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61Arq Bras Oftalmol. 2012;75(1):61-3
Relato de Caso | Case RepoRt
INTRODUÇÃOO carcinoma espinocelular da conjuntiva (CEC) é o tumor malig
no mais comum da conjuntiva(1). Possui etiologia multifatorial(2,3) ida de avançada(4), exposição a raios ultravioleta(4,5), e a derivados do petróleo, fumaça de cigarro, infecção pelo papilomavírus humano (HPV)(5), e pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV).
O CEC conjuntival possui baixo grau de malignidade, facilmente identificável, raramente leva à metástase e responde muito bem à ex cisão cirúrgica; entretanto, pode haver recorrência, o que o torna mais agressivo(6).
A terapia de escolha é a excisão cirúrgica, sendo a ressecção in completa o maior fator de risco para o insucesso terapêutico(4). Ou tras causas de recidiva seriam a semeadura de células tumorais no momento da exérese, surgimento da lesão “de novo” ou recidiva(1).
Tratamentos adjuvantes como crioterapia, radiação e antimetabólicos têm sido empregados para reduzir a recidiva, como terapia primária ou adjuvante.
O objetivo deste relato de caso é apresentar um portador de CEC tratado por exérese da lesão e aplicação tópica de 5fluoruracila (5FU) e que evoluiu de forma desfavorável, discutindo os fatos à luz da li te ratura pertinente.
RELATO DO CASOMasculino, 68 anos, pardo, procedente de Cerquilho/SP, foi
atendido na Faculdade de Medicina de Botucatu (UNESP) em agos
to/2005, com queixa de nódulo indolor no olho esquerdo (OE), pru rido intenso e lacrimejamento. Negava outros sintomas visuais ou sistêmicos, não possuía antecedentes oculares e relatava hipertensão arterial, diabetes mellitus e gastrite.
Ao exame oftalmológico, acuidade visual (AV) corrigida era 20/60 no olho direito (OD) e 20/40 no OE; pressão intraocular por tonometria de aplanação era 12 mmHg OD e 14 mmHg OE. À biomicroscopia observouse lesão conjuntival de aspecto papilomatoso, elevada, vas cularizada, invadindo a córnea, com concreções em sua superfície, localizada no limbo temporal OE (Figura 1).
Suspeitouse de CEC, procedendose à exérese com aplicação intraoperatória de 5FU. O diagnóstico anatomopatológico confirmou CEC moderadamente diferenciado, com margens cirúrgicas livres (Fi gura 2). O paciente foi reencaminhado para acompanhamento na cidade de origem.
Em setembro/2006, apresentou nova lesão no OE há 15 dias, em local diferente da lesão prévia. A biomicroscopia evidenciou lesão elevada, com superfície lisa e coloração amarelada, localizada na região nasal superior OE. Realizada biópsia, com resultado de CEC. Foi introduzido ciclo de 5FU 25 mg/ml, três vezes ao dia, durante se te dias e programada cirurgia para exérese que não foi realizada, por ter ocorrido regressão da lesão. Realizado raspado conjuntival, tendo como resultado a presença de células epiteliais com atipias discretas, inconclusivo para malignidade.
Novo ciclo de 5FU tópico foi realizado, com acompanhamento ambulatorial mensal.
Carcinoma espinocelular de conjuntiva com evolução para exenteração: relato de casoConjunctival squamous cell carcinoma requiring orbital exenteration: case report
Larissa Horikawa satto1, MariangeLa estHer aLencar Marques2, siLvana artioLi scHeLLini3
Submitted for publication: April 12, 2011 Accepted for publication: June 10, 2011
Study carried out at the Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP.1 Physician, Setor de Plástica Ocular, Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia, Cirurgia
de Cabeça e Pescoço, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual de São Paulo - UNESP - Botucatu (SP), Brazil.
2 Pathologist, Departamento de Patologia, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual de São Paulo - UNESP - Botucatu (SP), Brazil.
3 Professor, Departamento de Oftalmologia, Otorrinolaringologia, Cirurgia de Cabeça e Pescoço, Fa culdade de Medicina, Universidade Estadual de São Paulo - UNESP - Botucatu (SP), Brazil.
Funding: No specific financial support was available for this study.
Disclosure of potential conflicts of interest: L.H.Satto, None; M.E.A.Marques, None; S.A.Schellini, None.
Correspondence Address: Silvana Artioli Schellini. DEP. OFT/ORL/CCP. Faculdade de Medicina de Botucatu - UNESP - Botucatu (SP) - 18618-970 - Brazil - E-mail: [email protected]
RESUMOPortador de carcinoma espinocelular da conjuntiva teve a lesão removida, com re corrência em outra localização. O paciente recebeu ciclos de 5Fluoruracila como tratamento adjuvante à remoção cirúrgica, apresentando evolução desfavorável que chegou à exenteração orbitária. São feitos comentários quanto ao uso de antimi tó ticos no tratamento destas lesões.
Descritores: Neoplasias de células escamosas; Neoplasias da túnica conjuntiva; Re cidiva local de neoplasia; Exenteração orbitária; Fluoruracila/administração & do sagem; Fluoruracila/uso terapêutico; Antimitóticos/uso terapêutico; Humanos; Mas culino; Meia idade
ABSTRACTA case of a squamous cell carcinoma of the conjunctiva is presented. The lesion was removed with recurrence in another conjunctival site. The patient received cycles of 5-Fluorouracil as adjuvant treatment to the surgical removal and presented unfavorable evolution, requiring orbital exenteration. Comments are made on the use of antimitotic drugs in the management of these lesions.
Keywords: Neoplasms, squamous cell; Conjunctival neoplasms; Neoplasm recurrence, local; Orbit exenteration; Fluorouracil/administration & dosage; Fluorouracil therapeutic use; Antimitotic agents/therapeutic use; Humans; Male; Middle aged
Carcinoma espinocelular de conjuntiva com evolução para exenteração: relato de caso
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Dois meses após o raspado conjuntival e na vigência do uso do 5FU, houve novo crescimento da lesão de aspecto esponjoso, na região nasal superior OE. O antimitótico foi mantido por mais dois meses, em esquema regressivo, tendo novamente ocorrido regressão da lesão conjuntival.
Três meses depois, o paciente retorna com abaulamento conjuntival próximo ao fundodesaco superior, com coloração amarelada e presença de neovasos. O antimitótico foi intensificado.
Em março/2007, a lesão apresentavase difusa, acometendo to do o limbo nasal e avançando sobre a córnea, com aspecto de CEC in situ. Após um mês, a lesão parecia estável, apesar do uso do antimitótico.
Optouse por nova exérese, realizada em junho/2007, com diagnóstico anatomopatológico de CEC, com margens profundas acometidas. Em setembro/2007, evidenciouse novamente lesão elevada no mesmo local. Feito biópsia excisional, com resultado de conjuntivite aguda supurativa, sem sinais de neoplasia. Solicitada revisão da lâmina ao serviço de Patologia, o qual manteve o diagnóstico.
Em dezembro/2007, verificouse presença de lesão elevada, extensa, irregular, com algumas áreas hiperpigmentadas, na conjuntiva nasal OE, ocupando todos os fundosdesaco conjuntivais e avançando sobre a córnea (Figura 3).
Indicado uso de 5FU enquanto era feito “screening” para avaliação de acometimento sistêmico e infiltração local, usando tomografia computadorizada de órbita e ultrassonografia cervical, que não revelaram comprometimento das estruturas avaliadas, exceto do osso etmoide.
Optouse pela exenteração orbitária, removendose o osso etmoide. O exame anatomopatológico revelou CEC ulcerado, pouco diferenciado, com atipias celulares intensas, mitoses frequentes e raras células queratinizadas com infiltração superficial da esclera (Fi guras 4 e 5).
Decorridos três anos, o paciente encontrase em seguimento e bem. Foi feita a adaptação de prótese de face, com boa reabilitação estética.
DISCUSSÃOO paciente em questão apresentava as características dos por
tadores de lesões epiteliais malignas da conjuntiva com lesão típica, que foi removida e tinha margens cirúrgicas livres do tumor. No entanto, houve recorrência do tumor em outro local, com características clínicas diversas da primeira.
Figura 1. Aspecto ectoscópico do carcinoma espinocelular da conjuntiva, localizado no limbo temporal do olho esquerdo, no início do tratamento.
Figura 2. Carcinoma espinocelular da conjuntiva ulcerado e moderadamente diferenciado (HE200X).
Figura 3. Aspecto da lesão conjuntival recorrente, localizada no limbo nasal antes da exenteração orbitária. A lesão agora acometia toda a região nasal e chegava até os fundos-de-saco.
Figura 4. Carcinoma espinocelular da conjuntiva pouco diferenciado com invasão da esclera (HE200X).
Satto LH, et al.
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Figura 5. Carcinoma espinocelular da conjuntiva pouco diferenciado, com atipias celulares intensas, mitoses frequentes e raras células queratinizadas (HE400X).
A possibilidade de recidiva ou de recorrência reforça a necessi dade de revisões periódicas, mesmo que as margens cirúrgicas estejam livres do tumor, já que margens não acometidas não garantem a cura(1).
O uso de quimioterápicos tópicos, como o 5FU, a mitomicina C (MMC) e o interferon Alfa2b (IFN) tem sido feito como terapia adjuvante ou única para tratamento de tumores da conjuntiva. Entetanto, o paciente apresentou novas lesões após ter tido a regressão da lesão sob uso de 5FU.
A MMC é um agente antitumoral que inibe a síntese de DNA(2) e tem capacidade para erradicar células tumorais. Bons resultados têm sido obtidos, tanto com a terapia adjuvante, quanto com uso isolado, em doença primária e recorrente(6).
O 5FU é uma droga citostática e de ação antimetabólica, com potencial de toxicidade seletiva para o epitélio displásico. O uso do colírio de 5FU 1%, quatro vezes ao dia, durante quatro semanas pode levar à regressão clí nica da lesão, como também pudemos evidenciar, com substituição da lesão por epitélio normal; porém, existe risco de recidiva e de ceratoconjuntivite tóxica(7), muito mais frequente e mais importante com o uso da MMC, o que motiva o uso do 5FU no nosso serviço.
O 5FU apresenta diversas vantagens quando comparado com a excisão cirúrgica(8): trata toda a superfície ocular, eliminando a ne cessidade de garantir margens cirúrgicas livres; reduz o risco de defi ciência de células tronco que ocorre nas excisões extensas envolvendo o limbo corneano; simplicidade do tratamento e custo reduzido, evitando repetições da cirurgia quando há recorrência. Co mo desvantagens, são relatadas(2,3): penetração limitada com po tencial falha no tratamento quando usada como agente único no CEC invasivo; potencial para mudanças no epitélio da nasofaringe; efeitos colaterais locais, como desconforto conjuntival e hiperemia, ceratopatia epitelial ponteada e blefaroespasmo.
O IFN por via tópica, subconjuntival ou combinação destas é efi ciente no tratamento de lesões primárias e recidivadas(9,10). O me canismo de ação não é conhecido, mas pode envolver uma combinação de efeitos antiproliferativo e antiviral contra o HPV. O uso tó pico é bem tolerado, mas febre e mialgia podem ocorrer com o uso subconjuntival(10).
Os quimioterápicos tópicos podem alterar a aparência clínica e histológica das células epiteliais, dificultando o diagnóstico, o que pode ter ocorrido no presente caso.
O antimitótico pode levar à regressão da lesão, o que foi confirmado pelo exame histológico no caso aqui relatado.
A lesão do paciente quando da última recidiva não era típica, com acometimento extenso, chegando até os fundosdesaco, sinal de prognóstico sombrio. A investigação sistêmica e local mostrou que seria ainda possível a exenteração, conduta agressiva, mas que se fez necessária. Apesar da grande morbidade ocasionada pelo procedimento realizado, a vida do paciente está preservada.
É importante ainda salientar que o acompanhamento do pa ciente deve ser criterioso, já que recidivas ou novos tumores po derão ocorrer.
CONCLUSÕESO CEC conjuntival é facilmente identificável e tratável. Recidivas
podem ocorrer, mesmo quando as margens cirúrgicas não estão acometidas. Os antimitóticos, como o 5FU, podem ser usados como tratamento único ou adjuvante à remoção cirúrgica. Os pacientes devem ter acompanhamento criterioso, sendo necessários, mais estudos, incluindo maior número de pacientes e maior tempo de seguimento, a fim de verificar a real eficácia dos antimitóticos no tratamento do CEC conjuntival.
REFERÊNCIAS 1. Schellini SA, Matai O, Shiratori C, Marques ME, Junior BO, Padovani CR. Lesões epi
teliais malignas da conjuntiva e recidiva tumoral estudo retrospectivo. Rev Bras Oftal mol. 2005;64(2):716.
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4. Bessa HJ, Potting MH, Bomfim MG. Neoplasias conjuntivais. Rev Bras Oftalmol. 1997; 56(10):7657.
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6. Akpek EK, Ertoy D, Kalyci D, Hasipiri H. Postoperative topical mitomycin C in conjunctival squamous cell neoplasia. Cornea. 1999;18(1):5962.
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10. Vann RR, Karp CL. Perilesional and topical interferon Alfa2b for conjunctival and corneal neoplasia. Ophthalmology. 1999;106(1):917. Comment in: Ophthalmology. 1999; 106(9):16423.