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UNIVERSIDADE REGIONAL INTEGRADA DO ALTO URUGUAI E DAS MISSÕES CÂMPUS DE FREDERICO WESTPHALEN PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS MESTRADO EM LETRAS ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM LITERATURA COMPARADA LEITURA E ENSINO DE LITERATURA CONTEMPORÂNEA NO ENSINO MÉDIO: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE LIVROS DIDÁTICOS DO PNLD 2015 Mestrando: Jaime André Klein Orientadora: Profa. Dra. Luana Teixeira Porto Frederico Westphalen, agosto de 2015.

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UNIVERSIDADE REGIONAL INTEGRADA DO ALTO URUGUAI E DAS MISSÕES

CÂMPUS DE FREDERICO WESTPHALEN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

MESTRADO EM LETRAS

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM LITERATURA COMPARADA

LEITURA E ENSINO DE LITERATURA CONTEMPORÂNEA NO

ENSINO MÉDIO: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE LIVROS

DIDÁTICOS DO PNLD 2015

Mestrando: Jaime André Klein

Orientadora: Profa. Dra. Luana Teixeira Porto

Frederico Westphalen, agosto de 2015.

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Jaime André Klein

LEITURA E ENSINO DE LITERATURA CONTEMPORÂNEA NO

ENSINO MÉDIO: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE LIVROS

DIDÁTICOS DO PNLD 2015

Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa

de Pós-graduação em Letras – Mestrado em Letras,

área de concentração em Literatura Comparada –,

sob a orientação da Profa. Dra. Luana Teixeira

Porto, como requisito parcial para a obtenção do

título de Mestre em Letras.

Frederico Westphalen, agosto de 2015

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UNIVERSIDADE REGIONAL INTEGRADA DO ALTO URUGUAI E DAS MISSÕES

CÂMPUS DE FREDERICO WESTPHALEN

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS

MESTRADO EM LETRAS

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM LITERATURA COMPARADA

A Comissão Examinadora, abaixo assinada,

aprova a Dissertação de Mestrado

LEITURA E ENSINO DE LITERATURA CONTEMPORÂNEA NO

ENSINO MÉDIO: UM OLHAR CRÍTICO SOBRE LIVROS

DIDÁTICOS DO PNLD 2015

elaborada por

Jaime André Klein

como requisito parcial para a obtenção do grau de

Mestre em Letras

COMISSÃO EXAMINADORA

___________________________________________________

Profa. Dra. Luana Teixeira Porto – URI/FW

(Orientadora/Presidente)

___________________________________________________

Profa. Dra.Gabriela Fernanda Cé Luft –IFRS

(1º arguidora)

___________________________________________________

Profa. Dra. Ana Paula Teixeira Porto – URI/FW

(2ª arguidora)

___________________________________________________

Profa. Dra. Maria Thereza Veloso – URI/FW

(Suplente)

Frederico Westphalen, 02 de setembro de 2015.

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SUMÁRIO

RESUMO ................................................................................................................................... 6

INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 8

1. A LITERATURA E A FORMAÇÃO DO LEITOR ....................................................... 12

1.1 O leitor e a leitura de literatura no Ensino Médio ............................................................. 12

1.2. O ensino de literatura: o texto literário na sala de aula ..................................................... 17

1.3 A literatura nos norteadores curriculares para o Ensino Médio ......................................... 24

1.3.1 O espaço do texto literário nos PCNEM e PCN+ ............................................................ 24

1.3.2A contemplação da literatura nasOCNEM ....................................................................... 30

2. O LIVRO DIDÁTICO COMO FERRAMENTA PARA ESTUDO DA LITERATURA

NO ENSINO MÉDIO ............................................................................................................. 35

2.1. Breve Histórico do Livro Didático no Brasil..................................................................... 35

2.2.O Fundo Nacional de Desenvolvimentoda Educação (FNDE) eos programas

dedistribuição de livros para as escolas públicas brasileiras– PNLD e PNLEM. .................... 39

2.2.1. O Programa Nacional do Livro Didático - PNLD .......................................................... 40

2.2.2. O PNLEM - Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio .................................. 41

2.3. O livro didático e o ensino de literatura no Ensino Médio ................................................ 42

3. ENSINO DE LITERATURA NO LIVRO DIDÁTICO: PNLD 2015 ...........................51

3.1. A construção de um roteiro de análise do livro didático ................................................... 51

3.1.1. A delimitação dos objetos .............................................................................................. 51

3.1.2. A escolha de um tópico temático para análise ................................................................ 52

3.1.3. Um roteiro para avaliação de livro didático de literatura ............................................... 54

3.2 Livros didáticos em análise: obras do PNLD 2015 ............................................................ 56

3.2.1Português: língua e cultura: a literatura como pretexto para ensino da língua ................ 56

3.2.2Português: Vozes do mundo -literatura, língua e produção de texto..............................67

3.2.3 Português: linguagens em conexão.................................................................................80

3.2.4 Português: linguagens: uma atualização desatualizada..................................................99

3.3 Livros didáticos do PNLD 2015: fragilidades, potencialidades e possibilidades.............117

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CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................124

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 127

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RESUMO

Esta pesquisa se constitui de reflexões crítico-teóricas sobre a importância da leitura e o

ensino de literatura e sua eficácia na formação de leitores no Ensino Médio através de um

recurso pedagógico muito usual na prática escolar, o livro didático. Através da análise de

livros didáticos oferecidos à escola pública brasileira do Ensino Médio para o ensino de

literatura, objetiva-se identificar o potencial desse recurso didático para a formação do leitor

da prosa contemporânea brasileira bem como apontar suas carências para esse fim, além de

refletir sobre possibilidades de ensino de literatura e a leitura do texto literário. Para a análise,

foi elaborado um roteiro de observação e foram selecionados livros didáticos do PNLD 2015:

Português: língua e cultura,de Carlos Alberto Faraco; Português: Vozes do mundo -literatura,

língua e produção de texto, de Lília Santos Abreu-Tardelli, Lucas Sanches Oda, Maria Tereza

Arruda Campos e Salete Toledo; Português: linguagens em conexão,de Maria da Graça Sette,

Mária Antônia Travalha e Maria do Rozário de Barros; e Português: linguagens, de William

Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães. A partir do exame dos livros didáticos, que foi

amparado em estudos críticos sobre literatura e ensino de literatura, de autores como Antônio

Candido (1995), Jaime Ginzburg (2012), Marisa Lajolo (1982) (1985), Lígia Chiappini

Moraes Leite (1983) (2005), Vera Teixeira de Aguiar e Maria da Glória Bordini (1993),

Regina Zilberman (1988) (1991) (2005), entre outros, constatou-se que todos os materiais

analisados apresentam uma proposta pedagógica que atende aos documentos oficiais que

norteiam o ensino brasileiro, além de contemplarem indicações de material suplementar que

podem ajudar tanto o aluno quanto o professor na construção do conhecimento. No entanto,

não apresentam de forma suficiente atividades didáticas para a leitura da literatura brasileira

adequadas para potencializar no aluno habilidades fundamentais como análise e a intepretação

de textos, entre outros, e assim interagir com o texto literário. Ademais, o estudo da prosa

contemporânea brasileira, foco central da análise dos livros didáticos, é contemplado,

satisfatoriamente, em apenas um dos quatro livros examinados. Em relação ao ensino de

literatura e formação do leitor, observa-se que os livros didáticos analisados e oferecidos pelo

PNLD 2015 não possibilitam o estudo pleno de literatura e a formação de leitores no Ensino

Médio atentos à especificidade da arte literária e seu diálogo com seu contexto de produção de

outras linguagens.

Palavras-chave: leitura; ensino de literatura; livro didático; formação de leitores.

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RESUMEN

Esta investigación es de reflexiones crítico-teóricos sobre la importancia de la lectura y la

enseñanza de la literatura y su eficacia en la formación de lectores en la escuela secundaria a

través de un recurso pedagógico muy habitual en la práctica escolar, el libro de texto. A través

del análisis de los libros de texto que se ofrecen a la escuela secundaria de escuelas públicas

de Brasil para la enseñanza de la literatura, el objetivo es identificar el potencial de este

recurso educativo para la formación del lector de prosa brasileña contemporánea e identificar

sus necesidades para este fin, además de reflejar literatura sobre las oportunidades de

educación y la lectura de textos literarios. Para el análisis, se diseñó un guión de observación

y se seleccionaron los libros de texto PNLD 2015: Portugués: lengua y cultura, Carlos Alberto

Faraco; Portugués: Voces de -literatura mundo, el lenguaje y el texto producción, Lilia Santos

Abreu-Tardelli, Lucas Sanches Oda, Maria Tereza de Arruda y Salette Toledo; Portugués:

idiomas con respecto a, Mary Grace Sette, María Antonia Travalha y María Barros de

Rozario; y portuguesa: idiomas, William Robert cereza y Thereza hebra de Magallanes. Del

examen de los libros de texto, que fue apoyada en estudios críticos de la literatura y la

enseñanza de la literatura, autores como Antonio Candido (1995), Jaime Ginzburg (2012),

Marisa Lajolo (1982) (1985), Ligia Chiappini Moraes Leite ( 1983) (2005), Vera Teixeira de

Aguiar y Maria da Glória Bordini (1993), Regina Zilberman (1988) (1991) (2005), entre

otros, se encontró que todos los materiales analizados presentan una propuesta pedagógica

que cumpla con los documentos oficiales que guían la educación brasileña, y contemplan la

información material que les resulte útil tanto para el estudiante y el maestro en la

construcción del conocimiento. Sin embargo, ellos no tienen actividades suficientemente

didácticos para leer en la literatura brasileña apropiada para mejorar las habilidades básicas de

los estudiantes, como el análisis e interpretación de textos, entre otros, y por lo tanto

interactúan con el texto literario. Además, el estudio de la prosa brasileña contemporánea, el

foco central del análisis de los libros de texto, se contempla satisfactoriamente en sólo uno de

los cuatro libros examinados. En cuanto a la enseñanza de la literatura y la formación lector,

se observa que los libros de texto analizados y ofrecidos por PNLD 2015 no permiten que los

jugadores bibliográficas completas de estudio y formación en la escuela secundaria atento a la

especificidad del arte literario y su diálogo con su contexto de la producción de otros idiomas.

Palabras-claves: lectura; enseñanza de la literatura; libro de texto; formación de lectores.

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INTRODUÇÃO

Formar leitores não é uma tarefa fácil e cabe à escola o papel de formar o aluno

enquanto leitor. Essa formação fica ainda mais difícil quando não se tem material didático

adequado, de qualidade e que estimule tal prática. Ainda mais, em um universo que é regido

pela tecnologia, o material didático impresso perde seu encanto, tornando-o obsoleto, uma vez

que reproduz “modelos de leitura estabelecidos há mais de três décadas pela historiografia

literária” (GINZBURG, 2012, p. 212).A partir da prática em sala em aula, evidencia-se certa

resistência no ensino da disciplina por parte dos alunos, uma vez que, têm-se internalizados os

processos e métodos controversos no desenvolvimento de estratégias que convergem para o

processo de leitura literária.Essa resistência ao ensino de literatura, segundo Jaime Ginzburg,

“é a apatia: aulas de literatura em que ninguém, nem professor, nem estudantes, está

interessado por ela” (2012, p. 220).

Mesmo a leitura não sendo o principal objeto de prazer do aluno, é preciso reconhecer

que o ato de ler converge para o desenvolvimento da criticidade, pois algumas práticas podem

auxiliar na formação da personalidade do estudante. Ao ler, podemos identificar o tema de um

texto e até mesmo reconhecer mecanismos de organização e estrutura formal inerente ao

texto, mas a atividade da leitura não deve restringir-se somente à apreensão de informações

superficiais do texto. Ela deve ser vista e entendida como uma atividade reflexiva, capaz de

elaborar a experiência de vida e de desenvolver uma racionalidade e uma concepção de

mundo.

Uma visão de mundo ou uma leitura do mundo com vistas à sua compreensão é o

que os textos literários podem oferecer a seus leitores a partir do cotejo entre diferentes textos

e áreas do saber. E, por ser ainda atividade que estimula a postura reflexiva, a literatura

promove no homem o desenvolvimento de sua intelectualidade, sua criticidade e sua

humanidade para poder se inserir na realidade da sociedade que o cerca e se reconhecer nela.

Para desenvolver essa linha de raciocínio, podemos retomar Antônio Candido. Segundo

Candido (1995), é direito de todo homem o acesso à arte, sendo ela um dos responsáveis por

consolidar o universo de conhecimento, assim como os demais direitos básicos do ser

humano, indiferentemente de classe social.

Portanto, é necessário que sua importância seja reconhecida por toda sociedade para

que suas funções sejam desenvolvidas plenamente e também é preciso que a compreensão

efetiva de seu significado seja construída. É importante ressaltar, então, que tal compreensão e

identificação do valor da literatura podem ser desenvolvidas e cultivadas através de uma

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prática cotidiana: a leitura. Mas é imprescindível refletir sobre sua prática na escola e os

recursos utilizados por ela, para que se pense em como formar melhor leitores de literatura, e

para isso um dos caminhos pode ser examinar os recursos pedagógicos para a leitura da

literatura na escola.

Então, diante de um cenário sombrio para o ensino de literatura na escola, o que fazer

para motivar o encontro dos alunos com a leitura da literatura na sala de aula e ampliar seu

senso crítico em relação à leitura que a literatura propõe sobre a sociedade contemporânea?

De que forma a literatura brasileira pode se tornar objeto de apreciação no Ensino Médio,

nível de formação em que ela se insere de forma mais direta? Os livros didáticos

proporcionam, eficazmente, a interação do aluno com o texto literário? As atividades de

análise e interpretação literária propostas proporcionam conhecimento sobre literatura e

permitem vê-la como meio de humanização? Os livros didáticos tradicionais permitem a

construção de conhecimento de literatura e a proficiência dos alunos em relação ao texto

literário? Que alternativas a escola dispõem além do material didático para o ensino de

literatura e a leitura literária?

Todos esses questionamentos são apresentados como ponto de partida para uma

reflexão sobre a literatura no ambiente escolar, e, propomos, assim, nesta dissertação, discutir

o ensino de literatura na escola, identificando fragilidades e potencialidades dos livros

didáticos utilizados, além de reflexões acerca de possibilidades para e na formação do leitor

de textos literário no Ensino Médio. Tal proposição de estudo almeja ainda uma contribuição

para a melhoria do ensino de literatura na escolae consequentemente, a formação do leitor

através de livros didáticos, objeto que elegemos para exame nesta pesquisa, pelo Programa

Nacional do Livro Didático (PNLD) promovido pelo Governo Federal Brasileiro.

Para a análise de materiais didáticos, entendemos que é necessário delimitar a

abordagem, tendo em vista a busca por uma investigação aprofundada sobre o tema e as

limitações de tempo para cotejo e avaliação dos livros didáticos. Sendo assim, escolhemos

construir um exame crítico que leve em conta a forma como a prosa brasileira contemporânea¹

é apresentada nos livros didáticos e os recursos pedagógicos propostos para tornar essa prosa

lida e apreciada pelos estudantes do Ensino Médio. A escolha pela prosa brasileira

contemporânea como tema principal de abordagem dos materiais didáticos deve-se ainda ao

fato de que essa prosa aborda temas do cotidiano, presentes no contexto sociocultural de vida

do leitor desta época, o que, em tese, pode ser um fator de aproximação entre texto literário e

leitor do Ensino Médio. Isso, contudo, significa que o olhar crítico se dará sobre todo livro,

depois, focar a atenção à prosa brasileira contemporânea.

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Dessa forma, ao elegermos uma investigação que discute leitura e formação do leitor

através da análise de recursos didáticos, nossa proposta de estudo se insere na linha de

pesquisa do Mestrado em Letras da URI intitulada “Leitura, linguagens e ensino”. A

associação desta dissertação a esta linha justifica-se ainda por este estudo abordar práticas de

leitura e metodologia do ensino de literatura, oportunizando a reflexão acerca da leitura e da

formação do leitor e contemplando abordagens teórico-práticas de ensino da leitura no

contexto da educação básica do século XXI.

Ao desenvolver este estudo, objetiva-se principalmente discutir literatura na escola,

identificando potencialidades e fragilidades do ensino e leitura da prosa brasileira

contemporânea propostos em livros didáticos de língua portuguesa/literatura para o Ensino

Médio¹. Além disso, pretende-se: analisar o livro didático oferecido para a escola pública

brasileira do Ensino Médio para o ensino de literatura, identificando seu potencial para a

formação do leitor de literatura contemporânea assim como apontar suas carências para esse

fim, e ainda, refletir sobre possibilidades de ensino de literatura e a leitura do texto literário;

investigar se as atividades de leitura, análise e interpretação dos textos em prosa propostas nos

livros didáticos estimulam a interação do aluno com o texto literário tal como orientação dos

Parâmetros Curriculares Nacionais para ensino de leitura na escola; comparar livros didáticos

de língua portuguesa/literatura para o Ensino Médio a fim de identificar a forma de

abordagem da prosa brasileira contemporânea proposta por esses materiais pedagógicos;

Apesar do ensino de literatura se dar através do livro didático, precisa-se defender a

ideia de que a literatura é um dos vieses para transformar o indivíduo “apagado e sem ação”

(expressão muitas vezes usada por professores de escola de nível médio para definir

estudantes) da sociedade em um sujeito ativo, crítico, protagonista, que lê e compreende o

meio em que está inserido e o professor pode ser o grande instrumento dessa transformação.

Daí uma das razões que justificam nosso trabalho: a necessidade de formarmos leitores de

literatura e oferecermos a professores e alunos recursos adequados para o ensino dessa

expressão artística. Ademais, há a necessidade urgente de discutir os recursos didáticos

disponíveis na escola para a leitura da literatura e sua eficácia na formação de um leitor de

literatura.

Assim, optamos por avaliar a qualidade do material didático oferecido às escolas

brasileiras, entendendo que isso é primordial para que este possa auxiliar na consolidação da

___________________

²É importante registrar que não encontramos livros didáticos específicos para o ensino de literatura brasileira no

PNLD 2015. A proposta de ensino de literatura está contemplada em coleções didáticas de Língua Portuguesa,

como explicaremos no terceiro capítulo.

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leitura e do ensino de Literatura no Ensino Médio. Desta forma, comparar os livros didáticos

distribuídos gratuitamente para as escolas públicas brasileiras permite examinar a forma pela

qual o mercado editorial contempla a literatura, em especial a prosa contemporânea brasileira,

para o ensino. Este exame permite esboçar as fragilidades e as potencialidades dos materiais,

no sentido de elencar os livros didáticos que convergem, potencialmente, para um ensino de

literatura que vise formar o aluno um leitor. É importante ressaltar que a metodologia adotada

para comparar e analisar essas fragilidades e potencialidades dos livros didáticos será

apresentada no terceiro capítulo.

Para expor as reflexões construídas nesta pesquisa, este trabalho aborda, em seu

primeiro capítulo, a literatura na formação do leitor, levando em conta a concepção de leitor e

leitura de literatura, e, a partir dela, procura-se refletir criticamente acerca da relação entre

ambos. Pressupondo a importância da leitura de literatura na formação do leitor, focamos,

ainda, o espaço que o texto literário tem na sala de aula através do ensino de literatura e a

contemplação dela nos documentos oficiais que norteiam a educação brasileira. No segundo

capítulo, explanamos sobre o livro didático, sua introdução na educação brasileira, a

implantação de programas nacionais que promovem sua distribuição para os alunos das

escolas públicas, e ainda, sobre o uso desse material para o ensino de literatura. O terceiro

capítulo trata da análise de livros didáticos no PNLD 2015, com vistas à identificação de

potencialidades e fragilidades do material pedagógico disponibilizado, além de refletir sobre

possibilidades para o ensino de literatura e a formação do leitor. Por isso, propomos,

amparados em estudo já publicado, um roteiro para análise de livro didático voltado à leitura

da literatura, o qual subsidia o olhar crítico sobre livros didáticos eleitos para análise nesta

dissertação.

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1. A LITERATURA NA FORMAÇÃO DO LEITOR

1.1 O leitor e a leitura de literatura no Ensino Médio

A leitura é crucial na vida das pessoas, pois presume uma consciência do mundo e

ampliação de horizontes. No entanto, constatamos que tal prática está em declínio na

sociedade brasileira atual, levando-se em conta a situação da leitura em nosso país apontada

pela pesquisa realizada pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Ibope Inteligência.

Segundo dados da pesquisa descrita no livro Retratos da Leitura no Brasil 3, organizado por

Zoara Failla (2012), há uma redução no número de leitores se comparado com o crescimento

populacional do país.

Cada vez mais adepto à informação curta e pronta, o brasileiro não tem por hábito ler.

De acordo com o levantamento nacional da pesquisa citada, o número de brasileiros

considerados leitores decaiu consideravelmente, de 95,6 milhões em 2007 para 88,2 milhões

em 2011. Segundo informaçõesconstantes no livro:

[...] a amostra da pesquisa representou 93% da população brasileira (PNAD de

2009) ou 178 milhões; destes, 50% (88.2 milhões) declararam-se leitores. Em

relação a 2007, constatamos uma redução de 7,4 milhões de leitores (eram 95,6

milhões ou 55% da população estudada). Este número quase coincide com a redução

de 7,1 milhões de pessoas, na faixa de 5 a 17 anos, entre 2007 e 2011, passando de

29 % para 24% do total da amostra na 3ª edição da pesquisa. (FAILLA, 2012, p.29).

Essa situação apontada pelo levantamento nacional incita uma reflexão crítica, quando

levadas em conta a escolaridade dos informantes e a importância que os brasileiros dão à

leitura. Notamos que o percentual de leitores é maior entre os brasileiros que estudam. Já

entre os brasileiros não estudantes, esse percentual é 50% menor aos brasileiros estudantes.

Outro dado a ser considerado é a importância que a leitura adquire entre os indivíduos. No

levantamento realizado em 2011 e publicado em 2012, a atividade de ler por prazer em tempo

livre aparece em sétimo lugar, ante o quarto lugar ocupado em 2007.

Ainda, segundo dados da avaliação PISA (Programa Internacional de Avaliação de

Alunos) de 2012, o desempenho do Brasil em relação à leitura piorou, ocupando a posição 55

no ranking. A prática da leitura decresceu no país em relação ao último levantamento, ficando

abaixo da média dos países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico,

a OCDE. Se há uma carência na formação de leitores na escola e se compartilhaa ideia de que

a leitura competente pode tornar o indivíduo um sujeito emancipado, refletir sobre como

desenvolver a habilidade de leitura na escola é crucial.

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Considerando esse cenário configurado pelos levantamentos, há uma necessidade de

aumentar o número de brasileiros considerados leitores. Tal aumento requer, inevitavelmente,

uma formação de leitores. Muitos programas para expandir a leitura já foram postos em

prática, como o Plano Nacional do Livro e Leitura – PNLL, o Programa Nacional Biblioteca

da Escola/PNBE, entre outros, que visam a “formar leitores, buscando de maneira continuada

substantivo aumento do índice nacional de leitura [...] em todas as faixas etárias e do nível

qualitativo das leituras realizadas” (BRASIL, 2006, p. 25), tendo, inclusive, um olhar mais

objetivo por parte dos cursos superiores de licenciatura que trazem para seu círculo de

formação um estudo aprofundado de estratégias para formar leitores. Essa formação na

graduação se justifica pelo fato de os professores serem cruciaisnesse processo, já que é

através dela que muitos brasileiros têm acesso à leitura. Por conseguinte, ao debater sobre a

formação do leitor, é de fundamental importância que os cursos de licenciaturas também

formem professores leitores, pois não é possível um professor não leitor formar alunos

leitores. Nessa visão, antes de se formarem leitores na escola, tem-se a necessidade de formar

docentes leitores.

O baixo índice de leitura na escola apontado pelos dados anteriormente expostos está

em declínio, sempre foi um problema a ser solucionado pela escola, e esta, muitas vezes,

condicionou a solução à literatura. Com o processo de modernização do país, além de

alfabetização, coube à escola difundir o letramento literário, algo que era estritamente ligado à

elite burguesa. Nessa perspectiva, em sua dissertação de mestrado Gostar de Ler: um estudo

sobre alunos de Ensino Médio e sua relação com a leitura, Elaine Dante (2006)destaca a

responsabilidade da escola em relação ao letramento literário. Para a autora, cabe à escola

promover diferentes letramentos utilizando variados objetos de leiturae abrangendo

necessariamente o letramento literário que, por estar sendo negligenciado ou descaracterizado,

demanda inovações pedagógicas urgentes.

O letramento literário é, assim, indispensável, mas nem sempre a escola esteve

incumbida dessa formação e atendia a todos, promovendo a leitura. Por muito tempo, a escola

destinava-se à elite burguesa. Com o advento da industrialização, aconteceu a migração do

campo para a cidade, ocasionando o crescimento da população urbana e necessitando a

expansão da escola brasileira. Passaram então caber à escola a alfabetização e o letramento

dessa população, inclusive o literário, pois a leitura de textos era uma prática ainda não

difundida entre essa “nova” população.

Assim, se, por um lado, a maior parte das possibilidades de contato com a leitura está

na escola, é natural, por outro, quetambém seja pensada a inserção da literatura como objeto

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de leitura e a formação de leitores de literatura. Sabemos que a literatura foi introduzida na

escola desde a criação desta, embora, nem sempre o objetivo de ensino com objeto literário

fosse, de fato, a compreensão da literatura e do texto literário em sua especificidade artística,

já que inicialmente a literatura era instrumento para ensino de língua e identificação dos

melhores empregos da expressão escrita através da linguagem de autores considerados

exemplares. (CEREJA, 2004).

Assim sendo, como grande parte do alunado desconhecia a tradição literária e a norma

cultada língua,tanto a leitura quanto o estudo da literaturatornavam-seuma prática que exigia

esforços para que o texto fosse compreendido. Logo, o problema, apresentado pelo

levantamento realizado pela pesquisa recente do Instituto Pró-livro, descrita no livro Retratos

da leitura no Brasil 3 e pela avaliação PISA, não é novo e que apenas foi se tornando crônico

com o passar do tempo. Nota-se um espaço cada vez mais reduzido para a abordagem da

literatura na sala de aula, e isso implica a necessidade de se pensar a relação entre literatura e

leitura. Como ler literatura? Como abordá-la no contexto de formação escolar?

Primeiramente, ao formarem-se leitores, deve-se ter clareza do que é leitura. O ato de

ler não corresponde apenas ao reconhecimento do texto em seus aspectos estruturais e

linguísticos, seja ele escrito ou não. Ler é conhecer, desvendar, é preencher as lacunas

deixadas pelo emissor na criação de sua obra e isso necessita do receptor – o leitor – para dar

vida e significância ao universo do texto. A leitura deve ser concebida, além de prazer, como

fonte de conhecimento, pois ela possibilita um novo entendimento do mundo em que se insere

e um diálogo com o texto no sentido de reconhecer o sentido inicialmente pensado pelo autor

para a escrita ou de propor um significado diferente. Para Marisa Lajolo (1982):

Ler não é decifrar, como num jogo de adivinhações, o sentido de um texto. É, a

partir do texto, ser capaz de atribuir-lhe significado, conseguir relacioná-lo a todos

os outros textos significativos para cada um, reconhecer nele o tipo de leitura que

seu autor pretendia e, dono da própria vontade, entregar-se a esta leitura, ou rebelar-

se contra ela, propondo outra não prevista (LAJOLO,1982,p.59).

Assim, para a autora, a leitura presume significação e fruição, sendo assim, apenas

ocorre a leitura quando o aluno consegue, através das linguagens, verbais e não verbais, criar

conexão, fazendo com que este atribua significações a elas. Enfim, a leitura se solidifica à

medida que permite o diálogo construtivo entre autor, texto e leitor. É a partir desse momento

queeste consegue criar associações com outros textos, possibilitando transitar entre seus

sentidos possíveis. Logo, a leitura passa a ser vista como uma atividade que proporciona uma

Page 15: LEITURA E ENSINO DE LITERATURA  · PDF fileo livro didÁtico como ferramenta para estudo da literatura no ensino mÉdio

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experiência única com texto, e, se for o literário, essa experiência é infinita por ele ser

polissêmico, oportunizando amplas possibilidades de interpretação.

Desse modo, construir um leitor é capacitá-lo para que ele amplie seu horizonte de

expectativas, pois o texto necessita do leitor para se realizar. A escola, enquanto formadora de

leitores deve, incessantemente, formar o aluno para ser um leitor crítico, capaz de analisar,

refletir e se tornar um protagonista transformador do seu meio, sem deixar de buscar a

alteridade, a voz do outro. No entanto, é preciso atentar para que o texto literário seja

contextualizado na interpretação e para que não ocorra distorção de sentidos, pois um texto

bem interpretado leva o aluno ao viés das experiências múltiplas de interação com o texto.

Essa liberdade de interpretação dada pelo texto literário Umberto Eco (2003) chama de

respeito com o leitor. Ele destaca a necessidade dessa relação respeitosa do leitor com o texto,

pois, segundo Eco:

[...] a leitura literária nos obriga a um exercício de fidelidade e de respeito

naliberdade de interpretação. Há uma perigosa heresia crítica, típica denossos dias,

para a qual de uma obra literária pode-se o que se queira,nelas lendo aquilo que

nossos mais incontroláveis impulsos nos sugerirem.Não é verdade. As obras

literárias nos convidam à liberdade deinterpretação, pois propõe um discurso com

muitos planos de leitura e noscolocam diante das ambiguidades e da linguagem da

vida. Mas para poderseguir neste jogo, no qual cada geração lê obras literárias de

modo diverso,é preciso ser movido por um profundo respeito para com aquela que

eu,chamei de intenção do texto. (ECO, 2003, p.12).

Contudo, essa liberdade de interpretação que o leitor possui para com o texto literário

deve ser explorada por uma relação de confiança e de respeito. A relação entre o leitor e o

escritor é recíproca, pois um necessita do outro para que sua função seja desempenhada. O

texto literário somente terá vida se o leitor desempenhar seu papel de leitura e interpretação.

Esta só se tornará possível se houver um texto, ou seja, leitor e escritor estabelecem uma

cumplicidade entre si, em que um fica imaginando o outro.Desse modo, o mundo apresentado

no texto literário aciona o reconhecimento e um posicionamento crítico do leitor acerca de

suas experiências individuais no mundo real em que está fixado, permitindo que ele reflita e

construa sua intelectualidade crítica acerca do contexto de que faz parte, compreendendo,

assim, a si mesmo e ao outro.

É importante ressaltar que a significação do texto literário acontece a partir do instante

em que o receptor interage com o material escrito. Essa interação estreita a relação leitor e

literatura. Relação esta que a escola nem sempre analisa ou reavalia. Ao definir leitura como

uma tomada de consciência crítica do mundo, do contexto histórico-social em que o leitor está

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presente, percebe-se, que a prática da leitura deve ser, incondicionalmente, mais praticada no

espaço escolar.

A leitura atenta de um texto literário pode propiciar uma visão crítica e emancipação

do leitor, pois causa neste um estranhamento que vai possibilitar que ele “desorganize” seu

mundo, e, após, “reorganize-o” novamente. Em seu ensaioDireito à literatura, Antônio

Cândido (1995) argumenta que a literatura é um direito básico de qualquer indivíduo, porque

é através da literatura que o leitor conhece a sociedade em quem está inserido, reflete

criticamente sobre ela e com esse conhecimento formado a desorganiza e volta a organizá-la,

para em seguida, se inserir novamente na sociedade e nela se reconhecer. Todavia, é

importante salientar que a literatura não é a realidade e sim uma representação da realidade.

Partindo do pressuposto de que a organização do meio em que o indivíduo vive se dá

através da sua leitura crítica de mundo, delega-se à escola a formação de leitores críticos,

capazes de ler o espaço e a sociedade em que estão inseridos; porém, essa concepção de

leitura parece estar um pouco longe de tal instituição. A escola deverá reavaliar a importância

e o tratamento que dá para a relação entre leitura e literatura. Faz-se necessário o abandonodo

artificialismo envolvido na prática de leitura de textos literários, como desenvolver prática de

leitura com o texto isolado, sem conexões com outras leituras, atividades de rememorização

de dados sobre o texto, sem que o aluno perceba a leitura como uma ação cultural constituída

através da história.

Jaime Ginzburg (2012) chama atenção para o tratamento que a escola dá ao texto de

literário. Segundo o autor, o aluno se desmotiva em ler um texto literário por ter internalizada

uma ideia equivocada de fruição e não prioriza o deleite estético, a catarse, que a leitura

literária exige e permite. Atrelar as leituras literárias a provas e exames, por exemplo, é fazer

com que os alunos apenas usufruam de forma superficial o texto. Além disso, nesse caso, há o

risco de a leitura da literatura ser realizada apenas por obrigação, sem uma atividade que

propicie ao aluno compreender o texto e o diálogo que este pode apresentar com o seu

contexto de produção, enfim, o texto pode não receber um sentido no ato de leitura pelo

aluno.

A prática da leitura em sala de aula tem se consolidado como uma tarefa atrelada à

obrigação, ao passo que a leitura enquanto forma lúdica e prazerosa de reconstruir mundos

possíveis mostra-se uma prática pouco explorada e, na medida em que as leituras são impostas

no ambiente escolar, o ato de ler passa a ser entendido apenas como uma mera atividade

escolar com vistas à avaliação ou ao cumprimento de tarefas. Além disso, nem sempre as

escolhas pessoais para leitura são levadas em conta, o que também contribuipara a

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desmotivação na prática e que apaga a voz protagonista do aluno enquanto leitor.É importante

ponderar que o contato do aluno com a leitura de forma lúdica e prazerosa é possibilitado pelo

abandono das atividades tradicionais de leitura, deve-se priorizar novas atividades que levem

à fruição do texto, à analise crítica e à sensibilidade. Desse modo, essas novas atividades

permitiriam cotejar a leitura de obras tradicionais com as escolhas pessoais para leitura,

contribuindo para motivar o aluno à prática da leitura. Portanto, para tornar, de forma plena e

concreta, o aluno um leitor ativo, protagonista, é crucial que se tenha um olhar mais claro e

atento sobre o ensino de literatura na escola. Se à escola é delegada a função de formar

leitores, e a literatura sendo um viés para isso, embora não exclusivo, o ensino desta deve se

tornar centro da prática educacional.

1.2. O ensino de literatura: o texto literário na sala de aula

Vários autores, dentre eles críticos da literatura, têm apontado que o ensino de

literatura no Brasil apresenta dificuldades e empecilhos não só para a formação do leitor, mas

também para o desenvolvimento da habilidade de interpretação do texto literário. De acordo

com Coutinho, “O problema da literatura, no Brasil, o seu futuro, seu desenvolvimento, sua

consolidação, sua maioridade, estão a depender em especial do estudo e do ensino da

literatura” (COUTINHO, 2003, p. 212). Essa preocupação corrobora para a angústia em

relação ao destino da literatura, que estáperdendo espaços na sociedade brasileira atual e,

principalmente, na escola. Essa perda de espaço já se inicia na supressão do ensino da

literatura e falta de práticas de leitura, segundo Gabriela Luft (2014). Para a autora, essa perda

de espaços não se deriva apenas pela falta de práticas de leitura, mas também das recentes

políticas públicas que direcionaram o ensino da disciplina. Muitos currículos escolares estão

diminuindo a carga horária de aulas para a disciplina, silenciando a formaçãode um cidadão

autônomo, com senso crítico e com capacidade para ler a sociedade e suas relações alienantes,

que visam à dominação do ser humano.

Todavia, se hoje o ensino da literatura tem perdido espaço, nem sempre foi assim. O

ensino da literatura é antigo em nosso país. Foi incluído no currículo dos colégios através da

reforma educacional no auge da República, fazendo com que seu papel estético comprometido

com o mundo real cedesse lugar para o pedagógico, não levando em conta as suas

especificidades (ZILBERMAN, 1988). A metodologia de ensino da Literatura, que se dava

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através da memorização de pequena listagem de obras, adentrou pelo século XX. Ainda é

comum encontrar alunos que saibam de cor algumas obras de autores respeitados, sem

bagagem mais crítica e aprofundada de leitura, o que favorece para um contato mais íntimo

com a literatura. Desse modo, a literatura é concebida, muitas vezes, como apenas um objeto

textual para provas, sob pena de reprovação caso o aluno não tenha se apropriado das

informações básicas acerca do texto, autor e contexto histórico.

Ler literatura exige do leitor conhecimentos prévios e experiências de leitura e de vida.

São essas experiências que fazem o leitor ler o texto literário de seu modo, a partir de sua

visão de mundo, e, quanto mais leituras, mais possibilidades de entender o mundo e a

sociedade da qual faz parte. As experiências farão com que o texto escrito seja

contextualizado e, assim, o leitor dará sentido à sua realidade. Logo, quanto mais leituras de

texto e de mundo, mais interação com os textos.

No entanto, a literatura não tem o merecido destaque no cenário educacional, uma vez

que sofreu apagamento nas leis que regulamentam a educação brasileira, LDB e PCNEM, e,

como disciplina regida por uma legislação pertinente, seu ensino, segundo Zinani e Santos

(2002), está engessado, de um lado, pelo vestibular, ainda adotado pela grande parte das

universidades brasileiras, que condiciona o conteúdo e a perspectiva de abordagem, e, de

outro, pela relação interacionista aluno/professor que vai traduzir o interesse e o gosto por

essa modalidade de produção cultural. Ainda é importante destacar que os vestibulares ainda

existentes estão perdendo espaço para outro exame, o Exame Nacional do Ensino Médio –

ENEM, e neste, a literatura é, ainda mais, silenciada.

Para ser possível formar um leitor competente, proficiente, que enxergue além das

palavras escritas, é de fundamental importância ensinar ao aluno a ler literatura. Segundo

Zilberman (1991):

[...] o exercício dessa função [...] é delegado à escola, cuja competência precisa

tornar-se mais abrangente, ultrapassando a tarefa usual de transmissão de um saber

socialmente reconhecido e herdado do passado. Eis porque se amalgamam os

problemas relativos à educação, introdução à leitura, com sua consequente

valorização, e ensino da literatura, concentrando-se todos na escola, local de

formação do público leitor. (ZILBERMAN, 1991, p.16).

Desse modo, o exercício da leitura do texto literário em sala poderia conferir um

sentido educativo à leitura, pois pode ser vista e entendida com uma atividade reflexiva, capaz

de elaborar experiência de vida e desenvolver uma racionalidade e concepção de mundo.O

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texto literário pode contribuir significativamente na formação do sujeito, no entanto, é preciso

atentar para a metodologia utilizada nessa atividade.

O leitor sente a necessidade de se encontrar no texto, na história, pois, se isso não

acontece, ele se torna cada vez mais distante de sua realidade fazendo com que ele não crie

uma empatia com o texto e sua leitura.Assim, “ou o texto dá sentido ao mundo, ou ele não

tem sentido nenhum” (LAJOLO, 1982, p.15). “Fazer surgir ou aperfeiçoar o espírito crítico do

estudante em relação ao mundo real é o objetivo do ensino de literatura” (MALARD, 1985, p.

17), e ele só se torna viável quando houver interação entre o texto e o contexto externo,

permitindo que o leitor consiga intercambiar as informações, as sensações, o estranhamento

causado pelo texto literário com o seu mundo real. A partir do momento em que houver esse

reconhecimento, se desperta o interesse do leitor pela leitura de literatura, logo, iniciar-se-á

sua formação leitora.

Ligia ChiappiniMoraes Leite (1983) destaca que é o texto o ponto de partida para o

ensino e estudo da literatura e sem ele não há uma formação de leitores. Segundo Elaine

Bender (2007), o conteúdo e a estética de cada texto são o essencial para a literatura e o que a

diferencia dos demais gêneros, e esta, ao compor o currículo, tem, primordialmente, o

objetivo de formar leitores.

Para Jaime Ginzburg (2012), a literatura é explorada pelo professor e pelo aluno com

um objetivo claro, a apropriação de conhecimento para realização de provas, exames, fugindo

de sua função social. Assim, o conhecimento é apenas mecânico e há uma “decoreba” de

informações acerca do texto literário. Ainda para o autor, “estudantes poderiam estar sendo

preparados para a reflexão crítica, sendo capazes de ler livros dos mais diversos gêneros,

realizar atividades de análise e interpretação” (GINZBUR, 2012, p. 211). Mas não é isso o

que comumente constatamos. Há materiais didáticos para ensino de literatura que não

ensinam a ler literatura e nem promovem debates críticos e interpretação sobre o texto

literário. Há apenas uma simplificação da compreensão sobre a literatura.

William Roberto Cereja (2005) esclarece, em sua tese de doutorado Uma proposta

dialógica de ensino de literatura no ensino, que:

[...] tanto os manuais didáticos quanto alguns professores (e talvez estes por

influência daqueles) interagem com os alunos tomando como referência uma

sequência de procedimentos entre os quais a leitura do texto literário propriamente

dita desempenha um papel secundário, servindo muito mais à exemplificação da

teoria desenvolvida do que como objeto básico para a construção de conhecimentos

de literatura ou para o desenvolvimento de habilidades de leitura nessa modalidade

de texto” (CEREJA, 2004, p.18).

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Por conseguinte, não se trabalha, portanto, a construção do intelecto crítico num todo,

o que possibilitaria leituras múltiplas, apenas, condiciona o leitor do texto a um caminho de

leitura consagrado pelo estudo do texto considerado por críticos como canônico. Nesse

sentido, Jaime Ginzburg (2012) propõe a pensar em como deveria ser o ensino de literatura e

defende que “o ensino de literatura de qualidade, no contexto brasileiro contemporâneo,

deveria ser caracterizado por alguns elementos fundamentais” (GINZBURG, 2012, p. 211).

Para ele, os alunos deveriam estar sendo preparados para a reflexão crítica, para um

permanente debate entre texto e sociedade. O autor critica a situação da leitura e do ensino da

literatura no Brasil, pois esse processo se dá de forma distorcida, amarrada a um sistema

engessado, que condiciona a prática à habilidade de rememorização de obras, autores,

baseando-se na historiografia literária, e não focalizando a compreensão, a discussão e a

análise crítica, que, de fato,permitem ao aluno ser um transformador de mundo e não apenas

um inserido no mundo.Compartilhando da crítica de Ginzburg, William Roberto Cereja

(2004) destaca que “o problema é que, transformando-se noprincipal objeto e no principal

objetivo do curso de literatura no ensino médio, ela vem centralizando, [...] a maior parte

dasatividades da disciplina, não abrindo espaço a outros tipos de abordagem daliteratura, mais

condizentes com a realidade e com os objetivos da educaçãooficial de hoje” (CEREJA, 2004,

p. 213).

Nessa mesma visão, Regina Zilberman pontua que:

[...] o conhecimento da literatura é um processo infinito, não apenas porque o leitor

depara-se permanentemente com obras recentes, mas também porque ele busca

obras do passado que se atualizam por força de sua leitura, e igualmente, enfim,

porque obras lidas revelam aspectos inusitados a cada retomada. A organização da

historiografia atrofia essa propriedade da literatura, porque o novo coincide com o

que está sendo lançado, jogando para trás tudo o que veio antes, qualificado com

antigo, ultrapassado ou velho. Confundindo atualidade com novidade, não estimula

a redescoberta do já estudado, porque não consegue situá-lo em paradigmas diversos

dos previamente estabelecidos. (ZILBERMAN, 2005, p.236).

Dessa forma, todas as obras têm sua importância e sua função, e, partindo dessa visão,

ao classificá-las dentro da linha cronológica da historiografia literária, entre novo e atual,

perde-se o valor que elas trazem. Todas elas, não importa o tempo e a finalidade com que

foram escritas, seja apenas por bel prazer ou com intenções de denúncias sociais, permitem ao

leitor a redescoberta e a apreciação de seus textos, situando-os no tempo e no espaço.Ao ler as

obras do passado, o leitor vai contextualizá-las, a partir de suas experiências e leituras de

mundo, tornando-as recentes. Logo, ao ler o texto em outro momento, redescobrirá e

atualizará sua leitura e visão do próprio texto.

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Letícia Malard(1985) defende que o ponto de partida para o ensino de literatura é o

texto, refutando o ensino a partir da periodização e pontua ainda a importância da

intertextualidade, para a comparação dos textos entre si. Para a autora, “aliteratura é uma

prática social tanto para quem a escreve quanto para quem a lê. Prática social no sentido de

atividade humana em intenção transformadora do mundo, que expressa o peculiar da relação

do homem com o mundo, os modos de ser do homem no mundo” (MALARD, 1985, p. 10).A

partir do entendimento da autora, o texto literário, ao possibilitar a humanização do leitor e

potencializar sua leitura crítica e reflexiva da sociedade que faz parte, transforma o leitor e a

sociedade, e é essa a prática social a qual se referia Letícia Malard.

Para Maria da Glória Bordini e Vera Aguiar (1993),a literatura tem o poder de oferecer

ao leitor um mundo diferente do que ele vivencia, pois, nas palavras das autoras:

[...] a riqueza polissêmica da literatura é um campo de plena liberdade para o leitor,

o que não ocorre em outros textos. Daí provém o próprio prazer da leitura, uma vez

que ela mobiliza mais intensa e inteiramente a consciência do leitor, sem obrigá-lo a

manter-se nas amarradas do cotidiano. Paradoxalmente, por apresentar um mundo

esquemático e pouco determinado, a obra literária acaba por fornecer ao leitor um

universo muito mais carregado de informações, porque o leva a participar

ativamente da construção dessas, com isso forçando-o a reexaminar sua própria

visão da realidade. (BORDINI; AGUIAR, 1993, p.15).

Ainda, segundo as autoras, o leitor de literatura é responsável, utilizando-se da

linguagem, “pela reconstrução de todo o universo simbólico que as palavras encerram e pela

concretização desse universo com base nas vivências pessoais do sujeito” (BORDINI;

AGUIAR, 1993, p. 15). O texto literário permite ao leitor experienciar e divagar por um

mundo paralelo ao seu. Isso somente é possível, porque “a obra literária acaba por fornecer ao

leitor um universo carregado de informações, porque o leva a participar ativamente da

construção dessas, com isso forçando-o a reexaminar a sua própria visão da realidade

concreta” (BORDINI; AGUIAR, 1993, p.15).

Nessa mesma linha de raciocínio, pautada na reflexão sobre o poder da literatura e

sobre seu ensino na escola, Regina Zilberman (1988) considera que a escola deve ampliar

ainda mais os horizontes acerca da formação de leitores, deixando de ser meramente

transmissora de conhecimento e sim construtora, juntamente com os alunos. Esses horizontes

quebram o tradicionalismo, tornam mais abrangente o papel da escola e revigoram os esforços

para uma proficiência em relação à leitura.

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Para amenizar os problemas acerca da formação de leitores, deve haver,

primordialmente, uma política educacional e cultural voltada à leitura, e que proporcione a

popularização da literatura. Para Zilberman, adotar uma nova política educacional significa:

[...] adotar uma metodologia de ensino da literatura que não se fundamente no

endosso submisso da tradição, na repetição mecânica e sem critérios de conceitos

desgastados, mas que deflagre o gosto e o prazer da leitura de textos, ficcionais ou

não, e possibilite o desenvolvimento de uma postura crítica perante o lido e perante

o mundo que esse traduz. (ZILBERMAN, 1988, p. 44)

Essa metodologia que Zilberman (1988) questiona é a que se encontra em muitoslivros

didáticos e sua adoção no ensino de literatura é bastante comum entre os professores. No

entanto, deve-se atentar para que não seja o único recurso pedagógico. A escola pode ser o

único meio queoportuniza para alguns estudantes terem contatos com os livros. Vive-se numa

sociedade com baixos índices em leitura, o que pode contribuir para que a escola seja o

primeiro acesso aos livros.

Outro empecilho no tratamento do texto literário na escola refere-se à sua

pedagogização e que é duramente criticado. Maria do Rosário MorttattiMagnani (1989)

ressalta o aparecimento da literatura na escola. No Brasil, a educação iniciou com o ensino

dos jesuítas que usavam a literatura como forma pedagógica. Hoje, de acordo com a autora, o

professor pode e deve interferir na leitura de seus alunos, desde que essa interferência seja

feita de maneira crítica: “A literatura é também novidade e ruptura e só será agente de

transformação na medida em que for resultado e lugar de transformação” (MAGNANI, 1989,

p. 22). A leitura possibilita que qualquer texto seja traduzido para o presente e que coloque

em relação o passado com a realidade do leitor. Esse diálogo pode representar essa ruptura

citada por Magnani.

Ao avaliar a abordagem do texto literário na sala de aula, Maria Thereza Frago Rocco

(1981) critica o uso da literatura em sala de aula. Segundo a autora, a utilização de textos

literários com outra finalidade a não ser o estudo literário fez com que os textos se tornassem

apenas instrumento para outro estudo, contemplando a rememorização de informações acerca

do mesmo, por exemplo. A autora pontua, ainda, que o texto literário deve ser estudado, desde

que seja para entender o próprio.Para Elaine Bender (2007), ao exercer uma função didática

quando utilizada no ambiente pedagógico, a função da literatura é distorcida e perde seu

objetivo que é formar sujeitos e atuar no ensino. Essa pedagogização do texto literário ainda é

muito presente no ensino de literatura, tornando o texto um caminho para estudar questões

ligadas à formação educativa do aluno e não contemplando a fruição do texto literário em si.

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Por isso, um dos motivos do apagamento do ensino de literatura na escola é o

desinteresse dos estudantes pela leitura. Segundo Letícia Malard, “o estudante de hoje chega

ao Ensino Médio sem o hábito de ler e a escola também não está a estimular o aluno para o

exercício efetivo da leitura, a não ser quando esta está condicionada a uma tarefa obrigatória”

(1985, p.10). Ao se tratar de um texto literário, muitos alunos do Ensino Médio podem ter

certa resistência pelo fato de terem internalizados que, junto com o texto, vêm atividades

desestimulantes de apropriação de informações sobre o texto e que serão cobradas em

avaliações condicionadas a notas.

No entanto, segundo Lajolo (1985), no Ensino Médio o estudose dá sobre literatura e

não de literatura, pois a prática docente privilegia o ensino, a análise de autores e obras

canonizadas pela própria literatura. O texto literário, sendo polissêmico, permite inúmeras

leituras sobre o mundo e a realidade, logo, deve-se conhecer e sentir outras leituras e não

apenas nos deleitarmos sobre o cânone. Portanto, segundo a autora, dois aspectos cruciais

devem ser observados e considerados quando se trata de literatura no Ensino Médio: ensinar

literatura e ensinar sobre literatura. Quando seensina literatura, leva-se em conta o

desenvolvimento do gosto pela leitura, já quando se ensina sobre literatura, explana-se sobre

informações acerca de autores, obras, períodos literários, etc. No Ensino Médio, a priori na

disciplina de literatura, deveser a ênfase no ensino de literatura, pois o cenário atual necessita

de formação de leitores, leitores proficientes, críticos e não na apropriação de informações

acerca da cronologia da historiografia literária, seus principais autores e obras. A busca de

informações deve vir em segundo plano, porém, não é o que se evidencia em muitas salas de

aula, onde se contempla o ensino sobre literatura, e a formação de leitores fica em segundo

plano.

Assim sendo, a escola tem importância crucial na formação do aluno como leitor, e a

literatura em sala de aula pode ser um viés para tal objetivo e, ainda, para a transformação do

aluno e a relação que este tem com o mundo da leitura. Porém, é importante destacar que a

literatura e seu ensino estão cada vez mais suprimidos em sala, nos currículos e em

documentos oficiais nacionais que direcionam a educação básica brasileira, e isso pode ser

observado quando se analisam documentos oficiais do governo brasileiro que delegam (ou

não?) espaço para o texto literário na escola, orientando professores de todo o país a

desenvolver atividades de leitura e leitura da literatura na sala de aula.

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24

1.3 A literatura nos norteadores curriculares do Ensino Médio

A partir da obrigatoriedade legal do estudo até os 17 anos, o tempo de permanência na

escola teve um crescimento significativo. Dada a importância ao Ensino Médio, uma vez que

antecede um nível de formação superior, parâmetros de nível nacional foram criados para

reformular a prática do ensino a fim de aprofundar os conhecimentos e potencializar a

aprendizagem e, assim, possibilitar uma formação básica mais plena ao estudante.

A reformulação do currículo em nível nacional contemplou também a reformulação do

ensino de literatura, o que torna imprescindível um estudo mais atento do espaço dado ao

texto literário no Ensino Médio nos novos norteadores curriculares do país, sendo eles os

Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM e PCN+ e as Orientações

Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (OCNEM).

1.3.1 O espaço do texto literário nos PCNEM e PCN+

A partir da proposta do Ensino Médio, cuja diretriz atende à Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional – LDB, foi elaborado, no ano 2000, um documento que servisse de

parâmetro ao currículo, os PCNEM – Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino

Médio. A elaboração do documento baseou-se na “perspectiva de criar uma escola média

com identidade, que atenda às expectativas de formação escolar dos alunos para um mundo

contemporâneo” (BRASIL, 2000, p.4),e o respeito à diversidade tornou-se o eixo principal da

proposta global e adotado pela área das Linguagens, antes LinguagensCódigos e suas

Tecnologias, está substituindo a antiga área “Língua e Literatura”.

Este documento “é de natureza interpretativa e indicativa” e está direcionado

diretamente à escola, pois é nela que acontece “o encontro entre o pensar e o fazer, a

interatividade, o diálogo, a construção de significados na, pela, e com a linguagem”

(BRASIL, 2000, p.4). A tendência pelo termo das linguagens é justificada, pois, segundo os

PCNEM, é a linguagem que “permeia o conhecimento e as formas de conhecer, o pensamento

e as formas de pensar, a comunicação e os modos de comunicar, a ação e os modos de agir”

(BRASIL, 2000, p.5), e, no mundo contemporâneo sedento pela informação, as linguagens e

seus códigos articulados permitem aos alunos que leiam a si mesmos e ao mundo que estão

inseridos, garantindo uma “participação ativa na vida social, a cidadania desejada” (BRASIL,

2000, p. 6), algo possibilitado pela especificidade da leitura literária. Assim, sendo a

linguagem verbal apenas mais uma entre muitas e sendo o texto literário uma

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linguagemverbal, este tem sua especificidade ignorada e o seu papel na formação dos alunos,

configurando-o apenas como uma das muitas “linguagens”.

Os PCNEM evocam o termo interdisciplinaridade e intertextualidade, propondo

formar alunos que consigam “analisar, interpretar e aplicar os recursos expressivos das

linguagens, relacionando textos com seus contextos” (BRASIL, 2000, p.8),para saber

diferenciá-los e inter-relacioná-los. Além disso, os alunos devem estar aptos a “confrontar

opiniões e pontos de vista sobre as diferentes linguagens e suas manifestações específicas”

(BRASIL, 2000, p.8). Desse modo, o aluno teria conhecimento teórico suficiente para

construir um ponto de vista crítico, coerente diante de uma produção e do mundo, deixando de

ser um mero depósito de informações. Uma vez que o aluno possui tal habilidade crítica e

conhecimento diante das manifestações das linguagens, será possível ele compreender e

respeitar “a relação entre, nas,e pelas linguagens” (BRASIL, 2000, p.9) e utilizar-se delas

“como meio de expressão, informação e comunicação em situações que exigem

distanciamento e reflexão sobre os contextos”, atuar “como protagonista no processo de

produção/recepção” além de “compreender e usar a Língua Portuguesa como língua materna,

geradora de significação e integradora da organização de mundo e da própria identidade”

(BRASIL, 2000, p.10).

O estudo da língua materna, a partir do eixo interdisciplinar imposto pelos PCNEM,

exige um grande esforço e cuidados, uma vez que, com os novos parâmetros no currículo, não

há mais a separação entre gramática, literatura e produção textual. Não obstante, o estudo da

gramática e de questões linguísticasé prioritário e torna-se uma estratégia de como

produzir/compreender e interpretar textos, fazendo com que o estudo da língua materna possa

“pela interação verbal, permitir o desenvolvimento das capacidades cognitivas dos alunos”

(BRASIL, 2000, p. 17). O processo de ensino-aprendizagem da língua materna, a Língua

Portuguesa, deve, segundo o documento norteador, “pressupor uma visão sobre o que é uma

linguagem verbal”, sendo esta, caracterizada “pela construção de um sistema linguístico e

comunicativo em determinados contextos” (BRASIL, 2000, p. 18).

Os Parâmetros Curriculares priorizam o saber linguístico do aluno e, sendo o texto a

base da linguagem verbal, este se torna instrumento prioritário no trabalho em sala de aula. De

acordo com os PCNEM, “o texto é único como enunciado” (BRASIL, 2000, p. 19), mas abre

inúmeras possibilidades de atribuir significados e cabe à escola, a partir das aulas de Língua

Portuguesa, aprimorar o uso da linguagem verbal para que o aluno tenha instrumentos

suficientes capazes de potencializar seu desempenho na sociedade. Também é fundamental

que seja contemplado, nas aulas da língua materna, “o uso ético e estético da linguagem”

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(BRASIL, 2000, p. 22), a fim de compreender que é possível, na e pela linguagem, a

transformação social, cultural e pessoal.

Ao reorganizar suas prioridades, os PCNEM creditam à literatura e ao texto literário

um papel secundário, restringindo-os à área da leitura. Quando aborda a literatura em seu

texto, o documento, ao desconsiderar a sua especificidade, faz com que o texto literário seja

estudado em sala de aula como sendo apenas mais um tipo de textos, não levando em conta o

papel deste na formação dos alunos do Ensino Médio. Ainda, apesar de o ensino de literatura

ser reconhecido pelo documento, o texto literário, assim como os outros tipos de textos, têm o

mesmo grau de importância, não há uma hierarquia, um status, pressupondo que o texto

literário e outros tipos de textos, como o referencial, desempenham a mesma função. Mesmo

que esses outros tipos de textos contribuam para avançar nos índices de leitura, o texto

literário, devido a sua especificidade, exige um estranhamento por parte do leitor e uma

concepção de leitura específica e, por isso, precisa ser abordado em sala de aula de forma a

receber um tratamento diferenciado, no qual haja espaço para se refletir sobre a especificidade

da linguagem literária e a relação do texto literário com a vida social.

Aopropiciar ao aluno do Ensino Médio a leitura de textos literários, faz-se com que ele

tenha contato com um texto cujo léxico é muitas vezes superior ao que o aluno possui,

ajudando o estudante a ampliar sua habilidade no uso da língua. Segundo Gabriela Luft

(2014), presume-se que quando o leitor estiver apto para compreender plenamente um texto

literário, estará preparado para compreender qualquer tipo de texto, pois o literário, muitas

vezes, concretiza o uso mais complexo e elaborado da língua,além de oferecer espaço para

todas as possibilidades de interpretação que podem ser apresentadas pelos demais textos.

Desse modo, o texto literário em sala de aula não deve servir apenaspara ampliar a

competência linguística proposta pelos PCNEM. É preciso compreender a potencialidade do

texto e a natureza da literatura para que seja dada a devida importância a esta arte disponível

no ensino básico. Tal importância parte da compreensão, por parte do professor e dos alunos,

do que é literatura e qual a sua função. Partindo desse pressuposto, o documento norteador

não é enfático em relação à definição do que é literatura. O documento deixa em aberto uma

discussão: o que é levado em conta para classificar um texto como literário ou não literário?

Há uma infinidade de leituras e autores disponíveis e pelo fato de não serem bem vistos aos

olhos do discurso que legitima cânone, nem sempre as leituras realizadas na escola são

consideradas como literatura. Há certa desqualificação acerca do texto. Ler Machado de Assis

é mais importante do que ler livros da série “Crepúsculo”? O que o aluno deve ler? São

questões como essas que o professor encontra ao propor leitura de literatura no Ensino

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Médioe que são de suma importância. Quando se propõe formar leitores, é fundamental

conhecer o gosto dos alunos, o que estão lendo, independentemente do julgamento feito pela

crítica literária acerca das escolhas e gostos literários dos estudantes. Uma vez que se busca

aumentar o número de leitores e para tal visa-se à formação do aluno como leitor, propiciar

leituras que partem do gosto dos alunos contribui para potencializar a formação. Mesmo

sendo desprestigiadas pela crítica literária, tais leituras podem ser objeto de cotejo com textos

literários tradicionais, por exemplo.

Segundo Gabriela Luft (2014), por mais que haja uma tendência (comum até em livros

didáticos de literatura) em abordar autores e obras bem referenciados pela crítica literária e

ratificados como pertencentes ao cânone, o professor de literatura deve oferecer aos alunos

leituras não canonizadas, que não deixam de apresentar qualidade. Sempre há autores e obras

mais acessíveis para compreensão e que são porta de entrada para leituras mais complexas e,

assim, permitirão o acesso de leitores menos familiarizados ao universo literário. Iniciar com

leituras complexas pode fazer com que os alunos supostamente podem criar aversão à leitura

de textos literários.

No entanto, deve-se atentar para que os textos apresentados aos alunos não

subestimem a capacidade dos mesmos. Tal prática acontece quando se oferecem apenas textos

ao seu alcance, provenientes de seu contexto social ou que façam parte do seu vocabulário.

Para que isso não aconteça deve-se ouvir o aluno, isto proporcionará que suas experiências e

vivências sejam socializadas. A partir da socialização,pode-se diagnosticar o conhecimento

prévio internalizado pelo aluno. Para Luft (2014), o documento PCNEM nega a

especificidade e autonomia da disciplina, além de reduzir o deleite estético à condição de

divertimento e dar ênfase na liberdade de interpretação e julgamento do aluno. A autora

chama atenção ainda à orientação dada ao docente para a abordagem do texto literário em sala

de aula, a qual aponta um espaço para a literatura dividido com outros textos e recursos,

tornando a atividade com literatura uma dentre as várias possíveis para a prática de leitura e

desenvolvimento de habilidade de compreensão e interpretação de texto.

Sendo o foco a inter-relação entre linguagens, o trabalho isolado com o texto literário

não deve, segundo os PCNEM, ser privilegiado na sala de aula. Isso, por um lado, traz

benefícios, por outro, prejuízo. Benefício no sentido de mobilizar a prática de leitura

comparatista através do cotejo de vários textos de linguagens diferentes ou não. Prejuízo

porque assim se diminui o espaço para a literatura e consequentemente para a sua apreensão

enquanto objeto de humanização e formação crítica.

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Com os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio, há um visível

desaparecimento do ensino de literatura dos currículos escolares, o que preocupa docentes da

disciplina cuja formação é humanística. Pressupondo que a literatura forma um ser mais

humano, crítico, protagonista, capaz de ler e transformar sua realidade, o desaparecimento do

ensino da disciplina em sala favorece para o antagonismo crítico na transformação da

realidade, na desumanização e na alienação do sujeito.

Mais tarde, outro documento oficial do governo federal tratou da organização

curricular no Ensino Médio. Em 2002, foram elaboradoras novas orientações, a fim de

contribuir com as reformas educacionais definidas pela LDBEN – Lei 9.394 de 20 de

dezembro de 1996, os PCN+,vem ratificar a visão já adotada pelas diretrizes dos PCNEM de

2000.

A reforma do Ensino Médio, confirmada pela LDBEN de 1996, pretendia “[...]

promover competências gerais” (BRASIL, 2002, p.12), capazes de articular e intercambiar

conhecimento ao invés de apenas transmitir conhecimentos disciplinares padronizados. Logo,

o novo modelo de Ensino Médio, abordado nos PCN+, assume o objetivo de preparar o aluno

para a vida, qualificando-o para uma cidadania e capacitando-o para o aprendizado

permanente.

Em relação à literatura no novo documento, a única referência feita a ela leva em conta

a interdisciplinaridade e atribui ao ensino da literatura na escola uma prática balizada em

livros didáticos, o que incita um exercício docente pautado em materiais pré-elaborados e que

oferecem, muitas vezes, uma compreensão lacunar do texto literário. Ao ratificar a

interdisciplinaridade, os PCN+ apenas citam o que é necessário para as relações

interdisciplinares, mas não apresentam caminhos para a prática, dificultando o trabalho dos

professores, uma vez que, os Parâmetros deveriam ser a base norteadora para a ação docente.

A escola, ao priorizar o ensino de literatura pelo método tradicional regido pela

apropriação de informações acerca da historiografia literária, tende a mecanizar a literatura

em sala. Do contrário, o ensino de literatura deve priorizar a obra enquanto tal, para que o

aluno leitor usufrua do deleite estético, do estranhamento e da essência da obra.

Partindo desse entendimento, os PCN+ continuam extinguindo a literatura do currículo

e propõe à disciplina de Língua Portuguesa no Ensino Médio a função de formar leitores,

“inclusive das obras clássicas de nossa literatura” (BRASIL, 2002, p.71), o que, em termos de

estruturação do currículo, indica não haver um espaço reservado para a literatura como

conhecimento necessário ou indispensável à formação do estudante de Ensino Médio.

Propõeapenas a organização do conteúdo das aulas a partir de temas bases, abordando “o

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texto como representação do imaginário e a construção do patrimônio cultural” (BRASIL,

2002, p.74).

Sobre o conteúdo das aulas, o documento faz um alerta em relação à sua organização.

Para os PCN+, ao organizar o currículo desse nível de ensino separado por áreas afins, é

importante que o professor tenha conhecimento e entendimento claro da relação que sua

disciplina tem com as demais da área e do currículo. Assim, o professor deverá ter a

habilidade de transitar nas mais diversas áreas do conhecimento para que seja possível

contemplar a interdisciplinaridade abordada nos PCN+. Nestes, assim como nos PCNEM, a

literatura ocupa o mesmo espaço das demais linguagens, exigindo da escola que ela incorpore

os gêneros textuais que circulam na sociedade, pois: “se, na sala de aula, o estudante analisa

textos com os quais convive fora da escola, as relações que faz entre os conteúdos

disciplinares e sua vivência tornam-se muito mais significativas”(BRASIL, 2002, p. 78).

Denota-se, a partir de tais procedimentos, a intenção de se formar um leitor

proficiente, que tenha competência de ler os múltiplos textos a que tem acesso. E o texto

literário, nessa linha de raciocínio, deve ser um dos tipos de texto a serem desenvolvidos nas

práticas de leitura na sala de aula. Mas, apesar de haver claramente um gradativo apagamento

da literatura como disciplina e como conteúdo indispensável à formação do aluno, o

documento emite um posicionamento importante: a necessidade de se desenvolver no aluno a

habilidade de estabelecer relações entre o que lê e o que vivencia. E isso sinaliza, mesmo que

de forma tímida, um interesse na prática da leitura comparatista, pois estabelecer relações

entre vida literária e vida social é uma forma, por exemplo, de mostrar o quanto a literatura

pode dialogar com outras áreas do saber. Se, contudo, essa é uma perspectiva de trabalho

requerida para o Ensino Médio, será que há materiais didáticos para o ensino de literatura que

promovem a habilidade de reconhecimento pelo aluno das relações entre os textos? Que tipos

de exercícios de leitura estão sendo propostos para desenvolver a tão proclamada

“competência textual”? Esses livros são específicos para a literatura ou a literatura está

embutida no conteúdo de língua portuguesa?

Ao diluir a disciplina específica de literatura na disciplina de Língua Portuguesa, mais

uma vez, a literatura, segundo o que se depreende dos PCN+, é lançada para um lugar

comum, em que produções literárias se misturam com as não literárias. Fazendo isso, atribui-

se à literatura um papel insignificante no Ensino Médio. Além disso, tanto os PCNEM como

os PCN+, abandonam aosprofessores com suas sugestões superficiais e que, temendo serem

tradicionais, descaracterizam o ensino de literatura, tornando-o apenas uma prática

pedagógica.Fica justificado, portanto, o pouco êxito da escola em formar leitores devido à

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falta de alternativas, metodologias mais aprofundadas nos documentos oficiais que pudessem

se tornar viés para o ensino de literatura, logo, a difusão do gosto pela leitura literária.

Assim, é importante destacar que, tanto PCNEM quanto PCN+ convergem em pontos

polêmicos como: a diminuição do processo de assimilação da experiência com a literatura ao

pregar que esta era uma “literatura difícil” e assim substituiu-a por uma mais fácil; a

simplificação da aprendizagem literatura a um conjunto de informações em relação às obras; e

a substituição dos textos originais por fragmentos, resumos ou simulacros (FREDERICO;

OSAKABE, 2004). Essas questões foram analisadas em um novo documento elaborado em

2004. As críticas aos documentos publicados anteriormente possibilitaram que um novo

documento fosse elaborado por uma equipe de consultores e de leitores críticos, incluindo

Frederico e Osakabe. Assim, foram elaboradas as Orientações Curriculares Nacionais para o

Ensino Médio (OCNEM), que passam a ser tema da próxima seção deste capítulo.

1.3.2A contemplação da literatura nas OCNEM

O ensino de literatura acabou perdendo espaço nos documentos anteriores. Essa perda

se deu porque os seus conteúdos acabaram sendo “diluídos” no ensino da linguagem.

Justamente pelo fato dos documentos oficiais PCNEM e PCN+ não terem contemplado o

debate desse ensino, além de desqualificarem sua especificidade, foram elaboradas, em 2006,

as Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – OCNEM. Este novo

documento discorre, em um capítulo específico e elaborado por consultoras e leitores críticos,

sobre a importância da presença da literatura nos currículos do Ensino Médio.

Segundo uma das leitoras críticas envolvidas na elaboração das orientações,

HaquiraOsakabe (2004), a literatura possibilita sensibilizar o aluno e torná-lo mais crítico

perante o mundo e isso justificaria a presença do estudo do texto literário nos currículos

nacionais e nas salas de aula. No capítulo destinado aos conhecimentos de literatura, as

OCNEM conceituam a literatura “como meio de sensibilidade” (BRASIL, 2006, p. 52), e

como meio “de humanização do homem coisificado” (BRASIL, 2006, p.53).

O objetivo do ensino de literatura, segundo este novo documento, é humanizar o

aluno, além de construir “um conhecimento tão importante quanto o científico, embora se faça

por outros caminhos” (BRASIL, 2006, p. 52). Há nas OCNEM a perspectiva de Antônio

Cândido em relação à literatura. Segundo este autor, a literatura, além de possibilitar a

construção do conhecimento e da criticidade, tem um grande poder de humanizar o homem

(aluno) que está inserido numa sociedade cujas relações são coisificadas. Assim, a

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literatura,na visão de Cândido, “desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que

nos torna mais compreensivos e abertos para [...] a sociedade, o semelhante” (CANDIDO,

1995, p.249). O ensino da literatura, portanto, atende ao inciso 3º da Lei de Diretrizes e Bases

da Educação Nacional de 1996, que estabelece “aprimoramento do educando como pessoa

humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do

pensamento crítico” (BRASIL, 2006, p.53).

O documento ainda ressalta que, para conseguir alcançar humanização, o ensino

literário não deve centrar-se na historiografia literária, nos estilos e nas características das

escolas literárias. A prioridade deve ser “formar o leitor literário, [...] de „letrar‟ literariamente

o aluno, fazendo-o apropriar-se daquilo que tem direito” (BRASIL, 2006, p.54). Mas, o que

seria o letrar literariamente?

Segundo as OCNEM, o letramento literário é a apropriação da literatura e ocorre

através dessa experiência literária, a qual causa a sensação de estranhamento no leitor e se

torna possível através do contato direto com texto. A linguagem única do texto literário

permite ao leitor construir novas significações na medida em que utiliza da sua própria leitura

de mundo para dar um novo sentido ao texto lido, e, é por isso que o contato direto com a

literatura se torna o viés para o letramento literário, pois “a experiência construída a partir

dessa troca de significados possibilita [...] a ampliação de horizontes, o questionamento [...], o

encontro da sensibilidade, a reflexão, enfim, um conhecimento diferente do científico”

(BRASIL, 2006, p. 55).

Desse modo, para trabalhar a literatura, a leitura do texto literário é importante e

necessária, pois é “um acontecimento que prova reações, estímulos, experiências múltiplas e

variadas, dependendo da história de cada indivíduo. [...] A leitura resulta em interações

diferentes para cada um, como cada um poderá interagir de modo diferente com a obra em

outro momento de leitura do mesmo texto” (BRASIL, 2006, p. 67), ou ainda, relacionar o

texto lido com outros tipos de textos, contemplando assim, a intertextualidade tanto defendida

pelos documentos. Contudo, ao lermos o mesmo texto de diversas maneiras, evoca-se o

conceito de polissemia.

As OCNEM também definem, em seu texto, o conceito de texto literário como sendo

aquele que revela qualidade estética, e por isso, se distingue do não literário. Há hoje uma

infinidade de textos disponíveis para se trabalhar a leitura, entretanto, o próprio documento

alerta que, “nem tudo que é escrito pode ser considerado literatura” (BRASIL, 2006, p.55).

Para auxiliar a prática dos professores em sala em relação à literariedadedo texto ou não, as

Orientações Curriculares propõem seguintes indagações como critérios: “Há ou não

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intencionalidade artística? Quais os recursos utilizados para tal? [...] Proporciona ele o

estranhamento, o prazer estético?” (BRASIL, 2006, p.57).Há uma grande preocupação do

documento em relação ao lugar dos textos que não são canônicos. Segundo as OCNEM, “qual

seria o lugar do rap, da literatura de cordel, das letras de músicas e de tantos outros tipos de

produção, em prosa ou verso, no ensino de literatura?” (BRASIL, 2006, p.56).

Ao trabalhar o texto literário, não se deve visar apenas àsua fruição, mas também

analisar o modo como acontece a fruição desse texto. Sobre isso, o documento aborda duas

maneiras de fruir o texto: a individual, que pressupõe uma leitura solitária, silenciosa,

reflexiva, capaz de sensibilizar e aproximar o leitor do escritor; e a coletiva, que pressupõe

uma forma de potencializar a leitura individual através do intercambio de leituras e

experiências.

O capítulo sobre a literatura no documento também aborda reflexões sobre a leitura

literária. Segundo as OCNEM, “por meio da leitura dá-se a concretização de sentidos

múltiplos, originador em diferentes lugares e tempos” (BRASIL, 2006, p.65). Ainda sobre a

leitura literária, de acordo com o documento, a leitura do texto literário é “um acontecimento

que provoca reações, estímulos, experiências múltiplas e variadas, dependendo de cada

indivíduo” (BRASIL, 2006, p.67). Assim, ao ler o texto literário, é proporcionada ao aluno

uma experiência subjetiva diferente da proporcionada ao seu colega. Por isso, a partir da

leitura individual deve acontecer a leitura coletiva, em que as leituras individuais são

compartilhadas, para que ocorra a releitura da sua própria leitura individual, permitindo que o

aluno dê outro significado para o que já leu.

As Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio também pontuam sobre

como propiciar a leitura integral dos livros, algo tão defendido por Jaime Ginzburg (2012),

sem que essa leitura culmine em resoluções de exercícios ou provas. É necessário, segundo as

OCNEM:

[...] formar para o gosto literário, conhecer a tradição literária local e

oferecerinstrumentos para uma penetração mais aguda nas obras – tradicionalmente

objetivosda escola em relação à literatura − decerto supõem percorrer o arco quevai

do leitor vítima ao leitor crítico. Tais objetivos são, portanto, inteiramentepertinentes

e inquestionáveis, mas questionados devem ser os métodos que têm sido utilizados

para esses fins (BRASIL, 2006, p.69)

Dessa forma, é imprescindível que o ensino de literatura não seja condicionando

apenas aos textos do cânone, melhor ainda, a fragmentos destes textos, ou ainda à realização

de atividades superficiais e imediatistas com os textos literários. É crucial que os alunos

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tenham contato mais aprofundado e também conheçam outras obras significativas e

contemporâneas. O documento reconhece que

[...] a prática escolar em relação à leitura literária tem sido a de desconsiderara

leitura propriamente e privilegiar atividades de metaleitura, ou seja, a de estudodo

texto (ainda que sua leitura não tenha ocorrido), aspectos da histórialiterária,

características de estilo, etc., deixando em segundo plano a leitura dotexto literário,

substituindo-o por simulacros, como já foi dito, ou simplesmente ignorando-o

(BRASIL, 2006, p.70)

Há uma visão equivocada na prática escolar em relação à leitura literária. Muitos

professores partem do princípio que as atividades do estudo do texto contribuem para motivar

o aluno para a leitura. Ao mesmo tempo em queessas atividades de metaleitura são

necessárias, elas têm de ser desenvolvidas com muito cuidado, pois elas devem objetivar que

o aluno leia, e não “fazê-los refletir sobre os diversosaspectos da escrita: organização da

língua, história literária dos textos, estruturados textos literários, etc.” (BRASIL, 2006, p. 70).

Há um reconhecimento de que há uma grande dificuldade em tornar os alunos que ainda não

são leitores interessados pela leitura a partir de atividades de metaleitura, pois, se o aluno não

leu o texto, vê na leitura deste um pretexto para realizar exercícios e isso só contribui para o

afastamento do gosto pela leitura.

O documento ressalta que é de suma importância que o aluno se reconheça como leitor

e que sinta prazer nisso, ao mesmo tempo, que encontre espaços coletivos para compartilhar

sua leitura individual e, se o objetivo do ensino de literatura é “motivar para a leitura literária

e criar um saber sobre a literatura, é preciso considerar a natureza dos textos e propor

atividades que não sejam arbitrárias a essa mesma natureza” (BRASIL, 2006, p.72-73).

A partir do exposto, as OCNEM orientam que o ensino de literatura siga o caminho

inverso ao que é realizado nas escolas, fazendo com que o aluno tenha, inicialmente, contato

com a obra, com o texto em si, para que ocorram a fruição, o estranhamento, para somente

depois aprofundar seu estudo através da história da literatura. Ou seja, o documento prima

pela interpretação de texto, mas não propõe o ensino de literatura associado à compilação de

dados estanques dos períodos literários.

Desta forma, ao comparar com os documentos que lhe antecederam, o PCNEM e o

PCN+, as Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio podem frustrar o

professor do Ensino Médio justamente pela falta de orientações fundamentais para que este

encontre metodologias capazes de desenvolver ou potencializar a formação de um leitor de

literatura. Nesse contexto, ou professor mantém sua prática engessada e baseada a história

literária em relação ao texto literário, ou inova na sua abordagem, mas sem metodologias

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adequadas. Portanto, fica evidente que as OCNEM não orientaram o ensino de literatura,

função para a qual foram elaboradas, apenas diagnosticaram o seu ensino. Considerando tudo

isso, cabe pensar na “operacionalização” dessas orientações no material didático do professor.

Se, por um lado, sabe-se que a situação ideal seria o professor elaborar seu planejamento e

suas ações pedagógicas, por outro, nota-se que grande parte dos professores executa suas

funções docentes tendo como guia o livro didático, aliado do professor na tarefa de explicitar

conteúdos, desenvolver habilidades e exercitar leituras. Por isso, a necessidade de conhecer de

forma mais aprofundada o livro didático, apontando suas potencialidades e fragilidades.

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2. O LIVRO DIDÁTICO COMO FERRAMENTA PARA ESTUDO DA LITERATURA

NO ENSINO MÉDIO

2.1. Breve Histórico do Livro Didático no Brasil

A história do livro didático em nosso país tem ligação direta com nosso colonizador.

Os primeiros livros, conhecidos como Cartilha Maternal, com finalidade de didatizara

alfabetização e o ensino no Brasil eram exportadas pelo império de Portugal, no entanto, os

livros que eram mandados para a colônia eram de qualidade inferior, de folhas simples, não

possuíam capa dura, e chegavam comum valor elevadíssimo, permitindo que somente a elite

brasileira da época pudesse ter acesso a eles (SCHEFFERet al, 2007).

Em 1859, foi escrito o Manual Explicativo do Método de Leitura, por Francisco Alvez

da Silva Castilho que contemplava o método tradicional de ensino de leitura, partindo da

leitura coletiva do alfabeto para depois a leitura individual seguida de exercícios escritos. No

ano de 1880, Hilário Ribeiro produziu a Cartilha Nacional, na qual propunha uma

simultaneidade entre leitura e escrita. No mesmo ano ainda, é lançada a Cartilha da Infância,

de Thomaz Galhardo, que foi usada por um século, até 1980. (SCHEFFERet al, 2007).

A partir de 1889, com a Proclamação da República, o maior desejo do novo país era de

formar cidadãos republicanos, já que a nova situação e ordem política e social assim exigiam.

Porém, a maioria da população brasileira, operários, agricultores, negros alforriados, era

analfabeta. Solange Collares (2008) pontua no primeiro capítulo de sua dissertação de

mestrado que, desde os primeiros passos republicanos, a educação era de interesse da

oligarquia que estava no poder, logo, a minoria. Já a maioria da população vivia às margens

do processo escolar que era voltado para a preparação apenas da elite brasileira.A partir da

visão da autora, podemos perceber que a educação brasileira, desde a sua institucionalização,

já era discriminatória e desigual, pois contemplava apenas a formação de uma pequena elite

brasileira.No entanto, para mudar o cenário de analfabetismo entre os marginalizados,

pensou-se na expansão das escolas pelo Brasil.

Segundo Schefferet al (2007), em 1892, Felisberto de Carvalho publicouO primeiro

Livro de Leitura, em que deixa clara a técnica tradicional, a qual se deve manter no ensino.

Alguns anos mais tarde, em 1907, foi publicada a Cartilha Analytica, de Arnaldo Barreto, que

utilizava a decifração e a compreensão. Tal cartilha foi usada em muitos estados brasileiros e

dava ênfase ao sistema de ensino partindo de histórias formadas por frases e ideias lógicas.

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Em 1930, o Brasil adentrou a Segunda República, que perdurouaté 1937. Nesse

tempo, houve uma discussão muito grande em relação à escola. Os liberais, amparados pela

pedagogia da Escola Nova, defendiam uma escola laica, gratuita e obrigatória e havia aqueles

que defendiam uma escola aristocrática, tradicional. Em 1937, já no Estado Novo, foi criado,

pelo ministro Gustavo Capanema, o Instituto Nacional do Livro – INL. Este foi projetado

especificamente para formular políticas do livro didático de tal modo que contribuísse para

legitimar o livro didático nacional e, assim, aumentar sua produção além de divulgar e

distribuir obras de interesse cultural e educação (COSTA et al, 1997). Segundo Elaine Bender

(2007), a comissão do INL – Instituto Nacional do Livro exercia uma função voltada para o

político-ideológico do que para o didático, intensificando o controle sobre a produção e

circulação do livro. Começam a surgir, diante disso, críticas ao uso desse material.

Segundo Wanderley Costa et al (1997), a partir de acordos firmados entre o governo

brasileiro e americano na década de 1960, deu-se a criação, em 1968, da Fundação Nacional

do Material Escolar – FENAME. Na década de 1970, o Ministério da Educação e Cultura e a

Comissão do Livro Técnico e do Livro Didático – COLTED lançaram o livro Utilização do

Livro Didático:

[...] convencido o Governo Brasileiro da importância do livro e, em especial, do

livro didático, como instrumento básico para melhorar o rendimento escolar, que é

fundamento de uma verdadeira integração nacional, tornou-se imperativo que esse

livro alcançasse os alunos em todo território brasileiro e possuísse características

que, por seu conteúdo e apresentação atendesse “ao desenvolvimento físico e

social”. (BRASIL, COLTED, 1970, p. 11)

O livro didático, segundo esta comissão, deveria ser distribuído por todo país, para que

houvesse, através de um melhor rendimento escolar, um desenvolvimento social. Para tanto, a

COLTED ainda expôs alguns critérios que um bom livro didático apresentasse, entre eles,

uma capa durável ao manuseio e ilustrações atraentes que despertassema curiosidade do

aluno. Estas, segundo a comissão, deveriam estar relacionadas ao texto, refletir a realidade e

reforçar informações acerca do assunto abordado.

Wanderley Costa etal (1997) destacam que, no período entre 1970 e 1980,

intensificaram-se estudos críticos sobre o livro didático, enfatizando o conteúdo, o caráter

ideológico voltado para o sistema capitalista. Em 1985, foi criado o Plano Nacional do Livro

Didático, o qual introduziu a política da reutilização do livro didático por no mínimo três anos

e proporcionou aos professores a possibilidade de escolher os livros que seriam utilizados na

escola. No entanto, o grande financiador do livro didático ainda era o governo. A criança

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desprivilegiada sempre foi o motivo da política do livro didático, e isso fez com que crescesse

a disputa entre as editoras que tinham como estratégia programas sociais e qualidade da

mercadoria favorecendo a produção de livro para uma massa gigante da população.

A partir de 1994, no governo de Fernando Henrique Cardoso, houve uma expansão do

livro didático para todas as escolas públicas do Ensino Fundamental. Mais tarde, em 2006, no

governo de Luís Inácio Lula da Silva, a distribuição gratuita de livros didáticos para o Ensino

Médio, iniciando com as áreas de Língua Portuguesa, contemplando, também, a Literatura, e

Matemática e, posteriormente, contemplando as demais áreas. (COSTA; FREITAG; MOTA,

1997).

É importante destacar que há muitas discussões sobre o uso do livro didático nas

escolas e isso também tem se tornado inclusive tema para pesquisa por renomados

pesquisadores e institutos. KazumiMunakata (2012), em seu artigo O livro didático: alguns

temas de pesquisa,cita alguns trabalhos de pesquisa tendo como objeto o livro didático. O

autor chama atenção para o número dos trabalhos acerca do tema: nas décadas de 1970 e

1980, os trabalhos que tinham o livro didático como objeto de pesquisa não passavam de

cinquenta. Entre 1993 e 1995, eram 22 trabalhos. Em 1997, 26 pesquisas; em 1999, 79 e 46

em 2000. A partir de eventos específicos sobre o tema, como o “Simpósio Internacional do

Livro Didático: História e Educação”, em São Paulo, o número de trabalhos envolvendo o

objeto chegou a 800 entre 2001 e 2011.

Entre os temas das pesquisas apontadas por Munakata (2012), está a produção do livro

didático. A partir da implementação da política pública do livro didático gratuito, o mercado

editorial deu um grande salto, pois fez do livro didático sua mercadoria, sendo que sua

produção e distribuição são mediadas, em muitos países, inclusive o Brasil, pelo Estado. No

caso brasileiro, quem faz essa mediação entre editora e a escola (professores e alunos) é o

governo através do Programa Nacional do Livro Didático instituído em 1985. Somente a

partir de 1996 é que foram criados critérios de avaliação que interferissem diretamente na

oferta dos livros didáticos pelas editoras. O autor menciona o trabalho de pesquisa de Circe

Bittencourt, o qual apresenta um conjunto de temas e abordagens pelo livro didático. Ainda

aborda o livro a questão do livro didático como política pública educacional, a produção

editorial para o mercado, a inserção no mundo escolar como detentor do saber e as práticas e

usos desse material.

Célia Cristina de Figueiredo Cassiano (2007), em sua tese de doutorado O mercado do

livro didático no Brasil: da criação do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) à

entrada do capital internacional espanhol, pontua que a relação entre a política educacional do

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Brasil e o mercado dos livros didáticos é baseada por interesses políticos, comerciais e

educacionais. A autora ainda descreve que a política pública do PNLD faria do Estado

brasileiro o maior comprador de livros didáticos do mundo, o que atraiu grandes grupos

editoriais internacionais e reconfigurou o mercado editorial do país. Assim, o livro didático se

tornou um negócio lucrativo para as editoras, confirmando a relação apontada pela autora.

Esse mercado editorial de livros didáticos no Brasil, em 1990, foi liderado por nove

grandes editoras: Saraiva, Ática, FTD, Moderna, Atual, Scipione, Cia. Editora Nacional,

Editora do Brasil e o IBEP (CASSIANO, 2007, p.154). As nove editoras que vieram a

dominar esse mercado se consolidaram a partir da reforma da educação ocorrido com a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 4024/61. Essa lei possibilitou a expansão da

rede pública de ensino e, uma vez expandida, maior o mercado consumidor, o que acentuou o

negócio do livro didático (PAIXÃO, 1998, p.156). Outro fator que contribuiu para o aumento

do consumo de livros didáticos foi a promulgação da Lei nº 9.692/71, que aumentou o tempo

obrigatório de escolarização de quatro para oito anos.

O poder desse grande oligopólio editorial e a rentabilidade desse ramo faz com que, a

partir da implementação da escolha dos livros didáticos pelos professores, as editoras

começassem a fazer parte do cotidiano escolar. Divulgadores e representantes das editoras,

após a divulgação das obras didáticas aprovadas pelo PNLD e divulgadas pelo Guia do Livro

Didático e às vésperas da escolha do material didático pelos professores das escolas, visitam

as escolas e doam o material de sua empresa como divulgação, a fim de influenciar o docente

na escolha da coleção. Segundo Célia Cassiano (2007), é no momento em que se decide o

livro adotado pela escola que se concretiza a venda e, é por isso, que o marketing editorial

mantém maciça divulgação e contato com o protagonista dessa escolha, o professor.

Em relação à pressão editorial sobre os professores, Olga Molina (1988) já relatava

que:

[...] quem edita mais divulga mais e, com isso, forma-se um círculo vicioso: as

editoras mais poderosas exercem maior pressão sobre os professores (pela

distribuição de exemplares gratuitos e pela propaganda maciça) e, sendo mais

conhecidas, têm suas obras entre as mais escolhidas. [...] De pouco adianta poder

escolher quando não se sabe escolher. (1988, p.24).

A escolha, portanto, delegada ao professor, deve ser minunciosamente técnica e

crítica. Ao mesmo tempo em que é preciso observar os livros didáticos pela sua composição

técnica (conteúdos, ilustrações, entre outros), a análise crítica também deve ser levada em

conta. O professor, conhecendo a realidade em que está inserido (escola), deve priorizar,

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independentemente da pressão das editoras, o livro didático que melhor for aprimorar o

desenvolvimento intelectual do seu aluno.

Em relação a essa escolha dos livros didático, Célia Cassiano (2003) pontua que o

professor enfrenta grandes empecilhos na escolha: o tempo curto, normalmente apenas um

dia, que os professores têm para analisar o Guia distribuído e nem todos os professores o

recebem. Ainda relata que os pareceres do Guia são alvos de queixa por parte dos professores,

uma vez que são muito abstratos e só seria possível uma melhor análise tendo o livro em

mãos para manuseá-lo.

Segundo o Guia do Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio (2012), as obras

didáticas devem “favorecer o diálogo, o respeito e a convivência, possibilitando a alunos e

professores o acesso a conhecimentos adequados e relevantes para o crescimento pessoal,

intelectual e social dos atores envolvidos no processo educativo” (Guia PNLEM, p. 12). Ao

selecionar os livros didáticos para sua escola, os professores devem levar em conta essas

ressalvas feitas pelo Guia.

Além disso, uma avaliação adequada dos livros didáticos deve envolver conhecimento

da proposta dos documentos oficiais que regem a educação básica no país e também os

documentos internos da escola que balizam a ação pedagógica docente, como o Projeto

Pedagógico. De posse de todas essas informações, o docente teoricamente poderia realizar

uma avaliação mais precisa da adequação e pertinência dos livros didáticos, porém, para

poder realizar uma análise mais criteriosa é importante que os professores da rede pública de

ensino tenham acesso a todos os referenciais, a fim de escolher o recurso didático mais

propicio para sua realidade. É de suma importância que, para as análises e a seleção, os

professores levem em conta as reflexões críticas acerca do livro didático e da política do

Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)? Tendo em vista esta última

questão, propõe-se na próxima seção uma abordagem da distribuição de livros didáticos para

escolas públicas brasileiras pelo programa do FNDE.

2.2. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e os programas de

distribuição de livros para as escolas públicas brasileiras – PNLD e PNLEM

Visando ao financiamento de ações voltadas à educação básica foi criado, pela Lei nº

5.537, de 21 de novembro de 1968 e posteriormente alterado pelo Decreto – Lei nº 872, de 15

de novembro de 1969, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE, uma

autarquia vinculada ao Ministério da Educação. Esta autarquia adquire e distribui os livros

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didáticos em todo território nacional, além de executar importantes programas do livro. Entre

eles, estão o Programa Nacional do Livro Didático (PNLD), o Programa Nacional do Livro

para o Ensino Médio (PNLEM), entre outros.

2.2.1. O PNLD – Programa Nacional do Livro Didático

O Programa Nacional do Livro Didático – PNLD objetiva a distribuição de livros

didáticos à Educação Básica e assim subsidiar o trabalho dos professores em sala. O programa

é executado a cada três anos. As coleções dos livros didáticos passam por uma avaliação

criteriosa, posteriormente, o Ministério da Educação publicavao Guia de Livros Didáticos

com resenhas das coleções aprovadas que é encaminhado às escolas, onde os professores

escolhem, entre os títulos disponíveis, aquele que melhor atende a sua realidade e ao seu

projeto político pedagógico.

Em relação ao PNLD, Tânia Mariza Kuchenbecker Rösing (2012) afirma que o

programa é fundamental, pois o livro didático, muitas vezes, é “o único material de leitura ao

alcance dos alunos em situação de pobreza, podendo ser utilizados como apoio à formação da

cidadania” (2012, p. 101).O Guia do Programa Nacional do Livro Didático é uma importante

ferramenta para a escolha, pois contém uma análise criteriosa dos livros que compõem as

coleções. À escola é delegada a função de escolher duas coleções, a primeira escolha e a

segunda escolha, para que, caso a primeira opção não esteja disponível, o Fundo Nacional de

Desenvolvimento da Educação – FNDE faça o envio da segunda opção.

Em termos históricos, a política pública do livro didático no país acontece inicialmente

com a criação do Instituto Nacional do Livro (INL) em 1929, cujo objetivo era legitimar o

livro didático e fomentar sua produção. Posteriormente, foi criada a Comissão Nacional do

Livro Didático (CNLD) que visava aestabelecer uma política de legislação que contemplasse

a produção, distribuição e controle do material. Em 1945, foi instituído um controle mais

rigoroso sobre a distribuição dos livros didáticos. Em 1966, após um acordo firmado entre o

Ministério da Educação do Brasil e a Agência Norte-americana para o Desenvolvimento

Internacional é criado o COLTED – Comissão do Livro Técnico e Livro Didático cuja função

era coordenar, produzir, editar e distribuir os livros didáticos para aquele ano. A política do

livro didático foiimplementada em 1970 pela Fundação Nacional do Material Escolar –

Fenamee,em 1980, a política do livro passa a ser coordenada pela Fundação de Assistência ao

Educando – FAE (POSSARI, LINO, 2006, p. 21-22).

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A efetiva instituição do Programa Nacional do Livro Didático pode ser compreendida

a partir de três momentos. Sua criação se deu a partir do Decreto nº 91.542, de 19 de agosto

de 1985. Critérios para avaliação da qualidade dos livros foram estabelecidos em 1993. No

ano seguinte, publicou-se o documento “Definições de critérios para avaliação dos Livros

Didáticos” e, em 1996, iniciou-se o processo de avaliação pedagógica dos livros inscritos

pelas editoras para serem usadas no ano seguinte.

Segundo dados do próprio Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação,

disponíveis em seu sítio eletrônico, a distribuição dos livros didáticos para os alunos das

escolas públicas pelo PNLD leva em conta o cadastro do Censo Escolar do INEP. O Programa

Nacional do Livro Didático, diferentemente dos demais programas do FNDE que tem como

referência o número de matrículas do ano anterior, tem como base uma projeção de

crescimento das matrículas, criando, assim, uma reserva técnica de livros para garantir a todos

os alunos os livros do programa. É importante destacar que, neste programa, ocorre a

reutilização dos livros por três anos consecutivos.

Os dados do portal eletrônico do FNDE destacam ainda que, até o ano de 2005, a

escolha dos livros do programa se dava de duas formas: a centralizada e a descentralizada. Na

centralizada, todas as etapas estavam sob responsabilidade do FNDE e MEC, com exceção da

escolha que era feita pela escola e o monitoramento da distribuição em parceira do FNDE

com as Secretarias Estaduais de Educação. Já na descentralizada, ocorria o repasse dos

recursos para as Secretarias Estaduais de Educação que assumiam todas as etapas, levando em

conta as peculiaridades regionais, ficando apenas a fiscalizaçãosob responsabilidade do

FNDE.

2.2.2. O PNLEM – Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio

Em 2004, iniciou-se o PNLEM – Programa Nacional do Livro para o Ensino Médio,

criado pela resolução nº38 do FNDE que visa a universalizar os livros didáticos em todo país

e é mantido com recursos oriundos do Orçamento do Governo Federal. A Secretaria do

Ensino Médio e Tecnológico do Ministério da Educação, o FNDE e as Secretarias de

Educação são responsáveis pela execução do Programa. A primeira pela avaliação didática,

catálogos, resenhas, monitoramento e avaliação. O segundo, pela operacionalização, incluindo

compra e a distribuição.

A implantação desse programa é justificada pela progressiva extensão da

obrigatoriedade e gratuidade do Ensino Médio, explicitada na Portaria Ministerial 2.922/03,

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pautada no artigo 208, incisos I e II da Constituição Federal de 1988 e na LDB. É importante

destacar que o programa iniciou em 2006 com a distribuição universal dos livros didáticos de

Português e Matemática. Mais de sete milhões de alunos das três séries foram beneficiados no

início de 2006, com exceção dos estados do Paraná e Minas Gerais, por desenvolverem

projetos próprios. Atualmente, todas as escolas são contempladas com o material didático de

todas as disciplinas.

2.3. O livro didático e o ensino de literatura no Ensino Médio

O livro didático foi criado e adotado pelo Governo Federal para amenizar as enormes

desigualdades entre pobres e ricos e facilitou a prática pedagógica do professor em sala de

aula, pois abarcaria teoria, textos e exercícios, tornando, assim, o conhecimento mais próximo

do aluno. Porém, o livro didático levou os professores à perda gradual de sua autonomia, pois

grande parte do corpo docente o adotou como manual a ser seguido (COSTA; SUASSUNA,

2010). No que se refere ao livro didático de literatura para o ensino médio, percebe-se que o

texto literário perdeu espaço para outras linguagens nesse manual denominado de livro

didático.

Segundo Amanda Costa e Lívia Suassuna (2010), o livro didático foi pensado,

inicialmente, como um instrumento para o ensino, mas acabou visto como mercadoria que

visa ao lucro, e, levando-se em conta a lei do mercado, o lucro está acima da educação. Ao ser

visto apenas como mercadoria, ele enfrenta uma adequação às normas de consumo,

acarretando num distanciamento cada vez maior da finalidade para a qual foi criado.

Segundo Lígia Chiappini Moraes Leite (2005), o livro didático é um elemento

facilitador, pois traz o conhecimento mais próximo dos alunos e dos professores. Ainda

segundo a autora, os livros didáticos trazem uma concepção de ensino-aprendizagem

bancária, porque veem um aluno como um depósito vazio a ser preenchido por um professor

que passa a ser visto apenas como um intermediário do conhecimento presente no livro

didático e o aluno.A autora ainda aponta para outro dado importante: por ser um manual, o

conteúdo contemplado pelo livro didático torna o professor um mero repetidor, uma vez que o

livro apresenta, de certa forma, um roteiro para o ensino, e não proporciona nenhuma reflexão

acerca do ensinado, apenas acontece uma transmissão ao aluno, e este não tem o

discernimento de refletir, apenas armazena as informações. Então, quando se trata do texto

literário, que tem a função de levar à reflexão, a didatização do mesmo se deve, em partes, ao

suporte pelo qual o mesmo é veiculado, disseminado que são os livros didáticos.

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Para Regina Zilberman (1988),

[...] o livro didático concebe o ensino de literatura apoiado no tripé conceito de

leitura-texto-exercício [...] o conceito de leitura e de literatura que a escola adota é

de natureza pragmática, aquele só se justifica quando explicita uma finalidade – a de

ser aplicado, investido, num efeito qualquer (ZILBERMAN, 1988, p.111).

A autora destaca o uso do texto literário pelo livro didático cuja finalidade principal é

o de apropriação de informações através de exercícios. Assim, conformea visão da autora, o

texto literário perde sua essência artística e sua leitura se torna um mero objeto para

exercícios, perdendo sua função humanizadora, de reflexão e transformadora.

Outro importante problema acerca dos livros didáticos de literatura que é o modelo

utilizado para o ensino da mesma. O foco torna-se o ensino da história da literatura, em que se

estudam os estilos de época de forma cronológica, leituras de fragmentos de textos, uma lista

fechada de autores, o que priva o aluno de conhecer de forma mais aprofundada outros

autores e outras obras fazendo com que a leitura seja apenas superficial e em segundo plano.

O ensino da literatura em sala de aula está condicionado, em grande parte, ao livro

didático. Muitas vezes o primeiro contato do aluno com a literatura ocorre através dele. Mas

esse recurso pedagógico aborda, muitas vezes, de forma equivocada o ensino da literatura, por

muitas razões, dentre as quais a ênfase dada: a) à periodização da historiografia literária que

reproduz modelos de leituras; b) ao contato com fragmentos de obras e não da leitura da obra,

o que dificulta a compreensão do texto e a formação crítica resultante da análise do leitor, o

que indica uma forma de ensino criticada por Jaime Ginzburg. Segundo este autor, “por essa

razão, a imagem do conhecimento de literatura predominante [...] está associada a um campo

limitado do exercício do conhecimento. [...] O ensino da literatura se torna, desse modo,

alavanca para realização de provas” (GINZBURG, 2012, p. 212).

Hélder Pinheiro (2009) destaca a real necessidade de manuais para o ensino de

literatura, pois os que já existem não contribuem na formação de leitores de literatura e

levanta questionamentos sobre a forma como estes manuais tratam a literatura. O autor

destaca ainda que é importante a história da literatura, mas é de suma importância abandonar

o método de ensino ultrapassado que força a memorização, assim não valoriza experiências

reais de leituras, debater, analisar e interagir com o texto.Para o autor, em muitas situações, os

livros didáticos são suportes indispensáveis, porém pontua para os compreensíveis limites

desse recurso e para a necessidade de melhorias, embora sejam mercadorias, destes manuais

para cumprirem a função a que se destinam, formadores de pessoas.

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Mesmo sendo uma mercadoria, sua produção envolve vários aspectos, no entanto, os

manuais didáticos à disposição devem fortalecer o trabalho pedagógico do professor em sala

de aula de forma a se tornar um grande influenciador na formação de leitores. Segundo

Zilberman:

[...] a leitura é o fenômeno que respalda o ensino de literatura, e ao mesmo tempo, o

ultrapassa, porque engloba outras atividades pedagógicas, via de regra, de

tendênciamais prática. De modo que a literatura, enquanto evento cultural e social

depende de como a literatura é encarada pelos professores, por extensão, pelos livros

didáticos que encaminham a questão; pois, de uma maneira ou de outra, eles se

encarregam deorientar a ação docente em sala de aula (ZILBERMAN, 1991, p.94).

Segundo a autora, a formação de leitores a partir da literatura está diretamente ligada à

forma do encaminhamento da leitura. Mesmo os livros didáticos contribuírem para tal

formação, é a ação docente que orienta e forma efetivamente o leitor. Porém, se o professor

tornar o livro didático um manual a ser seguido fielmente e não se desvincular do mesmo, a

prática de formação de leitores fica ameaçada, culminando em pseudoleitores num sistema de

ideologia dominante representada no livro didático.

Por ser adotado pelas escolas, o livro didático necessita ser alvo de constantes estudos,

pois ele tem se mostrado incompleto, limitado, que não permite a construção da criticidade.

Por isso, o professor não deve fazer dele sua única fonte para o ensino e exige que busque

outros materiais para aprofundar o que os manuais didáticos abordam de maneira superficial,

panorâmica do todo.

Um professor desatento ou despreparado pode equivocar-se quando acredita que os

livros didáticos que adota para o ensino de literatura não necessitam de material de

complementação, que são completos. Tratar o livro didático como sendo condutor de suas

aulas como um manual de instrução traz grandes prejuízos tanto para a prática de ensino

quanto aos alunos em relação à construção do senso crítico e do conhecimento.A importância

delegada ao livro didático, pois, como recurso pedagógico, contribui para a formação moral,

social e intelectual do aluno, não devendo, portanto, ter uma inclinação para propagação de

uma ideologia dominante por parte dos materiais didáticos, ecompete à escola construir o

saber do ensino de literatura a partir do livro didático, instrumento mais usual em sala de aula.

O guia de livros didáticos do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) pontua

sobre a importância de se analisar um livro didático para sua utilização em sala de aula,

abordando a importância de se adequar o livro à realidade da sala de aula, abrindo

possibilidades de agregar outros recursos pedagógicos que não sejam os tradicionais para a

prática de ensino.

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Segundo o Guia:

[...] parte das concepções e, principalmente, das práticas didáticas “tradicionais”, se

manifesta nas exposições e/ou nas atividades propostas, num diálogo às vezes difícil

com as inovações pretendidas. Nesse sentido, podemos dizer que a discussão e a

assimilação, assim como o grau e a forma de adesão, a esses princípios, têm

marcado, no âmbito do LDP do EM, a oposição entre o ensino que podemos chamar

de “tradicional” e o “inovador” (BRASIL, 2012, p.14)

Nesse sentido, há a necessidade de não tornar o livro didático a única ferramenta no

processo de ensino de literatura, pois ele não atende às especificidades dos alunos em sala.

Dessa forma, necessita constante complementação em relação às suas informações e

atividades para contornar suas deficiências didáticas.

No entanto, o Guia alerta em relação ao ensino da literatura através do livro didático

que:

[...] em decorrência dos compromissos do ensino médio com a literatura, os

fragmentos ou excertos de obras literárias, em sua maioria de autores consagrados

de diferentes períodos históricos, no Brasil e em Portugal, compõem, em cada

coleção, coletâneas mais volumosas que as de outra natureza. [...] Por outro lado, é

bastante pequeno o espaço reservado à produção literária que não se identifica com

os cânones estabelecidos: a poesia produzida pelas periferias, a literatura dita

marginal, as obras menos visitadas de escritores consagrados, os autores

considerados regionais ou pouco conhecidos, os gêneros de menor prestígio (como o

conto ou o romance policial), a literatura oral e/ou popular. (BRASIL, 2012, p.19).

Segundo o alerta do Guia, nota-se uma predileção ao cânone, fazendo com que as

demais obras sejam consideradas inferiores, e dessa forma seu espaço é reduzido. Notrabalho

com o texto, o Guia do PNLD 2015 recomenda “uma abordagem de textos da tradição

literária brasileira e de língua portuguesa em geral, orientada para a formação do leitor de

literaturae secundada por um processo de construção de conhecimentos específicos”

(BRASIL, 2015, p.14). A historiografia literária e a cultura dominante dificultam o espaço

para tais manifestações na representação literária.

A recomendação pela abordagem de textos tradicionais, ou seja, do cânone brasileiro

já era recomendada na edição anterior do PNLD de 2012. Na época, o guia alertavaque:

“exposição da matéria segue uma sucessão cronológica de períodos, escolas, tendências e

estilos de época, cada um deles com os seus autores e obras principais, assim como gêneros,

concepções e procedimentos estéticos característicos” (BRASIL, 2012, p. 21). É importante

destacar que uma escola com práticas tradicionais de ensino tende a contemplar textos

literários reconhecidos pela crítica, uma vez que estão mais presentes em livros didáticos. No

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entanto, não se sugere rejeição ao cânone, pois este tem sua importância reconhecida. A

posição neste trabalho é a de que ele não deve ser apenas o único objeto de estudo e de leitura,

podendo dividir o mesmo espaço com textos literários menos prestigiados pela crítica.

As orientações curriculares para o Ensino Médio estabelecem a leitura literária, e não

os conhecimentos sobre a literatura, como o objeto específico de estudo.Como todas as áreas

de conhecimento possuem seu material didático que podem interferir de forma positiva como

de forma negativa em seu estudo, não seria diferente com a literatura. No livro didático, a

literatura, muitas vezes, está presa a padrões que massacram a ludicidade e a fantasia

inerentes ao texto literário e ainda retira a criatividade das aulas, impondo um padrão no uso

do texto e na maneira de interpretá-lo.

O livro didático é um recurso exclusivo para o uso escolar e as discussões em torno de

sua utilização trouxeram aprimoramentos, porém fora substituído por outros recursos

pedagógicos. Por ocupar um lugar de destaque entre os meios de ensino, há pontos positivos e

negativos em relação à escolha do livro didático. Se essa escolha for feita pelo professor, este

levará em conta a especificidade de sua classe. O mesmo acontece quando a escolha for feita

por um grupo maior de professores. Já quando a escolha ocorre por parte dos Governos

Federal e Estadual, é necessário ao selecionador conhecer de maneira profunda a área de

estudos, a realidade de ensino para uma análise criteriosa do material a ser usado.

Maria do Rosário Mortatti Magnani (1989) observa que os livros didáticos podem ser

o primeiro contato da criança com a leitura através do texto. Porém, ao contemplar a

literatura, os manuais distorcem e confundem o próprio sentido de literatura, tornando-a

apenas um objeto em que são explorados quesitos específicosda Língua Portuguesa, como

compreensão gramatical. Assim, o ensino de literatura está subordinado ao ensino da língua.

Mesmo os que consideram a literatura como uma disciplina autônoma demonstram

uma preocupação com um conhecimento que tem validade na prestação de provas e não para

uma apreciação das obras e formação do sujeito leitor. O ensino de literatura precisa ir além

desta prestação de provas, precisa ir mais afundo no conteúdo, pois segundo Bakhtin (1988),

não se consegue estudar literatura sem levar em conta o contexto cultural, porém ela não pode

ficar presa a uma época. É preciso levar em conta suas características e história, sem deixar de

lado a apreciação e fruição de seus textos.

Jaime Ginzburg (2012) chama atenção para a desconfiguração do uso do texto literário

em sala e pelos livros didáticos. Para ele, os livros didáticos apenas apresentam informações

historiográficas, autores e fragmentos de textos literários. A grande preocupação dos livros

didáticos é oferecer maior número possível de informações ao aluno para que este tenha bom

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êxito em provas, nos vestibulares ainda existentes, e exames nacionais pertinentes ao Ensino

Médio e não na construção do senso crítico, de um ser mais humano e mais cidadão.

Diniz (1994) denuncia tal prática apontada por Ginzburg em relação ao uso

fragmentado do texto literário em sua dissertação A trama do texto no livro didático. Para ela,

a leitura direcionada pela obra didática, além de restringir as inúmeras possibilidades de

leitura que o aluno poderia realizar diante do texto literário, determina qual é o entendimento

que ele vai ter.Direcionar a leitura através de obras didáticas pode limitar a interpretação e

descaracterizar a função polissêmica do texto, uma vez que, os livros didáticos para a grande

maioria dos alunos é o primeiro contato com o texto literário, no entanto, os livros em sua

maioria, resumos ou fragmentos de obras literárias, o que não permite ao aluno o

conhecimento integral da obra e assim limita a sua interpretação.

Francisco Savioli (1997) pontua que há muitos educadores contra a utilização do livro

didático, uma vez que veem sua estrutura como prejudicial, pois, congela o saber, e uma vez

congelado, acaba por destruí-lo. Porém, o autor destaca que essa posição tão radical pode

privar tanto a escola quanto os professores de um recurso pedagógico, que pode ser um

excelente auxílio à prática em sala de aula. O autor ainda destaca alguns pontos positivos do

bom uso do livro didático, entre eles, o de possibilitar o acesso em qualquer lugar ao conteúdo

adquirido e sintetizado nos manuais. Assim, se contemplar atividades coerentes,

sistematizadas, os livros passam a ser um material portátil de estudos.

Essa perspectiva de Francisco Savioli (1997) em relação ao uso do livro didático se

difere com a que Leite (2005) defende. Lígia Chiappini Moraes Leite (2005) faz uma reflexão

acerca das pesquisas acadêmicas cujo objeto é o livro didático. Ela chama atenção que esses

trabalhos são de suma importância, e que deveriam, não só mostrar o seu objeto como

simplificador de conhecimento ou disseminador dos valores dominantes. Deviam romper as

barreiras da academia e se tornarem instrumento de transformação da realidade. A autora

ainda destaca a necessidade de desmitificar a ideia de que um país subdesenvolvido necessita

de livros didáticos e que a lacuna entre ensino e pesquisa, assim como a distância entre

especialistas, professores e alunos devem ser diminuídas para que realmente se possa ter uma

transformação sólida e eficaz.

É fato que os livros didáticos não substituem os livros de literatura, porém sua

eficiência pode ser questionada. Segundo Bender (2007), o livro didático é um mal

necessário, levando em conta as reflexões críticas acerca do mesmo, mas ao mesmo tempo,

sua distribuição é um benefício para uma estrutura educacional precária. É importante

destacar que, mesmo o uso livro didático sendo criticados por inúmeros estudos, ele pode ser,

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em muitas escolas, o único material disponível para o ensino. Assim, não há como negar a

força e a persistência dos livros didáticos, pois, mesmo depois de tantas reformulações de

ensino e ataques quanto ao seu uso, permanecem e cada dia se apresentam com novas

propostas e novas capas. É importante salientar que a força que os mesmos possuem não a

adquirem sozinhos. Há uma estrutura, tanto política como pedagógica, por de trás de sua

produção e consumo. Porém, o aval é dado pela escola e pelo professor e cabe a estes

selecionar o material mais adequado e de maior qualidade a partir de um rol de coleções já

determinado pelo Guia do PNLD.

Ana Paula Porto e Luana Teixeira Porto (2014) abordam a seleção dos livros didáticos

em seu artigo “Formação de leitores e livro didático: potencialidades e desafios no ensino de

literatura”. Para as autoras:

[...] a qualificação do ensino de literatura na escola no nível médio exige que cada

docente saiba selecionar adequadamente o livro didático que lhe dará suporte para

desenvolver práticas de leitura da literatura. Mesmo que o governo federal

estabeleça uma pré-seleção de livros didáticos a serem trabalhados nas salas de aula

- e isso implica uma liberdade mais restrita ao docente na escolha desse material

pedagógico impresso -, o professor tem a chance de eleger, entre as opções

disponíveis, aquele livro didático que considera mais oportuno para sua prática de

ensino-aprendizagem. (PORTO; PORTO, 2014, p.10).

De acordo com as autoras, o professor deve estar muito bem orientado ao selecionar os

livros didáticos, observando suas potencialidades e qualidades para que o ensino de literatura

consiga formar leitores. Ao abordar o uso dos livros didáticos no ensino de literatura, as

autoras consideram, ainda, que:

[...] o livro didático de literatura deve ter como meta favorecer o acesso ao texto

literário, estimular o prazer do aluno em ler o texto, propor atividades pedagógicas

que estimulem o desenvolvimento da habilidade de interpretar textos e ainda

relacionar literatura com outras formas da expressão humana, identificando diálogos

entre literatura e outras artes ou outras disciplinas. Acreditamos que o livro didático

deve colocar o aluno em contato com o texto literário e propor condições para que o

sentido do texto seja construído pelo leitor, o que implica rejeitar qualquer

proposição didática que explore o texto literário como pretexto para outra atividade

que não se relacione à interpretação textual, como as tradicionais aprendizagens

linguísticas e gramaticais abordadas com base no exame da linguagem do texto

literário. Além disso, entendemos que o livro didático deve possibilitar a interação

do leitor com outros objetos, artísticos ou não, como obras de outros campos do

conhecimento e obras construídas com linguagens diferentes da linguagem literária,

como o cinema e a pintura, e ainda com outras disciplinas, como a história e as artes.

Tal proposição poderia contribuir para uma formação escolar amparada na leitura de

diferentes linguagens e na integração de diferentes áreas do saber. (PORTO;

PORTO, 2014, p.10).

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A partir do exposto pelas autoras, nota-se a dificuldade de formar o aluno um leitor de

literatura, pois,muitas vezes, o material didático disponibilizado está dirigido para o

reconhecimento de características explicitadas de antemão e cobradas em exercícios,

limitando o encontro com o texto artístico, às descobertas que motivem o desenvolvimento do

gosto e a própria fruição do texto.

Por ser o texto literário um texto artístico, seu valor não está apenas na mensagem que

ele transmite, mas na forma como ele o veicula esse valor. Ao respeitar essa função estética

do texto literário, o leitor construirá uma relação estética com o texto, e esta, possivelmente,

pode aproximar o leitor do mundo da leitura. Pelo fato de o livro didático estar mais presente

no dia a dia dos alunos, ele pode contribuir para que se estabeleça essa relação estética com o

texto literário através da fruição. Considerando a literatura uma arte, a relação estética com o

texto literário não se dá através da transmissão e interpretação de informações, mas através do

sentir, do perceber a si mesmo e a obra como um todo.

Em seu artigo “A formação estética e literária por meio do livro didático”, Janete

Brindon et al (2012) se questionam em relação à abordagem do texto literário nos livros

didáticos. A preocupação das autoras acerca dos livros didáticosé se os mesmos respeitam a

naturezaficcional da literatura e contribuem para essa formação estética do aluno, além de

permitir o leitor estabelecer relações com a literatura. Ainda, segundo as autoras, cabe à

escola a formação de leitores e promoção do contato do aluno com o texto literário, e em

muitos casos, ela acaba sendo o principal lugar, senão o único, de acesso ao livro. Portanto,

tem de se atentar à forma como o texto é disponibilizado ao aluno, pois ela é fundamental

para que o texto seja percebido como objeto de fruição, de deleite e não um mero transmissor

de informações, desconstruindo uma relação de cumplicidade entre o texto e o leitor.

É importante salientar que o livro didático é uma realidade presente e de forma maciça

na prática docente em sala de aula das escolas públicas brasileiras. Sua importância é oriunda

por ofertar, de forma igualitária e gratuita, o conhecimento sobre literaturapara seus alunos,

independente de classes sociais. Mas há de se destacar que o livro didático não deve ser o

único material presente nas salas de aula, pois há outras inúmeras possibilidades de se estudar

literatura e de se formar leitores, utilizando outros recursos pedagógicos. Mesmo sendo uma

realidade nas escolas, ele deve ser adotado como um material complementar, como forma de

potencializar o ensino e a formação de leitores.

Mas como promover o contato do texto literário com o aluno e sua fruição para que

este se forme leitor a partir do material disponibilizado, o livro didático? É por isso que a

qualificada seleção dos livros didáticos pelos professores é de suma importância. E o que

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levar em conta na análise dos livros didáticos? Que critérios considerar? No próximocapítulo,

apresenta-se um roteiro de análise que será utilizado para analisar os livros didáticos

disponibilizados para a escolha dos professores pelo PNLD 2015.

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3. O ENSINO DE LITERATURA NO LIVRO DIDÁTICO: OBRAS DO PNLD 2015

3.1. A construção de um roteiro de análise do livro didático de literatura

3.1.1. A delimitação dos objetos

Para estudar a presença daliteratura no Ensino Médio, as potencialidades e fragilidades

do ensino e leitura da prosa brasileira contemporânea propostos em livros didáticos de

literatura para o Ensino Médio é importante analisar o livro didático oferecido para a escola

pública brasileira para esse nível de ensino, identificando seu potencial para a formação do

leitor. Para isso, elegeu-se investigar as obras didáticas disponibilizadas pelo Fundo Nacional

de Desenvolvimento da Educação, que distribui livros didáticos a escolas públicas através do

Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).

Este programa, desde 20101, avalia livros didáticos mediante edital público e seleciona

as coleções que serão apresentadas aos professores para que escolham os livros/autores que

subsidiaram o ensino de língua portuguesa e literatura. Para um exame de coleções

atualizadas, elegemos como objeto de estudo obras didáticas disponibilizadas pelo PNLD para

o período 2015-2017, as quais estão apresentadas no Guia de livros didáticos: PNLD 2015:

Língua portuguesa: ensino médio. A escolha pelos livros didáticos desse período justifica-se

pelas seguintes razões: necessidade de avaliação crítica dos livros didáticos adotados

recentemente nas escolas públicas brasileiras de Ensino Médio; relevância de exame de

materiais didáticos em uso atualmente; necessidade de reflexão crítica sobre a forma como o

ensino de literatura tem se apresentado nas últimas publicações didáticas, o que permitirá

discutir o espaço dado aos textos literários nos recursos pedagógicos mais atualizados.

O Guia de livros didáticos: Língua portuguesa: ensino médio, PNLD 2015 é composto

das seguintes coleções: Português: língua e cultura, autor Carlos Alberto Faraco; Português:

contexto, interlocução e sentido, autoria de Maria Luiza M. Abaurre, Maria Bernadete M.

Abaurre e Marcela Pontara; Língua Portuguesa, dos autores Roberta Hernandes Alves e Vima

Lia Martins; Português: linguagens em conexão, autoria de Maria das Graças Leão Sette,

Márcia Antônia Travalha e Maria do RozárioStarling de Barros; Português: linguagens, de

William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães; Vozes do mundo: literatura, língua e

1 O Decreto n. 7.084, de 27 de janeiro de 2010, apresenta regras sobre os programas de material didático

subsidiado pelo Governo Federal.

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produção de texto, dos autores Maria Tereza Arruda Campos, Lília Santos Abreu- Tardelli,

Lucas Sanches Oda e Salete Toledo; Viva Português, de autoria de Elizabeth Campos, Paula

Marques Cardoso e Sílvia Letícia de Andrade; Ser protagonista: língua portuguesa, dos

autores Cecília Bergamin, Marianka Gonçalves Santa Bárbara, Matheus Martins e Ricardo

Gonçalves Barreto; Novas Palavras, dos autores Emília Amaral, Mauro Ferreira, Ricardo

Leite, Severino Antônio e Língua Portuguesa: linguagem e interação, dos autores Carlos

Emílio Faraco, Francisco Marto de Moura e José Hamilton Maruxo Júnior.

Considerando que, em uma pesquisa de mestrado, o tempo paraainvestigação

aprofundada é curto, foi necessário delimitar o número de objetos a serem analisados. Dessa

forma, foram escolhidas quatro coleções para análise: Português: língua e cultura, autor

Carlos Alberto Faraco; Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto, dos autores

Maria Tereza Arruda Campos, Lília Santos Abreu- Tardelli, Lucas Sanches Oda e Salete

Toledo; Português: linguagens em conexão, autoria de Maria das Graças Leão Sette, Márcia

Antônia Travalha e Maria do Rozário Starling de Barros e Português: linguagens, de William

Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães.

A eleição dessas quatro coleções obedeceu a critérios, como diversidade das propostas

para o ensino de língua e literatura entre as obras; a diferença de posição das editoras (editoras

menores e maiores em termos de quantidade de publicações, editoras mais conhecidas e

menos conhecidas no cenário atual da educação, editoras com maior e menor distribuição de

obras no país); a trajetória das editoras na publicação de obras didáticas, além de serem as

coleções disponibilizadas pelas editoras para análise, escolha e adoção por parte da escola em

que o pesquisador leciona.

Segundo dados do PNLD 2015, disponíveis no site do FNDE, as coleções da

disciplina de Língua Portuguesa para o Ensino Médio mais distribuídas são das editoras

Saraiva (2.460.988 livros), FTD (1.548.498 livros), Editora Ática (926.095 livros), Editora

Moderna (822.319 livros), Editora Leya (677.698 livros), Editora SM (631.835 livros),

Editora Positivo (297.447 livros) e Editora Base Editorial (203.332 livros).

3.1.2. A escolha do tópico temático para análise

O estudo sobre o livro didático de literatura e a reflexão sobre as atividades de leitura,

análise e interpretação dos textos não seria possível de ser realizado, tendo em vista toda a

produção literária do paísapresentada nos recursos pedagógicos. Assim, como seria inviável

analisar todo o conteúdo do livro, escolhemos analisar nas coleções didáticas a prosa

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contemporânea, especialmente porque ela não se vincula à ideia tradicional de “escolas

literárias” e também porque é uma ficção que possibilita um diálogo mais estreito com o

contexto de produção e com as vivências dos alunos do ensino médio, que, enquanto leitores e

sujeitos inseridos no contexto social, podem reconhecer suas experiências de vida nas

narrativas. Pensa-se que, desta forma, será mais produtivo analisar a proposição didática dos

livros com textos literários que estão mais próximos dos horizontes culturais e sociais do

estudante do século XXI.

Além disso, a opção por examinar a prosa contemporânea nas coleções didáticas

permite identificar a literatura (e as artes) do tempo atual, mostrando o quanto a expressão

estética pode ser uma interpretação do mundo vivido, atividade de relação que é também

exigida ao aluno do Ensino Médio, como propõe os PCN‟s e também enfatizado por Antônio

Candido, que vê na literatura a consolidação do conhecimento no meio social, sobretudo no

homem participante desse meio, neste caso o aluno.

A delimitação do estudo da prosa brasileira contemporânea em detrimento da poesia

justifica-se pela tendência dos alunos de ensino médio em ler textos narrativos e não de ler

textos em verso. A tendência em não ler textos em verso justifica-se, em partes, pelo ensino e

atividades equivocadas desse gênero. Assim, considera-se mais pertinente investigar o

potencial do livro didático para a abordagem de textos que são mais familiares ao universo do

público estudantil.

Nessa perspectiva, considera-se importante reconhecer o papel do escritor dessa

literatura contemporânea. Para Karl Schollhammer (2009), o escritor contemporâneo é

movido por uma necessidade urgente de se relacionar com a realidade histórica. E essa

urgência é expressão da dificuldade do escritor lidar com o mais próximo e atual, e aceitar sua

realidade é enxergar a margem, antes nunca vista. Na literatura, os escritores encontraram

caminhos para interagirem e se relacionarem com esse mundo que o tempo presente

dificilmente captura.

O presente contemporâneo é desafiado “em dar respostas a um anacronismo ainda

tributário de esperanças que lhe chegam tanto do passado perdido quanto do futuro utópico”

(SCHOLLHAMMER, 2009, p.12). O passado se apresenta enquanto perdido, oferecendo seu

testemunho, enquanto o futuro só tem sentido por meio de promessas redentoras e

libertadoras.

Há uma insistência e preocupação, por parte dos escritores das gerações mais recentes,

pela criação de sua própria presença e, com as novas tecnologias, vários caminhos são

oferecidos dando maior visibilidade da sua escrita, além de se encontrar mais facilidade de

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publicação no contexto contemporâneo. Percebem-se, também nessa geração de escritores, a

falta de possibilidade de intervenção e a recuperação do elo com a atualidade. Essa

impossibilidade ainda dos desafia a reinventarem as formas históricas do realismo literário

numa literatura que trabalha com problemas do país e que expõe suas questões vulneráveis.

A prosa contemporânea brasileira caracteriza-se, portanto, por pretender investigar

temáticas presentes no cotidiano da sociedade, como violência, o consumismo e seus

desdobramentos nas relações sociais, etc. O leitor encontrará, nos diversos gêneros

contemporâneos, como o romance, crônicas, contos, minicontos, entre outros, personagens

não adaptadas às mudanças do mundo pós – moderno, pelo retrato da miséria social e pessoal

dos indivíduos que perambulam pela vida e pelas margens das grandes cidades em busca de

sentido para sua existência. Pelo fato de os temas da ficção contemporânea brasileira

dialogaremcom uma realidade próxima, entende-se que estudá-los na escola é fundamental e

analisar como aparecem nos livros didáticos é, também por isso, necessário.

3.1.3. Um roteiro para avaliação de livro didático de literatura

O exame crítico do livro didático, com vistas a identificar suas potencialidades e

fragilidades, é realizado através da adoção de um roteiro para avaliação das obras. Seguindo o

estudo de Porto e Porto (2014), procurou-se adaptar e ampliar o quadro de análise proposto

pelas autoras para analisar criticamente a qualidade das atividades de leitura, análise e

interpretação dos textos apresentados nas seções sobre prosa contemporânea nos livros

didáticos, além de indicação de materiais suplementares para o estudo do texto literário.

Dessa forma, foram apontados os seguintes tópicos para análise: apresentação

pedagógica do livro, atividades didáticas para leitura de literatura; contextualização da prosa

contemporânea; indicação de material suplementar para estudo. Todos esses elementos de

análise estão apresentados no quadro a seguir e seguem um caminho avaliativo diferente do

proposto pelo Guia do livro didático, uma vez que se procura nesta investigação discutir as

potencialidades e fragilidades do livro didático como instrumento de formação de leitor de

texto literário.

O roteiro para avaliação de livro didático de literatura pensado para esta pesquisa leva

em conta a tendência pedagógica do livro e sua atenção aos documentos oficiais que norteiam

o ensino bem como sua proposta de leitura da literatura. Ao analisar as atividades didáticas

para a leitura da literatura brasileira na escola, no ensino médio, pretendemos examinar a

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potencialidade dos exercícios propostos para desenvolver no aluno habilidades fundamentais,

como a análise e a interpretação de textos, a comparação entre textos, a mobilização do

conhecimento prévio, a contextualização dos temas propostos para discussão ou estudo. Em

relação ao tema escolhido para análise dos livros, a prosa contemporânea brasileira,

buscamoscompreender que tipo de conhecimento sobre essa literatura está sendo construído

via livro didático. Para isso, será dada atenção também a pesquisas que refletem sobre a prosa

contemporânea. Por fim, o foco da análise será o material suplementar que pode ajudar tanto o

aluno quanto o professor a ler literatura e a desenvolver uma maior compreensão sobre o texto

literário, já que os livros didáticos dispõem de uma seção para isso.

QUADRO 1 - Roteiro para avaliação de livro didático de literatura

Proposta pedagógica do livro

1 O livro didático apresenta explicitação dos seus objetivos e metodologia de

ensino-aprendizagem

2 O livro didático atende à proposta curricular para o Ensino Médio explicitada

em documentos oficiais (PCN, PCNEM, PNC+ e OCNEM)

3 O livro didático orienta o docente para a execução das atividades propostas

4 Existe uma concepção de leitura da literatura baseada em reflexão teórica

acerca da literatura

Atividades didáticas para leitura da literatura

1 O livro didático propõe atividades com base em textos literários integrais

2 O livro didático propõe relacionar diferentes textos de um mesmo autor

3 O livro didático apresenta atividades de análise de texto literário

4 O livro didático apresenta atividades de interpretação de texto literário

5 O livro didático apresenta atividades para estabelecimento de relação do texto

literário com o contexto social de produção

6 As questões para análise e interpretação do texto literário privilegiam a

possibilidade de mais de uma interpretação do texto

7 O livro didático mobiliza o conhecimento prévio do aluno acerca dos temas

abordados

8 O livro didático contextualiza os temas literários abordados

9 O livro didático possibilita a apropriação de conceitos teóricos e sua inter-

relação com práticas concretas de leitura do texto literário

10 O livro didático apresenta atividades para exercício do cotejo entre textos

literários e não-literários

11 O livro didático apresenta atividades para inter-relação entre literatura e outras

áreas do saber

12 O livro didático apresenta atividades para fruição estética do texto literário

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13 O livro didático apresenta atividades para reflexão crítica sobre o texto

literário

Contextualização da prosa contemporânea brasileira

1 O livro didático apresenta adequada seleção de conteúdos, autores e obras

adequados para o conhecimento sobre a prosa contemporânea

2 O livro didático apresenta adequada sistematização das tendências estéticas e

das tendências temáticas da prosa contemporânea

3 O livro didático apresenta referencial bibliográfico e digital atualizado para

ampliação do conhecimento sobre prosa contemporânea

4 O livro didático apresenta possibilidade de estudo da prosa contemporânea

produzida por autores prestigiados/valorizados pela crítica literária

5 O livro didático apresenta possibilidade de estudo da prosa contemporânea

produzida por autores menos prestigiados/valorizados pela crítica literária

6 O livro didático apresenta possibilidade de estudo da prosa contemporânea

através de diferentes gêneros literários

7 O livro didático apresenta possibilidade de associação da prosa literária

contemporânea a outras formas de arte

Indicação de material suplementar para estudo

1 O livro didático apresenta indicação de material suplementar para estudo do

professor

2 O livro didático apresenta indicação de material suplementar para estudo do

aluno

3 O livro didático incorpora estudos acadêmicos sobre a prosa contemporânea

4 O livro didático apresenta fontes de multimídia para estudo da prosa

contemporânea

Este quadro procura contemplar tópicos e questões para uma análise global do livro

didático adotado como instrumento pedagógico no Ensino Médio e norteia a avaliação neste

trabalho das obras didáticas eleitas para receber um olhar crítico. A análise dos livros

didáticos é apresentada nas seções seguintes.

3.2. Livros didáticos em análise: obras do PNLD 2015

3.2.1 Português: língua e cultura:a literatura como pretexto para ensino da língua

A coleção Português: língua e cultura é composta por três volumes (1º ano, 2º ano e 3º

ano do Ensino Médio), havendo a indicação de que cada livro seja adotado em uma série do

Ensino Médio, o que pressupõe uma divisão de “conteúdos”, autores e obras estabelecida

previamente e que atende a uma organização tradicional do ensino de literatura na escola

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baseada numa perspectiva cronológica. É importante registrar ainda que o volume destinado

ao terceiro ano constitui-se de uma “revisão” das tendências literárias no decorrer dos tempos,

sugerindo que o terceiro ano do Ensino Médio seja o momento formativo adequado para

consolidar a compreensão do estudante acerca dos principais períodos literários. Assim, o

autor contextualiza a literatura na Idade Média e no período Clássico e segue a apresentação

sintética de autores, obras e tendências nos tempos históricos posteriores até chegar à

contemporaneidade.

A análise sobre a coleção de Faraco está centralizada no livro do 3º ano, pois é nele

que se encontra o tópico principal eleito para observação em nosso trabalho, a prosa brasileira

contemporânea. O livro Português: língua e cultura foi elaborado pelo autor Carlos Alberto

Faraco e distribuído pela Editora Base Editorial, da cidade de Curitiba – Paraná. Este livro

didático faz parte das obras aprovadas pelo Ministério da Educação para compor o Programa

Nacional do Livro Didático de 2015. Dessa obra foram distribuídos mais de 200 mil

exemplares às escolas públicas brasileiras. É compostopor 320 páginas de folhas brancas,

porém em todas elas há a presença de colorido e possui em sua capa bem chamativa e colorida

a presença de uma obra de arte, que remete à ideia do título do livro de que a língua é cultura.

Na apresentação do livro, na terceira página, o autor pontua que o objetivo maior dessa

coleção é oportunizar ao aluno que este possa ampliar “seu conhecimento sobre nossa língua,

e ao mesmo tempo, melhorar o domínio das atividades de leitura, escrita e fala” (FARACO,

2013, p. 3), e, assim, estará atendendo à proposta curricular para o Ensino Médio, presente

nos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio – PCNEM e PCN+.

Além disso, o livro, nas palavras de apresentação do autor, aborda a linguagem verbal,

suas estruturas e função social. O texto literário, segundo Faraco, ocupará “posição de

destaque na coleção” (2013, p. 3), pois ele é uma indispensável para se fazer “uma leitura

mais qualificada e abrangente do mundo e de nossas experiências existenciais” (2013, p. 3).

Cita ainda, em sua apresentação, que a fruição desses textos literários na coleção, objetiva que

o aluno possa percorrer a história da literatura em língua materna e, assim, ter acesso à nossa

história cultural.

Os temas abordados na apresentação do livro são retomados com mais profundidade

nas orientações dadas pelas 72 páginas no Manual do Professor. Neste, há uma preocupação

intensa, por parte do autor, em relação às práticas de ensino, em especial ao da Língua

Portuguesa (inclui-se aí a Literatura, visto que, a partir dos novos Parâmetros Curriculares

Nacionais, a Literatura foi “diluída”, condicionada, à disciplina de Língua Portuguesa) em

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relação às novas circunstâncias da transformação da sociedade contemporânea como o acesso

à informação e às novas tecnologias.

Em consonância com os documentos oficiais PCNEM e PCN+, o autor pontua, no

Manual do Professor, que o objetivo da coleção é o estudo da língua e da linguagem e o

estudo do texto com reflexões sistemáticas sobre a língua para, assim, poder garantir aos

alunos o efetivo domínio sobre a linguagem verbal escrita e oral. O texto literário aparece,

portanto, como um “instrumento” secundário, após o estudo da língua, objeto prioritário, o

que atende ao que está previsto nos documentos oficiais, como os PCNEM e PCN+, que

alertam para o ensino privilegiado da língua e do texto, não necessariamente enfocando o

texto literário.

Desse modo, as reflexões do autor, no Manual do Professor, partem da concepção de

língua e de linguagem, destacando a importância que elas têm para os estudantes, os quais são

chamados de “seres de linguagem”. As reflexões de Faraco (2013) consideram ainda que, ao

se formar no Ensino Médio, o aluno deve ter adquirido efetiva autonomia nas práticas

socioverbais. Assim, o Manual deixa evidente que as atividades da disciplina de Língua

Portuguesa devem contribuir significativamente para que os alunos dominem a leitura, a

escrita e a fala “em situações formais, quanto do desenvolvimento de uma compreensão da

própria realidade da linguagem” (2013, p. 252).

O manual concebe a linguagem como um “conjunto de práticas sociointeracionais” e,

para tanto, o livro didático em questão garantirá um “tratamento pedagógico não burocrático à

leitura, à escrita e à oralidade” (2013, p. 252). Nessa perspectiva, o autor aborda reflexões e os

objetivos da leitura. Segundo Faraco (2013), ler pressupõe familiarizar-se com diferentes

gêneros textuais, o desenvolvimento de criticidade para interagir com o texto, concordar ou

discordar dele. O manual considera também a leitura de texto em outras linguagens, verbal ou

não. Tal consideração leva em conta a ascensão das tecnologias e para tanto, o aluno deve

estar apto a realizar a leitura das outras linguagens.

O autor ressalta ainda que essa capacitação de leitura cabe à disciplina de Língua

Portuguesa, que deve propiciar atividades de leitura tanto na linguagem verbal quanto

oferecer experiência de leitura de outras linguagens, pois somos, segundo o manual, “seres de

múltiplas linguagens” (2013, p. 253). Além disso, a sociedade contemporânea ampliou a

circulação de textos nas mais variadas linguagens exigindo assim que o estudante tenha a

capacidade de lê-los. Percebe-se, nas reflexões do Manual, que o autor atende aos Parâmetros

Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – PCNEM e PCN+, quando prioriza o estudo da

língua e das linguagens e, ainda, a interdisciplinaridade justificada, pelo autor, pela

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necessidade da sociedade contemporânea de organizar os saberes de forma integrada e

dinâmica e não em “gavetas e caixas” separadas, possibilitando, assim, uma interação entre

texto verbal com a música, cinema, entre outros.

Assim como nos documentos oficiais, a literatura está condicionada à área da leitura.

O autor reconhece no manual a importância da relação dos alunos com os textos literários, no

entanto, pontua de forma enfática que essa relação, essa leitura é “uma” das mais

significativas experiências de leitura que a escola pode oferecer. Evocando a

interdisciplinaridade, o autor propõe em seu livro articular o texto literário com textos não

literários para conquistar os alunos para a leitura em geral, inclui-se aí a literatura.

O autor chama atenção para a abordagem que a escola faz dessa interação entre textos

literários e não literários. Para o autor, a escola não deve tornar o texto literário um meio de

estudos gramaticais e muito menos o centro de obrigações. Essa visão do autor vai ao

encontro da dos autores críticos, como Jaime Ginzburg, Regina Zilberman, entre outros, em

relação ao papel do texto literário e de seu ensino na sala de aula atrelado a obrigações como

exercícios e provas.

Além disso, o manual pontua que o livro não propõe atividades que consistem em

classificação dos períodos literários, ou ainda, a classificação de características presentes nos

textos literários. No entanto, a única referência de um autor crítico citado no manual, em

relação à leitura de literatura na sala de aula, é Alfredo Bosi, justamente para justificar a não

proposição de atividades de classificação acima citados. Não se evidencia, no Manual do

Professor, a defesa do texto literário enquantopossibilitador de humanização do aluno, de

criticidade, muito menos a presença de estudos e autores críticos acerca da leitura literária.

Encontram-se ainda, no Manual do Professor, reflexões acerca da escrita e da

oralidade, além de considerações sobre a organização da coleção (destaca que, em todos os

capítulos, o objeto linguístico central é o texto), as funções do livro didático, sugestões

bibliográficas, apresentação dos capítulos do livro 3 com as respostas das atividades

apresentadas por ele.

Há também uma seção com considerações acerca da metodologia e avaliação, em que

o autor alerta que a concepção de linguagem que sustenta o livro exige, necessariamente, uma

metodologia diversificada e ativa, sugerindo trabalhos individuais, em duplas, em pequenos

grupos, além de exposições do professor. Sobre a avaliação, esta decorre também da

concepção de linguagem presente no livro. Segundo o Manual, “a avaliação tem de ser

entendida como parte indissociável do processo de ensino/aprendizagem” (2013, p. 264).

Desse modo, a avaliação deve ser contínua, abrangente e cumulativa, não ser um ato isolado,

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e deve ter uma clara função formativa. Cabe aqui ressaltar que o autor ainda aborda a função

diagnóstica da avaliação e pontua que provas devem se centrar na leitura dos textos e em

atividades de compreensão.

O livro de Faraco destinado ao 3º ano é composto por 13 capítulos e estes estão

estruturados da seguinte forma: do capítulo 1 ao capítulo 5, o autor aborda os gêneros

textuais, em proposta de formação que utiliza alguns textos literários em prosa e outros em

versos e de textos não literários para o estudo da língua a partir do texto, em consonância com

o que estipulam os Parâmetros Curriculares Nacionais; do capítulo 6 ao capítulo 10, trata da

literatura. Nestes capítulos, o autor aborda a história da literatura, ou seja, a historiografia

literária se faz presente no livro. No capítulo 6, o autor contempla a literatura medieval; no

capítulo 7, Faraco faz uma revisão da Literatura Portuguesa desde o Renascimento até o

Romantismo, se valendo de fragmentos de textos para o estudo do mesmo.

No capítulo 8, o livro traz um panorama da literatura em Portugal dos séculos 19 e 20,

em que aborda o Romantismo, o Realismo, o Simbolismo e o Modernismo. Importante

ressaltar que o autor do livro utiliza-se de fragmentos de textos literários de autores de

renome, ou seja, do cânone para o estudo do texto, como Camilo Castelo Branco, Eça de

Queiróz, Camilo Pessanha e José Saramago. Também é importante ressaltar que, nessa

configuração da estrutura do livro, o autor é contraditório em relação às orientações e

reflexões presentes no Manual do Professor. O autor pontua no Manual que as atividades não

devem ser de ordem classificatória, no entanto, já há uma predileção à classificação uma vez

que há a classificação dos tempos literários e a contemplação de atividades que remetem à

classificação de características presentes nos textos.

No capítulo 9, inicia-se a abordagem da relação entre Portugal e África e o

desenvolvimento da produção literária africana. Intitulado “Despertar Literário”, o capítulo

contempla o estudo do texto a partir dos textos de autores africanos como Agostinho Neto,

José Luandino Vieira, José Craveirinha, Noémia de Sousa, Vaso Cabral e Manuel Lopes.

Ressalta-se que as atividades propostas para o estudo do texto contemplam a apropriação de

informações e dos estudos linguísticos, como se percebe em uma das atividades propostas

para análise de texto literário:

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FONTE: FARACO, 2013, p. 147.

No capítulo 10, o livro continua abordando a literatura africana em Língua Portuguesa,

no entanto, ele contempla as manifestações literárias contemporâneas e o estudo do texto

literário se dá, novamente, a partir de fragmentos das narrativas dos autores Pepetela, Ana

Paula Tavares, Luís BernandoHonwana, Mia Couto, Eduardo White, Conceição Lima, Helder

Proença e Vera Duarte e ainda sugere uma leitura complementar para estudo de texto do autor

João Correia Filho. Em relação às atividades propostas nesse capítulo, elas possuem função

interpretativa, a fim de apropriação das informações acerca do texto, como visto em perguntas

como: “São dois os personagens principais desse fragmento do romance – um oposto ao

outro. Quais são eles e como se distinguem?” (2013, p. 162), e ainda, “Por que Mia Couto só

foi conhecer a obra de Guimarães Rosa em 1988?” (2013, p. 177).

No capítulo 11 e 12 é contemplado o estudo da gramática como a regência verbal, o

uso do verbo haver e ter, o uso das preposições com pronomes relativos, etc. É importante

destacar que há nesses capítulos uma seção denominada “Leitura Lúdica”, que traz crônicas

do autor Olavo Bilac para serem lidas, sem torná-las objeto de estudo. O estudo gramatical

continua na seção chamada “Apêndices”.

O capítulo 13aborda em suas 19 páginas de forma bem sucinta a Literatura Brasileira

Contemporânea, e o autor inicia o capítulo refletindo sobre a importância de se estudar

Literatura. Segundo o autor, “estudar literatura é um caminho fundamental para alcançarmos

objetivos importantes na nossa formação como cidadãos” (2013, p. 205) e ainda pontua que,

por meio da literatura, podemos “apreciar as inúmeras possibilidades expressivas da língua”

(2013, p. 205). Além disso, traz a concepção de fruição a partir da literatura, pois, segundo

Faraco, “a literatura é uma fonte sempre renovada de prazer e lazer” (2013, p. 205). Após essa

pequena reflexão, o autor traça uma breve revisão acerca da literatura no Brasil, do contexto

histórico, de alguns autores e principais obras (é importante destacar que o autor faz

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referências nessa revisão apenas de autores e obras canônicas) desde a colonização à literatura

moderna.

O autor define como literatura contemporâneaa literatura produzida pós-Guimarães

Rosa, João Cabral de Melo Neto e Clarice Lispector. Desse modo, o capítulo faz referência a

alguns contistas, romancistas brasileiros contemporâneos, além de alguns poetas (ressalta-se

aqui que a poesia não é objeto de nosso estudo, logo, não será analisada).

O capítulo utiliza-se dos contos “Uma vela para Dario”, de Dalton Trevisan, e

“Partilha I”, de Marçal Aquino, para ilustrar a produção do conto brasileiro contemporâneo e

são acompanhados por figuras que dialogam com o enredo dos contos, como a imagem de

uma vela e da Favela do Papagaio em Belo Horizonte. Ambos os contos servem para o estudo

de texto: o conto de Dalton Trevisan serve para analisar e discutir de forma coletiva a

estratégia narrativa; as atividades propostas para o estudo do conto de Marçal Aquino se

resumem em três perguntas superficiais em relação aos personagens e à linguagem utilizada

pelos personagens:

FONTE: FARACO, 2013, p. 212.

Nota-se que, para responder às questões propostas, o aluno tem de recorrer ao texto a

fim de buscar informações pontuais da narrativa para conseguir elaborar sua resposta. Ao

iniciar as perguntas com os verbos “note”, “descrever” e “exemplifica”, o autor já direciona o

olhar do aluno para pontos específicos do texto e de sua interpretação, o que pode limitar a

resposta.Portanto, não há a necessidade do aluno refletir sobre o texto literário em si,

tampouco, analisá-lo e interpretá-lo, visando construir uma visão crítica sobre o mesmo e,

assim, provocar um posicionamento crítico do aluno acerca do texto.

O romance contemporâneo é contemplado no capítulo por fragmentos de Dois Irmãos,

de Milton Hatoum, e A grande arte, de Rubem Fonseca. É importante destacar que o autor

utiliza-se de fragmentos, o que é condenado por todos os críticos literários, tais como

Ginzburg, Zilberman, Osakabe e Leite (caracteriza-se uma pseudoleitura ao não favorecerem

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a leitura integral dos textos). Um livro didático não comporta um romance na íntegra, no

entanto, sendo ele apenas uma ferramenta que auxilia a prática docente, parte do professor

oferecer atividades que propiciem a leitura integral dos romances.

O fragmento do romance de Hatoum traz uma rápida contextualização da narrativa,

além de apresentar o autor, para, em seguida, iniciar a leitura do fragmento que, assim como

os contos, é acompanhado de uma imagem fotográfica do embarque de alemães para o

Canadá, criando uma inter-relação entre linguagens, o que é defendido pelos documentos

oficiais. Há, ainda, uma sugestão de leitura complementar do romance Esaú e Jacó, de

Machado de Assis, e cujo tema de irmãos gêmeos se aproxima com o fragmento de Hatoum.

O mesmo acontece com o fragmento de A grande arte, de Marçal Aquino. Há uma

breve contextualização do fragmento, a apresentação do autor, seguido o fragmento da

narrativa. Neste fragmento, o autor não se utiliza de imagens que pudessem dialogar com a

narrativa. Além disso, o autor sugere, após a leitura do fragmento do romance, outros livros

desta “linhagem literária” como O matadore Inferno, de Patrícia Melo; Cidade de Deus,de

Paulo Lins; “Cabeça a prêmi, de Marçal Aquino e Capão Pecado, de Ferréz.Ao sugerir a

leitura de outros livros desta linhagem literária, Faraco recorre à classificação das obras.

Partindo do pressuposto de que fragmentos desfavorecem o gosto pela leitura, há de se

questionar o autor acerca do uso excessivo de fragmentos em seu livro, uma vez queestudos

críticos apontam os fragmentos como sendo um dos motivadores pelo desprestígio da leitura

integral do texto e do contato mais efetivo com o texto literário.

As atividades propostas para a leitura desses fragmentos são a discussão coletiva sobre

as diferentes estratégias narrativas perceptíveis em cada texto, além de uma pesquisa em

pequenos grupos sobre momentos marcantes da história cultural brasileira do século XX a

partir de temas maiores como: a questão de Canudos e Os Sertões, de Euclides da Cunha; a

Semana de 22; manifestações culturais da Era Vargas, das décadas de 1960 e 1970, das

décadas de 1980 e 1990. A sugestão do autor, após essa pesquisa, é apresentar e discutir os

resultados com toda a turma. Para encerrar o estudo da literatura prosa contemporânea

brasileira, o autor sugere, ainda, a leitura complementar de uma entrevista com o escritor do

conto “A Partilha”, de Marçal Aquino, seguido de um roteiro para rememorização das

principais informações da entrevista.

É importante ressaltar que a coleção Português: língua e cultura, da editora Base

Editorial foi avaliada e aprovada para compor o Guia do PNLD 2015. Sobre esta coleção, o

Guia considera como pontos fortes a abordagem da gramática e a articulação entre leitura e

demais eixos de ensino. Já como pontos fracos indica otratamento da oralidade com número

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reduzido de propostas com gêneros orais. Destacam-se, segundo a avaliação do Guia, os

capítulos voltados para questões como variação e preconceito linguístico, além de, pontuar

que o Manual do Professor traz discussões teórico-metodológicas relevantes aodocente. Em

relação à literatura o Guia expõe que os textos presentes são de autores representativos da

literatura brasileira, portuguesa e africana, ou seja, canônicos. Cabe aqui ressaltar que,

somente no capítulo da literatura contemporânea que aparece a literatura brasileira.

Segundo a avaliação do Guia, “à medida que se expõe o contexto social, econômico

ecultural da época em estudo, apresentam-se também as escolas a ele associadas,

algunsautores de destaque, características estéticas e principais obras” a fim de que o aluno

entenda a literatura como “campo de conhecimento e cultura” (GUIA PNLD, 2015, p. 54). No

entanto, o que fica claro, a partir da análise do livro, é que o estudo da literatura está

condicionado à historiográfica literária, seguindo uma cronologia dos acontecimentos. A

avaliação exposta pelo Guia confronta as reflexões do próprio autor no manual do professor

acerca da classificação dos períodos literários.

O Guia ressalta ainda que as temáticas abordadas pela coleção são diversificadas e

atendem às orientações dos PCNs, no entanto, não se evidenciaram, na análise do livro do 3º

ano, estudos a partir de temáticas. O que há em excesso é o estudo da linguagem e de

conceitos linguísticos a partir dos textos literários. Sobre as atividades propostas pelo livro, o

Guia conclui que elas contribuem para a formação de um leitor crítico. Todavia, se as

atividades propostas contribuem para tal formação e, sendo esse um dos focos dos Parâmetros

Curriculares, não deveria ser este o ponto forte da avaliação da coleção por parte do próprio

Guia?

A partir da análise global da obra didática de Faraco, é possível examinar de forma

mais detalhada o potencial e a qualidade do livro. Para tanto, as observações registradas a

seguir procuram responder ao roteiro elaborado para a análise de livro didático. Nesse sentido,

evidenciou-se que o livro do 3º ano, Português: língua e cultura,do autor Carlos Alberto

Faraco, explicita seus objetivos e metodologias de ensino-aprendizagem na apresentação do

livro e no manual do professor, e leva em conta as orientações explicitadas pelos PCNEM e

PCN+ em relação ao estudo das linguagens, verbais e não verbais, além da formação do aluno

para a cidadania, a autonomia e a intelectualidade. No entanto, não atende plenamente as

Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio – OCNEM em relação à literatura,

sua função e ensino, além de não contemplar as orientações do mesmo documento acerca da

formação humana e crítica do aluno. O livro também não propõe uma concepção de leitura de

literatura baseada em reflexões críticas e teóricas sobre literatura, salvo a referência feita, no

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manual do professor de uma citação do crítico literário Alfredo Bosi, e, ainda, abandona o

docente em relação à orientação para a execução das atividades que propõe.

Sobre as atividades didáticas para leitura de literatura, o livro analisado peca na

escolha de fragmentos para leitura e, posteriormente, a resolução de atividades. Caso o livro

apresentasse leituras teóricas e críticas sobre o texto literário em sala de aula, não haveria a

presença de fragmentos nos livros ou em menor quantidade, ou ainda, os textos literários

estariam presentes de forma integral. Não se evidenciaram no livro atividades que

propiciassem a relação e estudo de diferentes textos de um mesmo autor, o que se tem é um

vasto número de textos de diversos autores, muito menos atividades de análise crítica do texto

literário. No entanto, é importante destacar que as questões que o livro propõe, mesmo sendo

superficiais e de apropriação de informações, possibilitam múltiplas interpretações. Porém, as

respostas às questões presentes no manual do professor privilegiam as respostas fechadas, sem

margem e nem orientações ao professor para aceitar mais possibilidades de respostas, o que

deixa contraria a característica polissêmica do texto literário.

Ainda, o livro não contempla atividades que estabelecem relação do texto literário

com o contexto social da produção. A contextualização histórica e social do texto literário

acontece de forma expositiva, explanada pelo autor a fim de propiciar informações para um

conhecimento prévio acerca do texto, do autor. O livro peca por não abordar o estudo de

literatura a partir de temáticas, o que se apresenta são textos com temas isolados,

impossibilitando que aconteça o cotejo entre os textos literários e não literários. Faraco é feliz

ao contemplar linguagens não verbais e relacioná-las com a literatura, este encontro acontece

quando o autor se utiliza de fotografias, imagens com possuem uma relação com o texto

apresentado, facilitando assim a compreensão por parte do aluno. Porém, o livro didático

Português: língua e cultura fica à mercê de atividades que não desenvolvam a reflexão e a

criticidade sobre o texto literário e expõe a apresentação de fragmentos, condicionados às

atividades superficiais não permite que ocorra a fruição do texto. Evidencia-se ainda que,

mesmo sendo a leitura uma preocupação em todos os documentos oficiais, o livro didático

analisado não se apropria de conceitos teóricos acerca da leitura e muito menos apresenta

práticas concretas de leitura literária.

Em relação à contextualização da prosa contemporânea, foco central de nossa análise,

o livro didático fica aquém do idealizado pelos estudos críticos e teóricos. A apresentação da

prosa contemporânea brasileira presente no livro analisado pode ser considerada deficiente.

Encontram-se, no referido livro, apenas quatro fragmentos de autores contemporâneos

brasileiros, Dalton Trevisan, Marçal Aquino, Milton Hatoum e Rubem Fonseca. Como se

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pode ter conhecimento sobre a prosa contemporânea apenas contemplando fragmentos de

quatro autores? Há à disposição um enorme número de autores e obras considerados

contemporâneos, além de críticos literários que possibilitariam conhecimento adequado sobre

a prosa contemporânea ao aluno do Ensino Médio. Restringir o estudo da prosa

contemporânea a essa seleção é restringir a função da literatura, o ensino, a leitura e a fruição

estética.

O capítulo referente à prosa contemporânea não apresenta um ensino de literatura a

partir da tendência de temáticas, e, ainda, o estudo da prosa contemporânea brasileira parte de

autores que podemos considerar tradicionais nessa tendência literária, silenciando o vasto

referencial bibliográfico e autoral contemporâneo não prestigiado pela crítica literária, como

Caio Fernando Abreu, Ana Paula Maia, Marçal Aquino, entre outros. Assim, torna-se

evidente que o livro didático não apresenta material bibliográfico atualizado que possa

contribuir para construir e ampliar o conhecimento acerca da literatura contemporânea em

prosa.

É importante destacar que, neste capítulo, o livro não cria nenhum link com nenhum

material digital que possibilite o ensino e a leitura de literatura. Há um paradoxo claro em

relação à falta de referencial digital presente no capítulo, pois o aluno vive num mundo

contemporâneo em que as tecnologias estão cada vez mais presentes em sua realidade. Logo,

utilizar-se dessa ferramenta para atividades que potencializem a aprendizagem é de suma

importância.

O estudo da literatura contemporânea brasileira em prosa neste livro se dá a partir dos

gêneros textuais conto e romance. No entanto, essa estética literária abrange outros gêneros

textuais como miniconto, nanoconto, crônica, entre outros. Assim, o autor, ao eleger os dois

gêneros textuais em questão, torna, de certo modo, impossível que o aluno tenha contato com

gêneros pouco conhecidos e estudados em sala de aula. O estudo da prosa contemporânea

brasileira neste livro didático sequer apresenta uma possibilidade de cotejar a prosa literária

com outras manifestações de arte.

Quanto à indicação de material suplementar para estudos, o livro do 3º ano apresenta

ao professor, no Manual do Professor, alguns títulos bibliográficos como sugestão que podem

ser usados pelo docente na construção do saber teórico e prático para o ensino de Língua

Portuguesa, além de contemplar, em alguns capítulos do livro, material digital para o estudo

da literatura, no entanto, não há vestígio algum sobre estudos acadêmicos sobre a prosa

contemporânea presente no livro, a não ser a breve citação do crítico Alfredo Bosi no Manual

do Professor, justificando o não estudo da literatura a partir de classificações.

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Em suma, com o vasto referencial sobre a prosa contemporânea brasileira disponível

para estudos, restringir a sua abordagem a apenas 19 páginas e de forma superficial,

contemplando apenas alguns autores é, de certo modo, um fator limitador para a formação do

leitor. Busca-se tão urgentemente formar leitores literários, críticos e ativos e, tendo uma

estética literária que se aproxima do jovem aluno, não explorá-la profundamente é no mínimo

controverso.

Partindo da análise do livro do 3º ano Português: língua e cultura, há de se perguntar

como uma coleção com esses traços logrou aprovação para compor o Guia do PNLD 2015 e

ser oferecida para a escolha do professor, uma vez que a obra não atende a todas as

orientações dos norteadores curriculares oficiais, em especial, as OCNEM no que diz respeito

à formação de leitores críticos, ativos e mais humanos? Pode-se afirmar que o livro analisado

não atende de forma satisfatória os tópicos propostos para sua análise. Ele atende, de forma

satisfatória, à proposta pedagógica e na indicação de material suplementar para estudo. No

entanto, é extremamente precário na contextualização da prosa contemporânea e na

proposição de atividades didáticas que propiciam a leitura de literatura. E isso, aliado à noção

de que a literatura nessa obra didática atua como “pretexto” para ensino da língua, é elemento

sinalizador do pequeno potencial do livro para a formação do leitor.

3.2.2Português: Vozes do mundo - literatura, língua e produção de texto:

O livro Português: Vozes do mundo 3 - literatura, língua e produção de texto compõe

a coleção de três livros para o Ensino Médio e a autoria é de Lília Santos Abreu – Tardelli,

Lucas Sanches Oda, Maria Tereza Arruda Campos e Salete Toledo. A coleção, da Editora

Saraiva de São Paulo, está em sua primeira edição e foi coordenada por Maria Tereza e

lançada no ano de 2013, o que pressupõe que a coleção não se baseia em nenhuma anterior,

que seja apenas atualização de coleções já escritas. O livro da terceira série do Ensino Médio

é dividido em três partes: literatura, língua e produção de texto e possui 512 páginas brancas

com a presença de muito colorido, gráficos, figuras. Sua capa acinzentada contrasta com o

vermelho e azul, e ainda apresenta imagens de aeroportos e de aviões fazendo conexões, o que

leva ao entendimento de que os conteúdos que compõem o livro estarão conectadas e que

permitirão ao aluno alçar voos solos.

Diferentemente do livro de Faraco analisado na seção anterior, a apresentação do

Português:Vozes do mundo se dá de forma mais dinâmica. Ele expõe, em suas primeiras

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páginas, a metodologia da exposição do assunto abordado em cada seção, como indicação de

abertura de unidades, de capítulos, as questões, entre outros. Após essa breve apresentação

ilustrada e comentada, há o sumário. Nele percebe-se, de forma bem clara, a separação das

seções literatura, língua e produção de texto, o que dá a entender de que não haverá

intercambio entre eles, de que cada assunto será abordado de forma separada. As primeiras

seis unidades são destinadas à literatura, com 19 capítulos; a parte II é composta pela língua

com três unidades com 13 capítulos; a produção de texto é trabalhada em três unidades com 8

capítulos no total e completa a parte III.

Ao iniciar a análise efetiva do conteúdo que “recheia” o livro, é importante conhecer o

Manual do Professor, pois é nele que se encontram as orientações para o trabalho do docente

com o livro junto aos alunos. Em suas 112 páginas, os autores abordam a proposta da coleção,

os princípios teóricos - metodológicos, o uso das tecnologias em sala de aula. Abordam ainda

a interdisciplinaridade, a avalição, a estrutura da coleção, planejamento e seleção dos

conteúdos, seguidos das orientações específicas e sugestões de atividades, além das respostas

destas e a bibliografia utilizada.

Sobre a proposta da coleção, os autores evocam o conceito de dialogismo proposto por

Mikhail Bakhtin para explicitar a perspectiva adotada na elaboração da coleção. Para os

autores, “interessa à obra investigar como a língua em uso, transformada em discurso, produz

sentido e como tais sentidos dialogam com a vida – a do próprio contexto de produção e a

nossa vida, sujeita a interferências e aberta a mudanças” (CAMPOS et al, 2013, p. 404 - 405).

Sob essa perspectiva, os autores pontuam no Manual do Professor que, na parte

dedicada à literatura, buscam reconstruir o palco discursivo das obras literárias que integram a

tradição literária (percebe-se que há uma predileção ao cânone, uma vez que literaturas e

autores menos lidos, menos conhecidos, não fazem parte dessa “tradição literária”) e que

ajudam na construção da identidade. Ainda investigam o diálogo com outras linguagens

artísticas, além do diálogo com tradição crítica. Em relação à língua, o Manual aborda em

suas reflexões que, apesar de focar a abordagem discursiva, também utilizará as contribuições

da gramática normativa e discursiva, da pragmática e da linguística textual. Segundo os

autores, o livro tem com objetivo, na parte da língua, articular forma e sentido, fazendo com

que o aluno reflita sobre as estratégias formais disponíveis para que o aluno possa se

posicionar, defender pontos de vista, afirmar-se como sujeito perante o mundo.

No Manual do Professor, Campos et al (2013) pontuam que tanto as reflexões sobre

literatura bem como sobre a língua, propõem desenvolver as habilidades leitoras de textos

escritos e orais a partir do plano discursivo da língua. Seguindo essa linha teórico-

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metodológica, os autores expõem que a parte destinada à produção textual foi construída de

forma a ampliar a competência de leitura dos alunos, além de instrumentalizar o aluno para o

manuseio dos elementos linguísticos que contribuem para a elaboração de textos escritos e

orais. Segundo o Manual, “por meio da leitura, o aluno analisa o estilo, o conteúdo temático e

os elementos de construção composicional de um texto representativo do gênero que servirão

de subsídios para sua produção” (CAMPOS et al, 2013, p.405). Ao encerrar a apresentação da

coleção, os autores evocam o termo interdisciplinaridade, pois, para eles, o desenvolvimento

de competências e habilidades das várias áreas do conhecimento associadas à área de

Linguagens, códigos e tecnologias auxilia a conscientizar o aluno de seu papel como “sujeito

histórico, social e ideológico e [...] pela interação na sociedade, de cruzar novas vozes sociais,

novos conhecimentos, compreensões, visão de mundo e ter uma atitude responsiva e

transformadora” (CAMPOS et al, 2013, p. 405). Nota-se que a proposta do livro é fomentar o

aluno de meios (conteúdo) para que possa ser autônomo e assumir um papel ativo e

transformador na e da sociedade.

Em relação aos princípios teórico-metodológicos que fundamentam o livro, os autores

reconhecem a importância dos estudos literários no Ensino Médio e a dificuldade dos

professores em sensibilizar o aluno para riqueza e a multiplicidade de aspectos humanos,

linguísticos e sociais intercambiadas numa obra literária. Ainda pontuam que há uma

necessidade de desenvolver novas formas de abordagem do texto literário e seu aluno-leitor.

Sobre essa abordagem e a qualidade de leitura, os autores do livro trazem reflexões críticas de

Ligia Chiappini Moraes Leite e HaquiraOsakabe, co-autoras do capítulo específico sobre

conhecimentos de literatura presente nas Orientações Curriculares para o Ensino Médio. Na

visão destas autoras, cabe ao professor juntamente com os alunos construir o entendimento do

fenômeno literário como um modo discursivo cujo valor extrapola o caráter pragmático,

tornando-se uma forma do leitor exercitar sua liberdade.

Campos et al (2013) pontuam no Manual do Professor que o contato com a literatura é

um processo humanizador, logo, evocam os estudos de Antônio Candido de Mello e Souza.

Para Cândido (1995), a literatura é um direito de todos, um patrimônio que deve ser

compartilhado por todos em um espaço democrático que permita ao leitor criar novos

mundos, perceber novos lugares, ocupar lugares diferentes do seu, exercitar seu livre pensar.

Nesse viés, os autores da coleção veem o papel da literatura na escola como elemento

humanizador importante na formação dos alunos e ressaltam que entendem humanização

como “um processo que envolve, ao mesmo tempo, capacidade de reflexão, de imaginação,

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interesse pelo saber, senso estético, compromisso com o outro, noção da complexidade do

mundo, acesso ao humor e às emoções, etc.” (CAMPOS et al, 2013, p. 406).

O Manual do Professor ainda ressalta que é fundamental, na utilização do livro

didático, que o professor privilegie o contato dos alunos com o texto literário, no entanto,

atentam para que esse contato tenha a mediação do docente, possibilitando visões diferentes

daquelas já conhecidas. Outra abordagem feita pelos autores no Manual dirigido ao professor

é a formação do leitor literário. Nela, conceituam o texto literário como um texto aberto, pois

comporta uma estrutura que se transforma quando em contato com as possibilidades variadas

de leitura. Nesse sentido, reforça-se a necessidade dos alunos terem contato direto com o

texto. Ainda explanam sobre a dimensão discursiva do texto literário trazendo reflexões de

Antônio Candido e sobre o letramento literário, e pontuam que as orientações de alguns dos

principais documentos oficiais advertem sobre a importância desses temas.

Para os autores do livro Português: Vozes do mundo, “formar um leitor literário é

criar condições para que os alunos se entendam e se capacitem para que possam se tornar

interlocutores da cultura” (CAMPOS et al, 2013, p.409). Ainda traçam um dos objetivos

principais da coleção, da qual o livro analisado faz parte, o de “desmontar as armadilhas do

estudo tradicional da literatura, que torna a leitura literária um “luxo” e o texto literário, algo

“sagrado” e pouco acessível às classes menos favorecidas” (CAMPOS et al, 2013, p. 409).

Ainda, ao encerrar a seção destinada à literatura, o Manual faz uma abordagem no

desenvolvimento de capacidades leitoras pela literatura em que apresenta uma síntese das

capacidades e habilidades trabalhadas no estudo dos textos literários acrescida de algumas

orientações que permitem ao professor desenvolver sua ação de auxiliar os alunos na

aquisição dessas capacidades.

Há ainda, uma fundamentação teórico-metodológica para o ensino da língua e da

produção textual presentes no Manual. No ensino da língua a perspectiva adotada pelos

autores da coleção convergempara a perspectiva de linguagem apresentada pelos Parâmetros

Curriculares Nacionais. Reconhecem ainda que, ao elaborar este material didático levaram em

conta a perspectiva de linguagem presente nos PCN, no entanto, não ignoraram a gramática

normativa e descritiva, a pragmática e a linguística textual. O estudo da língua ainda quer

permitir que o aluno reflita sobre o seu uso. Essa reflexão permitiria que o aluno

experimentasse a língua portuguesa como sua própria língua, formadora de sua identidade, na

medida em que identifica seus usos e seus efeitos em diferentes textos presentes no âmbito

escolar e social, tal qual preconizam os Parâmetros Curriculares Nacionais.

Assim, o estudo da língua a partir do livro elaborado pelos autores tem por finalidade

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o ensino da língua como um bem cultural, direito de todo cidadão; o conhecimento

da língua e de suas variedades propiciando o conhecimento de outras identidades

diferentes da do aluno e que formam a heterogeneidade linguística nacional; o

estudo da língua como um caminho para escrever, ler e se expressar de forma mais

adequada em cada situação de vida com que o aluno deparar. (CAMPOS et al, 2013,

p. 412 -413).

Em relação às atividades do estudo da língua, os autores visam “ao desenvolvimento

das habilidades leitoras, para que o aluno possa cada vez mais, no percurso da obra, analisar

os textos que lê considerando a visão de mundo expressa nele, os valores, as vozes que

dialogam no texto” (CAMPOS et al, 2013, p.413). Nas atividades, a norma padrão da língua é

apresentada, segundo o Manual, com apontamentos e questões que “lembram o aluno de que

ela é uma variante de determinado grupo social e que por ser a língua valorizada pelo grupo

dominante, é a variedade legitimada e por isso deve ser estudada” (CAMPOS et al, 2013,

p.413). Porém, os autores apontam que ao longo de todo o livro, outras variedades, de menor

prestígio, far-se-ão presentes, a fim de provocar reflexão e discussão crítica dos discursos que

ignoram tais variantes.

Sobre o trabalho com produção de texto, o Manual considera que as relações que o ser

humano estabelece com o outro e com o mundo se dão através da linguagem. Portanto, a

produção textual considera a língua uma atividade interativa, social e cognitiva, não apenas

uma estrutura e forma. Assim como o livro de Faraco, anteriormente analisado, o livro

Português: Vozes do mundo também trilha o mesmo caminho em relação à produção textual

e o ensino da língua, baseando-se no que estabelece os Parâmetros Curriculares Nacionais em

relação ao ensino de Língua Portuguesa e ao lugar do texto e da linguagem no seu ensino.

Na sequência, o Manual do Professor trata da avaliação e explicita a estrutura da

coleção, além de apresentar o planejamento e seleção de conteúdos divididos por seções

literatura, língua e produção textual e por bimestres, contemplados nos três anos do Ensino

Médio. Há, ainda, as orientações específicas e sugestões de atividades para o professor. Em

suma, essa seção pode servir de cartilha para o professor desempenhar sua função em sala.

Ensina-o a dar aula. Encontram-se também nessa seção as respostas das atividades propostas

no livro e o que chama atenção é que, Campos e os demais autores utilizam-se da mesma

abordagem de Faraco em relação às respostas fechadas, sem possibilidade de respostas

diferentes da dos autores, nem orientação para que respostas diferentes sejam aceitas.

Observa-se, de suma importância, que há indicação de material de apoio ao professor

intitulado de “Outras vozes”, que traz referências bibliográficas para consulta do professor. A

seção bibliografia encerra o Manual.

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O livro Português: Vozes do mundo 3 - literatura, língua e produção de texto é divido

em três partes, tal qual o título. A literatura é contemplada no início do livro, o que pressupõe,

assim como no Manual, a importância que os autores dão à literatura e ao texto literário. Cabe

ressaltar que, sendo o objeto principal da análise a literatura, as demais partes do livro serão

abordadas de forma global, assim como na análise anterior. A literatura é abordada em 19

capítulos.

Na unidade 1, composta pelos capítulos 1 e 2, é apresentada a fase Pré–Modernista, a

nova visão que se criou sobre o Brasil, os temas, as formas, o tempo, além do jogo discursivo

nesta fase. Ademais, na sequência é abordada a diversidade da produção pré-modernistas,

cujos autores selecionados para o estudo são seletos, conhecidos na tradição literária, são eles:

Euclides da Cunha, Monteiro Lobato, Lima Barreto e Augusto dos Anjos. Há, no final da

unidade, um roteiro de estudo, que traz em forma de esquema, um resumo sobre o fora estudo

nos dois capítulos da primeira unidade.

Os dez capítulos que compõem a unidade 2, 3 e 4 tratam do Modernismo e suas

manifestações em Portugal e no Brasil. Nestas unidades, os autores introduzem teórica e

historicamente as vanguardas que contribuíram para a solidificação dessa nova manifestação

estética, além de apresentar de forma separada as três gerações com seus contextos, alguns

autores e algumas obras. É importante ressaltar que se nota a presença no decorrer de todo o

conteúdo apresentado a presença de autores seletos e reconhecidos pela crítica, como

Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, José Lins do Rego, Guimarães Rosa, entre outros.

É de suma importância pontuar que o estudo de cada manifestação artística parte da

teoria ligada à história. Cabe aqui ponderar que, de fato, para aprofundar os conhecimentos

acerca do assunto, é fundamental que se conheça o contexto histórico, no entanto, ao se

buscar a formação de um aluno leitor, partir do contexto histórico (teoria) não contribui para

alcançar o objetivo, uma vez que o aluno deve ter contato com o texto propriamente dito, tal

qual defende as OCNEM. Tornar o texto literário o ponto de partida e não o ponto de

chegada. Ademais, o que se percebe é que o texto literário, tanto em verso quanto em prosa, é

objeto para resolução de exercícios. Campos e demais autores, utilizam-se de fragmentos de

textos em prosa para o estudo da literatura, tal qual Faraco, autor do livro anteriormente

analisado. Os fragmentos dos textos em prosa, ao mesmo tempo em que não contribuem para

a disseminação do gosto pela leitura, uma vez que, neste livro são apenas uma base de leitura

que culmina na realização de exercícios.

Há, no livro Português: Vozes do mundo, a presença maciça de informações

secundárias acerca dos assuntos abordados como curiosidades sobre autores, dicas de filmes,

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de músicas, entre outras, o que, de certo modo, contribui para um estudo mais aprofundado.

Deve-se ressaltar que, assim como na anterior, as unidades são encerradas com um roteiro de

estudos na forma de resumo acerca do que fora abordado na unidade. Além disso, há uma

seção intitulada de “Vozes em Rede” que apresenta alguns textos de autores pouco

conhecidos que dialogam com temáticas abordadas pelos autores consagrados contemplados

no corpus da unidade. Exemplo disso é o cotejo do fragmento do romance Cidade de Deus, de

Paulo Lins, com Manifesto regionalista, de Gilberto Freyre, e ainda, com Inocência, de

Visconde de Taunay que abordam problemas sociais, como a violência, a falta de dignidade

dos seus habitantes esquecidos e marginalizados. Na seção “Vozes em Rede”, Campos e

demais autores dão voz às obras e autores que estão à margem do cânone, além de, aos poucos

introduzirem o assunto da unidade posterior. Constatou-se ainda a presença de autores como

Lygia Fagundes Telles, Marina Colasanti, Marilene Felinto, que cotejam a mesma temática

em seus textos. É importante destacar a necessidade de se formar alunos leitores que sejam

capazes de cotejar textos e estudar literatura a partir de temáticas seria um viés exitoso, no

entanto, a abordagem por temática acontece apenas nessa seção deveria formar o corpus de

todos os estudos literários.

O objeto central desta pesquisa, a prosa brasileira contemporânea, é contemplado em

35 páginas na unidade 5 deste livro. A unidade inicia a abordagem à literatura brasileira

contemporânea com a obra pictórica com grafite dos irmãos gêmeos Otávio e Gustavo

Pandolfo, o que pressupõe os caminhos intercambiados que a literatura contemporânea irá

percorrer na unidade. O primeiro capítulo dessa unidade, o 13, apresenta uma breve

conceituação da literatura e da arte contemporânea, além das relações entre as artes e a

sociedade na contemporaneidade e explicita a diversidade como marca.

Campos e demais autores do livro reconhecem como o início da literatura brasileira

contemporânea o ano de 1960, e, a partir dessa década, traçam uma linha histórica com os

principais acontecimentos até o ano de 2010. O capítulo 13 serve de suporte teórico para

introduzir a noção de contemporaneidade ao aluno, uma vez que mergulha no contexto

histórico com os principais acontecimentos globais. É importante destacar que em relação à

literatura e à arte contemporânea, os autores da coleção pontuam que o papel da literatura e da

arte na sociedade, diferentemente das manifestações modernistas, não se atrelam a uma visão

de progresso social, no entanto, tentam representar as vozes sociais que vivem em meio a uma

realidade acelerada, e que vivem, o tempo todo como alguém isolado em meio à multidão.

Como já pontuado, o capítulo analisado tem cunho teórico, portanto, contempla apenas três

atividades de leitura, a pictórica dos irmãos Pandolfo, um poema de Paulo Henriques Britto e

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um fragmento de romance do autor brasileiro Cristóvão Tezza intitulado O fotógrafo, este

sendo objeto de estudo nos exercícios propostos. Destaca-se a questão abaixo partindo da

leitura do fragmento de Tezza:

FONTE: CAMPOS et al, 2013, p. 171.

Percebe-se que, mesmo a questão partindo da leitura de um fragmento, ela oferece um

ponto de vista crítico sobre o narrador a partir da leitura de outra pessoa, que não é o aluno e

nem o autor, faz dele. Ainda, sugere, a partir de tal oferta, que o aluno compare e associe a

personagem do fotógrafo, que vaga pela cidade de Curitiba com os indivíduos que vivem

anônimos e à margem nas grandes cidades(característica das narrativas contemporâneas

brasileiras), confronta ideias, provocando um debate entre leituras e um posicionamento

crítico do leitor para formular sua resposta. Destaca-se que, mesmo havendo uma resposta

fechada presente no Manual do Professor, a questão faz o aluno exercitar o intelecto,

desenvolver a sensibilidade e construir sua criticidade, além de cotejar a leitura do texto com

a leitura de mundo e da realidade que o cerca.

No capítulo 14, além de abordar a poesia concreta e marginal, os autores contemplam

as narrativas de um tempo veloz: o conto contemporâneo. O estudo sobre o conto

contemporâneo inicia-se com uma breve contextualização histórica e a citação de contistas

tradicionais, como Machado de Assis, Lima Barreto e Mário de Andrade. Logo após, é

contextualizada a literatura fantástica. Segundo os autores, na literatura fantástica “o cotidiano

é atravessado por um acontecimento inesperado, insólito, que produz estranheza ou aceitação

tão extremas que parece pertencer a outra realidade” (CAMPOS et al, 2013, p. 179). É

apresentado ao aluno, um fragmento do conto “A máquina extraviada”, de José J. Veiga.

Ressalta-se que, este fragmento serve apenas para exemplificar uma situação insólita, “carro-

chefe” do conto contemporâneo. Ademais, ainda citam Murilo Rubião que recorre a

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elementos religiosos em seus contos, e Ignacio de Loyola Brandão, que faz de sua literatura

com viés fantástico um recurso para engajamento político.

Ainda na seção denominada de “Narrativas de um tempo veloz”, os autores do livro

apresentam a literatura pop, na qual personagens e enredos trazem marcas de uma cultura pop,

ademais, há referências no texto ao cinema, à música, à literatura, ao movimento hippie e a

utilização de termos em inglês que sustentam o tom pop à literatura. Para ilustrar essa

literatura, o livro traz um trecho do conto “London London”, de Caio Fernando Abreu, que

apresenta um narrador dividido entre as múltiplas possibilidades que a cultura global oferece.

O capítulo ainda aborda a literatura psicológica e universalista, em que autores como

Otto Lara Resende, Autran Dourado, Antônio Callado, Osman Lins, Carlos Heitor Cony e

Moacyr Scliar e outros, esmiúçam a intimidade, os desejos e frustrações, os conflitos

psicológicos e sociais dos indivíduos contemporâneos. Nessa literatura, Campos e demais

autores transcrevem fragmento do conto “A estrutura da bolha de sabão”, de Lygia Telles para

demonstrar a abordagem feita por esse tipo de literatura. Os contistas Rubem Fonseca e

Dalton Trevisan também são citados pelos autores do livro por abordarem o contexto da

violência e da degradação das metrópoles. Além de utilizar-se de fragmento do conto “Passeio

Noturno I”, de Rubem Fonseca como exemplo dessa narrativa, há indicação de obras

cinematográficas baseados em obras dos contistas acima citados. Há de se destacar que, os

fragmentos de contos trazidos pelo livro apenas servem para exemplificar os vieses que o

conto contemporâneo apresenta. Não há referência alguma sobre exercícios a partir de tais

textos. Já na seção “Leitura e reflexão”, apresenta-se um fragmento do conto “Afinação da

arte de chutar tampinhas”, do autor paulista João Antônio, o qual tematiza o cotidiano das

periferias e dos marginalizados. A leitura do trecho do conto culminará em resolução de

exercícios, exemplificado pela questão:

FONTE: CAMPOS et al, 2013, p. 181.

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Ressalta-se que a pergunta a ser respondida exige do aluno um senso e uma leitura

crítica, em que confronta suas ideias do texto com sua leitura de mundo, e com pontos de vista

de terceiros. Ao imbricar posições e leituras, a questão estimula o aluno a fazer associações e

comparações entre texto e realidade, buscando contribuições teóricas da contextualização da

época já estudadas, além da construção um juízo de valor acerca do narrador para elaborar sua

resposta.Nota-se que, para a formulação da resposta, o aluno desenvolve inúmeras atividades

a partir do texto, ele lê, analisa, debate, associa, reelabora sua leitura e seu senso crítico, além

de se posicionar perante a problemática. Nota-se que questões como esta deveriam ser mais

contempladas nos livros didáticos, pois contribuiriam para vestir o aluno de criticidade, além

de sensibilizar sua visão para com o outro.

O capítulo 15 aborda a produção poética contemporânea, as suas tendências e as

formas de ler poesia. No capítulo 16, intitulado de “As surpresas da prosa literária”, os autores

introduzem a prosa contemporânea no Brasil, oferecendo um breve panorama da produção em

prosa contemporânea no Brasil, além de apontarem três caminhos para a leitura da prosa de

hoje. O capítulo aborda a literatura brasileira em tempos de globalização, marcada pelo

hibridismo textual, pelo espaço mercadológico que a cerca e pelos meios de circulação

eletrônicos que aproximam o texto literário de um imenso conjunto de leitores, não só de um

país, mas de um mundo globalizado. Para representar vários elementos que remetem a esse

tempo globalizado, de instabilidade e fluidez, os autores apresentam um fragmento do

romance de Bernardo Carvalho, Os bêbados e os sonâmbulos, no qual há uma mistura e

simultaneidade de tempos e do questionamento de uma identidade única. Juntamente com este

autor, Campos e demais autores do livro, citam Michel Laub, Chico Buarque, João Gilberto

Noll, Luiz Vilela, Marcelino Freire, Sérgio Sant‟Anna, que também trazem para suas

narrativas os impasses e as crises existências próprios para a vida contemporânea.

É abordada ainda, no capítulo 15, a crônica literária, que trata da interação entre

espaços e personagem e é a que mais rapidamente incorpora as transformações do cotidiano.

O pano de fundo para as crônicas literárias é o espaço urbano, desordenado e acelerado, que

afeta diretamente as relações humanas. Como exemplo de crônica literária, o livro apresenta a

crônica “Existe sempre uma coisa ausente”, do autor Caio Fernando Abreu. Há referência

ainda, no livro, de outros escritores que assim como Caio Fernando Abreu revelam as mais

variadas formas de como as cidades contemporâneas influenciam no comportamento de

personagens, como Bernardo de Mendonça, Daniel Galera, Edney Silvestre, Antonio Prata,

Luiz Rufatto, Luis Fernando Veríssimo, Patrícia Melo, Marçal Aquino, entre outros.

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A literatura contemporânea regional também é citada no livro, como os romances e

contos do escritor amazonense Milton Hatoum. Com suas narrativas ambientadas na região

amazônica, o regionalismo ressurge como um universo particular em que o atraso e o

progresso social caminham juntos. Para ilustrar tal produção, o livro traz fragmento do

romance Cinzas do Norte,de Hatoum. Ainda cita outros autores que exploram em seus

romances as potencialidades das regiões mais distintas do país, como Alberto Mussa, Moacyr

Scliar, João Ubaldo Ribeiro, entre outros. É importante destacar que, nesse capítulo há

sugestões de obras cinematográficas que exploram a mesma temática. Há na seção seguinte, a

leitura do conto de Marcelino Freire, “Curso Superior”,que aborda temas polêmicos da

sociedade contemporânea e que servirá para reflexão a partir da resolução de perguntas.

Evidencia-se novamente, nessa atividade, a necessidade de reflexão crítica, cotejo entre

leituras do leitor, de mundo e de outros pontos de vista para o aluno reconstruir a significação

do texto. Evidenciou-se também, em uma das perguntas, citação de um parágrafo do texto A

identidade cultural na pós–modernidade, do teórico Stuart Hall para embasar a resposta do

aluno.

O capítulo 17 faz referência aos novos suportes disponíveis para o estudo da literatura,

como os e-books, blogs, links de internet, sites. Em relação a esses suportes, os autores

chamam atenção para qualidade dos textos literários que se encontram disponíveis na rede

mundial de computadores. Para os autores, “a rede mundial não possui um centro definido

que ofereça critérios para o leitor separar o bom do ruim” (CAMPOS et al, 2013, p.191).

Além desses suportes, o capítulo ainda aborda o teatro contemporâneo e suas tendências. No

final da unidade, os autores oferecem um roteiro de estudos para aprofundar as informações.

Na unidade seguinte, com dois capítulos, o livro aborda as literaturas africanas em língua

portuguesa, desde a literatura colonial, as lutas de independência à literatura pós-colonial,

autores e obras de Luandino Vieira, Pepetela, José Agualusa, Mia Couto, entre outros.

É importante destacar que, sendo a literatura o objeto dessa análise, as partes seguintes

que compõem o livro, língua e produção de texto não serão analisados, uma vez que o livro

apresenta as três partes em separado, não havendo uma fusão entre elas. A partir da análise

global em relação à literatura presente no livro Português: Vozes do mundo: literatura, língua

e produção de texto, é possível refletir pontualmente a partir do roteiro de avaliação elaborado

para este trabalho.

Em relação à proposta pedagógica, o livro não deixa evidente a explicitação de seus

objetivos e nem a metodologia de ensino–aprendizagem, mas atende de forma eficaz na

orientação do docente para a execução das atividades propostas. Estas orientações estão

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presentes no Manual do Professor, no final do livro, porém, não se constatou a presença de

orientações dadas pelos autores da coleção ao professor durante as explanações dos conteúdos

e das atividades. É importante destacar que, diferentemente do livro de Faraco já analisado, o

livro Português: Vozes do mundo atende de forma satisfatória à proposta das Orientações

Curriculares Nacionais para o Ensino Médio - OCNEM, acerca do papel da literatura.

Segundo os autores, a literatura é o viés para a humanização do aluno e, ao elencarem os

princípios teóricos, em especial, as contribuições críticas de Antônio Candido em relação à

leitura de literatura em seu manual contribuem positivamente na prática docente. Além disso,

as orientações e abordagens feitas por Campos e demais autores são visualizadas no conteúdo

e nas atividades propostas no livro analisado.

Ao analisar as atividades didáticas para a leitura de literatura, o livro didático fica

aquém de atividades baseadas em textos literários integrais, uma vez que há a presença

maciça de fragmentos de textos, em especial nos capítulos relacionados à prosa brasileira

contemporânea. Além disso, o livro analisado não propõe cotejo de diferentes textos de um

mesmo autor. O que apresenta é o cotejo de diferentes autores acerca de uma mesma temática,

porém, o cotejo se dá entre fragmentos, mas é importante destacar que os fragmentos

presentes nos capítulos da literatura brasileira contemporânea em prosa servem apenas para

exemplificar a teoria apresentada. De forma satisfatória, o livro apresenta, mesmo em

pequeno número, atividades de análise e interpretação de fragmentos de textos literários que

possibilitam, mesmo apontando para uma resposta fechada no livro do professor, mais de uma

interpretação e reflexões críticas sobre o texto, tal qual as orientações teóricas dadas no

Manual do Professor, mas, é fundamental pontuar que, o livro didático analisado não

possibilita ao aluno se apropriar de conceitos teóricos e sua inter-relação com práticas

concretas de leitura literária, pelo fato de abordar os conceitos teóricos apenas no Manual

presentes nos livros dos docentes.

O livro analisado atende ainda, de forma satisfatória, a contextualização dos temas

literários abordados, porém, não parte do conhecimento prévio do aluno acerca dos mesmos,

nem estabelece uma relação do texto com o contexto social de sua produção, o que poderia

aprofundar ainda mais a abordagem literária. O livro Português: Vozes do mundo não

apresenta atividades que exercitem o cotejo entre textos literários e não literários, mas

possibilita o diálogo com outras áreas do saber. Portanto, o livro analisado atende,

parcialmente, em relação às atividades didáticas para leitura da literatura, o que desfavorece a

fruição estética do texto literário.

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Acerca do tópico da contextualização da prosa contemporânea, o livro didático

analisado possibilita, de forma satisfatória, o estudo da prosa brasileira contemporânea

produzida por autores tradicionalmente valorizados pela crítica literária. Mas, ao mesmo

tempo em que favorece a presença de autores tradicionais, o livro analisado dá voz às obras

produzidas por um grande número de autores menos prestigiados pela crítica. As tendências

temáticas da prosa contemporânea são sistematicamente apresentadas ao aluno e há uma

adequada seleção de conteúdos, autores e obras que possibilitam o aluno conhecer a prosa

brasileira contemporânea, além de apresentar um referencial bibliográfico que contribui para

ampliar os conhecimentos acerca do tópico do roteiro.

Em relação ao material suplementar para estudo o terceiro livro da coleção Português:

Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto, apresenta um vasto material

complementar para estudos, tanto do professor quanto do aluno, apresentando um roteiro de

estudos ao final de cada unidade que possibilita, aos envolvidos, aprofundar os conhecimentos

acerca dos assuntos abordados no livro de forma individual. O livro didático analisado

contempla ainda fontes de multimídia que podem potencializar o estudo da prosa brasileira

contemporânea. Portanto, o livro didático avaliado faz parte das coleções aprovadas pelo

Ministério da Educação para ser ofertado aos professores para a escolha das coleções a serem

adotadas pela escola. No Guia do PNLD 2015, o livro em questão apresenta como ponto forte

o trabalho voltado para o funcionamento discursivo dos gêneros tomados como objeto de

estudo e a limitação da fruição pelo excesso de fragmentos como ponto fraco do material

didático. Segundo os avaliadores do Guia, a coleção favorece a compreensão da literatura

como um processo histórico – cultural e recorre a teorias críticas contemporâneas. Além

disso, as atividades, segundo os avaliadores do Guia, as atividades privilegiam a compreensão

da trama textual, as relações do texto com seu contexto de produção e a exemplificação das

características da estética estudada. No entanto, após a análise do livro didático, o que se

constatou fora, de fato, a presença excessiva de fragmentos, além de a literatura ser

apresentada de forma cronológica, ou seja, baseada na historiografia literária. Evidenciou-se

também, o que pode ser considerado mais um ponto fraco do livro didático além dos já

citados e que contradiz a avaliação apresentada pelo Guia,a falta de relação do texto com seu

contexto de produção e de um número reduzido de atividades de leitura. Uma vez que se

busca, urgentemente, formar alunos leitores, não deveria o livro didático contemplar mais

atividades para contribuir nessa formação? É de suma importância pontuar a abordagem que

os autores fazem em relação ao papel da literatura no ensino médio, a humanização, a

fomentação da criticidade e protagonismo do aluno e que deveria ter sido apontado pelos

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avaliadores do Guia como o ponto forte do livro didático. O livro Português: Vozes do mundo

- literatura, língua e produção de texto 3 está sendo adotado por 39.393 alunos no Brasil. Não

seria um número muito pequeno quando levado em conta a abordagem humanística presente

no livro e as ponderações acerca da formação crítica e humana contemplada no documento

oficial das Orientações Curriculares Nacionais para o Ensino Médio?

3.2.3Português: linguagens em conexão

O livro Português: Linguagens em conexão 3 é o terceiro livro que compõe a coleção

da editora Leya elaborada pelas autoras Graça Sette, Márcia Travalha e RozárioStarling. A

coleção faz parte das obras aprovadas pelo MEC e disponíveis para a escolha dos professores

para adoção nas escolas públicas brasileiras no período de 2015 a 2017. O livro didático

possui 496 páginas de folhas brancas, sendo 112 delas direcionadas à assessoria pedagógica, o

Manual do Professor.

O material didático da editora Leya tem capa de cor verde e nela um desenho de uma

mulata, o que se aproxima de uma a releitura de Carmem Miranda, ou de Gabriela, de Jorge

Amado. Tal abordagem pressupõe uma brasilidade presente em todo livro. Em sua primeira

edição, as autoras apresentam o livro na página 3 e destacam os caminhos percorridos por ele

para chegar ao aluno e este se conectar com o mundo, além de reconhecer que o aluno já

possui uma bagagem de conhecimento. Ao chamar atenção para o percurso que irão percorrer,

as autoras pontuam os resultados propostos aos alunos, entre eles apropriar-se dos diferentes

recursos que a língua oferece a seus usuários, apreciar e emocionar-se com a arte e a cultura,

com as diferentes formas de linguagem, compreender as novas tecnologias e seus impactos

nas mudanças da língua e da linguagem e tornar-se um cidadão capaz de apresentar soluções

para construir uma sociedade justa e democrática.

Após a apresentação, as autoras apresentam ao aluno as divisões do livro em relação

aos capítulos, aos ícones que o acompanham de acordo com cada eixo de aprendizagem.

Ressaltam ainda que, os capítulos são compostos por seções e boxes. A seção “Na bagagem”

apresenta pré-leituras para mobilizar o conhecimento prévio do aluno sobre o assunto que irá

ser tratado; nos“Textos principais” contém textos verbais e não verbais que ajudam a

enriquecer o repertório do estudante; No “Box biográfico”, quase sempre acompanhado por

uma caricatura, apresenta informações sobre a vida e obras de autores, tanto escritos quanto

artistas de outras linguagem, além de possibilitar links para o aluno ter acesso a maiores

informações acerca do assunto. Além disso, apresenta ainda o “Fique ligado”, em que indica

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mais matérias para pesquisa e assim enriquecer os conhecimentos; “Nas trilhas do texto”

propõe atividades para resolução e que constroem sentidos; Na “Palavras na lupa”, as

atividades propostas seguem o caminho linguístico e gramatical; na seção “Panorama”,

proporcionam uma visão geral e sistematização do conteúdo; na “Passos largos” há atividades

que retomam os conteúdos sistematizados na seção anterior; na seção “Pesquisa”, encontram-

se orientações para realizar pesquisas relacionadas ao que fora aprendido; Há ainda, segundo

a apresentação, a seção “Produção de texto e Boxes informativos ou de conceitos”, em que

apresenta orientações para produzir textos e informações adicionais e curiosidades,

respectivamente.

Ademais, as autores orientam, através de ícones, o modo das atividades serem

desenvolvidas, individual, em dupla ou grupo, se é atividade oral, além de apresentar ícones

que orientam o professor a recorrer à assessoria pedagógica no final do livro e ainda se a

atividade permite uma abordagem interdisciplinar e ainda, se há material digital relacionado a

algum conteúdo da página em que ele aparece. Após a apresentação das divisões do livro, as

autoras apresentam no sumário, de forma bem elaborada, as três unidades: literatura e leitura

de imagens, Gramática e o estudo da língua e Produção de textos orais e escritos, e os

capítulos que compõem cada unidade e o tema que eles abordam, além dos textos e do tópico

teórico e a produção textual. Nas seis páginas do sumário, já constata-se a presença de

desenhos/pinturas e muito colorido.

Para poder analisar de forma mais pontual o livro das autoras, é necessário, assim

como nas análises anteriores, conhecer as orientações e fundamentações teóricas e

metodológicas presentes no Manual do Professor, intitulado Assessoria Pedagógica, e que

serve para nortear a elaboração deste material didático. Para iniciar a assessoria, as autoras

evocam citações acerca da língua e da interação verbal e do poder da palavra, de Bakhtin e de

Millôr Fernandes, respectivamente. Nas primeiras palavras direcionadas ao professor, as

autoras enfatizam que construíram uma proposta que contemple a diversidade sociocultural do

país e que atendesse aos interesses e necessidades do que denominam de aluno-aprendiz do

Ensino Médio e das demandas do mundo contemporâneo.

Após a breve explanação do objetivo buscado pela coleção, as autoras fundamentam

teoricamente o viés tomado por elas na elaboração do material. A primeira abordagem teórica

que o Manual do Professor faz é em relação à concepção bakhtiniana de ensino da língua.

Segundo essa concepção, a língua não é um sistema autônomo, pois depende da interação

entre quem fala ou escreve e quem lê ou escuta em diferentes situações discursivas.

Pressupõe-se que, com essa primeira abordagem teórica que fundamenta às orientações ao

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professor, o material didático proposto pelas autoras e a editora Leya trilhe pelo viés da

interação, tal qual pré-anunciado pelo título da obra Português: linguagens em conexão.

Ainda segundo as orientações aos docentes em relação ao ensino da língua é a de

“orientar os alunos a perceberem que os sujeitos da comunicação precisam se

corresponsabilizar pela manutenção da atividade linguageira” (SETTE et al, 2013, p. 03). Ao

se basearem nessa concepção, Graça Sette e demais autoras pontuam que buscaram oferecer,

no livro didático, uma proposta pedagógica de ensino aprendizagem de Língua Portuguesa no

Ensino Médio que atenda às orientações do Guia de Livros Didáticos do PNLD de 2012,

visando ampliar e aprofundar a convivência do aluno com a diversidade e a complexidade da

Língua Portuguesa em diferentes usos; desenvolver a sua proficiência em áreas como leitura,

literatura, produção textual, para o ingresso no mundo do trabalho e para o pleno exercício da

cidadania. Propiciar ao aluno uma reflexão sistemática sobre a construção progressiva de

conhecimentos sobre linguagens e aumentar a autonomia em relação aos estudos, favorecendo

o desempenho escolar e o acesso ao nível superior. Nota-se, na proposta pedagógica das

autoras, uma preocupação em atender aos documentos oficiais da educação brasileira, que

pontua sobre a formação do aluno para o ingresso no mundo do trabalho, além da capacitação

intelectual para ingressar nos cursos superiores. O que chama atenção ainda e que está

presente em todas as seções de abordagem do Manual do Professor é a indicação de

referências teóricas para ampliar os conhecimentos acerca do tema abordado em cada seção.

A segunda abordagem feita no Manual do Professor é em relação ao processamento de

leitura, interpretação e produção textual. As autoras esclarecem que se essa proposta é

fundamentada nos estudos de Koch, Kleiman e outros, e se baseia na concepção de

texto/textualidade, na qual o texto não é um produto acabado, ele sempre está em processo de

criação e recriação através da interação. Assim, as autoras consideram que um dos principais

objetivos de leitura propostos no livro é o de fomentar a produção escrita. Destacam, ainda,

dar uma atenção à linguagem visual e, para tanto, propõem atividades de leitura

compreensivas de diversos gêneros textuais, a fim de despertar no aluno o interesse por

diversas linguagens.

A abordagem seguinte feita por Graça Sette e demais autoras do livro é no que diz

respeito às vozes do texto. Nessa abordagem, teórico–metodológica, as autoras partem das

contribuições de Bakhtin em relação à pluralidade de vozes nos textos além de evocarem

contribuições de outros estudiosos do campo da linguística que dialogam com a teoria

bakhtiniana. A partir dessa perspectiva, as autoras propõem aos alunos atividades de leitura

compreensiva e crítica que permite a eles perceberem em um texto quem fala, sobre o que

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fala, as estratégias usadas para seduzir o leitor, etc. Ainda procuram, segundo o Manual,

capacitar para que o aluno consiga identificar os intertextos, as diversas vozes presentes no

texto, etc, além de sugerir atividades que levem os alunos a refletirem sobre novos gêneros,

suportes e linguagens.

Na seção 4 do Manual, é abordada a leitura compreensiva e crítica de textos, voltada à

construção dos sentidos. Para tanto, privilegiam textos jornalísticos, textos multimodais como

charges, tiras, textos didáticos e de divulgação científica e do mundo do trabalho. Constata-se

que o objetivos das autoras nessa abordagem é favorecer o diálogo com as formas de

expressão e gêneros próprios das culturas juvenis. Para tanto, pontuam que selecionaram

textos que tematizam preocupações contemporâneas com o objetivo de promover a reflexão

para a formação de valores de cidadania. Percebe-se também, que o trabalho com a leitura tem

relação estreita com a produção de texto, e este serve de base para os estudos da língua. No

final da seção, há indicação de referenciais a serem consultados, além de sítios eletrônicos

acessados pelas autoras para elaborem essa seção.

Na seção “Leitura compreensiva e crítica de obras de artes plásticas”, o Manual

esclarece que há, em cada volume da coleção, alguns capítulos que tratam de forma

sistematizada a leitura compreensiva de obras, como pinturas, ilustrações, fotografias,

tapeçaria, e dialogando especialmente com a área da literatura. Segundo as autoras, as

atividades que propõem têm o objetivo de “incentivar o gosto e a fruição estética, a percepção

do diálogo da obra com outras produções artísticas e formas de linguagem, o contexto em que

ela foi produzida e sua importância para a História da Arte” (SETTE et al, 2013, p. 11). Além

disso, procuram orientar o aluno acerca da gramática própria dessa linguagem, que, segundo

as autoras, “muda historicamente e pode apresentar estrutura narrativa, descritiva ou

argumentativa” (SETTE et al, 2013, p.11). Para ampliar os conhecimentos dessa seção, são

indicadas leituras complementares e acessos a sítios eletrônicos. Após abordarem a leitura de

obras de artes plásticas, o Manual traz reflexões acerca da leitura de filmes. O objetivo dessa

leitura é propiciar a fruição estética, além de ter finalidade pedagógica, favorecendo o

trabalho interdisciplinar. Segundo as autoras do livro didático, é de extrema relevância a

leitura crítica e a apreciação de obras de arte em geral (literárias, artes plásticas, visuais,

fílmicas, entre outras), no entanto, ponderam que provas, questionários, preenchimentos de

fichas previamente elaboradas não são meios mais eficazes e motivadores na formação de

novos leitores dessas obras artísticas.

A literatura é abordada na seção “Concepção de estudos linguístico-literários”. Nela,

as autoras externam a preocupação de como e por que ensinar literatura aos alunos do Ensino

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Médio, uma vez que já tiveram contato com textos literários e estão familiarizados com suas

classificações. Logo, as autoras abordam reflexões a respeito da importância dos alunos

conhecerem as funções da linguagem, de categorizarem textos por diferenças de gêneros, na

vertente dos estudos linguísticos. Para isso, o Manual destaca as atividades que contrastam

textos de um mesmo tema, mas de gêneros diferentes, por exemplo. As autoras consideram

que, no plano literário, a classificação de gênero não é tão simples, uma vez que muitos

autores corrompem os cânones. Por isso, é preciso fomentar a capacidade de lidarem com

mais familiaridade com a mescla de gêneros. Ainda esclarecem ao professor que a literatura é

apresentada em “perspectiva cronológica da tradição historiográfica da literatura ocidental,

[...], mas sempre tomando como elemento de estudo o texto e o diálogo entre textos

produzidos em épocas diferentes” (SETTE et al, 2013, p.16). Procuram também conciliar o

estudo da história da literatura com a leitura compreensiva e a fruição de textos literários e

também propor uma análise comparativa de textos literários com outras formas de expressão

artística.

Assim, a proposta de leitura literária busca capacitar o aluno a: conhecer as

concepções de autoria e de fazer literário do passado e da atualidade; reconhecer o caráter

metalinguístico dos textos literários; relacionar diferentes concepções de autoria e de fazer

literário a diferentes contextos históricos e literários; compreender o texto literário como

forma de expressão estética, histórica e ideológica; assumir uma postura crítica frente a

posicionamentos enunciativos dos textos literários; identificar e compreender as formas

composicionais e temáticas de textos literários de diferentes épocas; ler obras de autores

representativos da literatura brasileira do passado e da atualidade, entre outros. Para ampliar

os conhecimentos e fundamentar a prática do professor, são indicadas várias leituras, dentre

elas, estão leituras de autores como Vitor Manuel Aguiar e Silva, Alfredo Bosi, Antônio

Candido, Jaime Ginzburg, Marisa Lajolo, Lígia Chiappini Moraes Leite, entre outros.

As demais seções contemplam: as variedades linguísticas e a relação entre a fala e a

escrita. Nesta as autoras deixam evidente que buscaram desenvolver o livro didático em

consonância do o que apontam os PCN em relação à língua falada e escrita dos alunos, as

variedades dialetais decorrentes da geografia e sociedade, dos preconceitos atribuídos aos

diferentes modos de falar, etc; uma reflexão a respeito da relação entre dificuldades

ortográficas e variedades linguísticas. Nela sugerem elencar as dificuldades ortográficas

identificadas nas produções dos alunos e levá-los a observar, analisar, inferir regras e aplicar

os conhecimentos adquiridos em seus textos; propostas de produção de textos escritos, em que

apresentam propostas que buscam contemplar situações de produção reais, em gêneros

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escritos variados, além de exemplificarem um quadro com critérios para avaliação dos textos

escritos dos alunos; propostas de produção de textos orais, em que apresentam atividades para

produzirem textos desses gêneros e que busca, entre os muitos objetivos, tornar o aluno um

usuário proficiente da linguagem oral, ampliando assim a sua possibilidade de participação

nas diferentes esferas sociais; a veiculação de textos escritos e orais produzidos pelos alunos;

a concepção de ensino de gramática, balizada no ensino dos aspectos formais e funcionais da

língua–sintaxe, morfologia e semântica, buscando unir os três aspectos no ensino da

gramática;

Há ainda uma concepção de avaliação, em que as autoras pontuam que a avalição deve

ser processual, diagnóstica, contínua e formativa; uma proposta de trabalho interdisciplinar,

na qual ponderam que a proposta presente no livro didático visa romper a fragmentação e

estabelecer diálogo, complementação e integração dos conhecimentos de diferentes áreas, e

assim há consonância com a diretriz do MEC de organização do Ensino Médio por áreas de

conhecimento. É citada como referência para ampliar os conhecimentos o livro Leitura:

Perspectivas interdisciplinares, organizado por Regina Zilberman. Ademais, as autoras

apresentam sugestões de metodologia de leitura, partindo da pré-leitura, leitura oral, leitura

silenciosa, investigativa e a pós–leitura.

O manual possui também uma seção que apresenta a estrutura do livro a partir dos

eixos de estudos, literatura e leitura de imagens, gramática e estudo da língua e a produção de

textos orais e escritos e, além dessa, há uma seção “Textos de apoio pedagógico” e uma

referência aos objetos educacionais digitais, na qual reconhecem que os jovens estão imersos

nessa culta da simultaneidade de linguagens e para tanto, o professor deve ser um mediador

das práticas digitais em sala de aula. Ao final do Manual, as autoras apresentam uma seção

intitulada “Parte específica”. Nela, há subsídios para a prática do docente em sala, e é

importante pontuar, de forma negativa, a abordagem dessa seção. Evidenciou-se que as

autoras do livro didático apresentam ao professor uma sequência didática, passo a passo, para

introduzir e desenvolver as atividades na sua prática em sala, o que pressupõe que o professor

não necessita de formação, uma vez que só é preciso consultar o roteiro de instruções das

autoras e colocá-las em prática.

A partir da abordagem teórica - metodológica abordada e apresentada pelas autoras do

livro Português: linguagens em conexão é possível analisar, de forma mais pontual, as

abordagens que o livro didático faz em relação aos conteúdos e atividades. Vale ressaltar que

a unidade 1 é intitulada “Literatura e leitura de imagens”, além de se utilizarem de um ícone

que indica o que assunto abordado pelos 16 capítulos que compõem a unidade.

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No capítulo 1, o livro didático analisado apresenta leitura de imagens a partir das

revistas e das charges. O capítulo inicia fazendo um levantamento dos conhecimentos já

internalizados pelos alunos acerca das revistas e charges. Após o diagnóstico, o livro

contempla a leitura da capa da revista Careta, a qual apresenta uma charge do autor Alfredo

Storni, publicada em 1922. Em seguida, são explanadas mais informações acerca da revista e

lançados alguns questionamentos a respeito do texto apresentado, para culminar num aporte

teórico sobre a charge no Brasil monárquico e republicano. Os exercícios disponibilizados

para resolução partem da leitura de charges e perguntas com respostas de múltiplas escolha,

fazendo com que seja necessário, uma reflexão e análise criteriosa das alternativas por parte

do aluno.

No segundo capítulo da unidade, há início o estudo da história da literatura. Como já

alertado pelas autoras no Manual do Professor, o estudo da historiografia literária acontecerá

de forma cronológica. Esse estudo inicia com o Pré–Modernismo em prosa e abrange as duas

primeiras décadas do século XX à Semana da Arte Moderna, em 1922. Já no início do

capítulo, há um diagnóstico das informações já presentes no aluno e, em seguida, o trecho do

texto Zé Brasil, de Monteiro Lobato com uma breve explicação para que o aluno entenda o

texto e conheça o autor.

Além disso, há também um box que apresenta locais de pesquisa para leitura integral

dos trechos ou excertos que serão objeto de estudos no capítulo. Os exercícios propostos pelas

autoras são mistos, desde perguntas cujas respostas são discursivas e de múltiplas escolhas. É

importante ressaltar que, as respostas apresentadas ao professor em seu livro, neste capítulo,

são fechadas, ou seja, não há outra interpretação possível a não ser a dada pelas autoras.

Outros fragmentos dos textos “O colocador de pronomes e Marabá”, do autor Monteiro

Lobato são indicados para leitura e resolução de exercícios. As temáticas abordadas pelos

fragmentos de Lobato servem de base para um estudo teórico mais aprofundado do Pré–

Modernismo na seção “Panorama”. Ao ter o aporte teórico sobre a escola que antecede o

Modernismo, são disponibilizados trechos do romance Triste fim de Policarpo Quaresma, de

Lima Barreto, e do romance Os sertões, de Euclides da Cunha, além de informações sobre os

autores e obras e exercícios diversos, de respostas discursivas e de múltiplas escolhas.

O capítulo 3 aborda a poesia pré–modernista apresentando o soneto “O morcego”, de

Augusto dos Anjos e, posteriormente, o poema“Ser mulher”, de autoria de Gilka Machado,

juntamente com informações acerca dos autores, seguidas de questões de interpretação dos

poemas e de conteúdo teórico sobre o contexto histórico das duas produções. As autoras ainda

sugerem como atividade, um sarau poético de Augustos dos Anjos e Gilka Machado, além de

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indicarem leituras complementares no boxFique ligado! No capítulo quarto, são abordadas as

vanguardas artísticas europeias e o Modernismo brasileiro. Faz-se um diagnóstico sobre a

bagagem cultural em relação à época que o aluno traz consigo, para em seguida, apresentar os

artistas e suas estéticas artísticas, como Anita Malfatti e Tarsila do Amaral com o

Expressionismo, o Cubismo, o Futurismo, o Dadaísmo e o Surrealismo e ainda o aporte

teórico sobre a antropofagia modernista brasileira e as vanguardas europeias. Em relação às

atividades propostas no capítulo se baseiam em leitura de imagens, figuras e obras pictóricas

associadas a outras informações ou imagens.

A poesia da primeira fase modernista é abordada no capítulo 5. O poema “Ode ao

Burguês”, de Mário de Andrade, e o fragmentos do Manifesto Pau- Brasil (1924) e do

Manifesto Antropófago (1928), de Oswald de Andrade, são leituras indicadas pelas autoras do

livro e que resultam em atividades. Os textos teóricos da seção “Panorama” abordam a

primeira fase do Modernismo, suas características, as gerações modernistas na poesia, a

influência das vanguardas europeias. Após a base teórica, é proposto ao aluno o diálogo de

trechos do poema épico “I-Juca Pirama”com o poema modernista “Juca Mulato”, do autor

Menotti del Picchia. Ainda são apresentadas informações acerca deste autor e de outro,

Cassiano Ricardo. Poemas de ambos os autores são indicações de leituras e bases para

atividades. As autoras ainda propõem a produção de um poema dadaísta como atividade

complementar e interdisciplinar.

O capítulo 6, do livro Português: linguagens em conexão, trata do Modernismo em

Portugal. É importante destacar que este capítulo engloba de forma sintetizada toda a

manifestação poética e em prosa do Modernismo em Portugal. A poesia inicia o capítulo e,

como ponto de partida em todos os capítulos mobilizam-se os conhecimentos prévios que os

alunos têm a respeito do assunto. O poema “Autopsicografia”, de Fernando Pessoa é a

primeira indicação de leitura proposta pelo livro. Destaca-se a indicação de trabalho

interdisciplinar possível no estudo do capítulo além de pontuar ao professor que no Manual do

Professor há sugestões (leem-se instruções detalhadas) para o trabalho com o poema de

Fernando Pessoa. Após a leitura do poema, o material didático apresenta informações acerca

do autor e também atividades de compreensão do texto com perguntas de respostas de

múltiplas escolhas e de respostas discursivas. Ainda é proposta leitura dos poemas: “Fim”, de

Mário de Sá Carneiro; Cântico negro, de José Régio;“Amar”, de Florbela Espanca, além das

informações acerca dos autores e a resolução de atividades. No capítulo também é abordada a

prosa modernista portuguesa, a partir da leitura conto “Tenório”, de Miguel Torga, das

informações sobre o autor e de atividades acerca do conto. Na seção “Panorama”, que

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contempla o aporte teórico do estudo central dos capítulos, é abordado o Modernismo em

Portugal. O capítulo encerra com proposição de resolução de questões diversas, inclusive de

questões presentes em vestibulares e no ENEM.

A primeira fase da prosa modernista aparece no sétimo capítulo da unidade, no qual as

autoras diagnosticam os conhecimentos prévios dos alunos sobre o livro Macunaíma, de

Mário de Andrade. As primeiras informações oferecidas pelo livro dizem respeito ao enredo

e, ainda, trecho do primeiro capítulo desse livro que servirão de ponto de partida para

atividades de interpretação e que culminam na seção “Paranoma”, numa análise geral de

Macunaíma. Também consta no capítulo 7, o conto “Carmela”, da obra Brás, Bexiga e Barra

Funda, de Alcântara Machado, seguido do box de informações sobre o autor e de atividades

de compreensão. Há de se pontuar que, as atividades de compreensão do texto são meramente

mecânicas, ou seja, não há a necessidade de um posicionamento crítico na elaboração da

resposta, é necessário apenas, retirar as informações apresentadas no texto. Após as

atividades, são apresentadas as características formais e temáticas do conto “Carmela”. O que

se evidencia, após o estudo do conto, é a indicação, por parte das autoras do livro didático, do

mesmo livro ser objeto de estudo através de uma ficha de leitura. É importante ressaltar que,

no Manual do Professor, as autoras destacam que tal atividade não contribui na formação do

leitor, logo, por que adotam essa metodologia em seu livro? Outro texto indicado para leitura

é “Teares”, trecho do romance Parque industrial, de Patrícia Galvão, que seguirá a mesma

lógica apresentada pelas autoras do livro: leitura do texto –box de informações sobre o autor –

atividades de compreensão. É necessário destacar, de forma positiva, as atividades da seção

Passos largos, em que as autoras contemplam questões já utilizadas em vestibulares e no

ENEM, o que favorece o contato e um conhecimento prévio do nível das provas à espera do

aluno. Na seção deste capítulo, o que chama atenção é a proposição de uma atividade de

leitura de imagem e de texto, na qual o aluno deve compreendê-las e relacioná-las a partir da

abordagem que cada leitura oferece. Tal atividade vai ao encontro do que fora ponderado

pelas autoras no Manual, que proporcionarão o diálogo entre as linguagens.

O capítulo 8 aborda a segunda fase da poesia modernista e já alerta o professor de que,

o tema do capítulo permite um trabalho interdisciplinar com Arte, História e Filosofia. Os

poemas “Mãos dadas”, de Carlos Drummond de Andrade, “Solidariedade”, de Murilo

Mendes, “Pai João”, de Jorge Lima, “Soneto de fidelidade”, de Vinícius de Moraes,

“Função”, de Mário Quintana, são as leituras propostas no livro, além das informações

relevantes sobre os autores. Também são propostas as atividades de compreensão dos poemas.

Na seção “Panorama”, é apresentado o suporte teórico acerca da segunda fase da poesia

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modernista. As atividades propostas pela seção “Passos largos” são oriundas de vestibulares e

ENEM. A proposta interdisciplinar apresentada no capítulo é a apresentação de um recital. Há

de se chamar atenção que, em nenhum dos dois capítulos que abordaram a poesia modernista

(primeira fase e segunda fase), as autoras propunham atividade de leitura apenas por prazer,

sem que os poemas sejam alvos de atividades. Assim, que êxito haverá em se formar leitores

de poemas ou mesmo apreciadores de poesia, se não ocorre a fruição estética, apenas

resolução de exercícios?

No capítulo 9, a leitura de imagens é o tema central da abordagem. Intitulado

“Imagens: Registro, denúncia, emoção e plasticidade”, as autoras contemplam pinturas,

fotografias, capas de livro e ilustrações, em especial, a pintura de Candido Portinari, Criança

morta, a capa de livro de Santa Rosa, Vidas Secas, e a fotografia Ceará, de Juca Martins, para

a leitura crítica de imagens, o que fica evidente, nos exercícios propostos, que exige do aluno-

leitor, uma visão mais afinada, um senso crítico, para imbricar a leitura de mundo e a leitura

da imagem, e assim, reformular a sua leitura. Ainda é contemplado no capítulo, um breve

histórico da impressão de capas de livros no Brasil, um texto teórico sobre Portinari, além das

funções da fotografia e do fotojornalismo. As questões propostas pelas autoras objetivam a

leitura crítica de imagens e a correlacioná-las com poemas e textos.

O capítulo 10 apresenta a segunda fase da prosa modernista no Brasil já

diagnosticando o conhecimento prévio do aluno acerca dessa fase, da época, entre outros. As

indicações de leitura deste capítulo são trechos dos romances Caetés e Vidas Secas, de

Graciliano Ramos, O quinze, de Rachel de Queiroz, Seara vermelha, de Jorge Amado,

Fogomorto, de José Lins do Rego, Os devaneios do general, de Érico Veríssimo, seguidos do

box de informações sobre o autor, de exercícios de interpretação e do aporte teórico sobre a

segunda geração do Modernismo: o romance. O que há de se pontuar, de forma negativa, é a

presença dos fragmentos e de autores e obras canônicas, o que de certo modo contradiz as

abordagens, no Manual do Professor, em relação às inúmeras vozes num texto feitas pelas

autoras. Partindo do pressuposto que as autoras externam preocupação em relação à presença

das muitas vozes de um texto, não seria coerente elas abordarem as inúmeras vozes de autores

não prestigiados pela tradição literária, para o estudo da prosa modernista, bem como das

demais manifestações estéticas? Além das questões de vestibular e de ENEM, há presente, na

seção Passos largos, questão da prova do MEC para o curso de Letras em 1990 sobre um

fragmento do romance Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Há ainda, no final do capítulo, uma

sugestão para produção de texto, a ficha de leitura, condenado pelas autoras no Manual do

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Professor, que as mesmas intitulam de Assessoria Pedagógica por não contribuírem na

formação do leitor.

A terceira fase do Modernismo é assunto do capítulo 11 e aborda a prosa, teatro e a

poesia. Na abertura do capítulo já há indicação de que este permite um trabalho

interdisciplinar com as disciplinas de Arte, Filosofia, História, Geografia e Sociologia. Na

seção Na bagagem, há um questionário que possibilita diagnosticar e a introduzir o assunto

abordado pelo capítulo. Logo após o diagnóstico, há uma contextualização sobre o autor

Guimarães Rosa e seu livro Grande sertão: veredas. A leitura de um fragmento desta obra é

uma das sugestões das autoras presentes no livro, seguida de mais informações sobre o autor e

de exercícios. Sobre estes, é importante destacar que, constatou-se a presença de uma questão

em que é necessária uma correlação de leituras críticas de Marilena Chauí e Walnice

Nogueira Galvão com a leitura de mundo internalizada pelo aluno e de uma situação apontada

pelo fragmento de Guimarães Rosa, o que favorece o senso crítico do aluno e sua posição

perante o mundo.

FONTE: SETTE et al, 2013, p. 169.

Contata-se que as habilidades necessárias para responder à questão proposta se

aproximam das habilidades exigidas pela questão do livro Português: Vozes do mundo -

literatura, língua e produção de texto.Almeja-se que o aluno imbrique posições e leituras, faça

associações e comparações entre a leitura do texto, os pontos de vista dos autores e, a partir de

sua leitura de mundo, elabore a resposta. A questão também permite o desenvolvimento da

análise, do debate, do cotejo de diferentes opiniões acerca da mesma problemática, além de

reelaborar sua leitura e seu senso crítico.

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O livro ainda aborda no mesmo capítulo, a leitura de uma cena de O bem-amado, de

Dias Gomes. Essa indicação de leitura seguida de informações sobre o autor Alfredo de

Freitas Dias Gomes e suas principais obras é para dar enfoque à peça teatral, ou seja, ao

gênero dramático. Na sequência dos estudos, o livro destaca informações sobre a autora

Clarice Lispector e indica um fragmento do romance A hora da estrela para atividade de

leitura, ponto de partida para resolução de exercícios. Estes, ora com respostas discursivas,

ora de múltipla escolha, apenas reforçam as informações apropriadas do texto e em nada

contribuem na formação do aluno–leitor. Além de Lispector, João Cabral de Melo Neto

também é abordado no material didático. Deste autor, é destacado um fragmento do auto

Morte e vida Severina e a obra poética “O engenheiro”. Sobre os exercícios propostos pela

autora, há de se pontuar que apenas favorecem a rememorização das leituras, como “Qual é o

tema do trecho de Morte e vida Severina que você leu?” (SETTE et al, 2013, p.182), e ainda,

“Qual é o tema desse poema? A que João Cabral compara o trabalho do poeta?” (SETE et al,

2013, p. 184). O suporte teórico da terceira fase modernista é abordado na seção Panorama, e

há nessa seção a indicação de conteúdo digital acerca do assunto. Já os exercícios propostos

na seção “Passos largos” oriundos de vestibulares e Enem, atendem de forma satisfatória, e

destaca-se uma questão que exige do aluno uma correlação de leituras, do trecho de Morte e

vida Severina com uma análise crítica para perceber a abordagem de um problema social, e

assim, direcionar o aluno à resposta.

O objeto central de análise proposta por este trabalho, a prosa brasileira

contemporânea, é abordado nos capítulos 12 e 13 do livro Português: linguagens em conexão.

Ao iniciar o capítulo 12, as autoras indicam que nele há uma sugestão de trabalho

interdisciplinar, além de conteúdos digitais e instruções do Manual do Professor. O capítulo é

iniciado com um levantamento dos conhecimentos prévios do aluno, sendo este diagnóstico

feito com perguntas, tais como: “qual o cenário mais comum nas obras brasileiras em prosa

sugeridas entre a segunda metade do século XX e o início do século XXI? Quais são essas

características? Você já leu as crônicas de Rubem Braga?” (SETTE et al, 2013, p. 193). A

contextualização permite, assim, que o aluno se aproxime do assunto a ser estudado. Após

esse breve levantamento, o autor Rubem Braga é apresentado a partir da leitura de sua crônica

“Ai de ti, Copacabana” e também de boxes com informações acerca da crônica e do autor. A

crônica se torna objeto de estudos na seção “Nas trilhas do texto”, a qual propõe exercícios de

fixação e apropriação de informações além de servir para o estudo da língua, como as figuras

de linguagem, o emprego de verbos onomatopaicos e o uso de pronomes, constatadas em

quatro questões. A seção “Panorama” traz a teoria acerca da crônica. Outro autor é

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apresentado ao aluno, João Antônio, sendo ele cronista e contista. Após apresentar o autor,

um fragmento de Ô Copacabana!é indicado para a leitura, que resultará em exercícios de

apropriação de informações, evidenciado na questão 2 : “Qual é o tema central desse texto?”

(SETTE et al, 2013, p.201). A questão 5 proposta pelas autoras, permite o diálogo da crônica

de Braga com a crônica de João Antônio: “Faça uma analogia entre o tom das narrativas Ai de

ti, Copacabana e Ô Copacabana!” (SETTE et al, 2013, p. 201).

As orientações acerca das variedades linguísticas apontadas pelas autoras no Manual

do Professor são evidenciadas numa questão proposta na seção “Palavras na lupa”:

FONTE: SETTE et al, 2013, p. 201.

Diferentemente da questão analisada no livro anterior, a questão acima proposta torna

o texto um objeto para estudo da língua. As expressões “quais são”, “indique”, “objetivo”,

pressupõem que o aluno retire do texto apenas informações pontuais, o que não contribui para

uma compreensão total do texto. Além disso, não desenvolve no aluno as habilidades de

análise, interpretação, de leitura crítica, não contribuindo assim, para formá-lo um leitor.

A seção Panorama aborda, teoricamente, a solidão urbana, seus sobreviventes e

marginalizados, e cita autores que representam estes sobreviventes e marginalizados do

cenário urbano, como Caio Fernando Abreu, Antonio Barreto, Rubem Fonseca, Sérgio

Sant‟Anna, entre outros. Outro autor que escreve em nome daqueles que vivem na margem

da sociedade, nas periferias é Ferréz. Deste autor é apresentado o primeiro parágrafo do

prefácio do livro Capão pecado e um fragmento do primeiro capítulo do romance como

indicação de leitura. Em relação aos exercícios propostos como interpretação do texto,

destaca-se a necessidade de maior compreensão do texto e de leitura crítica de mundo, sendo

que em uma delas, as autoras solicitam que o aluno trace o perfil do protagonista a partir dos

fatos narrados, ações, sentimentos e fala de uma das personagens. Assim, a percepção e a

criticidade do aluno em relação às características levantadas no texto são de suma importância

para a resolução da questão especificada. A violência da desigualdade também é denunciada

por artistas contemporâneos, entre eles, escritores como Paulo Lins, Marçal Aquino,

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DrauzioVarella, Patrícia Melo, compositores como Mano Brown e Criolo, além dos cineastas

e roteiristas, todos mergulham, com uma visão realista, no submundo, abordando temas como

falta de identidade, o crime, a violência, o sexo, etc. A seção que contempla essa abordagem

ainda evoca a autora Conceição Evaristo, como sendo uma voz de destaque no romance afro-

brasileiro. O fragmento do romance PonciáVicêncio, de Conceição Evaristo é a base para

todas as questões provenientes de provas de vestibulares e ENEM da seção “Passos largos”, o

que contribui para desenvolver as habilidades e competências exigidas por tais provas.

O realismo fantástico também é assunto a ser estudado no capítulo. No diagnóstico de

conhecimentos prévios, as autoras mencionam os representantes brasileiros dessa tendência

literária Murilo Rubião e José J. Veiga e, ainda, abordam que autores como o moçambicano

Mia Couto e o português José Saramago utilizaram-se dessa tendência em algumas de suas

escritas. O trecho do conto “O edifício”, de Murilo Rubião é uma das sugestões de leitura

dessa tendência e objeto de intepretação nos exercícios propostos, como visto abaixo:

FONTE: SETTE et al, 2013, p. 211.

É importante destacar que esta questão exige do aluno, um conhecimento sobre

intertextualidade e de correlacionar informações já estudadas anteriormente. Nota-se que a

primeira questão se assemelha às questões de vestibular e de ENEM, em que se apresentam

assertivas e o aluno necessita recorrer à leitura do texto para analisá-las, classificá-las como

certa ou errada, para assim, ser capaz de respondê-la. É importante frisar que questões desse

gênero familiarizam o aluno com as provas que irá prestar ao final do curso, além de

desenvolver habilidades que permitem responde-las.

Como mencionado, o conto “ A carteira de crocodilo”, de Mia Couto e o fragmento do

romance A jangada de pedra, de José Saramago, também são proposições de leitura no

capítulo, sucedidas de informações relevantes sobre os autores e de exercícios de

interpretação. Cabe ressaltar que, numa das questões elaboradas pelas autoras, o aluno deve, a

partir de sua criticidade formada, posicionar-se de maneira crítica, se concorda ou não “com a

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visão de que a vida apresenta muitos aspectos absurdos e de que o real e o fantástico

costumam se cruzar” (SETTE et al, 2013, p. 218). Ressalta-se ainda, que questões desse teor

favorecem o protagonismo e a leitura crítico, além de potencializarem a leitura que ao aluno

faz de si próprio perante o mundo, bem como, a própria leitura de mundo. O aporte teórico

sobre o realismo fantástico ou realismo mágico é contemplado na seção “Panorama”. Sobre as

questões provenientes de vestibulares e Enem que fomentam a seção “Passos largos”, destaca-

se, novamente, a exigência de um posicionamento e interpretação mais aprofundada por parte

do aluno para a resolução das questões, uma vez que, contempla termos pouco conhecidos

pelos alunos, além de cotejar o diálogo entre textos do realismo fantástico e imagens.

O capítulo 13 contempla os novos gêneros e diálogos da prosa contemporânea, o

conto, o miniconto, o microconto e o nanoconto. É importante destacar que, de todos os livros

já analisados, estes três últimos gêneros só aparecem no livro Português: linguagens em

conexão. Entende-se que, todos os gêneros contemporâneos devem ser estudados, uma vez

que estão muito presentes no dia a dia do aluno, além de possibilitarem leituras, muitas vezes,

mais críticas e relevantes do que uma leitura de um romance. Ainda, o mundo contemporâneo,

que vive as transformações sociais e tecnológicas, favorece a produção de gêneros curtos e de

leitura rápida. Ressalta-se que, o fato de serem narrativas curtas e de rápida leitura, não

influencia em significação menor ou superficial, pelo contrário, elas são carregadas de intensa

significação. Após a breve contextualização apontada pelo livro, as autoras citam Dalton

Trevisan como sendo um dos escritores de tais gêneros que mais se destaca no país. Logo,

sugerem a leitura do conto “Apelo”, no entanto, os exercícios de interpretação textual

objetivam, meramente, a coleta de informações acerca do texto, pois questionam o tema, o

gênero, a identificação do narrador, etc., além de fazer o estudo da língua a partir do texto.

O gênero miniconto é apresentado através da leitura de “A árvore que pensava”, do

autor Oswaldo França Júnior, e que é, novamente, objeto de estudo da língua, como figuras de

linguagem e os tempos verbais. Laura Guimarães é a autora do gênero microconto

apresentada pelo livro. A leitura sugerida pelas autoras do livro é objeto de estudo na seção

Nas trilhas do texto. Destaca-se, de forma positiva, a presença de um microconto com

estrutura e organização a partir de uma fotografia, fazendo com que a leitura do texto literário

seja mais convidativa e interessante, e ainda proporcionar o trabalho intertextual. No entanto,

a abordagem feita pela questão relacionada ao texto literário fica aquém de uma pergunta que

atenda o nível intelectual de um aluno de terceiro ano, prestes a ingressar no curso superior,

pois não desenvolve a habilidade de análise crítica tão necessária na leitura literária. A seção

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Panorama apresenta as narrativas curtas e suas características, e ainda menciona alguns dos

autores desses gêneros.

O capítulo ainda contempla um miniconto de Fernando Bonassi intitulado “Canção do

exílio”, além de um trecho do romance de Eles eram muitos cavalos, de Luiz Ruffato. O

primeiro faz uma paródia do poema “Canção do Exílio”, de Gonçalves Dias e aborda o tema

da violência e miséria. O segundo trata do cotidiano e pessoas simples em um grande centro

urbano. Ambos servem de ponto de partida para resolução de exercícios. A mescla e diálogo

entre gêneros na prosa de ficção contemporânea brasileira é o suporte teórico da seção

“Panorama”. As questões que compõem a seção “Passos largos” instigam a análise crítica por

parte do aluno, como visto na questão abaixo:

FONTE: SETTE et al, 2013, p. 237.

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Nota-se que a atividade proposta também pretende desenvolver as habilidades e

competências exigidas no Enem, uma vez que a questão é oriunda do exame em 2009. É

importante destacar que além da leitura do fragmento da novela, é proposta uma leitura que

contextualiza a produção. No enunciado da questão, além de contextualizá-la, é apresentado o

ponto de vista de um crítico literário, logo, o aluno necessita relacionar texto I, texto II e a

visão de Antônio Cândido, para estar apto em analisar e julgar as assertivas propostas. É

importante destacar que, ao analisar as assertivas, o aluno estará desenvolvendo uma leitura

de mundo e construindo um senso crítico.

O capítulo encerra com uma sugestão de elaboração de ficha de leitura. Vale ressaltar

que, as próprias autoras do livro tem posição contrária a tal prática, como visto no Manual do

Professor, no entanto, fazem uso dessa metodologia como sugestão para produção textual.

O capítulo 14 aborda a Arte Pop e as linguagens artísticas contemporâneas e oferece

como sugestão de leitura as telas No carro,de Roy Lichtenstein e Buum!, de Marcello Nitsche

além de suporte teórico sobre Pop Art e a manifestação no Brasil. No capítulo 15, o tema

abordado sãos as poéticas brasileiras da segunda metade do século XX ao século XXI. A

partir do estudo teórico sobre o Concretismo e outras tendências da vanguarda, a vertente

sociopolítica na poesia brasileira e das características gerais da poesia da metade do século

XX ao século XXI, o aluno é levado à leitura de poemas de diversos autores, entre eles

Augusto de Campos, Aníbal Machado e Paulo Leminski.

A unidade “Literatura e leitura de imagens” encerra com o capítulo 16 que traz as

vozes poéticas femininas, afrodescendentes e africanas contemporâneas. Os poemas abordam,

refletem ou dialogam sobre as questões de gênero e do universo feminino. São sugeridas para

leitura os poemas: “Com licença poética”, de Adélia Prado; “Drumundana”, de Alice Ruiz;

“Cantares" de Hilda Hilst; “Vozes–Mulheres”, de Conceição Evaristo; Grito negro, de José

Craveirinha; “Chão”, de Ondjaki; e, “O que é que eu quero para a vida?”, de Gonçalo M.

Tavares. É importante destacar que os exercícios propostos pelas autoras para a compreensão

do texto não fogem da regra dos demais, superficiais e rememorização de informações e se

diferenciam das questões de vestibulares e Enem propostas pela seção Passos Largos. O

tópico teórico aborda as vozes e diálogos da poesia feminina brasileira e das poesias africanas

de língua portuguesa.

A segunda unidade contempla a gramática e o estudo da língua. É abordado, nos cinco

capítulos, o estudo dos períodos compostos por coordenação e subordinação, as orações

subordinadas substantivas, adverbiais e adjetivas, e ainda, a pontuação, o uso da vírgula e do

ponto e vírgula. Já a terceira unidade aborda a produção de textos orais e escritos. São eles:

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artigo de opinião, pesquisa e exposição oral, mesa-redonda, ficha de leitura do conto, debate e

solução de problemas, resumo escolar, o microconto, a pesquisa, o painel e recital. É

importante ponderar que o foco central de análise deste trabalho de pesquisa é a literatura e,

portanto, a presença da gramática e da produção de textos foi analisada de forma superficial.

Partindo da análise global do livro, focando, principalmente, na presença da literatura,

é possível analisar o livro, de forma pontual, baseando-se no roteiro de avaliação de livro

didático proposto por este trabalho. Em relação ao tópico Proposta pedagógica do livro, pode-

se pontuar que atende de forma satisfatória, pois explicita seus objetivos e metodologia de

ensino-aprendizagem. Além disso, a elaboração do livro atende satisfatoriamente à proposta

curricular para o Ensino Médio explicitadas nos documentos oficiais PCN, PCNEM e PCN+

ao estruturarem sua coleção no estudo das linguagens. Em relação aos conhecimentos de

literatura propostos pelas OCNEM, o livro não contempla a abordagem humanística,

sugeridas pelos autores do documento. No entanto, quando é analisada a orientação dada ao

docente para a execução das atividades, o livro atende satisfatoriamente a proposta. Vale

pontuar que, as orientações dadas podem ser consideradas como instruções, passo a passo,

para que as atividades sejam propostas. Sobre a existência de uma concepção de leitura da

literatura baseada em reflexão teórica acerca da literatura, o livro atende parcialmente o

quesito, uma vez que tais reflexões aparecem apenas no Manual do Professor, e não na

explanação dos assuntos e temas abordados pelo livro didático.

Em relação às atividades didáticas para leitura da literatura, o livro analisado atende

parcialmente o roteiro. A análise permitiu constatar que o livro apresenta muitas atividades de

interpretação do texto literário, no entanto, as atividades propostas tem como finalidade a

apropriação de informações presentes nos textos. Além disso, as atividades apresentadas pelo

livro Português: linguagens em conexão contemplam, incessantemente, fragmentos de textos

literários, não atendendo às orientações de críticos literários acerca da leitura de textos

integrais. Também não apresentam atividades que propõe relacionar diferentes textos de um

mesmo autor, muito menos de textos literários com não literários. O que apresenta, algumas

vezes, é o cotejo de textos de mesma temática, porém de autores diferentes. O material

didático analisado também não apresenta atividades para a fruição estética do texto literário,

pois faz uso exagerado de fragmentos, o que impossibilita a fruição, ademais, o texto literário

é base de exercícios de fixação, e não há indicação de textos apenas para leitura, sem

obrigação a realização de atividades. A apropriação de conceitos teóricos é possível no livro,

no entanto, não há a inter-relação com práticas concretas de leitura literária.

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O livro didático analisado também atende, de forma parcial, em relação a atividades de

análise e reflexão crítica sobre o texto literário, pois aparecem atividades para tal finalidade

apenas numa seção, que contempla questões de vestibulares e Enem. O livro também atende

parcialmente em relação à possibilidade de mais de uma interpretação do texto, uma vez que,

as questões para a análise e interpretação apresentadas pelo livro, em sua maioria, são

discursivas, no entanto, é importante pontuar que, poucas são as questões que aceitam

resposta pessoal, ou seja, a maioria das respostas é fechada, direcionadas pelas autoras, e não

há indicativo de aceitar outras possíveis respostas. O livro apresenta, satisfatoriamente,

atividades que estabelecem relações do texto literário com seu contexto social de produção

através do suporte teórico presente na seção “Panorama”. Ainda, mobiliza o conhecimento

prévio do aluno acerca dos temas abordados na seção intitulada “Na bagagem”, além de

contextualizar o tema abordado. Outro quesito que o livro atende de forma satisfatória é a

apresentação de atividades que inter-relacionam a literatura com outras áreas do saber. Em

muitos capítulos, as autoras indicam a possibilidade de trabalhos com outras disciplinas, entre

elas, Arte, Filosofia, Sociologia e História.

Sobre a contextualização da prosa contemporânea, o livro didático atende,

satisfatoriamente, todo o roteiro de análise estabelecido por este trabalho. Constatou-se a

seleção de conteúdos, autores e obras adequadas para o aluno conhecer superficialmente a

prosa brasileira contemporânea. As tendências estéticas e temáticas são sistematicamente

apresentadas no livro didático. Este contempla ainda o estudo da prosa brasileira

contemporânea produzida tanto por autores mais prestigiados pela crítica literária, bem como

por autores menos valorizados. A análise permitiu ainda constatar a possibilidade de se

estudar a prosa contemporânea a partir de diferentes gêneros literários e ainda associá-la a

outras formas de arte. Para complementar o estudo do foco de análise, as autoras Graça Sette,

Márcia Travalha e RozárioStarling indicam referencial bibliográfico e digital atualizado que

possibilitam ampliar e potencializar o conhecimento sobre a prosa brasileira contemporânea.

Acerca da indicação de material suplementar para estudo, o livro didático atende, de

forma satisfatória, o quesito. O livro analisado apresenta indicação de material suplementar

para estudo, tanto para professor quanto para aluno. Além disso, as autoras, em muitos

capítulos, inferem ícone que indica fontes de multimídia disponíveis para o estudo. Porém, o

livro didático peca quando não incorpora estudos acadêmicos sobre a prosa brasileira

contemporânea e que poderiam auxiliar no seu estudo. Em suma, a partir da análise do livro,

pode-se afirmar que sua presença entre as obras avaliadas e aprovadas se justifica, uma vez

que atende a maioria dos critérios elencados no roteiro de avaliação e que está em

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consonância com a avaliação do Guia PNLD 2015, que pontua que disponibiliza atividades

que estabelecem relações entre o texto literário e o contexto histórico, social e político de sua

produção; permite o diálogo entre a literatura brasileira e outras literaturas de língua

portuguesa, sobretudo a produzida em Portugal, e ainda sobre farto material ilustrativo, com

imagens que contribuem tanto para a contextualização dos conteúdos. É importante destacar

ainda que, mesmo o livro didático Português: linguagens em conexão 3 atender

satisfatoriamente os critérios avaliativos, ele ocupa apenas o 5º lugar entre os livros mais

adotados no país, com 180.785 unidades, o que pressupõe que os professores, na escolha dos

livros didáticos a serem adotados pela escola, não analisaram criteriosamente o material, caso

contrário, o número de unidades distribuídas pelo país seria muito maior.

3.2.4 Português: linguagens: uma atualização desatualizada

Português: linguagens é o nome dado à coleção dos autores William Roberto Cereja e

Thereza Cochar Magalhães, sendo ela composta por três volumes. O volume correspondente à

terceira série do Ensino Médio apresenta uma capa em tons avermelhados e nela a imagem de

uma jovem, o que pressupõe o público alvo deste material didático. O livro e a coleção

ocupam o primeiro lugar em relação à adoção por professores de todo país. Para a terceira

série foram distribuídas 614.355 unidades. É importante destacar que a coleção está em sua 9ª

edição.

Na apresentação do livro, os autores pontuam o viés da coleção, as linguagens. Nela,

consideram que é por meio das linguagens que interagimos com outras pessoas, que

expressamos toda forma de opinião, de informação, de ideologia. Assim, segundo os autores,

o livro tem a intenção resgatar a cultura em língua portuguesa, nos seus aspectos artísticos,

históricos e sociais, e imbricá-las, ao mesmo tempo, com outras manifestações artísticas e

culturas. Além disso, estabelecer relações e contrastes com o mundo contemporâneo, por

meio de outras linguagens e analisar os diálogos que a literatura brasileira estabeleceu com

outras literaturas, entre elas as africanas de língua portuguesa.

Os autores ainda ponderam que por meio das atividades sistematizadas e de roteiros de

leitura, o livro pretende dar suporte ao aluno para a leitura e interpretação de textos, oferecer

condição para que produza textos verbais adequados e, ainda, prepara-lo para o Enem, através

de atividades oriundas desse exame. Finalizando a apresentação, os autores destacam ainda

que o livro foi elaborado para que o jovem aluno se sintonize com a realidade do século XXI

e, que por meio das linguagens, possa descobrir, criar, relacionar, pesquisar, transformar.

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Após a breve apresentação, é importante desvelar as orientações dadas diretamente ao

professor, além do viés teórico que fundamenta o livro dos autores. O Manual do Professor se

localiza no final do livro e no sumário já se constata, superficialmente, o caminho abordado

pela coleção, uma educação para a cidadania, o protagonismo e a interdisciplinaridade. Na

introdução do Manual, os autores pontuam que a coleção chega a sua nona edição

reformulada e atualizada.

Na parte da literatura, o livro ainda mantém o mesmo objetivo das edições anteriores

de desenvolver a capacidade leitora dos alunos. Fora criada ainda uma nova seção, intitulada

“Literatura comparada” que adota a perspectiva dialógica de literatura, com a finalidade de

formar leitores competentes e que cotejadores de diferentes textos e linguagens. Ainda

destacam que o trabalho com a literatura contemporânea foi visivelmente ampliado, assim

como, as possibilidades de acesso ao texto literário. Com a seção “Para quem quer mais na

Internet”, os autores indicam sítios eletrônicos nos quais o aluno internauta acesse mais

informações acerca do assunto abordado. A seção “Fique ligado! Pesquise!” reforça conexões

da obra com outras linguagens. A obra apresenta ainda novos conteúdos na parte

Interpretação de textoe contemplam questões fundamentadas na matriz de referências do

Enem.

O ensino da língua abre novos conteúdos, indispensáveis à atual visão de língua e de

interação verbal como intertextualidade, textualidade, interdiscursividade, variedades

linguísticas, entre outros. Ainda pontua que não abrem mão da gramática normativa,

essenciais para que se possa exercer um mínimo de metalinguagem.

Em relação ao Projeto Pedagógico da coleção de Cereja e Magalhães, estes pontuam

que ele está comprometido com a formação do estudante para a cidadania. Por isso, em todas

as atividades, o livro se volta para a formação de um indivíduo autônomo e solidário, que

valorize a educação, a ciência, a cultura e a tecnologia e adquira o hábito da pesquisa.

Portanto, o material didático incluirá, em diferentes atividades, textos que, de uma perspectiva

cidadã, abordam os mais diversos temas e, assim, permitem que, a partir da interação entre

professor e aluno, construa-se uma reflexão crítica sobre as questões que envolvem o homem

contemporâneo.

Na questão da interdisciplinaridade, os autores destacam que, pela diversidade dos

temas, que a coleção aborda o estudo de língua portuguesa já está em permanente diálogo

com outras áreas do conhecimento. Ainda, pontuam que o capítulo “Vivências”, que finaliza

cada unidade da obra, cumpre dois objetivos essenciais: integrar saberes, áreas de

conhecimento e professores, a fim de que o conhecimento seja operado de forma articulada e

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interdisciplinar, e desenvolver projetos, por meio dos quais o estudante tenha um papel

protagonista na relação com o saber.

Em relação à metodologia adotada pelo livro, sua concepção parte do princípio de que

o ensino de português, no Ensino Médio, deve estar voltado para a formação de um cidadão

autônomo, capaz de interagir com a realidade em que vivemos. Além disso, na escola, a

leitura, a escuta e a produção de linguagem, oral e escrita, são ferramentas indispensáveis para

a construção de conhecimentos nas mais diversas áreas e disciplinas. Logo, o ensino da

disciplina se dará a partir de articulação de eixos. Os autores consideram que a leitura cumpre

papel de destaque na coleção, pois consiste no principal elemento de articulação dos eixos da

disciplina, além de destacarem o baixo desempenho dos estudantes brasileiros em leitura,

apontado pelo PISA. Apesar do quadro negativo, Cereja e Magalhães compreendem que o

ensino de língua portuguesa em seus eixos centrais – leitura, produção de texto e reflexão

sobre língua – em virtude de suas variadas práticas de linguagem, pode participar ativamente

do processo de construção dessas capacidades. O eixo da leitura, segundo os autores,

desenvolve habilidades mais gerais, além de cumprirem um papel fundamental na produção

de textos orais e escritos, a partir das competências transversais como comparar, relacionar,

levantar hipóteses, interpretar, etc.

Em relação à literatura, os autores destacam que, pressupondo que o ensino de

literatura vem sendo feito de modo engessado, a proposta de estudo de literatura abordada no

livro prioriza o desenvolvimento das capacidades leitoras do aluno, ao mesmo tempo que

amplia seus horizontes quanto à literatura e à cultura universais. Fundamentada, teoricamente,

pelas ideias de Antônio Candido acerca das relações entre literatura e sociedade, pelo

dialogismo de Mikhail Bakhtin e pelas ideias de Hans Robert Jauss quanto às relações entre

diacronia e sincronia, o ensino de literatura contempla uma abordagem que cria diferentes

cruzamentos, aproximando autores de diferentes línguas e culturas, ou linguagens diferentes,

etc.

Os autores ainda pontuam que os projetos de literatura, propostos ao término de duas

unidades de cada volume, visam aproximar ainda a literatura do universo do aluno. Com base

em pesquisas em livros, vídeos ou na internet, a literatura transforma-se em conhecimento

significativo, que faz o adolescente compreender melhor o mundo em que vive, tal qual

propõem os documentos oficiais PCN e PCN+. Logo, afirmam que, se antes a leitura do texto

literário era a prioridade da literatura, o novo enfoque do livro vem a reforçar essa prioridade.

Ao se tratar da relação da literatura com outras linguagens, os autores abordam no Manual do

Professor, que a literatura dialogará com outras artes e linguagens, “sem perder de vista o

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objeto central–o texto literário” (CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p. 414). Em relação ao

ensino de literaturas africanas de língua portuguesa, os autores pontuam que o interesse dos

estudantes acerca destas se dá por diversas razões, entre elas, a lei federal que estabeleceu a

obrigatoriedade do ensino de cultura africana nas escolas do país, e a vinda constante ao

Brasil de escritores africanos para lançar seus livros ou proferir conferências. A partir da

possibilidade de cotejar textos literários africanos e brasileiros, os autores propuseram, na

seção Literatura comparada, estudos comparados de textos literários de autores brasileiros e

africanos.

Ao abordarem a interpretação de texto, os autores destacam que a publicação de

importantes documentos pelo MEC/INEP contribuirá para melhorar o foco e a consistência do

ensino de leitura e interpretação de textos no Ensino Médio. E a partir destes, propõem

preencher a lacuna existente no âmbito da leitura e da interpretação de textos através de

quatro capítulos específicos de interpretação de textos. Ao tratarem da produção textual, os

autores abordam que o livro adota a perspectiva de trabalho centrada nos gêneros do discurso,

além de contemplar aspectos relacionados com a tipologia textual. Ainda abordam, na seção

Produção de texto, o conceito de gêneros do discurso, fundamentados em Bakhtin, a

proposição de projetos cuja finalidade é criar situações concretas de produção e de recepção

de textos, fundamentada em Ângela Kleiman.

Em relação à língua, os autores destacam que há um enfoque diferente da gramática

tradicional, mas não elimina esse tipo de conteúdo. O livro, portanto, concentra aspectos que

pertencem tanto à gramática normativa quanto à gramática de uso e, ainda, à gramática

reflexiva. Cereja e Magalhães ainda conceituam a gramática no texto vigente, além de

apresentarem a estrutura do livro, composta pelas unidades, os capítulos, e ainda, apresentam

sugestões de estratégias, isto é, um manual de instruções, tal qual o livro anteriormente

analisado, em que contempla, passo a passo, o roteiro para o trabalho do docente em sala de

aula.

A partir da contemplação do aporte teórico que sustenta o livro, é possível iniciar a

análise efetiva do livro dos autores William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães,

para averiguar a consonância do desenvolvimento e metodologia da apresentação dos

conteúdos em relação ao aporte teórico presente no Manual do Professor. O livro didático em

análise é composto por quatro unidades e que, mescla o ensino de literatura, a produção de

texto e o ensino da língua em seus capítulos.

Na unidade 1 é apresentada a história social do Modernismo, e os autores indicam que

há na unidade uma sugestão de projeto interdisciplinar, além de inúmeras indicações de

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filmes, leituras, música, de sítios eletrônicos, além de indicações de museu que possui acervo

de arte modernista. Composta por onze capítulos, a unidade inicia a explanação do conteúdo

com a fase Pré–modernista.

No capítulo 1, os autores contextualizam o Pré–Modernismo enfocando o momento de

transição vivenciada pela literatura. Para tal estudo, apresentam informações acerca do autor

Euclides da Cunha e sua obra Os sertões. Ao contextualizar historicamente a produção da

obra, os autores criam mecanismos de diagnosticar os conhecimentos prévios do aluno e

assim, sistematizar cientificamente os conceitos elaborados. As propostas de leituras se

baseiam em fragmentos de Os sertões, de Euclides da Cunha e do prefácio que o escritor

português José Saramago fez para o livro Terra, de Sebastião Salgado. Os exercícios

elaborados a partir das leituras permitem o cotejo entre autores diferentes que tratam da

mesma temática, Euclides da Cunha e José Saramago, além de favorecer um posicionamento

crítico perante o tema explorado pelos fragmentos e prefácio, tal qual previa as abordagens do

Manual do Professor. O capítulo ainda explora o autor Lima Barreto, enfatizando a sua

principal obra Triste fim de Policarpo Quaresma. Ao explanar sobre autor e a obra, os autores

sugerem uma leitura de Moacyr Scliar que dialoga com o romance de Barreto, uma vez que a

história de Sclyar está condicionada ao romance enfatizado. Há ainda, como sugestão de

leitura um fragmento deste romance que será explorado pelos exercícios propostos. Destaca-

se, a presença de uma questão que explora a visão crítica do aluno perante a temática

abordada pela narrativa. Outros autores apresentados no capítulo são Monteiro Lobato e

Augusto dos Anjos com suas respectivas informações e citações acerca de suas obras mais

importantes. Além disso, são contemplados um fragmento e um poema para sugestão de

leitura. “De Lobato, o fragmento da crônica “Urupês”, e, de Augusto dos Anjos, o poema “A

ideia”. Em relação às atividades propostos a partir das leituras, evidencia-se questões que

fazem a apropriação de informações a partir de questões discursivas. Mesmo tendo a

possibilidade de múltiplas respostas, os autores estabelecem uma resposta única para as

questões.

O capítulo 2, intitulado de “A linguagem do Modernismo”, contextualiza a linguagem

usada nessa nova manifestação literária. O que há de se destacar é o estudo da linguagem

iniciar a partir da leitura de três poemas “As janelas”, de Guillaume Apollinaire, “O

domador”, de Mário de Andrade e, “O capoeira”, de Oswald de Andrade. Destaca-se a

presença de uma orientação ao professor em relação à exploração da leitura dos poemas e as

intervenções sugeridas. Uma vez que a corrente estética anterior ao Modernismo era o

Parnasianismo, os autores comparam, em um quadro, as características de ambos, para o

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aluno perceber que a nova fase literária reformulou a arte. Além do quadro comparativo, os

autores propõem exercícios de fixação, que tornam os poemas objeto de estudo da língua, de

regras gramaticais, etc. O capítulo ainda contempla uma perspectiva multidisciplinar, na qual

apresenta um painel de textos que relacionam a produção literária do Modernismo ao contexto

histórico, social e cultural em que o movimento floresceu. É importante destacar que, fica

evidente que os autores seguirão a linha cronológica da historiografia literária, o que é

condenado por alguns críticos literários.

O capítulo 3 trabalha a produção de texto. A tipologia textual estudada é a crônica.

Para produzir o texto, há a sugestão de leitura de crônicas de Fernando Sabino e de Lourenço

Diaféria, para o aluno ter contato com tal gênero e assim estar apto a elaborá-lo. Outra

produção textual é sugerida no capítulo 9. Nele os autores trabalham o gênero texto de

divulgação científica. Embasado por sugestão de leituras, o aluno é desafiado a escrever um

texto do gênero, para em seguida, ser objeto de estudo da língua.

O capítulo 4 apresenta as vanguardas do Modernismo. Os autores apresentam a teoria

das correntes relacionadas a expressões artísticas e a autores de representatividade. A

vanguarda brasileira é abordada a partir da Semana de Arte Moderna, na qual explanam sobre

a importância da Semana e destacam os envolvidos. A sugestão de leitura proposta pelos

autores é o poema “Os sapos”, de Manuel Bandeira, base para resolução de exercícios para

interpretação. Nestes, o aluno é levado a selecionar informações acerca do texto e a ainda, a

estudar a língua.

A língua também é foco de estudo dos capítulos 5 e 7. Neles são estudadas as orações

substantivas e adjetivas do período composto por subordinação. Os exercícios propostos para

o estudo das orações partem da leitura de fragmentos da canção “Eu sei que vou te amar”, de

Tom Jobim e Vinícius de Morais e de uma obra pictórica da série Os retirantes, de Candido

Portinari. Há ainda o estudo das orações a partir do poema “Poema da necessidade”, de Carlos

Drummond de Andrade. Tornar o texto base de exercícios obrigatórios, além de estudar a

língua e a gramática a partir do texto, como constatado na questão “qual a oração principal

desse período? Como se classifica a oração casar João?” (CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p.

62) desfavorece a formação de alunos leitores, tão almejados pela escola. O poema “Perde e

ganha”, de Ferreira Gullar e “O leitor e a poesia”, de Affonso Romano de Sant‟Anna são as

leituras propostas no capítulo 7, e que também são base para resolução de exercícios de

gramática para o ensino da língua, como por exemplo, “A que classe gramatical pertencem as

palavras o e que nesses dois versos? Qual a função sintática dessas palavras nesses versos?”

(CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p. 85).

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A literatura volta a ser estudada nos capítulos 6, 8 e 10. No capítulo 6 é abordado o

Modernismo e sua primeira geração em Portugal, contextualizando a mudança política e

cultural vivenciada pelo país e que fez despertar o Modernismo e seu principal autor de

literatura: Fernando Pessoa. Além de abordar as revistas e o espírito de renovação, os autores

do livro didático contemplam o estudo mais aprofundando sobre o autor Fernando Pessoa e de

seus heterônimos. São sugeridos, como leitura, fragmentos dos poemas “O guardador de

rebanhos”, “O ano da morte de Ricardo Reis”, “Tabacaria”, e do poema integral

“Autopsicografia”. É importante destacar que, os exercícios propostos para compreensão do

texto possibilitam múltiplas respostas e ainda, favorecem uma reflexão crítica acerca das

temáticas dos poemas.

No capítulo 8 é abordada a primeira fase do Modernismo, focando nos autores Mário

de Andrade e Oswald de Andrade. Os autores Cereja e Magalhães contextualizam a primeira

fase destacando as manifestações ocorridas e intituladas “A orgia intelectual”, “Pau-Brasil: a

poesia de exportação”, “Verde-Amarelismo e Anta: a reação”, e a “Antropofagia: a deglutição

cultural”.Os autores ainda destacam os vários escritores que participaram da primeira geração

do Modernismo brasileiro como Manuel Bandeira, Guilherme de Almeida, Raul Bopp, entre

outros. Ao focar o estudo de Oswald de Andrade, o livro didático apresenta quatro poemas do

autor e propõe a resolução de questões. É interessante pontuar que, as questões propostas

permitem que o aluno relacione informações de outras áreas do conhecimento, além de

informações atuais acerca de acontecimentos e situações pelas quais passa o país. Ainda

apresentam a prosa e o teatro do autor. Mário de Andrade é explorado no material didático, e

destacam o experimentalismo, o nacionalismo e a crítica social que fundamentam a prosa

deste autor. A sugestão de leitura parte do fragmento do livro Macunaíma, e entre as questões

propostas pelo material é abordada a variedade linguística, a partir de expressões presentes no

fragmento da leitura.

O resgate lírico e a relação das inovações técnicas e linguagem jornalística com a fala

coloquial dos ítalo-paulistas é a temática do capítulo 10 que contempla o estudo sobre os

autores Manuel Bandeira e Alcântara Machado. Durante o estudo sobre o autor, vários

fragmentos de poemas são apresentados para leitura. O poema “Libertinagem”é apresentado

na íntegra para a leitura e a resolução de exercícios. Destaca-se o cotejo entre poemas do

modernista Manuel Bandeira e do cabo-verdiano Ovídio Martins, “Vou-me embora pra

Pasárgada”e“Antievasão”, respectivamente. Este diálogo antecede os exercícios propostos

pelo livro didático. De ordem reflexiva e crítica, os exercícios apresentam uma

contextualização histórica e ainda informações acerca do tema abordado pela questão. Em

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relação a Alcântara Machado, focam a linguagem cinematográfica e a identificação do autor

com a alma popular. Além das informações acerca do autor e das relações com outros autores,

o livro didático destaca o conto “Gaetaninho”, pertencente à obra Brás, Bexiga e Barra

Funda. Os exercícios propostos para o estudo do texto estão relacionados ao estudo da língua.

A segunda fase do Modernismo e o romance de 30 é o tema da segunda unidade do

livro didático dos autores Cereja e Magalhães. Composto por dez capítulos, a unidade

contempla o estudo de literatura, a produção e interpretação textual e o estudo da língua. O

ensino da língua é estruturado pelo estudo do período composto por subordinação: as orações

adverbiais, o período composto por coordenação: as orações coordenadas e o estudo da

pontuação. Os gêneros trabalhados na produção textual é a Carta de leitor, a Carta de

reclamação e de solicitação. É importante ressaltar que o livro sugere a leitura de textos dos

gêneros para, posteriormente, propor a produção textual. A literatura é centro de estudo em

quatro capítulos da unidade 2.

O romance de 30 e a autora Rachel de Queiroz são abordados no primeiro capítulo da

unidade. Inicialmente, os autores contextualizam o gênero romance, além de abordagem o

contexto histórico da década. Para o aluno ter contato com a ficção de 30, os autores sugerem

a leitura de um fragmento de uma das mais importantes da época: Vidas Secas, de Graciliano

Ramos. A leitura é objeto de estudo a partir de exercícios pré-estabelecidos. É importante

pontuar que, para introduzir a questão, os autores do livro didático proporcionam ao aluno

uma contextualização do tema a ser abordado. O aluno é levado a inter-relacionar a temática

do fragmento com problemas sociais e a realidade atual, além do homem com o meio natural

e social. Os autores apresentam, ainda, um infográfico e um painel de textos interdisciplinares

que relacionam a produção literária da segunda fase do Modernismo ao contexto histórico,

social e cultura em que essa literatura floresceu. O livro destaca o compromisso com a

ideologia, e os diferentes caminhos trilhados pelo romance de 30, dentro os quais se destacou

o regionalismo nordestino. Para abordar o contexto histórico da época, é sugerido o fragmento

de A bagaceira, de José Américo de Almeida, que retrata o drama coletivo da degradação

humana. Esse viés literário foi explorado por outros autores citados pelo livro didático, como

Jorge Amado, José Lins do Rego, Graciliano Ramos. No regionalismo sulista, Érico

Veríssimo, entre outros. O estudo central do capítulo é sobre a autora Rachel de Queiroz e

suas principais obras. Como sugestão de leitura, destaca-se o trecho do romance O quinze,

que retrata o período que antecede a partida de Chico Bento. Após a leitura, são propostos

exercícios de compreensão do texto que permite ao aluno dialogar o tema da seca com o da

fome. Além disso, apresentam um fragmento de notícia de jornal que trata da crítica acerca do

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livro de Rachel. Ademais, indicam endereços eletrônicos para aprofundar o conhecimento

acerca da autora e das obras.

O capítulo 4, da segunda unidade, trata da representação do Nordeste no romance de

30 dos autores Graciliano Ramos, José Lins do Rego e Jorge Amado. O capítulo apresenta

informações acerca dos autores, do contexto histórico e social. As sugestões de leitura são

fragmentos dos romances São Bernardo, de Graciliano Ramos, Fogo Morto, de José Lins do

Rego e Capitães de Areia, de Jorge Amado, condicionadas à resolução de exercícios,

essencialmente destinados ao estudo da língua. Além disso, o livro didático relaciona a

temática dos romances com recorte de notícias, de críticas de outros autores em relação às

obras estudadas no capítulo.

O sul é representado no romance de 1930 pelos autores, Érico Veríssimo e Dyonélio

Machado e no capítulo 7. Em relação a Érico Veríssimo, o livro aborda o resgate histórico. Ao

contextualizar o autor e às obras, Cereja e Magalhães trazem considerações do crítico José

Dacanal e comparam o romance nordestino de 30 com o romance gaúcho da mesma época.

Como sugestão de leitura, o livro didático propõe o fragmento de Ana Terra, parte de O

continente, e que é condicionada a questões com respostas discursivas:

FONTE: CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p. 194.

É possível perceber que as perguntas permitem apenas a retomada de informações

acerca do fragmento e, ainda, não apresentam nenhuma orientação ao professor para aceitar

outras possíveis respostas, a não serem aquelas dadas contempladas no livro didático. Além

disso, a questão não permite ao aluno uma análise mais aprofundada e crítica do texto, nem

desenvolve a habilidade de compreendê-lo e construir um posicionamento perante a leitura.

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O autor rio-grandense Dyonélio Machado também é objeto de estudo. Após breve

contextualização e apresentação das principais obras deste autor, o livro didático sugere a

leitura do fragmento de Os ratos. Acerca das questões propostas, a partir da leitura do

fragmento, é possível identificar a necessidade de o aluno relacionar informações críticas com

a temática do fragmento, e assim, formular a resolução do questionamento, visto na questão

abaixo:

FONTE: CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p. 197.

O capítulo 9 apresenta a segunda geração do Modernismo em Portugal. Há uma breve

contextualização histórica-social da época, além da presença de comentários do crítico

literário Benjamin Abdala Júnior. O único autor abordado pelo capítulo para o estudo da

segunda geração modernista em Portugal é José Régio, e é deste autor a indicação para leitura.

O poema “Cântico negro”, a partir de sua leitura, é o objeto de estudo nos exercícios

propostos pelos autores do livro didático.

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Na unidade três do livro didático, o foco é a segunda fase do Modernismo e a poesia

de 30. Composto por 8 capítulos, a unidade contempla o estudo da literatura, da produção

textual e do estudo da língua. O debate regrado público é a sugestão dos autores para a

produção textual, que trabalha o gênero de forma teórica na produção enquanto texto, e a

oralidade na forma prática. No ensino da língua é abordado o ensino das concordâncias,

verbal e nominal, focando na concordância na construção do texto e na regra geral. Quanto à

literatura, ela é contemplada em quatro capítulos da unidade.

A poesia de 30 é tema dos capítulos 1 e 5 da unidade. Em relação à poesia, os estudos

focam nos autores Carlos Drummond de Andrade, Cecília Meireles e Vinícius de Morais. O

capítulo 1 contempla a poesia de Carlos Drummond de Andrade. A partir da contextualização

histórica da época, o livro didático sugere a leitura do poemaQuadrilha, além de exercícios de

fixação. É importante destacar que, nestes exercícios, é contemplado o estudo da função

sintática de versos. Ainda, aprofundar o estudo sobre Drummond, Cereja e Magalhães

cotejam o poema “No meio do caminho”, com o poema “Poesia verde”, do poeta angolano

José Luís Mendonça e ainda a poesia de Drummond com a poesia do autor chileno Pablo

Neruda, “As sem-razões do amor” e “Presente de um poeta”, respectivamente. Destaca-se que

tais cotejos, são objetos de estudos superficiais nos exercícios propostos, os quais fazem

apenas a rememorização de informações presentes nos textos. O professor e o aluno ainda têm

disponível, indicações de endereços eletrônicos para aprofundar seu conhecimento acerca do

autor.

Cecília Meireles e Vinícius de Morais completam o grupo dos principais poetas da

segunda geração do Modernismo brasileiro, no capítulo 5 da unidade. Nele, há a

contextualização da época, que introduzem o estudo em relação aos autores. É importante

destacar que, neste capítulo, constata-se a presença de poemas cuja intencionalidade é apenas

a leitura, o que potencializa a abordagem temática. Porém, os exercícios não fogem à regra

dos outros capítulos que abordam a poesia, oriundos da leitura de poemas dos autores

estudados. Ainda é estudado na unidade, no capítulo 6, o teatro brasileiro nos séculos XX e

XXI. O estudo é potencializado pela apresentação de informações a respeito dos principais

autores e obras teatrais. Destacam-se autores, como Maria Adelaide Amaral, Ariano Suassuna

e Nelson Rodrigues, este sendo estudado de forma separada. Uma cena da peça Vestido de

noiva, do dramaturgo, é a sugestão de leitura e a partir dela, é proposto uma atividade de

compreensão do texto, a partir de exercícios. Nota-se, novamente, a superficialidade das

questões, uma vez que se procura, pelas questões, localizar informações e situações que

envolvem as personagens do texto. A prosa neorrealista e existencialista em Portugal é a

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abordagem do capítulo 7 da terceira unidade. O estudo sobre tal prosa se dá em apenas quatro

páginas, contemplando apenas dois autores, de modo superficial, Alves Redol e José Cardoso

Pires. Aquele é objeto de leitura com o fragmento de Gaibéus, e que também é centro dos

exercícios propostos pelo material didático.

A unidade 4 do livro didático contempla o estudo aprofundado do texto dissertativo –

argumentativo, a produção textual de tal gênero, desde a introdução, argumentação e

conclusão, além o estudo da língua, partindo da regência verbal e nominal e, ainda, a

colocação pronominal na construção do texto. A literatura contemporânea brasileira é

estudada em seis capítulos, sendo o foco do estudo em três autores do cânone literário. Ainda

é estudada na unidade a literatura portuguesa contemporânea, tanto em prosa quanto em

poesia, as tendências da literatura brasileira contemporânea e o panorama das literaturas

africanas de língua portuguesa. É importante destacar que, os autores do livro didático

conceituam a literatura contemporânea como sendo aquela produzida a partir da década de

1940.

O capítulo 1 da última unidade do livro destaca a produção das décadas de 1940 a

1950 e a autora estudada é Clarice Lispector. A partir de uma breve contextualização da

época, o livro dá enfoque à leitura de três fragmentos, de autoria dos principais escritores da

época, A paixão segundo G. H., de Clarice Lispector, Sagarana, de Guimarães Rosa e A palo

seco, de João Cabral de Melo Neto e de exercícios cuja competência pretendida é a

apropriação de informações acerca de versos, da posição das sílabas tônicas, etc. Ainda, ao

estudar Clarice Lispector de forma aprofundada, o livro didático sugere a leitura de um conto

que integra a obra Laços de família. Após a leitura, Cereja e Magalhães apresentam exercícios

para a compreensão do texto. Em algumas questões, constatou-se da necessidade de uma

visão crítica acerca da realidade e que converge na leitura crítica do conto para a reflexão e

elaboração das respostas.

Guimarães Rosa e sua linguagem reinventada são o ápice do estudo contemplado pelo

capítulo 4. Neste, há uma breve apresentação do autor e a abordagem da grande novidade

linguística introduzida pelo autor. Ao contemplar o estudo do autor, reconhecido pelo cânone

literário, o livro didático aborda a capacidade do autor de transpor os limites do espaço

regional em que quase sempre se situam seus textos e alcançar uma dimensão universal. É

apresentado, de forma sucinta, o romance Grande sertão: veredas. O capítulo ainda apresenta

informações a respeito de outras obras de Guimarães Rosa e que foram adaptadas para o

cinema, como A terceira margem do rio, Fatalidade, entre outros. Em relação às atividades

propostas no capítulo, é importante pontuar que elas partem da leitura do fragmento de

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Grande sertão: veredas, no qual Riobaldo começa a contar sua história e a revelar ao

interlocutor as inquietações que o afligem e contemplam, de forma superficial, a apreensão

das informações apresentadas pela leitura. Pontua-se, positivamente, a presença de indicações

de sítios eletrônicos para acesso pelo professor e aluno, e assim, conhecer outros textos de

Guimarães Rosa.

Outro autor canônico contemplado para estudo da literatura contemporânea é João

Cabral de Melo Neto. No capítulo 5, da quarta unidade, as obras do poeta são objeto de estudo

e apreciação. Partindo da leitura de trecho de O engenheiro, o livro didático contextualiza o

autor e suas principais obras. Ainda dá destaque à Morte e vida severina, esmiuçando, de

forma rápida, as principais partes do texto. Em relação a este, os autores pontuam, em um

quadro separado, a informação que o autor tem um projeto em comum com outro escritor,

Graciliano Ramos, ao concederem à paisagem do Nordeste, à miséria e à bravura do

nordestino uma das dimensões estéticas mais fortes, cruéis e indiscutíveis que o Brasil

conheceu. Dois fragmentos da obra Morte e vida severina são sugeridos para leitura e objeto

central dos exercícios de compreensão textual superficiais propostos pelo livro didático.

Pontua-se, negativamente, a presença incessante de questões que não permitem a formação da

criticidade do aluno, uma vez que, o viés tomado por elas são o de rememorização de

informações acerca do texto.

O capítulo 7 aborda a literatura portuguesa contemporânea. Os autores pontuam na

abertura do capítulo que “desde a década de 1960, convivem na literatura portuguesa várias

tendências, [...]. Com a Revolução dos Cravos (1974), a produção literária em Portugal

ganhou novos matizes, incorporando a literatura de guerra, o revisionismo histórico e o

experimentalismo estético” (CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p. 355). Partindo da

contextualização da Revolução dos Cravos, os autores contextualizam a prosa contemporânea

portuguesa. O autor, utópico e crítico da realidade, contemplado no estudo da prosa é José

Saramago. A partir de informações acerca de sua vida e suas principais obras, o livro didático

explana sobre a narrativa Ensaio sobre a cegueira,e apresenta um trecho da narrativa para

leitura e exercícios de fixação e compreensão acerca dele. O livro ainda apresenta um diálogo

da narrativa com o quadro Cisnes refletindo elefantes, de Salvador Dalí, uma vez que ambos,

Saramago e Dalí se interessam pela percepção visual da realidade. Outros autores citados no

capítulo são Lobo Antunes, José Luís Peixoto, David Mourão – Ferreira, Alexandre O‟Neill,

Nuno Júdice, Filipa Leal, entre outros. Ao propor informações acerca dos autores, Cereja e

Magalhães, indicam a leitura de trechos de textos e poesia integral para exemplificar as

características de cada autor presente em sua obra. Há apenas uma sugestão de leitura que está

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ligada à cobrança de exercícios, que é o poema “A secreta viagem”, de David Mourão –

Ferreira.

O capítulo 8 desta unidade trata das tendências da literatura brasileira contemporânea,

poesia e prosa. Os autores pontuam que “a literatura da primeira metade do século XXI se

apropria das tradições literárias desenvolvidas a partir da segunda metade do século XX.

Metalinguagem, experimentalismo formal, engajamento social e a mistura de tendências

estéticas são alguns dos traços que marcam a produção contemporânea” (CEREJA;

MAGALHÃES, 2013, p.364). A poesia é o primeiro objeto de estudo apresentado pelo livro

didático. O estudo contempla a leitura de poesias dos autores diversos como Ferreira Gullar,

Paulo Miranda, Paulo Leminski, Donizete Galvão. Estuda-se ainda, a poesia concreta, desde a

poesia marginal de 1970 a 1980 e até a poesia do fim do século XX à década atual,

destacando-se nesta, a poesia multimídia de Arnaldo Antunes. É importante destacar que,

sendo a prosa contemporânea brasileira o foco central da análise, a poesia contemporânea fora

analisada de forma superficial.

A prosa brasileira contemporânea é apresentada em apenas cinco páginas do capítulo.

Os autores do livro didático pontuam que é a partir de 1960 que a ficção consolidou a

tendência contemporânea. Nesse período, destaca-se, mais que a poesia, a crônica e o conto.

Segundo os autores do livro didático, a crônica revelou e confirmou autores como Luís

Fernando Veríssimo, Jô Soares, Marcos Rey, Walcyr Carrasco, Moacyr Scliar, Carlos Heitor

Cony, Mário Prata, entre outros. Ainda cita o romance, este se desdobrando em diferentes

linhas, como o policial, o psicológico, o histórico e o memorialista. Para estudar a prosa

brasileira contemporânea, o livro apresenta um comentário do crítico literário Manuel da

Costa Pinto a respeito da ficção mais recente.

A primeira leitura sugerida são dois contos, um de autoria de um dos mais importantes

escritores da literatura brasileira atual Dalton Trevisan, e outro de Fernando Bonassi, escritor

revelação dos últimos anos. Após a leitura, os contos são objetos de estudo a partir de quatro

questões, cujas respostas são discursivas. Abaixo, é apresentada uma das questões elaboradas

e propostas pelo livro:

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FONTE: CEREJA; MAGALHÃES, 2013, p. 374.

Nota-se, a partir do exercício, que a pergunta é superficial, busca-se, meramente, a

apropriação de informações acerca do conto de Dalton Trevisan. Tal abordagem não constrói

uma leitura e um posicionamento crítico a respeito do tema abordado pelo conto. Novamente

o texto serve para o estudo da língua. O que chama atenção é a questão 4 que proporciona ao

aluno cotejar textos literários de diferentes autores, e assim, inter-relacionar a temática

abordada.

Ao contextualizar, teoricamente, o gênero conto, o livro destaca os autores Lygia

Fagundes Telles, Osman Lins, Murilo Rubião, Moacyr Scliar, Otto Lara Rezende, Dalton

Trevisan, José J. Veiga, Rubem Fonseca, João Antônio, Milton Hatoum, Sérgio Sant‟Anna,

Caio Fernando Abreu, Fernando Bonassi, Marcelino Freire, entre outros. Cereja e Magalhães

chamam atenção para os contos do curitibano Dalton Trevisan, uma vez que, pois são a

síntese do desenvolvimento da prosa urbana na literatura brasileira. Outro gênero abordado

pelo livro é o miniconto. De forma bem sucinta, o livro destaca que o miniconto propõe ao

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leitor uma leitura instantânea de uma situação, e citam o autor Marcelino Freire como um dos

representantes do gênero.

A crônica literária também é abordada no capítulo. De forma superficial e teórica, o

gênero é apresentado ao aluno destacando os principais cronistas, como Fernando Sabino,

Luís Fernando Veríssimo, Moacyr Scliar, Marcelo Rubens Paiva, entre outros. O romance

brasileiro contemporâneo também é estudado no capítulo, focando para as direções mais

tradicionais tomadas pela ficção, a do Realismo e a intimista. Entre os romancistas citados

pelo livro estão João Ubaldo Ribeiro, Milton Hatoum, Fernando Sabino, Chico Buarque de

Holanda, Lygia Fagundes Telles, CristovãoTezza, Daniel Galera, João Gilberto Noll, Patrícia

Melo, Rubem Fonseca, Luiz Ruffato, entre outros. Ganham um destaque especial com uma

rápida contextualização, os autores Luiz Ruffato, Rubem Fonseca, JocaReinersTerron e

Milton Hatoum. É necessário destacar que, não há sugestão de mais leituras no capítulo, o

ensino da prosa contemporânea brasileira se dá através de teoria. Não há se quer a presença de

fragmentos, nem exercícios. É impossível estudar essa tendência, muito menos em formar

alunos leitores dessa literatura sem que haja o contato com o texto literário contemporâneo.

O capítulo 9 traz um panorama das literaturas africanas de língua portuguesa e

contempla o estudo e a leitura de textos dos autores angolanos Pepetela e Maurício Gomes, do

moçambicano Mia Couto e do cabo-verdense Onésio Silveira. A leitura dos textos, como em

todo o livro didático, serve como base para a resolução de exercícios, e não apenas para o ato

de ler.

O livro didático analisado ainda contempla no final de cada unidade capítulos que

abordam as competências e habilidades específicas da área de Linguagens, códigos e suas

tecnologias avaliadas no exame do Enem, seguidas de exercícios de interpretação textual, cuja

finalidade é o treinamento do aluno para que este se familiarize com as questões

contempladas pelo exame, além de exemplificar as competências avaliadas a partir das

questões. Há ainda seções que apresentam sugestões de projetos interdisciplinares que

cotejam o texto literário com outras linguagens e áreas do conhecimento. O livro encerra com

a bibliografia utilizada na elaboração do material didático.

A partir da análise global do livro, é importante avaliá-lo a partir do roteiro de

avaliação elaborado neste trabalho de pesquisa. Em relação à proposta pedagógica, o livro dos

autores William Roberto Cereja e Thereza Cochar Magalhães atende de forma satisfatória. Os

objetivos e a metodologia de ensino-aprendizagem são explicitados, tanto na apresentação do

livro, quanto no Manual do Professor. Este orienta, detalhadamente, o docente para a

execução das atividades propostas, constatado, no Manual, pelas Sugestões de estratégias para

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a prática em sala. É contemplada ainda, nas orientações ao professor, uma concepção de

leitura da literatura baseada em reflexões teóricas, entre elas, as de Antônio Candido, Mikhail

Bakhtin, Alfredo Bosi e Hans Robert Jauss. Levando em conta as abordagens dos documentos

oficiais em relação ao ensino de Língua Portuguesa e Literatura, constata-se que o livro

atende plenamente à proposta curricular para o Ensino Médio explicitada nos PCN, PCN+ e

PCNEM, no que tange a interdisciplinaridade, a educação para a cidadania, a formação de um

indivíduo autônomo, etc. Há de se pontuar que, em relação às OCNEM e aos conhecimentos

de literatura, o livro não atende à proposta humanizadora explicitada por este documento.

Ao avaliar o tópico das atividades didáticas para leitura de literatura, pode-se afirmar

que o livro didático analisado atende, em partes, o roteiro elaborado. A leitura de textos

literários sugeridos pelo livro se dá a partir de fragmentos, não contemplando a integralidade

dos textos literários em prosa, exceto os textos em verso. Pontua-se ainda que, mesmo

utilizando-se de trechos de textos em prosa de diversos autores de cada época, nenhum

capítulo propõe atividade que relacione diferentes textos de um mesmo autor, há, em algumas

vezes, o cotejo entre textos de mesma temática, porém de autores e obras diferentes.

O material didático ainda não apresenta atividades que possibilitem estabelecer relação

do texto literário com o contexto social de sua produção, o que aparece no livro, de forma

isolada, o contexto histórico e social das “escolas” literárias e informações resumidas acerca

dos autores. Ainda não mobiliza o conhecimento prévio do aluno acerca dos temas abordados.

Os capítulos iniciam com a contextualização da época, mas não parte do conhecimento já

internalizado pelo aluno. Em relação à análise de texto literário, o livro, de Cereja e

Magalhães, não contempla atividades que objetivam esmiuçar o texto. O que apresenta, de

forma farta, são atividades de interpretação textual. Mas, é necessário ressaltar que, os

exercícios de interpretação são superficiais, buscam retirar do texto informações que

possibilitam rememoralizá-lo, além disso, torna o texto literário a base para o estudo da

língua. Ainda sobre as atividades de interpretação do texto literário, os autores propõem

questões que possibilitam múltiplas respostas por parte dos alunos, porém, não há orientação

ao professor para aceitar respostas diferentes àquelas informadas pelos autores do livro.

O livro atende, satisfatoriamente, em relação à contextualização dos temas literários

abordados. Ao iniciar cada unidade e capítulos os autores introduzem os temas e autores a

serem estudados com muitas informações acerca da época, da sociedade, dos autores e das

obras contempladas no estudo. Ademais, nos capítulos intitulados Vivências, ao final de cada

unidade, o livro didático apresenta atividades que permitam o cotejo entre textos literários e

não literários, e ainda projetos que inter-relacionam a literatura com outras áreas do

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conhecimento, reforçando assim, a proposta pedagógica apontada pelos autores e atendendo

aos documentos oficiais. No entanto, pontua-se que, o livro didático pouco apresenta

atividades que objetivam a reflexão crítica sobre o texto literário, o que permite o

questionamento: Como alcançar o objetivo proposto pela proposta pedagógica do livro, em

relação à autonomia, à criticidade do leitor – aluno, se o principal material didático disponível

não contempla atividades que favorecem tal formação?

Em relação ao tópico central da análise deste trabalho de pesquisa, a prosa brasileira

contemporânea, o livro didático atende, parcialmente, ao roteiro proposto, uma vez que,

contempla em grande número, obras e autores prestigiados pela crítica literária, ou seja, o

estudo da prosa brasileira contemporânea se inicia com os autores e fragmentos de obras

canônicas de Clarice Lispector, Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto. Não há a

possibilidade do estudo da prosa, a partir de leituras de autores menos valorizados pela crítica.

Estes autores apenas são citados como representantes de certos gêneros, sem apresentar

sugestão de leituras de suas obras. Desta forma, o livro analisado silencia as leituras de um

vasto referencial autoral contemporâneo, o que pressupõe que Cereja e Magalhães estão em

consonância com a crítica literária acerca de prestigiarem apenas leituras de autores do

cânone. A partir de tal constatação, é possível afirmar que, na elaboração do livro didático, os

autores selecionaram, de forma inadequada, conteúdos, autores e obras que possibilitariam um

conhecimento adequado e aprofundado sobre a prosa brasileira contemporânea. Ainda, o que

corrobora a afirmação anterior é a ausência de referenciais bibliográficos e digitais que

ampliem este conhecimento, porém, tal qual especificado no Manual do Professor e

atendendo aos documentos oficiais, o livro didático permite associar a prosa literária brasileira

contemporânea a outras formas de arte, como a pintura, o cinema, etc.

Acerca da indicação de material suplementar para estudo, o livro Português:

linguagens pode-se afirmar que o mesmo atende satisfatoriamente ao roteiro ao indicar

material suplementar, tanto para o professor quanto para o aluno. Há em cada capítulo,

indicações de endereços eletrônicos, de filmes, de músicas, de livros que ampliam, de forma

aprofundada, o conhecimento em relação ao assunto estudado. Quanto à incorporação de

estudos acadêmicos, o livro apresenta comentários de críticos literários em diversos capítulos

de estudo da literatura, porém, peca ao não contemplar tais contribuições no estudo da prosa

brasileira contemporânea.

Em suma, a partir da análise global do livro e a avaliação dos tópicos elencados pelo

roteiro elaborado, é necessário refletir sobre a presença desta coleção no rol das coleções

aprovadas pelo Guia do PNLD 2015. Cereja, um dos autores da coleção, mostra-

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secontraditório ao contemplar, no livro didático, o estudo da literatura a partir da periodização

da historiografia literária e autores tradicionalmente prestigiados pela crítica literária, pois em

sua tese de doutorado William Roberto Cereja mostra-se contrário a tal abordagem nos

materiais didáticos. Segundo o autor, nos materiais didáticos, para o ensino de literatura,

existentes no mercado,

a organização dos conteúdos, apoiada nahistoriografia literária, privilegia o enfoque

cronológico de movimentos, gerações eautores, com suas respectivas obras de

destaque. Estudar literatura, sob essaperspectiva, quase sempre é o mesmo que

conhecer, geralmente de formapassiva, aquilo que os “bons” escritores (com todas

as falhas e injustiças que historicamente sempre ocorreram nessa avaliação)

escreveram ao longo dahistória de nossa cultura. Trata-se, pois, de uma concepção

conteudista e enciclopédica de ensino de literatura.Com pequenas alterações, tanto

os manuais didáticos quanto algunsprofessores (e talvez estes por influência

daqueles) interagem com os alunostomando como referência uma sequência de

procedimentos entre os quais aleitura do texto literário propriamente dita

desempenha um papel secundário,servindo muito mais à exemplificação da teoria

desenvolvida do que como objetobásico para a construção de conhecimentos de

literatura ou para odesenvolvimento de habilidades de leitura nessa modalidade de

texto. (CEREJA, 2004, p. 17 – 18).

Levando em conta a posição do autor em relação ao estudo de literatura apoiada na

periodização da historiografia literária, é de se estranhar que o autor contempla em seu livro o

estudo de literatura sob essa perspectiva. A partir dessa contradição destacada, podem-se

levantar alguns questionamentos: como é possível, um livro que está em sua nona atualização,

ainda abordar de forma equivocada o ensino de literatura, em especial a prosa brasileira

contemporânea?Tais atualizações seriam apenas para contemplar às propostas curriculares dos

documentos oficiais e forjar a aprovação pelo Guia do PNLD? Tendo os professores um olhar

mais crítico em relação às abordagens feitas pela coleção e, conhecendo o estudo do autor em

sua tese de doutorado, sustentaria o número de 2.313.339 de coleções escolhidas e

distribuídas para as escolas públicas brasileiras, sendo destas, 614.355 unidades do livro

analisado?

3.3 Livros didáticos do PNLD 2015: fragilidades, potencialidades e possibilidades

A partir da análise dos livros didáticos, percebeu-se que sua elaboração atende à

proposta curricular dos documentos oficiais PCN, PCN+ e PCNEM no que diz respeito às

áreas do conhecimento, ou seja, Linguagens, códigos e suas tecnologias, focando na

interdisciplinaridade, no estudo, em primeiro plano, da língua materna, além de tornar o texto

literário objeto de estudo da língua.

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Ao analisar criticamente os livros didáticos disponibilizados para a escola pública

brasileira e objetos deste trabalho de pesquisa, constataram-se inúmeras fragilidades do

material, e que se fossem levadas em conta no momento da escolha, alterariam a qualidade do

ensino de literatura em sala de aula, uma vez que, o livro didático é o principal, senão o único,

material utilizado pelo professor para o ensino. Uma das fragilidades em relação ao ensino de

literatura e a formação do leitor é a adoção de fragmentos de textos que impossibilitam que ao

aluno a fruição estética do texto, além dos fragmentos não instigar a leitura de um texto em

sua integralidade, ou ainda, apresentar ao aluno apenas a teoria e a contextualização da época

e de alguns autores da prosa contemporânea brasileira.

A predileção ao cânone e à cronologia da historiografia literária também pode ser

consideradauma fragilidades dos livros analisados. Tal abordagem de certo modo “engessa” o

estudo da literatura, pois fará com que o aluno tenha contato apenas com os autores e obras

tradicionais, prestigiadas pela crítica literária, e que muitas vezes, não dialogam com a

realidade na qual vivem, desfavorecendo assim, a fruição do texto e à leitura. Ao focalizar no

objeto da pesquisa, a prosa brasileira contemporânea, tal predileção pelos autores mais

prestigiados pela crítica também se constata. Nos livros analisados, os textos e/ou fragmentos

apresentados para estudos são de autores prestigiados pela crítica, o que silencia um vasto

referencial de textos e autores que vivem às margens dessa elite autoral.

Outra fragilidade dos livros didáticos é a falta da presença de leituras críticas em

relação à prosa contemporânea, o que possibilitaria ao aluno analisar e inter- relacionar as

informações dos diferentes pontos de vistas acerca de um assunto. É importante salientar que

tal habilidade de analisar e inter-relacionar diferentes pontos de vistas é contemplada no

documento oficial PCNEM, logo, a presença de pontos de vistas de críticos literários

favoreceria para que o aluno formasse sua leitura crítica.

Outro ponto frágil dos livros analisados são as atividades propostas para a leitura de

literatura. Ao se buscar a formação crítica e humana do aluno, para que ele seja capaz de

analisar, interpretar, assumir uma posição crítica perante o assunto, as atividades elaboradas e

presentes nos livros didáticos deveriam convergir para tal finalidade, uma vez que são

objetivos propostos pelos documentos oficiais. No entanto, o que se percebe, é a presença de

atividades superficiais, que retiram dos textos (fragmentos) apenas algumas informações

objetivando a rememorização ou reconstrução do texto. Os autores não privilegiam exercícios

que instiguem o conflito de ideias, de posições acerca do texto para que o aluno forme sua

posição crítica e assim construa suas respostas. Ainda, o texto é o ponto de partida para o

estudo da língua, tal qual contemplado pelos documentos oficiais. Além disso, é importante

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destacar que, em alguns livros analisados nem sequer são propostas atividades de leitura da

prosa brasileira contemporânea. Como podem os livros didáticos assumir o papel de

formadores de leitoresse não contemplam atividades para tal formação? Seria apenas para

ludibriar os que buscam tal finalidade? Um ponto é comum entre os livros analisados, todos

ficam aquém de formadores de leitores.

Contudo, mesmo apresentando fragilidades, os livros analisados também apresentam

potencialidades. Uma delas é em relação às orientações pedagógicas dadas ao docente, através

do Manual do Professor que contemplam contribuições teóricas de autores críticos com o

intuito de fundamentarem a prática docente e também a elaboração do material didático.

Acerca dessas contribuições, destaca-se a presença do crítico e sociólogo Antônio Candido no

livro Português-Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto. Visto que o

documento oficial OCNEM, publicado em 2006, traz um capítulo exclusivo sobre os

conhecimentos de literatura e que também contempla os estudos do crítico citado, ele alicerça

o estudo de literatura na formação humanizada do aluno. O autor do material didático acredita

que a literatura é o caminho para humanizar o aluno. Essa abordagem também é constatada no

Manual do Professor do livro acima citado. É importante ressaltar que é o único livro

analisado que contempla preocupações acerca da formação humana do estudante. No entanto,

essa abordagem humanística fica restrita às orientações para o docente, no Manual do

Professor, não se apresentando de forma satisfatória na elaboração das atividades de leitura.

Outro potencial dos livros analisados é a abordagem interdisciplinar. Atendendo às

orientações dos documentos oficiais, os autores contemplaram em todos os livros analisados o

diálogo da literatura com outras áreas do saber, o que possibilita ao aluno aumentar os seus

conhecimentos acerca do assunto estudado, além de tornar mais dinâmico este estudo. A

interdisciplinaridade se deu a partir de projetos que imbricassem a área das Linguagens com

outras áreas do conhecimento, em especial, à das Ciências Humanas, além de indicações de

leitura fílmica, cotejo de textos literários com obras artísticas de mesmo tema, visita à

exposição de Arte, consultas a sítios eletrônicos, entre outros, a fim de potencializar o

aprendizado. Ademais, destaca-se a seção “Vozes em Rede”, do livro Português-Vozes do

mundo, que contempla de forma intertextual, leituras de diversos autores. Há de se pontuar

também, como potencialidade, a abordagem diagnóstica sobre o conhecimento prévio do

aluno acerca do assunto abordado pelos capítulos do livro Português: linguagens em conexão,

além da contextualização da época.

Outro potencial é a indicação do uso de recursos tecnológicos para a prática em sala de

aula, o que abre possibilidades para o leitor buscar informações, dividir opiniões, compartilhar

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ideias. Além disso, a utilização desses recursos tecnológicos e digitais na escola permite

desenvolver novas habilidades que são essenciais para o mundo contemporâneo, o mundo do

estudo e do trabalho. Ademais, o uso desses recursos estimula as trocas no processo de

ensino-aprendizagem e a construção do conhecimento de forma autônoma e compartilhada.

Considerando este diagnóstico, pode-se elaborar um quadro de análise sintetizado

sobre os livros didáticos analisados:

Proposta pedagógica do livro AS AP NA

Português: língua e cultura X

Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto X

Português: linguagens em conexão X

Português: linguagens X

Atividades didáticas para leitura da literatura AS AP NA

Português: língua e cultura X

Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto X

Português: linguagens em conexão X

Português: linguagens X

Contextualização da prosa contemporânea brasileira AS AP NA

Português: língua e cultura X

Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto X

Português: linguagens em conexão X

Português: linguagens X

Indicação de material suplementar para estudo AS AP NA

Português: língua e cultura X

Vozes do mundo: literatura, língua e produção de texto X

Português: linguagens em conexão X

Português: linguagens X

LEGENDA:

AS = Atende Satisfatoriamente; AP = Atende Parcialmente; NA = Não Atende.

A partir desses apontamentos, há a necessidade de reflexão acerca das possibilidades

de se estudar literatura e de se formar leitores a partir de outro viés, a não ser o tomado pelos

livros didáticos analisados. Um caminho possível para a leitura e ensino de literatura é o

caminho inverso do adotado pela escola, que privilegia o ensino literário a partir da

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cronologia da historiografia literária, tal quais as autoras do capítulo Conhecimentos de

literatura, das OCNEM orientam. É necessário que o aluno tenha o primeiro contato

exclusivamente com o texto, para que possa ocorrer a fruição e a partir dele, conhecer o

contexto histórico de sua produção, informações adicionais sobre o autor e a obra, e

posteriormente, a resolução de atividades. Estas devem estar fundamentadas na análise crítica

do texto, que imbriquem pontos de vistas diferentes da do aluno para que este reelabore sua

leitura de texto e de mundo, no cotejo do texto literário com outras manifestações artísticas,

que possibilitem o texto literário dialogar com outros textos, sejam eles literários ou não.

Uma possibilidade de estudar literatura e potencializar a formação do leitor é a partir

de temáticas literárias. Isto permitiria colocar em evidência o estudo do texto enquanto texto,

e ainda cotejar diferentes textos literária do um mesmo autor e ainda de autores diferentes que

convergissem na mesma temática. Esse viés possibilitaria ao aluno contemplar diversas visões

e formas dos autores abordarem os temas propostos, além de transitar por épocas e contextos

diferentes. O estudo de literatura por temáticas permitiria a contemplação das vozes de textos

literários cujos autores são silenciados pela crítica literária, assim, possibilitaria que as obras

de autores marginais fossem estudadas e privilegiadas tal qual o cânone, sem hierarquizar.

É fato que é impossível os livros didáticos contemplarem a integralidade doe alguns

textos literários em prosa devido à sua extensão, como por exemplo, o romance. Porém, a

partir do estudo por temáticas, mesmo recorrendo aos fragmentos, as oportunidades de o

aluno se identificar com um tema abordado por eles são enormes, o que pode favorecer a

procura pelo texto integral. Além disso, a importância que os recursos tecnológicos têm na

vida dos alunos permite que estes sejam utilizados como ferramentas pedagógicas e também

estejam presentes em sala da aula para o estudo de literatura e para a leitura literária.

Há de se destacar que os recursos digitais podem diminuir a distância do aluno com o

texto literário, portanto, a partir da leitura de fragmentos de romances com a mesma temática,

além da leitura integral de textos literários como contos, crônicas, minicontos e outros, cuja

extensão permite a integralidade, pode-se fazer desta ferramenta pedagógica o viés para a

leitura e o estudo de textos literários. Ademais, o mundo da tecnologia oferece inúmeros

aplicativos que podem ser utilizados para fins pedagógicos, como por exemplo, o aplicativo

Hagaquê, propício para a criação de histórias em quadrinhos e que pode ser utilizado na

prática de leitura do texto literário, além de seu estudo. Uma possibilidade de seu uso é, a

partir da apresentação da temática a ser estudada, e dos fragmentos das leituras de diversos

autores e épocas, do aluno recriar o romance com o qual mais se identificou em forma de

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histórias em quadrinhos utilizando a ferramenta pedagógica disponibilizada pelo mundo da

tecnologia, o aplicativo Hagaquê.

Outra possibilidade é utilizar-se do programa MovieMakerpara a criação de

documentários ou até mesmo curta e longa metragens dos romances lidos. A ferramenta

instigaria debates, pontos de vistas diferentes, um estudo mais aprofundado sobre cenas, o

enredo, os personagens, e assim, o estudo do texto literário estaria acontecendo de maneira

mais dinâmica e lúdica, o que culminaria na fruição do texto.

Outra ferramenta tecnológica para o estudo de literatura a partir do texto é o aplicativo

Cmaptools, que cria mapas conceituais. A partir da leitura do texto literário, uma

possibilidade para atividades de análise e interpretação do texto é a criação de mapas

conceituais a partir de tópicos elaborados que permitam ao aluno extrair da leitura do texto as

informações solicitadas e que necessitam de uma visão mais crítica acerca da leitura,

favorecendo assim, que o texto seja estudado em sua essência.

Há ainda outro aplicativo que permite, de forma lúdica e mais aprofundada, estudar o

texto literário, o Hot potates. Com este aplicativo é possível elaborar questões assertivas, de

múltiplas escolhas, além de cruzadinhas, que levem em conta os descritores de habilidades

presentes em diversas provas e exames, como por exemplo. Vestibulares e Enem. Suma, o

mundo da tecnologia oferece várias possibilidades, sejam eles aplicativos, sejam eles sítios

eletrônicos, blogues, entre outros.

Enfim, essas propostas, que são resultado do que aprendemos no curso de Mestrado

em Letras e discutimos em disciplinas sobre literatura e formação do leitor, ainda precisam ser

“aplicadas” em contextos reais de ensino de leitura e literaturano Ensino Médio e assim

avaliadas para se ter uma visão precisa de todo o seu potencial, ainda não investigado. A

simples indicação dessas alternativas já sinaliza que há inúmeros caminhos que possibilitam o

estudo de literatura e a formação do aluno como leitor, exemplo disso são os aplicativos do

mundo tecnológico que podem servir como ferramentas pedagógicas e contribuir de forma

positiva para o ensino de literatura. O importante é destacar que, mesmo o livro didático

sendo uma realidade presente em todas as escolas públicas brasileiras, ele deve ser apenas um

suporte pedagógico para a leitura e o ensino de literatura.

Levando em conta as análises dos livros didáticos, é possível afirmar que não há um

pleno ensino de literatura, muito menos formação de alunos leitores, caso sejam eles o único

recurso utilizado pelo professor em sala de aula. É fundamental, e faz parte da prática

docente, a busca incessante de alternativas metodológicas para o exercício da docência e para

a formação integral do aluno em relação à leitura e ao ensino de literatura. Partindo disso, é

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imprescindível fomentar nos docentes estratégias de análises críticas acerca dos livros

didáticos que servirão para, criteriosamente, selecionar o material didático que sua escola

adotará balizará sua prática em sala. Se o livro didático é um mal necessário como afirma

Elaine Bender (2007), que seja então o de maior qualidade.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A escola brasileira vivencia e enfrenta, nos dias atuais, um grave problema que afeta

diretamente a qualidade de ensino e da formação do aluno da educação Básica:está havendo

um apagamento da leitura e do ensino de literatura na vida do estudante.Esse desapego do

estudante à leitura e à literatura explica-se, em parte, pelo fato de a disciplina de literatura

nem sempre ser desenvolvida adequadamente, na sala de aula e de a área literária não parecer

agradável ou convidativa aos alunos.

A leitura literáriaé de suma importância para a formação do aluno, pois desenvolve

nele a sensibilidade, tornando-o mais reflexivo, crítico e amplia as possiblidades enquanto ser

humano, potencializando a leitura de mundo e da realidade que o cerca, além de promover o

protagonismo na organização da sociedade. Ademais, a leitura do texto literário permite o

leitor construir múltiplas significações na proporção que vai utilizando a leitura de mundo

internalizada por ele para fomentar o texto lido com novos sentidos. Possibilita,ainda, ao

aluno, experienciar, infinitamente, a fruição, o deleite estético, a catarse e ainda, permite que

ele, pela polissemia do texto, preencha as lacunas deixadas pelo criador da obra e dê

significância ao universo apresentado no e pelo texto.

Dada à importância da leitura e, levando-se em conta os índices sobre a situação da

leitura no país, urge a necessidade de formar o aluno um leitor, por conseguinte, cabe à escola

promover o contato mais direto do aluno com o texto literário visando à formação de leitores.

Este contato se dá a partir do ensino de literatura e, principalmente, por meio do livro

didático. Muitos estudiosos criticam o uso deste material para o ensino de literatura e a

formação de alunos leitores por entenderem que o livro didático tem se mostrado incompleto,

limitado, devendo ser constantemente estudado, uma vez que, o livro didático adotado como

instrumento pedagógico, muitas vezes, não contempla, em sua maioria, possibilidade de

formação da criticidade, nem possibilita condições propícias para a leitura de literatura com

deleite e profundidade.

Ao analisar o ensino de literatura no Ensino Médio, à luz de reflexões crítica-

teóricas, percebeu-se que o livro didático ainda ocupa papel central no ensino do texto

literário e consequentemente, na formação do leitor, uma vez que é por meio dele que os

alunos do Ensino Médio das escolas públicas brasileiras têm acesso ao texto e a práticas de

leituras. No entanto, esse recurso pedagógico contempla, ainda, de forma equivocada o ensino

de literatura devendo ser utilizado como material suplementar na prática docente, uma vez

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que, apresenta inúmeras fragilidades apontadas por estudos críticos em relação ao ensino de

literatura e à formação de leitores.Estes reproduzem modelos de leituras enfatizando a

periodização da historiografia literária, e ainda colocam o aluno em contato com fragmentos

de texto, dificultando a compreensão do mesmo e a formação do gosto pela leitura no aluno.

Os livros didáticos exploram o ensino de literatura, de forma superficial e com um

objetivo evidente, apropriar o aluno de informações e conhecimento sobre literatura para fins

avaliativos, fazendo com que a literatura perca sua função social de sensibilizar e fomentar a

visão crítica no aluno, possibilitando que ele leia, analise e interprete textos de variados

gêneros, além de sua realidade e do mundo a sua volta. Destaca-se, ainda, que os materiais

didáticos analisados não ensinam e nem promovem debates críticos sobre o texto literário e as

atividades de análise e interpretação literária propostas por eles são, meramente, de

apropriações das informações acerca dos fragmentos de textos sugeridos para leitura. Por

conseguinte, não estimulam o aluno a conhecer a fundo o texto literário, nem permitem a

fruição e o deleite estético do texto. Essa constatação vai ao encontro do que há muito tempo

já é criticado por estudiosos, como Jaime Ginzburg (2012), os livros didáticos para o ensino

de literatura buscam construir um conhecimento mecânico, ou seja, dotar o aluno com o

máximo de informações acerca do texto literário visando à realização de provas e exames.

É lamentável que, por ser um recurso pedagógico tão presente nas salas de aula das

escolas brasileiras e de forma gratuita, o ensino de literatura esteja restrito a pseudoleituras

literárias e a atividades superficiais, uma vez que, a literatura pode ser vista como um

instrumento motivador e desafiador capaz de transformar o aluno do Ensino Médio em um

sujeito ativo, crítico e pensante. Outro ponto a ser considerado em relação às atividades

sugeridas a partir da leitura dos textos literários é que as mesmas, pelo fato de serem

superficiais, não permitem que o aluno construa conhecimento sobre literatura, tampouco,

permite vê-la como um viés para sensibilizar e humanizar o aluno enquanto sujeito, algo tão

defendido por Antônio Cândido.

Em relação à prosa contemporânea brasileira, foco de análise nos livros didáticos, é

possível afirmar que sua abordagem fica aquém da abordagem idealizada. Em todos os livros

didáticos analisados, esta estética literária é apresentada de forma sucinta, privilegiando a

leitura e estudo do texto de autores mais prestigiados pela crítica literária. Os autores menos

prestigiados por tal crítica são citados no transcorrer dos capítulos, no entanto, ficam em

segundo plano e não são prestigiados nas atividades de leitura. Entende-se que, os livros

didáticos são falhos em relação ao estudo da prosa brasileira contemporânea e em nada

contribuem para o aluno interagir com os diversos textos desta literatura, tampouco ajuda na

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formação de leitores desta estética. Há de se convir que é inviável os livros didáticos

apresentarem textos literários na íntegra, como o gênero romance, no entanto, a literatura

contemporânea brasileira em prosa dispõe de muitos outros gêneros textuais que permitem

serem contemplados nos materiais didáticos de forma integral, como o conto, a crônica, o

miniconto, entre outros, e que possibilitaria ao aluno interagir e cotejar textos de diferentes

gêneros e de diversos autores, além de analisá-los e debatê-los, o que, sem dúvida,

contribuiria, potencialmente, na construção de conhecimento de literatura e na sua formação

enquanto leitor.

Em suma, é importante ratificar a importância da literatura no Ensino Médio para a

formação do leitor e as contribuições da escola e do papel do professor nesse processo. No

entanto, é coerente compartilhar do entendimento de Cereja (2004) de que o ensino de

literatura no Ensino Médio, a partir dos livros didáticos, não alcança plenamente dois

objetivos cruciais a que se propõem: a formação de leitores competentes de textos literários

ou não literários e a consolidação de hábitos de leitura. É crucial ressaltar que o problema

pode ser considerado crônico, uma vez que os autores dos estudos críticos acerca da leitura e

do ensino de literatura apontam para suas deficiências já na década de 1980.

Tal apontamento converge para a necessidade urgente de repensar o ensino e a leitura

de literatura no Ensino Médio a partir do livro didático, uma vez que se mostra ineficiente,

para assim, definitivamente, alcançar a tão almejada formação de leitores proficientes,

críticos, autônomos e, essencialmente, humanizados.Com a ascensão das tecnologias, usar

seus recursos é um possível viéspara a leitura e o ensino do texto literário em sala de aula, no

entanto, é necessário, primeiramente, capacitar os professores para se familiarizar com esta

ferramentas digitais e estarem aptos a utilizá-las. Desse modo, este trabalho de pesquisa

pretende contribuir para a melhoria do ensino de literatura no Ensino Médio tornando-se uma

referência para consulta e reflexão por professores acerca das “alternativas” pedagógicas para

o ensino de literatura, e consequentemente, a formação do leitor através de livros didáticos e

assim revigorar os programas nacionais do livro didático para as escolas públicas brasileiras.

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