Vol. 12 | N. 21 | 2018 ISSN 1984-0519
Revista Frontistés – Faculdade Palotina
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FUNDAMENTOS DA DEONTOLOGIA KANTIANA
Jonas Gabriel Vilela Santos*
Resumo: O presente artigo objetiva realizar uma breve incursão nos fundamentos da
deontologia kantiana, aclarando, especialmente a partir das obras Crítica da Razão Prática e
Fundamentação da Metafísica dos Costumes, os conceitos regentes da filosofia moral de
Kant. Num primeiro ato, introduzir-se-ão os prolegômenos filosóficos que anteviram ao
criticismo kantiano; em seguida, definir-se-á a natureza do sujeito transcendental proposto por
Kant; o fundamento da ação moral; a definição dos imperativos e por fim, uma explanação do
plano deontológico como processo livre que conduz à autonomia.
Palavras-chave: Kant. Imperativo Categórico. Sujeito Transcendental. Liberdade.
Groundworks of Kantian deontology
Abstract: This article aims do a brief inside in the Kant’s deontology fundaments
highlighting specially from de works: Critic of the Pratic Reason and Fundaments of the
Metaphysics of Morals, the guiding concepts of Kant’s moral philosophy. Firstly, will it
define the transcendental subject’s nature proposed by Kant; following, the groundwork of the
moral action; the imperatives’ definition and at the end an explanation about the deontological
plan as freedom process which guide to autonomy.
Keywords: Kant. Categorical Imperative. Transcendental Subject. Liberty.
Considerações iniciais
O pensador objeto do presente artigo é umas das figuras mais emblemáticas do rol de
polímatas europeus do século XVIII. Diz-se polímata porque, para além da carreira filosófica,
o mesmo se dignou adentrar áreas na pesquisa e na docência tão diversas e abrangentes que o
título póstumo de “Filósofo Cosmopolita” lhe é perfeitamente adequado. Correligionário da
prole iluminista, Kant deve ser situado no rol dos pensadores de alto calibre revolucionário
* Acadêmico do 4º semestre do Curso de Filosofia da Faculdade Palotina – FAPAS. E-mail:
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que mudaram as linhas do pensamento e da visão de mundo da modernidade dos séculos
XVII e XVIII. Junto dos revolucionários dos sistemas de realidade vigentes, como Nicolau
Copérnico e Isaac Newton, Kant se encarregou de solucionar com diligência e obstinação o
problema da autonomia do sujeito frente à grandiosidade do ‘sistema físico’, mecânico e
determinista que irrompia nas universidades, especialmente inglesas e escocesas, já no
declínio da promessa iluminista, cenário este de famigerado ceticismo.
Immanuel Kant nasceu em 1724, no interior da antiga Prússia, cidade de Könisberg,
hoje Kaliningrado (pertencente ao território da Rússia). Apesar do reconhecimento e honrarias
locais que recebeu das autoridades locais, sobretudo por sua proeminente atividade
acadêmica, Kant provinha de uma família, aos moldes da época, acentuadamente modesta
(REALE, 2005, p. 348-349). Seus pais trabalhavam em ofícios vulgares: o pai, Johann Georg,
era lavrador e seleiro, a mãe, Ana Regina Reuter, era dona de casa. Trabalharam arduamente
para a sobrevivência e educação moral dos seis filhos; e foi naquele contexto prussiano, de
austeridade familiar e uniformidade educacional para com os filhos, que o jovem Immanuel
desenvolveu sua personalidade, caráter e visão de mundo.
Estudou no Collegium Fridericianum, cujo diretor era o pastor pietista, F. A. Schultz,
na época, também professor de teologia da Universidade de Könisberg cujas as aulas Kant
frequentou (ROHDEN, 2011, p. 61). A preferência pela instituição foi de sua mãe, Regina,
que planejou decididamente educar os filhos na tradição protestante pietista. Ambiente
demasiadamente rigoroso e protocolar que, mais tarde, viria interferir nas notas mais sutis da
filosofia moral do Kant maduro (REALE, 2005, p. 348). Lá aprendeu latim, parcialmente
grego, e também realizou suas primeiras incursões nas obras clássicas do pensamento
moderno iluminista. Por sua dificuldade com o grego, pode não ter chegado a ler os clássicos
da literatura e filosofia gregas, como sugerem alguns de seus historiadores.
Em 1740 matricula-se na Universidade de Könisberg, cursa aí ciências naturais e
filosofia, graduando-se em 1747. Nos sete anos seguintes foi preceptor nas casas de diversas
famílias dos arredores de Könisberg, ofício que o manteve financeiramente enquanto
doutorava-se (ROHDEN, 2011, p. 62). Em 1755 obteve sua licença de Livre-Docente e em
1764 recusa o pedido do governo local que assumisse a cátedra de Arte Poética. Lecionou,
ainda em Könisberg, até 1770, quando recebeu seu título de docente ordinário com a
dissertação De mundi sensibilis atque inteligibilis forma et principiis (Das formas e princípios
do mundo sensível e inteligível), lecionando as disciplinas de metafísica e lógica. Um ano
antes de sua admissão rejeita ser professor titular em Erlangen e Jena em vista de salvaguardar
sua oportunidade em Könisberg.
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Em 1772 abandona o cargo de bibliotecário da biblioteca real do castelo de Könisberg,
emprego conseguido em 1765. Em 1786 é escolhido reitor da universidade e eleito membro
da Academia de Ciências de Berlim (ROHDEN, 2011, p. 64).
Em sua carreira, como supradito, foi estimado por algumas autoridades locais, por
exemplo: o barão von Zedlitz chegou a oferecer-lhe uma cátedra na Universidade de Halles
em 1778. Entretanto, com a morte do Rei da Prússia, Friederich II – como narra Reale, um
“filoiluminista” –, ao qual o barão von Zedlist era submisso, Kant veio a sofrer represarias já
em seus últimos anos de vida por parte da corte. De tez reacionária, o então Rei despede o
barão de Könisberg de seu cargo de ministro e, em 1794, ordena através do serviço de censura
da Prússia uma repreensão ao Filósofo por suas ideias postuladas na publicação de A Religião
nos Limites da simples Razão. Os historiadores e biógrafos contemporâneos de Kant como
Johann Gottfried Herde (1744-1803) – o qual frequentou as aulas de Kant em Könisberg –,
são quase unânimes ao reconhecer que Kant se manteve obediente à corte sem, no entanto,
retratar-se oficialmente.
Nunca fez grandes expedições ou viagens para fora de Könisberg. Tem-se registro de
apenas duas saídas em toda a sua vida; e os anos passados na pequena cidade sempre foram
vividos com prussiana metodicidade. Acordava às cinco, fazia sua caminhada vespertina
sempre no mesmo horário, nunca faltava a seus deveres e era pontualíssimo nas aulas
(REALE, 2005, p. 349). Os últimos anos da vida do senhor de “testa larga, constituída de
propósito para pensar; sempre sereno arguto e erudito; aberto a todas instâncias da cultura
contemporânea” (REALE, 2005, p. 349), foram de trágico sofrimento. A velhice lhe tomou as
forças físicas, motoras e intelectuais; perdeu grande parte da visão, beirando a cegueira; veio a
sofrer sérios surtos de amnésia e aos poucos foi perdendo a lucidez reflexiva. Em 1796, aos
23 dias de junho faz sua última preleção na universidade; em 1800 sua debilitação física
piora, levando Wasianski e Jäsche, dois discípulos seus, a organizar e publicar suas lições.
Faleceu no leito de seu quarto aos 12 dias de fevereiro do ano de 1804, 11 horas em
decorrência de um quadro semivegetativo (ROHDEN, 2011, p. 64).
1 Prolegômenos filosóficos do pensamento kantiano
É de consenso de considerável parte da comunidade acadêmica de pesquisadores na
teoria do Filósofo de Könisberg que a argumentação moral e epistemológica deste se funda
em princípios mistos de duas grandes correntes ocidentais, especialmente epistemológicas; a
saber, o racionalismo de René Descartes, o qual mais tarde influenciaria Baruc Spinoza e
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Gottfried Leibiniz, e o empirismo da tradição inglesa e escocesa, tendo por expoentes, John
Locke, Georg Berkley e, especialmente, David Hume. Portanto, expor e analisar a filosofia
moral kantiana é, ao mesmo passo, realizar um diálogo histórico com os clássicos
antagonismos modernos. Assim nos atesta Paul Guyer:
Como vários filósofos do tempo de René Descartes e Thomas Hobbes, Kant tentou
explicar tanto a possibilidade do novo conhecimento científico, o qual havia
culminado na visão de mundo matemática de Isaac Newton, quanto a possibilidade
da liberdade humana (1992, p. 1-2)1.
Já no auge da teoria moderna da explicação científica e experimental do mundo e do
sujeito humano, Kant busca dar uma resposta sólida a um paradoxo que se punha ao se levar a
termo as concepções morais de Descartes e Hume.
Diferentemente dos mecanicistas e empiristas desde Hobbes a David Hume, Kant
não tentou reduzir a liberdade humana a mais um mecanismo entre aqueles de uma
natureza predeterminada, mas, também diferentemente dos racionalistas desde
Descartes a Gottfried Wilhelm Leibniz e Christian Wolf, Kant não esteve
intencionado em fundamentar a liberdade humana em uma intuição racional
afirmada em algum mundo objetivamente perfeito, tão somente obscurecido
confusamente pelos sentidos (GUYER, 1992, p. 2)2.
Este paradoxo entre o determinismo das correntes naturalistas versus o platonismo que
emana das teorias cartesianas sugere a condenação da alma humana, ou numa imanente
condição natural, ou numa causa extramundana que, para ser alcançada, exige um exacerbado
menosprezo das faculdades sensíveis em função de ordenar a ação como que aos modos da
geometria e das evidências matemáticas. Kant observa uma natureza comum a essas duas
faces do problema antropológico posto por este antagonismo: ambas põem em causas
exógenas a determinação da ação humana. O empirismo, nas faculdades sensíveis que ao
causarem prazer ou dor regulam as estruturas sentimentais que levam o homem ou à ação
viciosa, ou à ação virtuosa, sem haver aí um juízo de bondade ou maldade livremente
deliberado. Nesta corrente, a liberdade da vontade não existe. Como expoente desta classe
filosófica, Hume em seu Tratado Sobre a Natureza Humana afirma que
1“Like many philosophers from the time of René Descartes and Thomas Hobbes onward, Kant tried to explain
both the possibilty of the new scientific knowledge, which had culminated in the mathematical worldview of
Isaac Newton, and the possibility of human freedom”. Todas as traduções que se encontrarem neste artigo são
nossas. 2“Unlike mechanists and empiricists from Hobbes to David Hume, Kant did not try to reduce human freedom to
merely one more mechanism among those of a predictable nature, but, unlike rationalists from Descartes to
Gottfried Wilhelm Leibniz and Christian Wolf, Kant was not willing to ground human freedom on an alleged
rational insight into some objectively perfect world only confused grasped by the senses”.
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[...] podemos recordar o precedente sistema das paixões e notar uma diferença mais
considerável entre nossas dores e prazeres. O orgulho e a humildade, o amor e o
ódio, são estimulados quando se nos apresenta algo que possui uma relação com o
objeto da paixão e produz uma sensação separada da relacionada com a sensação.
Pois bem: a virtude e o vício vão acompanhados destas circunstâncias. Devem
encontrar-se necessariamente em nós ou em nos outros e estimular prazer ou dor, e
por conseguinte, dar lugar a uma destas quatro paixões, as quais se distinguem
claramente do prazer e a dor que despertam os objetos inanimados e que
frequentemente não têm relação conosco; este é, quiçá, o efeito mais considerável
que a virtude e o vício têm sobre o espírito humano ( 2001, p. 342)3.
O fundamento exógeno para a ação moral virtuosa está no estimulo de sensações que
conjugalmente produzem o desejo de uma possível conduta, o que Hume chamou de
sentimento nobre, uma qualidade de sentimento oriundo da mesma fonte dos que causam o
vício, entretanto, que habitua o homem a sentimentos comuns de humildade, amor, coragem.
Não é o homem que em última instância age de livre vontade deliberativa, mas até a
deliberação é fruto da mnemônica das percepções de dor ou prazer que, pela força habitual,
conduzem o raciocínio para o que é mais útil e bom. A liberdade do sujeito é, na verdade, uma
trama complexa de percepções e impressões psicológicas constituintes das paixões internas; a
vontade é sempre movida pelo desejo estimulado pelas experiências de prazer.
Na outra mão do paradoxo estão os racionalistas que, como Descartes, admitem uma
espécie de intuição intelectual como fundamento para o conhecimento verdadeiro, o qual
deveras orienta (move) a vontade para a ação moral virtuosa. No texto As Paixões da Alma,
Descartes escreve:
Mas a vontade é, por natureza, de tal modo livre que nunca pode ser compelida; e,
das duas espécies de pensamentos que distingui na alma, das quais uns são suas
ações, isto é, suas vontades, e os outros as suas paixões, tomando-se esta palavra em
sua significação mais geral, que compreende todas as espécies de percepções, os
primeiros estão absolutamente em seu poder e só indiretamente o corpo pode
modificá-los, assim como, ao contrário, os últimos dependem absolutamente das
ações que os produzem, e a alma só pode modificá-los indiretamente, exceto quando
ela própria é sua causa (1973, p. 242-243).
3“[...] podemos recordar el precedente sistema de las pasiones para hacer notar uma diferencia aun más
considerable entre nuestros Dolores y placeres. El orgullo y la humildad, el amor y el ódio, son excitados cuando
se nos presenta algo que posee uma relación com el objeto de la pasión y produce uma sensación separada
relacionada com la sensación. Ahora bien: la virtude y el vicio van acompañados de estas circunstancias. Deben
hallarse necessariamente em nosotros o em los otros y excitar placer o dolor, y por consiguiente, dar lugar a una
de estas cuatro pasiones, que se distinguen claramente del placer y el dolor que despiertan los objetos
inanimados y que frecuentemente no tienen relación com nosotros; éste es quizá el efecto más considerable que
la virtude y el vicio tienen sobre el espíritu humano.”
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Neste tratado sobre a mecanicidade das funções da alma humana em relação a si
própria e ao corpo que a contém, Descartes define um conceito fundamental que seu
racionalismo, mais tarde, viria subsidiar ao criticismo moral kantiano, “a vontade é, por
natureza, de tal modo livre que nunca pode ser compelida”. Descartes devolve ao sujeito
pensante o poder de agir sem uma determinação natural das afecções, entretanto, o
fundamento da possibilidade da ação moral está no conhecimento dedutivo do agir enquanto
derivado de juízos verdadeiros (DESCARTES, 1973, p. 246-247). Este conhecimento pode
ser alcançado através do entendimento da evidência de ordem geométrica em todo existente, e
esse entendimento é uma espécie de intuição racional oriunda em si de um ser transcendente
que seja puramente cógito, ilimitado e eterno. Um puro espírito que se dignou conceder à
alma humana uma ideia pura e homogênea.
É mister, portanto, rejeitar inteiramente a opinião vulgar de que há fora de nós uma
fortuna que faz com que as coisas sobrevenham ou não sobrevenham, a seu bel-
prazer, e saber que tudo é conduzido pela providência divina, cujo decreto eterno é
de tal modo infalível e imutável que, excetuando as coisas que este mesmo decreto
quis pôr na dependência de nosso livre arbítrio, devemos pensar que, com respeito a
nós, nada acontece que não seja necessário e como que fatal, de sorte que não
podemos sem erro desejar que aconteça de outra forma (DESCARTES, 1973, p.
280).
Para Descartes, o ‘livre-arbítrio’ é o princípio da possibilidade de uma ação reta e,
segundo ele, virtuosa. Com toda certeza, Descartes ainda deposita nesse conhecimento inato,
provido por Deus, a razão pela qual se julgam as ações. Contudo, aí já se encontra um faixo
de luz a respeito do que mais tarde Kant viria afirmar sobre os princípios ilegítimos para
moral, dentre eles, os juízos sintéticos ad posteriori, subsidiados pela experiência sensível.
Descartes, do mesmo modo, rejeita a visão utilitária de que a ação virtuosa ocorra em função
da perseguição de um bem empírico e abre o leque de discussões que mais tarde Kant
continuará na Fundamentação da Metafísica dos Costumes.
Toda essa especulação se funda numa nova noção de ciência filosófica que Kant, junto
do idealismo alemão, inaugura: o ‘idealismo transcendental’. Essa transcendentalidade do
sujeito cognoscente e do conhecimento enquanto tal é o que possibilita a sugerida síntese
entre ‘razão’ e ‘sensibilidade’.
2 O sujeito transcendental
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Para adentrar o problema moral em Kant, é preciso, preletivamente, introduzir o leitor
em sua sistematização categorial; definir em que ela se pauta; qual seu fundamento e objeto;
e, enquanto ciência, qual sua natureza.
Assim, o próprio Kant nos introduz:
Ainda, porém, que todo o nosso conhecimento comece com a experiência, nem por
isso surge ele apenas da experiência. Pois poderia bem acontecer que mesmo o
nosso conhecimento por experiência fosse um composto daquilo que recebemos por
meio de impressões e daquilo que a nossa própria faculdade de conhecimento
(apenas movida por impressões sensíveis) produz por si mesma; uma soma que não
podemos diferenciar daquela matéria básica enquanto um longo exercício não nos
tenha tornado atentos a isso aptos a efetuar tal distinção (2013, p. 45-46).
Kant busca evidenciar os limites do conhecimento regulando que a totalidade dos
juízos, começa, mas não surge inteiramente da experiência sensível (2013, p. 45), sendo assim
possível distinguir ‘conhecimento puro’ e ‘conhecimento empírico’. Vê-se que esta
abordagem vem em resposta ao ceticismo empirista, o qual definira que nada há no intelecto
que não seja impressão dos dados empíricos. Assim, Kant faz uma diferenciação da natureza
dos juízos, ou do que se diz conhecer. “Tais ‘conhecimentos ‘são denominados a priori e se
diferenciam dos ‘empíricos’, que têm suas fontes a posteriori, i. e., na experiência (2013, p.
46). Kant ainda afunila esta definição de juízos qualificando-os entre ‘analíticos’ e
‘sintéticos’. Estas qualificações são ditas a respeito da relação proposicional entre sujeito e
predicado, onde “ou o predicado “B” pertence ao sujeito “A” como algo que já está contido
(de modo oculto) neste conceito “A”; ou “B” se localiza inteiramente fora do conceito “A””
(2013, p. 51). No primeiro caso estão definidos os analíticos, no segundo, os sintéticos.
Dessa maneira, Kant identifica as ciências, como a matemática e a física que têm seus
princípios de conhecimento em ‘juízos sintéticos a priori’, como ciências lógicas enquanto
necessitam de um dado autoevidente para serem atestadas enquanto ciência, sendo seus
limites claros e definidos, pois
deixar que os limites de uma ciência se confundam com os de outra não constitui um
aumento, mas sim uma deformação da mesma; o limite da lógica, contudo, está
firmemente determinado pelo fato de ela ser uma ciência que apenas apresenta e
prova, com toda força, as regras formais de todo pensar [...] (KANT, 2013, p.25-26).
Assim, Kant desmistifica alguns juízos que se sedimentaram na tradição sob a
prerrogativa de juízos analíticos, especialmente os gerados na trajetória histórica da ciência
matemática; por exemplo, que 2+2 = 4 seja autoevidente. Em verdade os termos 2 e 2 não
contém o predicado 4, senão supondo a operação de soma, o modo de relação entre ambos.
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Essa ideia de adição é qualquer conceito diverso dos elementos 2 e 2, logo, define-se este
como juízo sintético.
Podemos já antecipar que os tipos de juízos visados por Kant não podem ser os a
posteriori, pois estes são, de toda forma, impossíveis fora da experiência sensível; já os a
priori, sendo analíticos ou sintéticos, parecem estar já no entendimento de modo formal
enquanto princípio de possibilidade de enquadramento da própria experiência. Assim se
deixarmos “[...] que se apague gradativamente, de seu conceito empírico de um corpo, tudo
aquilo que é nele empírico – a cor, a dureza ou maciez, o peso, mesmo a impenetrabilidade -,
permanecerá, todavia, o espaço que ele ocupava [...]” (KANT, 2013, p. 48). O espaço tem,
portanto, valor ‘apriorístico’, pois sem seu conceito, os demais predicados do corpo não
subsistiriam. Depreende-se que essa nova maneira de Kant investigar o que se pode conhecer
visa a ‘aprioristicidade’, os conceitos sem os quais o sistema científico rui. Sobre este
conhecimento, sintetiza Kant:
Eu denomino transcendental todo conhecimento que se ocupe não tanto com os
objetos, mas com o nosso modo de conhecer os objetos, na medida em que estes
devam ser possíveis a priori. Um sistema de tais conceitos se denominaria filosofia
transcendental (2013, p. 60).
Como esta ciência deita sua investigação sobre o conhecimento e suas categorias
apriorística, Kant ousa, como Descartes, definir o objeto de ciência transcendental enquanto
presente no pensamento. Kant está preocupado com o que é o conhecimento do objeto, sem
dar margem à ilusão imaginária da razão. Portanto, Kant busca a consciência de uma intuição
interna que em tudo situe o pensante como sujeito e não como objeto: “Não é por meramente
pensá-lo que conheço um objeto (Objetkt), mas é porque determino uma intuição dada, com
relação à unidade da consciência em que todo pensamento consiste, que conheço um objeto
(Gegenstand)” (2013, p. 306). Este Gegenstand é a determinação que realiza o sujeito como
substância formalmente pensante sobre um Objekt, que é o constituído como tal. É uma
unidade de consciência de uma intuição pela qual um conhecimento se relaciona ao objeto
(KANT, 2013, p. 71). Descartes afirmou que essa intuição é racional, portanto, inata. Kant, ao
contrário definirá que a única intuição (representação) apriorística do sujeito transcendental é
empírica e ‘pura’, no sentido de ser a forma segundo a qual se percebe.
Eu denomino ‘puras’ (em sentido transcendental) todas as representações em que
não se encontra nada que pertença à sensação. Assim, a forma pura das intuições
sensíveis em geral, nas quais todo o diverso dos fenômenos é intuído em certas
relações, será encontrada a priori na mente [...] Na investigação se verificará que há
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duas formas puras da intuição sensível como princípios do conhecimento a priori,
quais sejam, o espaço e o tempo, com cuja consideração nos ocuparemos agora
(KANT, 2013, p. 72-73).
Assim concluímos, a partir deste último trecho da Estética Transcendental, que o
sujeito transcendental é uma estrutural formal do sujeito humano na qual se entendem
intuições apriorísticas e a possibilidade dos juízos sintéticos. Este mesmo sujeito tem uma
existência meramente conceitual e formal, não empírica ou individual. Essa concepção é
basilar para, agora, introduzir-se a natureza da lei moral, da vontade e da liberdade
transcendental, está última subsistindo da mesma maneira.
3 Fundamentos da moral
O Filósofo de Könisberg inicia a primeira secção da Fundamentação da Metafísica
dos Costumes apresentando um conceito mor para o entendimento da ação moral, a ‘boa
vontade’. Nem uma das virtudes almejáveis pelo agente moral, como discernimento, argúcia,
capacidade de julgar, etc. (2007, p. 21), podem lograr êxito em sua bondade se não forem
orientadas por um princípio de ‘caráter’, não utilitário e para além do conceito de virtude, que
os reja. Kant introduz este capítulo reconhecendo a ‘boa vontade’ como esse princípio:
A boa vontade não é boa por aquilo que promove ou realiza,
pela aptidão para alcançar qualquer finalidade proposta, mas tão somente pelo
querer, isto é em si mesma, e, considerada em si
mesma, deve ser avaliada em grau muito mais alto do que tudo o
que por seu intermédio possa ser alcançado em proveito de qualquer
inclinação, ou mesmo, se se quiser, da soma de todas as inclinações (KANT, 2007,
p. 23).
A boa vontade é o pressuposto kantiano de toda ação moral. Ela em si mesma
constitui-se autônoma em relação àquilo a que leva agir o sujeito. Kant ao afirmar que esta
deve ser avaliada em si mesma, em sentido formal, portanto, transcendental, sem ser
conjugada com a bondade (utilidade) final da ação, situa-a no mesmo grau de independência
formal do sujeito transcendental, não sendo, portanto, uma paixão da alma, como diria Hume.
É a real possibilidade de uma ação incondicionada por qualquer fator externo à formalidade
do próprio sujeito.
Uma ação praticada por dever tem o seu valor moral, ‘não no propósito’ que com ela
se quer atingir, mas na máxima que a determina; não depende portanto da realidade
do objeto da ação, mas somente do ‘princípio do querer’ segundo o qual a ação,
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abstraindo de todos os objetos da faculdade de desejar foi praticada (KANT, 2007,
p. 30).
O ‘dever’ contém, portanto, a boa vontade em si (2007, p. 26); é o exercício próprio da
faculdade autônoma da vontade, contudo, esse exercício não atualiza por si a ação moral. Está
compreende uma disposição moral em agir ‘pelo dever’ e não somente “em conformidade
com o dever” (KANT, 2007, p. 27). Segundo Kant, a ação vem a ser moral quando não restam
dúvidas ao sujeito pensante, consciente de sua ação, sobre as motivações de sua vontade.
Como situação exemplar, Kant, ilustra essa condição com o caso do suicídio:
[...] quando as contrariedades e o desgosto sem esperança roubaram totalmente o
gosto de viver; quando o infeliz, com fortaleza de alma, mais enfadado do que
desalentado ou abatido, deseja a morte, e conserva contudo a vida sem a amar, não
por inclinação ou medo, mas por dever, então a sua máxima tem um conteúdo moral
(2007, p. 28).
A ação em vista de seu objeto compreende uma ‘inclinação’ e, portanto
passionalidade; já a ação pelo dever presta ao princípio pelo qual se age um ‘respeito’
(KANT, 2007, p. 31). Esse respeito, ao contrário da inclinação, constitui a atividade da
própria vontade e não o efeito desta. O respeito da vontade se presta a um princípio, ou juízo,
maior que ela, afinal, esse dever é uma razão de ação, um axioma, uma ‘lei’; portanto, “dever
é a necessidade de uma ação por respeito à lei” (2007, p. 31), pois
Só pode ser objeto de respeito e portanto mandamento aquilo que está ligado à
minha vontade somente como princípio e nunca como efeito, não aquilo que serve à
minha inclinação mas o que a domina, ou que, pelo menos, a exclui do cálculo na
escolha, quer dizer a simples lei por si mesma (KANT, 2007, p. 31).
O grande prezar de Immanuel Kant sobre a possibilidade da ação moral do sujeito
transcendental situa-se na superação da heteronomia dos fundamentos dessa ação, os quais
legou a tradição cética empirista. O sujeito só age moralmente enquanto o faz em
conformidade com o dever e pelo dever, o que compreende uma independência da vontade em
relação aos motivadores exógenos como o prazer e a dor físicos (somáticos) e, até mesmo, às
paixões endógenas, como a vaidade e a soberba. Assim o dever é a “máxima que determina a
ação” (KANT, 2007, p. 30), o princípio do querer.
Deve-se observar que este princípio do querer não pode estar situado nos efeitos que
se espera da ação, os quais condicionariam os motivadores da ação não tendo, portanto,
nenhum valor incondicionado (KANT, 2007, p. 30). Em que residiria, pois, este valor? Em
parte alguma que não o
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‘princípio da vontade’, abstraindo dos fins que possam ser realizados por uma tal
ação; pois que a vontade está colocada entre o seu princípio a priori, que é formal, e
o seu móbil a posteriori, que é material [...] (KANT, 2007, p. 30).
Define-se aqui, portanto, que a ‘vontade’ é um princípio formal a priori, ou seja,
intuitivo, pertencente à estrutura formal da condição da possibilidade de conhecimento e
juízo, o sujeito transcendental.
Na esfera dos princípios formais a priori, a vontade, capaz de orientar-se pelos juízos
racionais, não se basta em sua formalidade para a ação moral. Não é a simples liberdade
negativa que qualifica a autonomia da ação moral. Como supradito, é pela lei que o dever se
orienta determinando a vontade pelo respeito ao seu princípio.
Essa lei é a chave de leitura para a ação moral em Kant. “Ora, se uma ação realizada
por dever deve eliminar totalmente a influência da inclinação [...], nada mais resta à vontade
que a possa determinar do que a ‘lei’ objetivamente (2007, p. 30)”. Já na esfera subjetiva,
Kant define que o “puro respeito” a essa lei há de se dar de modo prático formulado em uma
“máxima que manda obedecer a esta lei prática, mesmo com prejuízo de todas as minhas
inclinações” (2007, p. 31).
Por conseguinte, nada senão a ‘representação da lei’ em si mesmo, que ‘em verdade
só no ser racional se realiza’, enquanto é ela [...] pode constituir o bem excelente a
que chamamos moral, o qual se encontra já presente na própria pessoa que age
segundo a lei (KANT, 2007, p. 32).
Mas em que consiste essa lei? Qual sua natureza? Onde reside seu fundamento? Estas
são perguntas centrais para a investigação do fundamento último da moral para o Filósofo de
Könisberg.
3.1 A lei moral e os imperativos
Duas coisas enchem o ânimo de admiração e reverência sempre nova e crescente,
quanto mais frequente e persistentemente a reflexão se ocupa delas: o céu estrelado
sobre mim e a lei moral em mim. Não me é necessário buscar ou simplesmente
suspeitá-las fora de meu horizonte como veladas em obscuridades ou no
transcendente4: vejo-as antes de mim e conecto-as diretamente com a consciência de
minha existência (KANT, 2002, p. 203)
4“Two things fill the mind with ever new and increasing admiration and reverence, the more frequently an
persistently one’s meditation deals with them: the starry sky abouve me and the moral law within me. Neither of
them do I need to seek or merely suspect outside my purview, as veiled in obscurities or [as lying] in the
extravagant: I see them before me and connect them directly with the consciousness of my existence”. A
tradução deste trecho da conclusão da segunda parte da CRP (Crítica da Razão Prática) tem uma peculiaridade
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Este célebre parágrafo com que Kant inicia a conclusão da segunda parte da Crítica da
Razão Prática, a respeito do método da razão prática pura, sintetiza a essência daquilo que
Kant entende por princípio determinante da vontade, colocando-o no auge das sublimidades
com que o homem conscientemente se relaciona.
Sendo o dever a possibilidade transcendental de uma ação em respeito à lei, e não por
inclinação passional aos efeitos dela, é necessário determinar e definir qual a natureza e
fundamento desta lei, onde esta repousa; pois a liberdade negativa da ação conforme o dever é
apenas a possibilidade mais lata e sem a efetiva atualização da ação autônoma. Kant entende
que o princípio do agir pelo dever não pode prestar-se a uma lei, ou representação de lei,
externa ao sujeito; entenda-se externa, toda lei ou representação desta não determinada pela
faculdade da razão pura, fundamento do sujeito transcendental. “A razão pura é prática por si
mesmo e concede (ao ser humano) uma lei universal, a qual podemos chamar ‘lei moral’”
(KANT, 2002, p. 46)5. Portanto, Kant investiga na estrutura formal da razão pura, elementos
para uma lei moral fundamental que possa ser expressa numa representação prática, tal como
busca na razão pura especulativa os fundamentos teoréticos para definir a natureza dos juízos
sintéticos apriorísticos como intuições empíricas, delimitando que os princípios pelos quais o
entendimento organiza e une na consciência a percepção são categorias básicas presentes
enquanto estrutura na própria razão.
Neste caso a busca é por uma lei fundamental, uma lei moral, tal qual os fundamentos
intuitivos dos juízos, categorial.
Se um ente racional deve pensar [representar] suas máximas como leis práticas
universais, então ele pode pensá-las somente como princípios que contêm os
fundamentos determinantes da vontade, não pela sua matéria, mas tão somente pela
sua forma (KANT, 2002, p. 40)6.
A matéria dos princípios práticos é o objeto da vontade, aquilo para o qual ela se
inclina ou não. Se a vontade tiver seus fundamentos determinantes no objeto, então “sua regra
(lei) seria sujeito de uma condição empírica [...] e, consequentemente, não seria uma lei
destacável: o termo extravagant, regularmente traduzível por extravagante, exagerado, é notado pelo tradutor
para o inglês Werner S. Pluhar (2002) em rodapé com a expressão alemã im Überschwenglichen, correspondente
à inglesa in the transcendent. Por isso, preferiu-se traduzir para português desta última correspondente do
alemão. 5 “Pure reason is pratical by itself alone and gives (to the human being) a universal law, which we call the moral
law”. O termo correspondente do alemão para moral law é Sittengesetz. 6“If a rational being is to thin of his maxims as pratical universal laws, then he can think of them only as
principles that contain the determinig basis of the will not by their matter but merely by their form”.
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prática” (KANT, 2002, p. 40)7. Contudo, se toda a matéria, ou objeto da vontade, estiverem
separados da lei, então nada sobraria que não a ‘simples forma de uma legislação universal’.
Essa lei universal se expressa praticamente, de modo que “só um ser racional tem a
capacidade de agir ‘segundo a representação’ das leis, isto é, segundo seus princípios, ou: só
ele tem uma ‘vontade’” (KANT, 2007, p. 46). Essa vontade, apesar de ser a própria razão
prática formalmente, não é determinada suficientemente pela razão pura, pois ainda está em
sua materialidade sujeita a condições subjetivas, como diz Kant, a certos móbiles (2007, p.
48), os quais não coincidem com as condições objetivas da vontade. É o problema da natureza
contingente da vontade não responder necessariamente em sua subjetividade a representação
objetiva da razão pura. A determinação que esta última realiza sobre a vontade subjetiva
chama-se obrigação8; este princípio obrigante da vontade “chama-se mandamento (da razão),
e a fórmula do mandamento chama-se ‘Imperativo’” (KANT, 2007, p. 48).
É interessante notar que Kant define o ‘mandamento’ formulado em um ‘imperativo’
como obrigante da vontade, ou seja, aquilo que representa a lei moral, determinando a
vontade a agir conforme a lei. Essa definição ainda não é o que se poderia reconhecer como
sublimidade da ação moral, pois a ‘ação conforme’ tem um conteúdo moral negativo e não
ainda afirmativo. É preciso que a conformidade se converta em respeito, como supradito, esse
respeito à lei é o que faz a sublimidade da ação moral, a verdadeira boa vontade, a qual não
necessitaria de nenhum imperativo, dando a entender que a adequação entre as leis objetivas e
as condições subjetivas livres e indeterminadas, as quais só se determinam pelas
representações do bem (2007, p. 49), comporta que o imperativo não seja aplicável a todos
indiscriminadamente:
Por isso os imperativos não valem para a vontade ‘divina’ nem, em geral, para uma
vontade ‘santa’: o dever (Sollen) não está aqui no seu lugar, porque o ‘querer’
coincide já por si necessariamente com a lei. Por isso os imperativos são apenas
fórmulas para exprimir a relação entre leis objetivas do querer em geral e a
imperfeição subjetiva deste ou daquele ser racional, da vontade humana por exemplo
(KANT, 2007, p. 49).
Em se tratando, pois, dos imperativos como recursos práticos da lei para uma ação
necessária segundo o princípio de uma vontade boa de qualquer maneira (2007, p. 50), é
preciso que esse imperativo leve a uma ação cuja bondade se define na absolução em si da
ação; se ocorre o contrário, a ação já não é um bem em si, mas uma mediadora em vista de um
7“[...] the rule of the will would be subject to an empirical condition [...], and, consequently would not be a
pratical law”. 8 Nötigung.
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efeito. Essas duas qualidades de ações, Kant tipifica como derivadas de duas qualidades de
imperativos: o ‘categórico’ e o ‘hipotético’.
3.1.1 Imperativos hipotéticos
Os imperativos hipotéticos não se põem formalmente, como juízos sintéticos a priori.
Em verdade são sempre determinados a posteriori, o que compreende representarem a
necessidade de uma ação como boa somente em vista de outro que se queira alcançar a través
dela; o imperativo, nesse caso, é um meio. É objetivamente necessário em função de uma
heteronomia; é “[...] boa como meio para ‘qualquer outra coisa’ [...]” (KANT, 2007, p. 50).
Em sua formalidade, o imperativo hipotético, pode ainda ser dito como ‘problemático’,
fazendo jus ao termo hipotético, ao determinar a ação em vista de um intenção, ou inclinação
possível; ou ‘assertórico-prático’, quando se refere a uma intenção real, fática. De ambos os
modos, o presente imperativo é sempre fundamentado num juízo sintético a posteriori
passível de dúvida e, portanto, determinado primeiramente por condições subjetivas. Por
exemplo, o imperativo formulado: deve-se fazer tudo de modo a evitar a dor, não pode ser
universalizável objetivamente, porque o seu determinante é material e subjetivo, sendo assim,
múltiplo e particular; cada sujeito busca o seu prazer segundo sua condição material que é
causa do diverso e do contrário. Neste caso, uma certa prudência9 (phrônesis) aristotélica
estaria desvinculada do sentido de virtude ao passo que busca a felicidade. Esta ‘prudência’
como imperativo hipotético pode se dar como prudência nas
relações com o mundo, ou a prudência privada. A primeira é a destreza de uma
pessoa no exercício de influência sobre outras para as utilizar para as suas intenções.
A segunda é a sagacidade em reunir todas estas intenções para alcançar uma
vantagem pessoal durável. (KANT, 2007, p. 52)10
Assim o imperativo hipotético como ‘destreza’ ou ‘sagacidade’ dentro do escopo da
virtude da prudência, é um juízo analítico. Há ainda a qualidade imperativa da técnica
(thecné), pertencente à arte, visando à utilidade, ou ao juízo de do belo (estético), da mesma
forma, analítico. Assim Kant conclui que esses imperativos: destreza, sagacidade, arte
se devem considerar mais como conselhos (concilia) do que como mandamentos
(praecepta) da razão; que o problema de determinar certa e universalmente, que
9 Klugheit.
10 Nota de Kant ao termo Gesinung (disposição) no 21º parágrafo da 2ª secção (Transição da filosofia moral
popular para a metafísica dos costumes).
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ação poderá assegurar a felicidade de um ser racional, é totalmente insolúvel, e que
portanto, em relação com ela, <<nenhum imperativo é possível que possa ordenar,
no sentido rigoroso da palavra, que se faça aquilo que nos torna felizes>> (2007, p.
55-56).
Conclui-se, portanto, que na ordem dos imperativos hipotéticos, virtude e felicidade
não coincidem necessariamente, de modo que “a felicidade não é um ideal da razão, mas da
imaginação, que assenta somente em princípios empíricos dos quais é vão esperar que
determinem uma conduta necessária” (2007, p. 56). Finalmente, os imperativos hipotéticos
são proposições analítico-práticas, não fundadas em um factum11
, como compreende Kant.
Resta-nos, agora, definir o segundo conceito geral de imperativo, o categórico.
3.1.2 Imperativo categórico
Deve-se reconhecer ainda uma segunda possibilidade geral de imperativo que “sem se
basear como condição em qualquer outra intenção a atingir por um certo comportamento,
ordena imediatamente este comportamento” (KANT, 2007, p. 52). Não mantém relações com
a matéria da ação, a finalidade assertórica (felicidade), ou seus efeitos resultantes, mas
estabelece com a forma procedimental e com princípio que dela deriva, uma relação
determinada. Isso significa dizer que esse princípio se funda em juízos sintéticos a priori e é o
“essencialmente bom na ação consiste na disposição12
(Gesinnung), seja qual for o resultado”
(2007, p. 52).
Portanto, o imperativo categórico é a formulação da excelência da prática moral, ou,
como sintetiza Kant: “pode-se chamar o imperativo da moralidade” (2007, p. 52). A questão
problemática que mais evidentemente se propõe a esta definição é a de que esse imperativo
não é o único móbil da vontade. Como se poderia reconhecer a apoditicidade de uma máxima
imperativa moral, ou categórica, considerada por si mesma (2007, p. 56), como encontrar uma
seguridade de que a vontade é determinada tão somente pela representação da lei:
Não deves fazer promessas mentirosas para não perderes o crédito quando se
descobrir o teu procedimento»; admitimos pelo contrário que uma ação deste género
tem de ser considerada como má por si mesma, que o imperativo da proibição é
portanto categórico; mas não poderemos encontrar nenhum exemplo seguro em que
11
Termo empregado na Crítica da Razão Prática o qual designa um fato essencial, ou formal da razão, um
‘assim é’ da razão. Não se entenda em sentido empírico, como o próprio Kant indica: “não é nenhum fato
empírico mas o único factum da razão pura (2011, p. 53). 12
Deve-se entender “disposição” como motivação primeira da ação; não como disponibilidade, possibilidade
hipotética, ou mesmo como estado de ânimo. A expressão completa: “das Wesentlich-Gute derselben besteht in
der Gesinnung”, ou […] and the essential good in it consists in the disposition (KANT, 2011, p. 61).
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a vontade seja determinada somente pela lei, sem qualquer outro móbil, embora
assim pareça; pois é sempre possível que o receio da vergonha, talvez também a
surda apreensão de outros perigos, tenham influído secretamente sobre a vontade (KANT, 2007, p. 56).
Deste modo o imperativo não teria, senão uma função pragmática, cujo crivo são as
vantagens ou desvantagens consideradas em relação à inclinação da vontade do sujeito pelo
desejo. Por isso, este imperativo precisa ser considerado a priori, contornando a mera
explicação de sua máxima atingindo a real possibilidade de seu estabelecimento. Uma vez que
a lei moral é um fundamento em si mesmo, o imperativo categórico vem a ser seu
estabelecimento, não sendo passível de uma explicação externa à sua formalidade; é a síntese
tautológica: ‘dever pelo dever’. Kant não subestima a possibilidade do imperativo categórico
ser formulado em uma proposição que por si só possa ser este imperativo, contudo, reconhece
a dificuldade de se realizar tal empreendimento:
[...] o princípio da dificuldade que suscita este imperativo categórico ou lei da
moralidade, é também muito grande [...] Neste problema vamos primeiro tentar se
acaso o simples conceito de imperativo categórico não fornece também a sua
fórmula, fórmula que contenha a proposição que só por si possa ser um imperativo
categórico.
Um elemento conceitual necessário para o imperativo categórico é o conhecimento
teórico do conteúdo por ele contido. O imperativo hipotético só permite o conhecimento de
seu conteúdo ao passo que a condição de sua efetivação for dada; é empírico, portanto, a
posteriori. O conteúdo da lei da moralidade, de outro modo, contém tão somente “a
necessidade da máxima13
que manda conformar-se com a lei [...]” (KANT, 2007, p. 58-59).
Kant realiza simples e objetivamente, a formulação dessa máxima em um mandamento
autoevidente cujo conteúdo está posto a priori na razão do sujeito transcendental sem
depender de outrem:
Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se
torne lei universal [...]
Age como se a máxima da tua ação se devesse tornar, pela tua vontade, em lei
universal da natureza (KANT, 2007, p. 59)
13
O próprio Immanuel Kant toma nota da definição do conceito de ‘máxima’, pois a geração de uma fórmula
categórica do imperativo, ou seja, que tenha fundamento e conteúdo em si mesma, necessita de uma clara
diferenciação entre princípios subjetivos e objetivos de qualquer lei: “máxima é o princípio subjetivo da ação e
tem de se distinguir do princípio objetivo, quer dizer da lei prática. Aquela contém a regra prática que determina
a razão em conformidade com as condições do sujeito (muitas vezes em conformidade com a sua ignorância ou
as suas inclinações), e é o princípio segundo o qual o sujeito age; a lei, porém, é o princípio objetivo, válido para
todo o ser racional, princípio segundo o qual ele deve agir, quer dizer um imperativo (KANT, 2007, p. 58).
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Age de tal forma que a máxima de sua vontade possa valer sempre ao mesmo tempo
como um princípio de uma legislação universal14
(KANT, 2002, p. 45).
As duas primeiras formulações são da Fundamentação da Metafísica dos Costumes; a
terceira, da Crítica da Razão Prática. Ambas, em síntese, expressam a possibilidade prática
de uma ação que se apresenta como ‘máxima’. Máxima, sendo o princípio subjetivo da ação
(vontade), precisa do princípio objetivo da ação, a lei (mandamento) universal para ser dita
‘moral’. Kant, nesse sentido lato, não pensa o imperativo categórico como uma obrigação,
como dizem os críticos, ‘formulada para anjos’, sem considerar a própria contingencialidade
humana. Pelo contrário, o eixo da possibilidade do imperativo categórico é a equação que
cada sujeito humano pode e deve realizar entre a consciência da legislação universal objetiva
e máxima interna do agente. É uma constante possibilidade de, independentemente das
condições subjetivas, o sujeito poder realizar uma ação moral. É, em suma, uma
fundamentação de como se dá a ação moral, superando o determinismo mecanicista da
modernidade. Kant abre a possibilidade de o ser humano, entendido não como objeto do
conhecimento, mas como sujeito deste, iniciar uma ‘nova série’ prática, independente – em
seu princípio, não em sua materialidade – da determinação física da materialidade, ou
experiências sensíveis. Na fundamentação dessa máxima, enquanto, princípio da vontade,
Kant termina por identificar a razão da ocorrência da imoralidade. Um fator sutil, mas que se
sustenta num último elemento a ser tratado em nosso estudo sobre a deontologia kantiana.
Se agora prestarmos atenção ao que se passa em nós mesmos sempre que
transgredimos qualquer dever, descobriremos que na realidade não queremos que a
nossa máxima se torne lei universal, porque isso nos é impossível; o contrário dela é
que deve universalmente continuar a ser lei; nós tomamos apenas a liberdade de
abrir nela uma exceção para nós, ou (também só por esta vez) em favor da nossa
inclinação (KANT, 2007, p. 63).
A liberdade de abrir uma exceção ao sujeito agente é o desqualificante último da ação
moral. Portanto, o mandamento moral não é a rigor uma necessidade para o sujeito,
materialmente, mas tão somente ao sujeito transcendental enquanto este é estruturalmente
incondicionado, ou seja, absolutamente livre, tendo uma vontade autônoma.
4 Liberdade para autonomia
14
“So act that the maxim of your will could always hold at the same time as a principle of a universal legislation.
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Por fim, o último conceito chave do sistema moral kantiano é algo que se pressupôs
até o presente momento em virtude de se manter a metodologia analítica da ação moral até
chegar a um princípio último que, apesar de sua suma relevância e necessidade fundamental,
não deve ser entendido no campo da ontologia fundamental. O conceito de que falamos é o de
‘liberdade’.
A vontade é uma espécie de causalidade dos seres vivos, enquanto racionais, e
liberdade seria a propriedade desta causalidade, pela qual ela pode ser eficiente,
independentemente de causas estranhas que a determinem; assim como necessidade
natural é a propriedade da causalidade de todos os seres irracionais de serem
determinados à atividade pela influência de causas estranhas (KANT, 2007, p. 93).
Como o próprio Kant define, esta é uma ‘liberdade negativa’, pois sua essencial
propriedade de poder agir segundo sua própria lei é independente das causas estranhas.
Contudo, desta liberdade deriva uma ‘liberdade positiva’; o momento em que ação já não
meramente determinada por causas subjetivas, mas sim objetivas. O problema de se avaliar a
qualidade desta ação é que a própria liberdade possui um conteúdo apriorístico, portanto, não
definido. Assim, não é possível julgar em última instancia, ou seja, nas motivações mais
subjetivas se a ação foi genuinamente moral, apesar de sua forma prática ter sido. O móbil da
vontade não pode ser comunicado racionalmente.
Afirmar que a ‘liberdade positiva’ se dá na objetividade do imperativo implica dizer
que uma vontade, verdadeiramente livre é uma vontade submetida a leis morais; e, em última
instância, são a mesma coisa (KANT, 2007, p. 94).
Existe ainda uma última aporia que se apresenta à investigação sobre o conceito de
liberdade. Uma vez que a vontade é causa dos seres vivos racionais e a liberdade é sua
propriedade, pela qual ela pode ser eficiente e independente de causas estranhas (KANT,
2007, p. 93), como a liberdade pode se determinar objetivamente sendo que a vontade se
determina por um princípio subjetivo?
Não basta que atribuamos liberdade à nossa vontade, seja por que razão for, se não
tivermos também razão suficiente para a atribuirmos a todos os seres racionais. Pois
como a moralidade nos serve de lei somente enquanto somos seres racionais, tem ela
que valer também para todos os seres racionais; e como não pode derivar-se senão
da propriedade da liberdade, tem que ser demonstrada a liberdade como propriedade
da vontade de todos os seres racionais (KANT, 2007, p. 95).
Kant soluciona o problema considerando a ‘liberdade’ como atributo próprio da
vontade de todo ser racional. Isto é diferente da definição da liberdade como mera
determinação subjetiva. Agir livremente, ou julgar livremente, é uma faculdade imanente à
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vontade do sujeito enquanto ele é de natureza racional; é uma possibilidade apriorística de
todo ser racional, e não apenas dos seres enquanto indivíduos. Este esquadrinhamento da
liberdade permite-nos entender que todos os seres racionais podem agir sob uma ideia de
liberdade “e, portanto, é preciso atribuir, em sentido prático, uma tal vontade (livre) a todos os
seres racionais” (KANT, 2007, p. 96).
Da pressuposição desta ideia decorreu, porém, também a consciência de uma lei de
ação que diz que os princípios subjetivos das ações, isto é, as máximas, têm que ser
sempre tomados de modo a valerem também objetivamente [...] (KANT, 2007, p.
97).
Por fim, esta ideia de liberdade que orienta a máxima subjetiva precisa se tornar
máxima subjetiva de todos os seres racionais; é a grande tese moral de Kant: todo ser racional
pode fazer com que o princípio de sua ação valha para todos. O grande aporte inaugural de
Kant é que essa universalização da máxima em um imperativo segue um conceito caro,
derivado da liberdade, ‘autonomia’.
Ora à ideia da liberdade está inseparavelmente ligado o conceito de ‘autonomia’, e a
este o princípio universal da moralidade, o qual na ideia está na base de todas as
ações de seres ‘racionais’ como a lei natural está na base de todos os fenômenos
(KANT, 2007, p. 102).
A autonomia é para Kant o centro valorativo da filosofia moral. É o momento em que
o sujeito se reconhece não somente pertencente a um mundo sensível regido por leis naturais e
exógenas a sua estrutura formal (heterônomas), mas como pertencente a um mundo inteligível
regido por leis independentes da natureza, fundadas apenas na razão (KANT, 2007, p. 102).
Daí que se conclui a impossibilidade de o homem pensar a causalidade de sua vontade fora da
ideia de liberdade.
Pois agora vemos que, quando nos pensamos livres, nos transpomos para o mundo
inteligível como seus membros e reconhecemos a autonomia da, vontade juntamente
com a sua consequência – a moralidade (KANT, 2007, p. 103).
Considerações finais
Pode-se resumir que o grande empreendimento do sistema moral de Immanuel Kant é
o resgate da autonomia da ação do sujeito transcendental. Esta autonomia se funda na
condição de possibilidade de um princípio determinante da vontade que seja independente da
materialidade da ação. Esse fundamento é a lei moral; princípio sintético a priori, ou seja,
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fundamento formal subsistente na natureza racional do sujeito. O exercício eficaz do
cumprimento da lei moral é a ação em respeito ao ‘dever’, superando a mera negatividade da
ação em relação ao móbil da vontade, o que Kant chama de ‘ação conforme ao dever’. A ação
em respeito à lei é compreendida no ‘dever pelo dever’. Essa lei moral, não determina
eficientemente a vontade sem um princípio ordenador, um mandamento da moral que sirva
como máxima. Esse mandamento deve, de modo apriorístico, conter em si toda a formalidade
procedimental da ação sem servir de meio para a satisfação de uma inclinação sensível da
vontade. A este mandamento Kant denomina imperativo categórico, pois funda-se nos mesmo
princípio teórico dos juízos sintéticos a priori do entendimento; na especificação deste
imperativo, o Filósofo de Könisberg postula que todo juízo que se guie pela noção de bem, ou
felicidade, na verdade, gera princípios imperativos que não asseguram a moralidade da ação,
servindo apenas como meios para o conseguimento de interesses particulares. Kant afasta o
que a tradição ética manteve unido em necessária coincidência; a saber, ‘virtude’ e
‘felicidade’. Assim, ele debita a uma razão pura prática a origem desse imperativo. Contudo,
ainda postula a necessidade de uma equação entre a máxima determinante da vontade, a qual
é subjetiva, e a objetividade do princípio. Este princípio fundamental e atributo da vontade,
enquanto causa dos seres racionais, é a liberdade transcendental; a faculdade que permite o
sujeito dirigir a vontade para uma nova série independente das leis naturais. A consciência
desta independência é o que leva o sujeito a agir sob a representação (ideia) de liberdade
incondicionada. Por fim, a conduta orientada por esse princípio genuíno da vontade é a
autonomia, segundo Kant, a sublimidade do sujeito humano.
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