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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ Bruna Bertoldi Gonçalves OUVIDORIA VINCULADA À COMUNICAÇÃO: ESTUDO DE CASO DA PREFEITURA DE JARAGUÁ DO SUL FLORIANÓPOLIS 2011

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

Bruna Bertoldi Gonçalves

OUVIDORIA VINCULADA À COMUNICAÇÃO:

ESTUDO DE CASO DA PREFEITURA DE JARAGUÁ DO SUL

FLORIANÓPOLIS2011

OUVIDORIA VINCULADA À COMUNICAÇÃO:

ESTUDO DE CASO DA PREFEITURA DE JARAGUÁ DO SUL

Florianópolis2011

Bruna Bertoldi Gonçalves

OUVIDORIA VINCULADA À COMUNICAÇÃO:

ESTUDO DE CASO DA PREFEITURA DE JARAGUÁ DO SUL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao

curso de Especialização em Gestão da

Comunicação Pública e Empresarial, da

Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito

parcial para a obtenção do título de especialista

em comunicação pública e empresarial.

Orientador: Prof. Aldo Antonio Schmitz, Msc.

FLORIANÓPOLIS2011

RESUMO

A pesquisa verifica as possibilidades e possíveis vantagens de vincular a ouvidoria

ao setor de comunicação em uma instituição pública. Também são propostas do

trabalho aprofundar conhecimentos sobre a comunicação na esfera pública e

compreender o papel e as perspectivas da ouvidoria nesse cenário. O estudo de

caso tem como foco o modelo de ouvidoria adotado pela Prefeitura Municipal de

Jaraguá do Sul no ano de 2004, quando a Coordenadoria de Ouvidoria passou a ser

vinculada à Diretoria de Comunicação. A atuação dos setores ocorreu de forma

integrada e estratégica durante o período. Constatou-se que a instituição inovou e

obteve resultados positivos ao associar o setor de ouvidoria à comunicação.

Palavras-chave: Comunicação pública, ouvidoria, Jaraguá do Sul.

ABSTRACT

The research verify the possibilities and potential benefits of linking the listener office

to the communications department in a public institution. Work are also proposed to

deepen knowledge about communication in the public and understand the role of the

ombudsman and the prospects in this scenario. The case study focuses on the

ombudsman model adopted by the City Hall of Jaraguá do Sul in 2004, when the

listener has to be linked to communication. The performance of the sector occurred in

an integrated and strategic during the period. It was found that the institution has

innovated and worked successfully to associate office listener with the

communication.

Keywords: Public communication, listener, Jaraguá do Sul.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...........................................................................................................8

1.1 TEMA.......................................................................................................................9

1.2 JUSTIFICATIVA.......................................................................................................9

1.3 PROBLEMA...........................................................................................................10

1.4 OBJETIVO GERAL................................................................................................10

1.4.1 Objetivos específicos.........................................................................................10

1.5 METODOLOGIA....................................................................................................11

2 COMUNICAÇÃO PÚBLICA.....................................................................................15

2.1 COMUNICAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES............................................................17

2.1.2 Comunicação estratégica e integrada................................................................22

2.1.3 Gestão da comunicação.....................................................................................25

2.2 A COMUNICAÇÃO PÚBLICA................................................................................30

2.2.1 Marcos históricos................................................................................................33

2.2.2 A esfera pública e o espaço público ..................................................................35

2.2.3 O dever de informar e o direto à informação.....................................................38

2.2.4 Instrumentos de comunicação...........................................................................40

2.2.5 Processo de interação........................................................................................43

2.2.6 O gestor da comunicação pública......................................................................45

3 OUVIDORIA PÚBLICA............................................................................................49

3.1 HISTÓRICO DA OUVIDORIA NO BRASIL...........................................................52

3.2 DEFESA E ATENDIMENTO AO CONSUMIDOR..................................................55

3.3 A CIDADANIA........................................................................................................57

3.4 A OUVIDORIA NA COMUNICAÇÃO.....................................................................58

7

3.4.1 Estrutura da ouvidoria........................................................................................62

3.4.2 Tecnologia da informação..................................................................................64

3.4.3 Processo de interação........................................................................................66

3.4.4 A função educativa.............................................................................................67

4 A OUVIDORIA VINCULADA À COMUNICAÇÃO...................................................70

4.1 ESTUDO DE CASO: PREFEITURA DE JARAGUÁ DO SUL...............................71

4.1.1 Administração 2001-2004...................................................................................71

4.2 DE “RECLAMADORIA” À OUVIDORIA................................................................73

4.2.1 Ouvidoria vinculada à administração.................................................................73

4.2.2 Diretoria de Comunicação: novas perspectivas.................................................75

4.2.3 PIC, Ouvidoria e Comunicação..........................................................................75

4.3 A COMUNICAÇÃO NA GESTÃO DE UM NOVO MODELO DE OUVIDORIA.....78

4.3.1 A campanha de lançamento do PIC...................................................................84

4.3.2 Atuação integrada entre Comunicação e Ouvidoria..........................................85

4.3.3 Programas desenvolvidos a partir do PIC.........................................................88

4.4 OUVIDORIA E COMUNICAÇÃO NA PREFEITURA EM 2011..............................89

CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................92

REFERÊNCIAS...........................................................................................................93

8

1 INTRODUÇÃO

Esta monografia propõe um estudo de caso sobre o modelo de ouvidoria

adotado pela Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul no ano de 2004. No referido

ano, a Coordenadoria de Ouvidoria do órgão passou a ser vinculada à Diretoria de

Comunicação. A atuação dos setores ocorreu de forma integrada e estratégica

durante o período. Parte das ações de comunicação desenvolvidas era planejada e

executada a partir das informações que chegavam aos ouvidores. A equipe de

comunicação intervinha estrategicamente em determinadas situações referentes à

Ouvidoria, como será relatado.

A pesquisa tem por finalidade aprofundar conhecimentos sobre a

comunicação na esfera pública, compreender o papel da ouvidoria nesse cenário e

verificar as possibilidades e possíveis vantagens de vincular a atividade ao setor de

comunicação em uma instituição pública. A hipótese levantada é a de que ocorrem

melhorias na comunicação entre a instituição e seus públicos quando as referidas

áreas atuam de forma sinérgica.

Para alcançar os objetivos citados, no segundo capítulo é feito o resgate dos

conceitos de comunicação pública. O estudo parte de revisão bibliográfica com base

em Maurício Camargos (2004), Jorge Duarte (2009), Graça Monteiro (2009),

Margarida Kunsch (2003, 2009a, 2009b), Wilson Bueno (2009) e Elizabeth Brandão

(2009). No terceiro capítulo, estão em análise aspectos referentes à ouvidoria

pública, levando em conta proposições de autores como Edson Luiz Vismona

(2000), Luiz Carlos Iasbeck (2010), João Elias de Oliveira (2000, 2010), Chussely

Souza de Lima (2010) e Cristina Ayoub Riche (2010). Entrevistas em profundidade

servem de base para o desenvolvimento do estudo de caso no quarto capítulo. Nas

9

considerações finais não se pretende impor conclusões. Considera-se que esse

trabalho é apenas um começo.

1.1 TEMA

A monografia estuda as perspectivas da ouvidoria pública como processo de

interação e canal de comunicação entre o serviço público e a sociedade. A sua

vinculação à área de comunicação é o foco do estudo de caso proposto.

1.2 JUSTIFICATIVA

A realidade da comunicação nas organizações públicas é complexa e

diversificada, e há questões que necessitam ser estudadas com maior rigor para que

seja possível aperfeiçoar a teoria e a prática. A forma de atuação das ouvidorias

públicas é uma dessas questões. Demonstrar os resultados de um modelo bem-

sucedido, em que a ouvidoria se vincula diretamente ao setor de comunicação, é

uma maneira de contribuir com a discussão do tema.

De acordo com Lima (2010, p. 153), há “uma evidente fragilidade teórica no

que tange à transversalidade das temáticas ouvidoria, gestão e comunicação”. A

pesquisa reveste-se de relevância por investigar um tema pouco explorado e que

começa a ser discutido pelos pesquisadores da área da comunicação, além de

propor a produção de novos conhecimentos sobre comunicação pública e ouvidoria

pública.

Há poucos registros bibliográficos sobre casos em que a ouvidoria pública

está ligada à comunicação e, por isso, a apresentação de um estudo de caso que

detalhe o modelo adotado por um órgão público – com análise de procedimentos e

10

resultados - poderá servir de insumo e de ponto de partida para outros trabalhos

sobre o assunto.

O levantamento de informações servirá também como instrumento de gestão

e de tomada de decisão profissional, por revelar técnicas que contribuirão com os

conhecimentos na área e auxiliarão no planejamento de ações específicas para a

atuação da ouvidoria pública, sob o olhar estratégico da comunicação.

1.3 PROBLEMA

Pretende-se investigar as possibilidades e as vantagens de a ouvidoria atuar

em conjunto com a comunicação nos órgãos públicos, compreender as funções da

ouvidoria pública e identificar conceitos apresentados por pesquisadores no que se

refere à comunicação pública.

1.4 OBJETIVO GERAL

Apresentar as perspectivas da ouvidoria pública como processo de interação

e canal de comunicação entre o Estado e a sociedade, e avaliar as possibilidades e

vantagens de vincular a ouvidoria diretamente à área de comunicação.

1.4.1 Objetivos específicos

• Registrar os estudos sobre comunicação pública e ouvidoria no serviço

público.

• Revisar as abordagens sobre a ouvidoria nas organizações públicas e

privadas, como um processo de interação e canal de comunicação.

• Apresentar, por meio de estudo de caso, as possibilidades de vincular a

11

ouvidoria diretamente à área de comunicação em prefeituras.

• Identificar as vantagens de vincular a ouvidoria pública ao setor de

comunicação das instituições.

• Desenvolver, expor e divulgar o trabalho.

1.5 METODOLOGIA

O trabalho parte de revisão bibliográfica e evolui para o estudo de caso, no

qual foi desenvolvida pesquisa do tipo exploratória, com aplicação do método

qualitativo. Conforme Silva e Grigolo (2002), a pesquisa exploratória permite maior

familiaridade com o problema investigado e é usada quando há pouco conhecimento

sobre um determinado assunto.

Trata-se de aprofundar conceitos preliminares, muitas vezes inéditos e interessantes, sobre uma determinada temática, de uma forma mais subjetiva e interpretativa com vistas a tornar a realidade focalizada mais explícita. (...) Parte de uma ideia preconcebida, uma questão de pesquisa ou hipótese que o pesquisador deseja esclarecer e aprofundar (SILVA; GRIGOLO, 2002, p. 42).

A pesquisa que utiliza o método qualitativo se fundamenta na descrição

detalhada de situações e prescinde de procedimentos rigorosos e regras precisas

em sua condução. “Os dados podem ser transcritos a partir de entrevistas, registros

de observações, documentos escritos (pessoais e oficiais), fotografias, filmagens

etc.” (SILVA, 2001, p. 58).

A técnica de abordagem utilizada em campo é a de entrevistas em

profundidade, com um universo de cinco pessoas – profissionais que participaram

do projeto de ouvidoria em questão. Gil (1999 apud NETO, 2010, p. 18) caracteriza

universo ou população como “conjunto definido de elementos que possuem

12

determinadas características” e amostra como o “subconjunto do universo ou

população, em que se estabelecem as características deste universo ou população”.

A amostra não se aplica à pesquisa proposta, haja vista que foram realizadas

entrevistas em profundidade.

Duas entrevistas foram realizadas pessoalmente e três foram feitas de forma

impessoal, por e e-mail. Roteiros de perguntas específicos para cada público foram

os instrumentos utilizados na investigação. Cabe ressaltar que algumas perguntas

foram similares nos vários roteiros, a fim de reunir diferentes visões e agregar

informações.

Para Duarte (2005), as principais vantagens das entrevistas em

profundidade são a flexibilidade que o informante tem para definir de que maneira

apresentará as suas respostas e a liberdade que o entrevistador possui para

formular e ajustar as perguntas. O autor ressalta que o objetivo desse recurso

metodológico é fornecer elementos para compreensão de uma situação, e

parafraseia uma análise de Demo:

Os dados não são apenas colhidos, mas também resultado de interpretação e reconstrução pelo pesquisador, em diálogo inteligente e crítico com a realidade. Nesse percurso de descobertas, as perguntas permitem explorar um assunto ou aprofundá-lo, descrever processos e fluxos, compreender o passado, analisar, discutir e fazer prospectivas. Possibilitam ainda identificar problemas, microintenções, padrões e detalhes, obter juízos de valor e interpretações, caracterizar a riqueza de um tema e explicar fenômenos de abrangência limitada (DUARTE, 2005, p. 63).

O produto das entrevistas em profundidade servirá de base para elaboração

do estudo de caso. Yin (2001) afirma ser o estudo de caso a estratégia adequada

para responder a questões do tipo “como” e “por que”, e define o método de

pesquisa como “uma inquirição empírica que investiga um fenômeno contemporâneo

dentro de um contexto da vida real, quando a fronteira entre o fenômeno e o

13

contexto não é claramente evidente e onde múltiplas fontes de evidência são

utilizadas” (YIN, 2001 apud DUARTE, 2005, p. 216).

A necessidade de aplicar o método surge do desejo de compreender

fenômenos. “Como estratégia de pesquisa, utiliza-se o estudo de caso em muitas

situações, para contribuir com o conhecimento que temos dos fenômenos

individuais, organizacionais, sociais, políticos e de grupo, além de outros fenômenos

relacionados” (YIN, 2005, p. 20).

Para Herman, Schoutheete e Bruyne (1991 apud DUARTE, 2005, p. 216), tal

técnica reúne inúmeras e variadas informações, com riqueza de detalhes, para

apreender uma situação em sua totalidade. Particularismo, descrição, explicação e

indução são características essenciais do estudo de caso, segundo Merriam.

Seguem algumas definições do autor, que sacramentam a escolha do método

adotado para essa pesquisa:

Particularismo: o estudo se centra em uma situação, acontecimento, programa ou fenômeno particular, proporcionando assim uma excelente via de análise prática de problemas da vida real. Indução: a maioria dos estudos de caso utiliza o raciocínio indutivo, segundo o qual os princípios e generalizações emergem a partir da análise dos dados particulares. Em muitas ocasiões, mais que verificar hipóteses formuladas, o estudo de caso pretende descobrir novas relações entre elementos (MERRIAM, 1999 apud DUARTE, 2005, p. 217).

A escolha da Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul como objeto do estudo

de caso deu-se por meio de conversas com fonte primária. O orientador da

monografia, Aldo Antonio Schmitz, prestou alguns serviços à prefeitura através da

agência EDM Logos Comunicação e participou indiretamente do processo de

implantação do modelo de ouvidoria vinculada à comunicação. A referida fonte

oportunizou o conhecimento do caso. Registra-se a consulta a dados secundários

para ciência dos temas em questão – livros, artigos e dissertações de mestrado - e

14

para esclarecimento sobre a Prefeitura de Jaraguá do Sul - site da instituição e

livreto.

15

2 COMUNICAÇÃO PÚBLICA

Nestes tempos em que conceitos como “responsabilidade social” e

“sustentabilidade” estão em evidência, os gestores das organizações públicas e

privadas começam a perceber a importância da comunicação com os diversos

públicos. A tendência da transição da economia com base na indústria para a

economia fundamentada na informação já era apontada por especialistas no início

dos anos 80, como explicam Duarte e Monteiro (2009). Na concepção dos autores, a

economia baseada na informação é hoje “matéria-prima primordial para alimentação

dos sistemas constituídos pela sociedade e por suas organizações” (DUARTE;

MOTEIRO, 2009, p. 337).

No rastro desses autores, Kunsch (2003, p. 69) afirma que “o sistema

comunicacional é fundamental para o processamento das funções administrativas

internas e do relacionamento das organizações com o meio externo”. Conforme

Duarte (2009), no Brasil a comunicação pública revela-se mais como uma postura

do que como um conjunto de conhecimentos, áreas ou estruturas. Tal postura visa

ao fortalecimento da cidadania por meio do uso da comunicação como instrumento

de interesse coletivo. O autor pontua algumas nuances da comunicação, de acordo

com o âmbito de atuação:

No setor público, em que tem maior potencial de desenvolvimento, incorpora o pressuposto da transparência em um tema historicamente relacionado à busca de visibilidade e legitimidade e que às vezes assume viés claramente político de culto à personalidade ou promoção institucional. No terceiro setor é um caminho natural para viabilizar o atendimento às necessidades da sociedade, complementando ou simplesmente substituindo o papel do Estado. Na área privada, pode ser exemplo de compromisso institucionalizado com a responsabilidade social da organização ou simples estratégia de marketing (DUARTE, 2009, p. 60).

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Vivemos em uma sociedade dinâmica, com novas bases, estruturas e

tecnologias de informação. O cidadão-cliente solicita informações, exige

esclarecimentos, reclama e cada vez mais conhece os seus direitos. Conforme

Duarte e Monteiro (2009), ganhar ou perder nesse novo contexto - marcado pela

interligação de redes locais e globais e estruturas de comunicação - depende não

mais do modo de produção da organização, mas do lugar que ela ocupa no “modo

de informação”. A expressão “nada a declarar” não encontra mais espaço e é

exorcizada à medida que se consolida a visão de que a comunicação deve ser

transparente e estratégica.

As políticas amparadas no conceito low profile (baixo perfil), bem aceitas no ciclo autoritário que durou 21 anos, tempo mais que suficiente para alguém tomar juízo, foram ultrapassadas por um novo clima organizacional. A clareza e a abertura inspiraram o novo clima de comunicação organizacional (CHINEM, 2006, p. 30).

Sendo assim, é imprescindível comunicar-se com os públicos de interesse e

responder a todas as perguntas, sejam elas convenientes ou inconvenientes. A

imagem das organizações necessita ser criada e preservada, e é preciso contar com

profissionais qualificados para planejar ações estratégicas e gerenciar crises. São

inúmeros os desafios e possibilidades da comunicação, segundo Duarte e Monteiro

(2009). Os pesquisadores apontam as funções da comunicação e destacam as

vantagens que ela confere às organizações.

A comunicação é a energia que circula nos sistemas e a argamassa que dá consistência à identidade organizacional. Ela é o oxigênio que confere vida às organizações. Está presente em todos os setores, em todas as relações, em todos os fluxos de informação, espaços de interação e diálogo. É consenso que uma boa compreensão e um bom uso da comunicação são capazes de qualificar práticas gerenciais, melhorar o desempenho operacional, promover mudanças significativas nas múltiplas relações da instituição com seus diversos públicos e agregar valor à organização (DUARTE; MONTEIRO, 2009, p. 334).

17

2.1 COMUNICAÇÃO NAS ORGANIZAÇÕES

A sociedade é composta por um conjunto de entidades que prestam serviços

e produzem bens voltados a atender às necessidades e desejos do ser humano.

Fazem parte dessa rede empresas públicas e privadas, órgãos governamentais e

entidades do terceiro setor, entre outras instituições. “Uma organização pode ser

descrita como uma entidade abstrata, na qual os fluxos de informações são a

energia que nela circula e lhe dá vida e vigor” (DUARTE; MONTEIRO, 2009, p. 339).

Nassar (2009) define organização como um sistema social e histórico formal,

que obrigatoriamente se relaciona com seus integrantes, internamente, e com a

sociedade e com outros sistemas sociais. Para o autor, algumas características são

comuns a todas as organizações: são constituídas por relacionamentos entre

pessoas, têm memória, história e identidade, são complexas e aplicam a divisão de

trabalho, buscam resultados e devem enfrentar os desafios das mudanças. Com

relação a essa última particularidade, defende que

os ajustes organizacionais e uma ‘comunicação excelente’ são formas de permanecerem vivas diante de reestruturações produtivas e patrimoniais (fusões e aquisições), movimentos da concorrência e desafios ecológicos, culturais, econômicos e sociais (NASSAR, 2009, p. 63).

“‘Comunicação organizacional’, ‘comunicação empresarial’ e ‘comunicação

corporativa’ são terminologias usadas indistintamente no Brasil para designar todo o

trabalho levado a efeito pelas organizações em geral” (KUNSCH, 2003, p. 149).

Duarte e Monteiro (2009) ressaltam que a comunicação é um processo de múltiplos

canais e que não significa apenas circulação de informações – apesar de essas

gerarem interações, e interações gerarem influências e comportamentos -, mas

também diz respeito a relacionamento.

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Tal fenômeno sofre influência dos contextos sociais, econômicos, políticos e

culturais em que está inserido. “Lidar com comunicação é trabalhar com estruturas,

padrões, fluxos de informação e processos de interação, assim como com

motivação, influência e credibilidade” (DUARTE, MONTEIRO, 2009, p. 339). Kunsch

(2009a) pontua que o processo comunicacional das organizações é constituído

basicamente pelos seguintes elementos: fonte, codificador, canal, mensagem,

decodificador e receptor.

O processo de comunicação – o qual tem como fonte a administração, que cria as mensagens considerando o ambiente e o perfil do receptor, seleciona os canais (meios) mais adequados para a sua veiculação, evita ruídos e controla todo o processo e os seus resultados – é o componente mais importante para o estabelecimento de relacionamentos da organização com os mais diversos públicos, as redes de relacionamento e a sociedade. É por meio da comunicação que ela estabelece diálogos a respeito de suas políticas, suas ações e suas pretensões; informa, organiza e reconhece os seus públicos de interesse, entre os quais os colaboradores; legitima a sua existência; e trabalha para a melhoria do ambiente de trabalho, entre outros objetivos (NASSAR, 2009, p. 64).

Para compreensão da complexidade do ato comunicativo, Kunsch (2003)

recomenda o estudo de aspectos como barreiras, redes, níveis, fluxos, meios e

modalidades comunicacionais. Alguns desses elementos serão aprofundados no

item Gestão da comunicação (2.1.3). Em síntese, com base na classificação de

Redfield (1980 apud KUNSCH, 2003, p. 87), os meios ou veículos utilizados pelas

organizações para se comunicarem com os diferentes públicos são classificados em

orais (diálogo, palestras, entrevistas, telefone, alto-falantes), escritos (cartas, murais,

panfletos, jornais), pictográficos (fotos, mapas, desenhos), escrito pictográficos, com

a palavra escrita aliada à ilustração (cartazes, gráficos e filmes legendados), meios

simbólicos (bandeiras, sirenes, luzes, sinos) e audiovisuais (vídeos institucionais,

clipping eletrônico).

19

Bueno (2009) avalia que a comunicação nas organizações deixou de ser um

simples conjunto de atividades fragmentadas para tornar-se um processo integrativo

que norteia o relacionamento da instituição com os seus stakeholders. Diante dessa

perspectiva, busca-se uma verdadeira articulação entre os vários departamentos e

áreas que executam atividades de comunicação nas organizações.

Ainda que, operacionalmente, haja uma descentralização, tendo em vista a execução das atividades específicas de comunicação (relações públicas, assessoria de imprensa, comunicação interna, propaganda/publicidade, marketing etc.), o planejamento deve ser centralizado. Isso acarreta economia de recursos e de esforços e contribui para a consecução do que devem ser os objetivos maiores da organização: aumentar a vantagem competitiva da empresa ou entidade ante seus concorrentes e consolidar sua imagem (reputação) ante a opinião pública (BUENO, 2009, p. 11).

A assessoria de comunicação desempenha papel estratégico nas

organizações e o seu trabalho não está restrito à divulgação e a contatos com a

imprensa, mas envolve ações de comunicação integrada com os diferentes públicos

de interesse e com a opinião pública, como explica Chinem (2006, p. 18):

As atividades conjugadas de Relações Públicas e de Publicidade e Propaganda têm como objetivo, em linhas gerais, melhorar a comercialização de produtos e serviços e/ou imagem pessoal ou institucional. Elas constituem no seu conjunto o amplo universo da comunicação social, onde deve haver estreita cooperação e soma de esforços. Cada uma dessas áreas poderá gerar fatos ou revelar dados de interesse jornalístico, que poderão ser noticiados.

Neste momento, entra em cena a figura do profissional de comunicação,

uma das peças dessa engrenagem comunicativa. De acordo com Carrascosa (2003

apud ALMANSA, 2010, p. 23-24), por tradição, as relações com os meios de

comunicação têm sido as que mais preocupam as assessorias e as relações

informativas seguem sendo prioritárias. Todavia, salienta que as equipes não devem

se limitar a elas.

20

Para a autora, os serviços prestados por uma assessoria de comunicação

fundamentam-se na administração da comunicação interna e externa. Entre as

atividades desempenhadas pelos profissionais que a compõem estão a produção de

publicações institucionais, murais e press-releases, agendamento e

acompanhamento de entrevistas, relacionamento com os meios de comunicação,

gestão da publicidade, gestão de crises, organização de eventos e desenvolvimento

de campanhas publicitárias.

As mensagens internas e externas devem compor um todo, sem que haja contradições, já que do contrário fracassaria a comunicação em geral e só criaria confusão. Assim, se tem passado de assessorias de imprensa, cuja principal ocupação era as relações informativas com os meios de comunicação, às atuais assessorias, nas quais a comunicação se contempla de forma global, bem mais próxima das Relações Públicas (ALMANSA, 2010, p. 24).

Cabe ressaltar que uma assessoria de comunicação pode abrigar apenas

um profissional, ou ser composta por uma equipe, como sugerido. Para Almansa

(2010), o entendimento que prevalece é de que um grupo formado por profissionais

das diversas áreas da comunicação e preparado para executar as diversas

competências é a melhor opção. No entanto, aspectos como porte e necessidades

da organização e condições financeiras para contratação de pessoal podem

influenciar na estruturação do setor.

Há diversas terminologias para designar o setor de assessoria de

comunicação nas instituições. Departamento, gerência, coordenação e diretoria de

comunicação são algumas delas. Chinem (2006) elenca alternativas para a

viabilização dos serviços de assessoria de comunicação em uma grande instituição

prestadora de serviços básicos à população:

uma estrutura interna própria, que garanta o mínimo de condições de trabalho aos seus profissionais; contratação de serviços de terceiros

21

(assessorias externas); uma estrutura mista, que mantenha uma assessoria interna para os trabalhos rotineiros e uma empresa sob contrato para eventos e determinados serviços especiais. E, nesse caso, os trabalhos executados pela assessoria externa devem ser supervisionados pela assessoria de comunicação para que haja uma uniformidade de trabalho (CHINEM, 2006, p. 34).

De acordo com Almansa (2010), a assessoria de comunicação coordena e

interliga todas as ações de comunicação com o intuito de criar, manter e melhor a

imagem da instituição perante os seus públicos. O setor deve estar em igualdade de

condições com os demais departamentos da organização e se relacionar de forma

independente. Ela deve ter acesso a todas as informações, sendo a intermediária

entre a direção e os stakeholders.

Resulta imprescindível o contato permanente (diário ou quase diário) e a coordenação entre direção geral e assessoria de comunicação, já que esta tem que conhecer em primeira mão as linhas da cultura organizacional que, mais tarde, terá que difundir. Para isso, a assessoria de comunicação deve ter status diretivo e formar parte do órgão decisório (ALMANSA, 2010, p. 42).

Segundo a autora, em algumas empresas o diretor de comunicação está

diretamente integrado ao departamento de marketing e, em outras, diretamente

vinculado à direção geral ou à presidência. Na sua concepção, a proximidade da

direção deve ser também física - com a estrutura de trabalho perto do local onde

está situada a direção -, para que não haja o risco de a distância espacial se

transformar em distanciamento de comunicação.

22

2.1.2 Comunicação estratégica e integrada

Bueno (2009) percorre a trajetória da comunicação organizacional no país e

avalia como as empresas e associações se comunicavam na década de 70, período

em que vigorava a ditadura militar e no qual o trabalho era exercido, muitas vezes,

por profissionais de outras áreas:

As atividades de comunicação eram percebidas e desenvolvidas isoladamente: a edição de publicações empresariais, a assessoria de imprensa, a organização de eventos, a publicidade e o marketing, de maneira geral, eram assumidos, na quase totalidade dos casos, por departamentos e profissionais sem qualquer vinculação. Disso resultava, invariavelmente, uma comunicação difusa, muitas vezes contraditória. Por exemplo, uma comunicação interna marcada pelo autoritarismo, pelo desestímulo à participação e ao diálogo convivia com uma publicidade descontraída, que simulava uma empresa democrática e aberta (BUENO, 2009, p. 5).

Nesse período, poucas eram as entidades que reconheciam a importância

da comunicação. Por outro lado, a publicidade e a propaganda eram extremamente

valorizadas. Já consagradas no rádio e nos meios impressos, começavam a

conquistar espaço na televisão. Os ares democráticos dos anos 80 exigiram uma

nova postura das organizações. A década foi marcada pela profissionalização do

jornalismo nas organizações e das atividades de Relações Públicas, com a chegada

dos egressos das faculdades de Comunicação. No entanto, defendia-se a separação

entre os profissionais da comunicação por área de competência (BUENO, 2009).

Ainda conforme o autor, na década de 90, a comunicação nas organizações

passou a ser vista como um processo integrado de ações que conduz o

relacionamento da instituição com os seus públicos. O público interno passou a ser

valorizado e reconhecido como peça fundamental para o desenvolvimento e

propagação de uma boa imagem da instituição. A comunicação posicionou-se como

elemento estratégico e caminha para assumir a perspectiva da atuação integrada,

23

com aproximação entre os diversos profissionais que executam atividades de

comunicação nas organizações.

Hoje, a Comunicação Empresarial encontra-se na linha de frente, situada em posição de destaque no organograma das organizações, promovendo conhecimentos e estratégias para que as empresas e entidades não apenas superem os conflitos existentes, mas possam atuar, preventivamente, impedindo que eles se manifestem (BUENO, 2009, p. 10).

Dessa forma, ações integradas e planejadas estrategicamente visam a

otimizar recursos, prever crises – que podem afetar o clima organizacional, a

imagem e a reputação da instituição - e potencializar resultados, conforme verificam

Duarte e Monteiro (2009, p. 337):

A comunicação e os componentes que a integram – informação, interação e contexto – já são, há pelo menos duas décadas, fator decisivo para o sucesso organizacional. A variável comunicação é cada vez mais determinante para a viabilização de aspectos fundamentais à sobrevivência e ao avanço, como vendas, coesão interna, engajamento, gestão, visão, reputação e imagem.

As ações de comunicação devem estar alinhadas com a visão, os valores, a

missão e os objetivos da organização. É necessário buscar o equilíbrio entre os

interesses da entidade e de seus públicos.

Sua importância estratégica pode ser atribuída à valorização que a opinião pública está dando para as questões comportamentais, à ética empresarial, ao respeito a valores sociais e à possibilidade da quantificação econômico/financeira das crises mal administradas. Hoje, quem quer dissimular, esconder casos negativos e fugir da exposição é condenado pela mídia e pela sociedade (CHINEM, 2006, p. 48).

No rastro do pensamento de Chinem (2006), Lara (2003) aborda a questão

da coerência necessária entre discurso e prática, e aconselha:

Está em moda falar em responsabilidade social da empresa. Qualquer um chega e fala da tal responsabilidade social e da função social do

24

lucro. Mas o discurso corresponde à prática? A empresa tem uma cultura de responsabilidade social ou é só um discurso? Analise bem a situação e, se não detectar a cultura, não autorize o discurso. Nesse caso, é melhor não falar nada do que falar do que não é verdadeiro (LARA, 2003, p. 90-91).

Para Kunsch (2009a), a comunicação institucional, a comunicação interna, a

comunicação mercadológica e a comunicação administrativa viabilizam o

relacionamento com os diferentes públicos e são as grandes áreas da comunicação

organizacional integrada. Juntas, agregam valor às organizações e desempenham

função estratégica.

O fator determinante que direciona cada uma das modalidades da comunicação integrada é a natureza dessa comunicação, ou seja, quais são os seus propósitos e a que tipo de segmento público se destina. Por exemplo, a Comunicação Institucional visa criar relações confiantes e construir reputação positiva com todo o universo de públicos e a sua natureza precípua é institucional. Já a Comunicação Mercadológica, ao objetivar persuadir o consumidor para adquirir um bem ou serviço, tem uma manifestação discursiva de natureza mercadológica. Destaco ainda que na prática essas ações comunicativas se misturam e se interconectam (KUNSCH, 2009b, p. 115).

Cabe ressaltar que a comunicação integrada configura-se mais como teoria

do que como prática no dia-a-dia das organizações. Bueno (2009) sugere que o

conceito de comunicação integrada não tem sido tratado com seriedade no Brasil:

Basta navegar na web ou dar uma olhada em alguns fôlderes de agências / assessorias para concluir que todo o mundo, de uma hora para outra, pratica a comunicação integrada. Assim como toda organização é sustentável, socialmente responsável e cidadã (BUENO, 2009, p. 49).

Conforme o autor, na maioria das organizações do país nem mesmo a

comunicação interna e a externa estão articuladas. Cursos de Comunicação que

superestimam as partes em detrimento do todo, dificuldade para trabalhar em equipe

e profissionais com egos inflados são apontados como alguns aspectos que

25

permeiam as organizações e dificultam a integração. No entanto, para ele, a

tendência de uma comunicação efetivamente integrada a médio e longo prazo é

irreversível. A proposta é que as atividades comunicativas estejam intimamente

ligadas ao processo de gestão e de planejamento.

2.1.3 Gestão da comunicação

Na visão de Bueno (2009), uma instituição moderna não depende apenas

dos profissionais de comunicação para relacionar-se com os diferentes públicos,

mas implementa uma “autêntica cultura de comunicação”, de modo a mobilizar e

capacitar todos os funcionários a desempenharem a função.

(...) o relacionamento com os distintos públicos da organização é realizado tanto pelos assessores de imprensa, pelos profissionais de Relações Públicas, pelas agências de propaganda ou de comunicação, muitas vezes terceirizadas, como também pela secretária, pela telefonista, pelos vendedores, pelos funcionários de maneira geral (BUENO, 2009, p. 4).

Fazer com que todos os colaboradores se tornem comunicadores e tenham

consciência da sua responsabilidade para o desenvolvimento da organização é um

desafio, segundo Duarte e Monteiro (2009, p. 359):

Construir alicerces para uma comunicação mais orgânica e participativa é um trabalho árduo, que consome tempo, planejamento, cuidado e que não tem visibilidade. Em compensação, dá sustentação e eficiência aos múltiplos processos e, certamente, agrega valor e ajuda a fortalecer nossa atuação. Comunicar sobre comunicação é, portanto, o grande desafio.

Os autores (2009, p. 341) definem cultura organizacional como “conjunto de

valores, crenças, atitudes e comportamentos, modos de pensar e agir, partilhado

pelas pessoas que a integram”. Os dirigentes devem apoiar a criação de uma cultura

26

comunicativa. Estimular experiências em todos os segmentos, reservar recursos e

recompensar esforços que incentivem tal prática são algumas formas de fazer isso.

Quanto à cultura de comunicação, Bueno (2009, p. 23) nos lembra que

ela não está presente em organizações oligárquicas ou autoritárias, que estabelecem rígido controle para a circulação de informações, asfixiam as interações entre os públicos internos e censuram todas as mensagens, como se a comunicação representasse um risco quando praticada de forma ampla e democrática.

Dessa forma, entende-se que o pluralismo em uma organização deve ser

assumido como oportunidade. A comunicação nas organizações está cada vez mais

associada ao exercício do poder e a burocracia tende a ser uma de suas

características. É necessário promover o acesso dos funcionários às informações,

de modo que elas circulem livremente, sem a ditadura do fluxo descendente –

comunicação da cúpula diretiva com os funcionários. Os fluxos que conduzem a

comunicação dentro de uma organização são o descendente ou vertical, o

ascendente, o horizontal ou lateral, o transversal e o circular (KUNSCH, 2003).

Algumas informações que circulam em uma organização são inúteis, outras

podem revelar vantagens em relação à concorrência e há aquelas que são tão

importantes que sustentam a sobrevivência da organização, conforme Duarte e

Monteiro (2009, p. 343):

Por ser um bem abstrato e intangível, o valor da informação está associado a um contexto e é função do efeito que ela tem sobre o processo decisório. Assim, ao ter acesso a informações, indivíduos e equipes têm a oportunidade de sair da condição de beneficiários para serem agentes dos processos de tomada de decisões.

As informações fluem através das redes de comunicação formal e informal. A

formal é a comunicação administrativa, “de onde emana um conjunto de informações

pelos mais diferentes veículos impressos, visuais, auditivos, eletrônicos, telemáticos

27

etc., expressando informes, ordens, comunicados, medidas, portarias,

recomendações”, diz Kunsch (2003, p. 84). É realizada com o intuito de canalizar

esforços para atingir os objetivos da organização.

A comunicação informal não é contratada e emerge das relações entre as

pessoas. Elas necessitam de informações confiáveis e os canais formais nem

sempre esclarecem as curiosidades e dúvidas de forma clara e suficiente. Uma das

formas mais conhecidas “da rede informal é o boato ou rumor, que chega a constituir

uma ‘rede de boatos’, formada às vezes por interesses maldosos, mas em grande

parte decorrente da ansiedade, da insegurança e da falta de informações”

(KUNSCH, 2003, p. 83).

Percebe-se que nem todas as informações que circulam em uma

organização são positivas - e que os funcionários podem facilitar ou dificultar a

comunicação nas organizações. Até mesmo os atos comunicativos planejados

podem não causar os efeitos desejados e não ser aceitos da forma pretendida. As

barreiras são os problemas que interferem na comunicação. Para Kunsch (2003), as

principais barreiras no âmbito organizacional são as pessoas, os processos

administrativos/burocráticos, o excesso e a sobrecarga de informações e as

informações incompletas ou parciais.

Para a autora, a comunicação em uma organização está intimamente ligada

ao processo de gestão, mesmo que em algumas empresas tal competência seja

vista como acessória. O gestor da comunicação deve administrar os fluxos

comunicativos, driblar as barreiras da comunicação, conhecer o perfil dos públicos

com os quais a instituição se relaciona e os canais adequados para estabelecer

esse relacionamento.

O comunicador empresarial não pode se reduzir a um mero executor de

28

tarefas (redator de releases ou de house-organs, organizador de eventos, criador de logos ou banners), mas tem de estar em sintonia com os novos processos de gestão, com as novas tecnologias e ser capaz de mobilizar pessoas e integrar-se a equipes para realização de um objetivo comum. Enfim, espera-se (...) que o comunicador empresarial seja efetivamente um gestor, capaz de traçar estratégias, fazer leituras do ambiente interno e externo e agir proativamente, criando espaços e canais para um relacionamento sadio com os públicos de interesse da organização (BUENO, 2009, p. 14-15).

A transparência é fundamental para que se crie uma relação de confiança

com os públicos - grupos ou setores que se relacionam com a organização de forma

permanente ou não. De acordo com França (2011):

no meio acadêmico brasileiro, permanece cristalizada a divisão de públicos em três categorias: internos, externos e mistos. Todavia, as transformações do mercado demonstram a não-congruência desse paradigma com os objetivos da comunicação, cada vez mais dirigida a segmentos específicos.

O autor cita o caso dos empregados temporários, dos terceirizados e dos

estagiários para questionar a divisão adotada usualmente. Não se pretende

aprofundar tal discussão nessa monografia. Desse modo, a título de exemplo e de

forma geral, pode-se caracterizar o público interno como os funcionários e seus

familiares, o público externo como os clientes e o público misto como os

espectadores.

É necessário considerar a relevância do público interno das organizações e

desenvolver ações estratégicas nesse sentido. A comunidade interna deve ser a

primeira a ser comunicada sobre assuntos relativos à organização, sem que haja

sonegação de informações. Do contrário, será instaurado um clima de incertezas e

expectativas que poderá prejudicar o ambiente de trabalho. Para Duarte e Monteiro

(2009, p. 342):

Se as estratégias de comunicação forem voltadas apenas para

29

disseminar a informação gerencial das instâncias superiores, sem valorizar a consulta, opinião ou participação dos empregados ou mesmo estimular a ligação entre os próprios empregados, os benefícios certamente não serão plenos.

Desenvolver canais de comunicação interna engloba a elaboração de

jornais, revistas, comunicados e folhetos, a realização de encontros e reuniões

periódicas, caixas de sugestões, programas que valorizem a qualificação

profissional, entre outras ações. A comunicação interna visa a liquidar

comportamentos reativos, abrir novas perspectivas e unir visões fragmentadas. “Um

processo comunicacional interno, que esteja em sintonia com o sistema social mais

amplo, propiciará não apenas um equilíbrio como o surgimento de mecanismos de

crescimento organizacional” (KUNSCH, 2003, p. 70).

É imprescindível administrar também a comunicação externa das

organizações, e isso corresponde, em algumas situações, ao gerenciamento de

crises, conforme observa Bueno (2009, p. 15):

Na emergência de uma crise (um acidente na fábrica, a demissão de um número grande de funcionários, a identificação de uma falha em um de seus produtos), o comportamento esperado é o “jogo aberto”, numa interação profícua com os públicos envolvidos e com a própria sociedade. Na sociedade da informação, não se pode escamotear a verdade, sob pena de comprometer, definitivamente, a imagem. Quase sempre, a opinião pública penaliza mais as organizações que escondem os erros do que aquelas que os assumem e tomam medidas concretas para superá-los – porque, afinal de contas, as falhas acontecem, muitas vezes à revelia do esforço das organizações.

O foco da comunicação externa é tornar a organização conhecida, manter

uma imagem positiva e sustentar o relacionamento com os diversos públicos, que

variam de acordo com as características de cada instituição e podem ser acionistas,

consumidores, a comunidade do entorno, fornecedores, o governo, a imprensa,

sindicatos e a sociedade como um todo. Atender de forma satisfatória às

30

necessidades de cada público é uma das funções dessa modalidade de

comunicação (BUENO, 2009).

2.2 A COMUNICAÇÃO PÚBLICA

O termo comunicação pública vem sendo utilizado de diferentes formas e

com inúmeras acepções. Duarte (2009) explica que o esforço para definir o

significado da expressão

faz com que às vezes seja usada para referir-se aos veículos públicos, tratada como a estrutura técnica das redes de TV e rádio, em alguns casos como comunicação governamental, ou ainda como sinônimo do conjunto de instrumentos originários da Administração Pública (DUARTE, 2009, p. 59).

Essas definições, muitas vezes incompatíveis, variam de acordo com o

contexto, o autor e o país. Quem desenvolve algumas conclusões a cerca dessa

constatação é Brandão (2009, p. 1):

Tamanha diversidade demonstra que a expressão ainda não é um conceito claro, nem mesmo uma área de atuação profissional delimitada. Pelo menos por enquanto, Comunicação Pública é uma área que abarca uma grande variedade de saberes e atividades e pode-se dizer que é um conceito em processo de construção.

Nesta pesquisa, a referida expressão será usada para identificar a

comunicação do Estado e/ou governamental, cuja abordagem acomete a essa

instituição a responsabilidade de estabelecer um fluxo de comunicação com os

cidadãos. Algumas singularidades condicionam a prática da comunicação pública e

a diferenciam das outras modalidades de comunicação exercidas pelas

organizações nas suas relações com a sociedade, conforme esclarece Monteiro

(2009, p. 41):

31

Essa prática – marcada tanto pelo interesse coletivo quanto pelas tentativas de institucionalização de um diálogo mais efetivo entre emissores e receptores – tornou-se mais visível recentemente com o aumento da pressão social em favor do respeito aos direitos do cidadão à informação, à expressão e à deliberação.

A informação é trabalhada pelo viés da cidadania por órgãos

governamentais, entidades do terceiro setor, agências reguladoras, conselhos e

empresas privadas prestadoras de serviços públicos, como abastecimento de água

e de luz e telefonia. A comunicação governamental é “uma forma legítima de um

governo prestar contas e levar ao conhecimento da opinião pública projetos, ações,

atividades e políticas que realiza e que são de interesse público” (BRANDÃO, 2009,

p. 5). Seja na esfera federal, estadual ou municipal, a comunicação promovida pelos

governos pode ter diferentes objetivos, como informar, convocar os cidadãos para o

cumprimento de deveres, prestar contas à sociedade, despertar o sentimento de

patriotismo, educar e promover a cidadania.

Dessa forma, entende-se que privilegiar o interesse público em relação ao

interesse corporativo ou individual é uma das prerrogativas. Duarte (2009) destaca a

importância de adaptar os instrumentos às necessidades dos públicos. “(...) as

pessoas que mais precisam de informação em geral são as que têm menos acesso

aos mecanismos de transmissão e orientação ou possuem mais dificuldade de

compreensão de seu significado” (DUARTE, 2009, p. 67).

As campanhas publicitárias por meio do rádio, da televisão, dos impressos e

da web são o instrumento mais utilizado para esse tipo de comunicação, que tem

como público-alvo os habitantes de uma determinada região. Brandão (2009) aponta

algumas manifestações que soam como indícios de uma participação mais ativa e

consciente dos cidadãos no cenário político do Brasil e de outros países:

32

(...) as novas práticas de participação política que a sociedade tem encontrado para se fazer ouvir, somadas ao desenvolvimento acelerado da tecnologia e à maior possibilidade de sua utilização pela população, fazem surgir outros meios e formas de comunicação do Estado com seus cidadãos, com forte componente político participativo. É o caso das ouvidorias, dos 0800, dos call centers, dos Conselhos, das audiências públicas (BRANDÃO, 2009, p. 5).

Essa perspectiva vai ao encontro do que prega a comunicação pública:

democratização da informação, interatividade como ferramenta de diálogo e

participação cidadã. O receptor da informação - ao mesmo tempo contribuinte,

cliente, eleitor - é reconhecido como ator social, com competência para assimilar

informações e interagir com a realidade. No entanto, a essência da comunicação

pública algumas vezes é ofuscada por interferências políticas. De acordo com Bueno

(2009, p. 150), a comunicação pública que devemos praticar “passa longe das ações

oportunistas de governantes sem espírito cívico e de empresas inescrupulosas que

sobrepõem sua ambição pessoal e seus lucros às demandas reais da população”.

Para Cogo (2011), é imperativo exigir que os governos estabeleçam ações

com o intuito de promover o fortalecimento das instituições em vez de

estabelecerem procedimentos para fortalecer partidos políticos ou a gestão que se

encontra à frente do poder.

O processo de descrédito das instituições públicas e o desgaste da imagem do governo e de seus órgãos executivos e representativos demonstram a urgente necessidade de se promover uma grande reforma nos conceitos que regem o uso das ferramentas e processos comunicativos do Estado (COGO, 2011).

O uso da máquina pública para promoção pessoal dos governantes é um

dos casos que merece destaque. Lara (2003) faz algumas considerações sobre o

assunto e observa que o papel do assessor de comunicação na área pública é fazer

política junto à população, zelar pela imagem da entidade e pelo direito da

33

sociedade à informação. Ele pode até ser filiado a um partido, no entanto, deve

distinguir o momento de fazer política partidária.

Em nenhuma circunstância pode-se fazer promoção pessoal do administrador ou de seus prepostos com recursos públicos. Em períodos eleitorais, o Ministério Público fica atento às tentativas de governos fazerem publicidade para ajudar o candidato da situação. Nos períodos pré-campanha eleitoral, mesmo aquela propaganda com caráter de prestação de contas à sociedade é malvista pelos promotores (LARA, 2003, p. 70).

Para Brandão (2009, p. 13), “é inegável a influência explícita e direta da

direção das instituições no direcionamento dos interesses de comunicação,

deixando o interesse institucional superar o interesse público”. O assessor de

comunicação precisa aprender a lidar de maneira ética com as pressões políticas

que permeiam as organizações públicas.

Houve grande expansão das assessorias de comunicação na área

governamental nos últimos anos. Geralmente, estão subdivididas em três áreas –

imprensa, publicidade e relações públicas – e submetidas diretamente ao gestor da

organização. Ao analisar o modelo adotado por muitas instituições, Brandão julga

ser “uma prática de trabalho em que o foco é o atendimento à cúpula da instituição,

com a função de ‘dar visibilidade’, ou seja, ‘colocar na mídia’ o órgão governamental,

ou dela defendê-lo” (ibidem). Assim, entende-se que, de modo geral, a comunicação

nas assessorias governamentais brasileiras privilegia o relacionamento com a mídia,

e não o relacionamento com o cidadão.

2.2.1 Marcos históricos

De acordo com Haswani (2009), as primeiras ações formais de comunicação

governamental no Brasil surgiram com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder.

34

Essas ações tinham por objetivo administrar a expansão das classes populares no

cenário político na década de 30. O Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP)

foi um dos instrumentos criados para tal finalidade. Nesse período, os jornais

circulavam sob censura e nasceu a Hora do Brasil, no rastro do uso intenso do rádio.

Com este modelo, consolidava-se no Brasil o mecanismo de Benito Mussolini, de falar sozinho para ninguém contestar. O espetáculo do poder tinha intuitos bastante claros: a criação do mito, o controle rigoroso da força política emergente, a exclusão de intermediários e a implementação do populismo (HASWANI, 2009, p. 38).

Com a queda de Vargas, em 1945, o DIP foi extinto. A comunicação

governamental passou a focar a figura do presidente, restrita a jingles e slogans. No

governo do general Euclides Figueiredo foi criada a Secretaria de Comunicação

Social, o primeiro órgão de comunicação com caráter de ministério. No entanto,

“sem canais confiáveis, produziram-se apenas novas versões da propaganda oficial

descendente, ideológica, dogmática e manipuladora de uma opinião pública nada

crítica” (idem, p. 39).

No Brasil, a disseminação de informações voltadas à cidadania ganhou

impulso com a redemocratização, após o fim da Ditadura Militar. Os militares

governaram o país no período compreendido entre 1964 e 1985, época marcada

pela censura, pela supressão de direitos constitucionais, pela repreensão aos que se

opunham ao regime e pela perseguição política. Entende-se por cidadania o

exercício de direitos e deveres, a participação política da população, e isso é

possível quando há condições de informação e comunicação. Neste contexto, o

conceito de comunicação pública no Brasil passou a ser construído como o processo

de comunicação entre o governo, a sociedade e o Estado (ibidem).

Diante do novo cenário político do país, a comunicação de origem

35

governamental também sofreu transformações e buscou a adoção do sentido de comunicação pública, ou seja, aquela com objetivo de informar o cidadão. Essa acepção pode ser percebida desde o Governo de Fernando Henrique Cardoso, quando o Presidente afirmava que a comunicação pública era um tema indissociável do funcionamento da democracia, exercendo o papel de instrumento de uma relação aberta e franca do governo com a população. Com este objetivo, também foi anunciada a criação de um Programa Continuado de Aperfeiçoamento Profissional em Comunicação do Governo, que ficaria a cargo da ENAP (BRANDÃO, 2009, p. 10).

No regime democrático, o cidadão ganha voz e passa a cobrar transparência

às ações estatais. Nas últimas décadas, atitudes socialmente responsáveis

começaram a ser adotadas pela iniciativa privada e por organizações públicas e do

terceiro setor, com atenção às reivindicações do público. Percebeu-se que posturas

politicamente corretas auxiliam no desenvolvimento das instituições e também nas

vendas. De acordo com Brandão (2009), a partir do Governo Lula o conceito de

comunicação pública com sentido de informação para a cidadania é citado com

maior frequência. Em setembro de 2003, no segundo ano do primeiro mandato, o

Ministro Luiz Gushiken apresentou as propostas para a implantação da Política

Nacional de Comunicação.

(...) a palestra que lançava as bases da Política Nacional de Comunicação, proferida logo no início do Governo, mostrava a dificuldade para elaborar conceitos sobre o que poderia ser uma política de comunicação para o Estado Brasileiro. Misturava educação cívica, propaganda política, marketing político e um moralismo filosófico que se manifesta na percepção da comunicação como instrumento pedagógico de ideias políticas. No entanto, deve-se reconhecer que pela primeira vez depois da era militar tratou-se da comunicação governamental com uma preocupação que pretendia ir além da propaganda e do marketing político e resgatou-se a noção do civismo, desgastada no tempo da ditadura militar (idem, p. 12).

2.2.2 A esfera pública e o espaço público

Entre as definições do termo público, estão: “Relativo, pertencente ou

36

destinado ao povo, à coletividade, ou ao governo de um país. Que é do uso de

todos, ou que está aberto ou acessível a quaisquer pessoas” (FERREIRA, 2008, p.

664). Privado, no entanto, revela-se o oposto do relatado, sendo o lugar que cada

pessoa ocupa no espaço público, sem função pública ou oficial. De acordo com

Jovchelovitch (2000 apud HASWANI, 2009, p. 33) “a vida pública existe

precisamente para enfrentar questões de interesse coletivo que não podem ser

resolvidas através de caminhos que contêm apenas verdades singulares, radicadas

em interesses privados”.

A concepção de esfera pública foi introduzida pela revolução burguesa na

Europa. O movimento surgiu em oposição ao regime feudal, no qual não havia uma

noção de poder público e a representação pública estava vinculada a existência do

senhor de engenho. O conceito está relacionado à participação política e à relação

entre a sociedade e o Estado. Conforme Haswani (2009, p. 34):

Ela indica a existência de um espaço em que os cidadãos buscam participação política por meio do diálogo racional sobre as questões de seu interesse. Com a queda do absolutismo, firmaram-se os objetivos desse novo público de mediar a relação entre Estado e sociedade, fazendo com que o Estado prestasse à sociedade contas do que fazia, por meio da publicidade disponível.

Em meio aos debates sobre a regulamentação da sociedade civil e a

administração do Estado, “a mídia ocupou o espaço de intermediação das relações

entre os atores sociais e onde as controvérsias associadas às relações de poder se

materializam, como um grande espaço público” (COGO, 2011). De acordo com o

autor, os movimentos sociais surgiram para fortalecer a participação da sociedade

civil organizada no espaço público. Pressionar os governantes a implementarem

políticas de comunicação que promovam o exercício da cidadania é uma forma de

participar desse processo.

37

Matos (2009) propõe um novo paradigma, no qual a participação da

sociedade e de seus segmentos na comunicação pública não se dê apenas pela

recepção da comunicação do governo e de seus poderes, mas também por meio da

produção ativa desses atores. A participação por meio de representantes é uma

forma de fazer com que todos os cidadãos integrem o processo de alguma maneira.

No entanto, a participação indireta não alcança todas as demandas da sociedade.

De acordo com a autora, o conjunto de espaços imateriais e físicos em que

os agentes da sociedade podem concretizar a sua participação no processo de

comunicação é chamado de esfera pública. Ela pode ser representada pela mídia

dos diferentes grupos, como a dos movimentos sociais, dos partidos, do Governo,

dos sindicatos etc. Nesse sentido, o desafio é tornar possível uma esfera pública

ampla, de modo a

implementar vias materiais e imateriais de trocas de informação que sejam, ao mesmo tempo, acessíveis, amigáveis, universais. Isto não deveria incluir apenas os suportes tecnológicos e midiáticos, mas igualmente outros compatíveis e abertos ao ambiente da comunicação pública (MATOS, 2009, p. 52-53).

Para a autora, um cidadão com nível de escolaridade baixo e uma empresa

modesta podem atuar como participantes da esfera pública. No entanto, é

necessário que tenham consciência da relevância da sua participação. É

fundamental que o Governo - por meio da educação e de campanhas e programas

sociais - e as entidades da sociedade civil organizada disseminem informações

sobre os direitos que assistem aos cidadãos e ensinem a população a participar de

debates, negociações e tomadas de decisões relativas a questões de interesse

público. Ao ocupar o espaço público para falar de si, de sua categoria ou de outros,

o indivíduo ou a organização exerce a cidadania e contribui para o desenvolvimento

38

da democracia.

2.2.3 O dever de informar e o direto à informação

As sociedades democráticas afirmam a igualdade políticas dos cidadãos.

Porém, a competência cidadã de seus membros só se efetivará em função da

qualidade da informação, entendida como informação clara, adequada, suficiente e

verídica, sem a qual nos tornamos politicamente inaptos. O direito à informação

encontra-se elevado ao nível dos direitos fundamentais. Logo, não está restrito à

dimensão privada das pessoas; também permeia a âmbito da esfera pública, de

modo a estimular a cidadania ativa e participativa. A demanda por informações, tanto

no setor público quanto no privado, assume características universais, já que é

comum aos cidadãos/consumidores de todos os países. No rastro dessa tendência

internacional e referendando outras legislações específicas, a Constituição Federal,

em seu artigo 5, estabelece que

Todos têm direito a receber dos órgãos públicos informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à segurança da sociedade e do Estado (BRASIL, 1988).

Como se constata, a forma da lei obriga os órgãos públicos e,

consequentemente, o servidor público a informar o contribuinte/consumidor sobre

seus atos e seu desempenho administrativo profissional. Para tanto, é

imprescindível que o servidor no exercício das suas atribuições funcionais conheça o

ritual estatal que o rege. A lei de responsabilidade fiscal (BRASIL, 2000) muda a

cultura institucional de gestão do dinheiro público. Um dos seus sustentáculos é a

39

transparência, que objetiva permitir à sociedade o conhecimento e a compreensão

das contas públicas. Assim, não é suficiente a mera divulgação de dados. A

sociedade precisa compreender as informações através de linguagem clara,

objetiva, sem embaraços, na forma da lei.

A transparência desejável e buscada pela lei visa ao controle mais efetivo,

reconhecendo que conhecedor das contas públicas o cidadão estará melhor

aparelhado e em condições de fiscalizar, cobrar, exigir e, assim, contribuir para coibir

práticas danosas de gestores no controle de cofres públicos. O descumprimento da

referida lei, a negligência ou a manipulação de informações – a propaganda

enganosa é um exemplo – por parte dos órgãos públicos constitui violação a direito

fundamental consagrado no texto constitucional e caracteriza crime de

responsabilidade. Acerca dessa previsão, pode-se observar o que aponta a

Constituição Federal (BRASIL, 1988):

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: §1º A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.

A propaganda governamental, inegavelmente, produz elevados gastos com

publicidade e, não raro, encontra-se voltada apenas à promoção pessoal e de

interesses específicos. Em períodos eleitorais, é frequente a transmissão de

informações inverídicas aos cidadãos. Os fatos de interesse econômico, político e

social são maquiados, inflados e até mesmo usurpados de outras gestões (LARA,

2003).

40

2.2.4 Instrumentos de comunicação

Entende-se que a informação emitida por uma organização deve chegar ao

receptor e ser compreendida, mas, para que isso se concretize, é preciso considerar

fatores como conhecimento de sua existência, acesso, linguagem adequada,

relevância, entre outros. Isso porque as informações disseminadas podem estar

disponíveis em locais desconhecidos, ser apresentadas em momento inadequado,

não chegar ao destinatário, ser interpretadas de forma equivocada, ser

desinteressantes etc. (DUARTE, 2009).

Diante dessa premissa, parte-se para outra consideração: a comunicação é

um processo amplo, que vai além da simples emissão de informações; é a

interlocução entre sujeitos, em uma perspectiva de diálogo e interação. Ela

pressupõe que os atores tenham a possibilidade de operar de forma ativa no

processo. Ao tratar da comunicação pública, Duarte (2009) afirma que ela deve

permitir que o cidadão expresse suas posições, com a convicção de que será ouvido

com atenção.

Na prática, isso inclui o estímulo a ser protagonista naquilo que lhe diz respeito, ter conhecimento de seus direitos, a orientação e o atendimento adequado, passando pelo direito a saber como são gastos os recursos públicos, o motivo e o voto de um parlamentar, até a possibilidade de ter participação efetiva nas decisões sobre aquilo que é de interesse público. A viabilização da comunicação exige informação, mas também credibilidade dos interlocutores, meios e instrumentos adequados, valorização do conhecimento dos sujeitos, facilidade de acesso e uma pedagogia voltada para quem possui mais dificuldades (idem, p. 64).

Ainda referindo-se à comunicação pública, o autor acredita que o termo está

vinculado ao esforço de melhorar a vida das pessoas por meio da comunicação, e

ressalta a importância dos instrumentos para alcançar tal objetivo. Entre os

exemplos típicos, estão “relatórios, bancos de dados, publicações institucionais,

41

iconografia, noticiário da imprensa, internet, banners, quadros murais, publicidade,

fôlderes, folhetos, cartazes, guias, boletins eletrônicos, cartas, manuais, malas

diretas, discursos” (idem, p. 65). Essas ferramentas auxiliam na disseminação e

disponibilidade de orientações e possibilitam aprofundar um determinado assunto.

Os instrumentos de comunicação pública devem ser adaptados ao ambiente

e às necessidades, às condições e aos interesses dos públicos. Lara (2003, p. 79)

recomenda: “preste atenção em duas coisas: 1) pode mudar o linguajar, mas não o

discurso; 2) adequar a linguagem não pode significar nenhuma forma de pouco caso

à inteligência das pessoas. O desafio é falar com clareza para os diversos públicos”.

Segundo o autor, os mecanismos de comunicação informal para a troca de

ideias também merecem destaque pela função que desempenham e pela expansão

registrada. Nos últimos anos, multiplicaram-se os conselhos gestores e setoriais, os

fóruns de discussão, as consultas públicas, as câmaras técnicas, as centrais de

atendimento ao cidadão, as ouvidorias.

De acordo com Duarte (2009), é possível classificar os instrumentos de

comunicação institucionalizados como massivos, diretos e segmentados, com

relação ao público a que se destinam. A comunicação de massa é voltada ao

máximo possível de pessoas e é a principal fonte usada pela sociedade para a

construção de suas representações sociais e narrativas.

Por vezes, os detentores do poder usam a imprensa como canal de

comunicação de massa. Uma maneira de equilibrar essa força é adotar

“instrumentos de comunicação gerenciados a partir do controle público, como rádios,

sites, TVs e agências de notícias” (idem, p. 66).

O autor expõe suas impressões sobre a situação do Brasil no tocante ao

assunto:

42

Há bons exemplos no Brasil de rádios comunitárias, tvs universitárias e agências institucionais de notícias que prestam excelente serviço à sociedade. Em geral, entretanto, veículos públicos ainda possuem dificuldades orçamentárias, excesso de influência política, pouca participação da sociedade na gestão e foco na divulgação das instituições a que estão ligados. O resultado costuma ser pouca penetração junto ao público e restrição do potencial original (ibidem).

A comunicação direta pressupõe contato personalizado, proporciona

interação, viabiliza a troca de informações, permite que as pessoas resolvam

problemas, recebam esclarecimentos e tirem dúvidas, por exemplo. Grupos de

trabalho, atendimento e debates são alguns exemplos de comunicação direta. Ela

geralmente permite a verificação do retorno da ação comunicativa de forma mais

rápida e apurada. Duarte (2009) julga ser essa a comunicação mais eficaz e destaca

a sua relevância na relação com o público interno das organizações.

A comunicação segmentada destina-se a grupos específicos. Pode ser uma

via de aproximação com determinados públicos. A ascensão de interfaces como

blogs, intranet, redes sociais e outros frutos das novas tecnologias de informática

tem fortalecido essa abordagem, que também se aplica por meio de reuniões,

eventos, feiras etc. (ibidem).

43

2.2.5 Processo de interação

A interação entre as organizações e os diversos públicos dá-se de diferentes

formas. Ações comunicativas são o fio condutor desse processo, e a escolha das

ferramentas a serem utilizadas varia de acordo com as características da instituição

e de seus públicos. Palestras sobre a organização em universidades ou para

segmentos específicos da sociedade, concursos de redação em escolas - com

entrega de prêmios -, investimento em projetos esportivos ou culturais são algumas

das inúmeras opções. A assessoria de comunicação possui papel importante nesse

processo, segundo Lara (2003, p. 88):

Mesmo que a instituição tenha um setor específico para as relações institucionais, a assessoria de comunicação será demandada a toda hora para fazer a parte que lhe cabe. Nessa assessoria estão os especialistas, gente que sabe escrever, que sabe fazer relações públicas, que entende de cerimonial, que sabe como lidar com a imprensa se for o caso de divulgar a ação.

O autor explica que, em determinados casos, quando o assessorado é

interpelado nas ruas ou em eventos por cidadãos que buscam esclarecimentos ou

pretendem contribuir com sugestões, a assessoria de comunicação deve acolher as

demandas. Se necessário, a equipe poderá fazer contato posterior para apresentar

uma resposta ao interessado.

A interação entre o órgão público e o cidadão também pode acontecer

através da mobilização social. Apresentar e compartilhar um problema é uma

maneira de fazer com que as pessoas se sintam, de certa forma, responsáveis e,

assim, ajudem a encontrar soluções. A mobilização social caracteriza-se pelo

engajamento voluntário de um grupo de pessoas em uma causa, e segundo Miranda

e Gonsalves (2010, p. 21):

44

Para que as pessoas se mobilizem, elas precisam de, no mínimo, informação e, então, compartilhar um imaginário, emoções e conhecimento sobre a realidade do mundo à sua volta. Isso tudo gera reflexão e debate e, assim, os primeiros passos para a mudança.

As autoras julgam ser a comunicação fator importante para o sucesso de

uma mobilização social, porque é através dela que será alcançada a atuação

coletiva, fundamental para o processo. A comunicação deve ser pautada pelo

diálogo entre os sujeitos, que compartilham interesses comuns. É necessário

disseminar informações a todos os públicos sobre os objetivos do movimento,

justificar sua proposta, além de demonstrar o que setores importantes da sociedade

pensam sobre o assunto. Quanto ao planejamento de comunicação, orientam que

deve ser

flexível o suficiente para permitir a tomada de posições a respeito de questões críticas e estratégicas e para motivar, associar e integrar os diversos públicos através da criação, da manutenção e do fortalecimento dos vínculos de cada público com o próprio projeto instituído (idem, p. 24).

Independentemente das particularidades de cada movimento de

mobilização, é necessário dar voz aos agentes envolvidos e valorizar seus

interesses culturais, de modo a estimular o reconhecimento de suas

responsabilidades. “Só assim será possível conseguir gerar a mobilização de forma

participativa, fato indispensável para se obter êxito na campanha” (idem, p. 25). As

ações de comunicação devem ser realizadas com o intuito de viabilizar canais de

interação entre os públicos e entre esses e o movimento de mobilização, de uma

forma que não seja confusa e desordenada. Ações interdependentes e

permanentes, de modo a gerar um processo contínuo de participação, devem

integrar o planejamento de comunicação que visa à mobilização da sociedade.

Os modelos de comunicação que podem ser usados dividem-se em três

45

grupos, conforme Toro e Werneck (1996 apud MIRANDA; GONSALVES, 2010, p.

25): a comunicação macro ou segmentada - dirigida a determinados públicos de

acordo com seu trabalho ou função na sociedade – a comunicação micro –

desenvolvida com base nas características específicas das pessoas a que se

destina – e a comunicação de massa – direcionada a um grande número de

pessoas, tratadas como indivíduos anônimos. Os autores defendem que a

comunicação massiva ignora as particularidades dos sujeitos, o que tenderia a

diminuir a possibilidade de identificação com a comunicação e, consequentemente,

com a mobilização social proposta.

2.2.6 O gestor da comunicação pública

Uma organização pública ou privada é composta por uma rede de relações.

Por meio dessa constatação, entende-se que desenvolver uma comunicação

eficiente deve ser um objetivo a ser alcançado pelas instituições. Duarte e Monteiro

(2009) explicam que a comunicação deve ser compreendida como um conjunto de

sujeitos, instrumentos e produtos que atuam para uma finalidade específica, ditada

pelos interesses da organização. O gestor da comunicação deve ser o responsável

por orientar esse processo, de forma integrativa.

Mintzberg (1973 apud Fossatti, 2006, p. 73-77) propõe um conjunto de

papéis do gestor da comunicação reunidos em três categorias relacionadas à

atividade de comunicar. São elas as categorias interpessoal, informacional e

decisão. Os papéis identificados pelo autor são os de representação, líder, relação,

monitor, disseminador, mão de obra, empreendedor, administrador de problemas,

negociador e administrador de recursos.

46

O papel do gestor de comunicação e de toda a sua equipe seria pedagógico e motivador, orientando sobre práticas eficientes e naturalizando a preocupação com a comunicação, para que todos os integrantes, em todas as áreas, assumam o protagonismo de bem comunicar. Sua responsabilidade não se limitaria a criar e manter eficientes produtos e serviços, mas também implicaria gerar espaços de interação e participação, despertar o interesse e motivar para uma comunicação excelente em cada âmbito (DUARTE; MONTEIRO, 2009, p. 356).

Diante dessa nova exigência, os autores vislumbram a possibilidade de

transformar a comunicação organizacional em uma prática mais ampla, que fortaleça

o diálogo com o respaldo das novas tecnologias de informação e comunicação. Ao

traçarem as características da “comunicação tradicional” e da “comunicação

contemporânea” em um quadro com 18 itens (idem, p. 357), os autores analisaram,

por exemplo, que aquela é usada como ferramenta de poder, com foco em produtos,

com uma relação baseada no sentido emissor-receptor, com predominância do

discurso da autoridade. Por outro lado, apontam a comunicação contemporânea

como um processo voltado para a autonomia, solidariedade e sociabilidade, com

foco em processos, sendo ela plural, complexa, multifacetada e dinâmica, com

destaque para os argumentos dos sujeitos.

A partir desses autores, percebe-se que aplicar a proposta da comunicação

contemporânea nas organizações é uma exigência do mercado na atualidade.

Nesse contexto, o gestor da comunicação ampliou seu campo de atuação e tem

mais responsabilidades. No entanto, ele não está presente em todas as situações de

comunicação da organização e é imprescindível que os funcionários sejam

estimulados a desenvolver habilidades para a comunicação.

De acordo com Bueno (2009, p. 21), “seria inimaginável que toda a

comunicação de uma organização, ainda que de pequeno porte, dependesse de

uma única pessoa ou mesmo de um grupo pequeno de pessoas. Não dá para

47

assobiar e chupar cana ao mesmo tempo”. Sendo assim, é preciso fazer com que

cada integrante do sistema assimile o papel da comunicação, compreenda a

importância das relações interpessoais, zele pela qualidade das informações e tenha

abertura e oportunidade para se manifestar. As habilidades do gestor da

comunicação são fundamentais nesse processo.

Mais do que habilidade disseminadora de informações, entretanto, o comunicador precisa de habilidade dialógica e saber transferir essa mesma habilidade para a organização. O gestor deve deixar de ser um mero porta-voz da organização para ser o mediador de relações. (...) Os gestores são especialistas que atuam como estimuladores e orientadores, uma espécie de pedagogos da informação, agindo no sentido de elaborar políticas, estabelecer espaços de comunicação e criar mecanismos de educação para a comunicação. Deixam, portanto, de ser difusores de informação para também atuar como estrategistas de interação e pedagogos de comunicação (DUARTE; MONTEIRO, 2009, p. 358).

O cidadão tem demonstrado mais interesse pelos assuntos públicos e exige

cada vez mais transparência e clareza na informação que recebe. Cresce a

demanda por informação de qualidade. Diante disso, aumenta a responsabilidade de

quem trabalha com comunicação governamental. Esse crescimento, no entanto,

nem sempre é percebido como desdobramento dos avanços democráticos e do

fortalecimento do conceito de cidadania. Alguns governantes utilizam a comunicação

apenas como um instrumento para se sustentarem no poder. Camargos (2004, p.

148-149) apresenta as nuances desse cenário:

Uma boa comunicação é fundamental para a continuidade e sobrevivência de governos, mas o que muitos governantes não conseguem captar é que na outra ponta da linha está o cidadão e, do ponto de vista dele, o que importa não é a imagem boa ou ruim da administração, mas a transparência, a possibilidade de fiscalização, a existência de meios que permitam o julgamento de uma ação administrativa. Em outras palavras, para o cidadão, o que deveria prevalecer é a informação como um direito inalienável, fundamental, básico. Em última instância, a verdade dos fatos.

48

Um dos desafios dos profissionais que trabalham com comunicação

governamental é encontrar um ponto de equilíbrio entre a formação da imagem da

instituição e a garantia do direito à informação. Cabe frisar que a comunicação deve

ter o intuito de esclarecer, nunca o de confundir. O profissional não deve permitir

compreensões que sejam muito mais oportunas do que verdadeiras a respeito de

um fato, conforme explica Camargos (2004), que faz ainda uma analogia para

ilustrar a situação em que vive o comunicador da área pública:

Quem lida com comunicação na área governamental tem que tomar consciência de seu papel e desde já é preciso ficar claro que esse papel não poder ser o do marisco que tenta sobreviver entre o mar e o rochedo. Esse profissional, de fato, está entre o mar e o rochedo, mas não pode vestir a carapuça de um marisco. É parte ativa no processo por cujas consequências e resultados vai ser responsabilizado, seja por ação ou por omissão. Na área governamental, a oposição estará sempre atenta para destruir e despachar para o inferno a boa intenção do comunicador que coloca como objetivo único o direito da sociedade à informação. No outro extremo, os ditames da consciência e a história estarão sempre prontos para condenar o comunicador que coloca como objetivo único a formação da imagem da instituição em que trabalha em detrimento da informação como direito constitucional (idem, p. 150).

No rastro do pensamento desse autor, entende-se que o gestor da

comunicação tem de trabalhar para libertar o discurso comunicativo da organização

da conveniência política, deve atuar de forma a esclarecer o cidadão - nunca de

modo a confundir ou mascarar informações - e não deve abdicar de postura de

resistência, caso contrário, não contribuirá para o aperfeiçoamento da instituição e

não cumprirá de fato o seu papel.

49

3 OUVIDORIA PÚBLICA

A democracia pressupõe instrumentos capazes de fiscalizar as ações dos

Governos, com foco no interesse público. Entende-se que a ouvidoria é uma

ferramenta que abarca essa proposta, por ser um canal para denúncias,

reclamações, sugestões e elogios quanto aos serviços prestados. Vismona (2000, p.

13-14) explica:

O ombudsman ou ouvidor recebe as reclamações do cidadão, avalia se é da sua competência a questão apresentada, procura identificar as causas, a sua procedência e os meios para solucioná-la, ou, se isto não for possível, explicar o porquê. Não é a solução para todos os males, porém, agindo dentro da instituição, tem a vantagem de poder acelerar as soluções para questões muitas vezes simples, mas que para o cidadão são muito importantes e que poderiam ser ignoradas pelas grandes estruturas funcionais, perante as quais o cidadão sente-se impotente. Portanto, fortalece os direitos do cidadão, aproximando-o da instituição. Age em contato direto com o poder decisório e, coibindo abusos e a repetição de erros, estimula o processo de melhoria contínua da qualidade.

O pensamento desse autor é compartilhado por Pessoa, Silveira e Oliveira

(2011), pois acreditam que a ouvidoria facilita a tomada de decisões nas

organizações e é uma maneira de buscar a melhoria dos serviços, por meio das

informações repassadas por usuários dos produtos e serviços oferecidos e da

percepção sobre a imagem e o nível de excelência da instituição.

Ouvidores/ombudsman conferem ainda transparência às organizações, sejam elas públicas ou privadas, agregando valor percebido às instituições e/ou empresas. Essa nova relação, de respeito às pessoas, consumidoras diretas ou não, tem se revelado como ponto decisivo na imagem de uma organização, determinado a escolha do consumidor e, no caso de instituições públicas, a aprovação ou reprovação dos serviços prestados (ibidem).

A omissão de parte dos administradores públicos no tocante à criação de

canais que permitam ao cidadão manifestar sua opinião e obter informações gera

50

desconfiança e insatisfação popular quanto aos serviços prestados e à aplicação de

recursos. A implantação de uma ouvidoria é uma alternativa para administrar esses

conflitos e para ofertar à população um meio de controle externo. Segundo Oliveira

(2000, p. 24):

O acesso direto às informações e aos atos administrativos, bem como o registro de reivindicações do cidadão, são mecanismos dos mais baratos e de impacto social amplo e significativo. O cidadão informado passa a fornecer dados quanto às condições da prestação do serviço, aponta falhas, prioriza suas necessidades, propõe alternativas, contribuindo assim com elementos para a elaboração de políticas públicas. O nível da comunicação abre novos horizontes, partindo da simples reclamação para o diálogo e, daí, para a análise de questões reais, implicando num verdadeiro indicador de mudança.

O autor destaca que organizações renomadas utilizam as informações que

chegam à ouvidoria – sejam reclamações ou sugestões – para aperfeiçoar a

qualidade dos serviços ofertados e para solucionar problemas. Ele defende que o

mesmo aconteça com órgãos da administração pública e enumera alguns motivos

para a implantação de ouvidorias nessa esfera:

pode-se afirmar que, obrigatoriamente, toda e qualquer entidade da administração pública deve possuir um sistema de acolhimento de reclamações, reivindicações e denúncias, pelas seguintes razões:a) os cidadãos têm o direito de expressar comentários críticos e de serem ouvidos;b) a tabulação dos resultados de um sistema de reclamação dirige atenção e providências para áreas que necessitam de melhorias e aperfeiçoamentos;c) um sistema de reclamação sensível, competente e eficaz oferece um sentimento de satisfação ao cidadão reclamante, que sente respeito à sua dignidade e cidadania;d) um bom sistema de reclamação propicia economia de dinheiro e tempo ao administrador público e, conseqüentemente, a toda sociedade contribuinte (OLIVEIRA, 2000, p. 25).

É necessário adquirir conhecimentos multidisciplinares para desempenhar o

papel de representante do cidadão dentro de uma organização. Aprimorar a relação

entre a entidade e o cidadão, buscar soluções para as questões apresentadas e

51

informar os resultados obtidos, utilizando parâmetros éticos, são funções do ouvidor.

A ouvidoria surge no século XIX, com a promulgação da Constituição da

Suécia em 1809. O documento introduz o justitie-ombudsman, figura responsável

por fiscalizar a observância das leis pelos tribunais e pelos funcionários públicos. A

partir de então, a população passou a ter a possibilidade de questionar e criticar atos

de juízes e de outros funcionários do rei. “Ombudsman, expressão de origem

nórdica, resulta da junção da palavra ombud que significa ‘representante’,

‘procurador’ com a palavra man – homem” (VISMONA, 2000, p. 11).

Comparato (2011) desenvolveu uma pesquisa sobre as ouvidorias de Polícia

no Brasil e destaca que a expansão internacional do conceito de ombudsman foi um

processo gradativo, que teve início no século seguinte, com a criação do profissional

na Finlândia, em 1919, e na Dinamarca, em 1954. Afirma que, no mesmo ano, a

Alemanha Ocidental adotou o ombudsman para a sua administração militar. O último

dos países escandinavos a instituir um ombudsman foi a Noruega, no ano de 1962.

Também naquele ano, destaque para a Nova Zelândia, o primeiro país não-

escandinavo a criar um ouvidor para as esferas administrativa e civil.

Ao longo do século XX, outras nações incorporaram a figura do ouvidor. A

atividade tornou-se comum em organizações privadas e públicas e estabeleceu-se

como um canal de comunicação, de modo a viabilizar a manifestação do público. A

configuração da ouvidoria é descrita por Vismona (2000, p. 12):

Mandato determinado, exercício de suas funções com autonomia e independência, receber reclamações e sugestões, acesso direto à administração, atuar em defesa dos direitos individuais, combatendo erros, omissões e abusos, são pontos comuns na configuração do ombudsman nos diversos países, inclusive no Brasil.

Reza o Código de Ética do Ouvidor/Ombudsman - instituído pela Associação

52

Brasileira de Ouvidores/Ombudsman, em 1997 - que o profissional deve trabalhar

para “defender intransigentemente os direitos inerentes à pessoa humana; agir com

integridade, transparência e respeito; exercer suas atividades com independência e

autonomia, de forma ágil e precisa, buscando a correção dos procedimentos

errados” (VISMONA, 2000, p. 16).

3.1 HISTÓRICO DA OUVIDORIA NO BRASIL

Segundo Vismona (2000), no período colonial, surge no Brasil o ouvidor-

geral, encarregado de aplicar a lei de Portugal, sendo um representante do poder,

não do cidadão. Essa figura reportava ao rei o que acontecia na colônia. Esse

modelo de ouvidoria distinguia-se do modelo implantado na Suécia, no qual o

justitie-ombudsman representava os interesses da população.

Diferentemente da Constituição da Suécia, a Carta Magna do Brasil de 1988

não estabelece a necessidade de um ombudsman para controle da administração

pública. Conforme Vismona (2000, p. 11), “ouvidor, no Brasil, na configuração atual,

mais próxima da clássica, de representante do cidadão agindo na defesa de seus

direitos, passou a ser adotado pela administração pública em 1986, pela Prefeitura

Municipal de Curitiba”. Na esfera pública, ouvidor é a denominação mais usada.

Faz-se uma pausa na trajetória da ouvidoria no serviço público brasileiro

para uma observação do referido autor, o qual relata que os ouvidores que

trabalham nos Municípios, nos Estados e na União são nomeados pelo Chefe do

Executivo, geralmente por decreto. Ele cita a existência de uma polêmica quanto à

autonomia do ouvidor indicado politicamente. Esse trabalho não adentra nessa

seara, pois não está relacionada aos objetivos da pesquisa. Apenas para constar,

registra-se a opinião de um dos pioneiros na implantação de ouvidorias públicas

53

profissionais no Brasil, Oliveira (2010, p. 170):

Podemos afirmar que, majoritariamente, a ouvidoria no serviço público é comandada por pessoas indicadas politicamente. As exceções são poucas, principalmente em alguns municípios e em órgãos reguladores. Diferentemente do ombudsman clássico, o perfil da nossa ouvidoria como um órgão de controle interno, sem a devida autonomia e independência, faz com que seus ouvidores atuem muitas vezes como instrumentos de defesa dos seus órgãos, em vez de representantes dos cidadãos, para não ferir suscetibilidades daqueles que os indicaram.

Em 1986, Oliveira (2000, 2010) planejou e instituiu a primeira ouvidoria

pública estadual, com sede em Curitiba. Em 1995, foi nomeado ouvidor geral do

Estado do Paraná, cargo ocupado até o ano de 2001.

O debate sobre a possibilidade de incorporar as atividades de ouvidoria às

universidades brasileiras iniciou-se em 1984. As instituições públicas de ensino

superior foram pioneiras. De acordo com Pessoa, Silveira e Oliveira (2011), “em

1992, foi implantada a primeira ouvidoria universitária na UFES – Universidade

Federal do Espírito Santo”.

Em 20 de abril de 2000, Mário Covas, à época governador de São Paulo,

sancionou a lei de defesa do usuário do serviço público. A lei nº 10.294/99

determinou a criação de ouvidorias em todos os órgãos públicos estaduais de São

Paulo, resultando, assim, na institucionalização da atividade na administração

pública, de modo a servir de estímulo para os Municípios e a União. Para Vismona

(2000), a institucionalização da Ouvidoria deu-se pela necessidade de aperfeiçoar os

serviços prestados e de atender aos cidadãos. O autor comenta a aplicação da

norma:

Esse diploma legal define os direitos básicos do cidadão-usuário do serviço público, assegurando os direitos à informação, à qualidade e ao controle. Quanto ao controle, define que para assegurar esses direitos todos os órgãos e entidades prestadoras de serviços públicos no Estado de São Paulo deverão ter Ouvidorias. Com tal determinação, o número

54

de ouvidores teve grande crescimento. Foram designados 117 Ouvidores, que passaram a atuar em todas as Secretarias de Estado, na Administração direta e indireta, além das empresas privadas que assumiram a concessão de estradas e energia, formando um verdadeiro sistema, interligado por intranet e internet (VISMONA, 2000, p. 14).

Iasbeck (2010) atribui a expansão das ouvidorias no Brasil à obrigatoriedade

de que todos os órgãos públicos que prestam serviços aos cidadãos instituam uma

ouvidoria.

No inciso I do § 3º do artigo 37 a Constituição Brasileira obriga o serviço público a dispor de serviços de atendimento a reclamações. A Lei nº 8.490/92 previu a criação de uma Ouvidoria Geral da República na estrutura organizacional do Ministério da Justiça; A Lei nº 10.689/04 mudou o nome da Ouvidoria Geral da República para Ouvidoria Geral da União, que, pelo Decreto nº 4.785/03, tem, entre outras, a competência de coordenar tecnicamente o segmento de ouvidorias no Poder Executivo Federal (IASBECK, 2010, p. 16).

A determinação para implantação do serviço em órgãos públicos fez com

que algumas organizações passassem a oferecer o atendimento de forma

descomprometida e sem a conscientização da relevância dessa atividade. Ainda

segundo o autor, por outro lado, há instituições que assumem a responsabilidade

com a compreensão de que é necessário estimular a participação popular e, assim,

estimular a prática da cidadania.

De acordo com Comparato (2011), existem mais de mil ouvidorias públicas

no país, a nível federal, estadual e municipal, nos mais variados setores da

administração pública. Os ouvidores brasileiros, “em sua maioria, passaram a

exercer esta função sem um preparo técnico prévio; foram aprendendo, buscando

identificar as suas qualidades específicas no dia-a-dia. Falta literatura, faltam cursos”

(VISMONA, 2000, p. 16).

Na iniciativa privada, a função ganhou força no final da década de 80, com a

instituição do Código de Defesa do Consumidor (CDC). A partir do documento, as

55

empresas passaram a se preocupar com penalidades e multas e a buscar a

prevenção de conflitos por meio da figura do ouvidor. Destaca-se que as empresas

privadas deram preferência ao termo ombudsman.

A Rhodia e o jornal Folha de S. Paulo adotaram o ombudsman em 1985 e

em 1989, respectivamente, segundo Vismona (2000). Com essas iniciativas e com a

promulgação do CDC, outras empresas teriam sido estimuladas a instituir um

representante para ouvir o que os clientes e cidadãos tinham a dizer. O autor cita a

Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica, o Banco Nacional e o Grupo

Pão de Açúcar, e comenta as perspectivas de atuação do ouvidor:

Este crescimento é contínuo: em bancos, shoppings centers, empresas privadas de energia, rodovias e telefonia, de cartões de crédito, enfim, nas mais diversas áreas o ombudsman vem sendo instituído, viabilizando canais de acesso com o consumidor antes inexistentes, fortalecendo o atendimento ao cidadão e a transparência nas empresas (VISMONA, 2000, p. 12)

3.2 DEFESA E ATENDIMENTO AO CONSUMIDOR

Os direitos sociais, como educação, trabalho, saúde, moradia, segurança,

previdência social, entre outros, ganham forma através da intervenção do Estado e

visam a diminuir as desigualdades sociais. A legislação protege e garante esses e

outros direitos, que se constituem “como pilares do capitalismo social e, em seu

âmago, revelam um sentido ético, pois conferem à responsabilidade social e ao

altruísmo um papel relevante na convivência coletiva” (SROUR, 2000 apud

GUAZZELLI, 2010, p. 98).

Em consonância com esse cenário e diante dos significativos avanços na

conquista de direitos pelos cidadãos, em 1990 foi instituído o Código de Defesa do

Consumidor (CDC), por meio da lei nº 8.078, o qual regulamenta o previsto no inciso

56

22 do artigo 5º da Carta Magna: o Estado promoverá a defesa do consumidor, na

forma da lei. Cabe ressaltar que a atual Constituição (BRASIL, 1988), aclamada pelo

Deputado Ulysses Guimarães como a “Constituição Cidadã”, tem como eixo a

cidadania e a inserção participativa do cidadão.

Com foco também na cidadania, o CDC inaugura uma nova fase nas

relações de consumo ao assegurar direitos e conclamar o cidadão à tarefa de

fiscalizar e corrigir a atividade administrativa. Segundo Guazzelli (2010, p. 98),

Em vez de apenas ditar regras e sanções, logo no início de seu enunciado, tal como um guia de boas práticas, o código preconiza a harmonização dos interesses dos participantes nas relações de consumo, com base no equilíbrio dessas relações e, entre outros princípios, alerta para a necessidade de promover a educação e informação de fornecedores e consumidores quanto aos seus direitos e deveres, com vista à melhoria do mercado de consumo.

No rastro da ação precursora das entidades de defesa do consumidor,

a lei obteve uma acolhida social que poucas iniciativas lograram e conseguiu promover, de modo eficiente, a conscientização da população sobre o valor de sua participação como agente de mudança no desenvolvimento social, de garantia de seus direitos e, principalmente, da sua força como agente de uma relação jurídica de consumo ( idem, p. 102).

Sintonizado com a sociedade, o CDC influenciou a criação de outras leis e o

desenvolvimento de inúmeras associações que, atuantes na defesa dos interesses

dos consumidores brasileiros, vêm aperfeiçoando e amadurecendo os conceitos de

direito e de cidadania na sociedade. Os serviços de atendimento a consumidores

(SACs) objetivam ser um canal adequado de interlocução e monitoramento

permanente do nível de satisfação do consumidor. Assim sendo, entende-se que as

práticas de ouvidoria e de relações públicas se desenvolvem e coexistem sobre a

mesma base referencial de princípios (GUAZZELLI, 2010).

57

3.3 A CIDADANIA

A materialização da cidadania só poderá resultar de uma ação conjunta

entre Estado, sociedade civil, empresas e, sobretudo, da participação do cidadão,

que é o seu principal agente. Entretanto, fortalecer e estimular o seu exercício

compete em grande parte ao Estado, que tem a responsabilidade de estabelecer as

políticas públicas de serviços básicos para o cidadão. Exercer concretamente os

direitos e deveres no dia a dia requer conhecimento mínimo desses direitos e

deveres. A par disso, o cidadão pode reivindicar ao Estado, por meio de seus órgãos

públicos, o acesso à informação, conforme argumenta Vismona (2000, p. 15):

A consolidação da democracia exige o desenvolvimento de novos instrumentos que modernizem o Estado, estimulem a participação e alterem o foco da administração pública, redirecionando-o para o atendimento ao cidadão, racionalizando os recursos públicos, combatendo os desperdícios e a corrupção, conferindo, enfim, maior transparência ao exercício do poder político. A ouvidoria no Brasil, mantidos os seus princípios, é uma aliada na conquista desses objetivos.

Em plena era da informação, nesse início do século XXI, não basta ao

cidadão ou cidadã apenas saber-se titular de direitos e prerrogativas que todos

gozam segundo a Constituição em vigor (BRASIL, 1988). Somente no envolvimento

com os processos e sistemas informativos é possível buscar esses direitos, os quais

nem sempre estão informados.

O direito de petição aos poderes públicos, a obtenção de certidões para

defesa de direitos e esclarecimentos de interesse pessoal podem ser obtidos

diretamente em repartições públicas. Seja no ambiente virtual informatizado, por

telefone ou diretamente nos balcões, é essa busca consciente e intencional,

demanda legítima por parte das pessoas, o elemento mais importante para o

aprimoramento das instituições e amadurecimento da cidadania. Vismona (2000, p.

58

17) acredita que a ouvidoria desempenha papel relevante frente à confusão

existente entre os interesses públicos e privados no Brasil:

A ouvidoria auxilia no fortalecimento do indivíduo perante as grandes e mais complexas estruturas prestadoras de serviços e produtos, conferindo maior transparência às ações das instituições, buscando a superação da passividade com o incentivo à participação e, por conseqüência, aprimorando o grau de conscientização da cidadania e a valorização da democracia.

Riche (2010, p. 182) também ressalta o papel social das ouvidorias e as

perspectivas que surgem diante de um trabalho realizado com excelência:

O bom desempenho de uma ouvidoria pública é fundamental para viabilizar a inclusão social e a participação do cidadão, é essencial para que as vozes dos sujeitos, muitas vezes considerados invisíveis, se transformem em hino da civilidade, da liberdade, da esperança e da igualdade social.

É sabido que a lei não muda comportamentos, o que muda o

comportamento é a educação. O desempenho prático da cidadania como processo

cultural se consolida em função da demanda de direitos a serem conhecidos e de

responsabilidades que são de todos e de cada um dos brasileiros (RICHE, 2010;

VISMONA, 2000).

3.4 A OUVIDORIA NA COMUNICAÇÃO

Comunicação é sinergia. Como também pode ser entropia. Poder ser positiva, como também negativa. Pode retratar amizade e aproximação, como antipatia e rejeição. Entendimento e desentendimento. Paz e guerra. Bem ou mal. Comunicação é tudo que leva a transmitir, receber, processar ou compartilhar significados. Comunicação está sempre envolta em variabilidade (PESSOA; SILVEIRA; OLIVEIRA, 2011).

A ouvidoria é um serviço de comunicação, sendo um canal para a livre

manifestação do público, que poderá revelar sua satisfação ou insatisfação quanto

59

aos serviços prestados pela organização. Ela é também uma mídia que promove a

interação social. Críticas, sugestões e reclamações recebidas são usadas para

gerar, reformular e disseminar sentidos. As informações recebidas transformam-se

em outras informações que vão influenciar a realidade, conforme argumenta Iasbeck

(2010, p. 19):

Os problemas trazidos às ouvidorias com o rótulo de “reclamações, sugestões, críticas ou dúvidas” são, quase sempre, problemas de comunicação, do ponto de vista do processo propriamente dito, ou seja, são “problemas” porque algo que partiu da organização (de sua expressão) com determinadas intenções foi entendido e “consumido” de forma diversa pelo cliente ou cidadão. Para entender as diferenças entre o que se envia e o que se recebe, é necessário analisar as intenções de emissão e as expectativas de consumo, materializadas tanto em informações intangíveis (serviços, atividades, ideologias) quanto em suportes identificáveis (produtos, critérios, regulamentos).

Iasbeck (2010, p. 15) define como objetivo primeiro da ouvidoria “curar

vínculos estremecidos no relacionamento entre as organizações e seus públicos”.

Intermediar questões polêmicas e situações de conflito, assim como administrar

interesses e intenções, faz parte do trabalho. Ouvir é o início do processo de

comunicação entre o cidadão/cliente e a organização, que se completa com a

resposta.

O autor fala sobre a “troca de papéis no jogo comunicacional” para abordar a

dinâmica do processo da comunicação - caracterizado pelo estímulo a novas

respostas e ao diálogo – no qual o emissor da mensagem torna-se receptor ao

receber retornos e feedbacks, e aquele que inicialmente era receptor passa a ser

emissor ao transmitir uma reação ou resposta à mensagem.

A ouvidoria precisa agir junto à organização, pois quem é demandado nas ouvidorias não são as ouvidorias isoladamente, mas toda a organização. É, então, a organização que providencia respostas e encontra alternativas de solução, devidamente assessorada e municiada de informações pela ouvidoria. Essa é a outra parte do trabalho do ouvidor: buscar respostas e soluções para os problemas que lhe

60

chegaram, articulando os dois polos do processo comunicativo: o emissor (público, cidadão, cliente, consumidor) e o receptor (organização pública ou privada), proporcionando uma troca de papéis coordenada e sincronizada entre eles (idem, p. 18).

No entanto, o ouvidor não se limita a divulgar informações ou a administrar o

fluxo delas. Faz parte de sua atividade analisar contextos e reações, com base em

critérios justos, com uma postura ética, com responsabilidade no trato da

informação. Por esse motivo, o autor defende que o profissional não pode prescindir

de habilidades comunicativas específicas, mas faz uma ressalva ao esclarecer que

não recomenda, com isso, necessariamente a reserva de vagas aos profissionais da

comunicação.

O que pretendemos é salientar a relevância do tratamento competente das informações que fluem pela ouvidoria, de modo a sensibilizar aqueles que ali trabalham a buscarem desenvolver competências comunicativas para o exercício de sua função. E, sendo comunicação, a ouvidoria não é apenas recepção e divulgação: é também um lugar de produção e transformação de informações (idem, p. 19-20).

Saber ouvir e fazer isso sob a perspectiva do outro, compreender contextos

e motivos e usá-los na formulação da resposta e no desenvolvimento do processo

de comunicação e traduzir linguagens técnicas e burocráticas são algumas das

competências sugeridas pelo autor.

“Quem ama reclama”, ditado popular bastante conhecido, é uma expressão que sintetiza, de certa forma, uma das questões mais relevantes em ouvidoria entendida como lugar de comunicação: quem procura a ouvidoria não quer romper o vínculo; antes, deseja tratá-lo e fazê-lo perdurar. Por isso, a ouvidoria, hospital de vínculos, precisa investir seriamente na competência de seus profissionais para tornar-se um espaço reconhecidamente capaz de manter atados, pela comunicação, aqueles que são a razão maior da existência de toda e qualquer organização: o cliente, o consumidor, o cidadão (idem, p. 24).

Em sua tese de doutorado, o autor afirma que a comunicação organizacional

é mais uma função do que um departamento; mais um signo do que uma

61

representação formal. O discurso de uma instituição é construído por todas as

formas pelas quais ela se manifesta - a identidade visual, as citações na mídia, a

atuação dos funcionários etc – e a maneira como o público interpreta esses sinais

contribui para a formação de uma imagem. Tal imagem será decisiva para as

escolhas do público, que poderá confiar ou desconfiar do discurso.

Os discursos são produzidos ininterruptamente, em um fluxo contínuo de

troca de informações. As pesquisas qualitativas e quantitativas estão entre as

metodologias mais utilizadas para avaliar a imagem das instituições. Iasbeck (2011)

acredita que o espaço de tempo compreendido entre a captação dos dados e a sua

apresentação final revela uma defasagem, visto que as pesquisas tendem a

valorizar o aspecto emocional e, assim, estão sujeitas a interferências inesperadas,

como mudanças de humor, por exemplo.

O autor vislumbra na ouvidoria um lugar adequado para a aferição da

imagem da organização – o fluxo de informações é dinâmico, sujeito a mudanças e

possibilita uma análise mais fiel desse processo periodicamente. Argumenta que o

usuário do serviço

oferece muitas e diversificadas informações, desde as mais óbvias e explícitas, até outras que podem facilmente ser inferidas na relação. Todas as informações que chegam até ela podem e devem ser sistematizadas, organizadas de forma a servirem como importantes subsídios aos escalões estratégicos da Organização, aqueles que têm o poder de mudar o discurso. Os dados colhidos junto à Ouvidoria podem ser transformados em valiosas informações gerenciais (IASBECK, 2011).

É por meio desse viés estratégico que os objetivos da ouvidoria se

encontram com os objetivos da assessoria de comunicação. Desde a sua

implantação, a ouvidoria reflete o discurso da instituição e é uma ferramenta

complementar de comunicação para executar políticas estratégicas. De acordo com

62

Pessoa, Silveira e Oliveira (2011), “jamais a ouvidoria deve ser considerada uma

adversária ou concorrente dos demais setores da organização, ao contrário, ela é

uma aliada interna para todas as áreas. E sua atuação deve ser complementar e

não paralela”.

Alguns dos benefícios da implantação de uma ouvidoria, citados pela

empresa de consultoria ODM (2011), coincidem com os benefícios advindos de

ações de comunicação nas organizações. Entre eles, a identificação de áreas que

mereçam maior atenção dos dirigentes, o retorno sobre a atuação da instituição, a

possibilidade de redirecionamento de ações, o relacionamento democrático com o

público, a revisão de políticas institucionais e o fortalecimento da imagem da

organização.

Iasbeck (2011) considera a ouvidoria o “espaço mais adequado para reger –

de um lado – a produção dos discursos e – de outro - monitorar a imagem e

promover, assim, a identidade entre organização e seus públicos”, desde que haja

consciência por parte dos administradores quanto às áreas estratégicas e quanto à

importância da comunicação para o sucesso das instituições.

Comunicar é interagir com o outro; é trocar informações na busca do entendimento e da compreensão, condições essenciais para que possamos obter qualidade de vida em grupo, em proveito de toda a sociedade. A Ouvidoria, aqui entendida como lugar privilegiado de comunicação organizacional, tem tudo para promover tais atitudes, resignificando as relações públicas no trabalho e viabilizando a dignidade das relações humanas, de modo ampliado, integrado e abrangente (ibidem).

3.4.1 Estrutura da ouvidoria

Órgãos públicos devem obedecer à legislação - quando afetados por ela em

sua esfera de atuação - ao estruturar uma ouvidoria. No entanto, mesmo com a

63

existência de norma, a forma de implantação pode não estar claramente definida,

como é possível constatar no texto do decreto nº 50.656, de 30 de março de 2006. O

documento que institui e organiza o Sistema Informatizado da Rede de Ouvidorias

do Estado de São Paulo é abrangente e não especifica como deve ser a estrutura

das ouvidorias no tocante a equipamentos e quadro de pessoal. Conforme a ABO

(2011), limita-se a determinar o seguinte:

Artigo 2º - A Casa Civil, por intermédio da Subsecretaria de Gestão e Recursos Humanos, tomará as providências necessárias para a implementação do Sistema Informatizado da Rede de Ouvidorias e designará os órgãos ou servidores responsáveis pela sua administração, atualização, manutenção e concessão de senhas.

De forma geral, pode-se dizer que a estruturação das ouvidorias brasileiras

dá-se de maneira aleatória quando não existem normas. Empresas privadas

estabelecem o setor conforme as condições de instalação que possuem ou de

acordo com o que está documentado em seus regimentos internos. Apesar de

salientar a carência de referências bibliográficas sobre ouvidoria e parecer contrário

à sistematização das estruturas e dos procedimentos ao destacar a diversidade do

modelo adotado no Brasil, em entrevista, Oliveira (2010, p. 171) diz o seguinte:

O debate acadêmico sobre ouvidorias ainda é incipiente. Temos tido universidades realizando cursos de extensão e de especialização, mas, mesmo com a existência do Fórum Brasileiro de Ouvidores Universitários (FNOU), não há o entusiasmo necessário para a sistematização ou mesmo a divulgação literária. Em muitos cursos, tem aumentado o número de monografias, trabalhos de conclusão de cursos e dissertações sobre ouvidoria, o que já é um bom começo. Creio que o maior óbice para a academia prestar atenção à instituição é a diversidade do próprio modelo de ouvidoria brasileira. Como sistematizar ou debater algo que está em constante mutação, o que não condeno, pois demonstra adaptabilidade, jogo de cintura para sobreviver, ser contemporâneo. Talvez a sistematização pudesse engessar e limitar o desenvolvimento de algo não-burocrático, célere, informal etc.

O entrevistado esboça considerações sobre os sistemas de atendimento

64

adotados à época de sua obra (OLIVEIRA, 2000) e aponta características gerais que

esses organismos devem apresentar. Planejar serviços de telefonia capazes de

responder de forma eficiente às demandas e apresentar retorno dentro de um prazo

razoável são algumas delas.

O sistema deve contar com regras básicas, tecnologia apropriada e muito bom senso por parte dos funcionários, na hora do atendimento. Muitas organizações implantam sistemas de atendimento com rotinas de trabalho preestabelecidas, inflexíveis para o bom atendimento e solução às reivindicações apresentadas por seus clientes, burocratizando ainda mais os processos internos e reduzindo as atividades do sistema a mero elenco de regras. Cabe à estrutura de ouvidoria implantar ações e mecanismos, permitindo ao cidadão o entendimento e o incentivo para o exercício de sua cidadania e ao administrador público a possibilidade de análise e alteração de procedimentos (idem, p. 25-26).

3.4.2 Tecnologia da informação

O potencial de interação das ouvidorias foi maximizado com o advento das

telecomunicações e da informática. Essa convergência gerou impacto positivo na

forma de prestar o serviço aos cidadãos e consumidores por otimizar os trabalhos e

o fluxo comunicacional. O controle do tempo médio de atendimento, estabelecido

por algumas organizações através dos sistemas, é apenas um dos exemplos. As

novas mídias fazem a mediação do trabalho e influenciam os padrões de interação e

comunicação das instituições. De acordo com Raimundo (2010, p. 82), essa

influencia ocorre, sobretudo, naquelas organizações “que se intitulam flexibilizadas

no seu processo de gestão pelo uso de tecnologias de comunicação”.

Ao adotar como ponto de partida o reconhecimento do papel central das

novas tecnologias de comunicação, a autora desenvolve uma pesquisa que compara

a forma como as pessoas que trabalham em centrais de atendimento lidam com as

experiências interativas, com o intuito de compreender a ligação entre os sistemas

65

técnicos e a consolidação de espaços de diálogo na esfera das centrais.

O diálogo é instituinte da ação comunicativa e, como tal, favorece a construção de um sentido de autonomia que se manifesta com a participação efetiva dos sujeitos no processo de tomada de decisão. As novas mídias funcionam como fomentadoras das interações comunicacionais e da flexibilidade necessárias ao processo (idem, p. 84).

Hoje, mais do que nunca associadas à tecnologia da comunicação, as

mídias são fundamentais para a troca de informações e estão presentes nas mais

diversas dimensões da comunicação. Romano (1993 apud IASBECK, 2010, p. 23),

comunicador espanhol, classifica as mídias de acordo com a dependência que elas

mantêm com as tecnologias da comunicação.

Nas mídias primárias, a interação se dá pessoalmente pela presença física, o que implica competências específicas de expressão e percepção; nas mídias secundárias, a interação é intermediada por um equipamento tecnológico, normalmente utilizado pelo emissor, ao passo que o receptor não precisa de nenhum aparato tecnológico; nas mídias terciárias, ambos necessitam de aparatos tecnológicos, tanto para mandar como para receber mensagens (ibidem).

Percebe-se que há a tendência de as ouvidorias - entendidas como mídias

de interação social – cada vez mais se enquadrarem no padrão qualificado por

Romano como mídias terciárias, haja vista que os contatos, em sua maioria, são

estabelecidos por telefone e por e-mail. Para o autor, o uso de tecnologias diminui as

chances de percepção do outro ao mesmo tempo em que tal fragilidade é suprida

pelas características comunicativas naturais do próprio meio.

Os acessos à ouvidoria modificam seu caráter midiático e injetam sentidos diferenciados nas manifestações recebidas, alterando tanto a relevância do assunto quanto a tempestividade e a efetividade da resposta. Por isso, a relação estreita entre meios e técnicas requer conduções diferenciadas de ocorrências, adequação de linguagem, interferência em campos semânticos, traduções e transculturações de sentidos, enfim, uma complexa e sutil engenharia semiótica capaz de assegurar a eficácia do processo de comunicação (ibidem).

66

3.4.3 Processo de interação

Não há regulamentos para a ocupação do cargo de ouvidor no Brasil, ou

seja, não há determinações quanto ao tipo de formação desse profissional, mas há

consenso entre pesquisadores da área quanto à necessidade de o ouvidor

desenvolver ou possuir habilidades comunicativas. Especialistas em relacionamento

podem encontrar nesse mercado uma oportunidade de trabalho. A gestão

estratégica dos relacionamentos é imprescindível para a efetividade dos resultados

dos trabalhos desempenhados por esse setor. Promover a aproximação entre a

organização e os públicos é a principal tarefa da ouvidoria, segundo Riche (2010, p.

180):

Construir pontes, tarefa hercúlea e primordial de ouvidorias públicas, que devem conhecer os anseios da sociedade, dar voz aos que não têm vez, aos invisíveis, promover o acesso à informação, como um dever do Estado e um direito do cidadão, com o intuito de transformar a cultura do segredo e da segregação na cultura da transparência e da democracia participativa.

A ouvidoria possui diferentes públicos, definidos de acordo com o perfil da

organização em que ela está inserida. Algumas atendem apenas o público externo,

enquanto outras servem de canal de comunicação também com o público interno.

Lima (2010, p. 153) identifica quatro grupos de públicos específicos com os quais a

ouvidoria pode se relacionar:

O primeiro grupo é composto por clientes, consumidores e cidadãos; o segundo, pela gestão da organização (presidente, secretário de Estado, gestor maior); o terceiro, pelos responsáveis por responder às demandas e manifestações (gestores de áreas, líderes); e o quarto, por funcionários e servidores em geral.

Conforme o autor, o terceiro grupo, através do qual são obtidas respostas e

são produzidos os posicionamentos da ouvidoria, desponta como peça chave do

67

processo e, por isso, o ouvidor deve cultivar e desenvolver esse relacionamento,

com ações direcionadas.

A ouvidoria também é canal entre esses líderes e a gestão estratégica da organização quando as manifestações exigem mediação. Nesse momento ela pode colaborar com o líder para demonstrar a necessidade de determinada intervenção em prol do cliente. (...) a aplicação de estratégias de comunicação dirigida fomenta o desenvolvimento de ações aproximativas que estreitam os laços, cria vínculos duradouros e fideliza o público (idem, p. 164).

O autor realizou uma pesquisa com ouvidores de instituições públicas de

Pernambuco cujos resultados revelaram prioridades dos profissionais quanto às

ações para estreitar e melhorar relacionamentos.

A pesquisa demonstrou que o cliente é a prioridade da ouvidoria em relação à importância, à força de trabalho dedicada e ao direcionamento de ações de relacionamento. Entretanto, as lideranças aparecem logo em seguida, ficando à frente do nível estratégico e do corpo funcional, em relação ao desenvolvimento de estratégias aproximativas, o que demonstra a consciência dos ouvidores em relação ao valor de estreitar relacionamentos com os líderes das organizações, os responsáveis pelas respostas que serão entregues aos clientes (idem, p. 162).

No Brasil, muitas ouvidorias ainda são confundidas com centrais de

atendimento em vez de serem identificadas como a última instância do

cidadão/consumidor em relação à organização. Aos ouvidores – além do desafio de

gerenciar relacionamentos - cabe lidar com esse cenário, orientando aqueles que

procuram o serviço sobre o papel do setor e sobre as formas de atendimento

adequadas ao seu problema, como o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC),

por exemplo (IASBECK, 2010; LIMA, 2010; RICHE, 2010).

3.4.4 A função educativa

Não cabe à ouvidoria tomar decisões gerenciais. Sua proposta é estabelecer

68

um canal de comunicação através do qual seja possível interpretar as demandas

recebidas. Mais do que isso, deve valorizar o ser humano, abrir novos horizontes e

educar o cidadão para o exercício da cidadania, conforme argumenta Riche (2010,

p. 181):

Uma das principais razões de existir de uma ouvidoria deve repousar na possibilidade de transformar a sociedade, diminuindo o déficit de cidadania, cuidando para que o cidadão passe a ser o sujeito e não o objeto de sua história. Como recurso de governança, apoiado nos princípios da ética e da transparência, a ouvidoria serve não somente para proteger o cidadão e esclarecê-lo sobre direitos e deveres, mas também para o surgimento de uma demanda social: cidadãos passam a ser mais exigentes relativamente à qualidade dos serviços prestados, tendo como contrapartida a oportunidade de melhoria e aperfeiçoamento desses serviços.

Iasbeck (2011) afirma que, além de educar para a cidadania, o ouvidor deve

auxiliar também na educação dos funcionários da organização para que haja

otimização do tempo e melhoria dos resultados.

A ouvidoria deve ser um lugar compreensível de comunicação, uma mídia no melhor sentido do termo: um lugar de intermediação e de transculturação das informações entre culturas diferentes. Por isso, o pessoal da ouvidoria pode e deve educar os funcionários das áreas demandadas a compreenderem e responderem as questões segundo o ponto de vista do receptor. E todo o investimento nesse sentido, seja em capacitação interna ou externa (estimulando os demais técnicos a se aprimorarem em cursos específicos) torna-se bastante compensador, considerando a abreviação significativa no tempo de resposta e a grande possibilidade de aumento da qualidade das informações prestadas (ibidem).

A ouvidoria deve orientar os funcionários da organização responsáveis pelo

repasse de informações para que respondam de forma rápida e consistente aos

pedidos demandados pelos cidadãos/consumidores. Para o autor, se os funcionários

não apresentarem competências comunicativas, o ouvidor deverá adequar a

linguagem burocrática e os jargões técnicos para que essas informações sejam

compreendidas por aqueles que procuram o serviço.

69

O autor acredita que as ouvidorias exercem também uma função política,

pelo fato de mediarem conflitos e interesses diversos.

O bom político é aquele que representa bem alguns interesses, defendendo-os junto aos demais que conflitam com ele, sabe condescender, recuar, avançar, negociar, promover acordos, abrir mão de algumas prerrogativas em face de outras, enfim, sabe articular relações num sistema eficaz de comunicação. Não são outros os requisitos de um bom ouvidor e/ou, numa perspectiva organizacional, de um “sistema de ouvidoria” (ibidem).

70

4 A OUVIDORIA VINCULADA À COMUNICAÇÃO

A Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul inovou e obteve resultados

positivos no ano de 2004 ao associar o setor de ouvidoria à diretoria de

comunicação. Neste estudo de caso, busca-se analisar de que forma as ações eram

desenvolvidas e como ocorria o trabalho em conjunto com o setor de comunicação.

As contribuições desse modo de operar para a melhoria da imagem do órgão, a

maneira como os trabalhos eram gerenciados, de que forma ocorria o processo de

interação entre a organização e a comunidade e a atuação da ouvidoria vinculada à

comunicação são questões que buscam respostas nesse trabalho. O resgate do

processo de implantação do modelo de ouvidoria na instituição auxilia na

contextualização de informações e na análise da evolução dos serviços prestados.

Foram realizadas entrevistas em profundidade com profissionais que fizeram

parte do processo de transição e implantação e que participaram da execução desse

modelo de ouvidoria. São eles a ex-diretora de Comunicação, Marlene Eggert, que

acompanhou as mudanças, o prefeito à época, Irineu Pasold, a atual coordenadora

da Ouvidoria, Maria Ausília Bento, o diretor da agência EDM Logos Comunicação,

Ely Diniz da Silva e o diretor da empresa Direct Channel, Cláudio Görresen Fricks. A

empresa desenvolveu um software que viabilizou a implantação do Programa de

Interação com a Comunidade (PIC), crucial para a aplicação de um novo modelo de

atendimento e de ação.

A hipótese levantada no início da pesquisa, de que ocorrem melhorias na

comunicação entre as instituições e seus públicos quando as referidas áreas atuam

de forma sinérgica, foi comprovada, como se vê a seguir.

71

4.1 ESTUDO DE CASO: PREFEITURA DE JARAGUÁ DO SUL

Localizada na região norte de Santa Catarina, a cidade de Jaraguá do Sul é

o terceiro polo industrial do Estado. O município foi colonizado por imigrantes

europeus, principalmente alemães, italianos e húngaros. Com 142 mil habitantes,

comporta uma população predominantemente de classe média. Apesar da força

industrial - com destaque para a produção de malhas, alimentos, motores elétricos,

componentes de informática e parapentes - há falta de mão de obra especializada.

A Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul apresenta características

específicas do mercado governamental e tem sua base de atuação na prestação de

serviços. A instituição é composta por 14 secretarias municipais e cinco autarquias,

somando 3.600 servidores, conforme informações da Diretoria de Comunicação da

instituição, fornecidas no segundo semestre de 2011.

4.1.1 Administração 2001-2004

O município foi administrado por Irineu Pasold no período de 2001 a 2004.

Ele nasceu em 9 de maio de 1945, em Massaranduba, cidade vizinha a Jaraguá do

Sul. Iniciou sua vida pública com serviços comunitários como presidente da diretoria

administrativa da Escola da Comunidade Evangélica, onde atuou por 13 anos.

Nesse período, também prestou serviços ao Hospital Evangélico de Jaraguá.

Graduado em Farmácia e Bioquímica com especialização em Análises

Clínicas pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), foi convocado, em

1993, para assumir a Secretaria Municipal de Saúde de Jaraguá do Sul, durante a

administração do prefeito Durval Vasel. Exerceu a função até abril de 1996; optou

por deixar o cargo para filiar-se ao Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e

72

disputar as eleições. Naquele ano, foi eleito vice-prefeito, ao lado do empresário

Geraldo Werninghaus, um dos fundadores da WEG.

Em 1999, Werninghaus sofreu um acidente fatal e Pasold assumiu o

comando da instituição. No ano seguinte, elegeu-se prefeito de Jaraguá do Sul e

administrou o município por mais quatro anos. Segue abaixo o resumo daquelas que

seriam as principais realizações da administração 2001-2004, segundo informações

relatadas em publicação produzida no último ano de sua gestão (SCHMITZ, 2004):

• Construção de quatro novos centros de educação infantil; ampliação e

reforma de outras vinte unidades escolares, com a construção de 95 novas

salas de aula e demais dependências;

• Na informática educativa, Jaraguá do Sul tornou-se referência nacional de

inclusão digital, acessível a todos os alunos do ensino fundamental;

• Foram construídos quatro novos postos de saúde, no total de 720 metros

quadrados, além da ampliação e reforma de outros 11 postos;

• O índice de mortalidade infantil caiu de 12 para 5,28 mortes em mil, taxa

menor que a média em países de Primeiro Mundo (6 em mil);

• Jaraguá do Sul tornou-se uma das melhores cidades brasileiras para a

terceira idade, além de contar com programas de proteção à criança e ao

adolescente;

• A prefeitura viabilizou a construção de quase 700 unidades de habitação de

interesse social;

• A água chegou a mais de 98% dos domicílios e o esgoto sanitário atendeu,

até o final de 2004, 50% da população, sendo a cidade catarinense com

maior índice de esgoto, à epoca;

73

• Chegou a contar com 53 áreas de lazer e esporte que são pontos de encontro

de crianças, jovens e das famílias, além do Calçadão, que foi reurbanizado;

• O prefeito Irineu Pasold foi homenageado com o troféu O Barriga Verde, pela

Editora Presença, devido ao alto índice de aprovação em sua gestão.

Em 2004, a EDM Logos Comunicação, com sede em Joinville (SC), maior

agência de comunicação do Sul do país, desenvolveu um projeto de comunicação

para o órgão, a pedido de Pasold. O então prefeito pretendia fazer com que a

população da cidade tivesse conhecimento do trabalho desenvolvido pela prefeitura.

O livreto Jaraguá do Sul, melhor para você (SCHMITZ, 2004), do qual foram

extraídas as informações da citação anterior, foi uma das ações de comunicação

planejadas, assim como a implantação do Programa de Interação com a

Comunidade (PIC), determinante para a aplicação do novo modelo de ouvidoria que

será detalhado a seguir.

4.2 DE “RECLAMADORIA” À OUVIDORIA

Antes de iniciar a análise do modelo de ouvidoria adotado pela Prefeitura de

Jaraguá do Sul em 2004, é necessário contextualizar de que forma e em que

condições a atividade era desempenhada anteriormente, durante os anos que

antecederam a mudança, e entender a proposta do Programa de Interação com a

Comunidade (PIC).

4.2.1 Ouvidoria vinculada à administração

74

Maria Ausília Bento trabalha há 16 anos na instituição e há oito atua na

coordenação da Ouvidoria. Ela possui 2º grau completo e cursou algumas fases de

Pedagogia. Sem saber precisar o ano em que a atividade começou a ser

desenvolvida, e sem a existência de documentos e registros que possibilitem tal

esclarecimento, a funcionária recorre à memória e recorda que no ano de 1994 o

órgão já oferecia o serviço de ouvidoria aos munícipes.

Em 2003, ano em que Maria Ausília assumiu a coordenadoria, o atendimento

feito via telefone era registrado em um formulário, em duas vias. Uma delas era

encaminhada ao setor correspondente à demanda e a outra, arquivada. No entanto,

não havia uma metodologia ou sistema para que as pendências e a finalização do

atendimento fossem acompanhadas pelo ouvidor, diz Maria Ausília:

O ouvidor fazia o atendimento e passava a demanda para alguém, que repassava para outra pessoa, e a Ouvidoria nem sabia quem era, não havia registro e cobrança. O formulário ficava arquivado. Os ouvidores não eram treinados para dar retorno aos cidadãos. Não existia uma estrutura nesse sentido.

Com um precário sistema de arquivo físico, fazia-se necessário consultar

folha por folha para localizar um atendimento. Consultas ao arquivo eram feitas

eventualmente, pois não era prática da época acompanhar cada caso. Ela explica

que a estrutura da Coordenadoria de Ouvidoria estava vinculada e era gerenciada

pela Secretaria Municipal de Administração:

A grande dificuldade no tempo da Secretaria de Administração era a falta de controle. Não tínhamos como dar retorno ao cidadão porque não havia um sistema para acompanhar os casos e cobrar respostas e soluções dos funcionários responsáveis por cada demanda.

75

4.2.2 Diretoria de Comunicação: novas perspectivas

Em 2003, a agência EDM Logos, com o apoio do Instituto de Pesquisa

Bonilha, realizou um levantamento da situação de todas as Secretarias Municipais

com o intuito de colher e selecionar informações para desenvolver um plano de

comunicação para prefeitura. De acordo com Ely Diniz da Silva, presidente da

agência, a empresa foi contratada por indicação de um grupo de empresários locais

para planejar ações visando à melhoria da comunicação do governo. Ele conta que:

Quando procurou a agência, a prefeitura buscava alinhamento de comunicação entre as diversas áreas, planejamento e consultoria de comunicação, treinamento de secretários para o relacionamento com a imprensa, campanha publicitária e outras ações para divulgar realizações junto à comunidade.

O plano de comunicação foi apresentado pela agência em junho de 2003,

com a proposta de um novo organograma. A agência indicou a criação de uma

Diretoria de Comunicação e propôs a vinculação da Coordenadoria de Ouvidoria ao

setor. Ocorreu, então, a estruturação do novo departamento, com o qual a Ouvidoria

passou a se relacionar diretamente. Ambos os setores eram subordinados ao

gabinete do prefeito. A estrutura física da Ouvidoria foi transferida da Secretaria de

Administração para um espaço próximo ao gabinete e junto à Comunicação.

4.2.3 PIC, Ouvidoria e Comunicação

Ely explica que os principais pontos do contrato firmado entre a agência e a

prefeitura compreendiam campanha de mídia (anúncios para TV e jornal), media

training com secretários e prefeito e consultoria para implantação de projetos da

área de comunicação, na qual se enquadrava o Programa de Interação com a

Comunidade (PIC).

76

O Programa de Interação com a Comunidade (PIC) é um canal permanente de comunicação com a população. Quando o cidadão faz uma reclamação, sugestão, denúncia ou solicita informação, a prefeitura dá o retorno com agilidade. Todos os contatos são cadastrados, facilitando e agilizando o acompanhamento, pelo setor envolvido, de todo o processo. O atendimento é feito pelo telefone e pessoalmente (SCHMITZ, 2004).

A fase de implantação do PIC, estruturado a partir da Ouvidoria por meio de

um software, deu-se no final do ano de 2003 e no início de 2004. Nesse período, a

equipe da Ouvidoria era composta por quatro ouvidores e uma coordenadora. Ely

fala sobre a implementação do PIC:

A implementação do PIC partiu de uma pesquisa que indicou os multiplicadores de comunicação, ou seja, funcionários pró-ativos em cada setor, que resolviam as pendências. Com a vinculação da Ouvidoria à Diretoria de Comunicação, esses funcionários foram convocados a atuar agregados ao PIC.

Nos “bastidores”, a equipe da EDM Logos Comunicação referia-se aos

funcionários pró-ativos1 com o termo “expeditos”, uma analogia a Santo Expedito,

conhecido como o santo das causas justas e urgentes. Cabe ressaltar que os

multiplicadores foram selecionados por meio de pesquisas internas aplicadas pelo

Instituto Bonilha, empresa de Curitiba (PR) especializada em pesquisas de opinião e

mercado. Por meio delas, foram identificados os funcionários que efetivamente

resolviam problemas e possuíam iniciativa.

A Direct Channel, também empresa curitibana, venceu a licitação para

desenvolver o sistema do PIC. Cláudio Görresen Fricks, diretor da empresa à época,

explica como surgiu a demanda para criar um software específico para uma

ouvidoria pública:

1 Esses agentes serão identificados ao longo do texto por meio dos termos “cabeças de setor”, “usuários de divisão”, “multiplicadores” e “expeditos”, conforme nomenclaturas repassadas pelos entrevistados.

77

O Instituto Bonilha estava realizando uma consultoria para melhoria do atendimento público da Prefeitura de Jaraguá. A partir do que foi levantado pela consultoria, foi especificado um sistema. Nós ganhamos a licitação e desenvolvemos o programa segundo essa especificação.

Cláudio destaca a agilidade no atendimento ao cidadão e o estabelecimento

de um único ponto de contato para atender as demandas como algumas das

vantagens do software. O profissional também discorre sobre as características e

funcionalidades do sistema do PIC, desenvolvido especificamente para a Prefeitura

de Jaraguá do Sul. Ele conta que

Não tinha um nome específico. Era um sistema de CRM (Customer Relationship Management) com um banco de conhecimento onde constavam diversas informações sobre a prefeitura. Todas as secretarias estavam interligadas ao sistema. Quando uma dúvida não era respondida pela base de conhecimento, a secretaria responsável era acionada a dar uma resposta. Quando eram feitas solicitações de serviço, a secretaria envolvida tinha que dar uma resposta, em um prazo determinado, sobre a data em que aquele serviço seria executado.

As secretarias municipais participavam do PIC através dos seus setores,

com um responsável em cada departamento de cada secretaria encarregado pelo

recebimento e encaminhamento das demandas do seu setor. Foram determinadas

pessoas-chave em cada departamento que iriam participar do PIC. Elas possuíam

acesso ao sistema em seus computadores e recebiam o imput das tarefas que

deveriam realizar. Houve aquisição de novos computadores para a Ouvidoria, com

capacidade para rodar o software.

Ely Diniz destaca que o PIC surgiu como um elemento agregado ao plano de

comunicação desenvolvido para a prefeitura. “O PIC foi incorporado às ações de

comunicação, como uma forma de reforçar o relacionamento com a comunidade”,

explica.

78

4.3 A COMUNICAÇÃO NA GESTÃO DE UM NOVO MODELO DE OUVIDORIA

As manifestações dos que acorrem à ouvidoria, independentemente de sua natureza, sempre se traduzem em sinais de alerta, desafios e momentos intensos de reflexão. Além disso, o respeito à diversidade, à opinião do outro, à necessidade do outro é essencial para retirar o cidadão da condição de demandante/reclamante e alçá-lo à condição de consultor habilitado e competente da instituição. Portanto, ao mesmo tempo em que viabiliza o controle social, a democracia participativa, a ouvidoria é uma ferramenta de gestão (RICHE, 2010, p. 181).

Marlene Eggert, formada em Jornalismo e com especializações em

marketing e comunicação interna, ingressou na Prefeitura de Jaraguá do Sul em

2004 como diretora de Comunicação por meio de contatos com a agência EDM

Logos. “A agência precisava de alguém na prefeitura para fazer a ponte e

intermediar os trabalhos de comunicação planejados. Ao chegar lá, passei a

coordenar a estrutura de assessoria de imprensa, composta por um fotógrafo e dois

jornalistas. Também era encarregada da parte de eventos, eram muitas as

inaugurações na época”, comenta.

Durante o período em que ocupou o cargo, Marlene participava de reuniões

semanais em Joinville com os profissionais da agência e, nesses dias, coordenava a

equipe da prefeitura por telefone. A jornalista relata que trabalhava em conjunto com

a equipe da EDM Logos.

Quando iniciou suas atividades no órgão, o software para gerenciar os

trabalhos da Ouvidoria já havia sido desenvolvido e precisava ser colocado em uso.

Marlene participou do processo de implantação e adaptação. Ela acompanhava

diariamente a Ouvidoria para saber como estavam os trabalhos e os atendimentos. A

Diretoria de Comunicação coordenava o setor, mas havia uma estrutura própria para

a Ouvidoria.

79

De acordo com Marlene, o PIC exigiu mais comprometimento dos

funcionários e, de certa forma, reorganizou a comunicação interna, disseminando o

espírito do trabalho em equipe, com o estabelecimento de prazos. A ex-diretora de

Comunicação acredita que existem barreiras para aceitar o novo, mas afirma que os

funcionários se envolveram e houve engajamento no atendimento aos cidadãos

naquele ano.

Marlene aponta os objetivos do PIC: “dar mais agilidade e transparência ao

levantamento e à solução das necessidades da comunidade. Fazer com que o

cidadão não se sentisse abandonado em suas denúncias, reclamações e

sugestões”. Antes da implantação do programa, não havia registro das demandas

que chegavam à Ouvidoria, como ela explica:

Até então, a Ouvidoria fazia o trabalho sem muito planejamento. Não tinha registros consistentes. Com esse sistema, se alguém da comunidade ligava, registrava-se no sistema, que gerava automaticamente uma atividade para uma secretaria, e gerava também um prazo. Ficou determinado que a prefeitura não poderia ficar mais de cinco dias úteis sem dar um retorno para o contribuinte. Foram feitas muitas reuniões com pessoas de todas as áreas para explicar o fluxo do sistema, como iria funcionar, porque um dependia do outro, porque era importante cumprir prazos etc.

Com o novo software, o ouvidor registrava informações do atendimento

através de opções que permitiam selecionar a área afim, o tipo de problema e o

prazo para resolução; o sistema automaticamente gerava a demanda. O sistema do

PIC possibilitou a emissão de relatórios.

Marlene explica que foram feitos treinamentos para o uso do sistema com os

ouvidores e com os multiplicadores. Esses disseminavam a informação em seus

setores de forma geral. A capacitação foi realizada em duas etapas: esclarecimentos

sobre o PIC, seus objetivos e sua aplicação e aulas sobre a parte operacional do

software. O processo de transição pelo qual passou a Ouvidoria, vinculando-se à

80

Comunicação, foi marcado por um intenso trabalho de conscientização do público

interno.

Foi necessário estimular o envolvimento de todos, motivar os servidores a

aderir, como explica Marlene, que buscou treinar os ouvidores para uma nova

proposta de comunicação. A ex-diretora elaborou um manual para os atendentes. O

material orientava sobre a forma adequada de atender. Ser ouvidor não era uma

função muito simpática internamente, segundo ela, pelo fato de serem feitas

cobranças aos funcionários.

Ainda segundo Marlene, os procedimentos do setor foram modificados e o

que antes era uma “reclamadoria” transformou-se efetivamente em uma ouvidoria.

Riche (2010, p. 181) discorre sobre a cultura de participação em ouvidorias públicas:

A proposta de uma ouvidoria pública, por trabalhar constantemente com a insatisfação humana e com o desconhecimento dos cidadãos sobre os seus direitos e deveres, é justamente a de transformar a cultura da reclamação em uma cultura de cooperação e participação. Nessa cultura, o bom senso, a ética, o respeito à diversidade e o diálogo têm prevalência nas relações entre as partes envolvidas. Deve ser um órgão de natureza mediadora, sem caráter deliberativo, executivo ou judiciário, no qual prevaleçam os princípios da equidade, da transparência e da autonomia da vontade. O intuito é, também, garantir os direitos do cidadão, com base nos princípios constitucionais que regem a administração pública.

Com a mudança na Prefeitura de Jaraguá do Sul, o cidadão passou a ter um

atendimento mais ágil e cortês, na opinião da ex-diretora de Comunicação. “Só

permaneceu o atendimento via telefone. O sistema fez com que todos os

procedimentos mudassem e fosse possível acessar a informação de forma mais

precisa”, comenta.

Antes do PIC, o atendimento da Ouvidoria era feito através do telefone 156 –

ligação com custo - com uma linha apenas, o que fazia com que o ramal ficasse

ocupado com frequência. A partir do PIC, foi implantado um 0800 – ligação gratuita –

81

com mais ramais, melhorando a acessibilidade.

Em 2004, foi estabelecido o prazo de cinco dias úteis para resolução de

problemas. Nos anos seguintes, o período para retorno foi estendido para sete dias

úteis. Atualmente, os ouvidores não informam um prazo, mas, em média, a solução

pode demorar até 10 dias úteis, como explica Maria Ausília. A coordenadora

esclarece que seu trabalho consistia, e ainda consiste, em cobrar das pessoas

diretamente ligadas ao PIC o andamento das pendências, além de realizar também

o trabalho direto com o público por meio dos atendimentos.

Um guia resumido elaborado por ela está à disposição no setor, em uma

folha no formato ofício, para consulta por parte dos atendentes. Nele, consta que “a

Ouvidoria é um instrumento de comunicação entre os poderes e a sociedade, com

foco no cidadão, que age como braço da Administração no atendimento das

demandas, criando, assim, credibilidade e fortalecimento da cidadania”. O folheto

também elenca algumas atribuições do ouvidor:

• Estabelecer canal permanente de comunicação entre a prefeitura e os

cidadãos para o recebimento de reivindicações e sugestões;

• Avaliar a procedência das solicitações e encaminhá-las aos setores

competentes para o devido atendimento;

• Acompanhar as providências tomadas e cobrar soluções;

• Dar o devido retorno ao interessado de forma ágil e desburocratizada e tomar

conhecimento do seu nível de satisfação;

• Agir com autonomia;

• Saber negociar e administrar conflitos;

• Agir de forma ética, imparcial e transparente;

82

• Ter boa comunicação e relacionamento interpessoal;

• Respeitar o sigilo profissional.

Iasbeck (2011) destaca algumas características que julga indispensáveis ao

profissional:

O ouvidor possui algumas peculiaridades que o destacam dos demais profissionais: o próprio cargo o investe de uma função representativa de grande ascendência, uma vez que funciona não apenas como porta-voz do cliente, mas também como porta-voz da organização. Por isso, por assumir essa dupla representatividade, ele encarna a melhor metáfora do acordo. Evidentemente, o profissional escolhido para o cargo precisa reunir características que o tornem positivamente reconhecível e confiável por parte da empresa e dos clientes, do patrão e do empregado. Dentre tais características, o conhecimento técnico da organização, o comportamento ético, a ponderação, a competência crítica, a assertividade de suas intervenções, a predisposição a ouvir e – sobretudo – a capacidade de responder levando em consideração o que foi ouvido destacam-se sobre outras competências mais óbvias e muitas vezes dispensáveis, tais como formação acadêmica, vinculações político-partidárias, idade, “tempo de casa”, apresentação pessoal etc. Quando as competências secundárias – ou dispensáveis – se sobrepõem àquelas que se localizam na integridade e no caráter do ouvidor, é possível que sua atuação fique comprometida, sob suspeita, não seja capaz de promover acordos, nem venha a merecer credibilidade pelas partes envolvidas em conflitos ou situações de trocas amistosas.

Em alguns casos, a coordenadora contata diretamente o técnico ou fiscal

encarregado da execução, quando há um problema que não foi resolvido. Ela

comenta que evita fazer isso, pois o procedimento padrão é lidar apenas com o

“cabeça de setor”, mas há exceções. Segundo Maria Ausília, eram cerca de 70

usuários de divisão em 2004, número aproximado que se mantém atualmente. A

coordenadora relembra que acompanhou fiscais e técnicos durante a execução de

trabalhos por inúmeras vezes.

No contexto de uma ouvidoria, a distinção precisa prevalecer sobre a tendência à pasteurização das diferenças. Cada cliente, consumidor ou cidadão que a procura é único em suas preocupações, possui

83

peculiaridades que deseja ver reconhecidas, consideradas e respeitadas. Por isso, a atitude de uma ouvidoria precisa primar sempre pela valorização dessas diferenças, ainda que a inteligência organizacional a leve a padronizar respostas como medida de economia de tempo e aumento da produtividade. Mesmo que as respostas sejam padronizadas, é necessário que a comunicação dessas respostas atente para as peculiaridades de quem a demandou. Sempre haverá uma forma de individualizar um procedimento padrão, de explicitar o reconhecimento e o respeito que o outro espera e merece. Não se trata apenas de desenvolver competência de customizar respostas, mas, antes de tudo, desenvolver sensibilidade para perceber as tais diferenças (IASBECK, 2011).

Na opinião de Maria Ausília, o sistema on-line pôs fim à parte burocrática e a

definição de responsáveis nas secretarias auxiliou no processo. “Mudou o

atendimento, é dado retorno tão logo a secretaria responsável pela demanda envia a

resposta. Tornou-se possível monitorar as pendências e entrar em contato com o

encarregado por ela, quando há demora”, comenta.

Depois de solucionado o pedido - ou detectado que não há solução - o

encarregado do setor ao qual a solicitação foi encaminhada posta a resposta via

sistema. Na sequência, a Ouvidoria estabelece contato com o cidadão. Com o PIC,

tornou-se possível fazer buscas por nome, rua, telefone, endereço, secretaria etc. A

coordenadora da Ouvidoria destaca algumas contribuições advindas da implantação

do sistema.

Hoje temos o histórico do atendimento do cliente, sabemos o que ele já pediu anteriormente, e isso pode ajudar no atendimento e na abordagem. Desse modo, passamos credibilidade e confiança para quem está do outro lado da linha. Temos condições de atender bem e de consultar informações relacionadas à pessoa enquanto falamos com ela.

Maria Ausília fala ainda sobre a sua percepção quanto à satisfação do

contribuinte e cidadão a partir da implantação do PIC. “Mesmo que não seja a

resposta esperada, ele se sente satisfeito, porque recebeu atenção”, diz.

A ouvidoria é, pois, um polo receptivo, um lugar a ser procurado por

84

quem tem a iniciativa da resolução do problema. Por isso mesmo, este acolhe a demanda, trata-a convenientemente segundo critérios éticos, legais, regulamentares, técnicos. Não pode perder a dimensão humanista que esse tratamento exige, sempre e em qualquer situação, por envolver pessoas sensibilizadas negativamente por problemas (IASBECK, 2010, p. 18).

Para Maria Ausília, a função da Ouvidoria em um órgão público é atender o

público. “Somos canal direto entre a população e a prefeitura. O melhor canal.

Precisa haver bom atendimento, é preciso haver diálogo com a comunidade e não

ter medo da reclamação, mas perceber nela uma oportunidade para melhorar”.

4.3.1 A campanha de lançamento do PIC

Ely Diniz explica que a participação da EDM Logos no planejamento do

modelo de ouvidoria da Prefeitura de Jaraguá do Sul foi de apoio à iniciativa do

órgão de aperfeiçoar a comunicação. A empresa organizou o evento de lançamento

do PIC, desenvolveu estratégias de comunicação e produziu materiais de apoio e

divulgação (slides de apresentação, cartilhas, bottons etc). Ele conta que

O lançamento ocorreu primeiramente para os “expeditos”, com apresentação do projeto do PIC e palestra motivacional do Eloi Zanetti - criador da analogia entre o Santo Expedito e o trabalho dos servidores agregados ao programa. Em seguida, o projeto foi apresentado a todos os funcionários por folhetos, cartazes e edições de jornal mural.

Bottons com o nome PIC foram distribuídos durante o lançamento. Todas as

pessoas que trabalhavam direta e indiretamente com o PIC usavam o adereço,

segundo a ex-diretora de Comunicação. A coordenadora da Ouvidoria relembra que

as pessoas sentiam orgulho de fazer parte do programa. Os multiplicadores não

recebiam remuneração pelo trabalho extra e era necessário demonstrar à equipe o

valor da atividade desempenhada. O grupo da comunicação desenvolveu ações com

85

esse intuito. Marlene comenta que mensalmente eram realizadas reuniões com a

oferta de um almoço ou algo do gênero. Buscava-se reconhecer o trabalho e o

comprometimento dos funcionários do PIC.

Ely fala sobre o trabalho da equipe: “a Comunicação promoveu a motivação

com palestras, treinamentos, divulgação, reuniões e reconhecimentos do trabalho

dos multiplicadores”. Marlene explica que o PIC também foi lançado na imprensa,

com o objetivo de mostrar à comunidade que a prefeitura estava aberta a

reclamações, sugestões e denúncias.

4.3.2 Atuação integrada entre Comunicação e Ouvidoria

A Ouvidoria era utilizada estrategicamente como instrumento de marketing.

Usava-se o PIC como uma mídia, para divulgar informações, como campanhas de

vacinação, por exemplo. “Os atendentes repassavam informação de interesse.

Faziam isso de forma direcionada, divulgando algo específico sobre o bairro do

cidadão que procurava a Ouvidoria. Isso era possível pelos dados cadastrados”,

explica Marlene.

Campanhas de vacinação, entregas de loteamento, festas nas comunidades

e concursos foram citados como exemplos de informações que eram inclusas no

sistema. Os multiplicadores têm a possibilidade de criar um título e disponibilizar

informações que poderão ser acessadas pelos ouvidores. A ex-diretora de

Comunicação exemplifica:

Se uma pessoa reclamava da falta de asfaltamento na sua rua, encaminhava-se a reclamação à Secretaria de Obras e, durante o atendimento, informava-se sobre ruas asfaltadas recentemente nos bairro do cidadão ou nas proximidades, ou mesmo o número de ruas atendidas na cidade. A equipe de comunicação também repassava aos ouvidores informações para divulgação ao final do atendimento.

86

Na opinião da ex-diretora, houve melhorias no relacionamento da prefeitura

com a comunidade a partir da integração entre os dois setores:

A vantagem da Ouvidoria ligada à Comunicação é que se tem acesso a tudo o que o cidadão fala, reclama, pede, sugere, e é possível direcionar ações de comunicação nesse sentido. Até a comunicação interna melhora. A Comunicação, sabendo o que acontece, pode proporcionar interação entre os setores e estimular o comprometimento dos funcionários.

Ela comenta que, à época, a partir de uma demanda identificada na

Ouvidoria, eram criados folhetos explicativos e mensagens para o rádio, organizados

eventos e ações de relações públicas, além de serem enviadas sugestões de pauta

à imprensa. Marlene julga o modelo vantajoso, se implantando com seriedade e com

real suporte dos responsáveis pela comunicação, pois oferece agilidade na solução

dos problemas. Com base nas informações da comunidade, desenvolviam-se

algumas ações específicas de comunicação.

O PIC dava o start para uma ação. Por exemplo, em um vídeo institucional produzido, deu-se ênfase a alguns assuntos recorrentes na Ouvidoria, questionados pelos cidadãos, como asfalto. Mostramos o que a prefeitura tinha feito e estava fazendo na cidade. Muitas informações divulgadas no vídeo foram selecionadas a partir de demandas recebidas pelo PIC.

A comunicação trabalha com todos os públicos, e a ouvidoria também. Há

convergência na linguagem e nos procedimentos dessas duas áreas. Marlene

acredita que a ouvidoria deve ser explorada como ferramenta de comunicação da

melhor forma possível, de modo a complementar outras ações. Ações de

comunicação eram articuladas ao trabalho da Ouvidoria. Em 2004, a prefeitura

possuía um convênio com o Centro Universitário de Jaraguá do Sul (UNERJ),

através do qual cerca 20 universitários realizavam estágio na instituição. De acordo

com Maria Ausília,

87

esse pessoal estava sem ter muita ocupação. Durante cerca de dois meses, foi desenvolvido um trabalho que consistia em ir de casa em casa para divulgar à população ações da prefeitura. Primeiramente, foi feito um mapeamento das realizações e obras da prefeitura na cidade. Foi uma ação relacionada ao PIC. São poucos os que se dispõe a reclamar. A maioria descontente não liga. A ideia era ouvir essas pessoas que não ligavam. Perguntava-se se estavam satisfeitas. Era uma espécie de ouvidoria pró-ativa, interativa.

A comunicação foi fundamental para a adoção de novas práticas. Naquele

período, o prefeito passou a visitar as comunidades que apresentavam maior índice

de reclamações na Ouvidoria. Na opinião de Pasold,

a ouvidoria foi e é um trabalho e um serviço importantíssimo na condução de um município ou de qualquer órgão público. Sentia isso nos contatos com os conselhos e associações comunitárias. Com a ouvidoria, ampliam-se esses contatos. As visitas às comunidades são outra atitude necessária para bem administrar a coisa pública. Quando eu não podia ir, mas se fazia necessária a presença da administração, secretários ou outros responsáveis faziam este contato com a intenção de resolver problemas ou de encontrar soluções com a ajuda da comunidade.

Segundo o ex-prefeito, a proposta era disseminar a ideia de que a ouvidoria

não é apenas uma “reclamadoria”, mas também um canal para sugestões. A

coordenadora da Ouvidoria fala sobre a participação da equipe de comunicação.

A Diretoria de Comunicação era o nosso braço direito. Quando havia muitas solicitações pendentes, ela cobrava e fazia a ponte com os secretários e, principalmente, com o prefeito, para resolver. A Ouvidoria entrava em contato com a Comunicação e o departamento ajudava a resolver os problemas.

O engajamento do público interno no aperfeiçoamento dos serviços

prestados é apontado por Maria Ausília como um ponto positivo, assim como a

oportunidade que os ouvidores tiveram para trabalhar as informações de diferentes

formas. Ela entende a implantação do PIC e sua forma de utilização como produto

de uma visão estratégica de comunicação tida à época:

88

Com o PIC e o apoio da Comunicação, o nosso trabalho e a satisfação da população melhorou 90%, porque tudo passou a ser feito via sistema. O problema era encaminhado e sempre havia um responsável em cada setor, uma pessoa treinada para receber a demanda. A Comunicação estava a par de tudo, usava as informações que chegavam à Ouvidoria para desenvolver estratégias de atuação, no sentido de esclarecer algo à população ou mesmo ajudar a solucionar o problema.

A coordenadora pontua que a Ouvidoria, quando vinculada à Comunicação,

era tratada como um canal estratégico de comunicação com a comunidade. Na sua

opinião, “ouvidoria é comunicação” e não faz sentido não somar esforços em uma

atuação conjunta:

Não há pontos fracos quando se fala em aliar a Ouvidoria à Comunicação. Essa articulação só tem a somar. Acho que ouvidoria tem que ser ligada à comunicação. Naquela época tinha-se uma visão de conjunto e o responsável da época brigava pela comunicação. Atualmente não é mais assim.

Maria Ausília complementa com a observação de que a ligação com a

Comunicação só será válida se assumida de forma estratégica, como acredita que

ocorreu em 2004.

A EDM Logos prestou serviços à prefeitura no período em que a ouvidoria e

a comunicação atuaram em conjunto. O presidente da agência de comunicação

acredita que a ouvidoria de um órgão público é um fator fundamental para o

desenvolvimento do espírito de cidadania, sendo a voz de resistência do cidadão

comum. Ele explica porque defende que os órgãos públicos devem aliar a ouvidoria

à comunicação. “É a forma mais simples e rápida de os administradores públicos

saberem se a comunidade está satisfeita ou não com as ações realizadas.”

4.3.3 Programas desenvolvidos a partir do PIC

O PIC envolvia ações externas, como o “Pergunte ao Prefeito”. Marlene

89

detalha o projeto:

Era um programa de rádio regular com o prefeito, ao vivo, aos sábados pela manhã, no qual ele respondia às solicitações feitas à Ouvidoria, dava satisfação sobre o que foi feito. As perguntas recebidas durante a semana eram gravadas por telefone. Essa ação era uma extensão do PIC, com o prefeito ouvindo a população. O PIC gerou uma série de outras ações de comunicação. Vimos que eram estratégias de fortalecimento do PIC.

Outros projetos surgiram no rastro do PIC. O programa “Prefeitura nos

Bairros” consistia em um mutirão para resolver todas as solicitações de uma

determinada comunidade, feito com base nas demandas dos relatórios da Ouvidoria.

O programa Nosso Bairro Bota Fora promove a saúde pública, através da conscientização ambiental e de ações de recolhimento de matérias e utensílios reutilizáveis (vidro, metal, plástico, papel, móveis, além de todo o lixo acumulado em residências e terrenos baldios), visando combater insetos e roedores. Foram envolvidos 37 bairros, em mais de 31 mil domicílios, com coleta superior a três toneladas de resíduos sólidos (SCHMITZ, 2004).

O 0800 da Ouvidoria era divulgado nas comunidades por meio de banners,

em eventos.

4.4 OUVIDORIA E COMUNICAÇÃO NA PREFEITURA EM 2011

De acordo com Maria Ausília, a Coordenadoria de Ouvidoria permanece

vinculada à Diretoria de Comunicação e ligada à Chefia de Gabinete no

organograma, mas não há interação e integração entre os departamentos como

houve no ano de 2004. A coordenadora explica que, de forma geral, a relação se

resume ao repasse de releases. Ela comenta sobre mudanças políticas resultantes

das trocas de gestão que fazem com que a forma de atuação dos diversos setores

da prefeitura seja alterada.

90

A funcionária lamenta que o modelo de ouvidoria desenvolvido em 2004,

último ano da gestão de Irineu Pasold, não tenha sido adotado pelas administrações

posteriores, e acredita que o suporte que os ouvidores recebiam da área da

Comunicação auxiliava no trabalho e fazia com que o serviço fosse mais divulgado e

conhecido pela população e pelos veículos de comunicação da região. À época,

esses costumavam depor contra a Ouvidoria, por meio de matérias negativas.

O trabalho desenvolvido pela equipe de Comunicação esclareceu alguns

aspectos, como o de que o departamento não era o executor das tarefas solicitadas,

mas o responsável pelo início do processo e por seu acompanhamento. “Os públicos

devem entender que, quando a ouvidoria responde, ou quando ela providencia

respostas, as soluções encontradas são de responsabilidade de toda a organização

e não só dela, da ouvidoria” (IASBECK, 2011).

Uma prática estimulada em 2004 pela Diretoria de Comunicação ainda

reverbera nos dias de hoje no departamento de Ouvidoria, apesar de não ser

incentivada. Maria Ausília fala sobre a realidade da Prefeitura de Jaraguá do Sul no

ano de 2011 e faz algumas observações:

De vez em quando, repassamos informações que recebemos por releases para os cidadãos que telefonam. É forma de contribuir para a disseminação de informações de interesse público. Isso houve muito naquela época em que a Ouvidoria estava ligada à Comunicação. Hoje, não há esforços do departamento de comunicação nesse sentido, não há uma sintonia. O sistema não é mais abastecido frequentemente com informações importantes de cada secretaria, a Comunicação não trabalha nesse sentido de cobrar e motivar. Falta visão. Algumas autoridades não veem a Ouvidoria como um canal de comunicação e aproximação.

Os relatórios gerados pelo sistema são uma ferramenta que auxilia na

gestão da prefeitura. A coordenadora explica que há encaminhamento periódico às

autoridades, prática adotada em 2004. Eventualmente, o gabinete solicita relatórios

91

para que possa apresentá-los em reuniões e cobrar soluções dos secretários.

A Secretaria de Obras está entre as mais solicitadas, conforme relatado.

Maus tratos a idosos, patrolamento - passar a máquina em ruas de barro - colocação

de macadame – tipo de pavimento para pistas de rodagem - buracos em ruas, trocas

de lâmpadas, brigas entre vizinhos, podas de árvores, “bocas de lobo” e cães

abandonados são reclamações comuns.

Em 2011, são os secretários municipais que definem os multiplicadores, e o

treinamento resume-se a uma espécie de “aula particular” ao novo integrante,

explica Maria Ausília. A equipe é formada por cinco ouvidores e uma coordenadora e

aproximadamente 70 pessoas têm acesso ao sistema nas secretarias. A

coordenadora faz um comentário em tom de desabafo:

Hoje a Ouvidoria não conta com o respaldo e não tem o apoio da Comunicação para conscientizar aqueles que abrem o sistema, tampouco para orientar essas pessoas a abastecerem com informações. Com o sistema, temos a chance de compartilhar e de ter conhecimento de tudo o que o povo precisa saber, mas os atuais funcionários não têm a cultura de disponibilizar informações, como naquela época. É uma pena, porque a Comunicação era um instrumento para a Ouvidoria, e vice-versa. Os cidadãos recebiam esclarecimentos e informação de interesse público. Hoje não é mais assim e há perdas para a imagem da instituição.

O Departamento de Ouvidoria responde a alguns processos e batalha pela

gravação das ligações. “É uma garantia de que o pedido foi encaminhado”, comenta

Maria Ausília.

92

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa torna-se relevante na medida em que busca a compreensão

do papel e das funções da ouvidoria sob a gestão da comunicação. O estudo do

modelo adotado pela Prefeitura de Jaraguá do Sul no ano de 2004 demonstrou que

aliar a ouvidoria à comunicação é uma opção viável e positiva.

As entrevistas em profundidade permitiram investigar com maior

detalhamento a realidade da comunicação da prefeitura, as dificuldades enfrentadas

e as estratégias adotadas no tocante a esse processo. No entanto, os resultados da

investigação não são conclusivos, haja vista que a proposta é apenas aprofundar

conhecimentos e revelar novos olhares sobre o tema. Tem-se a consciência de que

o assunto começa a ser explorado e necessita ser debatido à exaustão para

amadurecimento de ideias.

O levantamento de informações oferecido pela pesquisa poderá servir como

instrumento de gestão e de tomada de decisão profissional. Diminuir as áreas de

incerteza sobre o tema e revelar a importância desse modelo de trabalho para

órgãos públicos são contribuições da pesquisa em questão.

93

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