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PASSADO, PRESENTE E FUTURO DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA João Carlos Areosa Mestrando em Direito Processual Civil na PUC-SP. Pós- Graduado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – RJ. Especialista em Direito Societário e Mercado de Capitais pela Fundação Getúlio Vargas – RJ. Graduado pela PUC-RJ. Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem, da AASP e do IASP. Advogado. RESUMO : O artigo objetiva analisar o panorama histórico dos embargos de divergência no Brasil, apresentando suas principais características, procedimento e controvérsias. Diante da importância dada ao tema da uniformização da jurisprudência e previsibilidade das decisões judiciais, pelos autores do Projeto do Novo Código de Processo Civil, este estudo perpassa pelos termos do texto proposto para regular essa espécie recursal. PALAVRAS-CHAVE : Embargos de Divergência Divergência jurisprudencial – Recurso Especial – Recurso Extraordinário – Projeto do Novo Código de Processo Civil. PAST, PRESENT AND FUTURE OF THE APPEAL FOR RESOLUTION OF CONFLICT IN PREVIOUS CASE LAW 1

Passado, Presente e Futuro dos Embargos de Divergência

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PASSADO, PRESENTE E FUTURO DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA

João Carlos Areosa

Mestrando em Direito Processual Civil na PUC-SP. Pós-

Graduado em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio

Vargas – RJ. Especialista em Direito Societário e Mercado

de Capitais pela Fundação Getúlio Vargas – RJ. Graduado

pela PUC-RJ. Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem, da

AASP e do IASP. Advogado.

RESUMO: O artigo objetiva analisar o panorama

histórico dos embargos de divergência no Brasil,

apresentando suas principais características,

procedimento e controvérsias. Diante da importância

dada ao tema da uniformização da jurisprudência e

previsibilidade das decisões judiciais, pelos

autores do Projeto do Novo Código de Processo

Civil, este estudo perpassa pelos termos do texto

proposto para regular essa espécie recursal.

PALAVRAS-CHAVE: Embargos de Divergência –

Divergência jurisprudencial – Recurso Especial –

Recurso Extraordinário – Projeto do Novo Código de

Processo Civil.

PAST, PRESENT AND FUTURE OF THE APPEAL FOR

RESOLUTION OF CONFLICT IN PREVIOUS CASE LAW

1

ABSTRACT: The article aims to analyze the

historical of the appeal for resolution of conflict

in previous case law in Brazil, presenting its main

features, procedure and controversies. Given the

importance attached to the issue of uniformity of

law and predictability of judicial decisions, by

the authors of the Project of the New Code of Civil

Procedure, this study permeates the terms of the

proposed text to regulate this sort appeal.

KEYWORDS: Appeal for resolution of conflict in

previous case law – Jurisprudence Divergence –

Especial Appeal – Extraordinary Appeal – Project of

the New Code of Civil Procedure.

SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Função, distinção e

cabimento dos embargos de divergência – 2.1 O

objetivo – 2.2. Distinções entre os Embargos de

Divergência, os Embargos infringentes, o Recurso

Especial (105, III, “c”), o incidente de

uniformização e o artigo 555, §1º, do Código de

Processo Civil – 2.2.1. Embargos de Divergência vs.

Recurso Especial (artigo 105, inciso III, alínea

“c”) – 2.2.2. Embargos de Divergência vs. Incidente

de uniformização de jurisprudência – 2.2.3.

Embargos de Divergência vs. Embargos Infringentes –

2.3. Características indispensáveis ao acórdão

embargado – 2.4. Características indispensáveis ao

2

acórdão paradigma – 3. Comprovação da divergência –

4. Efeitos da interposição dos embargos de

divergência – 5. Procedimento e julgamento – 6. O

projeto do novo código de processo civil e a

análise acerca da necessidade de manutenção dessa

espécie recursal – 7. Conclusões – 8. Bibliografia.

1. Introdução

Historicamente1, o ordenamento processual civil

brasileiro cuidou de solucionar eventuais divergências

quanto à interpretação e aplicação da lei no âmbito dos

Tribunais2. Ainda na década de 30 do século passado foram

editados dois diplomas legislativos (a Lei nº. 319/373 e,

em seguida, o artigo 8534, do Código de Processo Civil de1 Para uma visão mais abrangente: ASSIS, Araken de. Manual dosRecursos. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2012, p. 877-881.2 Helena Najjar Abdo ressalta que os embargos de divergência, “na exataconfiguração prevista no art. 546 do CPC, não parecem ter paradigmanas legislações processuais estrangeiras. A despeito disso, é comumaos vários sistemas processuais dos demais países a previsão derecursos que comunguem da mesma finalidade, qual seja, a de garantir auniformidade da jurisprudência.” ABDO, Helena Najjar. Embargos deDivergência: aspectos históricos, procedimentais, polêmicos e dedireito comparado. In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa ArrudaAlvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis. Vol.9. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 242.3 Lei n°. 319 de 15.11.1937.4 Art. 853. Conceder-se-á recurso de revista para as Câmaras Civisreunidas, nos casos em que divergirem, em suas decisões finais, duas(2) ou mais Câmaras, ou turmas, entre si, quanto ao modo deinterpretar o direito em tese. Nos mesmos casos, será o recursoextensivo à decisão final de qualquer das Câmaras, ou turmas, quecontrariar outro julgado, também final, das Câmaras reunidas.Parágrafo único. Não será lícito alegar que uma interpretação divergede outra, quando, depois desta, a mesma Câmara, ou turma, que aadotou, ou as Câmaras reunidas, hajam firmado jurisprudência uniformeno sentido da interpretação contra a qual se pretende reclamar.(Redação Original)

3

1939) responsáveis pela implantação do recurso de revista

como meio hábil para sanar eventual disparidade entre

acórdãos da mesma Corte.

De acordo com o artigo 853 do Código de Processo

Civil de 1939, buscava-se a uniformização intra muros da

jurisprudência do respectivo Tribunal por meio do efetivo

julgamento das teses jurídicas alegadamente conflitantes.

Não obstante o objetivo preconizado pelo recurso de

revista, nos parece correto afirmar que a origem dos

embargos de divergência está mesmo atrelada ao Decreto-lei

Art. 853 - Conceder-se-á recursos de revista nos casos em quedivergirem, em suas decisões finais, duas ou mais câmaras, turmas ougrupos de câmaras, entre si, quanto ao modo de interpretar o direitoem tese. Nos mesmos casos, será o recurso extensivo à decisão final dequalquer das câmaras, turmas ou grupos de câmaras, que contrariaroutro julgado, também final, das câmaras cíveis reunidas. (Redaçãodada pela Lei nº 1.661, de 1952).§ 1º - Não será lícito alegar que uma interpretação diverge de outra,quando, depois desta, a mesma câmara, turma ou grupo de câmaras, que aadotou, ou as câmaras cíveis reunidas, hajam firmado jurisprudênciauniforme no sentido da interpretação contra a qual se pretendereclamar. (Incluído pela Lei nº 1.661, de 1952).§ 2º - A competência para o julgamento de recurso, em cada caso, seráregulada pela Lei. (Incluído pela Lei nº 1.661, de 1952).§ 3º Do acórdão que julgar o recurso de revista não é admissívelinterpor nova revista. (Incluído pela Lei nº 4.333, de 1964).

4

n°. 6, de 16.11.1937, em especial ao seu artigo 6°, inciso

II, b. 5 6

À luz desses instrumentos de resolução de

divergências intra muros – leia-se recurso de revista e os

embargos do supracitado Decreto-lei –, cumpre mencionar,

com esteio em Carvalho Santos7, que, na sessão de

04.09.1940, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, ao

analisar Questão de Ordem suscitada no bojo de recurso de

revista (artigo 853, Código de Processo Civil 1939)

5 “Art. 6 Admitem-se embargos para o tribunal pleno dos julgamentos dasturmas:I, quando o acórdão embargado não confirmar por unanimidade a decisãorecorrida;II, quando, embora não se verifique unanimidade no julgamento, oacórdão embargado: a) deixar de aplicar, por inconstitucional, lei ou ato do Presidenteda República (Constituição, art. 96);b) estiver em manifesta divergência com a jurisprudência do TribunalPleno ou da outra turmaIII, nos casos de recurso extraordinário, sempre que o Tribunalresolva entrar no conhecimento da questão federal, que deu lugar àinterposição do recurso.”6 Em sentido contrário: “Todavia, o STF, ao interpretar de formaliteral o mencionado artigo, entendeu que ele não se aplicava aorecurso extraordinário, na medida em que naquele órgão não existiriamas "câmaras reunidas".De modo a impor a revisão do entendimento do STF, foi promulgada a Lei623/1949 que introduziu o parágrafo único ao art. 833, nos seguintestermos: ‘Parágrafo único. Além de outros casos admitidos em lei, sãoembargáveis, no STF, as decisões das Turmas, quando divirjam entre si,ou de decisão tomada pelo Tribunal Pleno.’ Esse pode ser considerado omarco criador dos embargos de divergência na legislação processualcivil brasileira, sendo certo que, a partir daí, havia uma dualidaderecursal: se a divergência ocorresse no âmbito dos tribunaisestaduais, cabível o recurso de revista, no STF, embargos dedivergência.” LASPRO, Oreste Nestor de Souza. O objeto dos embargos dedivergência, Revista de Processo, São Paulo: Revista dos Tribunais,vol. 186, p. 9, ago. 2010.7 SANTOS, J. M. de Carvalho. Código de Processo Civil interpretado. Rio deJaneiro: Freitas Bastos, V. 9, 1947, p. 377-381.

5

interposto com o fito de sanar alegada divergência acerca

da interpretação das turmas daquela Corte, considerou tão

somente os embargos previstos no Decreto-lei n°. 6 como o

recurso cabível para saná-las, assentando, em última

análise, que a aplicação do recurso de revista deveria

ficar restrito às câmaras reunidas dos tribunais

intermediários.8

Embora bastante criticado à época9, tal

entendimento veio a prevalecer no Pretório Excelso, razão

pela qual o legislador entendeu por bem inserir,

posteriormente, no Código de Processo Civil de 1939, a

seguinte previsão no bojo do artigo 833: “Além de outros

casos admitidos em lei, serão embargáveis, no Supremo

Tribunal Federal, as decisões das Turmas, quando divirjam

entre si, ou de decisão tomada pelo Tribunal Pleno.”10

Nos dias atuais, releva mencionar a critica de

Barbosa Moreira11, no sentido de ter sido injustificável a

relutância do Supremo Tribunal Federal em conhecer do recurso

de revista tão somente pelo fato do artigo 833, caput, do

Código de Processo Civil de 1939 fazer referência expressa

às Câmaras Cíveis Reunidas.

8 Esse posicionamento foi bastante criticado à época. Cf. Hamilton deMoraes e Barros, A revista no sistema do código de processo civil, n.30, p. 30. apud ASSIS, Araken de. Manual dos Recursos. 2012, p. 880.9 MONIZ DE ARAGÃO, E. D. Embargos Infringentes. 2ª ed. São Paulo: Saraiva,1974, p. 129/130.10 Lei nº. 623, de 19 de fevereiro de 1949.11 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio deJaneiro: Forense, 2006, p. 633.

6

Fato é que, em razão de justificativas nem sempre

bem fundamentadas, bem como à vista de o recurso

extraordinário (interponível, à época, contra violação à

legislação infraconstitucional e constitucional) já possuir

a divergência como hipótese de cabimento, nos termos do

artigo 114, III, “d”, da Constituição Federal de 196712, o

recurso de revista fora alijado do anteprojeto do Código de

Processo Civil de 1973, porquanto se dizia não ser oportuna

a existência de diversos instrumentos com o mesmo

desiderato13.

Parte da doutrina rememora que os autores do

anteprojeto do Código de Processo Civil de 1973 sequer

elencaram os embargos de divergência no texto elaborado, o

que apenas ocorreu em emenda quando o Projeto do Código já

tramitava no Senado Federal.14

12 Art. 114 - Compete ao Supremo Tribunal Federal: (...)III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas, emúnica ou última instância, por outros Tribunais, quando a decisãorecorrida: (Redação dada pelo Ato Institucional nº. 6, de 1969) (...)d) dar à lei federal interpretação divergente da que lhe haja dadooutro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal.13 “A função do recurso é idêntica à da revista, e bem diferente dosembargos de declaração e dos embargos infringentes, porque propicia auniformidade da interpretação.” ASSIS, Araken de. Manual dos Recursos.4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2012, p. 880. “O recursoprevisto no atual art. 546 (e no respectivo parágrafo único doprimitivo texto do Código) nada tem a ver, na substância, com osembargos infringentes (Capítulo IV) nem como os embargos de declaração(Capítulo V). Sua finalidade é análoga à do recurso de revista dodireito anterior: propiciar a uniformização da jurisprudência interna dotribunal quanto à interpretação do direito em tese.” BARBOSA MOREIRA,José Carlos. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense,2006, p. 632.14 No Senado Federal, o artigo 546 recebeu a seguinte redação:Art. 546. O processo e o julgamento do recurso extraordinário, noSupremo Tribunal Federal, obedecerão ao que dispuser o respectivoregimento interno. (Revogado pela Lei nº 8.038, de 1990)

7

Assim, o texto original do artigo 546, parágrafo

único, do Código de Processo Civil, cujo teor autorizava a

apresentação de embargos de divergência no âmbito do

Supremo Tribunal Federal, vigorou até a edição da Lei n°.

8.038, de 28.05.1990, que sem mais nem menos o ab-rogou, ao

mesmo tempo em que o recriou, restringindo a disciplina e a

possibilidade de utilização dessa via (artigo 29)15 à

decisão de turma do recém-criado Superior Tribunal de

Justiça em sede de recurso especial.

Nada obstante, o Supremo Tribunal Federal, com base

em seu regimento interno, continuou a receber os embargos

de divergência apresentados. Isso porque os Ministros do

Supremo Tribunal Federal entenderam que suas normas

regimentais possuem força de lei à luz do que se lê do

artigo 119, §3º, “c” da Constituição Federal de 196916. Se

se considerar válido tal raciocínio, não há que se falar em

Parágrafo único. Além dos casos admitidos em lei, é embargável, noSupremo Tribunal Federal, a decisão da turma que, em recursoextraordinário, ou agravo de instrumento, divergir do julgamento deoutra turma ou do plenário.15 “Art. 29. É embargável, no prazo de 15 (quinze) dias, a decisão daturma que, em recurso especial, divergir do julgamento de outra turma,da seção ou do órgão especial, observando-se o procedimentoestabelecido no regimento interno.”16 “O Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (RISTF) e as normasde direito processual dele constantes - Preceitos materialmentelegislativos - Regras processuais (como a do art. 317 do RISTF)editadas pelo STF, com fundamento em poder normativo primárioatribuído a esta Suprema Corte pela Carta Política de 1969 (art. 119,§ 3º, "c") - Recepção - Precedentes (RTJ 147/1010 - RTJ 151/278-282 -RTJ 190/1084-1088) - Doutrina.” (RE-Edv-Agr 382.939-PR, j. 15.02.2006,Relator Ministro Celso de Mello).

8

violação ao artigo 22, inciso I, da Constituição Federal

vigente.17

Todavia, essa discussão perdeu objeto diante da Lei

n°. 8.950, de 13.12.1994. Tal iniciativa legislativa teve o

condão de adicionar os embargos de divergência no rol

taxativo do artigo 496, do Código de Processo Civil, bem

como inserir as respectivas hipóteses de cabimento, nos

termos dos incisos I e II, do artigo 546, do Caderno

Processual Civil. O parágrafo único, por sua vez, franqueou

ao Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal (“RISTF”)

e do Superior Tribunal de Justiça (“RISTJ”) a

regulamentação do procedimento dos embargos de divergência.

2. Função, distinção e cabimento dos Embargos de

Divergência

2.1. O objetivo

Os embargos de divergência são regulados pelo

Código de Processo Civil, notadamente os artigos 496,

inciso VIII, e artigo 546. Além disso, e por força do

parágrafo único, do artigo 546, o RISTF (artigo 330 a 336)

e o RISTJ (artigo 266 e 267) regulamentam o procedimento

17 Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário,marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

9

dessa espécie recursal no seio daqueles Tribunais

Superiores.18

A doutrina não duvida que a função institucional

dos embargos de divergência seja a de uniformização de

teses jurídicas em casos concretos que possuam a mesma

premissa fática no âmbito dos Tribunais Superiores, mesmo

porque estes tribunais já têm como dever constitucional

fixar a correta interpretação à legislação federal, seja

infraconstitucional, seja constitucional, ao apreciar os

recursos excepcionais que lhe são dirigidos, de acordo com

a competência positivada na Carta Magna.19

A despeito do interesse público de uniformização do

entendimento dos Tribunais Superiores, como observa Cândido

Rangel Dinamarco, na esteira das lições de Calamandrei,

Carnelutti e Celso Agrícola Barbi, o recurso posto à

disposição da parte vencida e que depende da iniciativa

desta para ser conhecido por órgão jurisdicional desempenha

também função inerente à busca por uma solução que sirva

aos seus interesses particulares, ainda que para alcançar

18 Embora não seja objeto deste trabalho, é sempre bom lembrar que háprevisão dos embargos de divergência no âmbito do Tribunal Superior doTrabalho, sendo certo que há súmulas de grande valia para a aplicaçãodesse recurso no âmbito do STF e STJ.19 “O fim a que visam os embargos de divergência é o de provocar aextinção da divergência intestina que eventualmente grassar no STF eno STJ. A Constituição outorgou a tais tribunais superiores, aoprimeiro em matéria constitucional, ao segundo no tocante ao direitofederal, funções uniformizadoras. Instituiu, para atender a essafinalidade, respectivamente, o recurso extraordinário e o recursoespecial, limitada a análise do quadro recursal.” ASSIS, Araken de.Manual dos Recursos. p. 881/882.

10

esse objetivo seja necessário perpassar pela missão

institucional20.

Nos embargos de divergência não poderia ser

diferente, uma vez que os recursos extraordinários e

especiais – plano de cabimento dessa espécie –, é certo

dizer, visam a “propiciar a autoridade, a efetividade e a

uniformidade interpretativa das normas de direito federal

em todo o território do país”21, embora num segundo plano

decorra da escorreita aplicação dessas funções

institucionais a defesa do direito subjetivo das partes.

2.2. Distinções entre os Embargos de Divergência, os

Embargos infringentes, o Recurso Especial (105, III, “c”),

o incidente de uniformização e o artigo 555, §1º, do Código

de Processo Civil

Em sua essência, os embargos infringentes, o

recurso especial com base no dissídio jurisprudencial, o

incidente de uniformização e o instituto do art. 555, §1º,

Código de Processo Civil, têm como pedra de toque a função

de uniformizar, alinhar, pacificar a interpretação de teses

de direito de acordo com as balizas previstas na legislação

de regência.

20 DINAMARCO, Cândido Rangel. Processo Civil Empresarial. São Paulo:Malheiros, 2011, p. 100/101.21 Idem, p. 101.

11

Por isso, conquanto detenham funções semelhantes

não há que se confundir ou mesmo imaginar que em dada

situação possa haver dúvida acerca do cabimento de um ou de

outro.

2.2.1. Embargos de Divergência vs. Recurso Especial (artigo

105, inciso III, alínea “c”)

Há duas distinções significativas entre os embargos

de divergência e o recurso especial, notadamente com base

em dissídio jurisprudencial. A primeira delas é com relação

ao âmbito de uniformização de cada um deles, isto é,

enquanto o recurso especial com fulcro na alínea “c” do

inciso III, do artigo 105, da Constituição Federal, busca a

pacificação da jurisprudência entre Tribunais

intermediários, bem como desses com o entendimento do

Superior Tribunal de Justiça, os embargos de divergência

têm como missão a uniformização das posições adotadas

dentro do mesmo Tribunal Superior (Supremo Tribunal Federal

ou Superior Tribunal de Justiça).

Aliás, daí decorre a segunda diferença: os embargos

de divergência podem ser utilizados tanto no Supremo

Tribunal Federal quanto no Superior Tribunal de Justiça, em

outras palavras, podem veicular questão infraconstitucional

ou constitucional, dependendo de onde for identificada a

divergência. Diferentemente, o Recurso Especial cinge-se à

12

matéria infraconstitucional e, portanto, apenas pode ser

apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça.

2.2.2. Embargos de Divergência vs. Incidente de

uniformização de jurisprudência

Patente, no particular, as diferentes naturezas

desses instrumentos. Os embargos de divergência são espécie

recursal (artigo 496, VIII, Código de Processo Civil), o

que não ocorre com o segundo, incidente propriamente dito.

Logo, o primeiro tem caráter corretivo enquanto que

o segundo busca estritamente prevenir a divergência

(atuação retrospectiva e prospectiva, respectivamente), por

isso deve ser utilizado antes do julgamento caso concreto e

prolação do acórdão que se acredita implicará em resultado

distinto de posicionamento anteriormente adotado no âmbito

de determinado Tribunal.

O incidente de uniformização de jurisprudência pode

ser empregado em reexame necessário, ação rescisória e

demais recursos, enquanto que os embargos de divergência

estão restritos aos acórdãos proferidos em recurso

extraordinário e recurso especial, ou seja, são lançados

apenas no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal

de Justiça ao passo que o incidente de uniformização pode

ser manejado em todos os tribunais intermediários e no

Superior Tribunal de Justiça. No Supremo Tribunal Federal

13

não se admite a utilização desse instrumento de

uniformização em função de não haver previsão expressa em

seu Regimento Interno22, ao contrário do Superior Tribunal

de Justiça.

Por último, e por ser instituto correlato, “a

relevante questão de direito” contida no artigo 555, §1º,

Código de Processo Civil, também visa, mediante a

identificação do relator do recurso, prevenir divergências

entre câmaras ou turmas do mesmo Tribunal, de forma que não

há qualquer semelhança com o procedimento dos embargos de

divergência.

2.2.3. Embargos de Divergência vs. Embargos Infringentes

A disparidade entre esses instrumentos também pode

ser facilmente identificada, na medida em que os embargos

infringentes, nos termos do artigo 530, do Código de

Processo Civil, têm lugar em casos de julgamento não

unânime de mérito – condição inafastável – em apelação ou

em ação rescisória, podendo ser utilizados nos tribunais

intermediários ou superiores. Na verdade, segundo o artigo

333, inciso IV, do RISTF, também podem ser manejados contra

a decisão não unânime que julgar a representação de

22 “A violação de literal disposição de lei (art. 485, III, do C.P.C.)pressupõe violação frontal e direta à lei. Os arts. 478 e 479 doC.P.C. inseridos na uniformização de jurisprudência, não foramcogitados na decisão do Tribunal Federal de Recursos. Além disso, esseincidente não existe no âmbito do jurisprudencial do Supremo TribunalFederal.” STF, Pleno, Ação Rescisória n°. 1.198 – 8 – DF, MinistroRelator Djaci Falcão, j. 23.08.1988.

14

inconstitucionalidade. Os embargos infringentes têm como

finalidade extirpar a divergência entre magistrados de um

mesmo órgão colegiado.

Visto isso, os embargos de divergência, bem

diferentemente, estão limitados ao Supremo Tribunal Federal

e ao Superior Tribunal de Justiça, e são cabíveis

independentemente do acórdão embargado ter sido unânime ou

por maioria de votos, tendo como objetivo precípuo a

uniformização da jurisprudência entre os órgãos colegiados

desses Tribunais Superiores.

Por fim, os embargos de divergência apenas podem

vergastar acórdãos proferidos por Turma do Supremo Tribunal

Federal ou Superior Tribunal de Justiça, enquanto que os

embargos infringentes não possuem tal limitação, podendo

ser lançados no bojo de qualquer órgão colegiado cuja

decisão contenha, ao final, voto vencido, nos termos do

artigo 530 e ss, do Código de Processo Civil.

2.3. Características indispensáveis ao acórdão embargado

Como preceitua o artigo 546, do Código de Processo

Civil, as decisões de Turma do Supremo Tribunal Federal e

do Superior Tribunal de Justiça – e de Turma somente23 –

podem ser objeto de embargos de divergência.

23 Não são cabíveis embargos de divergência contra acórdãos tomados emSeção, Órgão Especial ou Plenário, bem como de decisões monocráticas.

15

No Superior Tribunal de Justiça, a decisão será

embargável se o resultado encontrado por uma Turma divergir

do de outra Turma, Seção ou do Órgão Especial.

Na hipótese de a divergência ser entre Turmas da

mesma Seção, esta será a competente para pôr termo à

eventual disparidade. Mas, se a divergência for instaurada

entre Turmas de Seções distintas os embargos de divergência

serão submetidos ao Órgão Especial, A mesma competência do

Órgão Especial será observada caso a divergência seja

verificada entre decisão colegiada tomada por Seção –

distinta em relação a que pertença a Turma julgadora do

acórdão embargado – ou se o julgado paradigma for emanado

do próprio Órgão Especial.

No Supremo Tribunal Federal, os embargos de

divergência podem ser apresentados no caso do julgado

proferido pelo colegiado de uma das Turmas esteja em

conflito com o da outra ou do Plenário. Em qualquer das

hipóteses, o órgão máximo desse Tribunal Superior deverá

processar e julgar eventual conflito entre julgados

comprovadamente análogos.

A divergência apenas pode dizer respeito a acórdãos

de recursos especiais ou extraordinários que tenham o mesmo

grau de cognição. Isto é, firmou-se a compreensão de que,

para a admissibilidade dos embargos de divergência, faz-se

necessário que tanto o acórdão embargado quanto o paradigma

16

guardem, no que se prende à profundidade, o mesmo grau de

cognição em torno do objeto da controvérsia24. Não

interessa, para tais fins, se a decisão colegiada restou

unânime ou por maioria.

Não são poucas as críticas a essa posição. Aliás,

colhem-se apontamentos didáticos de perspicaz voto-vista do

Ministro Sálvio de Figueiredo, nos autos do EREsp

244.525/SP, acerca da irrelevância do grau de cognição dos

julgados para fins de interposição dos embargos de

divergência – posição esta da qual comungamos inteiramente

–, não obstante a posição dos Tribunais Superiores, no

particular, permaneça pacífica.25

“Aduza-se que em nenhum momento restou sufragada no

mencionado julgado a restrição dos embargos de divergência aos

casos em que fosse analisado, monocraticamente, o mérito do

recurso especial. Sem dúvida, seria uma incongruência assim

decidir, já que, nos termos da jurisprudência deste Tribunal e das

lições transcritas pelo em. Ministro Franciulli os embargos de

divergência têm cabimento para dirimir dissídio a respeito de

qualquer matéria, tanto preliminar como de mérito, processual ou

de direito material, mostrando-se irrelevante, igualmente, o

conhecimento ou não do apelo especial.”24 STJ, Terceira Seção, EREsp 1.053.323 – SP, Ministro Relator GeraldoOg Fernandes, j. 13.05.2009. STJ, Corte Especial, AgRg nos ERESP1.212.191 – MG, Ministro Relator Arnaldo Esteves Lima, j. 12.05.2011.STJ, Segunda Seção, Ministra Relatora Nancy Andrighi, AgRg nos EAg1.396.876 – BA, j. 10.10.2012.25 STJ, Órgão Especial, EREsp 571.642 – PR, Ministra Relatora ElianaCalmon, j. 01.08.2008. STJ, Órgão Especial, EREsp 260.691 – SP,Ministro Relator João Otávio Noronha, j. 19.12.2007.

17

Barbosa Moreira, Araken de Assis, Eduardo Arruda

Alvim e Cassio Scarpinella Bueno também criticam o fato de

os Tribunais Superiores vedarem o uso de embargos de

divergência quando um os julgados não tenha o mesmo grau de

cognição, muito em razão do Código de Processo Civil não

ter feito tal restrição e, não raro, haver acórdão que

perpasse todas as alegações de mérito para, ao final,

deixar de conhecer o recurso em apreço.26

Na realidade, para a doutrina majoritária, o

importante é que a questão objeto da divergência esteja

suficientemente clara e delineada no julgado, a fim de que

possa ser cotejada em sede de embargos de divergência.

Paralelamente, cumpre frisar que a Corte Especial

do Superior Tribunal de Justiça entende que não cabem

embargos de divergência com a finalidade de discutir

eventual equívoco quanto ao exame dos requisitos de

admissibilidade de recurso especial, tais como a

deficiência de fundamentação, a ausência de

prequestionamento, o reexame de provas, ou mesmo a

necessidade de interpretação de cláusulas contratuais.27

26 “A questão é tanto mais interessante porque é bastante comum que oacórdão do recurso extraordinário ou especial não conheça do recursopor razões que são, substancialmente, de mérito, por terem, aquelesrecursos, ‘fundamentação vinculada’”. BUENO, Cassio Scarpinella. CursoSistematizado de Direito Processual Civil. 3ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2011, Vol.5. p. 352.27 STJ, Órgão Especial, AgRg nos EREsp 1191545 – RJ, Ministro RelatorArnaldo Esteves Lima, j. 29.08.2012.

18

Com relação aos acórdãos provenientes de julgamento

de embargos de declaração, não pairam dúvidas acerca da

impossibilidade de se interpor embargos de divergência

diretamente. O acertado é concluir-se pela possibilidade de

apresentar embargos de divergência do acórdão do recurso

especial ou extraordinário se os embargos de declaração

tiverem integrado ou modificado a sorte da decisão

primitiva.

Também cumpre pontuar que não cabem embargos de

divergência de acórdãos proferidos no julgamento de ações

de competência originária dos Tribunais Superiores, Habeas

Corpus, Mandado de Segurança, Recurso Ordinário e Ação

Cautelar.28 A interpretação restritiva do artigo 546,

incisos I e II é feita de forma implacável pelos Tribunais

Superiores.

28 “PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.PARADIGMA PROFERIDO EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.INADMISSIBILIDADE. DIVERGÊNCIA NÃO CARACTERIZADA. 1. A jurisprudência desta Corte não admite embargos de divergênciaquando o julgado paradigma foi proferido em Recurso Ordinário emMandado de Segurança, pois os requisitos de admissibilidade desserecurso com o recurso especial possuem circunstâncias quedescaracterizam o dissídio.2. Precedentes: AgRg nos EREsp 1187845/ES, Rel. Min. BeneditoGonçalves, Primeira Seção, DJe 1.6.2011; AgRg nos EREsp 793.405/RJ,Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, DJe9.5.2011; AgRg nos EREsp 726.200/AP, Rel. Min. Eliana Calmon,Primeira Seção, DJe 4.8.2010; AgRg na Pet 5.543/BA, Rel. Min. AldirPassarinho Junior, Corte Especial, DJ 3.9.2007; AgRg nos EREsp693.716/SC, Rel. Min. Laurita Vaz, Corte Especial, DJ 1.08.2006.Agravo regimental improvido.” STJ, Primeira Seção, AgRg nos EREsp 1.179.978 – RJ, Ministro RelatorHumberto Martins, j. 28.04.2012.

19

Seguindo nessa toada, por meio dos embargos de

divergência não é possível impugnar decisão monocrática

proferida pelo Ministro Relator em sede de recurso

extraordinário ou recurso especial seja pela necessidade de

esgotamento das vias impugnativas, seja pela manifesta

escolha do legislador, restringindo o cabimento apenas

contra a “decisão da turma”.29 30

Frise-se que é de suma importância discernir as

hipóteses de cabimento de embargos de divergência a ser

eventualmente interposto em face do acórdão que julga

agravo interno contra decisão monocrática. Isso porque a

sistemática dos agravos alterou-se de forma relevante,

impondo a adaptação de súmulas e até mesmo do artigo 330 do

RISTF, senão vejamos.

Nos termos do artigo 544, caput, pela redação da

Lei n°. 12.322/2010, contra as decisões de

inadmissibilidade de recurso especial ou extraordinário

caberá agravo nos próprios autos, o qual será apreciado

pelo Ministro Relator designado no Supremo Tribunal Federal

ou Superior Tribunal de Justiça (artigo 544, §4º, Código de

Processo Civil).

Caso sobrevenha decisão monocrática, deixando de

conhecer o recurso ou a ele negando provimento, caberá

29 STJ, Órgão Especial, EREsp 275.039 – SP, Ministro Relator Ruy Rosadode Aguiar, j. 16.06.2003.30 STF, Pleno, AgRg nos ERE 432918 – SP, Ministro Relator Dias Toffoli,j. 23.04.2011.

20

agravo interno, nos termos do artigo 545, Código de

Processo Civil, no prazo de 5 (cinco) dias. Contra esse

acórdão não caberão embargos de divergência, pois não se

estará apreciando o recurso excepcional propriamente dito,

mas sim os termos da decisão de admissibilidade. Essa é a

ratio da Súmula STJ 315.31

Por outro lado, se o recurso especial ou

extraordinário vier a ser julgado monocraticamente pelo

Ministro Relator do Tribunal Superior competente, com base

nas faculdades conferidas pelo artigo 557, caput e §1º-A, o

acórdão do agravo interno que vier a ser interposto poderá

ser objeto de embargos de divergência. Idêntica conclusão

se chega ao se analisar a hipótese de o Ministro relator

julgar o agravo nos próprios autos (art. 544 §4º, Código de

Processo Civil), dando-lhe provimento, e na mesma ocasião

julgar o mérito do recurso extraordinário ou especial. Se

for interposto agravo interno, a decisão da Turma poderá

dar ensejo à interposição de embargos de divergência. Essa

é a inteligência da Súmula STJ 316.32

Em razão dessa breve explanação, o Supremo Tribunal

Federal, na sessão plenária de 26.04.2007, cancelou

definitivamente a Súmula STF 599, por flagrante

incompatibilidade à sistemática atual do agravo.33 31 Não cabem embargos de divergência no âmbito do agravo de instrumentoque não admite recurso especial.32 Cabem embargos de divergência contra acórdão que, em agravoregimental, decide recurso especial.33 Defendendo o cancelamento da Súmula STF 599, o professor ArrudaAlvim afirmou em artigo sobre a questão que “Por tudo isso é que

21

Para Eduardo Arruda Alvim, está correto o

entendimento da jurisprudência34 em autorizar a

interposição de embargos de divergência tão somente do

acórdão que vier a julgar o agravo interno interposto

contra a respectiva decisão monocrática – cujo conteúdo

diga respeito ao mérito do recurso especial ou

extraordinário, frise-se – em atenção ao princípio da

unirrecorribilidade das decisões. 35 36

Para mais da divergência não poder ser identificada

em outras espécies recursais ou ações de competência

uma interpretação literal da Súm. 599 do STF há de ser afastada - porque não se amolda ounão se coaduna com o sistema de direito positivo da atualidade e à crescente ampliação dospoderes do relator pelas leis mais recentes -, merecendo, a Súm. 599 do STF, uma releitura euma interpretação sistemática, de molde a se admitir, portanto, o cabimento dos embargos dedivergência contra acórdão (decisão de mérito) de uma das Turmas do Supremo TribunalFederal que julga o agravo regimental interposto em face de decisão monocrática (de mérito)de relator de recurso extraordinário - desde que, naturalmente, ocorrentes os seuspressupostos.” Cabimento de embargos de divergência contra acórdão (demérito) de Turma, proferido em agravo regimental, tirado de decisão derelator de recurso extraordinário – Imprescindibilidade de umareleitura da Súmula 599/STF.” Revista de Processo, Vol. 144, p. 9, SãoPaulo: Revista dos Tribunais, 2007.34 STJ, Primeira Seção, ERESP 747.064 – PR, Ministra Relatora DeniseArruda, j. 26.09.2007.35 “Por tudo, é possível concluir em prol do cabimento dos embargos dedivergência contra acórdão proferido em agravo interno ou regimental,no qual houve efetivo julgamento dos recursos especial ou extraordinário, aindaque de forma indireta, mediata. Se, ao contrário o acórdão prolatadono agravo interno versar apenas sobre o agravo nos próprios autos emsi, não cabem embargos de divergência.” SOUZA, Bernardo Pimentel.Introdução aos Recursos Cíveis. 2011, p. 554.36 “Vem em abono desse entendimento o princípio da unirrecorribilidadedas decisões. Se a decisão monocrática eventualmente proferida comsupedâneo no art. 557 ainda pode ser objeto de agravo interno (§1º, doart. 557), quer nos parecer que não se pode admitir possa serimpugnada, também, por embargos de divergência. Primeiro, há de serinterposto o agravo interno; sucessivamente, então, será possívelcogitar da interposição dos embargos de divergência.” ALVIM, EduardoPellegrini de Arruda. Curso de Direito Processual Civil. 2010, p. 960/961.

22

originária, o embate objeto dos embargos de divergência

deve respeitar a competência do Tribunal Superior

respectivo. Em outras palavras, os embargos de divergência

interpostos perante o Superior Tribunal de Justiça não

podem veicular questão constitucional, da mesma forma que

aqueles protocolizados perante o Supremo Tribunal Federal

não podem buscar a uniformização em matéria

infraconstitucional.37

Arremate diverso pode ser obtido por um leitor

menos atento ao analisar a letra do artigo 330, do RISTF38,

cuja redação original é anterior à constituição Federal de

1988, ou seja, antes da criação do Superior Tribunal de

Justiça e a conseguinte repartição de competências.

Na espécie, concordamos com a conclusão de Cândido

Rangel Dinamarco acerca dessa incompatibilidade sistemática.

Assenta o renomado professor que “são inadmissíveis os

embargos de divergência opostos pelo adversário do ora

consulente mediante invocação de possíveis divergências

implantadas no plano exclusivamente infraconstitucional,

sem passar ao da Constituição Federal. (...) Ora, sabendo-

se que esse tema se reporta à disciplina dos embargos

declaratórios no nível infraconstitucional do Código de

37 STJ, Órgão Especial, AgRg nos EAg 1345775 – PI, Ministro RelatorJoão Otávio de Noronha, j. 07.11.2012.38 Art. 330. Cabem embargos de divergência à decisão de Turma que, emrecurso extraordinário ou em agravo de instrumento, divergir dejulgado de outra Turma ou do Plenário na interpretação do direitofederal. (Atual competência do STJ: art. 105, III e c, da CF/1988.CF/1988: art. 102, III, a, b e c.)

23

Processo Civil, segue-se que o Supremo Tribunal Federal não

tem competência para julgar os embargos de divergência

assim opostos, dada a sua institucional destinação a

preservar a efetividade das normas residentes na

Constituição Federal e unificar a interpretação dessas

normas.”39

Não há dúvidas de que a divergência apontada deva

ser atual. Isso quer significar que não serão cabíveis

embargos de divergência em hipóteses que a jurisprudência

do respectivo tribunal já tenha debatido acerca da tese

jurídica agitada e firmado sua posição. Nesse sentido:

Súmula STJ 16840, Súmula STF 24741 e artigo 332, do RISTF.42

Todavia, qualquer alteração jurídica, política,

social ou econômica no país que justifique mudança de

direção deve ser levada em consideração pelo Ministro

relator, o qual, em tese, poderá propor a sua revisão, nos

termos do artigo 103 c/c 332 do RISTF. Tal assertiva

justifica-se para que a jurisprudência dos Tribunais

Superiores não fique engessada, devendo evoluir em

consonância com a sociedade civil.

39 DINAMARCO, Cândido Rangel. Processo Civil Empresarial. p. 102/103.40 Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência dotribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado.41 O relator não admitirá os embargos da lei 623, de 19/2/1949, nemdeles conhecerá o Supremo Tribunal Federal, quando houverjurisprudência firme do plenário no mesmo sentido da decisãoembargada.42 Art. 332. Não cabem embargos, se a jurisprudência do Plenário ou deambas as Turmas estiver firmada no sentido da decisão embargada, salvoo disposto no art. 103.

24

Demais disso, no âmbito do Supremo Tribunal

Federal, há firme entendimento, com base no art. 331 do

RISTF43, de que se o recurso extraordinário tiver sido

interposto com base em jurisprudência alegadamente

divergente sobre a mesma quaestio iuris e, na ocasião do

julgamento, o órgão julgador entender por bem desprovê-lo,

desconsiderando, em última análise, a divergência apontada,

não poderá o recorrente interpor ulteriores embargos de

divergência, repisando a divergência já rechaçada. Essa

posição está estampada nas Súmulas STF 247 e 598.44

Nada obstante o referido dispositivo seja anterior

à Constituição de 1988, que confinou divergência pretoriana

como hipótese de cabimento apenas do recurso especial, o

mesmo raciocínio se aplica na esfera do Superior Tribunal

de Justiça, especialmente, em caso de recurso especial

interposto com base no artigo 105, incido III, alínea “c”,

da Constituição Federal. Para Cassio Scarpinella Bueno,

“[o] entendimento é correto e deve ser prestigiado porque

os embargos de divergência não podem ser utilizados como

mero recurso interposto com vista à modificação do quanto

43 Art. 331. A divergência será comprovada mediante certidão, cópiaautenticada ou pela citação do repositório de jurisprudência, oficialou credenciado, inclusive em mídia eletrônica, em que tiver sidopublicada a decisão divergente, ou ainda pela reprodução de julgadodisponível na internet, com indicação da respectiva fonte,mencionando, em qualquer caso, as circunstâncias que identifiquem ouassemelhem os casos confrontados.44 Nos embargos de divergência não servem como padrão de discordânciaos mesmos paradigmas invocados para demonstrá-la, mas repelidos comonão dissidentes no julgamento do recurso extraordinário.

25

decidido em sede de recurso extraordinário e, por

identidade de motivos, em sede de recurso especial.”45

2.4. Características indispensáveis ao acórdão paradigma

No que tange ao acórdão paradigma, as exigências

não diferem muito daquelas apresentadas no âmbito do

acórdão embargado.

O acórdão paradigma, segundo firme jurisprudência

do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça,

deve ter sido conhecido e tirado necessariamente de

julgamento de recurso extraordinário e especial,

respectivamente. Essa posição recebe crítica ferrenha da

doutrina, uma vez não haver razão para se limitar a

indicação da divergência, dado que a lei não prevê tal

restrição.

Não obstante, há vozes no Superior Tribunal de

Justiça em sentido contrário, como se depreende do voto

proferido pelo Ministro Luiz Fux no bojo do EREsp 341.655:

“Os embargos foram admitidos com ressalvas.

Nesse particular, acrescento que os recebo sem ressalvas. É que em

meu sentir, concessa venia a) os embargos de divergência visam a

que o Superior Tribunal de Justiça como órgão máximo da

uniformização jurisprudencial nacional não revele antinomias na

45 BUENO, Cassio Scarpinella. Curso Sistematizado de Direito Processual Civil. 3ªEd. São Paulo: Saraiva, 2011, Vol. 5. p. 351.

26

apreciação das questões submetidas ao seu crivo, máxime teses de

mérito, de regra aventadas em recurso especial, mercê de as

mesmas poderem estar eclipsadas em causas de competência

originária ou recursal, por isso que essa forma de impugnação

uniformizante pode abarcar agravos regimentais de mérito,

liquidações de sentenças, recursos ordinários constitucionais ou

ações rescisórias com teses contrastantes; b) in casu, há divergência

entre arestos proferidos em ações rescisórias e entre agravos

regimentais de mérito e recurso especial, por isso que conhecidos os

embargos de divergência.”

No âmbito do Supremo Tribunal Federal, o mesmo

posicionamento restou encampado pelos Ministros Marco

Aurélio de Mello46 e Sepulveda Pertence47, apesar de terem

ficado vencidos no julgamento do ERE 247.416.

Somando-se a isso, não se mostra possível a

utilização de decisão monocrática como paradigma para fins46 “Senhor Presidente, continuo convencido de que, no artigo 546 doCódigo de Processo Civil, não se impõe limitação em se tratando doaresto paradigma. Dispõe este artigo sobre a decisão impugnávelmediante embargos de divergência e, aí sim, há de ter sido essadecisão prolatada por força de recurso extraordinário ou, sob a minhaóptica, recurso ordinário em mandado de segurança. Já sustentei aquiponto de vista que leva a essa conclusão, a partir de umainterpretação teleológica da norma do artigo 546 e considerada adualidade recursal – recurso extraordinário se concedida a ordem, eordinário, se denegada. Então, se fosse este o único obstáculo àadmissibilidade dos embargos, pediria vênia ao nobre Relator paradivergir, mas Sua Excelência aponta que o acórdão cotejado – e mesmoassim não deixa de ser um acórdão porque decorreu do julgamento deagravo regimental – não é específico, que dizer, não se esteia nasmesmas premissas fáticas da decisão impugnada mediante os embargos dedivergência.”47 “Ainda continuo inconformado com a invenção dos acórdãos de ‘segundaclasse’ do Supremo Tribunal Federal – os acórdãos, parece, nos quais oSupremo não acredita.”

27

de interposição de embargos de divergência, sob os mesmos

argumentos lançados linhas acima.

Além do mais, é indiferente que o resultado do

julgamento tenha ou não sido unânime, porquanto, não custa

lembrar, a divergência nunca será baseada em voto vencido,

justamente por não representar a posição final do julgado

e, por conseguinte, a do órgão colegiado.

Sobre a escolha do paradigma, a Súmula STF 353 é

clara no sentido de que “[s]ão incabíveis os embargos da

Lei 623, de 19.02.1949, com fundamento em divergência entre

decisões da mesma Turma do Supremo Tribunal Federal”. Sem

prejuízo, no Supremo Tribunal Federal há julgados

recentes48 inadmitindo a adoção do acórdão paradigma pela

mesma turma julgadora da decisão embargada, salvo quando se

detectar grande mudança na composição da Turma.49

48 STF, Pleno, AI 707478 AgR-EDv-AgR – RS, Ministra Relatora CarmenLucia, j. 03.08.2011.49 “Os embargos de divergência estão sujeitos, dentre os váriospressupostos que lhe condicionam a interposição, à observância dorequisito da diversidade orgânica. Esse requisito impõe que o padrãode divergência - para ser validamente invocado como expressão dodissídio interpretativo - resulte de acórdão emanado, ou do Plenárioou de outra Turma do Supremo Tribunal Federal, pois não se reveste deidoneidade processual, para efeito de demonstração do conflitopretoriano, a indicação de acórdão proferido pela própria Turma de queproveio a decisão contra a qual foram opostos os embargos dedivergência (Súmula 353/STF), ressalvada a hipótese excepcional de aTurma haver sofrido substancial modificação em sua composição.Precedentes. - Inocorrência, na espécie, dessa hipótese excepcional,pois os acórdãos em confronto emanaram da mesma Turma cuja composiçãomajoritária - quatro (4) Ministros, no caso - manteve-sesubstancialmente inalterada.” STF, Pleno, RE 318.469 EDv-QO – DF,Ministro Relator Celso de Mello, j. 03.10.2002.

28

No Superior Tribunal de Justiça, ao avesso, a

jurisprudência encontra-se sedimentada pela impossibilidade

de se colher decisão paradigma do mesmo órgão colegiado50.

Eduardo Ribeiro discorda desse posicionamento, reiterando a

importância da uniformização e que, na prática, a Turma

será apenas formalmente a mesma.51

O cabimento dos embargos de divergência também fica

prejudicado quando lastreado em julgado proveniente de

órgão colegiado que não mais detenha a competência para

julgar a matéria ventilada. Essa posição encontra-se

sedimentada pela Súmula STJ 158. Em consonância, não se

pode admitir embargos de divergência com base em julgado de

outro Tribunal Superior (ou do extinto Tribunal Federal de

Recursos).

O acórdão paradigma não necessita estar acobertado

pelo manto da coisa julgada52. O importante é que no

50 “1. Por falta de amparo legal, não é possível o exame de embargos dedivergência fundados em Acórdãos proferidos por uma mesma Turma, mesmoque a sua composição tenha sido alterada substancialmente.Precedentes.” STJ, Órgão Especial, EREsp 240.054 – SC, MinistroRelator Edson Vidigal, j. 29.08.2002.51 “Pedimos vênia para considerar melhor o entendimento mais liberal,acolhido nos acórdãos em primeiro lugar citados, pois mais consentâneocom a finalidade do recurso em exame. Seu objetivo é propiciar auniformização da jurisprudência. Em princípio, tratando-se da mesmaturma, a divergência há de ser por ela mesma harmonizada. Se,entretanto, ocorreu mudança em sua composição, só formalmente é amesma e a uniformização dependerá do pronunciamento do órgão próprio.”OLIVEIRA, Eduardo Ribeiro. Embargos de Divergência. In: NERY JUNIOR,Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos eatuais dos recursos cíveis. Vol. 9. São Paulo: Revista dos Tribunais,2006, p. 150.52 STJ, Terceira Seção, EREsp 585.392 – SP, Ministro Relator HamiltonCarvalhido, j. 08.10.2008.

29

momento da interposição haja decisão divergente nos termos

e pressupostos exigidos pela lei e jurisprudência do

respectivo Tribunal.

Importante esclarecer, igualmente, que o acórdão

paradigma deve ter argumentos suficientes e equivalentes

àqueles postos no acórdão embargado. De outro modo, quando

houver mais de um fundamento suficiente no acórdão

paradigmático e apenas um deles efetivamente divergir da

decisão recorrida, não caberá embargos de divergência, pois

não se saberá qual fundamento foi determinante para a

prolação do acórdão paradigma.

Tal raciocínio resulta da aplicação analógica da

Súmula STF 283 e Súmula STJ 128, conforme se depreende de

trecho do EREsp 193.896 – RJ: “Não se conhece dos embargos

de divergência se os paradigmas colacionados divergem de

apenas um dos fundamentos do Aresto embargado, sendo o

outro fundamento, não objeto do dissídio suficiente, por si

só, para mantê-lo.”

3. COMPROVAÇÃO DA DIVERGÊNCIA

As exigências feitas pelo artigo 331, caput, do

RISTF e pelo §1º do art. 266 do RISTJ são legítimas à luz

do parágrafo único do artigo 541, Código de Processo Civil.

O Superior Tribunal de Justiça também entende que esse

30

dispositivo – próprio dos recursos extraordinários e

especiais – é aplicável aos embargos de divergência.

Assim, há necessidade inarredável de se comprovar,

de modo analítico, a divergência com o apontamento das

circunstâncias que assemelhem ou identifiquem os casos

confrontados, a exemplo do que ocorre com o recurso

especial interposto com base em dissídio jurisprudencial;

ou seja, não basta a transcrição das ementas, salvo se

todos os elementos suficientes para a compreensão da

divergência estiverem presentes.53

Isso quer significar que, para mais da efetiva

demonstração de que o entendimento constante no acórdão

paradigma é o adotado pelo respectivo Tribunal, a parte que

interpuser os embargos de divergência deverá,

obrigatoriamente, expor o contraste entre o acórdão

embargado e o seu paradigma. Nesse sentido, cumpre ao

recorrente trazer à baila o julgado paradigma onde haja

entendimento diverso, proferido por ocasião de julgamento

de recurso excepcional.54

Logo, essa demonstração deve ser feita analiticamente, ou

seja, comparando lado a lado trechos dos julgados ditos

divergentes, objetivando esclarecer a um só tempo a

identidade ou semelhança fático-jurídica dos casos

53 STJ, Primeira Seção, EREsp 296.431 – SP, Ministra Relatora DeniseArruda, j. 25.08.2004.54 GRANADO, Daniel Willian, O recurso especial e a orientação do Superior Tribunal deJustiça. Dissertação de Mestrado PUC-SP, 2011, p. 397.

31

concretos, bem como a razão pela qual a tese contida no

acórdão embargado deverá prevalecer.

Neste ponto, ante o interesse não apenas das

partes, mas, em primeiro lugar, do próprio Tribunal em

sanar divergências internas – função institucional do

recurso –, é assente o entendimento de que em hipóteses de

flagrante divergência o órgão competente para julgar o

recurso deve abrandar os requisitos de admissibilidade.55

Por derradeiro, a comprovação física da divergência

deverá ser feita por meio de certidões, cópias autenticadas

dos acórdãos paradigmas, citação de repositórios oficiais

ou reprodução de julgados disponíveis na internet, com

indicação da respectiva fonte (parágrafo único, art. 541,

Código de Processo Civil), sendo certo que, em se tratando

de cópias, o patrono da parte recorrente dos autos poderá

declará-las verdadeiras.

4. EFEITOS DA INTERPOSIÇÃO DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA

Naturalmente, os embargos de divergência terão

efeito devolutivo (estrito) – efeito natural dos recursos56

–, na exata medida da divergência apresentada pela parte

recorrente. É que os embargos de divergência são recurso de

fundamentação vinculada, notadamente às questões

55 STJ, Primeira Seção, EREsp 719.121 – RS, Ministro Relator JoãoOtávio Noronha, j. 24.10.2007. Há diversos outros no mesmo sentido.56 “Todo recurso exibe efeito devolutivo”. ASSIS, Araken de. Manual dosRecursos. 4ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 244.

32

anteriormente decididas e discutidas nos próprios autos do

recurso especial ou extraordinário.

Por essa mesma razão, a exemplo dos recursos

excepcionais, recursos de fundamentação vinculada por

excelência, também se torna impositivo nos embargos de

divergência o prequestionamento das teses jurídicas ditas

divergentes. Contudo, isso não quer significar que, uma vez

conhecidos os embargos de divergência, o órgão julgador

deva ficar restrito aos argumentos e teses ventiladas até o

momento do julgamento.

Visto isso, o efeito substitutivo dos recursos, nos

termos do artigo 512, Código de Processo Civil, será

sentido em caso de conhecimento dos embargos e julgamento

da divergência apontada. De mais a mais, e como decorrência

correspondente, os embargos de divergência também impedirão

a formação da coisa julgada, nos termos dos artigos 301,

§3º, e 467, ambos do Código de Processo Civil.

Como consequência do que se expôs acerca do

prequestionamento, não nos parece razoável defender a

existência de efeito translativo no julgamento dos embargos

de divergência, uma vez que as matérias de ordem pública e

outras apreciáveis de ofício não poderão ser objeto do

julgamento, salvo se fizerem parte das matérias cuja

divergência restou apontada. Esse já é o entendimento do

33

Órgão Especial do Superior Tribunal de Justiça em sede de

recurso especial.57

Em contraponto, Fredie Didier Jr.58, com lastro na

doutrina de Bernardo Pimentel Souza59, entende que o efeito

translativo está presente tanto no julgamento dos recursos

excepcionais, quanto no âmbito dos embargos de divergência,

porquanto o tribunal deverá julgar a causa, aplicando o

direito à espécie (art. 336 do RISTF).

57 “PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOSDE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. PENSÃO POR MORTE.VIOLAÇÃO DO ARTIGO 47 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MATÉRIA DE ORDEMPÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. EFEITOTRANSLATIVO. INAPLICABILIDADE. 1. A Corte a quo não manifestou, emsuas razões de decidir, nenhum pronunciamento sobre o tema inserto noartigo 47 do Código de Processo Civil, o que não satisfaz oprequestionamento da matéria suscitada, qual seja, a necessidade deinclusão do INSS no polo passivo da demanda. Incidência da Súmula211/STJ.2. O entendimento de que é possível conhecer das questões de ordempública de ofício, ainda que não prequestionadas ou suscitadas, naexcepcional hipótese de o recurso especial ter sido conhecido poroutros fundamentos, em razão do efeito translativo, foi superado emnova análise pela Corte Especial, que concluiu pela necessidade dorequisito do prequestionamento na instância extraordinária.Precedente: AgRg nos EREsp 999.342/SP, Rel. Ministro Castro Meira,Corte Especial, DJe 1/2/2012; EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp32.420/PB, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe28/6/2012.3. Agravo regimental não provido.” STJ, Primeira Turma, AgRg nos EDclno REsp 1.252.991 – RJ, Ministro Benedito Gonçalves, j. 20.09.2012.58 Curso de Direito Processual Civil, 6ª Ed., V. 3. Salvador: Juspodvm, 2008, p.350.59 “[s]egundo autorizada doutrina, os embargos de divergência nãoproduzem efeito translativo. Todavia, o parágrafo único do artigo 336do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal conduz à conclusão deque o Pleno indica a interpretação correta, aplicando o direito àespécie. (...) Sendo assim, tudo indica que as questões de ordempública devem ser apreciadas após o conhecimento dos embargos dedivergência.” SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos Recursos Cíveis. 2011,p. 566.

34

A nosso ver, essa posição não deve ser encampada,

seja pela patente exigência de prequestionamento, seja pela

devida interpretação dos artigos 335 e 336, do RISTF.

É que, quando o parágrafo único do artigo 336 diz

“julgará a matéria restante”, não está a afirmar que as

questões apreciáveis de ofício poderão ser analisadas, mas

se refere apenas ao mérito do recurso propriamente dito –

cujas questões, portanto, devem ter sido devidamente

prequestionadas.

Dessa maneira, na esteira do entendimento do

Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça,

o efeito translativo não é adequado à sistemática dos

embargos de divergência. Apenas para concluir esse ponto,

seria de todo incongruente que a cúpula desses Tribunais

Superiores aplicasse a esta espécie recursal o efeito

translativo dos recursos, e não o fizesse em relação aos

recursos extraordinários e especiais.60

Por fim, os embargos de divergência não possuem

efeito suspensivo automático, nos termos do artigo 266, §2º

60 “O entendimento de que é possível conhecer das questões de ordempública de ofício, ainda que não prequestionadas ou suscitadas, naexcepcional hipótese de o recurso especial ter sido conhecido poroutros fundamentos, em razão do efeito translativo, foi superado emnova análise pela Corte Especial, que concluiu pela necessidade dorequisito do prequestionamento na instância extraordinária.Precedente: AgRg nos EREsp 999.342/SP, Rel. Ministro Castro Meira,Corte Especial, DJe 1/2/2012; EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp32.420/PB, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe28/6/2012.” STJ, Órgão Especial, AgRg nos EDcl no REsp 1.252.991 – RJ,Ministro Relator Benedito Gonçalves, j. 20.09.2012.

35

do RISTJ.61 Para Nelson Nery Jr., no entanto, se os

embargos de divergência forem interpostos de decisão de

Turma que dera provimento ao recurso extraordinário ou

especial, serão recebidos em ambos os efeitos (devolutivo e

suspensivo).62

Independente da respeitável opinião do supracitado

jurista, os Tribunais Superiores são uníssonos em admitir o

ajuizamento de ação cautelar incidental com o fito de

atribuir aos embargos de divergência o efeito suspensivo.63

5. PROCEDIMENTO E JULGAMENTO

Sendo o cabível à luz dos requisitos legais,

regimentais e jurisprudenciais, a parte que possuir

interesse recursal deverá interpor os embargos de

divergência em até 15 (quinze) dias após a publicação do

acórdão recorrido.

61 Art. 266. Das decisões da Turma, em recurso especial, poderão, emquinze dias, ser interpostos embargos de divergência, que serãojulgados pela Seção competente, quando as Turmas divergirem entre siou de decisão da mesma Seção. Se a divergência for entre Turmas deSeções diversas, ou entre Turma e outra Seção ou com a Corte Especial,competirá a esta o julgamento dos embargos.§ 1º A divergência indicada deverá ser comprovada na forma do dispostono art. 255, §§ 1º e 2º, deste Regimento. (Redação dada pela EmendaRegimental n. 1, de 1991)§ 2º Os embargos serão juntados aos autos independentemente dedespacho e não terão efeito suspensivo.(Redação dada pela EmendaRegimental n. 2, de 1992)62 JUNIOR, Nelson Nery. Teoria Geral dos Recursos, 6ª ed., São Paulo: Revistados Tribunais, 2004, p. 451.63 STJ, Órgão Especial, AgRg na MC 11732 – RS, Ministro José Delgado,j. 04.10.2006.

36

A análise do acórdão embargado é de suma

importância. Como observado alhures, se por ventura houver

dois ou mais fundamentos necessários para o acolhimento da

tese jurídica agitada, sendo um objeto de embargos de

divergência no Superior Tribunal de Justiça e outro de

índole Constitucional, por exemplo, o recorrente deverá

primeiramente interpor os embargos de divergência e, caso

este venha a ser conhecido e provido, posteriormente deverá

o embargante apresentar o recurso extraordinário.64 65

Com a distribuição desse recurso, os autos seguirão

para o novo Ministro relator, a fim de que seja feito o

juízo de admissibilidade prévio, o qual não vincula o órgão

colegiado. No âmbito do Superior Tribunal de Justiça, de

acordo com o artigo 266, §1º, RISTJ, o relator poderá

indeferir os embargos de divergência, liminarmente, quando

o recurso for intempestivo, se estiver contrastando com

64 PROCESSUAL CIVIL. INTERPOSIÇÃO SIMULTÂNEA DE EMBARGOS DE DIVERGÊNCIAE DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE.PRECLUSÃO CONSUMATIVA.1. O princípio da unirrecorribilidade, vigente no sistema processualcivil brasileiro, veda, em regra, a interposição simultânea de váriosrecursos contra a mesma decisão judicial.2. Assim, a interposição simultânea, contra o acórdão que julgou orecurso especial, de embargos de divergência e recurso extraordinário,acarreta a inadmissibilidade do recurso que foi protocolado porúltimo, ante a preclusão consumativa.3. Agravo regimental a que se nega provimento.STJ, Órgão Especial, EREsp 511.234 – DF, Ministro Relator Luiz Fux, j.04.08.2004.65 “Tem entendido o STJ que o princípio da unicidade impede que olegitimado avie, simultaneamente, embargos de divergência e recursoextraordinário contra o mesmo acórdão, fato que torna inadmissível orecurso que veio em segundo lugar.” ASSIS, Araken de. Manual dos Recursos.4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2012, p. 888.

37

Súmula do Tribunal, ou se não restar configurada a

divergência jurisprudencial.

Se os embargos de divergência vierem a ser

admitidos, a parte embargada será intimada para apresentar

contrarrazões em 15 (quinze) dias, e não em 10 (dez) como

preceitua o artigo 335, §1º, do RISTF. Abra-se parêntese

para dizer que é criticável o procedimento adotado,

porquanto seria desejável que, antes de se admitir o

recurso, o Ministro Relator tivesse a oportunidade de

analisar a resposta da parte recorrida, pois podem apontar

vícios que auxiliariam a análise do relator.

Apresentada a resposta, portanto, pode o Ministro

relator com supedâneo nas faculdades atribuídas pelo artigo

557, do Código de Processo Civil, desde logo, julgar

monocraticamente o recurso, cuja decisão pode ser esgrimada

por agravo interno.

Se não for a hipótese de decisão monocrática, o

Ministro relator remeterá o recurso ao colegiado. Em

seguida, e ante a ausência de Ministro revisor, o

julgamento dos embargos de divergência deverá ser incluído

na pauta da sessão de julgamento do órgão competente,

ocasião em que os procuradores das partes poderão realizar

sustentação oral.

38

Caso necessário, o Ministério Público poderá ser

ouvido, sendo-lhe franqueada vista dos autos por 20 (vinte)

dias, nos termos do artigo 266, §4º, do RISTJ.

Não há dúvidas acerca do cabimento de embargos de

declaração contra o acórdão que julgar definitivamente os

embargos de divergência. Se o julgamento se der âmbito do

Superior Tribunal de Justiça, além dos aclaratórios, o

acórdão, dependendo da matéria e da presença dos

pressupostos e requisitos constitucionais, poderá, ainda,

ser objeto de recurso extraordinário. Se assim o for, o

recurso interposto será analisado pela presidência daquela

Corte Superior e, caso admitido, seguirá ao Pretório

Excelso.

6. O PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL E A ANÁLISE

ACERCA DA NECESSIDADE DE MANUTENÇÃO DESSA ESPÉCIE RECURSAL

A preocupação com a função nomofilácica, isto é,

com a uniformização e estabilização da interpretação do

direito pelos Tribunais66, deve ocupar lugar de destaque na

agenda dos estudiosos do processo civil.

66 “Como se sabe a função nomifilácica se desenvolve por meio de ummétodo comparativo das decisões postas em confronto, a reclamar acongruência dos contornos fáticos e a semelhança dos elementosjurídicos da causa, de modo a exigir do tribunal de revisão, noexercício de sua alta tarefa, um pronunciamento que se preste parauniformizar a aplicação do direito quando surgir divergência nainterpretação do direito.” (OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Asemelhança no dissídio jurisprudencial para efeitos de recursoespecial e embargos de divergência e a lógica in Meios de Impugnação aojulgado civil: estudos em homenagem a José Carlos Barbosa Moreira, FABRÍCIO, AdroaldoFurtado (Coord.). Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 130/131)

39

Tal assertiva é verdadeira na medida em que a

divergência jurisprudencial é prejudicial não apenas aos

jurisdicionados (violação à segurança jurídica, isonomia,

etc.), mas ao próprio o ordenamento processual civil.

Por exemplo, acredita-se que um dos maiores vilões

da morosidade do Poder Judiciário é o volume de novas

demandas, o qual é alimentado pelo alto grau de

litigiosidade (“animus litigandi”) decorrente, principalmente,

da instabilidade dos posicionamentos dos Tribunais.67

De outra forma, as partes sempre buscarão

judicializar as suas pretensões resistidas, enquanto

vislumbrarem a possibilidade de um ou outro julgador

albergar a sua tese jurídica, ainda que isso signifique

divergir do entendimento majoritário do respectivo Tribunal

ou dos Tribunais Superiores. O resultado é uma verdadeira

avalanche de trabalho em todos os graus de jurisdição.

Nesse desiderato, assevera o festejado professor da

Universidade de Turim, Sergio Chiarloni, em artigo sobre os67 “(...) a melhor compreensão da matéria e a indicação de pressupostosclaros, assim como uma maior uniformidade da jurisprudência, evitam ouminimizam a deslegitimação do Poder Judiciário perante a sociedadecivil – fator fundamental em épocas de crise, tal como a queatravessamos –, por sua íntima conexão com o princípio da igualdade,um dos mais significativos da ordem constitucional brasileira.”(OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. A semelhança no dissídiojurisprudencial para efeitos de recurso especial e embargos dedivergência e a lógica in Meios de Impugnação ao julgado civil: estudos emhomenagem a José Carlos Barbosa Moreira, FABRÍCIO, Adroaldo Furtado (Coord.).Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 133)

40

precedentes judiciais, que o número de recursos na Corte de

Cassação italiana não para de aumentar diante divergência

gerada pelos seus próprios membros68, sendo certo que tal

situação gera “un deprecabile circolo vizioso. Quanto più aumentano i

ricorsi, tanto più aumentano i contrasti”.69 70

Merece aplausos, então, a louvável preocupação dos

autores do anteprojeto do novo Código de Processo Civil, no

particular. A exposição de motivos é enfática acerca da

necessidade de pacificação dos posicionamentos dos

Tribunais, a começar pelos Tribunais Superiores, in verbis:

“Por outro lado, haver, indefinidamente, posicionamentos diferentes

e incompatíveis, nos Tribunais, a respeito da mesma norma jurídica,

leva a que jurisdicionados que estejam em situações idênticas,

tenham de submeter-se a regras de conduta diferentes, ditadas por

decisões judiciais emanadas de tribunais diversos.

68 No mesmo sentido: “Raramente la storia della giustizia civile havisto verificarsi un caso più clamoroso di eterogenesi dei fini di unanorma processuale. Pensata per assicurare la parità di trattamento deicittadini coinvolti in un procedimento giudiziario, la garanziauniversale del ricorso in cassazione si è ritorta contro il suo scopo.La ragione è semplice. L’enorme numero dei ricorsi in cassazione, oggiarrivati a superare i trentamila l’anno, ha comportato la conseguenzadi veder fiorire in moltissimi settori del diritto privato i contrastiinterpretativi dovuti sia all’elefantiasi della corte e al suo internodisordine organizzativo, sai alle incomprimibili divergenze sui valorisottesi all’interpretazione giuridica, che si verificano nellevalutazioni dei differenti collegi che ruotano entro Le sezioni”.(CHIARLONI, Sergio. Funzione Nomofilattica e Valore Del Precedente.In: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Direito Jurisprudencial.São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 229.)69 Idem.70 “um círculo vicioso condenável. À medida que aumentam os recursos, aumentam tambémas divergências.” (tradução livre)

41

Esse fenômeno fragmenta o sistema, gera intranqüilidade e, por

vezes, verdadeira perplexidade na sociedade.

Prestigiou-se, seguindo-se direção já abertamente seguida pelo

ordenamento jurídico brasileiro, expressado na criação da Súmula

Vinculante do Supremo Tribunal Federal (STF) e do regime de

julgamento conjunto de recursos especiais e extraordinários

repetitivos (que foi mantido e aperfeiçoado) tendência a criar

estímulos para que a jurisprudência se uniformize, à luz do que

venham a decidir tribunais superiores e até de segundo grau, e se

estabilize.

Essa é a função e a razão de ser dos tribunais superiores: proferir

decisões que moldem o ordenamento jurídico, objetivamente

considerado. A função paradigmática que devem desempenhar é

inerente ao sistema.

Por isso é que esses princípios foram expressamente formulados.

Veja-se, por exemplo, o que diz o novo Código, no Livro IV: “A

jurisprudência do STF e dos Tribunais Superiores deve nortear as

decisões de todos os Tribunais e Juízos singulares do país, de modo a

concretizar plenamente os princípios da legalidade e da isonomia.

Evidentemente, porém, para que tenha eficácia a recomendação no

sentido de que seja a jurisprudência do STF e dos Tribunais

superiores, efetivamente, norte para os demais órgãos integrantes

do Poder Judiciário, é necessário que aqueles Tribunais mantenham

jurisprudência razoavelmente estável.

A segurança jurídica fica comprometida com a brusca e integral

alteração do entendimento dos tribunais sobre questões de direito.”

42

O texto do artigo 882 (versão Senado) e os artigos

483 e 484 (versão consolidada na Câmara – antes da

votação)71, do projeto do novo Código de Processo Civil

traduzem a atenção dada ao tema. Vê-se que apesar da

alteração da redação durante o trâmite legislativo,

permanecem com a mesma premissa fundamental, qual seja:

71 Art. 882. Os tribunais, em princípio, velarão pela uniformização epela estabilidade da jurisprudência:I - sempre que possível, na forma e segundo as condições fixadas noregimento interno, deverão editar enunciados correspondentes à súmulada jurisprudência dominante;II - os órgãos fracionários seguirão a orientação do plenário, doórgão especial ou dos órgãos fracionários superiores aos quaisestiverem vinculados, nesta ordem;III - a jurisprudência pacificada de qualquer tribunal deve orientaras decisões de todos os órgãos a ele vinculados;IV - a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e dos tribunaissuperiores deve nortear as decisões de todos os tribunais e juízossingulares do país, de modo a concretizar plenamente os princípios dalegalidade e da isonomia;V - na hipótese de alteração da jurisprudência dominante do SupremoTribunal Federal e dos tribunais superiores ou daquela oriunda dejulgamento de casos repetitivos, pode haver modulação dos efeitos daalteração no interesse social e no da segurança jurídica.§ 1º A mudança de entendimento sedimentado observará a necessidade defundamentação adequada e específica, considerando o imperativo deestabilidade das relações jurídicas.§ 2º Os regimentos internos preverão formas de revisão dajurisprudência em procedimento autônomo, franqueando-se inclusive arealização de audiências públicas e a participação de pessoas, órgãosou entidades que possam contribuir para a elucidação da matéria.Da eficácia do precedente judicial Art. 483. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-laestável. Art. 484. Para dar efetividade ao disposto no artigo anterior e aosprincípios da legalidade, da segurança jurídica, da duração razoáveldo processo, da proteção da confiança e da isonomia, as disposiçõesseguintes devem ser observadas: I – na forma e segundo as condições fixadas no regimento interno, ostribunais deverão editar enunciados correspondentes à súmula dajurisprudência dominante; II – os juízes e os tribunais seguirão a súmula vinculante, asdecisões proferidas em assunção de competência, em incidente deresolução de demandas repetitivas e em julgamento de recursosextraordinário e especial repetitivos;

43

velar pela uniformização e pela estabilidade da

jurisprudência.

A modernização dos métodos de uniformização e

estabilização da jurisprudência, ou melhor, dos

instrumentos para a realização efetiva do princípio da

III – os juízes e os tribunais seguirão os enunciados das súmulas doSupremo Tribunal Federal em matéria constitucional, do SuperiorTribunal de Justiça em matéria infraconstitucional e dos tribunais aosquais estiverem vinculados, nesta ordem; IV – não havendo enunciado de súmula da jurisprudência dominante, osjuízes e tribunais seguirão os precedentes do plenário do tribunal, ouórgão especial, onde houver, e a dos órgãos fracionários superiores,nesta ordem; V – a jurisprudência dominante de qualquer tribunal, ainda que nãoconsolidada em súmula, deve orientar as decisões de todos os órgãosjurisdicionais a ele vinculados; VI – na hipótese de alteração da sua jurisprudência dominante,sumulada ou não, os tribunais devem modular os efeitos da decisão quesupera o entendimento anterior, limitando sua retroatividade ou lheatribuindo efeitos prospectivos. § 1º. A mudança de entendimento sedimentado, que tenha ou não sidosumulado, observará a necessidade de fundamentação adequada eespecífica, considerando os princípios da segurança jurídica,confiança e isonomia. § 2º. Nas hipóteses dos incisos III, IV e V do caput deste artigo, amudança de entendimento sedimentado poderá realizar-seincidentalmente, no processo de julgamento de recurso ou de causa decompetência originária do tribunal, observado, sempre, o disposto noinciso VI do caput deste artigo. § 3º. O efeito previsto nos incisos II, III, IV e V do caput desteartigo decorre dos fundamentos determinantes dos acórdãos adotadospela maioria dos membros do colegiado, cujo entendimento tenha ou nãosido sumulado. § 4o. Não possuem o efeito previsto nos incisos II, III, IV e V docaput deste artigo: I – os fundamentos, ainda que presentes no acórdão, que não foremimprescindíveis para que se alcance o resultado fixado em seudispositivo; II – os fundamentos, ainda que relevantes e contidos no acórdão, quenão tiverem sido adotados pela maioria dos membros do órgão julgador. § 5o. O precedente dotado do efeito previsto nos incisos II, III, IV eV do caput deste artigo pode não ser seguido, quando o órgãojurisdicional distinguir o caso sob julgamento, demonstrando, medianteargumentação racional e justificativa convincente, tratar-se de casoparticularizado por situação fática distinta ou questão jurídica não

44

isonomia, é objeto de primeira necessidade em qualquer

(nova) regulamentação processual civil.

À luz dessa preocupação é que o objeto deste ensaio

ganha relevo. É inegável a importância dos embargos de

divergência para se evitar a chamada jurisprudência lotérica72

perante os Tribunais Superiores, sendo certo que os autores

do anteprojeto entenderam por bem fulminar a grande maioria

das discussões acerca dos pressupostos de cabimento por

meio do próprio texto da lei:

Art. 997. É embargável a decisão de turma que:

I – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do

julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo as

decisões, embargada e paradigma, de mérito;

II – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do

julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo as

decisões, embargada e paradigma, relativas ao juízo de admissibilidade;

III – em recurso extraordinário ou em recurso especial, divergir do

julgamento de qualquer outro órgão do mesmo tribunal, sendo uma

examinada, a impor outra solução jurídica. § 6o. Os tribunais deverão sistematizar seus precedentes e dar-lhespublicidade, organizando-os por questão jurídica decidida edivulgando-os preferencialmente por meio da rede mundial decomputadores.72 Segundo Eduardo Cambi, “A idéia da jurisprudência lotérica se inserejustamente nesse contexto; isto é, quando a mesma questão jurídica éjulgada por duas ou mais maneiras diferentes. Assim, se a parte tivera sorte de a causa ser distribuída a determinado Juiz, que tenhaentendimento favorável da matéria jurídica envolvida, obtém a tutelajurisdicional; caso contrário, a decisão não lhe reconhece o direitopleiteado.” CAMBI, Eduardo. Jurisprudência Lotérica, Revista dosTribunais, São Paulo: RT, ano 90, v. 786, abr. 2001, p. 111.

45

decisão de mérito e outra que não tenha conhecido do recurso, embora

tenha apreciado a controvérsia;

IV – nas causas de competência originária, divergir do julgamento de

qualquer outro órgão do mesmo tribunal.

§ 1º. Poderão ser confrontadas teses jurídicas contidas em julgamentos

de recursos e de ações de competência originária;

§ 2º. A divergência que autoriza a interposição de embargos de

divergência pode verificar-se na aplicação do direito material ou do

direito processual.

§ 3º Cabem embargos de divergência quando o acórdão paradigma é da

mesma turma que proferiu a decisão embargada, desde que a sua

composição tenha sofrido alteração em mais da metade de seus

membros.

Como se depreende do texto projetado, a (eventual)

nova redação do artigo que regerá os embargos de

divergência traduz o ideal de afastar a maioria dos

empecilhos que nos dias atuais bloqueiam o conhecimento e

até mesmo a possibilidade de interposição desse recurso.

Segundo os incisos I, II e III, do mencionado

dispositivo, não será mais necessário buscar um acórdão

paradigma que tenha o mesmo grau de cognição do julgado

embargado, bastando que a matéria relativa ao juízo de

admissibilidade ou de mérito esteja veiculada.

Somando-se a isso, o foco será direcionado à

divergência propriamente dita, independente do meio em que

46

fora identificada. Dessa maneira, poderão ser interpostos

embargos de divergência contra as decisões lançadas em

ações de competência originária, bem como estas poderão ser

utilizá-las como paradigma em acórdãos proferidos em

recurso extraordinário e especial.

A questão acerca da utilização de acórdão paradigma

proveniente da mesma Turma julgadora do acórdão embargado

também teve a atenção devida. Nessa conjectura, será

possível a utilização do julgado se mais da metade da

composição da Turma tiver sido alterada.

Fica visível, reiterando o entendimento de Cândido

Rangel Dinamarco, a elevação da função institucional

atribuída aos embargos de divergência, seguindo a patente

preocupação com a uniformidade e estabilização da

jurisprudência dos Tribunais, seja qual for a discussão

envolvida (juízo de admissibilidade, juízo de mérito,

direito processual ou direito material).

Outra questão que não pode ficar esquecida é que se

retirou a referência existente hoje no Código de Processo

Civil quanto aos Regimentos Internos do Supremo Tribunal

Federal e Superior Tribunal de Justiça. Por conseguinte,

seus termos apenas deverão prevalecer quando não colidentes

com a (eventual) nova redação do Estatuto Processual Civil.

47

Em apertada síntese, o que se quer dizer com toda

essa analise é que os embargos de divergência são espécie

recursal deveras útil ao sistema processual civil

brasileiro, razão pela qual os Tribunais Superiores não

devem perder tempo tentando afastar o cabimento desse

recurso, aplicando a monótona jurisprudência defensiva.

Muito ao avesso, o que se espera – se assim se mantiver a

redação do projeto – é que independente do veículo que se

utilize, a divergência seja efetivamente analisada e

extirpada, a fim de assegurar a uniformidade das decisões

judiciais, bem como maior segurança jurídica aos

jurisdicionados.

7. CONCLUSÕES

Independente do nome dado aos meios postos para

erradicar as divergências intra muros, o fato é que, antes

mesmo do Código de Processo Civil de 1939, a legislação

brasileira já adotava instrumentos para sanar eventuais

decisões contrastantes no bojo dos nossos Tribunais.

Ao longo do tempo, todavia, diversas modificações

legislativas tiveram o condão de alterar as espécies

recursais, as respectivas hipóteses de cabimento, bem como

aspectos procedimentais dos instrumentos com tal desiderato

uniformizador. No que tange aos embargos de divergência,

atualmente, estes são regidos pelo Código de Processo Civil

e pelos regimentos internos do Supremo Tribunal Federal e

48

Superior Tribunal de Justiça, âmbito próprio de sua

aplicação.

Além dos embargos de divergência, cumpre frisar que

o sistema processual civil pátrio dispõe de diversos

instrumentos semelhantes, mas que com este não devem ser

confundidos, seja pelo domínio de aplicação, seja pelas

hipóteses de incidência, ou mesmo pelas funções que

exercem, isto é, de prevenir a ocorrência da divergência ou

simplesmente fulminá-la após a sua verificação.

Com efeito, os Tribunais Superiores vêm criando

inúmeras restrições ao cabimento e conhecimento dos

embargos de divergência, que, como visto, extrapolam os

limites da legislação ordinária, sendo, a rigor,

manifestamente ilegítimas. Há também incontáveis súmulas,

tanto do Supremo Tribunal Federal, quanto do Superior

Tribunal de Justiça, tratando dos mais diversos aspectos

inerentes aos embargos de divergência, tanto diretamente,

quanto por analogia, algumas inclusive que sequer traduzem

as posições atuais desses Tribunais Superiores.

Por meio de tais constatações se pretende concluir

que esse verdadeiro emaranhado de entendimentos

jurisprudenciais (por vezes divergentes sobre a aplicação

dos embargos de divergência), súmulas, regras de regimentos

internos, etc., fazem com que os Tribunais Superiores

restrinjam em demasia a aplicação dos embargos de

49

divergência, instrumento este que tem como finalidade

primordial justamente a de manter uniforme e estável a

aplicação do direito em prol dos jurisdicionados e, porque

não, dos próprios Ministros do Supremo Tribunal Federal e

do Superior Tribunal de Justiça.

Repisando o entendimento de Sergio Chiarloni,

quanto maior for o número de recursos, maior será a

divergência dentro do mesmo Tribunal, se a preocupação com

a uniformização das decisões não estiver em primeiro lugar.

Se se considerar a quantidade de recursos represados no

Pretório Excelso e no Superior Tribunal de Justiça, chega-

se à conclusão de que ao invés de repulsar, os membros

desses Tribunais Superiores deveriam aproveitar ao extremo

a interposição dos embargos de divergência como forma de

afastar as teses jurídicas divergentes.

Justamente nesse sentido é a exposição de motivos

do projeto de novo Código de Processo Civil. Os autores do

anteprojeto consignaram expressamente a importância da

uniformização e estabilidade da jurisprudência em todos os

graus de jurisdição, com o claro intuito de gerar a

almejada previsibilidade nas decisões proferidas pelas

Cortes pátrias.

O Código de Processo Civil projetado, segundo o

texto aprovado pelo Senado Federal, portanto, visa

manifestamente a extirpar as discussões atuais acerca dos

50

embargos de divergência, em especial as hipóteses de

cabimento e as características dos acórdãos contrastados,

de forma que os Ministros dos Tribunais Superiores percam

menos tempo tentando repelir os recursos interpostos,

concentrando maior energia na efetiva resolução das

divergências identificadas.

Diante deste breve ensaio acerca da evolução dos

embargos de divergência – e não obstante a existência de

vozes que defendam a sua extinção –, nos parece correto

dizer que esta espécie recursal se mostra evidentemente

relevante e proveitosa para garantir estabilidade,

uniformidade e solidez na aplicação do direito, condições

inarredáveis para se atingir a previsibilidade das decisões

e, por conseguinte, a segurança jurídica e o tratamento

isonômico dos jurisdicionados.73

8. BIBLIOGRAFIA

ABDO, Helena Najjar. Embargos de Divergência: aspectos

históricos, procedimentais, polêmicos e de direito

comparado. In: NERY JUNIOR, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda

Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos

cíveis. Vol. 9. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

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