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PPIIÓÓDDÃÃOO - COMPARTES PIÓDÃO | Associação de … · 2010-10-22 · acontece por acaso, e que por detrás de cada pequeno facto existe sempre um significado. ... Figura

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Ficha Técnica:

Título: Piódão: Desafios do Futuro Edição: Junta de Freguesia do Piódão

Associação de compartes da Freguesia do Piódão Texto: Dr. Paulo Ramalho Coordenação e Supervisão: Eng.ª Cláudia Demétrio Pré-Design: Luís Paiva Design e Acabamento: Miguel Delgado Impresso em Abril de 2004, por Miguel Delgado, com tiragem de 500 exemplares.

Prefácio

Nada pode ser prometido antecipadamente, nada é garantindo nem por Deus nem pela própria

História.

O pensamento, o conhecimento da sociedade e acção têm uma natureza incerta.

Qualquer mudança, qualquer ruptura na sociedade comparta riscos e probabilidades, que à

partida, são desconhecidos.

Por isso mesmo, temos de viver e conviver, nas nossas crenças, entusiasmos, pensamentos e

empreendimentos com a incerteza e o grau de risco que daí advêm.

Este Plano de Acção Integrada para a Freguesia do Piódão, assumidamente ambicioso, deixou-

me aturdido, porquanto, julgava eu, que numa freguesia das mais recônditas do Portugal profundo, não

era possível assumir tão corajosamente ideias e acção verdadeiramente perigosas.

Fico espantado porque os autores deste plano não ignoram e têm plena consciência da

perigosidade e risco da sua proposta de acção.

Neste mar de incertezas e verdadeiro heroísmo, com experiências e erros à mistura,

combinações, reformas, mutações e uma nova forma de organização social e cultural, pode ser, que com

um pouco de sorte, mas sobretudo, com muita confiança e determinação se venha a obter um

desabrochamento e uma nova vivência humana das gentes do Piódão e sobretudo um grande progresso

para a freguesia e Região.

Mas todos temos que ter consciência que “não existe paraíso passado a recuperar, nem paraíso

futuro a edificar, tanto na Terra como no Céu, nem fim da História, nem terra prometida, nem Messias

presente ou futuro”.

Neste Oceano de ideias, incertezas e algumas dúvidas, ergue-se um ilhéu de certezas quanto

aos objectivos a prosseguir nas áreas, da natureza e ambiente, turismo e cultura, área social e quanto

aos meios e recursos a utilizar.

Oxalá que o Povo do Piódão, todas as suas organizações, o Concelho, a Região e o País, sejam

capazes de perceber que neste canto perdido do Universo surgiu um grande desafio do homem

moderno, que em vez de se deixar morrer e esvaziar na angústia do nada, resolveu encetar uma nova

viagem e travessia, dando sentido à sua existência.

Como diz o poeta “há sempre uma razão para viver e os homens fazem a história e a história faz

os homens”.

Com o plano que acção ora editado é dado a possibilidade a todos de demonstrar que nada

acontece por acaso, e que por detrás de cada pequeno facto existe sempre um significado.

A rota prometida é alta e difícil, mas tenho confiança que grandiosas recompensas aguardam

aqueles que a escolheram.

Arganil Dr. Pedro Pereira Alves

Índice

1. Introdução

2. Freguesia do Piódão: Contexto Geográfico, Histórico e Demográfico

2.1. O Território

2.2. A História

2.2.1. Povoamento

2.2.2. Origem da Freguesia

2.2.3. A Estrada Real

2.2.4. Os bandidos

2.2.5. O Vigário Nogueira e o Colégio do Piódão

2.2.6. O Carvão

2.2.7. A questão dos baldios

2.2.8. Migrações Sazonais

2.2.9. O Volfrâmio

2.2.10. A Emigração

2.2.11. As Comissões de Melhoramentos

2.2.12. Aldeia do Piódão – o reconhecimento público

2.2.13. A era do turismo

2.2.14. Últimos anos: os novos recursos dos baldios

2.3. A População

2.3.1. Evolução demográfica

2.3.2. Perfil etário

2.3.3. Perfil familiar

2.3.4. Perfil de instrução

2.3.5. Perfil socio-económico

3. Caracterização da Situação Actual

3.1. Constrangimentos Estruturais

3.1.1. Isolamento Físico

3.1.2. Desertificação Humana

3.1.3. Desordenamento das Áreas Silvo-pastoris

3.1.4. Abandono da Propriedade Rural

3.1.5. Degradação Arquitectónica

3.1.6. Ausência de Gestão Local Participada

3.2. Principais Recursos e Potencialidades

3.2.1. Património Arquitectónico

3.2.2. Cultura e Tradições

3.2.3. Património Histórico e Arqueológico

3.2.4. Artesanato e Produtos Endógenos

3.2.5. Recursos Naturais

3.2.6. Turismo

4. Minimização dos Constrangimentos e Valorização dos Recursos

4.1. Medidas Propostas

4.1.1. Medidas para a Minimização dos Constrangimentos

4.1.1.1. Isolamento Físico

4.1.1.2. Desertificação Humana

4.1.1.3. Desordenamento das Áreas Silvo-pastoris

4.1.1.4. Abandono da Propriedade Rural

4.1.1.5. Ausência de Gestão Local Participada

4.1.1.6. Degradação Arquitectónica

4.1.2. Medidas para a Valorização dos Recursos

4.1.2.1. Património Arquitectónico

4.1.2.2. Cultura e Tradições

4.1.2.3. Património Histórico e Construído

4.1.2.4. Artesanato e Produtos Endógenos

4.1.2.5. Recursos Naturais

4.1.2.6. Turismo

5. Plano de Acção Integrada para a Freguesia do Piódão

5.1. Entidades Promotoras

5.2. Áreas de Intervenção

5.3. Descrição do Projecto

5.4. Objectivos Gerais

5.5. Propostas de Intervenção

5.6. Calendarização das Acções

5.7. Gestão do Projecto

6. Conclusão

Bibliografia Consultada

Índice Figuras

Figura 1 – Mapa ilustrativo da sub-região Pinhal Interior Norte, situado na área territorial da

Comissão de Coordenação da Região Centro.

Figura 2 – Mapa ilustrativo da região demarcada do Concelho de Arganil.

Figura 3 – Mapa ilustrativo da região demarcada da Freguesia do Piódão.

Figura 4 – Diagrama ilustrativo das Entidades/Instituições parceiras, actualmente no “Plano de

Acção Integrada para a Freguesia do Piódão”, com a Junta de Freguesia do Piódão e a

Associação de Compartes da Freguesia do Piódão.

Índice Gráficos

Gráfico 1 – Representação gráfica da evolução demográfica da população da Freguesia do

Piódão por classes etárias

Gráfico 2 – Representação gráfica das famílias clássicas segundo a dimensão da Freguesia do

Piódão

Gráfico 3 – Representação gráfica do grau de Instrução da população da Freguesia do Piódão

(2001)

Gráfico 4 – Representação gráfica da distribuição da população da Freguesia do Piódão por

sectores de actividade (2001)

Gráfico 5 – Representação gráfica da distribuição da população do Concelho de Arganil por

sectores de actividade (2001)

Gráfico 6 – Representação gráfica da população residente no Piódão, com 15 ou mais anos,

segundo o principal meio de vida (2001)

Índice de Tabelas

Tabela 1 – Evolução demográfica da população da Freguesia do Piódão entre 1911 e 2001

1. Introdução

O Decreto-Lei nº 205/99 de 9 de Junho, relativo aos Planos de Gestão Florestal prevê a

elaboração de “planos-tipo de utilização dos baldios”. O Conselho Directivo da Associação de

Compartes da Freguesia do Piódão, consciente dos seus deveres e responsabilidades no

ordenamento do território1 decidiu aproveitar essa imposição legal para elaborar uma proposta

de carácter mais abrangente, que permitisse integrar a gestão dos baldios num projecto global

de intervenção na área da freguesia. Assim nasceu este “Plano de Acção Integrada para a

Freguesia do Piódão”.

O plano, apesar de assumidamente ambicioso, não pretende sobrepor-se às

competências das diversas entidades. É intenção dos compartes – e só isso fará sentido –

trabalhar em estreita colaboração com o Município Arganil (a quem compete a última palavra

sobre o ordenamento e gestão do território), todas as forças vivas da Freguesia e

Entidades/Instituições, públicas e privadas, que considera de extrema importância nas áreas

abrangidas no plano.

As opiniões e propostas constantes neste documento reflectem, assim, os pontos de

vista do Conselho Directivo dos Compartes sobre a mais crucial das questões com que a

Freguesia do Piódão actualmente se defronta: a sustentabilidade do seu desenvolvimento, a

médio e longo prazo.

Os três objectivos centrais do trabalho são: compreender o momento presente da região

à luz do seu passado; propor um conjunto articulado e coerente de acções para o futuro; suscitar

um debate alargado sobre os temas em causa. Trata-se, em simultâneo, de realizar um estudo

de situação/diagnóstico prospectivo e de delinear um projecto de acção integrada, de carácter

multifuncional e participado.

Região deprimida do ponto de vista económico e demográfico, sofrendo de atrasos

estruturais profundos, geograficamente periférica, marcada pelo estigma da interioridade e pela

distância em relação aos centros de decisão e às regiões desenvolvidas do litoral, o Piódão tem

sido nas últimas décadas agente passivo de intervenções quase sempre pontuais e

descoordenadas, que se esgotam na sede de freguesia. A principal preocupação do Conselho

Directivo dos Compartes é, por isso, promover um projecto global – extensível a todas as aldeias

– que seja, ele próprio, um factor acrescentado de coesão e de desenvolvimento para esta zona

tão isolada e abandonada.

1 Outros (fazendo jus ao ditado da mentira mil vezes repetida) incorporaram-se recentemente no discurso popular,

apesar de toda a gente saber que não passam de pura invenção para consumo turístico. Estão nesse caso as “aventuras” do Zé do Telhado e do João Brandão no Piódão ou a passagem de um dos assassinos de Inês de

Décadas de tratamento desigual aumentaram as assimetrias entre o litoral e o interior de

Portugal. As últimas previsões sobre a evolução demográfica demonstram que este fosso tem

tendência a agravar-se: o país corre sérios riscos de se tornar um território macrocéfalo e

estruturalmente desequilibrado, com a imensa maioria da população concentrada nas áreas

urbanas de Lisboa e do Porto e vastas regiões interiores completamente desertificadas.

Concelhos como o de Arganil reproduzirão a uma escala local este fenómeno, acentuando (se

nada for feito em contrário) a tendência para o despovoamento das serras e para a concentração

populacional nas vilas e zonas baixas (no caso, o eixo urbano Coja-Arganil - S. Martinho). O

turismo poderá constituir, na Freguesia do Piódão, um instrumento fundamental para a correcção

de algumas destas situações assimétricas – mas para isso precisa de ser profundamente

repensado. Contribuir para essa indispensável reflexão é outro dos principais propósitos deste

trabalho.

Os fogos são igualmente um factor de desertificação humana e ambiental. A devastação

provocada pela onda de incêndios deste Verão veio mostrar como é urgente repensar a floresta

portuguesa. É absolutamente necessário realizar uma profunda reforma estrutural das áreas

silvo-pastoris, sobrepondo-se, pela primeira vez, o interesse público ao interesse privado na

definição desse novo ordenamento florestal e territorial. A questão dos baldios do Piódão – ponto

de partida e de chegada para este trabalho – inscreve-se nesse quadro mais vasto de

intervenção plural sobre a paisagem.

Piódão, Dezembro de 2003

O Conselho Directivo da Associação de compartes da Freguesia do Piódão

BAIXOVOUGA

DÃO

LAFÕESBEIRA INTERIOR

NORTE

COVA DA BEIRA

BEIRA INTERIORSULPINHAL

INTERIOR SUL

PINHALLITORAL

BAIXOMONDEGO PINHAL

INTERIOR

NORTE

SERRA DAESTRELA

n

OLIVEIRA DO HOSPITAL

PAMPILHOSADA SERRA

GÓISLOUSÃ

VN POIARES

MIRANDADO CORVO

PENELA

FIGUEIRÓ DOS

VINHOS

PEDRÓGÃOGRANDE

CASTANHEIRADE PERA

ALVAIÁZERE

ANSIÃO

TÁBUA

n

ARGANIL

2. Freguesia do Piódão: Contexto Geográfico, Histórico e

Demográfico

A compreensão global de um território passa sempre, num primeiro momento, pela sua

localização e descrição. Procederemos por isso, neste capítulo, à indispensável contextualização

geográfica da Freguesia do Piódão; consideraremos depois os dados demográficos e estatísticos

mais relevantes; abordaremos por fim os principais momentos e eventos da sua histórica.

2.1. O Território

A Freguesia do Piódão está

administrativamente integrada no

Concelho de Arganil, Distrito de

Coimbra. Situado na área territorial da

Comissão de Coordenação da Região

Centro, este Concelho faz parte –

consoante os projectos e os interesses

conjecturais – de duas sub-regiões

distintas: a Beira-serra e o Pinhal Interior

Norte.

Figura 1 – Mapa ilustrativo da sub-região Pinhal

Interior Norte, situado na área territorial da Comissão

de Coordenação da Região Centro.

Fonte: Execução Gráfica Gabinete Técnico CMA

O Piódão é, com os seus 3.609

ha, a mais extensa freguesia do

Concelho, mas também a menos

densamente povoada (224 habitantes,

ou seja, uma densidade demográfica de

6 hab/km2) e a mais distante da sede

do município.

Figura 2 – Mapa ilustrativo da região demarcada do

Concelho de Arganil.

Fonte: Execução Gráfica Gabinete Técnico CMA

s. martinho

da cortiça

pombeiro

da beira

sarzedosecarias

folques

celavisa

coja

barril de

alva

vila cova

do alva

anseriz

pomares

piodão

moura da serra

benfeita

cerdeira

teixeira

cepos

arganil

Encravado numa zona de transição

entre a Beira Litoral, a Beira Alta e a

Beira Baixa, o território dispõe-se em

torno da linha de cumeada que, dos

Penedos Altos (1.030m) ao Gondufo

(1.312m), passando pelo pico de S.

Pedro (1.342m), separa na Serra do

Açor as bacias hidrográficas do rio Ceira

e do rio Alva. O curso superior do Ceira

e as ribeiras de Égua e do Piódão,

afluentes do Alva, correm encaixados

entre vertentes mais ou menos

abruptas, vales apertados em “V” que

desenham no seu percurso inúmeros

meandros.

Figura 3 – Mapa ilustrativo da região demarcada da

Freguesia do Piódão.

Fonte: Execução Gráfica Gabinete Técnico CMA

A região tem um clima de montanha, com grandes amplitudes térmicas anuais (verões

quentes e invernos rigorosos) e uma variabilidade acentuada na distribuição mensal das

precipitações.

O subsolo é constituído pelo complexo xisto-grauvácico ante-silúrico das Beiras, de que afloram

frequentes formações quartzíticas nalguns locais, cobertas por um palmo de terra.

O declive acentuado das encostas favorece o trabalho de erosão. Constituiu-se assim,

sob as vertentes, uma cobertura residual de rocha que se fragmenta e que é levada pela

escorrência, dando origem a um terreno cascalhento, muito pobre, ingrato para a lavoura. As

poucas terras ribeirinhas, de largura escassa, também não oferecem grandes condições para a

agricultura. A extraordinária engenharia de conquista de espaço às encostas através de socalcos

de suporte para as terras assegurava no passado uma relativa auto-suficiência alimentar, mas à

custa de um trabalho duríssimo: as tarefas agrícolas eram todas feitas à mão, uma vez que as

exíguas dimensões destes terraços impediam a utilização do arado e da grade.

Um tal conjunto de obstáculos naturais deu origem a uma paisagem relativamente pouco

humanizada, concentrando-se o povoamento em cinco aldeias (Piódão, Chãs d’Égua, Tojo,

Fórnea, Malhada Chã) e nove lugares (Foz d’Égua, Torno, Feijoeira, Covita, Barreiros, Eira da

Bouça, Moinhos, Pés Escaldados e Quinta da Pequena).

2.2. A História

2.2.1. Povoamento

No imaginário piodense o tempus histórico começa com o “tempo dos Mouros”: tudo

quanto é, afinal, mais antigo – vestígios da idade do bronze ou do ferro, testemunhos da

presença romana – é atribuído pelo povo a esse período mítico, espécie de cadinho primordial

ou ano zero simbólico, anterior à ordem revelada pelo cristianismo. Aos Mouros são atribuídos

poderes ocultos, encantamentos e magias, mas o mais poderoso dos seus dons é, sem dúvida,

a capacidade de transformarem qualquer objecto em ouro.

Existem, no entanto, provas arqueológicas de que o povoamento da região é muito

anterior a isso: a Freguesia – com mais de trinta rochas insculturadas já descobertas – tem vindo

a revelar-se um dos mais importantes santuários rupestres do Bronze Final (1200 a.C. a 700

a.C.) de toda a região centro. Neste contexto assume particular importância, pela sua

centralidade simbólica, o núcleo de gravuras da Ribeira d’Égua. Aqui, as rochas insculturadas

parecem incluir-se num conjunto arqueológico mais vasto, de dimensão religiosa complexa. É

possível que o vale da Ribeira d’Égua tenha sido considerado um enorme campo de

significações simbólicas para uma população relativamente estável que partilhou durante

centenas de anos as condições desse ecossistema delimitado.

Tudo aponta, assim, para a existência durante o Bronze Final, no topónimo Chãs do vale

da ribeira de Égua, de um povoado de altura. Apesar de ser um núcleo aberto, a sua situação

em cumeada proporcionava-lhe condições naturais de defesa, além de um controlo total sobre a

paisagem circundante. Este povoado, que terá chegado à Idade do Ferro, seria habitado por

populações que associavam a criação de gado à exploração do estanho (existem numerosos

indícios de minas na região) e, eventualmente, à metalurgia; a agricultura teria uma reduzida

importância, dado o tipo de relevo e a natureza esquelética dos solos. A aldeia seria a “cabeça”

de um vasto território, o pólo estruturante de um poder político e simbólico assente, não só, na

exploração mineira, como no controlo de uma rota terrestre de procura e distribuição do estanho

– a, mais tarde denominada, Estrada Real.

O povoamento do vale da ribeira do Piódão parece ter acontecido algumas centenas de

ano mais tarde. Segundo a tradição, a aldeia do Piódão situava-se originalmente em Casas

Piódam, alguns quilómetros abaixo do local actual. Esta primeira localização, por ser muito

quente, revelava-se propícia à proliferação de grandes colónias de formigas, que entravam nos

potes de barro e estragavam o mel neles armazenado, principal meio de subsistência da

comunidade. Tal facto terá levado a população a deslocar a aldeia para um outro sítio – mais

frio, menos soalheiro, e por isso menos dado à praga das formigas.

Na realidade, a mudança de local da povoação ter-se-á ficado a dever, não à praga das

formigas, mas à maior abundância de água no segundo sítio: Casas Piódão ficava num monte

em esporão, com boas condições defensivas e uma excelente visibilidade sobre o vale e as

montanhas – mas não tinha água; o seu abastecimento estava, na realidade, dependente de

uma levada com mais de 1 km de extensão. Existindo, nas imediações, tantos locais com água,

a construção da povoação naquele sítio parece, assim, constituir um indício de antiguidade. A

recente descoberta de algumas telhas da antiga levada sugere que estamos em presença de um

núcleo castrejo da Idade do Ferro, posteriormente transformado em acampamento mineiro

romano.

2.2.2. Origem da Freguesia

O registo mais antigo referente à região do Piódão remonta a 1527, altura em que o rei

D. João III mandou organizar o Cadastro do Reino. Neste levantamento aparece então, inserida

na “villa da voo” (Avô) o “Casall no Piódam” com apenas dois fogos, que deveriam corresponder,

quando muito, a uns dezasseis ou vinte moradores.

No ano de 1543 é criada a Freguesia de Aldeia das Dez, que abrangia o Piódão. A aldeia viria,

porém, a ser desanexada de Aldeia das Dez em 1676. Promovida então a paróquia e sede de

freguesia, continuou a integrar o Concelho de Avô.

Em 1721 a Freguesia do Piódão tinha 39 fogos e pouco mais de 100 moradores.

Em 1855 foi desanexada do Concelho de Avô e integrada no Concelho de Arganil,

continuando, no entanto, no que respeita à jurisdição religiosa, a pertencer ao Arciprestado de

Avô.

A memória dos tempos em que a Freguesia do Piódão tinha relações estreitas com Avô

e a sua área limítrofe (especialmente Lourosa) permanece ainda viva no imaginário popular:

havia uma casa do Piódam em Lourosa, onde os serranos costumavam pernoitar nos dias de

feira. Era também a Lourosa que os piodenses desciam para irem à missa ou para enterrar os

seus falecidos.

2.2.3. A Estrada Real

Durante a Idade Média a região viveu um período de grande isolamento, facto que se

traduziu na completa ausência de documentação relativa à freguesia. Esta interioridade só não

era total devido à passagem regular de caravanas de carros de bois na Estrada Real – um

caminho agreste e perigoso, frequentado tanto por comerciantes como por foras-da-lei, que

cruzava os ermos e ravinas do alto da serra.

O trajecto da Estrada Real decalcava, muito provavelmente, uma velha rota comercial

das sociedades metalurgistas do Bronze Final. Durante o período romano terá feito parte da

rede viária regional, mas a sua importância não parece ter sido grande. Na época medieval a

Estrada Real reassumiu particular relevo como via de ligação entre a Beira Litoral e a Beira

Interior – por ela chegavam à Cova da Beira o sal e o peixe do litoral, de lá vindo até ao Porto da

Raiva (por onde seguiam depois em barcaças Mondego abaixo), carvão, queijo, carne e

lanifícios.

Foi a inauguração da linha de comboio entre Lisboa e a Covilhã, no início do século XX,

que provocou a rápida agonia desta antiquíssima via de penetração para o interior: de então em

diante deixava de fazer sentido transportar mercadorias por um caminho tão difícil.

2.2.4. Os bandidos

A lenda afirma (e não custa acreditar) que, em tempos de crise, as serranias do Piódão

constituíram sempre um refúgio para foragidos e bandoleiros. Acoitados entre fragas, estes

proscritos e foras-da-lei dedicavam-se a assaltar as caravanas que cruzavam a Estrada Real;

mas também não hesitavam em descer às povoações para roubar alimentos.

O último desses períodos de grande instabilidade seguiu-se à sangrenta Guerra Civil de

1821/1825: nesses anos difíceis – de que as populações guardaram uma memória impressiva,

narrando factos cuja autenticidade pode ser confirmada2 – a vida demorou a voltar à

normalidade nas Beiras. As guerrilhas Miguelistas, derrotadas, dispersaram pelo campo e

transformaram-se em bandos de assassinos e delinquentes. Uma destas seitas – os Garranos,

comandada pelo temível Caca – andou, segundo reza a tradição, pelas serranias do Piódão.

Passavam de tal maneira “vestidos” de mato que ninguém os via. Por vezes desciam às aldeias

para roubar e perseguir raparigas. Os aldeãos, aterrorizados, fugiam para o mato, deixando-os à

2 Outros (fazendo jus ao ditado da mentira mil vezes repetida) incorporaram-se recentemente no discurso popular,

apesar de toda a gente saber que não passam de pura invenção para consumo turístico. Estão nesse caso as

vontade para praticar todo o tipo de tropelias, como pôr os cavalos a comer nas arcas de milho

ou abrir pipos de vinho a tiro.

Em 1 de Março de 1841, Caca e sete membros do grupo foram surpreendidos pela tropa

no lugar de Vila do Mato (Estrada da Beira) e mortos após dezoito horas de tiroteio cerrado.

Terminava assim, num mar de sangue, a tristemente célebre quadrilha dos Garranos. Mas nem

por isso a Serra do Açor pode sossegar: alguns sobreviventes do grupo continuaram a

apoquentar as populações da região do Piódão. É o caso do Oliveirão (morto em Chãs d’Égua

alguns anos depois) e do Coimbra (preso e condenado ao degredo na década de 60).

2.2.5. O Vigário Nogueira e o Colégio do Piódão

Após a morte do Oliveirão – terminados, enfim, os sobressaltos – a vida dos piodenses

retomou a sua trabalhosa normalidade. Cada serrano se voltou a curvar sobre os seus afazeres

quotidianos e, alheado do Mundo, o Piódão mergulhou no seu velho silêncio de pedra. O Mundo,

por sua vez, alheou-se de novo do Piódão.

Este isolamento seria mais uma vez quebrado (mas agora por bons motivos) em 1885 – ano da

chegada à sede de freguesia do jovem pároco Manuel Fernandes Nogueira. Recém-ordenado, o

novo vigário consagrou-se de corpo e alma à tarefa de abrir o Piódão ao exterior. A ele se ficou

a dever, logo em 1886, a fundação de um “colégio” interno que funcionou como um pólo cultural

de grande importância para a zona. A formação ministrada equivalia aos estudos liceais; depois

disso, após um pequeno estágio, os alunos estavam preparados para o professorado ou para o

seminário. Era o próprio vigário Nogueira quem ensinava todas as disciplinas.

Pelo colégio, que funcionou até 1906, passaram mais de 200 rapazes, quase todos de

famílias abastadas da região. Vinham de tão longe como Tortosendo, Alcains, Loriga, Vide ou

Seia. A maior parte destes alunos seguiu cursos superiores; cerca de trinta e tal ordenaram-se

padres.

A notável acção do vigário Nogueira Contígua não se limitou à criação do “colégio”:

tomou a iniciativa de abrir uma escola primária masculina (de que o irmão foi o primeiro

professor), mandou construir pontes e caminhos, incentivou a plantação dos primeiros pinhais,

remodelou a igreja paroquial (a fachada, que data dessa altura, foi desenhada por ele), etc.

Em 1906, quando foi chamado a exercer funções noutro lugar, o Piódão era já uma

freguesia diferente: apesar de continuar fisicamente isolada, a região tinha aberto as primeiras

janelas para o outro lado das montanhas.

“aventuras” do Zé do Telhado e do João Brandão no Piódão ou a passagem de um dos assassinos de Inês de Castro pela região.

2.2.6. O Carvão

Os cabeços agrestes e ventosos do Açor – constantemente lexíviados pelas chuvas,

cobertos por um solo pobre e magro – foram desde sempre muito pouco propícios à florestação.

O cimo da serra era o reino inóspito da urze, do tojo e da carqueja. Estas imensas extensões

arbustivas, mantidas rasteiras por acção das cabras, forneciam, apesar disso, uma das poucas

riquezas dos serranos: o carvão vegetal, feito com as raízes (ou torgas) desse mato que crescia

nos baldios.

Nas épocas de maior produção os almocreves juntavam-se em determinados

entrepostos na Estrada Real, ao cimo do Piódão, para fazerem o transporte das sacas

enfarruscadas. Formavam-se por vezes caravanas de mais de trinta machos, que seguiam com

a sua carga em direcção a Coimbra e ao litoral.

Dizia-se então que o carvão era o “ouro negro dos pobres”, mas a verdade é que não

havia muitas mais alternativas – o seu trabalho, duro e mal pago, constituía para muitos a única

forma de apurar algum dinheiro. Nas primeiras décadas do século XX a economia do Piódão –

assente no cultivo da terra e em relações de troca e entreajuda – funcionava, de facto, em

circuito quase fechado: a circulação de moeda estava reduzida ao mínimo e apenas um

pequeno número de pessoas com conhecimentos em alguma arte tinha possibilidade de ganhar

regularmente algum dinheiro – eram os ferreiros, os carpinteiros, os pedreiros, os alfaiates e os

sapateiros; a eles se juntavam taberneiros, almocreves e poucos mais. Para a restante

população, o carvão era, juntamente com a venda de cabritos, a grande fonte de rendimento.

2.2.7. A questão dos baldios

O acesso livre aos baldios era, portanto, uma questão vital para a maioria dos habitantes

da freguesia – só aí, nesses terrenos descampados da serra, eles podiam pastorear os seus

gados, cortar mato e fabricar carvão. Na década de 30 a crescente pressão demográfica

provocaria uma brusca ruptura nesta gestão equilibrada dos recursos comunitários: as pequenas

fazendas em torno das aldeias tornaram-se então manifestamente insuficientes para alimentar

uma população em crescimento contínuo (ver quadro da pagina 9); o sistema de produção

tradicional entrou em saturação e a fome estendeu os seus tentáculos sobre as aldeias. Em

1935, confrontado com a necessidade de arrotear novas terras para as cavadas de centeio, o

Regedor do Piódão organizou a partilha em 72 sortes (uma para cada casa) dos baldios que

ficavam mais próximos da aldeia. As outras localidades da freguesia em breve seguiram este

exemplo.

Nestas sortes o pastoreio livre tornou-se impossível, o que provocou a sobre-utilização

dos baldios de altitude – os únicos agora disponíveis. O esgotamento dos pastos foi rápido,

levando muita gente a ter que diminuir drasticamente o tamanho das suas cabradas. Datam

dessa altura as migrações sazonais para a Beira Baixa, a demanda das minas da Panasqueira e

o primeiro êxodo de piodenses em direcção a Lisboa.

Mais tarde, nos anos 50 e 60, os Serviços Florestais, ao semearem pinheiros nos baldios

da serra3, contribuíram para a extinção final das grandes cabradas que em tempos foram o

sustento da freguesia. Datam dessa altura as migrações sazonais para o Ribatejo e o segundo

surto migratório em direcção a Lisboa.

2.2.8. Migrações Sazonais

Nos anos 30 e 40 formavam-se, nas aldeias da freguesia, grandes ranchos de rapazes e

raparigas para irem até à ceifa do trigo na Beira Baixa.

Mais tarde, nos anos 50, essa migração sazonal mudou de rumo e passou a fazer-se

sobretudo para o Ribatejo. Uma vez lá chegados, o trabalho era duro mas variado: apanhar

azeitona, cavar a vinha, ceifar o trigo...

Havia um feitor de uma quinta no Carregal que vinha todos os anos ao Piódão, angariar mão-de-

obra. Organizava dois ranchos – um de raparigas e outro de rapazes. Na quinta, homens e

mulheres ficavam instalados em dois barracões distintos, onde dormiam e cozinhavam. Cada

pessoa tinha direito a um alqueire de farinha, outro de feijão e dois litros e meio de azeite por

mês; mas havia muitos que vendiam parte dessas provisões para comprarem conduto e vinho.

Eram “nove meses de invernada a cem escudos por mês, pagos por junto no fim da

campanha”. O dinheiro suado nesta faina do Ribatejo servia quase sempre para comprar o milho

que, por essa altura, escasseava nas arcas do Piódão.

3 Em 1940 é publicado o novo Código Administrativo dos baldios, que os classifica em: a) indispensáveis do

logradouro comum; b) dispensáveis do logradouro comum e próprios para a cultura; c) dispensáveis do logradouro comum e impróprios para a cultura; d) arborizados ou destinados à arborização. Os baldios dispensáveis do logradouro comum eram facilmente alienáveis, regulando o código a sua forma de alienação. Foi com base nisto que se alienaram, legal ou ilegalmente, milhares de hectares de terreno baldio até Abril de 1974. Vários Decretos-lei submeteram ao regime florestal grandes áreas de terreno baldio. A submissão dos baldios ao regime florestal não foi fácil nem pacífica: foi usada muitas vezes a força, a ameaça e a perseguição para impor às populações o desapossamento dos seus baldios.

2.2.9. O Volfrâmio

Durante a 2ª Guerra, em plena época de fome, surgiu uma notícia extraordinária – as

entranhas dos montes, que ocultavam segredos desde o tempo dos mouros, tinham decidido

oferecer de novo as suas riquezas aos serranos. Era a febre do volfrâmio a tomar conta da

região: da Malhada Chã à Fórnea, de Chãs d’Égua ao Piódão, levas de moços partiram em

direcção às minas da Panasqueira, na miragem, se não da fortuna, pelo menos de um salário ao

fim do mês. Saía-se de casa 2ª feira, pela madrugada, e regressava-se 6ª feira à noite. Anos e

anos longe da família, a arriscar a vida, a dar cabo dos pulmões por um punhado de moedas.

Depois, com o fim da Guerra, as minas fecharam. Voltaram a reabrir na década de 50,

mas os tempos eram outros - a época áurea do Volfrâmio tinha passado. A importância da

Panasqueira enquanto pólo empregador da região nunca foi totalmente recuperada, mas ainda

assim, aldeias como a Malhada Chã continuaram a estar economicamente muito dependentes

do couto mineiro.

Na década de 80, na sequência de uma longa crise, as minas da Panasqueira, em S.

Jorge da Beira, diminuíram a sua produção para o mínimo e despediram a quase totalidade dos

mineiros. Malhada Chã seguiu o destino das outras aldeias da freguesia, despovoando-se

rapidamente.

2.2.10. A Emigração

Embora a emigração para o Brasil, África ou Europa tenha sido relevante (no caso da

Malhada Chã assumiu mesmo características de êxodo para França), a verdade é que o

principal fluxo migratório dos habitantes da freguesia do Piódão foi quase sempre em direcção a

Lisboa.

A primeira grande leva de trabalhadores demandou à capital logo a seguir à 2ª Guerra,

na sequência do fecho das minas na Panasqueira. A esta gente serrana – rude, frugal, pouco

comunicativa, que se alojava em miseráveis casas da malta – estavam destinados trabalhos

violentos e mal pagos – na estiva, na construção naval ou na lota.

Mais tarde, nos anos setenta, a pequena restauração constituiu-se como alternativa a

esse emprego braçal. Criou-se assim, através da solidariedade entre conterrâneos

(particularmente activa entre os habitantes de Chãs d’Égua), uma rede de cumplicidades que

condicionava o acesso ao emprego à existência de relações de parentesco, amizade ou

vizinhança.

O facto de os naturais do Piódão terem continuado a labutar nos sectores tradicionais,

mantendo-se alheios ao novo filão da restauração ou à miragem de França, terá contribuído

para a preservação das características arquitectónicas da sua aldeia: é uma ironia do destino,

mas foi a sua fraca capacidade económica que evitou a construção sem regras, contribuindo

assim, ainda que involuntariamente, para a actual harmonia do conjunto urbano.

2.2.11. As Comissões de Melhoramentos

Nos anos 50 e 60 a socialização dos piodenses a residirem em Lisboa dependia, em

grande medida, da sua integração em redes formalmente organizadas que promoviam o

convívio entre conterrâneos e asseguravam a ligação à terra natal – é o período áureo das

Comissões de Melhoramentos e outros tipos de agremiações regionalistas, agrupadas na “Casa

da Comarca de Arganil”. Estas colectividades tiveram um papel fundamental na realização de

importantes obras de beneficiação nas aldeias serranas, assumindo competências que o Estado

Novo negava ao poder local e municipal. A sua intervenção baseava-se, quer na angariação de

donativos entre os associados, quer no exercício de um jogo constante de influências a diversos

níveis do poder político.

A Comissão de Melhoramentos do Piódão, criada em 19524, foi a grande impulsionadora

de obras tão marcantes como a abertura de um posto público de telefone (1954) e de um posto

de assistência médica (1956); mas a construção de uma estrada que permitisse quebrar o

secular isolamento da aldeia constituiu, sem dúvida, a sua luta mais prolongada e difícil: um

primeiro troço tinha sido iniciado – e logo interrompido – pelos Serviços Florestais em 1950;

seguiram-se longos anos de contactos (pedidos, cunhas, queixas, promessas, ilusões) até que

as obras recomeçaram em 1960 – mais uns quilómetros e nova paragem, mesmo à vista da

aldeia; foi preciso renovar o jogo de influências e esperar por 1970 para que a obra fosse,

finalmente, concluída pela Câmara Municipal de Arganil. O Piódão completava assim, quase

cem anos depois, o lento movimento de abertura ao Mundo iniciado no tempo do vigário

Nogueira.

4Ainda na década de 50 foram criadas outras duas agremiações regionalistas: a Comissão de Melhoramentos da Fórnea (1954) e a União Progressiva de Chãs d’Égua (1956). Mais tarde, na década de 70, surgiram as Comissões de Melhoramentos da Malhada Chã (1973) e do Tojo (1977).

2.2.12. Aldeia do Piódão – o reconhecimento público

Com a estrada começaram a chegar os primeiros visitantes. Cada um desses turistas,

ao regressar à cidade, levava consigo a notícia do seu deslumbramento; e as informações sobre

a existência de um fantástico povoado de xisto, escondido nas dobras da Serra do Açor,

espalharam-se muito rapidamente.

Em 1974, membros da Comissão de Melhoramentos do Piódão trouxeram à aldeia o

arquitecto Eugénio Correia, personalidade com certa influência junto do poder político de então.

O impacto da visita foi tão forte que o arquitecto se tornou, a partir desse momento, no primeiro

defensor da preservação da aldeia enquanto património arquitectónico único. As suas opiniões

encontraram eco no Município de Arganil, que de imediato iniciou diligências para a classificação

do Piódão como Imóvel de Interesse Público. O decreto a consagrar esse estatuto, publicado em

1978, implicava a proibição de novas alterações à unidade arquitectónica e à fisionomia do

conjunto urbano.

Quando a população (para quem o xisto era sinónimo de pobreza) foi informada de que,

de então em diante, não poderia rebocar ou pôr telha nas suas habitações, a reacção foi de

profunda consternação – o mundo parecia, mais uma vez, querer condenar a aldeia ao

isolamento e ao ostracismo. E nem mesmo os primeiros benefícios decorrentes desse novo

estatuto público (a iluminação do conjunto urbano em 1978, o alcatroamento da estrada em

1981) conseguiram reconciliar a comunidade com uma decisão que lhes parecia tão arbitrária

quanto injusta. Os turistas tinham, entretanto, começado a afluir ao Piódão, mas a aldeia – em

conflito aberto com o poder autárquico – não estava psicologicamente preparada para essa

invasão.

2.2.13. A era do turismo

A abertura dos piodenses ao turismo foi (e, em grande medida, ainda é) um processo

lento e difícil. A somar às queixas em relação ao poderes políticos, juntava-se também a

estranheza por haver quem se interessasse pela aldeia ao ponto de a considerar “bonita”. A

desconfiança em relação a essa turba ruidosa de forasteiros, a incomodidade com o seu

comportamento excessivo - o choque que a diferença cultural provocava - era, em parte,

amortecida por uma atitude de desdém e alheamento: à curiosidade dos visitantes eram

deixadas as ruas; os piodenses (os poucos que restavam) refugiavam-se nas suas casas e

nas suas hortas.

Entretanto a verdade é que o turismo tinha vindo para ficar (como bem perceberam os

comerciantes), transformando-se em pouco tempo numa actividade indutora de significativas

transformações estruturais – pelo menos na sede de freguesia. Em 1994 o Piódão é integrado

no Programa de Recuperação das Aldeias Históricas de Portugal5. Em 1995, na sequência

disso, a aldeia vê-se abrangida por um “Plano de Pormenor de Salvaguarda e Valorização”,

incluído no PDM de Arganil6, que define pela primeira vez regras para a recuperação e

construção de edifícios.

Os investimentos do Município de Arganil no âmbito do PRAHP concentraram-se na

valorização estética e arquitectónica da aldeia (processo que continuou a ser um foco de

conflitos entre a população e as autoridades), na melhoria das infra-estruturas básicas (redes

de abastecimento de água e electricidade, saneamento básico, construção de uma ETAR,

etc.) e – sobretudo na construção de uma estalagem com 31 quartos, gerida neste momento

pelo INATEL7. Alguns projectos de turismo rural foram também apoiados, como a Casa da

Padaria, a Casa do Malhadinho e as Casas da Aldeia. Em 1999 foi aberto um posto de

atendimento turístico e em 2003 foi inaugurado o Museu do Piódão.

Se tomarmos em consideração os dados sobre o turismo referentes a 2002

verificaremos, por extrapolação estatística, que o Piódão foi, durante esse período, visitado

por cerca de 50.000 pessoas (2.000 dos quais estrangeiros). Números, na verdade,

extraordinários para uma aldeia que, ainda há trinta e cinco anos, não tinha sequer uma

estrada que a ligasse ao mundo.

5 O programa relativo ao Piódão consagrava a “recuperação e preservação da escala humana dos espaços, da

fisionomia e dos pormenores da aldeia, no sentido de reforçar a sua vocação de pólo de atracção turística, de dominância rural, funcionando como montra do potencial produtivo das freguesias vizinhas (produtos naturais e artesanais) e como canalizador da vivência envolvente, com oferta de serviços turísticos”(Programa das Aldeias Históricas de Portugal – CCRC, 1999). As acções realizadas neste âmbito foram as seguintes: “Intervenções nas redes de esgotos e de abastecimento de água; construção de uma ETAR; enterramento das redes de electricidade e de comunicações; alargamento, rectificação e pavimentação das estradas de acesso à aldeia; remodelação de um imóvel para posto de turismo e Museu; recuperação e beneficiação da igreja paroquial; construção de uma Pousada; recuperação de edifícios degradados, com reposição de lousa nos telhados e correcção de dissonâncias”(idem) 6 O PDM está agora em processo de profunda reformulação e revisão estrutural. Os seus objectivos, no que ao

Piódão diz respeito, são totalmente coincidentes com os dos Compartes: “defesa e promoção da paisagem e preservação do espaço natural e património construído; requalificação e optimização das redes e abastecimento e tratamento de águas residuais; renovação da atracção das zonas ribeirinhas, do recurso água e ecossistemas inerentes, com a criação de áreas de recreio activo e percursos eco-turísticos; requalificação e optimização das acessibilidades; potencialização dos recursos endógenos para o desenvolvimento turístico, em termos de artesanato, gastronomia e etnografia; inventariação, classificação e disponibilização expositiva e informativa dos achados arqueológicos do Vale do Ceira; promoção do aproveitamento da vocação da freguesia para a instalação de parques eólicos; defesa das características únicas do aglomerado urbano do Piódão, promoção do ordenamento dos espaços públicos e dos espaços agroflorestais e da dinamização socio-cultural”. 7 A abertura da estalagem permitiu regularizar os fluxos turísticos para o Piódão, até aí excessivamente

concentrados em determinados períodos do ano.

2.2.14. Últimos anos: os novos recursos dos baldios

Nos últimos anos os baldios voltaram a concentrar a atenção da população. Depois da

emigração e dos fogos os terem votado a um longo abandono, os recursos comunitários

reassumiram assim uma centralidade estratégica no contexto do desenvolvimento da freguesia.

O primeiro facto relevante terá sido a integração de uma extensa área em redor de S.

Pedro do Açor na Lista de Sítios Protegidos da Rede Natura 2000. As características ecológicas

desta zona e, em particular, a sua importância florística justificaram este interesse

conservacionista. Foi, com efeito, registada nesta área a maior população até agora conhecida

de Arabis Beirana, espécie que constitui um endemismo português recentemente descrito, bem

como grande parte da população de narcissus asturiensis, endemismo ibérico incluído na Lista

Nacional de Espécies Ameaçadas e no Anexo II da Directiva Habitats.

O segundo acontecimento de relevo prende-se com a realização de sondagens que

permitiram constatar notáveis aptidões para a produção de energia eólica nas terras altas da

freguesia. Na sequência disso foi licenciado, na zona do Tojo, um primeiro parque eólico com

dez aerogeradores. Esta valorização de recursos energéticos endógenos e renováveis coloca o

Piódão na primeira linha dos interesses ambientais e energéticos nacionais, que passam pela

redução dos gases de efeito de estufa, a diversificação das fontes de abastecimento eléctrico e o

cumprimento da directiva europeia sobre a produção de electricidade a partir de energias

renováveis

2.3. A População

2.3.1. Evolução demográfica

Até à década de 60 a freguesia do Piódão registou um crescimento contínuo da

população. A partir desta data a tendência inverte-se, registando-se perdas do efectivo

populacional muito elevadas: 30% entre 1960 e 1970, 32% entre 1970 e 1981, 26% entre 1981 e

1991, 41% entre 1991 e 2001. Se compararmos os dados de 2001 com os dados de 1960,

apercebemo-nos melhor da amplitude desta quebra demográfica: em quatro décadas a freguesia

perdeu 79% da população. O fenómeno migratório e o envelhecimento da população residente

são, sem dúvida, os principais responsáveis por esta mudança radical no quadro demográfico da

Freguesia.

0

2040

6080

100120

140160180

200

n.º

de

pe

ss

oa

s

0-14 15-24 25-64 65 ou >

Idade

Evolução demográfica da população da Freguesia do

Piódão, por classes etárias

1991 2001

Tabela 1 – Evolução demográfica da população da Freguesia do Piódão entre 1911 e 2001

Tabela * Dados não descriminados (provavelmente incluídos em Chãs d’Égua). **Dados não descriminados (provavelmente incluídos em Foz d’Égua). ***Dados não descriminados (provavelmente incluídos em Piódão). ****Dados não descriminados.

2.3.2. Perfil etário

O desequilíbrio etário no Piódão em resultado do envelhecimento da população tem-se

acentuado década após década. Se compararmos os dados respeitantes a 1991 e 2001

verificamos que a quebra populacional é maior nos escalões mais jovens: no grupo etário dos 65

anos ou mais é de 8%; no grupo dos 25 e 64 anos é de 39,5%; no grupo entre os 15 e os 24

anos atinge os 51,7%; no escalão entre os 0 e os 14 anos ultrapassa os 85% (entre 1997 e 2001

não nasceu qualquer criança na freguesia.

Gráfico 1 – Representação gráfica da evolução demográfica da população da Freguesia do Piódão por classes etárias.

Lugar

Ano Bar

reir

os

Ch

ãs d

’Ég

ua

Co

vita

Eir

a d

a B

ou

ça

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Fo

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os

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Esc

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ado

s

Pió

dão

To

jo

To

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Ou

tro

s

Lu

gar

es

To

tal

1911 17 166 25 39 85 19 114 **** 23 255 75 16 38 872

1940 17 174 22 25 127 31 178 17 34 292 100 23 30 1070

1960 20 153 25 22 124 **** 229 17 19 281 109 28 10 1088

1970 * 79 ** 11 86 32 195 14 6 205 83 21 29 761

1981 * 52 ** * 55 7 170 * 0 110 65 *** 55 514

1991 * 54 ** * 34 29 148 * 0 76 40 ** 4 381

2001 3 18 3 2 20 9 81 6 0 65 19 3 **** 229

2.3.3. Perfil familiar

O envelhecimento da população reflecte-se de forma evidente no perfil das famílias

piodenses: em 2001, das 108 famílias clássicas, 38 eram constituídas por um único indivíduo e

52 eram famílias nucleares sem filhos (quase sempre casais idosos). De notar que as 14 famílias

com três indivíduos não correspondiam necessariamente a famílias nucleares com filhos, sendo

em muitos casos os três membros pessoas idosas, ligadas por outros tipos de laços familiares.

Na realidade, das 108 famílias registadas na freguesia do Piódão, 99 não incluíam qualquer

pessoa com menos de 15 anos.

Gráfico 2 – Representação gráfica das famílias clássicas segundo a dimensão da Freguesia do Piódão

2.3.4. Perfil de instrução

Os elementos relativos aos níveis de instrução formal em 2001 apontam para uma

população muito pouco capacitada. Se somarmos os indivíduos analfabetos e os indivíduos com

o 1º ciclo verificamos que 67,6% da população apresenta níveis de escolaridade muito baixos ou

nulos. Os indivíduos com o 2º ciclo pertencem certamente às faixas etárias mais novas, que

foram abrangidas pela extensão da escolaridade obrigatória. A percentagem de pessoas com

níveis de escolaridade mais elevada (3º ciclo, secundário ou superior) é irrisória – 7,4%. Não há

qualquer pessoa com um curso médio ou técnico-profissional.

Familias cláss icas segundo a dimensão da Freguesia do

Piódão

0

10

20

30

40

50

60

1 2 3 4 5 6

n.º de indivíduos por familia

n.º

de

fa

milia

s

Gráfico 3 – Representação gráfica do grau de instrução da população da Freguesia do Piódão (2001)

2.3.5. Perfil socio-económico

Os dados de 2001 sobre a divisão por sectores de actividade da população activa na

freguesia do Piódão são particularmente elucidativos sobre a predominância do sector primário

(61%) em relação aos sectores secundário (21%) e terciário (18%) – algo que se torna ainda

mais evidente quando comparamos estes elementos com os do conjunto do concelho de Arganil.

A confrontação com os elementos estatísticos sobre grupos de actividades permite confirmar que

a esmagadora maioria dos indivíduos empregados no sector primário se dedicam à agricultura;

no sector secundário a construção civil é a principal empregadora; o sector terciário esta quase

exclusivamente representado pelo comércio e actividades relacionadas com o turismo.

Gráfico 4 – Representação gráfica da distribuição da população da Freguesia do Piódão, por sectores de actividade (2001).

Grau de instrução da população da Fregues ia do

Piódão em 2001

27%

42%

24%

4% 0%1%2%Analfabetismo

1º Ciclo

2º Ciclo

3º Ciclo

Secundário

Médio

Superior

Dis tribuição da população da Fregues ia do

Piódão por s ectores de actividade em 2001

61%21%

18%Primário

Secundário

Terciário

Gráfico 5 – Representação gráfica da distribuição da população do Concelho de Arganil, por sectores de actividade (2001).

Se considerarmos os dados de 2001 referentes à condição perante a actividade

económica dos representantes das famílias, constatamos que apenas em 53,7% dos casos se

tratam de indivíduos empregados. Nos restantes 46,3% dos casos estamos perante pessoas

sem actividade económica (reformados na sua maior parte). Os dados são ainda mais

significativos se nos ativermos ao conjunto da população residente com quinze ou mais anos:

apenas 18% está empregada, vivendo efectivamente do seu trabalho.

Gráfico 6 – Representação gráfica da população residente no Piódão, com 15 ou mais anos, segundo o principal meio de vida (2001)

Distribuição da população do Concelho de

Arganil por sectores de activ idade em 2001

16%

41%

43%

Primário

Secundário

Terciário

População res idente no Piódão, com 15 ou mais anos ,

segundo o principal meio de vida em 2001

61%10%

3%

18%

1% 7%

Reforma

A cargo da familia

Outra situação

Trabalho

Rendimentos

propriedade

Subsídios

3. Caracterização da Situação Actual

O contexto histórico, demográfico e geográfico do Piódão, abordado no anterior capítulo,

está na origem de um conjunto de dificuldades e carências que constituem, hoje em dia,

entraves poderosos ao desenvolvimento sustentado da Freguesia. Apesar disso, existem nesta

região relevantes mais-valias que, devidamente aproveitadas, poderão inverter a situação,

contribuindo assim decisivamente para o ordenamento do território e a qualidade de vida das

populações

Proceder-se-á, no decorrer neste capítulo, ao diagnóstico desses constrangimentos

estruturais, bem assim como à detecção dos principais recursos e potencialidades da Freguesia

do Piódão.

3.1. Constrangimentos Estruturais

Os factores de índole estrutural que configuram constrangimentos sérios ao

desenvolvimento do Piódão serão, por uma questão de metodologia, abordados em itens

separados. Sublinhe-se, no entanto, que a sua leitura deverá constituir um exercício de

apreensão global, dado estarmos perante fenómenos complexos, interligados numa teia densa

de causas e efeitos.

3.1.1. Isolamento Físico

O Piódão sofre os custos de uma interioridade profunda. Situada no ponto mais

inacessível e ermo da Serra do Açor (numa zona de transição entre três Províncias, três Distritos

e cinco Concelhos), a freguesia foi sempre vista pelas autoridades como uma terra inóspita e

rude, de características quase fronteiriças. Os piodenses, assim relegados para as suas

montanhas e vales, responderam ao isolamento com mais isolamento, curvando-se sobre os

seus afazeres e alheando-se do Mundo exterior. Os contactos entre os dois lados foram, durante

séculos, escassos e desconfiados.

É a partir deste enquadramento histórico/geográfico que devemos, em parte, situar o

actual isolamento da freguesia: hábitos interiorizados no decurso de muitas vidas determinaram

que ele possua, ainda hoje em dia, uma forte componente psicológica. A verdade, porém, é que

esta região continua a ser vítima de distâncias bem reais, com reflexos visíveis na vida

quotidiana. O Piódão sofre triplamente com a sua posição periférica em relação a Lisboa (300

km da sede de freguesia), Coimbra (106 km) e Arganil (41 km, percorridos em cerca de 50

minutos). É um facto que, neste momento, os lugares habitados são todos servidos por

razoáveis estradas alcatroadas, mas a configuração do terreno continua a tornar as

acessibilidades difíceis e morosas. A simples ida a um posto de correio implica uma deslocação

de 28 km, por estrada de serra, até Côja. Para aqueles (uma minoria) que têm carro próprio, as

bombas de gasolina mais próximas ficam em Côja ou Vide (11 km). Os outros, se não

aproveitarem boleias ocasionais, terão que programar as suas deslocações para o dia da

“carreira de Arganil”, às Quintas-feiras. O único táxi existente é reservado para os casos

urgentes, dada a exorbitância das taxas praticadas.

As escolas C + S mais próximas ficam em Côja ou na Ponte as Três Entradas (23 km) –

facto que, somado às dificuldades de transporte, acaba por provocar o êxodo do jovens (e, atrás

deles, invariavelmente, dos pais).

O acesso a algo tão básico para a qualidade de vida como a saúde (sobretudo se

pensarmos que a maioria da população tem mais de 50 anos) é também negativamente marcado

pelo estigma da interioridade: o Centro de Saúde mais próximo fica em Côja; as farmácias de

Coja e Vide distam, respectivamente, 22 e 11 km; a teórica vinda regular de um médico ao

Piódão e a Chãs d’Égua, exibe as marcas de uma irregularidade a que não será certamente

alheia a contrariedade da distância e o incómodo da deslocação. Some-se a isto o facto de o

Centro de Dia do Piódão funcionar em condições incipientes (não prestando, por exemplo,

qualquer apoio aos habitantes de algumas aldeias da freguesia) e ter-se-á uma ideia do grau de

abandono e isolamento a que estão votados os idosos desta freguesia.

3.1.2. Desertificação Humana

Como vimos no anterior capítulo, o fenómeno migratório das décadas de 60, 70 e 80,

provocou uma brutal diminuição do efectivo populacional da freguesia. Mais grave do que isso:

este êxodo em busca de melhores condições de vida afectou sobretudo a população jovem em

idade activa, o que contribuiu para desequilibrar profundamente a estrutura demográfica da

região. A população está actualmente muito envelhecida – facto que, num autêntico círculo

vicioso, gera taxas de mortalidade elevadas e taxas de natalidade cada vez mais baixas. Este

saldo fisiológico negativo agrava assim, ano após ano, o défice populacional da freguesia – o

que, num segundo círculo vicioso, vai gerar por sua vez insuficiência de recursos humanos

(neste momento ter-se-á tocado no fundo, não existindo sequer mão-de-obra para a actual oferta

de emprego), baixo nível de qualificação profissional, ausência de iniciativa individual, falta de

dinâmica empresarial.

O envelhecimento da população teve também outros efeitos dramáticos no tecido social

da freguesia: a inversão da pirâmide etária veio acentuar carências e necessidades na área do

apoio à 3ª idade; por seu turno, a diminuição da população jovem provocou o encerramento

progressivo das Escolas Primárias (das quatro anteriormente existentes apenas a do Piódão se

encontra ainda a funcionar, mas o facto de no próximo ano lectivo ficar com um único aluno

ditará certamente o seu fim).

O quadro é, pois, o de uma freguesia demograficamente deprimida, onde a

desertificação humana avança a passos largos. Dir-se-á que o fluxo turístico das duas últimas

décadas veio abrir novos horizontes, criando oportunidades de negócio e estimulando a oferta de

emprego nas áreas da restauração, hotelaria e construção civil. A verdade, porém, é que a essa

alteração da conjectura económica não correspondeu uma mudança equivalente na estrutura

demográfica: o irreversível processo de envelhecimento da população residente (para quem as

oportunidades chegaram tarde de mais) apenas poderia ser travado com o retorno à terra dos

que um dia tiveram de emigrar, mas esse regresso de conterrâneos em idade activa parece estar

ainda fortemente condicionado pelo peso de velhos juízos negativos sobre as condições

existentes. Verifica-se, apesar de tudo, o esboço de uma tendência para o retorno, sobretudo

entre os piodenses de segunda geração a viverem em Lisboa. Este movimento, ainda muito

tímido (limita-se quase sempre à expressão de uma vontade), poderá ganhar outras proporções

quando os pressupostos económicos e sociais se tornarem mais atractivos.

3.1.3. Desordenamento das Áreas Silvo-Pastoris

O abandono dos baldios em resultado da desertificação humana e da alteração do modo

de vida tradicional constituiu, sem dúvida, a causa primeira para o flagelo dos incêndios. A partir

dos anos 70, o surto migratório iniciado na década anterior começou a ter efeitos cada vez mais

evidentes no ordenamento da paisagem: florestas e matos – sinais de ruralidade desde sempre

associados aos baldios – foram as primeiras vítimas do êxodo demográfico. Entre os que

ficaram, as alterações dos padrões comportamentais foram igualmente muito rápidas – os mais

novos, desdenhando velhos ofícios como o de pastor ou de carvoeiro, procuraram profissões

que os mantivessem pelas aldeias e os identificassem com os sinais dos tempos; os mais velhos

também não conseguiram manter-se indiferentes aos ventos de mudança: o aumento das

reformas permitiu-lhes começar a encarar a criação de gado como um complemento das suas

economias, reduzindo assim drasticamente o número de cabeças e passando a pastoreá-las,

não nos baldios da serra, mas em terrenos próximos de casa. As zonas silvo-pastoris, deste

modo progressivamente abandonadas, transformaram-se em grandes acumulações de

biomassa, crescentemente propícias à ocorrência de incêndios florestais. Os intervalos cíclicos,

a serra passou então a ser pasto de chamas. Fogos devastadores reduziram ainda mais a cinzas

as esperanças dos que tinham teimado em permanecer nas aldeias.

Actualmente a situação mantém-se. De acordo com os critérios da Direcção Geral de

Florestas, o Piódão reúne todas as condições para ser classificado como “área extremamente

sensível a incêndios”. Senão vejamos: a ausência de gestão das áreas florestais – privadas ou

colectivas – é quase total; não se regista nenhuma operação de silvicultura preventiva ou

qualquer outro tipo de intervenção nos povoamentos existentes; os matos cresceram ao ponto

de já não se conseguir penetrar na maioria dos baldios de meia encosta; os corta-fogos estão

totalmente inoperantes. Se nada for feito para inverter a situação, poder-se-à dizer com

propriedade que a população da Freguesia do Piódão se habituou à resignada fatalidade de

esperar pelo próximo fogo.

3.1.4. Abandono da Propriedade Rural

Trabalhar a terra sempre foi, numa região de características serranas como a abrangida

pela Freguesia do Piódão, a mais ingrata das tarefas. A morfologia acidentada do terreno, a

fraca qualidade dos solos e o parcelamento extremo da propriedade obrigavam a um enorme

dispêndio de energia que depois não tinha a devida tradução num rendimento agrícola

satisfatório. O esforço hercúleo de cultivar os pequenos terraços ou quelhadas (recordemos que

o trabalho era todo braçal, dado a tracção animal não poder ser utilizada em tão minúsculas

propriedades) raramente tinha outro resultado que não o da perpetuação de uma pobreza que,

em muitos períodos históricos, assumiu contornos de fome e miséria extrema. Tudo isto,

potenciado nas últimas décadas pelo fenómeno migratório e pela rápida alteração de hábitos e

mentalidades, desvalorizou social e simbolicamente o trabalho agrícola. Hoje em dia o abandono

das terras é quase total: no Piódão não há já agricultores, no sentido tradicional do termo (muito

menos jovens agricultores). As actividades rurais resumem-se à sua expressão mais residual e a

maioria das fazendas está “de relva” ou “de mato”; os terraços vão-se desmoronando

lentamente; caminhos, levadas, palheiros, azenhas – todos os sinais de ruralidade desaparecem

debaixo das silvas e os terrenos agrícolas vão ficando tão abandonados quanto os silvo-pastoris;

a própria posse da terra se vai tornando uma questão nebulosa, de extremas sem donos, à

medida que desaparecem os últimos depositários da memória colectiva.

Se é verdade que a estrutura fundiária desta região, assente numa rede dispersa de

microfúndios, se não coaduna com a racionalidade produtiva da agricultura moderna, também

não é menos verdade que ela imprime, com os seus impressionantes socalcos, uma marca

cultural à paisagem, tornando-se assim veículo identitário de uma especificidade que urge

conservar. O destino de aldeias como o Piódão ou Chãs d’Égua estará sempre

indissoluvelmente ligado à forma como conseguirem gerir e ordenar os traços da sua ruralidade.

3.1.5. Degradação Arquitectónica

A reabilitação urbana do Piódão tem servido de capa legal à degradação acelerada do

importante património arquitectónico da aldeia. Mata-se assim, a pretexto da sua conservação, a

galinha dos ovos de ouro. Na prática, a recuperação de um conjunto tão valioso em termos de

arquitectura rural exigiria, para além do conhecimento profundo da realidade local, o empenho

dos diversos poderes políticos envolvidos (Município de Arganil e CCRC, sobretudo) na definição

de regras claras de recuperação exterior dos edifícios e na criação de mecanismos eficazes de

sensibilização da população. Não é isso, porém, o que tem acontecido: é certo que o Plano

Director Municipal veio preencher uma importante lacuna no que diz respeito ao planeamento e

delimitação do crescimento no interior da malha urbana, mas continua a faltar um regulamento

de construção e reabilitação de imóveis, cujas normas definam concretamente as características

técnicas e estilísticas do modo de construção tradicional. Está assim aberto um vazio legal por

onde, passo a passo, se assiste à desfiguração da aldeia: cimento à vista, paredes demasiado

uniformes, portas e janelas de alumínio (desde que sejam pintadas de azul), esquinas cortadas à

rebarbadora, telhados com lajes de outras regiões, escadas exteriores de ferro – tudo parece ser

possível desde que as casas sejam “capeadas” com xisto. Acresce a isto que a sensibilização da

população local para as vantagens da reabilitação urbana não tem sido devidamente acautelada:

registaram-se algumas acções de informação sobre apoios financeiros para a recuperação de

imóveis e houve também algumas medidas pontuais de incentivo (nomeadamente a oferta de

materiais); no essencial, porém, os moradores continuam a sentir-se alheados desse conjunto

contraditório e ineficaz de regras e proibições, cuja lógica lhes escapa mas de cujas

arbitrariedades se apercebem.

Não basta, além disso, recuperar habitações – é também necessário vivificar os espaços

públicos, integrando-os de forma harmoniosa na malha urbana. A praça de acesso à aldeia é um

bom exemplo do muito que, nesse campo, ainda há a fazer: este local, quer pela sua

centralidade simbólica, quer pelo impacto que exerce junto de quem chega, deveria ser objecto

de uma intervenção cuidada que reanimasse as suas antigas funções de sociabilidade e

convivialidade. Em vez disso está transformado num misto de bazar e de parque de

estacionamento, repelindo para outras paragens a população local e acabando por não ser um

instrumento útil na divulgação de uma imagem de qualidade associada ao turismo no Piódão.

3.1.6. Ausência de Gestão Local Participada

Os problemas de comunicação entre a população e as autoridades não se esgotam no

atribulado processo de reabilitação urbana do Piódão. Trata-se, de facto, de um divórcio longo

de séculos, cuja explicação primeira reside no isolamento a que as populações serranas sempre

estiveram votadas. Ignorados pelo poder ou, quando necessário, olhados com complacência e

paternalismo, os habitantes da freguesia foram interiorizando uma atitude de profunda reserva e

cautela em relação a todas as formas de autoridade. Cada reclamação não atendida, cada nova

injustiça ou afronta, servia apenas para lhes confirmar a justeza dessa desconfiança, renovando

razões para a hostilidade e tornando o relacionamento ainda mais difícil. Este padrão

comportamental, agravado nas últimas décadas por novas questões, torna neste momento muito

difícil obter a ausência das populações para qualquer processo de tomada de decisão que lhes

seja exterior.

Ao mesmo tempo foram-se perdendo velhos hábitos de autarcia e gestão participada (o

pastoreio colectivo, o uso das águas e dos fornos comunitários, a administração dos baldios, as

reuniões ao Domingo no adro da igreja) que poderiam, hoje em dia, constituir o ponto de partida

para novas formas de intervenção nos assuntos da comunidade. Cada um se fecha no seu

mundo com uma obstinação de pedra, remetendo-se ao silêncio dos afazeres quotidianos e

interagindo com os outros apenas na medida do essencial.

3.2. Principais Recursos e Potencialidades

Abordaremos a seguir o conjunto de recursos e potencialidades que poderão num futuro

próximo contrariar os constrangimentos estruturais, assumindo-se assim como alavancas

indispensáveis ao desenvolvimento sustentado da Freguesia do Piódão. No entanto, uma vez

que estamos perante uma trama complexa de questões interligadas, a enumeração destas mais-

valias apenas fará completo sentido no quadro de uma leitura global e integrada da realidade.

3.2.1. Património Arquitectónico

Apesar dos cada vez mais evidentes sinais de descaracterização (muitas vezes

apresentados como “recuperações”), a aldeia do Piódão continua a ser um conjunto urbano de

reconhecido valor arquitectónico e grande coerência estética. A sua implantação em anfiteatro

de meia encosta; o enquadramento harmonioso na topografia e paisagem envolvente; as casas

de dois pisos, a acompanharem o declive do terreno; o traçado irregular das suas ruas estreitas

e tortuosas; as escadas que vencem os desníveis mais acentuados; os pequenos largos e

recantos inesperados – tudo isso impressiona fortemente os visitantes. Com razão, de resto: a

malha urbana da povoação constitui um dos melhores exemplos de coerência formal e

volumétrica na arquitectura rural portuguesa. Preservar esse conjunto de características

constitui, assim, um acto de bom senso e de gestão equilibrada dos recursos existentes no

território da freguesia. É necessário evitarem-se adulterações nas fachadas, rupturas tipológicas

na construção de novos edifícios ou mutilações visuais na harmonia do conjunto (como é,

actualmente, o caso do largo).

Mas o património construído da freguesia não se resume à aldeia do Piódão. Existem

outros conjuntos urbanísticos, de reconhecido valor cujas potencialidades ainda estão por

explorar (os Pés Escaldados, por exemplo). Há também que valorizar as marcas específicas de

ruralidade – terraços, azenhas, lagares, palheiros, pontes, etc.

3.2.2. Cultura e Tradições

A época actual é universalizante e globalizadora. Por muitos meios – música, televisão,

emigração, turismo – ideias e valores exógenos chegaram nos últimos decénios ao Piódão e às

outras aldeias da freguesia, misturando-se de forma quase sempre desarmónica com ideias e

valores locais. Assistimos assim a um processo de ruptura entre os actores sociais e os sistemas

culturais estabelecidos. Sabe-se, no entanto, que as raízes de um povo entroncam na sua

memória colectiva: olvidar o passado significa quase sempre cair na aculturação, na rápida

desagregação social e na perca de identidade. Uma cultura só permanece viva enquanto houver

um corpo significativo de actos, objectos e histórias reconhecido por todos como pertencendo a

um legado comum. Esta herança identitária é a base da coesão comunitária, o cimento sobre o

qual se podem, com segurança, erguer os alicerces dos dias futuros.

Na Freguesia do Piódão, os objectos da casa e da terra, os usos e costumes, as lendas

e histórias, foram já alvo de uma recolha que culminou na instalação do Museu do Piódão.

Apesar disso, muito mais há a fazer neste domínio. O manancial da cultura e tradições populares

é um dos mais significativos recursos da região, contribuindo o seu estudo e divulgação para a

redinamização da vida comunitária e para a requalificação da oferta turística.

3.2.3. Património Histórico e Arqueológico

Até há pouco tempo considerava-se que a freguesia, apesar de incluir uma aldeia

denominada “histórica”, tinha um passado relativamente pobre e ignorado. A matéria escrita

escasseava e os registos orais, confundindo a lenda com a realidade, concentravam o essencial

da informação em três momentos chave: o ”tempo dos mouros”, o “tempo dos bandidos” e o

“tempo do vigário Nogueira”. Se não havia História (pelo menos no sentido documental do termo)

muito menos havia Património Histórico: tudo se parecia resumir à Igreja Matriz do Piódão e ao

conjunto monumental da aldeia (proclamado, sem mais explicações, de histórico, quando

pareceria ter mais cabimento classificá-lo por referência a valores arquitectónicos e culturais).

A reavaliação da verdadeira importância e monumentalidade da denominada “Estrada

Real” e, sobretudo, a recente descoberta de um conjunto notável de rochas com arte rupestre do

Bronze Final (concentradas, sobretudo, em torno de Chãs d’Égua), veio demonstrar que afinal a

freguesia também possui o seu património histórico – e porventura dos mais significativos. As

lendas de mouros e bandidos eram, no fundo, sobrevivências de registos antigos, funcionando

como metáforas de uma memória difusa onde se sobrepunham diversos períodos, culturas e

religiões.

Digamos, pois, que a Freguesia do Piódão possui um insuspeito passado e um relevante

património histórico-arqueológico, constituindo, por isso, uma nova e importante mais-valia para

o desenvolvimento de um turismo de qualidade na região.

3.2.4. Artesanato e Produtos Endógenos

A chegada do turismo ao Piódão foi tardia, acontecendo numa altura em que a

desertificação humana e o envelhecimento da população já tinham deixado marcas profundas na

capacidade de iniciativa e no tecido económico da freguesia. Por esse motivo, a resposta local à

súbita procura de artesanato e de produtos endógenos foi praticamente nula. Esta situação de

absoluta fragilidade das estruturas produtivas empurrou os comerciantes para a mais equívoca

das soluções: sob rotulagem falsa (“Recordação do Piódão”, “Produto do Piódão”, etc.)

passaram a vender produtos de outras proveniências.

O uso indevido de uma designação geográfica tão específica para a promoção de coisas

que (tirando o caso do artesanato em xisto) nada têm a ver com a região continua, hoje em dia, a

ser uma prática usual. A protecção do bom-nome do Piódão tem, no entanto, tudo a perder com

esta estratégia comercial que aposta na mistificação, relacionando artigos, não com o local onde

são fabricados, mas com o sítio onde são vendidos. Para que a designação Piódão pudesse ter

credibilidade, ela deveria rotular apenas produções locais ou regionais que utilizassem matérias-

primas e/ou técnicas reconhecidamente tradicionais. É o caso, por exemplo, do artesanato em

xisto, das réplicas de objectos etnográficos, de produtos como o mel, as aguardentes, as

castanhas piladas, o queijo de cabra ou o carvão. O potencial é enorme, mas há que começar

quase de início, comercializando as produções locais através de circuitos curtos que as liguem

de forma efectiva às práticas tradicionais e à história do território. A criação de algumas

certificações no âmbito geográfico da Serra do Açor pode, talvez, ser uma estratégia a longo

prazo; até lá muito há, no entanto, a fazer para tirar o máximo partido das certificações já

existentes (no caso do mel), estimular a produção local e, sobretudo, disciplinar a utilização

abusiva da imagem do Piódão.

3.2.5. Recursos Naturais

A optimização dos imensos recursos naturais existentes constitui, muito provavelmente,

a chave para o desenvolvimento da freguesia a curto e a médio prazo. Há, por exemplo, que dar

especial atenção à recuperação dos usos tradicionais do território: as áreas mais elevadas foram

desde sempre propícias ao pastoreio e ao fabrico de carvão; os terrenos úmbrios de meia

encosta são, de há muito, ideais para a plantação de castanheiros; as zonas soalheiras têm

condições reconhecidas para a apicultura e as actividades cinegéticas; as potencialidades

hídricas das terras baixas podem ser reaproveitadas em contextos lúdicos.

A Serra tem vindo também a revelar-se fértil em recursos até à pouco insuspeitos: é o

caso das águas minerais (uma área em que tudo está ainda está por fazer), do vento (cujo

aproveitamento - de importância vital para a sustentabilidade deste plano de acção

integrada - se iniciará em breve, com a construção do primeiro parque eólico) e da flora (a

riqueza neste domínio pode medir-se pela inclusão de uma extensa zona dos baldios como Área

Classificada da Rede Natura 2000). O valor paisagístico e ecológico da região constitui, além

disso, uma importante ferramenta de gestão e reordenamento da actividade turística, permitindo

num futuro próximo canalizá-la cada vez mais para actividades ligadas ao usufruto da Natureza e

do Meio Ambiente.

3.2.6. Turismo

O turismo constitui, neste momento, o principal factor de dinamização e desenvolvimento

da Freguesia do Piódão. Ao colocar a região no mapa do país real, ele devolveu-lhe dignidade e

auto-estima, reintegrando-a simbolicamente num todo a que durante séculos pareceu não ter

pertencido. A actividade turística teve, além deste importante efeito psicológico, alguns

resultados práticos que importa sublinhar: permitiu a melhoria das acessibilidades, promoveu a

construção de infra-estruturas fundamentais, estimulou a criação de empregos nas áreas do

comércio e da construção civil. É sabido, no entanto, que o Piódão não estava preparado para a

súbita demanda de visitantes a que foi sujeito. Esta carga excessiva (por vezes mesmo brutal)

de forasteiros contribuiu assim para a descaracterização cultural e arquitectónica da aldeia.

Para que o Piódão passe a usar o turismo (em vez de ser por ele usado) há que

repensar profundamente o papel desta actividade no futuro da região: ela deverá, não só gerar

rendimentos e empregos, como promover bens e serviços úteis a toda a comunidade; deverá

também ser um factor acrescido de identidade cultural, contribuindo para a preservação das

memórias e tradições; terá que coadunar-se com o respeito pelo ambiente e a gestão equilibrada

do território; terá, por fim, que promover oportunidades iguais entre aldeias, deixando de se

concentrar exclusivamente na sede de freguesia. Quando isso acontecer, a imagem do Piódão

deixará de estar associada ao rolo compressor do turismo de massas, passando antes a ser

sinónimo de qualidade no usufruto da natureza e da cultura.

4. Minimização dos Constrangimentos e Valorização dos Recursos

4.1. Medidas Propostas

No anterior capítulo procedemos ao diagnóstico das principais dificuldades e

potencialidades da Freguesia do Piódão, identificando deste modo algumas áreas de intervenção

prioritária. Na sequência dessa abordagem proporemos agora um conjunto de acções que

permitam minimizar os constrangimentos, bloqueando condicionantes e factores negativos;

indicaremos também algumas medidas de valorização dos recursos, capazes de estimularem

vantagens e propiciarem o aproveitamento de mais-valias. Tratando-se de recomendações de

carácter geral, a responsabilidade prática da sua execução pertence em grande medida às

entidades políticas que intervêm habitualmente na gestão do território: Município de Arganil,

Junta de Freguesia do Piódão e Comissão de Coordenação da Região Centro. Novos parceiros

sociais – como os Compartes – poderão, no entanto, assumir um papel decisivo em diversas

áreas chave.

4.1.1. Medidas para a Minimização dos Constrangimentos

4.1.1.1. Isolamento Físico

- manter e melhorar as estradas de acesso (alargamento dos tapetes e eliminação de algumas

curvas);

- reforçar a periodicidade do transporte colectivo para Arganil;

- disponibilizar transportes escolares eficientes;

- adquirir um meio de transporte para doentes e idosos;

- construir um novo posto médico;

- melhorar e tornar mais regular a assistência médica;

- melhorar o funcionamento do Centro de Dia do Piódão;

- criar extensões do Centro de Dia em algumas aldeias.

4.1.1.2. Desertificação Humana

- incentivar a fixação de casais jovens (medidas de descriminação positiva);

- abrir uma escola de ensino pré-primário;

- promover o emprego e as oportunidades e investimento;

- criar condições para o regresso dos mais velhos (melhor assistência social, mais apoio à 3ª

idade).

4.1.1.3. Desordenamento das Áreas Silvo-Pastoris

- realizar operações de silvicultura preventiva;

- reforçar os meios de prevenção e ataque aos fogos;

- tomar medidas de reflorestação e ordenamento florestal;

- redinamizar os usos tradicionais dos baldios (apicultura, pastoreio, fabrico de carvão, apanha

do medronho);

- promover novos usos para os baldios (produção de energia, fruição da natureza, etc.).

4.1.1.4. Abandono da Propriedade Rural

- estimular a agricultura familiar em torno das aldeias;

- realizar operações de limpeza dos terrenos, caminhos e linhas de água;

- conservar as principais marcas de ruralidade;

- actualizar o cadastro das terras;

- promover o emparcelamento da propriedade e a cooperação entre agricultores.

4.1.1.5. Ausência de Gestão Local Participada

- promover o esclarecimento e informação das populações;

- assegurar o diálogo entre os diversos órgãos de poder e os residentes locais (auscultar

opiniões);

- recuperar formas tradicionais de gestão comunitária (os compartes, por exemplo);

- qualificar os recursos humanos.

4.1.1.6. Degradação Arquitectónica

- publicar regulamentação sobre a construção e reabilitação de edifícios tradicionais;

- ordenar o crescimento da malha urbana (do Piódão e das outras aldeias);

- disciplinar o uso dos espaços públicos;

- incentivar a construção tradicional.

4.1.2. Medidas para a Valorização dos Recursos

4.1.2.1. Património Arquitectónico

- todas as medidas descritas em “degradação arquitectónica”;

além disso:

- realizar um trabalho de investigação sobre a arquitectura tradicional do Piódão;

- publicar os resultados em suporte gráfico e digital.

4.1.2.2. Cultura e Tradições

- promover a investigação e recolha de espólio etnográfico;

- estimular a transmissão de saberes entre os mais velhos e os mais novos;

- editar livros e outro tipo de publicações sobre a cultura e tradições locais;

- instalar pólos museológicos em edifícios tradicionais (fornos, lagares, moinhos).

4.1.2.3. Património Histórico e Construído

- estudar, inventariar e proteger a arte rupestre da freguesia;

- promover escavações arqueológicas;

- criar um centro de interpretação de arte rupestre e vários circuitos de descoberta;

- estudar e proteger e divulgar a antiga Estrada Real (criar um circuito de descoberta).

4.1.2.4. Artesanato e Produtos Endógenos

- definir qual o artesanato e quais os produtos endógenos da região;

- estabelecer critérios para a utilização das rotulagens “Produto do Piódão” e “Artesanato do

Piódão”;

- estimular a produção local de artesanato e produtos endógenos;

- promover a gastronomia local.

4.1.2.5. Recursos Naturais

- criar zonas de lazer e fruição paisagística;

- ordenar e proteger as zonas ribeirinhas;

- proteger e divulgar a fauna e flora locais;

- proceder a um estudo sobre os recursos hídricos e as potencialidades em águas minerais da

região;

- instalar parques eólicos na freguesia.

4.1.2.6. Turismo

- promover e divulgar a imagem do Piódão;

- incentivar a formação de empresas de prestações de serviços na área da animação turística;

- diversificar a oferta turística;

- descentralizar o turismo, fazendo-o chegar a todas as aldeias da freguesia;

- promover novas formas de turismo (turismo cultural, eco-turismo, turismo de aventura, etc.);

- criar uma rede integrada de quartos instalados em casas de residentes.

5. Plano de Acção Integrada para a Freguesia do Piódão

5.1. Entidades Promotoras

Junta de Freguesia do Piódão e Associação de Compartes da Freguesia do Piódão.

5.2. Áreas de Intervenção

Baldios da Freguesia; outras áreas e equipamentos de usufruto colectivo; instituições de

carácter social.

Sendo este plano considerado um projecto-piloto, a futura da área de intervenção não se

resume, necessariamente, ao território da Freguesia do Piódão.

5.3. Descrição do Projecto

Este conjunto de iniciativas integradas pretende, em primeiro lugar, devolver aos baldios

os usos múltiplos que em tempos já possuíram, ultrapassando uma visão redutora que os conota

excessivamente com a floresta. A questão, sendo mais vasta do que isso, passa também pelas

questionáveis aptidões silvícolas da região. As políticas intensivas de florestação do Estado

Novo não lograram produzir os resultados que seriam de esperar, o que se explica devido às

características difíceis do clima e solos locais. A floresta nunca constituiu, assim, um recurso

importante para a freguesia, nem jamais qualquer particular conseguiu viver maioritariamente do

rendimento das suas matas. Na Freguesia do Piódão nunca existiram produtores florestais – o

que houve, e continua a haver, são pequenos proprietários florestais.

Não fará, além disso, qualquer sentido considerar os baldios da freguesia como uma

unidade de gestão puramente florestal no momento em que eles são de novo sinónimo de

recursos vários – existem áreas com potencial energético para produção de energia eólica;

outras com valor natural elevado, já integradas na rede Natura 2000; outras ainda com

potencialidades paisagísticas e arqueológicas que poderão ser exploradas em termos turísticos.

O ordenamento silvícola (embora importante, para diminuir o perigo e incêndios) será apenas o

ponto de partida para a gestão das potencialidades múltiplas dos baldios, desta forma se

conseguindo o propósito mais abrangente do ordenamento do território.

A ideia é, pois, eleger os baldios como núcleo estruturante de um projecto com efeitos

concêntricos sobre o desenvolvimento de toda a freguesia. O vector silvo-pastoril – sustentado

economicamente pela produção da energia eólica - terá um efeito despoletador sobre uma

série de iniciativas de desenvolvimento rural que procurarão assegurar as condições da sua

sustentabilidade, através sobretudo da utilização reprodutiva dos recursos existentes e dos

investimentos feitos. A sistematização dos dados através de um Sistema de Informação

Geográfica (SIG), será uma ferramenta de gestão fundamental para se atingirem os objectivos

propostos, permitindo a criação de um sistema de informação e apoio à decisão.

É preciso olhar para o todo e não apenas para uma parte do problema – por isso, o

plano também pretende ir para além de uma área específica de intervenção, assumindo-se como

um projecto estruturante para a região, uma iniciativa de carácter integrado que ajudará a definir

os modelos de desenvolvimento futuro. Para isso é fundamental que se consiga suscitar a

adesão da população residente, gerando-se um consenso mobilizador em torno dos principais

objectivos. Até aqui, as ideias sobre o Piódão têm sido quase sempre impostas de fora para

dentro, o que provoca um défice de diálogo e uma ausência de gestão participada. Entre as

diversas instituições e o cidadão comum existe uma “terra de ninguém”, que pode ser preenchida

por um acção integrada deste tipo.

O projecto pretende igualmente contribuir para melhorar a qualidade de vida das

populações, dando especial atenção às questões sociais, gerando oportunidades de emprego e

apostando na formação e capacitação individual. Criar-se-ão deste modo condições para a

promoção de modos de vida sustentáveis (significando isso actividades estáveis e dignas, que

sejam benéficas para a comunidade, não comprometam a segurança pessoal e colectiva, e não

seja incompatíveis com o meio ambiente). O renascimento dos tecidos demográfico, social e

económico passará pela aposta na implementação de infra estruturas de qualidade, que possam

atrair novos investidores e moradores.

As acções a concretizar, embora sendo de carácter global e integrado, serão, por uma

questão de operacionalidade, agrupadas em quatro áreas de intervenção distintas:

a) Natureza e ambiente – Pretende-se ordenar as áreas silvo-pastoris e dar um uso

múltiplo aos baldios, promovendo a conservação, valorização e divulgação dos recursos naturais

e ambientais no seu todo. A instalação de parques eólicos e a inclusão de parte dos baldios na

Rede Natura 2000 deverão ser encaradas como duas importantes mais valias, a serem

ponderadamente exploradas no futuro.

b) Turismo e cultura – A gestão dos baldios e dos diversos equipamentos colectivos

privilegiarão o seu potencial uso turístico. A utilização criteriosa destes recursos permitirá a

descentralização da oferta turística por toda a freguesia, contribuindo assim para a divulgação de

uma nova imagem do Piódão, associada à fruição da natureza e da cultura. A promoção deste

turismo de qualidade poderá revelar-se uma iniciativa abrangente em termos de Serra do Açor,

funcionando o Piódão como plataforma logística para a demanda de toda esta região.

c) Área social – Esta componente é particularmente importante. Um território

despovoado ou demograficamente envelhecido acaba por perder a sua dinâmica económica e

por ver diluídas as suas matrizes culturais específicas. É necessário, por isso, redinamizar as

estruturas de povoamento, criando condições sociais atractivas para a fixação de casais jovens

na região. O apoio social é também particularmente importante para que se possam garantir

condições de vida dignas a uma população que continuará a ser maioritariamente idosa.

d) Apoio técnico e monitorização dos recursos – A criação de um gabinete de apoio

técnico permitirá prestar uma preciosa ajuda à população local. Paralelamente, a elaboração de

uma base de dados sobre a Freguesia colocará as tecnologias da informação ao serviço do

desenvolvimento rural, criando condições para a promoção do turismo e ajudando a resolver

algumas questões estruturais fundamentais – a mais importante das quais é certamente a

titularidade da posse da terra (poucas parcelas estão registadas na conservatória em nome do

proprietário). A informatização dos dados através da elaboração de um Sistema de Informação

Geográfica cruzará informação georeferenciada com informação alfanumérica (nome do

proprietário, número de contribuinte, se recebe subsídio ou não, etc.). Outros dados podem ser

incluídas na cartografia digital: os caminhos, linhas de água e socalcos que precisam ser limpos;

a localização da sinalética, das condutas de água, das linhas de electricidade e de telefone; as

zonas de risco de incêndio; os caminhos e aceiros existentes; os locais de interesse turístico,

natural e arqueológico; etc.

5.4. Objectivos Gerais

De acordo com o que atrás ficou exposto, o Plano de Acção Integrada para a Freguesia

do Piódão visará atingir os seguintes objectivos gerais:

- Ser um projecto-piloto bem sucedido e de referência para outras Freguesias

- Mobilizar recursos e potencialidades no âmbito de um território concreto

- Promover o planeamento integrado e o desenvolvimento sustentado

- Dar um uso múltiplo aos baldios

- Promover a valorização da paisagem e a conservação da natureza

- Promover o ordenamento florestal e o ordenamento do território

- Prevenir os riscos de incêndio

- Promover produtos, usos e saberes tradicionais

- Desenvolver sinergias entre as aldeias e promover a descentralização

- Reanimar a vida da comunidade e prestar serviços às populações

- Preservar o património construído e o ambiente rural

- Desenvolver o turismo de natureza e o turismo cultural

- Melhorar a qualidade de vida da população e ajudar à sua capacitação

- Favorecer o desenvolvimento demográfico e a fixação de populações

- Gerir recursos através da utilização de novas ferramentas informáticas

- Aumentar a oferta de emprego na Freguesia

5.5. Propostas de Intervenção

Estes objectivos centrais serão, nas quatro áreas chave, concretizados através de

acções de carácter específico:

a) Natureza e ambiente

- Criação de uma equipa de Sapadores Florestais;

- Arborização de alguns terrenos baldios com espécies adequadas (criação de descontinuidades

no coberto vegetal, através da introdução de espécies menos combustíveis);

- Rearborização de áreas ardidas através do aproveitamento da regeneração natural (certos

pinhais, encostas com castanheiros, etc.);

- Reconversão de alguns povoamentos mal instalados (sobretudo pinhais em torno de

povoações ou em cotas demasiado altas);

- Beneficiação florestal (corta-fogos, aceiros verdes e outras áreas tampão; pontos de água,

caminhos);

- Manutenção dos usos tradicionais dos espaços baldios (pastoreio, actividades cinegéticas).

- Conservação da área dos baldios incluída na Rede Natura 2000;

- Valorização e conservação dos espaços florestais de interesse público (a catraia de S. Pedro,

os bosquetes de carvalhos da Malhada do Bago, alguns castanheiros centenários, etc.);

- Qualificação e divulgação de outros recursos tradicionais dos baldios (mel, medronho, carvão,

queijo, etc.);

- Aproveitamento do potencial eólico dos baldios (instalação de parques eólicos);

- Implementação de uma infra-estrutura de apoio, formação e prestação de serviços à população

na área agrícola e silvo- pastoril;

- Aproveitamento dos recursos cinegéticos para a delimitação de uma reserva de caça.

- Valorização dos socalcos da região

b) Turismo e cultura:

- Promoção da Freguesia do Piódão através da edição de livros, realização de encontros,

colóquios e outras iniciativas;

- Criação do Museu do azeite, em Foz d’Égua;

- Criação de um Centro de Interpretação de Energias Renováveis (Hídrica), Fórnea;

- Recriação do forno colectivo, no Piódão;

- Criação de um Centro de Interpretação da Fauna e Flora, na Malhada Chã (antiga casa

florestal);

- Criação de um Centro de Interpretação das Energias Renováveis (Eólica), no Tojo;

- Criação de um Centro de Interpretação de Arte Rupestre, em Chãs de Égua;

- Construção de novos espaços de lazer, como parques de merendas, miradouros, praias

fluviais;

- Sinalização e limpeza de percursos para passeios pedonais e em BTT (criação de dois circuitos

pedestres de carácter histórico: Em busca da Estrada Real e Nos Trilhos da Arte Rupestre;)

- Criação de uma imagem de marca (por exemplo, produtos locais do Piódão) para valorizar os

produtos locais (agrícolas, silvo-pastoris ou artesanais);

c) Área social:

- Apoio à reestruturação do Centro de Dia do Piódão (melhoria das condições existentes,

contratação de um assistente social, criação de valências no âmbito do serviço domiciliar e

nocturno; extensão da assistência às outras aldeias, etc);

- Criação de um Centro de Apoio ao Ensino Pré-Escolar (com creche, pré-primária e OTL);

- Criação de um Centro de Acolhimento para Escolas do 1º Ciclo (com horta pedagógica e outras

acções de sensibilização ambiental);

- Qualificação e formação dos recursos humanos existentes na freguesia.

d) Apoio técnico e monitorização dos recursos:

- Criação de um gabinete de apoio técnico ao desenvolvimento rural;

- Criação de uma base de dados geográfica;

- Elaboração de um Sistema de Informação Geográfica (SIG);

- Criação de um portal na Internet que promova e divulgue os recursos Freguesia do Piódão;

- Elaboração de uma Carta de Lazer do Piódão (através de elementos cartográficos digitais).

- Promoção da agricultura familiar em torno das aldeias (defesa, nos órgãos próprios, da

atribuição de um valor económico específico à manutenção da ruralidade).

5.6. Calendarização das Acções

As acções propostas serão realizadas, de forma gradual e faseada. O horizonte temporal

aponta, assim, para a existência de planos de intervenção a curto prazo (um ano), médio prazo

(dois a três anos) e longo prazo (quatro a dez anos)8.

Não havendo critérios pré-estabelecidos para a priorização destas medidas (todas elas

são, do nosso ponto de vista, igualmente importantes), a sua futura calendarização dependerá

das parcerias institucionais e do acesso a meios de financiamento9 que garantam, em cada caso

específico, a disponibilização dos recursos humanos e materiais necessários à concretização

8 O SIG, por exemplo, é um trabalho de fôlego, para cerca de 10 anos: num primeiro momento a cartografia digital

da freguesia incidirá sobre a delimitação dos terrenos baldios e dos diversos locais de interesse ecológico, arqueológico, turístico, etc. O mapa irá sendo depois preenchido, como se de um puzzle se tratasse, até incluir toda a informação disponível sobre a freguesia. 9 O financiamento de uma determinada acção é um processo técnico e político complexo, cujo sucesso depende

quase sempre do grau de envolvimento do Município de Arganil. Não cabe no âmbito deste estudo tecer considerações exaustivas sobre o assunto, mas é importante saber quais as alternativas que existem. Indicaremos por isso, de forma sumária, alguns programas de apoio a projectos nas áreas do Desenvolvimento Rural, Florestas, Ambiente e Cultura: “Acção Integrada de Base Territorial do Pinhal Interior” – (Portaria nº 72/2001 de 7 de Fevereiro): promoção da arborização, beneficiação e reforço da multifuncionalidade dos espaços florestais; modernização e desenvolvimento das actividades de exploração florestal e de transformação e comercialização dos produtos florestais; divulgação dos produtos florestais; prestação de serviços florestais especializados; valorização e conservação dos espaços florestais de interesse público; prevenção de riscos por agentes bióticos e abióticos (entre outros objectivos). “Programa AGRIS” - Sub acção 3.4: Unidade de Gestão Florestal (prevenção de riscos provocados por agentes bióticos e abióticos). Sub-acção 7.1: Recuperação e valorização do Património, da Paisagem e dos Núcleos Populacionais em Meio Rural. “Programa LEADER+”: Teoricamente este programa de apoio ao desenvolvimento, gerido pela ADIBER, aplica-se a toda a região da Beira-Serra. Na prática, a freguesia do Piódão tem sido sistematicamente excluída das medidas elegíveis, sob a alegação de que beneficia de outros fundos de financiamento. “Programa das Aldeias Históricas de Portugal”: Cumprido o essencial do seu papel e esgotados os fundos mais significativos, há agora a esperar apoios pontuais, sobretudo em iniciativas de carácter cultural (como foi o caso do apoio ao Município de Arganil para a instalação do Núcleo Museológico do Piódão). “Rede das Aldeias de Xisto”: Apesar do Piódão ter ficado excluído da Rede das Aldeias e Xisto, a Freguesia pode futuramente beneficiar de algumas acções na área da formação profissional. “Plano de Formação da Vertente Turística para a Região do Pinhal Interior”: Curso de atendimento e informação turística; curso de animadores e monitores de desporto aventura; curso de animadores da Rede de Aldeias. “Programa Operacional da Cultura” – Eixo1, Medida 1.1: recuperação e valorização de monumentos classificados, sítios arqueológicos e outros locais e interesse histórico; edição de publicações e outros suportes documentais e digitais com conteúdos relativos ao património; acontecimentos culturais ligados à valorização e animação do património. Programa Operacional do Ambiente – Eixo 1, Medida 1.1: conservação, valorização e promoção do património natural pertencente à Rede Nacional de Áreas Protegidas (incluindo a Rede Natura 2000), nomeadamente através do apoio a estudos e acções de gestão para espécies e habitats, criação de infra-estruturas de apoio ao turismo de natureza, acções de apoio ao desenvolvimento local.

das acções. Os eventuais rendimentos provenientes de novas concessões de parques

eólicos assumirão também uma importância decisiva no contexto da viabilização

económica de todo o projecto.

5.7. Gestão do Projecto

A gestão diária das múltiplas componentes práticas do projecto passa, necessariamente,

pela criação de um órgão de gestão, um órgão consultivo e de uma estrutura de apoio técnico.

Quanto ao órgão deliberativo do presente plano, este provem dos órgãos deliberativos das

entidades proponentes.

A implementação sectorial das acções preconizadas será também feita através do

desenvolvimento de parcerias e da celebração de protocolos com entidades, públicas e privadas,

com as quais exista complementaridade de objectivos. Como exemplos destas parcerias:

PROFIFORMA

CNA

ENERNOVA

Assembleia

de Compartes

de Chãs

d’Égua

ESAC

DRABL

Iniciativa

Privada

Câmara

Municipal

de Arganil

Comissões

de

Melhoramentos

ICN

Associação

Compartes

+

Junta

Freguesia

- Comissão de Melhoramentos do

Piódão;

- Comissão de Melhoramentos de

Malhada Chã;

- Comissão de Melhoramentos da

Fórnea;

- Comissão de Melhoramentos do Tojo;

- União Progressiva de Chãs d’Égua;

- Clube dos Amigos de Foz d’Égua;

Como exemplo: Aldeia Dinâmica, Turismo e

Agro-pecuária Lda.

Figura 4 – Diagrama ilustrativo das Entidades/Instituições parceiras, actualmente no “Plano de Acção Integrada para a Freguesia do Piódão”, com a Junta de Freguesia do Piódão e a Associação de Compartes da Freguesia do Piódão.

6. Conclusão

O Conselho Directivo da Associação de Compartes da Freguesia do Piódão acredita que

a freguesia tem, neste momento, recursos suficientes para deixar de ser uma mera soma de

lugares visitáveis e voltar a assumir-se como um território habitado e ordenado. Estão,

finalmente, criadas condições para se ultrapassarem as desvantagens comparativas que têm

condicionado o desenvolvimento da região – mas para isso, é necessário repensar o actual

modelo de desenvolvimento. Contribuir para essa urgente reflexão, propor um conjunto

articulado de medidas, estabelecer, na sequência disso, acordos de actuação com outras

entidades: são estes os propósitos que nos movem.

Estamos abertos ao trabalho em rede e a futuras experiências de parcerias territoriais

com outras entidades/instituições. Pensamos que este tipo de intervenção não se deve restringir

a uma área limitada à freguesia, mas sim, a uma vasta região que concentra uma

homogeneidade de valores, cultura e interesses.

Estamos conscientes da extensão do desafio – algumas propostas do plano poderão

não ser realizáveis, ou mesmo, adequar-se-ão melhor às competências de outras entidades.

Que seja: não pretendemos ser infalíveis ou exorbitar competências, mas sim encetar os

primeiros passos de uma caminhada em conjunto.

No fundo, todos temos o mesmo sonho: devolver o futuro ao Piódão.

Bibliografia Consultada Cavaco, Carminda (1999), “Desenvolvimento Rural – Desafio e Utopia”; Estudos para o Planeamento Regional e Urbano, nº 50 – Centro de Estudos Geográficos da Universidade de Lisboa. CCRC (1999), Programa das Aldeias Históricas de Portugal, Edição da Comissão de Coordenação da Região Centro, Coimbra. C. M. A. (2001), Benfeita – Plano de Aldeia, Gabinete Técnico do Município de Arganil. C. M. A. (1987), Piódão- Plano Trienal, Gabinete Técnico do Município de Arganil. Gralheiro, Jaime (2002), Comentário à Nova Lei dos Baldios, Editora Almedina, Coimbra. I. N. E. (2001), Apuramento Informático (dados relativos à Freguesia do Piódão), Instituto Nacional de Estatística. Ramalho, Paulo (2003), Museu do Piódão (textos diversos), Município de Arganil. Rocha-Trindade, Maria Beatriz (1987), “As Micropátrias do Interior português”, Análise Social vol. XXXIII, Lisboa.