7
o l~ V ~ N - •••• ~ - ~ t- U') :l C Z - « > o z ~ LU « :r: •••• LU > « 1. Introdução, 2. A perspectiva unilinear do desenvolvimento; 3. O modelo primário-exportador; 4. A especificidade do modelo de substituição de importações; 5. As soluções possíveis. Maria Magdalena E. Mischan Rodrigues~· * Aluna do curso de pós-graduação da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas. R. Adm. Emp., Rio de Janeiro, 1. Introdução A partir da década de 30 até a década de 60 o Brasil apresentou um progresso continuoe sempre crescente no setor industrial, de tal modo que, ao final desse período, apresentava um amplo parque industrial e um mercado interno bastante diver- sificado. Esse parque industrial abrangia desde bens leves de consumo até numerosos bens de ca- pital, passando também pela indústria de base (si- derurgia, alumínio, cobre, química etc.) ; tudo le- vava a crer que o Brasil havia atingido aquele ponto em que o seu desenvolvimento seria auto- sustentado e que se encontrava praticamente na mesma situação dos países que primeiramente realizaram sua Revolução Industrial (Inglaterra, França e Estados Unidos) quando, a partir de um dado momento, esses países tiveram o seu desen- volvimento automático e quase necessário. A analogia com a primeira Revolução Industrial parece perfeita, mas primeiro seria necessário examinar os princípios teóricos em que, conscien- te ou inconscientemente, está baseada essa analo- gia e que se encontram desenvolvidos nas diversas teorias do desenvolvimento econômico. 2. A perspectiva unilinear do desenvolvimento Examinando-se as várias teorias do desenvolvi- mento econômico mais atuantes e conhecidas nos dias de hoje, nota-se que, apesar das diferenças que apresentam entre si, a maioria delas se iden- tifica em aspectos tão fundamentais que, pratica- mente, podem ser reduzidas a um mesmo tipo de concepção, a que podemos chamar de teoria uni- linear do desenvolvimento econômico. Essa teoria distingue-se pelo fato de simular o desenvolvimento a um processo continuo e linear de crescimento, constituído por uma sucessão de degraus necessários que se encaminham em dire- ção a uma determinada estrutura ideal, previa- mente concebida por cada teórico do desenvolvi- mento.' O desenvolvimento se definiria, portanto, como a superação dessas fases, como numa car- reira de obstáculos. 2 Cada fase seria precondição para a realização da próxima e assim sucessiva- mente. Embora discordando quanto aos aspectos que revestiriam cada fase, os fundamentos básicos desses autores são os mesmos, que todos eles são norteados pela visão das nações ocidentais hoje desenvolvidas. A adoção dessa perspectiva implica a possibilidade de extrapolação desse mo- delo aos países atualmente em desenvolvimento, já que as fases são necessárias e independentes do tempo e do lugar onde se desenvolvem. 12(3) : 107-113, jul.lset. 1972 A velha e a nova industrialização

V 3. O 4. N-rae.fgv.br/sites/rae.fgv.br/files/artigos/10.1590_S0034... · As soluções possíveis. Maria Magdalena E ... França e Estados Unidos) quando, a partir de um dado

Embed Size (px)

Citation preview

ol~V~N-••••~-~t-U'):lCZ-«>oz~

LU

«:r:••••LU

1. Introdução,2. A perspectiva unilinear do

desenvolvimento;3. O modelo primário-exportador;4. A especificidade do modelo de

substituição de importações;5. As soluções possíveis.

Maria Magdalena E. Mischan Rodrigues~·

* Aluna do curso depós-graduação da Escola de

Administração de Empresas de SãoPaulo, da Fundação Getulio Vargas.

R. Adm. Emp., Rio de Janeiro,

1. Introdução

A partir da década de 30 até a década de 60 oBrasil apresentou um progresso continuoe semprecrescente no setor industrial, de tal modo que, aofinal desse período, apresentava um amplo parqueindustrial e um mercado interno bastante diver-sificado. Esse parque industrial abrangia desdebens leves de consumo até numerosos bens de ca-pital, passando também pela indústria de base (si-derurgia, alumínio, cobre, química etc.) ; tudo le-vava a crer que o Brasil havia atingido aqueleponto em que o seu desenvolvimento seria auto-sustentado e que se encontrava praticamente namesma situação dos países que primeiramenterealizaram sua Revolução Industrial (Inglaterra,França e Estados Unidos) quando, a partir de umdado momento, esses países tiveram o seu desen-volvimento automático e quase necessário.

A analogia com a primeira Revolução Industrialparece perfeita, mas primeiro seria necessárioexaminar os princípios teóricos em que, conscien-te ou inconscientemente, está baseada essa analo-gia e que se encontram desenvolvidos nas diversasteorias do desenvolvimento econômico.

2. A perspectiva unilinear do desenvolvimento

Examinando-se as várias teorias do desenvolvi-mento econômico mais atuantes e conhecidas nosdias de hoje, nota-se que, apesar das diferençasque apresentam entre si, a maioria delas se iden-tifica em aspectos tão fundamentais que, pratica-mente, podem ser reduzidas a um mesmo tipo deconcepção, a que podemos chamar de teoria uni-linear do desenvolvimento econômico.

Essa teoria distingue-se pelo fato de simular odesenvolvimento a um processo continuo e linearde crescimento, constituído por uma sucessão dedegraus necessários que se encaminham em dire-ção a uma determinada estrutura ideal, previa-mente concebida por cada teórico do desenvolvi-mento.' O desenvolvimento se definiria, portanto,como a superação dessas fases, como numa car-reira de obstáculos.2 Cada fase seria precondiçãopara a realização da próxima e assim sucessiva-mente.

Embora discordando quanto aos aspectos querevestiriam cada fase, os fundamentos básicosdesses autores são os mesmos, já que todos elessão norteados pela visão das nações ocidentaishoje desenvolvidas. A adoção dessa perspectivaimplica a possibilidade de extrapolação desse mo-delo aos países atualmente em desenvolvimento,já que as fases são necessárias e independentes dotempo e do lugar onde se desenvolvem.

12(3) : 107-113, jul.lset. 1972

A velha e a nova industrialização

A teoria unilinear do desenvolvimento está ba-seada num certo tipo de filosofia, característicado século passado, mas que até hoje deixou umagrande influência: o racionalismo hegeliano. Paraessa filosofia tudo se passa como se a históriafosse o desenvolvimento do Espírito cujas leisatemporais e aespaciais ditassem uma dialéticanecessária, proveniente das suas leis intrínsecas,através de uma necessidade que provém da suaprópria unidade. "O que o conceito ensina, a his-tória o mostra com a mesma necessídade.">

O racionalismo de Hegel está, portanto, presen-te nessas teorias do desenvolvimento, pois todaspartem de uma idéia, de um modelo inicial e ten-tam interpretar a história corno um processo deevolução dessa idéia, desde sua forma mais ru-dimentar até se chegar a sua estrutura ideal.o caráter ideológico e, portanto, parcial da teo-

ria unilinear provém do fato de que ela toma ummodelo de desenvolvimento, o dos paises capitalis-tas desenvolvidos, como universal e absoluto. Atéas alternativas possíveis só podem ser vislumbra-das como uma oposição a esse modelo, como suaantitese (caso da teoria das fases históricas deMarx), estando, pois, restritas ainda ao mesmouniverso que as geraram.

A observação do mundo subdesenvolvido condu-ziu entretanto a uma verdade completamente di-ferente daquela proposta acima: os observadoresmais atentos da economia desses países chegaramà conclusão de que, apesar das semelhanças exis-tentes com os países desenvolvidos, as diferençasas superam de longe em número. "Pelo simplesfato de serem contemporâneos das economias de-senvolvidas, os atuais países subdesenvolvidos nãopodem repetir a experiência dessas economias".'Uma comparação do processo de industrializaçãonesses dois tipos de economia deve levar em contaa defasagem no tempo e as diferenças geográficasexistentes entre elas. A falsa analogia entre osdois tipos de industrialização tem sido atualmente

108 ressaltada por vários autores.'Se, entretanto, a originalidade do desenvolvi-

mento dos nossos países precisa ser reconhecida,esse desenvolvimento deve sempre ser estudadoem confronto com o dos países. desenvolvidos, am-bos fazendo parte de um sistema maior de inter-câmbio e de relações derivadas de urna divisãointernacional do trabalho.

Atualmente, devido ao grande progresso nostransportes e nas comunicações, as economias dosvários países não mais podem ser estudadas comounidades isoladas. Elas funcionam como um gran-de sistema cujas partes são interdependentes eonde podemos distinguir dois subsistemas princi-pais: o centro e a periferia. O subsistema central,

Revista de Administração de Empre_'48

que iniciou o seu desenvolvimento numa épocabem anterior ao periférico, pôde controlar e man-ter o funcionamento do subsistema periférico con-dicionado às suas necessidades, por meio da im-portação de .matértas-prfmas e exportação de ma-nufaturados. O subsistema periférico, por sua vez,desenvolvendo-se sempre em função .do central,teve certas funções hipertrofiadas e outras im-possibilitadas de crescimento. Essa forma desigualde crescimento impediu que o subsistema perifé-rico tivesse condições futuras de proceder comoUII1aunidade autônoma e se encontrasse em con-dições totalmente diversas na época de sua de-Colagem.

É, portanto, necessário voltar às origens (istoé, ao modelo primário-exportador) para descobriruma explicação das diversidades entre a velha ea nova industrialização.

S. O modelo primário-exportador

As causas do novo tipo de industrialização devemser buscadas no próprio processo de desenvolvi-mento dos países capitalistas líderes, já que esseprocesso exigiu uma divisão internacional do tra-balho, cabendo aos países subdesenvolvidos a ta-refa de suprir os mais adiantados com as ma-térias-primas de que eles não .dispunham comabundância em seus territórios e também deabsorver o excesso (planejado) de produção ne-cessária para manter em dinamismo suas econo-mias.

A abundância de recursos naturais dos nossospaíses e a dependência política em relação às me-trópoles fizeram, portanto, com que eles se desen-volvessem à luz da demanda externa por algunsde seus produtos básicos, o que determinou umaespecialização em alguns produtos abundantes euma ausência de diversificação da capacidadeprodutiva interna; o crescimento da economiadava-se somente através do aumento das exporta-ções e não, como ocorreu com as economias cen-trais, pelo aumento da produtividade e con-seqüente formação de um mercado interno maisamplo e mais díversífícado,e Nessas economias, odesenvolvimento do setor externo (exportações)foi contrabalançado pelo desenvolvimento do se-tor interno (investimento autônomo e inovaçõestecnológicas) permitindo que "o aproveitamentodas. oportunidades do mercado exterior se desseconjuntamente com a diversificação e integraçãoda capacidade produtiva interna". 7

Disso decorreu para os nossos países uma sepa-ração muito nítída entre os setores interno e ex-terno da economia, sendo este último o setor dealta rentabilidade, e, também, de grande eoncen-

tração da propriedade dos meios de produção. Jáo setor interno apenas atendia às necessidadesbásicas de subsistência e nele situava-se a maiorparte da população, com baixos níveis de produ-tividade e níveis de renda muito inferiores.

Devido ao fato do crescimento das economiasdos países subdesenvolvidos ter sido efetuado prin-cipalmente de acordo com as solicitações externas,não havia uma extensão da prosperidade resul-tante do aumento da renda das classes exporta-doras para o restante da população; "nas econo-mias coloniais há uma tendência à concentraçãodas rendas nas fases de prosperidade e à socializa-ção das perdas nas fases de depressão"."

A separação entre os dois setores da economia_ o externo e o interno - impedia que houvesseum aumento dos salários reais do grupo interno,o que vinha originar a tendência à concentraçãoda renda apenas no setor exportador. Aumentan-·do-se a renda das classes exportadoras havia umaconseqüente ampliação da importação de bens le-ves de consumo, principalmente de luxo, desvian-do-se novamente a renda para fora e impedindoum efeito multiplicador sobre as demaisativida-des internas.

Desse modo, já nessa fase se delineava o futuroprocesso de desenvolvimento dos nossos países,com suas distorções características, isto é, a gran-de desigualdade na distribuição pessoal da rendae os desníveis regionais decorrentes da localizaçãodos centros mais dinâmicos em pontos que aten-diam basicamente à facilidade de exportação enão às necessidades internas do mercado e da pro-dução econômica.

A fase de exportação de produtos primários eimportação de manufaturados continuou até quecondições externas ao subsistema periférico deter-minassem uma mudança nessa estrutura obrigan-do os países subdesenvolvidos a produzir interna-mente alguns bens (principalmente de consumo),diminuindo também suas exportações de matéria-prima.

4. A especüicldade do modelo de substitui~de importações

A crise de 1929 e as sucessivas guerras pro-vocaram uma alteração no comércio exterior, rom-pendo o equilíbrio do modelo primário-exportador.A partir da I Guerra Mundial, começa um períodode retração do comércio internacional, que passaa estar sujeito a quedas e violentas flutuações;esse fato foi decorrente de uma contração na ati-vidade econômica dos países industrializados, quepassam a adotar Uma política de protecionismo,suspendendo os investimentos no estrangeiro econtendo suas Importações," A oferta de matérias-

prímas provenientes dos países periféricos excedea demanda, daí resultando uma redução no seupoder Be compra. A queda do valor dos produtosprímâríos no mercado internacional faz com queos países dependentes se vejam impossibilitados decontinuar o seu crescimento através da ampliaçãoda agricultura de exportação. Esse fato, por suavez, obrigou a uma redução nas importações demanufaturas, o que permitiu o início da formaçãode um mercado interno e deu impulso à industria-lização dentro dos próprios países. 10

Duas alternativas se apresentaram nesse mo-mento: estacionar economicamente ou expandir-se, mas rompendo a dependência em relação aocomércio exterior. É importante ressaltar que oinício da industrialização deu-se principalmentepor influência externa, não havendo nenhuma de-cisão interna no sentido de promover a industria-lização e o desenvolvimento econômico. Não houvenenhuma transição gradual de um sistema de ar-tesanato a um modelo de pequenas indústrias, quepudessem continuar a aproveitar a mão-de-obrae o equipamento existente na fase anterior (comoocorreu com os países desenvolvidos). Houve simuma mudança brusca numa economia voltada es-sencialmente para fora, que não possuía indústriadiversificada nem mercado interno, e que de re-pente foi obrigada a industrializar-se dentro decondições que exigiam equipamentos altamentesofisticados e mão-de-obra muito treinada e es-pecializada.

A solução que esses países encontraram foi a decomeçar a industrialização pela produção de bensde consumo final não duráveis, pois exigiam me-nores investimentos e já possuíam um mercado.interno constituído pela classe dominante tradicio-nal de grandes agricultores e comerciantes (queanteriormente importavam esse tipo de bens). Osequipamentos passaram a ser importados dos cen-tros, pois, devido ao baixo custo dos transportes,era mais barato e mais simples importá-los doque produzi-los internamente. Desse modo "o pro- 109cesso de substituição de importações foi avançan-do, entrando nas faixas de bens de consumo du-ráveis e, posteriormente, atingindo algumas faixasde produtos intermediários e bens de capítal"."

Esse processo foi totalmente inverso ao ocorridocom os países desenvolvidos: nestes havia umaproporção entre as diversas faixas, o que permitiua formação de um ciclo de desenvolvimento, quan-do o incremento da produção de bens de capitallevava também ao crescimento do setor de bensde consumo, o que, por sua vez, exigia novos in-vestimentos no setor de produtos de base. O de-senvolvimento industrial era baseado em equipa-mento de fabricação local pois o elevado custo dos

A veZha e a nova industriaZização

transportes e a barreira protetora aduaneira im-pediam que esses equipamentos fossem importa-dos. Esse processo forçava, portanto, o desenvolvi-mento paulatino e simultâneo da técnica, que, aoser incorporada à indústria, permitia o rebaixa-mento nos preços das mercadorias, com um conse-qüente aumento dos salários' e do poder aquísítívodas massas trabalhadoras.

Em vez de serem desenvolvidos primeiramenteos setores principais, isto é, aqueles que proporcio-nassem maiores economias externas, que estimu-lassem o aparecimento de indústrias complementa-res (e que fossem, portanto, mais rentáveis con-siderando-se o total da economia), os países sub-desenvolvidos iniciaram a sua industrialização porum caminho oposto: eram substituídos bens deconsumo para cuja produção era necessária umaproporcional importação de equipamentos, o quemuitas vezes aumentava a dependência externaem relação às importações em vez de diminuí-la.A demanda derivada pela importação de bens in.termediários e de capital resultou num agrava-mento da dependência pois esses bens são de maisdifícil substituição que os de consumo.»

À medida que se avança na industrializaçãopara as faixas de bens de consumo duráveis e decapital, ocorre um fenômeno de reconcentração darenda nas camadas médias e altas, que vai dificul-tar o desenvolvimento e acentuar as distorções domercado interno: os novos investimentos exigem,cada vez mais, grandes densidades de capital emenores quantidades de mão-de-obra. Assim, acapacidade de emprego no setor industrial crescesubstancialmente menos que a população e torna-se incapaz de absorver o excedente de mão-de-'obra que, através do êxodo rural, acumula-se nasgrandes cidades, constituindo uma massa margi-nalizada do processo produtívo.»

Disso decorre uma composição setorial da forçade trabalho muito diversa da dos países desenvol-vidos, na época de sua industrialização. Consíde-

110 remos por exemplo os dados referentes ao Brasil,no' auge de seu processo de substituição de impor-tações (década de 50) e comparêmo-los com osdados dos países desenvolvidos numa fase corres-pondente de sua industrialização. O grau de desen-volvimento dos diversos países foi medido pelaporcentagem de força de trabalho no setor primá-rio (uma grande porcentagem nesse setor é consi-derada um índice de baixo desenvolvimento). Foiobservado que, nos países que se desenvolveram apartir da Revolução Industrial, a composição seto-rial da força de trabalho foi evoluindo gradativa-mente do setor primário para o secundário e, pos-teríórmente, numa fase já bem avançada de indus-trialização, para o setor, terciário.,Revista de Administração de Empresas

Tabela 1

Composição setorial da força de trabalho no Brasil,em 1950, em comparação com países selecionados emdiferentes períodos históricos:

Setor(percentuais)

País Ano

Primário I Secundário ITerciárioBrasil 1950' 58 16 26Finlândia 19:30 57 23 20Itália 1881 57 28 15Noruega 1890 5.5 22 23E. U.A. 1860 60 20 20

Os dados de 1960 são ainda mais significativos,como podemos verificar na tabela 2.

Tabela 2

Se t o r(percentuais)

País Ano

Primário I Secundário I Terciário

Brasil 1960 52 15 33Finlândia 1940 47 28 25Áustria 1880 50 28 22Canadá 1881 .51 30 19~inamarca 1880 52 24 24França 1866 52 29 20Suécia 1910 49 32 19E.U.A. 1880 50 25 25

Observamos que, no Brasil, o setor terciário e;abem maior que o secundário, enquanto que osoutros países tinham mais ou menos a mesma pro-porção nos dois setores, ou até maior no secundá-rio. Essa estagnação do setor secundário não cons-titui uma peculiaridade do desenvolvimento bra-sileiro, mas é comum a· diversos países em desen-volvimento.

Essa tendência, juntamente com um precoce de-senvolvimento do 'setor de serviços mostra que anossa industrialização, ao invés de amenizar asdiscrepâncias entre as classes sociais, tende a oporuma classe média cada vez maior a uma reservatambém crescente de trabalhadores desemprega-dos e marginalizados. UI

o crescimento das duas classes configuradas aci-ma decorre também do processo de urbanização.Entretanto, uma tentativa de comparar a nossaurbanização com a observada na fase clássica dodesenvolvimento capitalista, e aproximar os anta-gonismos existentes entre as classes sociais, tam-bém se verá frustrada nos seus objetivos.

Celso Furtado mostra, em seu livro Subdesen-volvimento e estagnação na América Latina/6 queos antagonismos entre as classes, na velha fase, .tinham uma função de dinamização da sociedade,pois, ao pretender uma elevação dos salários, ostrabalhadores obrigavam a técnica a evoluir e des-cobrir novos caminhos de elevação da produtivi-dade, para compensar a alta nos salários. Assim,a técnica solucionava os problemas decorrentesdos antagonismos sociais e esse processo de con-tradição, de oposição tese-antítese, conduzia a umasíntese superadora, que levava a sociedade a um.estágio superior de desenvolvimento.

O mesmo não ocorreu na América Latina e de-mais países subdesenvolvidos: a própria formacomo a técnica penetra nesses países não leva àsolução do conflito, mas, pelo contrário, tende acriar novos problemas de desemprego e de rebai-xamento dos salários. O próprio conflito nemchega a ser colocado, pois a classe trabalhadoranão possui características bem definidas devido aoconstante processo de exclusão-marginalização damão-de-obra; a expansão espasmódica do sistemafaz com que, por um lado a mão-de-obra sejaexcluída e, por outro, seja incorporada em novasatividades. "Assim, a extensão do setor modernoagrava a heterogeneidade pelo lado da marginali-zação. Incorporação e expulsão passam a ser duastendências simultâneas e contraditórias do proces-so de expansão e modernização, que assume entãoem sua plenitude um caráter desigual e combina-dO."17A classe trabalhadora não possui mais amesma capacidade de organização e de barganha,característica dessa classe nas sociedades capita-listas clássicas.

As características psicológicas das massas são,portanto, bastante diversas; "essa massa urbana.de estrutura pouco definida, aspira a empregosque o sistema econômico não está criando emquantidade suficiente" .18Essa é a razão por que asolução do problema não mais pode ser encontra-da ao mesmo nível da fase anterior, mas requeruma solução de natureza política.

Os próprios técnicos, colocados na direção dasempresas particulares, e, a serviço da eficiência eda racionalidade, contribuem também para a mar-ginalização da população urbana. Assim, a indus-trialização avança, atingindo altas taxas de au-

mento de produtividade mas sem absorver o exce-dente populacional.

Para o agravamento desse problema concorre,de maneira decisiva, a alta taxa de crescimento de-mográfico, que é também uma das peculiaridadesdo mundo subdesenvolvido. Quando a industriali-zação penetrou nesses países, o progresso da higie-ne e da medicina preventiva já havia causado umainflação demográfica que nenhum dos países quese industrializaram nos séculos XVIII e XIX co-nheceu.

Considerem-se, por exemplo, os dados forneci-dos por Paul Bairoch, na sua obra Revoluçãoindustrial e subdesenvolvimento.19 Para os paísesque iniciaram seu desenvolvimento nos séculosXVIII e XIX a taxa média de aumento populacio-nal durante o take-oti foi de 0,7% a.a., enquantoque para os países subdesenvolvidos foi de 2,2%a.a., em média (entre 1953 e 1960).

5. As seluções possíveis

Todas essas diferenças demonstram claramenteque os dois tipos de industrialização não podemser reduzidos um ao outro e que aos diversos con-flitos devem ser propostas soluções diferentes. Aadoção de técnicas de planejamento importadasde culturas que não possuem a mesma configura-ção estrutural que a nossa não poderá constituiruma solução para o problema. É necessária umaestratégia de desenvolvimento global que leve emconta a tipicidade de cada país, não esquecendOentretanto as relações existentes entre os doissubsistemas principais.

Maria da Conceição Tavares esboça uma orien-tação para a solução desses problemas: propõe que.o investimento público se oriente para atividadesempregadoras de.mão-de-obra e no sentido de pro-mover uma reforma agrária, para que, aumentan-do a produtividade do setor primário, conjugue-seo fator terra ao fator trabalho (e não ao empregode técnicas de alta densidade de capital) .20

O professor Luiz Carlos Bresser Pereira desen-volve essa solução, propondo o desenvolvimento deindústrias trabalho-intensivas, mas de alto desen-volvimento tecnológico" (ex.r produção de equi-pamentos eletrônicos ou mecânicos por encomen-da). Cada produto exigiria um projeto especial e,portanto, não poderia ser padronizado, ao mesmotempo que exigiria mão-de-obra altamente espe-cializada.

Ressalta também esse autor a necessidade paraesses países de uma participação crescente no co-mércio internacional de manufaturados. 'Só dessemodo poder-se-ia aumentar sua renda, desde que

A velha e a nova industrialização

111

_.ISTRAÇIo DA PROouçlo, de Ma-chIine, Si Malta· e WeiI," • Coleçio•••••••• Empria. Brulleir. tratando deproblemas gerais da ••••• e especifi-ces ••• praduçie, lIImiRiItrIçio da füri..CI, mitados de tr•••• IIIIÍS prudutives,•••••••• e cantriIe d. praduçio.

ADM.1STRAÇIo DE YEIOAS, de RicIIa's.Figueiredo e t.em. Hllftbu,..., ••••ta análise qualitJtiv. e qllllltitltin dolIIIf1lIIIo,naliaçio das tias de distribui-Çio, d. organizaçio e do .,. de ven-•••. dltenninlÇio de preços e do ~prIIIIOCionll.

ASPECTOS LEGAIS E ECOIOMICOS, deBouzan, Souza Prado e Allgda Silva, 11-tuda problema de direita do 1nIIIIIho,direito C8IIIercial e tributmo, bem como• utilizaçio de Íldices estatísticos, ,A-ções sazonais, lIIistincia tícnica, planosgovernamentais e intIlÇio. .

ADMINISTRAÇÃOGERALE RElAÇOEs .-OUSTRIAIS,de Leite Cordeiro, Ribeiro deCarvalho e Breuer Pereira, fama umplllGl'lllla _iniatrativo ierar da peque-na empria. br.sileir. e SIUS problemasde produçio, vendas, diatribuiçio, com-pras, contabilidade e organização.

ADMUJISTRAÇIoCOITABI.E FlWJCElRA,de Monte CanneUo e Schoeps, .bordasistem.s de IIcrituraçio, de contrõIe in-timo e •••• finlÍlcein, crédito,.Innça e crediário, fin•• ciamenta • curto,médio .e longo prazo e contabilidade decustas.

PedidosFundlçio GetuIio,••.•asSeniço de publicaçõesPraia de 8atafaga. 188C.P. 21-120 - lC-05

Revista de Administração de Empresas

as oportunidades de substituição de importaçõesjá foram esgotadas. O desenvolvimento das expor-tações não mais deverá basear-se em produtos pri-mários pois a produção desses não exige mão-de-obra especializada, possuindo portanto uma baixaprodutividade; Se continuarem exportando produ-tos primários esses países· permanecerão com es-trutura de países subdesenvolvidos. As exporta-ções deverão basear-se sobre os produtos manufa-.turados,pois só desse modo essas nações concor-rerão com os países desenvolvidos em condiçõesde igualdade, prõmovendo ao mesmo tempo a di-versificação interna e apoiando-se sobre setores demaior produtividade.

Outras soluções são também desenvolvidas coma finalidade de resolver os problemas decorrentesda conçentração da renda e do desemprego cres-cente. Umadas mais conhecidas é a de Celso fur-tado, que propõe um aumento da carga trlbutáfíasobre os 10% mais ricos da população.» Essesimpostos provocariam um aumento da poupança,a qual seria investida em setores altamente traba-lho-intensivos. Os grupos menos favorecidos te-riam sua renda aumentada, o que por sua vez in-tensificaria a demanda por bens leves de consumo(produzidos geralmente segundo técnicas traba-lho-intensivas). Ao mesmo tempo, os bens produ-zidos para a classe alta teriam seu preço aumen-tado enquanto os de consumo geral seriam bara-teados. Formar-se-ia desse modo uma cadeia deprogresso, que, aos poucos, favoreceria grande-mente o processo de redistribuição de renda.

A solução atual encontrada pelo Brasil não pa-rece, entretanto, ter sido inspirada em nenhumadessas teorias apontadas acima. Essa solução éeminentemente prática; o Brasil procurou encon-trar uma saída para permitir que o crescimento daeconomia continuasse a passos largos, apesar dapermanência do problema da concentração da ren-da. A industrialização avança e o crescimento doPNB alcança níveis dificilmente atingíveis, embo-ra baseando-se ainda em distorções originadas aotempo da economia colonial do modelo primário-exportador.

Dois mecanismos principais têm sido utilizadospela política governamental para enfrentar o pro-blema do desenvolvimento: aumento do poderaquisitivo das camadas média e alta da popula-ção e estímulo ao aumento das exportações demanufaturados.

O aumento do poder aquisitivo da classe médiatem sido efetuado através do estabelecimento de"novos "esquemas de financiamento dos bens durá-veis e de uma política salarial que favorece uma

. abertura na escala de remuneração dos novos gru-pos médios emergentes".« O aumento desse poder

é particularmente importante para a manutençãodo desenvolvimento pois são os grupos médios oscapazes de adquirir os produtos das indústriasmais dinâmicas, que são justamente as de maiorintensidade de capital e que exigem grandes inves-timentos para sua instalação e manutenção (porexemplo, o caso da indústria automobilística); au-mentando o poderio desses grupos estaria garan-tida a dinamicidade das atividades de ponta.

Ao lado desse mecanismo é utilizado tambémum outro mecanismo complementar para compen-sar as dimensões ainda reduzidas do mercado ín-terno: as exportações. Os produtos que não con-seguirem ser consumidos internamente serão des-viados para o setor externo. Desse modo o paísconsegue permanecer "num ciclo em que o siste-ma capitalista se mantém dinâmico, independen-temente da redistribuição da renda e da elevaçãodo consumo interno" .24

Embora superando a estagnação, o atual cresci-mento da economia brasileira não conseguiu des-vencilhar-se dos antigos problemas surgidos nafase do modelo primário-exportador: a divisãodualista em dois setores de produtividade radical-mente diversos e a grande disparidade na distri-buição pessoal da renda.

Um estudo mais detalhado das soluções teóricase da situação atual da economia brasileira escapaao âmbito desse trabalho. A finalidade deste foi .apenas a de ressaltar a especificidade do desenvol-vimento dos países subdesenvolvidos, sem entrarem detalhes sobre o modo como cada país indivi-dualmente está superando o seu desenvolvimento.A ênfase nos problemas específicos que esses paí-ses estão enfrentando não quer dizer que eles seencontrem estagnados economicamente, mas ape-nas que existem problemas sociais e políticos quenão serão amenizados automaticamente, comoaconteceu com grande parte dos países capitalis-tas desenvolvidos. a

1 Ver Sunkel, Osvaldo & Paz, Pedro. Desarrollo econó·mico. ed. preliminar. Santiago, Instituto Latíno-Amerí-cano de Planificação EconôIhica e Social, 1969. t. 1: In-trodução, p. 11.

2 Ver Furtado, Celso. Teoria e política do desenvolvi·mento econômico. são Paulo. ed. nacional, 1967. capo 10,p.112.3 Hegel, Filosofia do direito. Ed. francesa. Prefácio.Conferir: "O desenvolvimento da consciência constituio fundamento de todas as outras manifestações (as leisdos povos, a religião, a economia etc.). Todas elas têmuma fonte comum, o espírito de uma época, que temsua causa próxima num degrau anterior e, de umamaneira geral, numa forma da Idéia. Mostrar essa uní-dade, compreendê-Ia como tendo uma raiz, este é o obje-tivo da história universal... O processo histórico é opróprio processo de evolução do espírito." In: Liçõessobre a história da filosofia. Paris, Ed. Gallimard,.p. 139.4 Furtado, Celso. Subdesenvolvimento e estagnação naAmérica Latina. 3. ed. Rio de Janeiro, Ed. CivilizaçãoBrasileira, 1968. capo 1, p. 4.5 Ver Pereira, Luiz Carlos Bresser. Desenvolvimentoe crise no Brasil. Rio de Janeiro, Zahar Editores, 1968.p.l88.6 Ver Furtado, Celso. Características gerais da econo-mia brasileira. In: Boletim Econômico da América La-tina, CEPAL.7 Tavares, Maria da Conceição. Substituição de impor-tações e desenvolvimento econômico na América Latina.Dados, n. 1, p. 116.8 Furtado, Celso. op. cito9 Ver Sunkel, Osvaldo & Paz, Pedro. Op. cito t. 2,p. 297-9.10 Ver Furtado, Celso. op. cito11 Tavares, Maria da Conceição. op. cito p. 12l.12 Ver Tavares, Maria da Conceição. op. cito p. 122.13 Ver Soares, Gláucio Ary Dillon. A nova industriali-zação e o sistema político brasileiro. Dados 2/3, 1967.p.32 a 50.14 Dados extraídos de Soares, Gláucio Ary Dillon.op. cito15 Ver Soares, Gláucio Ary Dillon. op. cito16 3. ed. Ed. Civilização Brasileira, capo 1, p. 11 e 12.17 Tavares, Maria da Conceição & Serra, J. Mas alládel estancamiento: una discusión sobre el estilo del de-sarrollo reciente de Brasil. Trimestre Económico, n. 125,1965.18 Furtado, Celso. op. cito capo 1, p. 12.19 Siglo Veintiuno Editores S.A., capo 9, p. 159.20 Tavares, Maria da Conceição. op. cito p. 139.21 Pereira, Luiz Carlos Bresser. op. cito p. 192·5.22 Furtado, Celso. Um projeto para o Brasil. 5 ed. Riode Janeiro, Ed. Saga. 1. parte; e Pereira, L.C. Bresser.A distribuição da renda e a recuperação da economiabrasileira. Visão, novo 1970. 113

. 23 Tavares, Maria da Conceição. Artigo citado na no-ta 17.24 Pereira, L.C. Bresser. Artigo citado na nota 22.

A velha e a nova industrialização