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PARECER TÉCNICO
SOLICITANTE: Sindicato dos Servidores da Polícia Civil do Estado
de Minas Gerais - SINDPOL/MG, entidade sindical de primeiro grau,
inscrita no CNPJ sob o nº. 25.577.370/0001-17, estabelecida em Belo
Horizonte, Minas Gerais, com sede na Rua Diamantina, nº. 214, Bairro
Lagoinha.
OBJETO: Lei Complementar Federal nº. 173, de 27 de maio de 2020, que
"Estabelece o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus
SARS-CoV-2 (Covid-19), altera a Lei Complementar nº. 101, de 4 de maio
de 2000, e dá outras providências", sobretudo quanto à previsão de
congelamento de salários e carreira até 31 de dezembro de 2021.
Excelentíssimo Senhor Presidente do Sindicato dos Servidores da
Polícia Civil do Estado de Minas Gerais - SINDPOL/MG, Doutor José
Maria de Paula.
O Sindicato dos Servidores da Policia Civil do Estado de Minas
Gerais (SINDPOL/MG) solicitou o posicionamento do escritório “Cezar Britto
Advogados Associados” e “Reis Figueiredo Advogados Associados”, através
de seu Vice-Presidente, Dr. Marcelo Armstrong, acerca de possível
inconstitucionalidade da Lei Complementar Federal nº. 173/20, que
estipulou o congelamento de salários e carreira, por 18 (dezoito) meses,
dos servidores da segurança pública, dentre eles, os Investigadores de
Polícia da Polícia Civil do Estado de Minas Gerais.
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Realizar-se-á, portanto, por meio do presente breve parecer,
um cotejo analítico da questão jurídica apresentada, a fim de determinar-se
sobre a constitucionalidade da referida Lei Complementar, sob o enfoque do
veto havido em seu artigo 8º, parágrafo 6, que, em tese, implicaria em
substanciais prejuízos aos policiais civis.
Assim, em uma só cadeia de fundamentação, restará
colacionadas a probabilidade do direito, o atual entendimento
jurisprudencial dos Tribunais Superiores, abordando eventuais prejuízos a
serem assumidos pela categoria representada pelo Consulente.
Apresenta-se, então, Parecer a esta Diretoria, em atenção à
solicitação realizada, acerca da possível inconstitucionalidade de macularia
a Lei Complementar Federal nº. 173/20.
I - HISTÓRICO E CONJUNTURA ATUAL.
Ab initio, cumpre esclarecer que há preocupação geral com o
denominado novo coronavírus (SARS-CoV-2), causador da doença COVID-
19, que, em virtude da intensa disseminação, em 11/03/2020, fez com que
a Organização Mundial da Saúde - OMS declarasse pandemia1 - um alerta
para que todos os países, sem exceção, adotem ações para conter a
disseminação do vírus e cuidar dos pacientes adequadamente.
Quando do referido anúncio pelo Diretor-geral da OMS,
Tedros Adhanom Ghebreyesus, já se estimava mais de 118 mil casos em
114 países, com a perda da vida de cerca de 4,2 mil pessoas. Outras
milhares já estariam lutando por suas vidas em leitos dos mais variados
hospitais.
Em 29/05/2020, conforme dados extraídos do sítio eletrônico
da Organização Pan-Americana da Saúde, em âmbito mundial registrou-se
5.701.337 casos confirmados da COVID-19 (107.740 novos em relação ao
dia anterior) e 357.688 mortes (4.354 novas em relação ao dia anterior).
1 OMS afirma que COVID-19 é agora caracterizada como pandemia. Organização Pan-Americana da Saúde Brasil,
2020. Disponível em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6120:oms-
afirma-que-covid-19-e-agora-caracterizada-como-pandemia&Itemid=812. Acesso em 01 de junho de 2020.
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Já, no Brasil, diante do levantamento realizado na mesma data, havia
498.440 casos confirmados e 28,834 mortes.2
Sabe-se que o momento é excepcional e que, como tal, se
exige medidas extraordinárias, a fim de se garantir a preservação da vida,
saúde e segurança, e, ainda, que se evite que todo o sistema de saúde
entre em colapso.
Uníssona é a orientação das autoridades públicas afeitas à
matéria, bem como da própria OMS, no cenário internacional, de
isolamento social (inclusive, com tomada de medidas enérgicas por alguns
países), para que se viabilize o chamado "achatamento da curva"3.
Há que se frisar que recentemente (17/03/2020), os
Ministros de Estado da Justiça e Segurança e da Saúde, através da Portaria
Interministerial nº. 54, determinaram que todos aqueles que contrariarem
normas da vigilância epidemiológica cometem crimes, sendo que, nesta
mesma portaria, restou autorizada a autoexecutoriedade do poder de
polícia - podendo as autoridades públicas constituídas, inclusive, mediante
força, interceder na liberdade dos cidadãos.
E, dentre várias outras normativas que tratam da matéria,
em 20/03/2020 houve a decretação de calamidade pública no Brasil,
através do Decreto Legislativo 06/20205 e definição dos serviços públicos e
atividades essenciais, através do Decreto do Governo Federal de nº.
10.282/2020 6 , prevendo em seu art. 3º, inciso III, a "atividades de
segurança pública e privada, incluídas a vigilância, a guarda e a custódia de
2 Notificação da doença causada pelo novo coronavírus (COVID-19). Organização Pan-Americana da Saúde Brasil,
2020. Disponível em:
https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=6101:covid19&Itemid=875. Acesso
em 01 de junho de 2020. 3 O termo tem a ver com reduzir ao máximo o ritmo de transmissão do vírus, fazendo com que o número de casos
ativos que necessitem de hospitalizações não supere o número de leitos hospitalares disponíveis, garantindo que
todos que precisem tenham o atendimento adequado, minimizando o número de mortes. 4 Dispõe sobre a compulsoriedade das medidas de enfrentamento de emergência de saúde pública previstas na Lei
nº. 13.979, de 01 de junho de 2020. 5
Decreto Legislativo nº. 06/2020. Planalto, 2020. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/portaria/DLG6-2020.htm. Acesso em 01 de junho de 2020. 6
Decreto nº. 10.282/2020. Planalto, 2020. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-
2022/2020/decreto/D10282.htm. Acesso em 01 de junho de 2020.
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presos" como "indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis
da comunidade".
O momento se presta à união entre sociedade civil, agentes
políticos, sociedades científicas, profissionais da saúde e do próprio Poder
Judiciário, para que soluções viáveis e concretas sejam buscadas.
Trata-se, pois, de uma espécie de chamamento de todos os
cidadãos brasileiros, extensivo a todos os países (quando do envolvimento
da OMS), para que ativem e intensifiquem mecanismos emergenciais de
resposta, para que a sociedade global não entre em colapso.
Dentre as medidas tomadas, editou-se a Lei Complementar
Federal nº. 173/20, que "Estabelece o Programa Federativo de
Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19), altera a Lei
Complementar nº. 101, de 4 de maio de 2000, e dá outras providências".
II - ANÁLISE DA LEI COMPLEMENTAR FEDERAL Nº. 173/20.
Aplicável a todo o funcionalismo público, extrai-se do artigo
8º da referida Lei Complementar, que, da data de sua publicação até o dia
31 de dezembro de 2021, estaria proibida a concessão, a qualquer título,
de "vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração"7, bem
como a contagem de "tempo como de período aquisitivo necessário
exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios,
licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a
despesa com pessoal".
Para melhor compreensão, transcrever-se-á no corpo da
presente a íntegra do caput do artigo 8º, incisos I e IX, da LC nº. 173/20,
que ganharão maior destaque no presente estudo, verbis:
Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei
Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados
pela calamidade pública decorrente da pandemia da
7 Excepcionando expressamente quando eventualmente decorrente de "sentença judicial
transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública".
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Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021,
de:
I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,
reajuste ou adequação de remuneração a membros de
Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e
militares, exceto quando derivado de sentença judicial
transitada em julgado ou de determinação legal anterior
à calamidade pública;
(...)
IX - contar esse tempo como de período aquisitivo
necessário exclusivamente para a concessão de anuênios,
triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais
mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com
pessoal em decorrência da aquisição de determinado
tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo
de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros
fins.
Diante de detida análise da norma, é crível afirmar que seu
conteúdo, sobretudo o disposto nos incisos em evidência, aplicável a
categoria dos servidores públicos, desafia a Constituição da República
Federativa do Brasil.
É de se consignar que o artigo 8°, da Lei Complementar nº.
173/2020 trata-se de réplica do artigo 109 da Constituição Federal, contudo,
com nítida alteração de seu caput, conforme se verifica:
Art. 109. No caso de descumprimento de limite
individualizado, aplicam-se, até o final do exercício de
retorno das despesas aos respectivos limites, ao Poder
Executivo ou a órgão elencado nos incisos II a V do
caput do art. 107 deste Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias que o descumpriu, sem
prejuízo de outras medidas, as seguintes vedações:
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)
I - concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento,
reajuste ou adequação de remuneração de membros de
Poder ou de órgão, de servidores e empregados públicos
e militares, exceto dos derivados de sentença judicial
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transitada em julgado ou de determinação legal
decorrente de atos anteriores à entrada em vigor desta
Emenda Constitucional; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 95, de 2016)
II - criação de cargo, emprego ou função que implique
aumento de despesa; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 95, de 2016)
III - alteração de estrutura de carreira que implique
aumento de despesa; (Incluído pela Emenda
Constitucional nº 95, de 2016)
IV - admissão ou contratação de pessoal, a qualquer
título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de
direção que não acarretem aumento de despesa e
aquelas decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou
vitalícios; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de
2016)
V - realização de concurso público, exceto para as
reposições de vacâncias previstas no inciso IV; (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)
VI - criação ou majoração de auxílios, vantagens, bônus,
abonos, verbas de representação ou benefícios de
qualquer natureza em favor de membros de Poder, do
Ministério Público ou da Defensoria Pública e de
servidores e empregados públicos e militares; (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)
VII - criação de despesa obrigatória; e (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 95, de 2016)
VIII - adoção de medida que implique reajuste de
despesa obrigatória acima da variação da inflação,
observada a preservação do poder aquisitivo referida no
inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 95, de 2016)
Ocorre que, como se sabe, a alteração de um artigo da
Constituição Federal somente pode ser realizado através de Emenda
Constitucional, observando trâmite legal específico e rigoroso, que difere da
Lei Complementar.
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Como se não bastasse, o inciso I da Lei Complementar nº.
173, ao publicar mudanças na remuneração dos servidores, salvo melhor
juízo, infringe ainda os artigos 37, inciso X; 39, parágrafo 8°; e 40, inciso X,
parágrafos 14º e 19º:
Artigo 37, Constituição Federal: A administração
pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios
obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
19, de 1998)
(...)
X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio
de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser
fixados ou alterados por lei específica, observada a
iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão
geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de
índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
19, de 1998)
Artigo 39, Constituição Federal.
(...)
§ 4º O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo,
os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e
Municipais serão remunerados exclusivamente por
subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de
qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de
representação ou outra espécie remuneratória,
obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e
XI. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
(...)
§ 8º A remuneração dos servidores públicos organizados
em carreira poderá ser fixada nos termos do § 4º.
Art. 40, Constituição Federal: O regime próprio de
previdência social dos servidores titulares de cargos
efetivos terá caráter contributivo e solidário, mediante
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contribuição do respectivo ente federativo, de servidores
ativos, de aposentados e de pensionistas, observados
critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de
2019)
(...)
X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio
de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser
fixados ou alterados por lei específica, observada a
iniciativa privativa em cada caso, assegurada revisão
geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de
índices; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº
19, de 1998) (Regulamento)
(...)
§ 9º O tempo de contribuição federal, estadual, distrital
ou municipal será contado para fins de aposentadoria,
observado o disposto nos §§ 9º e 9º-A do art. 201, e o
tempo de serviço correspondente será contado para fins
de disponibilidade. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
§ 10 - A lei não poderá estabelecer qualquer forma de
contagem de tempo de contribuição fictício. (Incluído
pela Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/98) (Vide
Emenda Constitucional nº 20, de 1998)
(...)
§ 14. A União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios instituirão, por lei de iniciativa do respectivo
Poder Executivo, regime de previdência complementar
para servidores públicos ocupantes de cargo efetivo,
observado o limite máximo dos benefícios do Regime
Geral de Previdência Social para o valor das
aposentadorias e das pensões em regime próprio de
previdência social, ressalvado o disposto no § 16.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 103, de
2019)
§ 19. Observados critérios a serem estabelecidos em lei
do respectivo ente federativo, o servidor titular de cargo
efetivo que tenha completado as exigências para a
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aposentadoria voluntária e que opte por permanecer em
atividade poderá fazer jus a um abono de permanência
equivalente, no máximo, ao valor da sua contribuição
previdenciária, até completar a idade para aposentadoria
compulsória. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 103, de 2019)
Como se vê, o inciso X, do artigo 40 e inciso X, do artigo 37,
ambos da Carta Magna, dizem que as remunerações serão tratadas por lei
específica e, com a devida venia, como se não bastasse respectiva
alteração ter se dado através do meio impróprio, trata-se a Lei
Complementar objeto de estudo de lei geral.
Ainda, constata-se do parágrafo 19, do artigo 40, da
Constituição Federal, previsão que o servidor público terá direito ao abono
de permanência quando atingidos os requisitos para aposentadoria
voluntária, pelo tempo que permanecer em atividade. No entanto, o inciso
IX, da Lei Complementar nº. 173/20 veda o abono de permanência, em
verdadeira inobservância à Constituição Federal.
Insta salientar que o inciso IX, do artigo 8°, da Lei nº.
173/20 proíbe a contagem de tempo para o período aquisitivo de anuênios,
triênios, quinquênios, licença-prêmio e outros benefícios, inclusive a
aposentadoria - isso, em violação literal dos parágrafos 9° e 10°, ambos do
artigo 40, da Carta Magna.
A bem da verdade, o que se tem é que a Lei Complementar
objeto do presente parecer se presta a alterar a própria Constituição da
República Federativa do Brasil - o que seria passível de meio próprio: a
Emenda Constitucional, sob pena de infringência ao processo legislativo,
descrito no artigo 60 e seguintes da Constituição do Brasil.
A respectiva lei guarda relação com um sério
comprometimento da ordem jurídica, na medida em que a norma
infraconstitucional apontada, vai na contramão dos direitos constitucionais.
Em outras palavras, a norma infraconstitucional jamais
poderá ir contra a Constituição; gozando a Carta Magna de status de norma
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jurídica, com a qual a norma infraconstitucional deve guardar relação e não
atentar contra ela.
A questão discutida no presente parecer é apta, inclusive, a
ensejar admissibilidade do apelo extraordinário pelo Colendo Supremo
Tribunal Federal, tendo em vista que atende ao requisito da repercussão
geral, e, ainda, da transcendência, vez que reflete no interesse geral de
uma sociedade.
No momento em que o julgamento deste tema afeta uma
gama de pessoas, despertando interesse público, tem aquela causa
repercussão geral. Desta forma, há repercussão política, jurídica ou mesmo
transcendental neste caso.
Com a implementação do denominado Neoconstitucionalismo
no Brasil, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, se trouxe a
ideia de que a Constituição não se trata apenas um texto normativo, mas
também é auto aplicável, possuindo eficácia imediata diante do confronto
entre a Constituição e uma norma infraconstitucional.
O Neoconstitucionalismo surgiu exatamente, para viabilizar o
desenvolvimento do Estado Democrático de Direito, de forma que a
Constituição não fosse apenas um texto morto, mas se apresentasse como
supremo diante dos conflitos entre as demais normas de direito. Este é o
princípio da supremacia da Constituição.
E em um Estado Democrático de Direito não se pode permitir
que uma lei seja "maior" do que a Constituição ou suprima direitos outrora
garantidos por esta e exclua da apreciação do judiciário lesão ou ameaça a
direito.
Cabe aos juízes e Tribunais declarar a inconstitucionalidade
de uma norma infraconstitucional através de forma difusa e ao Supremo
Tribunal Federal exercer o controle concentrado. Portanto, indiretamente,
pode ser declarada a inconstitucionalidade de uma norma que viole
princípios e garantias outrora conquistados na Carta Magna deste País.
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A legislação, ora atacada, ofende princípios basilares do
direito constitucional, nos quais se respalda a Lei Maior deste país e
instaura uma onda de insegurança jurídica em uma gama de processos e
para pessoas de todos os níveis.
Não há razão de se prever direitos e garantias fundamentais
se no momento de aplicá-los, o legislador os ignora e opta pelo
rompimento da Democracia e de Direitos Constitucionais outrora garantidos.
A legislação não coaduna com a juridicidade constitucional estabelecida
neste país.
Portanto, não seria crível aceitar que a norma objeto do
presente estudo se sustente a suprimir direitos dos milhares de
representados do Consulente, ou mesmo que o judiciário retroaja ao
passado positivando uma norma que afronta literal disposição da
Constituição Brasileira e o Neoconstitucionalismo; instaurando um caos
jurídico e uma insegurança sem precedentes, quando se permite que a
norma infraconstitucional sobreponha a própria Constituição.
Existe uma clara hierarquia entre a norma infraconstitucional
e a Constituição, não podendo aquela sobrepor esta, sob pena de infringir
os artigos 60 em diante, da Carta Magna, que descreve o Processo
Legislativo, uma vez que a Constituição somente pode ser alterada via
Emenda Constitucional e não por força de lei ou decreto.
Portanto, foram feridos princípios da constitucionalidade,
democrático, sistema de direitos fundamentais, princípio da justiça social e
princípio da máxima prioridade na proteção e efetivação dos direitos
transindividuais, onde o Estado deve, em todos os seus níveis, priorizar os
direitos coletivos fundamentais da sociedade, cuja violação e falta de
proteção, pelas consequências sociais produzidas, retiram o verdadeiro
valor substancial da democracia e deslegitima, pela omissão, a atuação
estatal.
Assim, a questão primordial e ora defendida é a
inconstitucionalidade do artigo 8°, da Lei Complementar nº. 173/2020, em
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razão de ser uma norma infraconstitucional e, portanto, inferior a
Constituição Federal, a qual consagra princípios e direitos, já alicerçados e
assegura a instituição de um Estado Democrático de Direito, os quais
colidem com a norma infraconstitucional em comento, configurando a
inconstitucionalidade desta.
Ademais, quanto aos servidores que preencherem os
requisitos para obtenção da aposentadoria ou quaisquer benefícios,
vantagens ou remunerações pertinentes à Lei Complementar nº. 173/2020,
antes de esta entrar em vigor, em tese, possuem direito adquirido - o qual
a referida lei não pode lhe mitigar.
É como nos parece.
Na oportunidade renovamos protestos de estima e
consideração.
Belo Horizonte/MG, 01 de junho de 2020.
CEZAR BRITTO & ADVOGADOS ASSOCIADOS E REIS FIGUEIREDO ADVOGADOS ASSOCIADOS