porm, no absoluto, pois aliberdade dos contratantes encontra-se limitada pelo princpio da supremaciada ordem pblica e pelos dois princpios do contrato que traam as diretrizesda noo de socialidade.

    Sob novo prisma, a autonomia da vontade est presente no Cdigo Civil de

    2002, e, de fundamental importncia para o direito contratual. Permite que as partes se

    manifestem no plano pessoal, deliberando com quem deseja contratar e o contedo do

    pacto.

    3.2.2 Princpio da supremacia da ordem pblica

    Como j verificado no tpico anterior, a autonomia da vontade amparada por

    lei, porm no tem carter absoluto, sendo subjugada s diretrizes estatais. O princpio

    da supremacia da ordem pblica verifica-se nessa interveno estatal, conforme dispe

    Barros (2005, p. 215) em sua obra:

    O princpio da ordem pblica o que limita a liberdade de contratar, vedando

    as convenes contrrias s normas cogentes e aos bons costumes.[...]Assim, o dirigismo contratual consiste na interveno do Estado no contedodos contratos para evitar o desequilbrio entre as partes e o abuso do podereconmico. Essa interveno se d por meio da edio de leis de ordem

    pblica, editadas pela Unio, pois os Estados-membros no podem legislarsobre contratos (art. 22, I, da CF).

    Da lio de Rizzardo (2005, p. 23/24) extraem-se alguns exemplos de normas

    estatais que servem de diretrizes limitadoras autonomia da vontade:

    Pode-se ressaltar vrios tipos de leis de ordem pblica, que afirmam asupremacia do Estado perante a liberdade das vontades:

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    a) Leis que consagram ou salvaguardam o princpio da liberdade e daigualdade dos cidados, e principalmente as que estabelecem o princpioda liberdade de trabalho, de comrcio e de indstrias;

    b) as leis relativas a certos princpios de responsabilidade civil ou a certasresponsabilidades determinadas;

    c) as leis que asseguram ao operrio proteo especial;

    d) as leis sobre o estado e a capacidade das pessoas;e) as leis sobre o estado civil;f) certos princpios bsicos do direito hereditrio, como os relativos

    legitima e a proibio de pactos sobre a sucesso futura;g) as leis relativas composio do domnio pblico;h) os princpios fundamentais do direito de propriedade;i) as leis monetrias.

    As normas delimitadoras podem ser divididas conforme sua determinao.

    Barros (2005, p. 215) descreve sua diviso:

    As normas cogentes ou coativas so as que no podem ser modificadas pelavontade das partes. Podem ser:a) imperativas: so as que ordenam algum ato. Tal ocorre, por exemplo,

    com a lei que obriga o comerciante a vender mercadoria a quem quisercompr-la.

    b) proibitivas: vedam algum ato. Tal ocorre, por exemplo, com a lei queprobe o anatocismo (juros compostos). Outro exemplo a vedao daclusula leonina2[2] nos contratos de sociedade.

    Os negcios quando submetidos as normas, outrossim, aos bons costumes,

    resultam na preservao da ordem pblica, perfazendo o ato lcito e eficaz.

    3.2.3 Princpio do consensualismo

    Conceituando o princpio do consensualismo, Rizzardo (2005, p. 17/18)

    explica que a vontade exteriorizada s gera perfeito acordo quando h consentimento

    mtuo:

    Mais abrangentemente, o acordo de duas ou mais vontades, que tenha porfim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar ou extinguir direitos.Para criar um lao obrigacional, mister que haja perfeito acordo, isto ,mtuo consenso sobre o mesmo objetoduorum vel plurim in idem placitumconsensus3[3]. No basta que cada parte experimente um ato de vontadeinterna, considerado pura manifestao psquica. Importa que a vontade dosdeclarantes vise como escopo imediato um resultado jurdico de naturezaobrigacional, alm do que ela se deve traduzir por uma manifestao exteriorsuficiente e inequvoca, que por si s basta para evidenciar o consentimento.

    2[2] A clusula leonina abusivamente garante vantagem a uma das partes, em prejuzo daoutra.

    3[3]Duorum vel plurim in idem placitum consensus o consentimento aclarado por duas oumais pessoas versando sobre um objeto de direito numa relao de obrigao.

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    Depreende-se assim, a necessidade da convergncia de vontades entre duas ou

    mais pessoas sobre um mesmo objeto, para gerar um negcio jurdico.

    Neste aspecto acrescenta ainda RIZZARDO (2005, p. 18) que o

    consentimento que determina a obrigao do pactuado, como manifestao recproca de

    promessas vlidas, livremente consentidas. Sem esse entendimento, o contrato no teria

    propsito, nem a lei seria forte suficiente para fazer nascer uma relao capaz de obrigar

    as partes contratantes.

    O art. 107 do Cdigo Civil Brasileiro reporta-se ao princpio doconsensualismo por no exigir forma especial para o aperfeioamento da conveno:

    Art. 107: A validade da declarao de vontade no depender de formaescrita, seno quando a lei exigir.

    Porm o princpio do consensualismo no absoluto, as excees regra so

    os contratos formais (solenes) ou reais. A lio de BARROS (2005, p. 222) esclarece

    que pelo princpio do consensualismo, o acordo de vontades suficiente para gerar a

    formao vlida do negcio. Porm apresenta duas excees: os contratos solenes (que

    exigem forma escrita para ter validade), e os contratos reais (que se formam com a

    entrega da coisa). Dentre os contratos reais destacam-se: mtuo, comodato, penhor,

    depsito, e os de doaes de pequeno valor.

    Unindo os conceitos dos princpios da autonomia da vontade e do

    consensualismo temos que a criao do negcio jurdico, depende inicialmente da

    vontade das partes em contratar e do mtuo consenso sobre o pactuado, que no

    existindo forma prescrita em lei, perfeita estar a conveno.

    3.2.4 Princpio da obrigatoriedade ou pacta sunt servanda ou princpio da fora

    vinculante dos contratos

    Conforme CARLI (2005, p. 48), o termo latim pacta sunt servanda significa

    que os contratos existem para serem cumpridos.

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    Na viso de RIZZARDO (2005, p. 24) a concepo filosfica da teoria clssica

    do brocardo pacta sunt servanda, consagrava que as convenes legalmente formadas

    constituem lei para aqueles que as celebram. Assim, conforme a regra consolidada no

    direito cannico irredutvel o acordo de vontades, portanto, os contratos devem ser

    cumpridos pela mesma razo que a lei deve ser obedecida.

    No mesmo sentido Santiago (2005, p. 36) acrescenta que tal princpio na sua

    concepo clssica, consagra o entendimento de que, uma vez obedecidos os requisitos

    legais para a existncia do contrato, a avena se torna obrigatria entre as partes, que

    no se podem desligar da relao jurdica seno por outro pacto com esse objetivo.

    Observa-se assim, que na concepo clssica, a obrigatoriedade dos contratos

    tinha carter absoluto por determinao legal. Desta forma, o contedo do acordo de

    vontades era irretratvel.

    Ao longo deste sculo, impulsionado pela nova idia de justia contratual, o

    princpio da pacta sunt servanda passou por um perodo de transformao, ganhando

    um matiz mais discreto. GAGLIANO e PAMPLONA FILHO (2006, p. 38/39) lecionam

    que o princpio da fora obrigatria, manifestado especialmente na imodificabilidade ou

    intangibilidade dos termos do contrato, tornou-se um instrumento de opresso

    econmica, que no decorrer do sculo XX acentuou as desigualdades sociais, facilitando

    a opresso do fraco pelo forte. Assim, em poca como a atual, em que os contratos

    paritrios cedem lugar aos contratos de adeso, a pacta sunt servanda temperada por

    mecanismos jurdicos de regulao do equilbrio contratual, a exemplo da teoria da

    impreviso4[4].

    Sob a gide do Cdigo Civil, o princpio da fora obrigatria, pode ser

    relativizado se o contedo do pacto divergir com os demais princpios gerais do direito

    contratual. A doutrinadora Carli (2005, p. 48/49), preceituando a respeito desta matria

    acrescenta que:

    4[4] Teoria da impreviso consistente no reconhecimento de que a ocorrncia de

    acontecimentos novos, imprevisveis pelas partes e a elas no-imputveis, refletindo sobre aeconomia ou na execuo do contrato, autorizam sua reviso, para ajust-lo s circunstnciassupervenientes.

  • 7/28/2019 O PACTA SUNT SERVANDA X A FUNO SOCIAL DO CONTRATO

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    A obrigatoriedade, todavia no absoluta. H que se respeitar a lei e,sobretudo, outros princpios com os quais o da fora obrigatria coexistecomo o da Boa-f, o da Legalidade, o da Igualdade, entre tantos outros;afinal, os princpios gerais do Direito integram um sistema harmnico.Assim, se pode dizer que pacta sunt servanda o princpio segundo ocontrato obriga as partes nos limites da lei.

    Embora com menor rigidez, o princpio da fora obrigatria se faz presente no

    direito contratual para dar segurana e credibilidade aos acordos. Como expem

    Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 38), de nada valeria o negcio, se o acordo

    firmado entre os contraentes no tivesse fora obrigatria. Seria mero protocolo de

    intenes, sem validade jurdica.

    Sem a obrigatoriedade dos contratos, no teria segurana as relaes negociais,

    pois a palavra dos homens seria carente de fora jurdica.

    Arremata Gomes (apudGAGLIANO e PAMPLONA FILHO, 2006, p. 38) que

    o contrato celebrado que seja, com observncia de todos os pressupostos e requisitos

    necessrios sua validade, deve ser executado pelas partes como se suas clusulas

    fossem preceitos legais imperativos.

    Nota-se assim, aps essa anlise, que embora sob a nova tica da justia e da

    igualdade, o pacta sunt servanda, encontra-se presente na relao contratual, dando

    garantias as partes do cumprimento do negcio acordado.

    3.2.5 Princpio da relatividade

    Acerca deste princpio, Barros (2005, p. 223) ensina que de acordo com o

    princpio da relatividade, o contrato s produz efeitos entre as partes. No beneficia nem

    prejudica terceiros. Assim, em regra, no se pode, por meio de um contrato, criar

    direitos e obrigaes para terceiros.

    Neste sentido, Santiago (2005, p. 39) elucida que o estudo da relatividade dos

    efeitos dos contratos envolve a questo dos efeitos contratuais do ponto de vista

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    subjetivo, ou seja, em relao s pessoas que esses efeitos atingem, no sentido ativo,

    passivo ou quanto oponibilidade.

    Percebe-se que, em regra, o contrato s ata aqueles que dele pactuaram. Porm

    o ordenamento jurdico trata algumas excees que so trazidas nas obras de diversos

    doutrinadores.

    De acordo com BARROS (2005, p. 223) as excees do princpio da

    relatividade so: a estipulao em favor de terceiro; a responsabilidade dos herdeiros

    quanto ao cumprimento do contrato do de cujus, at as foras da herana; e o poder do

    consumidor acionar judicialmente o fabricante, produtor, construtor ou importador,

    mesmo no tendo contratado diretamente com eles, na hiptese de reparao de danos

    causados por defeitos ou informaes insuficientes do produto.

    Na lio de GAGLIANO e PAMPLONA FILHO (2006, p. 40/41) retiram-se

    ainda outras excees ao princpio da relatividade, quais sejam: o contrato com pessoa a

    declarar, e ainda os casos onde necessria a relativizao do princpio da relatividade

    subjetiva, por exemplo, quando se constata a violao de regras de ordem pblica e

    interesse social.

    Outrossim, VENOSA (2003, p. 377) acrescenta como excees este princpio

    as convenes coletivas de trabalho e fideicomisso constitudo por ato inter vivos.

    Assim, estudadas essas definies, toma-se por lio, que o contrato no

    produz efeito com relao a terceiros, exceto nos casos previstos em lei.

    3.2.6 Princpio da boa-f

    O Cdigo Civil brasileiro de 2002 trouxe uma relevante inovao no mbito

    contratual, ao introduzir o princpio da boa-f no art. 422 em seu diploma legal. Sua

    redao traz:

    Art. 422: Os contratantes so obrigados a guardar, assim na concluso docontrato, como em sua execuo, os princpios de probidade e boa-f.

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    Ao inserir este princpio no ordenamento jurdico, buscou o legislador

    minimizar os efeitos da liberdade sem precedentes. Loureiro (2002, p. 41), descreve que

    a boa-f, equidade, e razoabilidade so pedras angulares da nova teoria geral do

    contrato e procuram atenuar os abusos potenciais de uma liberdade sem limites. Os

    conceitos filosfico-econmicos da teoria clssica dos contratos foram, portanto,

    atenuados e transformados.

    consenso entre os doutrinadores a diviso da boa-f em objetiva e subjetiva.

    Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 64/65) assim as definem:

    [...] faz-se necessrio que estabeleamos uma diagnose diferencial entre aboa-f objetiva e a boa-f subjetiva.Esta ltima, de todos conhecida por estar visivelmente presente no CdigoCivil de 1916, consiste em uma situao psicolgica, um estado de nimo oude esprito do agente que realiza determinado ato ou vivencia dada situao,sem ter cincia do vcio que a inquina.Em geral, esse estado subjetivo deriva do reconhecimento da ignorncia daagente a respeito de determinada circunstncia [...]Distingue-se, portanto, da boa-f objetiva, a qual, tendo natureza de princpio

    jurdico delineado em um conceito jurdico indeterminado -, consiste emuma verdadeira regra de comportamento, de fundo tico e exigibilidade

    jurdica.

    Ao compartilhar da mesma viso, Venosa (2003, p. 379), aponta a boa-f

    objetiva como regra de conduta:

    Na boa-f subjetiva, o manifestante de vontade cr que sua conduta correta,tendo em vista o grau de conhecimento que possui de um negcio. Para eleh um estado de conscincia ou aspecto psicolgico que deve serconsiderado.A boa f objetiva, por outro lado, tem compreenso diversa. O intrprete

    parte de um padro de conduta comum, do homem mdio, naquele caso

    concreto, levando em considerao os aspectos sociais envolvidos. Dessemodo, a boa-f objetiva se traduz de forma perceptvel como uma regra deconduta, um dever de agir de acordo com determinados padres sociaisestabelecidos e reconhecidos.

    Este estudo tem como foco a boa-f objetiva, presente no art. 422 do Cdigo

    Civil como norma principiolgica das relaes contratuais.

    3.2.6.1 A boa-f objetiva

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    Para GAGLIANO e PAMPLONA FILHO (2006, p. 66) o princpio da boa-f

    d uma nova concepo clssica teoria da estrutura obrigacional, porquanto esta, vista

    sob enfoque tico, afasta a concluso de que o contrato se encerra apenas na obrigao

    principal de dar, fazer ou no fazer. A boa-f impe tambm a observncia de deveres

    jurdicos anexos ou de proteo, a exemplo dos deveres de lealdade e confiana,

    assistncia, confidencialidade ou sigilo, confiana, informao, etc.

    Aprofundando o estudo da boa-f objetiva, Theodoro Jnior (2004, p. 21-23,

    grifou-se) invoca a conduta tica dos pactuantes sob trs aspectos diferentes, porm

    conexos:

    a) no art. 422, estabelece-se a obrigao acessria de agir segundo osprincpios da proibidade e boa-f, independente da previso dessaconduta nas clusulas do contrato, das negociaes preliminares, ou dostermos ajustados para a execuo e para a responsabilidade pela

    prestao realizada (funo integrativada boa-f objetiva);b) no art 113, estatui-se que os negcios jurdicos devem ser interpretados

    conforme a boa-f e os usos do lugar de sua celebrao(funointerpretativada boa-f objetiva)[...];

    c) no art 187, reprime-se como ato ilcito, a conduta do titular de umdireito, que, no exerc-lo, excede manifestamente os limites impostos

    pelo seu fim econmico ou social, pela boa-f ou pelos bonscostumes(funo limitativa da boa-f objetiva, como meio de

    controlar o exerccio do direito em busca de impedir ou sancionar oabuso do direito).

    V-se assim, que o autor estabelece as funes integrativa, interpretativa e

    limitativa da boa-f objetiva nessas diversas situaes, contudo obedecendo ao mesmo

    princpio de disciplinamento tico dos contratantes, um em relao ao outro.

    De toda sorte, o princpio da boa-f objetiva aplicvel nas diversas etapas da

    elaborao do pacto. Venosa (2003, p. 380), faz meno a essas fases quando diz:

    Tanto nas tratativas como na execuo, bem como na fase posterior derescaldo do contrato j cumprido (responsabilidade ps-obrigacional ou ps-contratual) a boa-f objetiva fator basilar da interpretao. Dessa forma,avalia-se sob a boa-f objetiva tanto a responsabilidade pr-contratual, comoa responsabilidade contratual e a ps-contratual. Em todas essas situaessobreleva-se a atividade do juiz na aplicao do direito ao caso concreto.

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    Por fim, cabe ressaltar a aplicabilidade deste princpio na esfera jurdica, pois

    se tratando de clusula geral, cumpre ao juiz o dever de examinar o caso concreto.

    Ressalta Santiago (2005, p. 104) que:

    A conseqncia da adoo da tcnica de clusula geral para a fixao legal doprincpio da boa-f, devido elasticidade envolvida, implica que no existemsolues imediatas para a questo, mas apenas linhas de orientao, cabendoao aplicador do direito, no caso concreto, definir a sano para o desrespeitodo preceito.

    Em caso de desrespeito norma lembra BARROS (2005, p. 220), que o juiz

    pode valer-se do princpio da preservao dos contratos (anulando apenas a clusula

    desleal, preservando o negcio); da converso dos contratos (transformando um

    contrato nulo noutro vlido); ou ainda do princpio do menor sacrifcio do devedor.

    3.2.7 Princpio da funo social

    Dentre as principais inovaes trazidas pelo atual Cdigo Civil, a positivao

    da funo social dos contratos, sem dvida a questo mais importante e mais obscura

    em matria contratual.

    O art. 421, do Cdigo Civil expressa que:

    Art. 421: A liberdade de contratar ser exercida em razo e nos limites dafuno social do contrato.

    Este princpio veio ao encontro do fenmeno da socialidade j presente no

    direito brasileiro, sob tendncias jurisprudenciais, antes mesmo de existir o Cdigo

    atual. Neste aspecto lembram Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 45) que:

    A socializao da idia de contrato no idia nova.A partir do momento em que o Estado passou a adotar uma postura maisintervencionista, abandonando o ultrapassado papel de mero expectador daambincia econmica, a funo social do contrato ganhou contornos maisespecficos.

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    Conforme SANTIAGO (2005, p. 72), embora existisse a idia de socializao,

    o quadro traado no panorama nacional, ainda revelava forte influncia individualista

    contida no Cdigo Civil de 1916. Um novo panorama s delineou-se a partir da

    Constituio de 1988, aperfeioando-se no Cdigo Civil de 2002.

    O ideal de justia social trazido pela Constituio Federal de 1988 serviu de

    diretriz para a incluso do princpio da funo social do contrato no instrumento

    civilista. Sobre esse aspecto, elucida Reale (2003), o pai do atual Cdigo Civil:

    Um dos motivos determinantes desse mandamento resulta da Constituio de1988, a qual, nos incisos XXII e XXIII do Art.5, salvaguarda o direito de

    propriedadeque atender a sua funo social. Ora, a realizao da funo

    social da propriedade somente se dar se igual princpio for estendido aoscontratos, cuja concluso e exerccio no interessa somente s partescontratantes, mas a toda a coletividade.

    Nota-se que, assim como serviu para os jusnaturalistas institurem o Estado

    liberal, o direito de propriedade foi o propulsor do Estado social.

    Diante de tal princpio, obriga-se entender o significado de funo social, para

    assim defini-lo. Theodoro Jnior (2004, p. 13) com eloqncia leciona que:

    Com efeito,funoquer dizer papel a desempenhar, obrigao a cumprir,pelo indivduo ou por uma instituio. E social qualifica o que concernente sociedade, relativo comunidade, ao conjunto dos cidadosde um pas. Logo s se pode pensar em funo social do contrato, quandoeste instituto jurdico interfere no domnio exterior aos contratantes, isto , nomeio social em que estes realizam o negcio de seu interesse privado.

    Buscando o conceito de funo social, BARROS (2005, p. 216) lembra que a

    lei no define o que vem a ser funo social do contrato. Desta forma, pode serinterpretado de diversos modos, consistindo basicamente na prevalncia do interesse

    coletivo sobre os interesses individuais dos contratantes.

    No entendimento de LOUREIRO (2002, p. 52), a funo social vela pela

    distribuio de riquezas, pois o cumprimento do contrato no deve gerar fonte de

    enriquecimento sem causa ou violar as noes de equidade. Seu papel fundamental

    assegurar a produo de riquezas e a realizao de negcios, sempre de forma a

    favorecer o progresso social, evitando o abuso do poder econmico e a relao desigual

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    entre os contratantes. Em outras palavras o contrato deve orientar as diversas relaes

    de forma a atender os princpios bsicos de nossa sociedade: a dignidade da pessoa

    humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; a equidade; a solidariedade

    e a produo de riquezas. Toda vez que o contrato descumprir com um desses objetivos,

    tem-se que ele no cumpre a sua funo social.

    Na doutrina de Theodoro Jnior (2004, p. 35/41) resta demonstrada a

    amplitude da funo social no mbito contratual, quando fala dos seus reflexos perante

    terceiros:

    A funo social do contrato consiste em abordar a liberdade contratual emseus reflexos sobre a sociedade (terceiros) e no apenas no campo dasrelaes entre as partes que o estipulam (contratantes).Quando o art. 421 do novo Cdigo brasileiro fala em funo social para ocontrato est justamente cogitando dos seus efeitos externos, isto , daquelesque podem repercutir na esfera de terceiros.

    Em sua obra Rizzardo (2005, p. 20) explica que para preservar o interesse

    coletivo, muitas vezes necessria, a supresso da vontade individual, em benefcio da

    comunidade:

    A funo social do contrato exprime a necessria harmonizao dosinteresses privativos dos contraentes com os interesses de toda a coletividade;entre outras palavras, a compatibilizao do princpio da liberdade com aigualdade, vez que para o liberal o fim principal a expanso da

    personalidade individual e, para o igualitrio, o fim principal odesenvolvimento da comunidade em seu conjunto, mesmo que ao custo dediminuir a esfera de liberdade dos singulares.

    Para BARROS (2005, p. 217), haver descumprimento do princpio da funo

    social, quando a prestao de uma das partes for exagerada ou desproporcional; quando

    houver vantagem exagerada de uma das partes; ou, quando se quebrar a base objetiva ou

    subjetiva do contrato. Assim o contrato s cumprir a sua funo social quando for

    simultaneamente til e justo.

    Somente a ordem estatal pode pressupor a eficcia do contrato, portantocompete ao Estado, o dever de agir em cumprimento a este preceito. Theodoro Jnior

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    (2004, p. 35) ao esclarecer que o negcio desconforme pode trazer sanes aos

    pactuantes afirma que:

    O Estado social, porm no se alheia aos problemas que o abuso da iniciativacontratual pode gerar no meio social em que os efeitos da conveno privadairo repercutir. Se algum dano for detectado, a autonomia contratual ter sidoexercitada de forma injurdica. No poder o resultado danoso prevalecer. Ouo contrato ser invalidado ou o contratante nocivo responder pela reparaodo prejuzo causado aos terceiros.De uma foram ou de outra, o contrato desviado de sua funo social noficar livre de uma sano jurdica, pois sua prtica incursiona pelo terrenoda ilicitude.

    Alguns autores, na viso de BARROS (2005, p. 217) defendem que adesconformidade do contrato com sua funo social pode ser corrigida pela reviso

    judicial do contrato. Outros, por sua vez, pregam que no cabvel essa reviso, pois

    violaria o princpio da autonomia da vontade, de modo que o juiz em vez de alterar

    clusula dever anul-la, ou em casos extremos, declarar nulo o prprio contrato.

    Para melhor entendimento da aplicao deste preceito pelos magistrados, as

    tendncias jurisprudenciais sero examinadas em captulo apropriado deste trabalho.

    4 PACTA SUNT SERVANDA X FUNO SOCIAL DO CONTRATO

    4.1 O CONTRATO SOB A GIDE DO PACTA SUNT DE SERVANDA NO ESTADO

    LIBERAL

    Conforme j mencionado, o contrato existente no Estado liberal foi trilhado

    pela liberalidade da autonomia da vontade, traado pelo movimento iluminista precursor

    da Revoluo Francesa. Este perodo foi marcado pelo auge do individualismo, que

    limitava ao mximo a interveno estatal nas relaes privadas, elevando os acordos

    categoria de lei, obrigando as partes a cumprirem o contratado (pacta sunt servanda).

    A doutrinadora Hironaka (2004, p.184) leciona sobre o dogma da vontade no

    Estado liberal satisfazendo o interesse privado:

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    A noo do contrato era de um instrumento de satisfao ao interesseestritamente privado, sem qualquer conotao ou finalidade social. Portanto,aquilo que era ajustado entre os contratantes deveria ser cumprido, tendo emvista o respeito da lei vontade.O dogma da vontade, assim, ocupava espao de destaque no cenrio jurdico,tendo o respaldo da lei, que garantia s convenes privadas total validade,obrigando os seus contratantes de maneira irrestrita (pacta sunt servanda),independentemente da realidade das partes, ou das pessoas contratantes. Oque importa o ajuste, a vontade contratual.

    Nessa mesma viso, Loureiro (2002, p.36) acrescenta ainda a amplitude dessa

    liberdade contratual:

    No sculo XIX criou-se um verdadeiro dogma da verdade [sic] e estaposio de princpio veio a se refletir na disciplina dos negcios jurdicos,dando origem a uma sria [sic] de normas que tutelam a liberdade e aespontaneidade do querer de quem realiza o negcio, e a desobrig-lo dovnculo obrigacional sempre que a sua vontade seja de alguma forma viciada(erro, dolo, coao).

    Percebe-se, que a supremacia da vontade, obrigava as partes a cumprir o

    acordo por eles estabelecido, ainda que seu contedo estivesse moldado de forma

    viciada. A vontade das partes, elevada ao status de lei, validava o acordo que empregavaesse artifcio, pois assim estabeleceram (e aceitaram) os contratantes.

    Por no permitir a interferncia estatal nas relaes privadas, este sistema

    contratual baseado na vontade e liberalidade das partes, consentia o favorecimento de

    uma das partes sobre a outra, insurgindo a desigualdade entre eles. Hironaka (2004, p.

    184/185) ressalta a deficincia deste sistema:

    [...] certo que as relaes jurdicas que se seguiram demonstraram, com otempo, que o individualismo jurdico favoreceu a injustia e a insuficinciada lei para a soluo dos conflitos sociais [...]Embora a lei pronunciasse a igualdade e a previso de justia, atribuindodireitos (embora num plano meramente formal), as desigualdades sociaisfaziam da lei a sua prpria inoperncia. Isto porque a no previso dodomnio social pelos grupos econmicos mais fortes, bem como o tratamentoliberal, principalmente no campo do direito patrimonial, praticamenteavalisavam [sic] a injustia contratual.

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    Sobre o pretexto de liberdade, os grupos econmicos mais fortes se favoreciam

    em detrimento de outros, praticando a injustia contratual. Salienta BIERWAGEN

    (2002, p. 35/36) que a liberdade individual mxima, e a no intervenincia do Estado,

    davam condies para a explorao da propriedade de forma irrestrita, e propiciavam a

    formao de monoplios dos meios produtivos, concentrando o capital nas mos de

    poucos. A liberdade de contratar torna-se ento, um verdadeiro crcere aos menos

    favorecidos, medida que se tornam escassas suas opes de satisfao das suas

    necessidades, seja de trabalho, ou de consumo, seno atravs das grandes indstrias que

    se formavam, estabelecendo unilateralmente as condies dos contratos.

    Por essas razes, o Estado liberal submergiu dando passagem ao Estado social,

    que se formou para atender aos apelos desta nova realidade, buscando o equilbrio

    econmico e a justia contratual.

    4.2 O CONTRATO APS A INSERO DO PRINCPIO DA FUNO SOCIAL

    Atualmente, o contrato visto como um produto da alterao da realidade

    social. A concepo do princpio da funo social do contrato fruto dessa nova

    realidade. Seu papel permitir um maior controle das atividades das partes que

    vinculam em uma relao privada, com o intuito de evitar prejuzo social advindo de tal

    relao.

    Com propriedade, Reale (apud LOUREIRO, 2002, p. 53) acrescenta que o

    Cdigo Civil de 2002, trouxe uma vitria expressiva no mbito social:

    [...] o sentido social uma das caractersticas mais marcantes do Projeto,em contraste com o sentido individualista que condiciona o Cdigo Civilainda em vigor. [...] Se no houve a vitria do socialismo, houve o triunfo dasocialidade, fazendo prevalecer os valores coletivos sobre os individuais,

    sem perda, porm, do valor fundante da pessoa humana. [...] o Projeto sedistingue por maior aderncia realidade contempornea, com a necessidadede reviso dos direitos e deveres dos cinco principais personagens do DireitoPrivado tradicional: o proprietrio, o contratante, o empresrio, o pai defamlia e o testador.

    Percebe-se, que o legislador adotou uma postura condizente com a realidade

    atual, dando maior relevncia aos interesses coletivos em detrimento dos individuais.

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    A positivao do princpio da funo social possibilita ao aplicador do direito

    impedir que a liberdade contratual seja exercida de forma abusiva, garantindo o

    equilbrio entre os pactuantes, impelindo os vcios de consentimento e as prestaes

    excessivamente onerosas para uma das partes.

    Alm do equilbrio contratual, a funo social traduz a idia de que o negcio

    pactuado deve atender a interesses sociais, ou seja, ser socialmente benfico e justo, sem

    acarretar prejuzos coletividade.

    Lembra Loureiro (2002, p.53) que a incluso do conceito de funo social do

    contrato significa que o legislador pretende, sem prejudicar a autonomia da vontade,

    garantir o equilbrio contratual e preservar o interesse da sociedade quando em contraste

    com interesse individual, tal como j ocorre com a previso da funo social da

    propriedade.

    Entendem Gagliano e Pamplona Filho (2006, p. 48) que com a ascenso da

    interveno estatal [...] No se est pretendendo aniquilar os princpios da autonomia

    da vontade (ou autonomia privada) ou dopacta sunt servanda, mas, apenas temper-los,

    tornando-os mais vocacionados ao bem-estar comum, sem prejuzo do progresso

    patrimonial pretendido pelos contratantes.

    Partindo deste preceito, denota-se que a chegada do princpio da funo social,

    no acarretou o fim dos princpios da autonomia da vontade e da fora obrigatria, mas

    serviu de instrumento regulador, para limitar suas conseqncias.

    Reforando esse pensamento Loureiro (2002, p. 53) lembra que a pacta sunt

    servanda encontra-se ainda presente no ordenamento, perfazendo o negcio jurdico:

    No se pode dizer que o velho brocado de que o contrato faz lei entre as

    partes no seja mais aplicvel no mbito do novo direito civil, mas sim quetal lei pode ser revogada ou ter sua fora atenuada em virtude de fatoresobjetivos imanentes s relaes sociais, de tal modo que lhe ficamsubordinados os arbtrios individuais.

  • 7/28/2019 O PACTA SUNT SERVANDA X A FUNO SOCIAL DO CONTRATO

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    Seguindo essa linha, Theodoro Jnior (2004, p. IX/X) refora a existncia dos

    princpios clssicos, atuando de forma imprescindvel para a formao do contrato:

    Mesmo vestido com as modernas indumentrias principiolgicas, o contrato

    no pode deixar de ser o fruto da fora criativa e livre da vontade, nemtampouco pode ser privado de sua natural e necessria fora obrigatria entreos contratantes, e muito menos pode transformar-se em fonte de obrigaes

    para quem da conveno no participou. claro que a rea dos preceitos e princpios de ordem pblica muito sealargou e que os princpios clssicos do contrato tiveram suas dimensesreduzidas. No foram, porm, anulados.Assim que, no obstante ter de submeter-se aos imperativos da boa-f, dafuno social e do equilbrio econmico, o contrato continua a existir paravincular as pessoas e fundamentalmente ser cumprido. E a vontade que

    sempre haver de prevalecer, dentro da licitude dos contornos da novaprincipiologia do contrato, ser declarada pelos contratantes e no a do juizou de qualquer outra autoridade que se credencie a fiscalizar a vida negocial.

    Como visto, a vontade das partes revestida da fora obrigatria o imperativo

    da relao contratual. A funo social do contrato no extinguiu esses preceitos

    clssicos, apenas atenuou seus reflexos, limitando-os aos interesses da coletividade.

    4.3 O DESCUMPRIMENTO DA FUNO SOCIAL E SEUS EFEITOS

    Para o entendimento desta matria, necessrio aclarar a amplitude do

    princpio da funo social dos contratos.

    Os doutrinadores revelam de forma diferenciada a abrangncia deste princpio

    inovador. Boulos (apud SANTIAGO, 2005, p. 83) demonstra sua viso sobre esse

    aspecto:

    A tutela da funo social do contrato como princpio informador de todo odireito contratual no se revela apenas no art. 421, do novo Cdigo Civil, mastambm em outras tantas normas do Cdigo que podem ser consideradasdesdobramentos ou aplicaes do referido princpio, como, por exemplo, asnormas que atribuem carter de nulidade relativa aos atos praticados emestado de perigo (art. 156), que disciplinam a leso (art. 157), que vedam aonerosidade excessiva (arts. 478-480) etc.

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    No entendimento de Alvim (apud SANTIAGO, 2005, p. 82) o grande espao

    da funo social j se observa no prprio cdigo civil de 2002, atravs de outros

    institutos que amenizam a dureza da viso liberal do contrato.

    Acrescenta Santos (apud SANTIAGO, 2005, p. 82), que a funo social do

    contrato se caracteriza por inmeras regras do Cdigo Civil, reprimindo com veemncia

    os atos no socialmente desejados, no intuito de regularizar a conduta das partes

    finalidade social dos contratos.

    Percebe-se que os doutrinadores citados, ampliam o efeito social a outras

    normas do ordenamento jurdico, em apoio funo social do contrato, como

    desdobramento deste princpio. Outros doutrinadores, relacionam o princpio da boa-f

    objetiva como parte deste preceito. Para Nery Junior (apud SANTIAGO, 2005, p. 82)

    A boa-f objetiva, clusula geral prevista no CC 422, decorre da funo social do

    contrato, de modo que tudo o que se disser sobre a boa-f objetiva poder ser

    considerado como integrante, tambm, da clusula geral da funo social do contrato.

    No mesmo sentido, o parecer da civilista Hironaka (2004, p. 194), que

    arremata a questo trazendo pauta:

    Trata-se, portanto de um elemento interno do contrato, uma finalidade nosomente pertencente coletividade, mas tambm aos contratantes, j que no

    podero conceb-lo apenas como modo de satisfao de seus prpriosinteresses, mas, sim, luz de um padro constitucional, um instrumento

    prtico de respeito dignidade humana. Por isso, entendemos que a clusulageral da boa-f uma decorrncia da funo social do contrato, na medidaem que impe deveres comportamentais aos contratantes para que sejamalcanados os mesmos objetivos. Se a funo social do contrato revela o

    ponto de referncia da liberdade contratual, a boa-f objetiva especifica, em

    certos aspectos, um modo de exerccio do contrato, ou seja, serve deparmetro de comportamento para os contratantes em todo o processoobrigacional, garantindo, assim, um modelo tico propiciador da consecuodos interesses sociais da relao privada.

    Consideradas tais ponderaes, toma-se ainda por lio, o ensinamento de

    BARROS (2005, p. 217), ao descrever que o contrato s cumpre seu papel quando for

    simultaneamente til e justo. A utilidade e a justia devem ser analisadas em face dos

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    interesses metaindividuais5[5], do interesse individual relativo dignidade humana e de

    outros preceitos constitucionais. Assim, haver descumprimento do princpio da funo

    social, quando a prestao de uma das partes for exagerada ou desproporcional; quando

    houver vantagem exagerada de uma das partes; ou, quando se quebrar a base objetiva ou

    subjetiva do contrato.

    Prestadas as devidas observaes, pode-se dizer que esto em sintonia com a

    funo social, os contratos pautados em conformidade com os princpios: da boa-f, da

    eticidade, do equilbrio econmico, da socialidade e da dignidade da pessoa humana.

    Portanto, ocorre o descumprimento da funo social do contrato, quando afastado algum

    dos princpios que o englobam, sejam em face dos interesses individuais ou

    metaindividuais.

    Extraem-se da obra de Theodoro Jnior (2004, p. 57/58), alguns exemplos de

    contratos em desacordo com o princpio da funo social do contrato onde as pessoas ou

    as entidades no figuram no negcio jurdico, mas que foram ou podero ser

    prejudicados por seus efeitos externos:

    a) induzir a massa de consumidores a contratar a prestao ou aquisio decerto servio ou produto sob influncia de propaganda enganosa;

    b) alugar imvel em zona residencial para fins comerciais incompatveis como zoneamento da cidade;c) alugar quartos de apartamento de prdio residencial, transformando-o em

    penso;d) ajustar contrato simulado para prejudicar terceiros;e) qualquer negcio de disposio de bens em fraude de credores;f) qualquer contrato que, no mercado, importe o exerccio de concorrnciadesleal;g) desviar-se a empresa licitamente estabelecida em determinadoempreendimento para a contratao de operaes legalmente no permitidas,como, v.g., uma fatorizadora que passa a contratar depsitos como se fosseinstituio bancria; ou a instituio financeira que, em lugar das garantiasreais permitidas por lei, passa a adotar o pacto de retrovenda ou ocompromisso de compra e venda, burlando assim a vedao legal do pactocomissrio;h) a agncia de viagens que sob a aparncia de prestao de servio de seuramo, contrata na realidade o chamado turismo sexual, ou a mediao no

    contrabando ou em atividades de penetrao ilegal em outros pases;i) enfim, qualquer tipo de contrato que importe desvio tico ou econmico definalidade, com prejuzo para terceiros.

    5[5]Os interesses metaindividuais ou transindividuais referem-se a um grupo de pessoas (comoos condminos de um edifcio, os scios de uma empresa, os membros de uma equipeesportiva, os empregados do mesmo patro).

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    Em todos esses exemplos, e, nos demais casos de descumprimento da funo

    social, a pessoa prejudicada, sendo parte ou no do negcio, pode pedir a interveno do

    Estado para declarar a nulidade ou ineficcia do ato, conforme o caso. Tratando-se de

    terceiros prejudicados, a tutela estende-se ainda para determinar o ressarcimento dos

    atos ilcitos, quando os negcios no puderem ser mais desfeitos.

    4.4 ANLISE DA TERMINOLOGIA DO ART. 421 DO CDIGO CIVIL

    BRASILEIRO

    A terminologia do art. 421 do Cdigo Civil de 2002, alvo de crticas e

    objees de muitos civilistas. Seu texto expressa que:

    Art. 421: A liberdade de contratar ser exercida em razo e nos limites dafuno social do contrato.

    Em sua crtica, Hironaka (apud SANTIAGO, 2005, p. 90) enumera dois

    enormes problemas no referido dispositivo legal, que ensejam modificao urgente, para

    alcanar a perfeita redao a qual permita a total consagrao do princpio da funo

    social. Esses problemas so: a meno liberdade de contratar e a afirmao de que oprincpio da funo social a razo do exerccio dessa liberdade.

    A definio de Santiago (2005, p. 90/91) sobre o termo liberdade de

    contratar matria que se aplica:

    A liberdade de contratar, repita-se, implica a liberdade de decidir celebrar ouno, o contrato, bem como a liberdade de escolher o outro contratante; j a

    liberdade contratual a liberdade de determinar o contedo do contrato, suasclusulas, sendo permitida legalmente, inclusive, a criao de contratosatpicos.O princpio da funo social atinge a liberdade contratual. O indivduo nofica limitado no seu direito de celebrar ou no, um contrato com a pessoa deseu interesse e de sua escolha. Mas, uma vez decidido a celebrar essecontrato, deve faz-lo de forma a no prejudicar a sociedade, respeitando umlimite, a funo social do negcio, que pode ser ferida atravs do seucontedo.

    No mesmo sentido, acrescenta Hironaka (2004, p. 195):

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    Realmente confundiu o legislador a liberdade de contratar com a liberdade

    contratual, qual quis, provavelmente se referir. A primeira corresponde

    livre faculdade de celebrar contratos, uma emanao do direito liberdade. Aliberdade contratual, diferentemente, respeita ao direito de escolher e discutiro contedo, as clusulas do contrato.A pertinncia da questo para qual chamamos a ateno flagrante, pois a

    liberdade de contratar no requer ateno do legislador infraconstitucional,enquanto que a efetiva liberdade contratual depende da interveno estatal(dirigismo contratual) e no meramente de uma presuno legislativa, demaneira formal. Assim, o texto deveria referir-se expressamente liberdadecontratual.

    Ante o mencionado, o termo liberdade de contratar encontra-se disposto

    erroneamente no diploma legal, gerando impreciso norma.

    Em segundo plano, porm no menos importante est o emprego do termo em

    razo no texto, para o dissabor de alguns doutrinadores.

    Contrria a essa terminologia a doutrinadora Santiago (2005, p. 91) esclarece

    que:

    [...] A liberdade contratual no exercida em razo da funo social docontrato, o seu fundamento no a funo social. A liberdade contratual exercida ainda em razo do direito liberdade, garantido

    constitucionalmente, que se manifesta, no caso, pela autonomia privada. Afuno social apenas limita essa liberdade, no a substitui [...]A razo de ser do contrato ainda a autonomia privada, podendo dizer-se queo prprio art. 421, do Cdigo Civil, o dispositivo legal estabelecendoexpressamente entre ns esse princpio, limitando-o, todavia, pela funosocial do contrato. No se pode dizer, simplesmente, que o objetivo desseartigo estabelecer a funo social do contrato.

    Para BIERWAGEN (2002, p. 48) a expresso em razo foi inserida no art.

    421, do Cdigo Civil, mais para reforar a idia de limitao da liberdade contratual doque para condicionar a existncia desta verificao de uma funo social.

    Feitas tais ponderaes, retira-se por lio, que a inteno do legislador era

    limitar o contedo do negcio jurdico, e no um direito constitucionalmente garantido.

    Conforme lembra GODOY (2004, p. 120/121) o deputado Ricardo Fiza,

    relator do projeto de alterao do novo Cdigo Civil (Projeto n. 6.960, de 12-06-2002),

    inseriu na proposta legislativa a sugesto de nova redao para o art. 421 para que este

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    disponha: a liberdade contratual ser exercida nos limites da funo social do

    contrato. Se aprovada esta modificao, sero extintas as imprecises deste princpio.

    5 A APLICAO DO ART. 421 CC NOS TRIBUNAIS

    Analisando o teor desta pesquisa, observa-se que no existe parmetro

    concreto que possa definir o que venha ser a funo social do contrato. Lembra Loureiro

    (2002, p. 47) que o Cdigo Civil no define o que se entende por funo social do

    contrato, embora fixe normas que deixam transparecer a importncia do elemento moral

    e da equidade nas relaes entre os contratantes [...].

    Assim como o art. 421 Cdigo Civil no expressa a definio de funo social,

    da mesma forma no trilha sua aplicao. Constata-se, portanto, o emprego da clusula

    geral na redao desta norma. No que tange o uso desta tcnica Venosa (2003, p.

    378/379) leciona:

    Diz-se que o novo Cdigo constitui um sistema aberto, predominando oexame do caso concreto na rea contratual. Trilhando tcnica moderna, esseestatuto erige clusulas gerais para os contratos. Nesse campo, reala-se o art.421 referido [...]. Essa disposio constitui modalidade que a doutrinaconvencionou denominar clusula geral. Essa rotulao no nos d perfeitaidia do contedo. A clusula geral no , na verdade, geral. O que

    primordialmente a caracteriza o emprego de expresses ou termos vagos,cujo contedo dirigido ao juiz, para que este tenha um sentido norteador notrabalho da hermenutica. Trata-se, portanto, de uma norma mais

    propriamente dita genrica, a apontar uma exegese.

    Partindo dessa premissa, Reale (2003) ensina que a utilizao da clusula

    aberta (geral) possibilita ao legislador assumir uma postura mais equilibrada, na

    positivao da norma, propiciando ao julgador uma anlise reflexiva e individual

    conforme o caso exposto:

    Na elaborao do ordenamento jurdico das relaes privadas, o legislador seencontra perante trs situaes possveis: ou d maior relevncia aos

    interesses individuais, como ocorria no Cdigo Civil de 1916, ou dpreferncia aos valores coletivos, promovendo a socializao dos

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    contratos; ou, ento, assume uma posio intermdia, combinando o

    individual com o social de maneira complementar, segundo regras ouclusulas abertas propcias a solues equitativas e concretas. No h dvidaque foi essa terceira opo a preferida pelo legislador do Cdigo Civil de2002. (www.miguelreale.com.br)

    Acrescenta Santiago (2005, p. 121) que essa avanada tcnica legislativa

    garante maior aplicabilidade da funo social:

    Nesse contexto de clusulas gerais, a lei passa a ser vista no como umlimite, mas, como um ponto de partida para a criao e desenvolvimento dodireito. As clusulas gerais, dotadas de grande abertura semntica, no

    pretendem uma resposta prvia a todos os problemas da realidade, mas, queessas respostas sejam progressivamente construdas pela jurisprudncia.Uma vez instituda a funo social como clusula geral, o aplicador do direitoganha importante ferramenta para fazer com que esta tenha aplicabilidade

    prtica, ou seja, operatividade.

    Destarte, das consideraes j efetuadas, constata-se que o legislador, ao

    conceber o princpio da funo social, reservou ao hermeneuta a aplicao da norma.

    Consoante essa questo, Theodoro Jnior (2004, p.125/126) edita o papel do magistrado

    frente s clusulas gerais:

    A adoo de um sistema normativo inspirado em conceitos abertos eclusulas gerais tm, certo, suas virtudes, mas apresenta, tambm, riscos e

    perigos que no so poucos nem pequenos. Uma norma legal em brancoevidentemente permite ao juiz preencher o claro legislativo de modo aaproximar-se mais da justia do caso concreto.

    Tecidas essas observaes, cabe ressaltar que embora no existam parmetros

    para sua aplicao, esse preceito fundamental para a consagrao do Estado social.

    Nessa vereda, Santiago (2005, p. 84) edita que:

    Apesar de todas as dificuldades a propsito de se precisar um conceito do quevenha a ser a funo social do contrato, no se deve duvidar da importnciada aplicao desse princpio nos casos concretos para se ter uma relaocontratual de fato justa, sendo que as dificuldades conceituais nodesmerecem o instituto, sendo inquestionvel a adoo desse princpio faces exigncias do Estado social.

    Frente o exposto, urge enaltecer a grandeza deste princpio trazido pelo Cdigo

    Civil de 2002, que constitudo sob o conceito de clusula geral, possibilita ao

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    magistrado empregar a hermenutica no julgamento de um caso especfico, em

    benefcio da coletividade e do equilbrio contratual.

    5.2 DECISES JURISPRUDNCIAS E SMULAS APLICANDO A FUNO

    SOCIAL

    O Tribunal de Justia de Santa Catarina em recente julgado, emprega o

    princpio da funo social do contrato na reviso das clusulas contratuais, relativizando

    os princpios da autonomia privada e dopacta sunt servanda. Nesse diapaso:

    A reviso das clusulas contratuais no constitui ofensa ao ato jurdico

    perfeito, e, tambm, no fere o princpio da autonomia privada em razodeste j se encontrar mitigado pela consagrao da boa-f objetiva e dafuno social dos contratos, nem mesmo o princpio do pacta sunt servanda,eis que seu reconhecimento relativo. (www.tj.sc.gov.br)

    Em sentido oposto, julgou o Tribunal do Rio Grande do Sul, ao declarar a

    inexistncia de ofensa a funo social em contrato paritrio. Ensina o magistrado que

    comprovado o equilbrio contratual, no cabe a interveno do Estado na relao

    privada:

    LOCAO. AO DE REVISO DE CONTRATO E ARBITRAMENTODE MULTA. INEXISTNCIA DE OFENSA FUNO SOCIAL DOCONTRATO. 1. No cabe a reviso de contrato de locao celebrado entrecontratantes paritrios, sobretudo quando comprovadamente discutiramamplamente a clusula cuja reviso pretende o locador. Inexistncia dehipossuficincia de uma das partes que justifique a interveno do Estado. 2.Caso em que, alm da comprovao da existncia de tratativas paritrias, norestou demonstrada a existncia de desequilbrio contratual. APELODESPROVIDO. (www.tjrs.jus.br)

    A definio de Theodoro Jnior (2004, p. 35), lembra que a funo social do

    contrato consiste em abordar a liberdade contratual em seus reflexos sobre a sociedade

    (terceiros) e no apenas no campo das relaes entre as partes que o estipulam

    (contratantes). Neste sentido, o desembargador Ricardo Torres Hermann, inspirado no

    princpio da funo social do contrato sentenciou em recente julgado do Rio Grande do

    Sul, que o contratado tem responsabilidade em face de terceiro prejudicado:

    Manifesta a legitimidade passiva da Seguradora, tendo em conta a funosocial do contrato, prevista no art. 421, do Cdigo Civil, que tem sua

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    inspirao no princpio constitucional da solidariedade, contemplado no art.3, I, da Constituio Federal, no podendo assim a Seguradora demandadaafirmar no apresentar qualquer responsabilidade em face da terceira

    prejudicada por seu segurado. (www.tjrs.jus.br)

    So vrias as smulas consubstanciadas pelo princpio da funo social docontrato, permitindo a relativizao do pacta sunt servanda. No caso em tela, ser

    analisada a Smula n 302 do Superior Tribunal de Justia:

    N 302: abusiva a clusula contratual de plano de sade que limita notempo a internao hospitalar do segurado. (www.stj.gov.br)

    Conforme explica TARTUCE (2009) a renncia prvia a um direito resultante

    da natureza do negcio gera nulidade absoluta a essa clusula. O contrato que a impe

    unilateralmente, sob a forma de adeso, limita o principal objetivo do contrato celebrado

    entre as partes, causando um desequilbrio contratual. Fazendo uma anlise

    principiolgica desta smula, observa-se que ela aplica de forma direta o princpio da

    funo social dos contratos, relativizando a fora obrigatria. Esta smula atende ainda

    trs princpios mximos do Direito Civil Constitucional: a proteo da dignidade

    humana; a solidariedade social e a igualdade em sentido amplo.

    (www.flaviotartuce.adv.br)

    Consoante, a anlise dos julgados aqui expostos denota-se que o operador do

    direito tem empregado o princpio da funo social do contrato viabilizando a

    relativizao do pacta sunt servanda sempre que comprovado o desequilbrio entre as

    partes, ou, a ilicitude do ato.

    6 CONSIDERAES FINAIS

    Ante o exposto, percebe-se que o contrato sofreu vrias transformaes ao

    longo dos anos adaptando-se aos valores econmicos e sociais do meio em que esteve

    inserido. Nesse contexto, ele vigorou no sculo XIX sobre a gide do Estado liberal,

    aplicando a mxima da autonomia de vontade e da pacta sunt servanda, elevando a

    vontade das partes categoria de lei.

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    Sob a vigncia do absolutismo, a interveno estatal nas relaes privadas era

    mnima, no existindo, portanto, mecanismos que regulassem o equilbrio contratual.

    Esse liberalismo sem limites com a potente consagrao da pacta sunt servanda,

    desencadeou o desequilbrio econmico e social, na medida em que, beneficiava as

    classes mais favorecidas em detrimento dos menos abastados.

    Atendendo aos anseios da sociedade, nasce o Estado social, contrrio ao

    liberalismo extremo, usando a interveno estatal para regular a igualdade entre as

    partes. O primeiro ordenamento brasileiro a inserir em seu contexto, o termo funo

    social foi a Constituio de 1988 com a previso da funo social da propriedade.

    Seguindo seus moldes o Cdigo Civil de 2002, acrescentou no livro das obrigaes, os

    princpios da funo social do contrato e da boa-f objetiva.

    Observou-se, neste estudo, que a insero do princpio da funo social do

    contrato foi a mais importante inovao, no mbito contratual, trazida pelo Cdigo Civil

    de 2002. E, que este princpio foi construdo nos moldes da nova realidade social, para

    resguardar os interesses coletivos, em detrimento da vontade individual.

    Conforme relatado, denota-se que, embora a fora obrigatria se encontre

    atenuada, ela ainda faz parte do sistema contratual, constituindo preceito fundamental

    para a formao do negcio jurdico. Este princpio imprescindvel, pois obriga as

    partes a cumprir o acordo firmado, acrescentando assim maior credibilidade e segurana

    aos negcios.

    Ressalta-se, que por tratar-se de clusula geral, a aplicabilidade do princpio da

    funo social, matria complexa. Assim, como o contrato no pode seguir o modeloindividualista do sculo XIX, da mesma forma, no pode extinguir a autonomia privada

    das partes e sua obrigatoriedade.

    Retira-se como lio, que o papel do juiz de suma importncia para a

    aplicao da norma. Cabe a ele interpretar o caso concreto, utilizando os princpios da

    proporcionalidade e razoabilidade de modo a alcanar o equilbrio entre as partes e

    assim fazer justia.

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    7 REFERNCIAS

    BARROS, Flvio Augusto Monteiro de. Manual de direito civil, v.2: direito das

    obrigaes e contratos. So Paulo: Mtodo, 2005.

    BIERWAGEN, Mnica Yoshizato. Princpios e regras de interpretao dos

    contratos no novo Cdigo Civil. So Paulo: Saraiva, 2002.

    BRASIL. Cdigo Civil e Constituio Federal/obra coletiva de autoria da Editora

    Saraiva com a elaborao de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Mrcia Cristina Vaz

    dos Santos Windt e Livia Cspedes. 59. ed. So Paulo: Saraiva, 2007.

    BRASIL. Superior Tribunal de Justia. Smula n 302. abusiva a clusula contratual

    de plano de sade que limita no tempo a internao hospitalar do segurado. Disponvel

    em: http://www.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp. Acesso em: 17 mar. 2009.

    BRASIL. Tribunal de Justia do Rio Grande do Sul. LOCAO. AO DE

    REVISO DE CONTRATO E ARBITRAMENTO DE MULTA. INEXISTNCIA DE

    OFENSA FUNO SOCIAL DO CONTRATO. 1. No cabe a reviso de contrato

    de locao celebrado entre contratantes paritrios, sobretudo quando comprovadamente

    discutiram amplamente a clusula cuja reviso pretende o locador. Inexistncia de

    hipossuficincia de uma das partes que justifique a interveno do Estado. 2. Caso em

    que, alm da comprovao da existncia de tratativas paritrias, no restou demonstrada

    a existncia de desequilbrio contratual. APELO DESPROVIDO. Apelao Cvel n

    70029005436. Relator: Paulo Srgio Scarparo. Data de publicao: 15 de abril de 2009.Disponvel em: . Acesso em: 10

    mai. 2009.

    BRASIL. Tribunal de Justia do Rio Grande do Sul. RESPONSABILIDADE CIVIL.

    ACIDENTE DE TRNSITO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA SEGURADORA EM

    FACE DO TERCEIRO ATINGIDO PELO SEGURADO. INEXISTNCIA DE

    INFORMAES INEXATAS POR PARTE DO SEGURADO. 1. Manifesta alegitimidade passiva da Seguradora, tendo em conta a funo social do contrato,

    http://www.tjrs.jus.br/site_php/jprud2/ementa.phphttp://www.tjrs.jus.br/site_php/jprud2/ementa.php
  • 7/28/2019 O PACTA SUNT SERVANDA X A FUNO SOCIAL DO CONTRATO

    36/38

    prevista no art. 421, do Cdigo Civil, que tem sua inspirao no princpio constitucional

    da solidariedade, contemplado no art. 3, I, da Constituio Federal, no podendo assim

    a Seguradora demandada afirmar no apresentar qualquer responsabilidade em face da

    terceira prejudicada por seu segurado. Orientao da Segunda Seo do STJ. 2.

    Impossvel cogitar da extino da cobertura, em razo de declaraes inverdicas

    prestadas pelo segurado, se a divergncia do Cdigo Postal do segurado revela mero

    equvoco de digitao. 3. Tratando-se de indenizao dos danos materiais decorrentes

    do acidente de trnsito, a correo monetria incidente sobre o valor h de fluir desde a

    data do desembolso, tendo em vista o disposto na Smula 43, do STJ, enquanto que os

    juros moratrios, por fora do disposto na Smula 54 do STJ, so aplicveis desde a

    data dos fatos. Sentena mantida por seus prprios fundamentos. Recurso improvido.

    Recurso Cvel N 71001744168. Relator: Ricardo Torres Hermann. Data de publicao:

    06 de abril de 2009. Disponvel em:

    . Acesso em: 10 mai. 2009.

    BRASIL. Tribunal de Justia do Estado de Santa Catarina. APELAES CVEIS.

    AO DECLARATRIA DE REVISO DE CONTRATOS BANCRIOS.

    ADMISSIBILIDADE DE ANLISE DAS CLASULAS DO NEGCIO.INCIDNCIA DO CDC AO CASO. PRINCPIO PACTA SUNT SERVANDA

    RELATIVIZADO. Apelante e apelado: Eletro Comercial Luzemar Ltda, e Apelante e

    apelado: Banco Sudameris Brasil S/A. Apelao Cvel n. 2009.003618-1, de So Jos

    Relator: Des. Ricardo Fontes. Data de publicao: 14 de abril de 2009. Disponvel em:

    . Acesso em: 10 mai.

    2009.

    CARLI, Vilma Maria Inocncio. Teoria e direito das obrigaes contratuais: uma

    nova viso das relaes econmicas de acordo com os cdigos civil e consumidor.

    Campinas: Bookseller, 2005.

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