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A TESSITURA DE PRÁTICAS INTERDISCIPLINARES NA PRAXIS DO PROFESSOR Ana Lúcia Gomes da Silva Universidade Federal de Mato Grosso do Sul Claudia Maria Vasconselos Lopes Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca Franchys Marizethe Nascimento Santana Universidade Federal de Mato Grosso do Sul Resumo O painel proposto alarga o debate sobre as questões interdisciplinares no contexto educacional brasileiro visando a possibilidade de promover a superação da dissociação das experiências acadêmicas entre si, como também delas com o contexto social. Concisas sobre tal concepção, selecionamos elementos no diálogo que contemplam as parcerias e investigam a forma de transformar o olhar sobre um tripé interdisciplinar diante dos desafios da práxis na formação de professores: articulação dos saberes de diferentes disciplinas/áreas do conhecimento em favor de um ensino contextualizado e holístico e, se propõe a olhar a formação continuada do docente como um estímulo a promover o profissional a autônomo. Nesse contexto, propomos uma discussão que objetiva perpassar questões interdisciplinares situadas em espaços específicos de aprendizagem, no sentido de formar professores para a reflexão e a operacionalização de práticas que atendam às demandas sociais. Para tanto, a literatura consultada foi: Barbosa (1984-2003); Bakhtin (1953-2011); Fazenda (1994-2005-2007); Iavelberg; Pimenta (2004); Nóvoa (1995); Morin (2000); Silva (2013); Oxford (2003). Perrenoud (2010), dentre outros. Os encaminhamentos nos provocam a refletir sobre a ação docente na ousadia de apreender o sentido de uma nova concepção de ensino e de currículo, baseada na interação e integração entre os diversos ramos do conhecimento. Assim, é possível repensar não só nossa vida, como a prática profissional e as relações entre idéias e realidade, entre professor e aluno, teoria e práxis. Pretendemos contribuir com um debate, que tem como síntese as possibilidades formativas no viés da perspectiva interdisciplinar. Palavraschave: Interdisciplinaridade, Formação de Professores, Práxis. XVIII ENDIPE Didática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira 737 ISSN 2177-336X

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A TESSITURA DE PRÁTICAS INTERDISCIPLINARES NA PRAXIS DO

PROFESSOR

Ana Lúcia Gomes da Silva

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Claudia Maria Vasconselos Lopes

Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca

Franchys Marizethe Nascimento Santana

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Resumo

O painel proposto alarga o debate sobre as questões interdisciplinares no contexto

educacional brasileiro visando a possibilidade de promover a superação da dissociação das

experiências acadêmicas entre si, como também delas com o contexto social. Concisas

sobre tal concepção, selecionamos elementos no diálogo que contemplam as parcerias e

investigam a forma de transformar o olhar sobre um tripé interdisciplinar diante dos

desafios da práxis na formação de professores: articulação dos saberes de diferentes

disciplinas/áreas do conhecimento em favor de um ensino contextualizado e holístico e, se propõe

a olhar a formação continuada do docente como um estímulo a promover o profissional a

autônomo. Nesse contexto, propomos uma discussão que objetiva perpassar questões

interdisciplinares situadas em espaços específicos de aprendizagem, no sentido de formar

professores para a reflexão e a operacionalização de práticas que atendam às demandas

sociais. Para tanto, a literatura consultada foi: Barbosa (1984-2003); Bakhtin (1953-2011);

Fazenda (1994-2005-2007); Iavelberg; Pimenta (2004); Nóvoa (1995); Morin (2000); Silva

(2013); Oxford (2003). Perrenoud (2010), dentre outros. Os encaminhamentos nos

provocam a refletir sobre a ação docente na ousadia de apreender o sentido de uma nova

concepção de ensino e de currículo, baseada na interação e integração entre os diversos ramos do

conhecimento. Assim, é possível repensar não só nossa vida, como a prática profissional e as

relações entre idéias e realidade, entre professor e aluno, teoria e práxis. Pretendemos contribuir

com um debate, que tem como síntese as possibilidades formativas no viés da perspectiva

interdisciplinar.

Palavras–chave: Interdisciplinaridade, Formação de Professores, Práxis.

XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira

737ISSN 2177-336X

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CURSO DE PEDAGOGIA EM QUESTÃO: FORMAÇÃO DE PROFESSORES NA

MULTIPLICIDADE DO MOVIMENTO INTERDISCIPLINAR

Ana Lúcia Gomes da Silva

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Resumo

O presente estudo é fruto do projeto de pesquisa: A Universidade na formação de

professores e pesquisadores Interdisciplinares: a arte como eixo articulador/CNPQ e tem

como objetivo dialogar sobre a Formação dos Professores no Curso de Pedagogia da

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul/UFMS no Campus de Aquidauana-CPAQ na

perspectiva interdisciplinar. Tal proposta apresenta relevância, uma vez que colabora com a

documentação que baliza a organização dos Projetos Pedagógicos para os Cursos de

Pedagogia no Brasil e sinaliza desafios no ensino para construir uma educação inovadora

no curso de pedagogia em questão. Os encaminhamentos metodológicos compreendem a

multiplicidade do movimento interdisciplinar na construção do conhecimento mediante

observações, entrevistas, depoimentos e seminários. Uma nova ótica sob o aporte teórico de Barbosa (1984-2003); Camargo (1994); Fazenda (1994-2005-2007) Iavelberg (2003) Pimenta

(2004); Nóvoa (1995) Morin (2000) e Silva (2013). Além dos recursos documentais representa

a possibilidade de promover a superação da dissociação das experiências acadêmicas entre

si, como também delas com a realidade social. Ele emerge não só como forma de

compreender e melhorar o mundo, mas como uma exigência interna das ciências que busca

o restabelecimento da Universidade como um espaço privilegiado. Dessa forma, tornar o

pedagogo mais ousado no propósito de ensinar e aprender como cientista que descobre na

psicologia, na filosofia, na sociologia, na história, nas letras, nas artes e em tantas outras

veias a raiz interdisciplinar.

Palavras-Chave: Universidade, Formação de Professores, Interdisciplinaridade, Arte.

Introdução

Este artigo apresenta os principais aspectos observados nas pesquisas realizadas no projeto

intitulado: “A Universidade na Formação de Professores e Pesquisadores Interdisciplinares:

a arte como eixo articulador” em movimento desde 2014. Registrado no CNPQ e vinculado

à linha de pesquisa de Formação de Professores do Grupo de Estudos e Pesquisas em

Formação Interdisciplinar de Professores-GEPFIP da Universidade Federal de Mato Grosso

do Sul-UFMS no Campus de Aquidauana-CPAQ e na Linha de Pesquisa da

Interdisciplinaridade da Pontifícia Universidade Católica de SP do Grupo de Estudos e

Pesquisas Interdisciplinares-GEPI, tem como objetivo dialogar sobre a Formação dos

Professores no Curso de Pedagogia/UFMS/CPAQ na perspectiva interdisciplinar.

Partindo do pressuposto que a palavra interdisciplinaridade tem permeado os debates nas

instituições de ensino superior das universidades brasileiras e externas ao nosso país,

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738ISSN 2177-336X

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propomos refletir sobre as representações dos entrevistados, a respeito das percepções que

foram marcantes no processo de ensino e aprendizagem durante a sua formação.

Somos sabedores que no estágio atual da educação, o professor não é mais visto como

aquele que detém todas as possibilidades do conhecimento e do saber; o aluno é

considerado, também, como protagonista do processo de ensino e aprendizagem.

Desse modo, é preciso enxergar o ensino sob outro prisma, pois as aulas, antes estáticas,

agora acompanham as constantes transformações provocadas pelo avanço das pesquisas e

pelo fenômeno da globalização. Tudo isso obriga os pesquisadores, educadores e técnicos

ligados à educação a buscar caminhos que permitam a compreensão e o estabelecimento de

uma nova forma de olhar o conhecimento, o ensino e a aprendizagem, o que implica o

surgimento de várias ideias.

Dentre essas ideias, surge a interdisciplinaridade como uma forma de contribuir para superar a

fragmentação do conhecimento e suas implicações sobre os estudos acadêmicos. Para ancorar e

sustentar nossas reflexões pautamos em Fazenda (2005) quanto aponta que a

interdisciplinaridade é entendida como uma mudança de atitude na forma de conceber,

compreender e entender o conhecimento, numa troca em que todos saem ganhando, uma

vez que há uma mudança de atitude e, a Arte como polo dinamizador do currículo, teria

como mérito o fato de possibilitar uma relação de ensino e aprendizagem significativa.

Atitudes e posturas que envolvem os educadores, numa perspectiva de abertura epistemológica

para contribuir na formação das futuras gerações. Se as problemáticas atuais são tão complexas

e exigem uma visão mais ampla é importante que o educador perceba e trabalhe possíveis

conexões entre os conhecimentos, unidade na diversidade, contradições e contraposições pela

pesquisa.

Nessa compreensão, a arte interdisciplina consigo mesma, através de diferentes linguagens,

como, também, com outras áreas do conhecimento humano. Seria o que poderíamos

chamar de uma “educação sem territórios e fronteiras”.

O estudo da interdisciplinaridade como abordagem pedagógica é central

para o ensino de arte. A arte contemporânea é caracterizada pelo

rompimento de barreiras entre o visual, o gestual e o sonoro. O happening,

a performance, a bodyart, a arte sociológica e ambiental, o conceitualismo

e a própria vídeo art são algumas das manifestações artísticas que

comprovam uma tendência atual para o inter-relacionamento de diversas

linguagens representativas e expressivas. Portanto, pelo isomorfismo

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organizacional, a interdisciplinaridade dever ser o meio através do qual se

elaborem os currículos e a práxis pedagógica da arte (BARBOSA, 1984,

p. 68).

A interdisciplinaridade como princípio pedagógico, tem sido pronunciada como aquela

capaz de realizar uma nova forma de educar, a de educar para a dúvida. Entretanto, sua

prática é marcada por muitas contradições, principalmente na questão conceitual e

efetivação na universidade. Por um lado, não existe uma definição única que contemple

toda a grandiosidade deste fenômeno, mas em todas elas encontramos a idéia de uma nova

atitude frente ao conhecimento, que confrontada com os aspectos que envolvem a

formação de professores faz da interdisciplinaridade um caminho complexo de ser

trilhado, mas não impossível. Fazenda (1994) aponta a necessidade de desenvolver uma

atitude interdisciplinar, para que a prática educacional seja mais significativa e mais

produtiva no ensino superior: “É apoio à ciência e à pesquisa. Possibilita eliminar a

distância existente entre a formação escolar e atividade profissional” (Fazenda, 1994, p.

23).

A criação de novos olhares interdisciplinares potencializa as reivindicações geradoras da

afetividade, do acolhimento, do desapego e das parcerias em seus entremeios mais

significativos. Promover ações interdisciplinares no sentido de oportunizar tal processo,

implica entre outras questões, na tarefa de aglutinar esforços de pesquisadores para resgatar esse

espaço nas instituições educativas e também na sociedade. Fazenda (1994) fortalece essa ideia

quando fala das atitudes de um professor interdisciplinar:

Entendemos por atitude interdisciplinar, uma atitude diante de alternativas

para conhecer mais e melhor; atitude de espera ante os atos consumados,

atitude de reciprocidade que impele à troca, que impele ao diálogo – ao

diálogo com pares idênticos, com pares anônimos ou consigo mesmo –

atitude de humildade diante da limitação do próprio saber, atitude de

perplexidade ante a possibilidade de desvendar novos saberes, atitude de

desafio – desafio perante o novo, desafio em redimensionar o velho

– atitude de envolvimento e comprometimento com os projetos e

com as pessoas neles envolvidas, atitude, pois, de compromisso em

construir sempre da melhor forma possível, atitude de

responsabilidade, mas, sobretudo, de alegria, de revelação, de encontro,

de vida (FAZENDA, 1994, p.82).

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E, nesse contexto a arte tem o papel articulador para que os professores do Curso de

Pedagogia da UFMS/Aquidauana concebam que qualquer área do conhecimento é responsável pela

educação ética e estética de nossos acadêmicos, tanto pelo que oferecemos ou pelo que omitimos

daquilo que deveríamos fazer e não fazemos. Conhecer a arte, tanto local, regional quanto universal

e expressar-se através dela como um direito de todo aluno. A Universidade precisa ser o espaço de

construção nas relações interdisciplinares para uma formação de professores que contextualiza o

conhecimento em seu tempo e espaço, ainda, que costura as ligações com as políticas públicas.

1 Abordagens que buscam alargar as discussões no Curso de Pedagogia/UFMS/CPAQ

Considerados esses aspectos procuramos alargar mais as discussões no campo da

Pedagogia sobre o objeto de investigação da pesquisa, buscando perceber e saber como

professores, acadêmicos em curso e egressos do curso constroem, vivenciam e

compreendem o processo de formação de professores sob uma ótica interdisciplinar. Pois,

ninguém tem a menor dúvida de que o homem necessita brincar, sonhar, cantar para ser

capaz de reinventar a vida. Se quisermos formar professores que educam crianças em sua

totalidade, não podemos desconsiderar as inter-relações com as linguagens da arte na

música, artes visuais, na dança e no teatro - como elementos artísticos que representam a

constituição do ser humano em seu aspecto emocional, intelectual e físico. Dessa forma,

tornar o pedagogo mais ousado no propósito de ensinar e aprender como cientista que

descobre na psicologia, na sociologia, na história, na filosofia, nas letras, nas artes e em

tantas outras veias a raiz da alegria de aprender.

A educação é inerente ao processo de humanização que ocorre na

sociedade em geral. Por isso, afirmamos que a educação é uma prática

social, histórica e situada em determinados contextos. Nesse sentido, é

que podemos afirmar que a educação é uma práxis social. Estudá-la,

analisá-la, compreendê-la, interpretá-la em sua complexidade, e propor

outros modos e processos de ser realizada com vistas à construção de

sociedade justa e igualitária, supõe a contribuição de vários campos

disciplinares, dentre os quais o da pedagogia.

A pedagogia é um campo de conhecimento específico da práxis educativa

que ocorre na sociedade. Diferente dos demais que não têm a educação

como objeto específico de análise, mas que a ela podem se voltar.

(PIMENTA, 2004, p. 39).

Entre autoras como Selma Garrido Pimenta, Ivani Fazenda e muitos que contribuíram e

alicerçaram nossos estudos sobre a educação está Ana Mae Barbosa da Escola de

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741ISSN 2177-336X

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Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo-USP. Ela declara, numa entrevista

concedida para a Agência USP de Notícias e publicada em 20 de novembro de 2007, que

"Não é possível conhecer um país sem conhecer e compreender sua arte” e, no mesmo

sentido complementa:

A Arte na Educação como expressão pessoal e como cultura é um

importante instrumento para a identificação cultural e o desenvolvimento

individual. Por meio da Arte é possível desenvolver a percepção, a

imaginação, permitindo ao indivíduo analisar a realidade percebida e

desenvolver a criatividade de maneira a mudar a realidade que foi

analisada. (BARBOSA, 2003, p. 18).

Daí compreendermos que a arte é capaz de dinamizar relações onde o criador é sempre

capaz de unir e mudar as interações produzidas no mundo da imagem pré-concebida.

Percebe as transformações e se percebe transformador. Ele se faz um solucionador de

problemas e é essa capacidade que o torna apto a criar e a superar os seus próprios limites.

Camargo (1994, p. 11) afirma que a arte dá formas à multiplicidade de experiências e

valores humanos, enquanto para Iavelberg (2003) a arte tem seu valor intrínseco como

construção humana, como patrimônio comum a ser apropriado por todos. A autora Rosa

Iavelberg complementa que a participação na vida cultural depende da capacidade de

desfrutar das criações artísticas e estéticas, cabendo à educação da educação infantil a

universidade garantir a educação em arte para que seu estudo não fique reduzido apenas à

experiência cotidiana.

As práticas educativas surgem de mobilizações sociais, pedagógicas, históricas, filosóficas,

e, no caso de arte, também artística e estética. Quando caracterizadas em seus diferentes

aspectos, ajudam a compreender melhor a questão do processo educacional e sua relação

com a própria vida. Sabemos que “os professores não são apenas consumidores, mas

também produtores de saber; não são apenas executores, mas também criadores de

instrumentos pedagógicos; não são apenas técnicos, mas são também profissionais críticos

e reflexivos”. (NÓVOA, 1995, p.31).

Nesta trilha os estudos e pesquisas interdisciplinares do projeto nos convidam a repensar a

formação de professores, na perspectiva de uma educação abrangente, interativa quando se

trata das sensibilidades artísticas e das reconfigurações no envolvimento do professor e do

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acadêmico no Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia da UFMS/CPAQ voltado à

pesquisa e a práxis.

1.1Encaminhamentos metodológicos na pesquisa

A realização da pesquisa conta com a maioria dos professores, acadêmicos matriculados e

egressos do curso de Pedagogia/UFMS/CPAQ, em parceria com a Escola Municipal “Erso

Gomes”, Escola Estadual “Antônio Salústio Areias”, com o Laboratório Interdisciplinar de

Formação de Educadores/LIFE, o Laboratório de Arte e Ludicidade para a Diversidade

Cultural/UFMS/CPAQ e de forma especial com os Grupos de Estudos e Pesquisas:

GEPFIP/UFMS/CPAQ e GEPI/PUC/SP.

Sendo assim, o presente artigo apresenta como fundamentação teórica, o Projeto

Pedagógico do Curso em estudo, que passa por revisões e atualizações pelo Núcleo

Docente Estruturante-NDE referendado pelo Colegiado do Curso e pela Pró–Reitoria de

Ensino e Graduação-PREG/UFMS. A documentação em questão reafirma o compromisso

com a formação de professores com base nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o

Curso de Pedagogia (DCN-Pedagogia), por meio dos Pareceres do CNE/CP Nº 05/2005 e

06/2006 e da Resolução CNE/CP Nº 01/2006, que define o marco geral e baliza a

organização dos projetos pedagógicos para os cursos de Pedagogia no Brasil. E, em

consonância com tais diretrizes, este projeto reflete sobre a formação de professores para

exercer a docência na Educação Infantil, nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, na

Educação Especial e na Educação de Jovens e Adultos, tendo a arte como eixo articulador.

Para tal tarefa, buscarmos encaminhamentos, junto a pesquisadora Ivani Fazenda,

para os dilemas de ordem teórico/metodológico enfrentado quando a questão é formar

professores pesquisadores na perspectiva da Interdisciplinaridade. A trajetória do estudo

tem como ponto de partida o processo investigativo interventivo, a apropriação do

conhecimento produzido sobre interdisciplinaridade e posterior seleção/definição teórica,

para qual foram utilizadas fontes impressas e digitais. Entre os autores que contribuem com

o estudo citamos BARBOSA (1984 e 2003) a principal referência do ensino da arte no

Brasil; CAMARGO (1994) que discute a arte da pré-escola à universidade; FAZENDA

(1994, 2005 e 2007) com férteis idéias na interdisciplinaridade; IAVELBERG (2003) com

suas produtivas reflexões sobre as linguagens da arte, PIMENTA (2004) que inspira os

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programas de formação de professores, NÓVOA (1995) que acredita no investimento da

formação como um processo dinâmico onde o professor precisa adotar uma postura ativa;

MORIN (2000) que dialoga com diferentes tempos e espaços, ampliando a competência

para ver, analisar e compreender as estruturas sociais, culturais em que as pessoas estão

inseridas e SILVA (2013) com as contribuições sobre a arte na educação. “A arte de olhar a

vida com arte: é abrir espaço para um ensino mais humano, é encontrar novas formas de capturar as

imagens, é ousar dar novos sentidos à vida. SILVA( p. 57).

No que se refere à percepção sobre a arte no auxilio a interdisciplinaridade, estamos

convicta, no sentido de não só constatar, mas, sobretudo, de fazer essa diferença:

observando, ouvindo, documentando e intervindo numa prática direta com os professores e

alunos em busca de uma nova qualidade de ensino, de uma nova escola, de uma educação

superior de qualidade.

1.2 Manifestações por meio dos depoimentos

Dentre as várias manifestações dos entrevistados, as mais repetidas e enfatizadas categorias

para classificar um docente universitário de “bom professor formador” foi a primeira: saber

explicar bem os conteúdos, em seguida identificar-se com a profissão docente sendo a

segunda o maior ponto em comum percebido nas falas dos egressos e dos acadêmicos em

curso. Até o presente momento somaram no universo da pesquisa 12 acadêmicos, entre as

turmas formadas até os dias atuais, dos quais as formulações geram muitas considerações

significativas. Partimos das seguintes perguntas: Qual ou quais foram às contribuições do

curso de Pedagogia/UFMS/CPAQ para sua formação? Em seguida as percepções sobre as

lacunas nesta formação? O que fez para atingir um estágio de profissionalidade? Por último

quais as sugestões para reformulações do Projeto Político Pedagógico do Curso?

Os seguintes depoimentos bastante vinculados com o ensino são representativos neste

estudo e, por ora apresentamos seis destes depoimentos:

Algumas reflexões que surgiram no primeiro ano de curso, conduzem até

hoje a forma como preparo os meus 10 auxiliares. Partindo do

conhecimento tácito e unindo-o à prática frequente do estudo do material

didático, busco não perder qualquer oportunidade de desenvolver cada

aluno ao seu máximo limite. E, assim vou seguindo, nesta longa

caminhada em prol da valorização de cada ser humano como um ser

único, capaz de transformar-se. As disciplinas eram interessantes, tais

como, História da Educação, Psicologia, Didática, Filosofia, dentre

outros. Havia muita leitura e pesquisa. Depoente “A” é formada no curso

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744ISSN 2177-336X

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de Bacharelado em Ciência da Computação e ingressou na Pedagogia,

mas por compromissos profissionais interrompeu o curso.

Pontos Negativos no Curso de Pedagogia/CPAQ:

Falta de professores, no início tínhamos apenas quatro. Depois teve uma

greve que atrapalhou o percurso das aulas. Na época tínhamos poucos

professores mestres e hoje vemos que a grande maioria é mestre e doutor.

Fragilidades na grade curricular. Não tínhamos Educação Especial que é

muito importante; nem matemática que senti muito a falta quando dei aula

no ensino fundamental; dentre outras áreas como geografia e ciências. O

estágio deveria ser bem maior, porque tínhamos a referência e nos faltou

mais a prática.

Pontos Positivos:

Professores comprometidos; sou uma professora que gosta o que faz e

comprometida porque tive um alicerce de bons professores.

Como vejo a educação hoje no Município

Como tem em todo lugar bons e maus profissionais, conhecendo a grande

e maioria. Já passaram pela minha sala vários estagiários da pedagogia. O

que posso notar é que estão teoricamente preparados. Por outro lado

trabalho com profissionais perto de se aposentar, muitos com problemas

emocionais, problemas de saúde alguns que deixam a desejar, mas existe

entre esses excelentes e compromissados. A prática me ajudou muito. E

cada ano o professor tem que sobressair com criatividade e bom

desempenho para que os alunos queiram assistir as aulas. Além da teoria

os novos professores deverão estar preparados emocionalmente, essa

clientela nova de alunos estão com algum tipo de deficiência e acima de

tudo com sérios problemas familiares que afetam seriamente o andamento

das aulas. Como professora me preocupo muito com o futuro desses

jovens alunos. Alguns professores adoecem porque não sabem lidar com

as “situações problemas”. Acredito que todos tem que se ajudar, a

Universidade Federal com mais projetos junto com esses alunos, projetos

com esportes, a saúde, ação social, conselho tutelar, psicóloga em cada

escola, enfim todos se unindo pra ajudar esse aluno “problema”.

Depoente “B”. Formada na primeira turma de Pedagogia da

UFMS/CPAQ, hoje Especialista em Educação Especial de 2000 a 2002

em São Carlos- SP

Minha formação está sendo marcada por alguns professores que fazem a

diferença no curso. São àqueles que gostam do que fazem, apesar dos

pesares. Que conseguem se organizar no gerenciamento das múltiplas

atividades acadêmicas de uma forma, minimamente equilibrada e que

confere à sua atuação em sala de aula, preparação de aula, atendimento ao

acadêmico com respeito e cuidado. Ainda, que se envolve com colegiado

do curso ou de outras instancias que tem a ver com o ensino de graduação,

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este é um professo mais comprometido. As lacunas ficam infelizmente

pela falta de comprometimento daqueles que cumprem tabela ao nos

formar. Deixo a sugestão para que todos se dediquem Depoente “C” em

curso.

No mês de abril do ano de 1997 ingressamos na primeira turma de

acadêmicos do Curso de Licenciatura Plena em Pedagogia, da

UFMS/CPAQ. Pioneiros, tanto acadêmicos quanto docentes, tínhamos a

árdua missão de cumprir com as determinações da Lei de Diretrizes e

Bases da Educação, também como conhecida como “Lei Darcy Ribeiro”

ou LDB 9394/1996, promulgada em 20 de dezembro de 1996. Dessa

forma, o Professor Licenciado em Pedagogia, passou a ter a

responsabilidade de alfabetizar as crianças brasileiras, sempre inspirado

nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, como

prega o art. 3º e os incisos da LDB. Naquela época o corpo docente do

curso era composto pela professora Elenir Machado de Melo, Ruben

Ayang de Oliveira, Francisco Romualdo de Paula, Marly Teixeira

Moretinni, Rosalina Brites de Assunção e Ana Lúcia Gomes da Silva. Não

era difícil perceber que tanto docentes quanto discentes estavam

extremamente alinhados estrategicamente, e com o objetivo de fazer

daquela Lei um dos norteadores para a carreira de novos alfabetizadores.

Após concluir o Curso de Pedagogia em 2000, tornei-me micro-

empresário. E em 2003, comecei o curso de Licenciatura Plena em

Matemática, concluindo o mesmo em 2006. Desde então, tenho duas

paixões: ensinar e empreender. Ainda não descobri qual das duas me

alegra mais. Sinto prazer em ambas. Depoente “D” da primeira turma do

curso. O curso de Pedagogia da primeira turma do CEUA agora CPAQ/MS

apresentava um cenário de aprendizado de novidade, tanto para os

acadêmicos também para os professores das áreas, tempo em que o curso

passava de reconhecimentos legais. Neste cenário do curso de Pedagogia

de Aquidauana o número de professores são limitados com 5 no quadro

com 2 mestres e nem um com título de doutorado. Analisando o hoje do

ontem, a grade curricular da primeira turma de Pedagogia foi carente das

disciplinas de Matemática, História, Geografia e Educação Especial. Não

tínhamos laboratórios que hoje possuem, falta de livros específicos para o

curso e o que tinha às vezes era apenas um exemplar e era preciso esperar

o outro terminar para emprestar ou senão, emprestar da biblioteca da

UFMS de Campo grande. Porém, com todas as dificuldades superadas na

medida do possível, como por exemplo, o mesmo professor ministrando

varias disciplinas, uma greve, algumas desistências de acadêmicos

conseguimos vencer e chegarmos sim, preparados para o mercado de

trabalho ou como eu e algumas colegas que atuavam como professoras

refletirmos sobre a nossa prática pedagógica. Desde que conclui o curso

de Pedagogia em 2.000, o meu objetivo como professora é sempre em dar

o meu melhor para os meus alunos, por isso procuro fazer cursos. Como

estava com a Educação Infantil fiz uma Especialização em Educação

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746ISSN 2177-336X

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Básica – área de concentração na Educação Infantil em 2.004 / UEMS

com o trabalho de Tcc “Pequeno Olhar, grandes revelações: Arte na

Educação Infantil”. E ai, brota uma nova paixão a Arte e lá foi eu fazer

mais uma graduação, agora nas Artes Visuais ano 2013. E, mais uma Pós

em Especialização Cultura e História dos Povos Indígenas/ UFMS 2.015

com o Tcc “Aldeia Aldeinha – uma aldeia urbana”. E não quero parar por

aqui, tenho o objetivo de mestrado e doutorado. Depoente “E”.

Como acadêmica do Curso de Pedagogia tive inúmeras experiências

significativas, como por exemplo a inserção no Projeto de Iniciação a

Docência/ PIBID. Esta foi, sem dúvida, a que mais me deu condições

para a docência e a outra foi em 2013 quando integrei o Grupo de

Estudos e Pesquisas em Formação Interdisciplinar de Professores da

UFMS/ CPAQ. Envolvida com os estudos, tive a oportunidade de

conhecer mais sobre o conceito da Interdisciplinaridade, visto que, já

havia tido um conhecimento prévio, mas por meio do grupo, foi

instigante estudar e refletir sobre este conceito. O estudo em grupo fez

com que eu compreendesse inúmeros conceitos, nas linhas de pesquisas,

assim levantar questionamentos e refletir com outros professores. O

GEPFIP já possui mais de ano de existência e sua contribuição seja para a

academia ou comunidade externa é de extrema importância. Hoje

iniciando minha carreira docente e ainda integrante do

GEPPIF/UFMS/CPAQ, constato a necessidade de estudar e participar da

formação continuada de professores, nesse sentido ampliar e rever nossas

práticas nos diferentes níveis de ensino. Depoente “F”, formada em

2015.

Procuramos, então, descrever sinteticamente as formulações que tiveram relação direta com o

tema sugerido, independentemente da forma e do estilo que cada entrevistado escolhera

para expressar.

O pensamento complexo é, pois, essencialmente o pensamento que trata

com a incerteza e que é capaz de conceber a organização. É o pensamento

capaz de reunir (complexus: aquilo que é tecido conjuntamente), de

contextualizar, de globalizar, mas, ao mesmo tempo, capaz de reconhecer

o singular, o individual, o concreto. (MORIN, 2000a, p.207).

A partir desta trajetória pode-se afirmar que o pensamento complexo como possibilidade de

reformar o pensamento, ou seja, como forma de perceber, compreender as múltiplas relações

existentes entre os diferentes elementos que constituem um sistema, torna o percurso instigante.

Através dos dados coletados, por meio de depoimentos, observações e registros de mídia

pretendemos provocar discussões no Grupo de Estudos e Pesquisa em Formação Interdisciplinar de

Professores da UFMS/Campus de Aquidauana, em torno de propostas que encontre coerência na

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construção de uma perspectiva interacional, construída nas/pelas categorias do encontro, do

acolhimento, da afetividade, do diálogo, da parceria, do reconhecimento e da totalidade. O processo

investigativo toma como foco principal a pessoa do professor formador e do acadêmico do Curso de

Pedagogia da UFMS/Aquidauana e alguns professores egressos do curso que hoje atuam nas

Escolas Municipais e Estaduais, buscando apreender o mundo subjetivo de suas representações e

expectativas, em que se inscreve o desejo imanente de mudanças em suas atividades educativas,

científicas e culturais.

Foram incluídos também, como material de pesquisa, os seminários. Alguns já ocorreram e

outros previstos para o decorrer de 2016 com a importante participação dos professores do curso.

Estão assim formulados: Infância: (des) construção em processo; Criança e Infância na

Contemporaneidade; Formação do pedagogo: aspectos legais e fundamentais; Reflexões

contemporâneas acerca da aquisição da leitura e da escrita na alfabetização; Alfabetização

científica e a valorização da curiosidade da criança; A Educação Ambiental no mundo

globalizado e capitalista; Classe hospitalar: roda de leitura com livros de pano para crianças

hospitalizadas, entre outros que estão sendo construídos.

Julgamos possível apontar que os seminários permitem a reflexão sobre a força das práticas

interdisciplinares e a abertura que elas proporcionam como possibilidades de aprendizagens

significativas, tanto no que se refere aos aspectos de vivência prática, ou seja, da docência

interdisciplinar, quanto na formação do pensamento complexo dos acadêmicos e sua

importância para a atuação dos mesmos nos diferentes campos já acima indicados.

Seguimos os passos no exercício de uma prática interdisciplinar que nos auxiliou a

identificar a pesquisa intervenção como balizadora no caminho percorrido. Procuramos

então, a partir dos princípios da metodologia interventiva, reconhecer o universo teórico

que respalda a prática pedagógica no curso de pedagogia e em cada uma das escolas

pesquisadas, destacando a preocupação com o trabalho interdisciplinar e as vozes dos

professores e acadêmicos no que se referem ao currículo do curso em termos de suas percepções,

demandas e expectativas.

As intervenções em educação, em especial as relacionadas ao processo ensino

aprendizagem, apresentam potencial para simultaneamente, propor novas práticas

pedagógicas (ou aprimorar as já existentes), produzindo conhecimento teórico nelas

baseado. (DAMIANI, 2012).

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Nos desdobramentos teóricos sobre intervenção, a interdisciplinaridade privilegia e emana

a força da ousadia na busca pela transformação da educação. Em Fazenda (2007)

encontramos tais referências quando realizamos intervenções procurando entender o

significado das palavras na maneira como os educadores e alunos pesquisados falam do seu

universo, das situações presentes e passadas.

Considerações Finais

Estas reflexões sinalizam desafios no ensino para construir uma educação inovadora no curso de

pedagogia em questão, onde os olhares e os diálogos sejam elementos de base no processo de

mudanças, uma vez que a cultura é o bem mais precioso de um povo e através da arte e de tantas

outras manifestações culturais, expressamos pensamentos e construímos diversas formas de

conhecimento. É dentro dessa perspectiva que o conhecimento tem a sua função estética,

transformadora, política e social na educação e na cultura. Uma pesquisa enquanto atividade

artística que expressa o homem e os seus sentimentos, como também compreende a expressão dos

sentidos mais urgentes para a reformulação da práxis em sala de aula.

Assim, esse projeto compreende a multiplicidade do movimento interdisciplinar na construção do

conhecimento mediante uma nova ótica e representa a possibilidade de promover a superação da

dissociação das experiências acadêmicas entre si, como também delas com a realidade social. Ele

emerge não só como forma de compreender e melhorar o mundo, mas como uma exigência interna

das ciências que busca o restabelecimento da Universidade como um espaço privilegiado. Um lugar

onde passamos grande parte de nossas vidas e por este motivo torna-se significativo a partir da

atuação do professor.

Isto nos faz ver que as correlações dos movimentos culturais com a arte e com a educação

em arte não acontecem no vazio, nem desenraizadas das práticas sociais vividas pela

sociedade como um todo. As mudanças que ocorrem são caracterizadas pelo mecanismo

social que interfere, modificando ou conservando as práticas vigentes.

Daí a necessidade de abordarmos sobre este universo, a partir daqui somando as experiências de

cada uma com percepções sobre o que nos parece mais significativo. Momento em que nos

retiramos e ao mesmo tempo nos fazemos presentes na forma de olhar a nossa trajetória.

Referências

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________. Isto é arte? Uma reflexão sobre a arte contemporânea e o papel do arte-

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FAZENDA,, Ivani. Interdisciplinaridade - história, teoria, pesquisa. Campinas: Papirus,

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A FORMAÇÃO CONTINUADA COMO ESTÍMULO À AUTONOMIA DO

PROFESSOR NA CRIAÇÃO DE PROJETOS INTERDISCIPLINARES

Claudia Maria Vasconcelos Lopes

Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca

Resumo

Este artigo se propõe a olhar a formação continuada do docente como um estímulo a

promover o profissional a autônomo para que possa, mesmo de maneira embrionária, dar

conta da demanda de trabalhar interdisciplinarmente, demonstrando mais segurança ao criar

projetos que elejam as diferentes linguagens, dentro da lógica dialógica proposta por

Bakhtin, ([1953] 2011).Serão também discutidas questões teóricas no escopo da autonomia

sociocultural (OXFORD, 2003) na arena da formação docente com o intuito de dialogar

com o objetivo citado anteriormente. Para tanto, convoco as noções de autonomia

sociocultural e letramento social, presentes em Lemke (1998) e Street (1984), e

Multiletramentos (ROJO, 2010), que almejam capacitar os docentes a navegar por práticas

de letramento cada vez mais inter e indisciplinares e a ótica de educação como ato

responsável preconizado por Bakhtin. O intuito é problematizar se o estímulo à autonomia

docente, no âmbito aqui exposto, pode vir a desencadear a criação de práticas pedagógicas

mais dialógicas e profícuas. Para ilustrar tal proposta, analiso a narrativa de uma aluna do

curso de Pós-Graduação de uma instituição pública de Ensino Superior localizada no Rio

de Janeiro, além de excertos do diário de pesquisa mantido ao longo do curso

Interdisciplinaridade e Educação, ministrado por mim. Tal opção metodológica localiza-se

no escopo da pesquisa qualitativa de base etnográfica e que vai buscar verificar se os

saberes coconstruídos ao longo do curso a estimulam a ser mais autônoma nas suas práticas

dialógicas, mesmo tendo recebido uma formação pré-serviço disciplinar, como parece

acontece nas universidades brasileiras.

Palavras–chave: Autonomia Sociocultural, Interdisciplinaridade, Formação Continuada.

Introdução

A formação continuada tem sido amplamente abordada, porém, não é objetivo deste artigo

apresentar essa temática, por si só, ela exigiria outro fórum. Servirá como pano de fundo,

uma vez que o estudo realizado tem como cenário uma matéria intitulada,

Interdisciplinaridade e Educação, que é um módulo, parte do currículo de uma formação

continuada fomentada pela pós- graduação de uma instituição pública federal de ensino

tecnológico superior localizada no Rio de Janeiro. O foco de interesse deste artigo seria um

recorte para desencadear as seguintes discussões: o existir-evento citado pode-se constituir

em um profícuo espaço de coconstrução de saber docente mais em sintonia com as

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demandas contemporâneas? Este pode ser capaz de estimular o docente a tornar-se

autônomo no viés da autonomia sociocultural (OXFORD, 2003) para criar práticas

pedagógicas mais dialógicas? Por este estudo dedicar-se apenas a fomentar a reflexão

acerca do diálogo entre os saberes coconstruídos ao longo do módulo e os possíveis

impactos que estes podem promover nas práticas pedagógicas dos docentes envolvidos, é

importante citar que a formação do professor é uma relação de nunca acabar, uma relação

que reflete e refrata o incluso, o interminável, o inacabado (GUILHERME, 2013 p. 39).

Não é objetivo mensurar até que ponto o docente torna-se autônomo ou não depois do

curso, até porque este estudo está inserido na pesquisa qualitativa de cunho etnográfico.

Procura-se provocar inquietações que possam preencher a brecha entre o discurso da

universidade e o cotidiano, principalmente o professor recém-formado vai encontrar na

escola. (CELANI 2001, p.36).

Acredito na relevância social do módulo citado por três razões: a literatura contemplada

durante o mesmo que pôde contar com textos fundantes no escopo da interdisciplinaridade,

letramento crítico, o par mais competente de Vygotsky (1998) e a filosofia da linguagem do

círculo de Bakhtin ( [1953] 2011). Em segundo lugar, as discussões que mantive, com os

docentes-participantes do programa. Em terceiro, talvez a principal razão, as sessões

reflexiva, para analisar os projetos por eles elaborados. Esta última razão parece estimular

a possibilidade de criar espaços de produção colaborativa e crítica para compreender e

transformar valores, conceitos de ensino-aprendizagem e desenvolvimento, bem como

regras e divisão de trabalho, que organizam as condições sociais, culturais, éticas e

políticas quanto ao pensar e à ação-discurso específicos de cada comunidade escolar

(MAGALHÃES, 2011, p. 13). Neste âmbito é importante salientar que as três razões

citadas são fatores preponderantes não só na formação continuada como no estímulo à

autonomia docente, mas é preciso que haja a habilidade e a vontade para que essa

autonomia ocorra, como propõe Littlewood (1996, p.428). Segundo Nicolaides (2011, p.

176)„habilidade‟ e „vontade‟ podem tanto já vir”prontos”, ou ser influenciados pelo

ambiente de aprendizagem.

A discussão nesta pesquisa afilia-se ao caráter transdisciplinar da Linguística Aplicada, que

possibilita buscar em diversas áreas do conhecimento fundamentos que o ajudem a refletir

sobre e compreender a natureza do objeto pesquisado (SZUNDY 2005 p. 12 ); para tanto,

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colhi de teorias da educação (FAZENDA, 2006; JAPIASSÚ, 1976) que serão fortemente

sustentadas pelas concepções de letramento social ( LEMKE, 1998 ; STREET, 1984 ).

Pretendo focar os pressupostos vygotskianos e bakhtinianos que fundamentam este artigo,

buscando sempre sublinhar o diálogo entre as duas teorias no que tange ao meu objeto de

investigação: refletir sobre o estímulo à autonomia sociocultural docente na produção de

projetos interdisciplinares que um curso de formação continuada pode promover. Buscando

contemplar esse objetivo, pretendo responder às seguintes perguntas: Até que ponto a

literatura utilizada durante o curso orienta o docente-participante do módulo no processo

de reflexão em relação à própria prática? Como o diálogo que tiveram comigo levou os

professores-participantes a refletir sobre a própria prática no que se refere à produção de

projetos que envolvam diferentes linguagens? Em que medida os docentes-participantes se

sentem mais autônomos para elaborar os seus projetos dialógicos com mais agência?

Em consonância com a perspectiva metodológica, triangulo os dados provenientes de dados

registrados no meu diário de pesquisa mantido ao longo do módulo e algumas citações dos

professores-alunos da turma.

Delineados os principais pressupostos, passo à breve especificação das quatro seções,

entrelaçadas e intimamente costuradas com as perguntas de pesquisa. Na primeira seção,

apresento o planejamento do módulo fundamentando o porquê das minhas escolhas. Vou

subdividir esta seção em três, onde delineio brevemente, na primeira subseção, as

exigências deste momento contemporâneo tão fluido (cf BAUMAN, 2000), que parece

eleger práticas mais inter/indisciplinares como um possível caminho para uma educação

que emancipe e promova a problematização de temas tão caros ao desenvolvimento

discente. Na segunda subseção, coloco em pauta que práticas de letramentos. Finalizo com

a subseção que coaduna com a segunda pergunta deste estudo. O interesse seria abordar o

estímulo e a importância da criação de arenas de contestação e conflitos dentro da formação

continuada. A segunda seção, tenta elucidar e trazer o conceito de autonomia para este

fórum. É uma tentativa de estabelecer um diálogo com a formação continuada e verificar

uma possível relação. A terceira seção, Caminhos metodológicos, ilustra a perspectiva de

pesquisa contemplada e contém uma subseção. Ambas vão dar conta de materializar os

dados da pesquisa com a narrativa da aluna. Na quarta seção trago as considerações finais.

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1 Interdisciplinaridade e Educação em sete atos: como os saberes foram entrelaçados?

Tecendo a Manhã

Um galo sozinho não tece uma manhã: ele precisará sempre de outros galos: De

um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um outro galo que apanhe

o grito de um galo antes e o lance a outro; e de outros galos

que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de seus gritos de galo, para

que a manhã, desde uma teia tênue,

se vá tecendo, entre todos os galos.(João Cabral de Melo Neto)

Abro essa seção com versos do poeta que nasceu em 1920 que destaca com propriedade, a

tessitura de uma manhã como sendo algo possível apenas diante da colaboração de vários

galos, que aos poucos vão, no jogo de gritos, costurando a manhã. Os galos são dialógicos,

como apontam os versos metaforicamente, e essa função social da troca, essa interação

entre os indivíduos me inspiraram a elaborar e idealizar o módulo, que contava com sete

encontros iniciado em outubro de 2013 na pós-graduação citada.

Podemos dizer que os gritos dos galos representam o entrelaçar das diferentes vozes

necessárias ao objetivo da disciplina. Vozes que na programação se materializaram em

forma de textos, problematizações, sessões reflexivas com discussões sobre o projeto

interdisciplinar elaborado em grupos de quatro, apresentação de projetos dialógicos bem

sucedidos ministrados por docentes oriundos de outros contextos, e uma palestrante sobre

um programa de formação continuada chamado PLIEP. As opções das práticas tem o

seguinte objetivo: convidar o docente-participante a mergulhar neste cenário que preconiza

a troca de saberes e estimula a criação de projetos interdisciplinares. A ideia foi entrelaçar,

nestes sete encontros de quatro horas, as diversas vozes e saberes.

1.1 O momento contemporâneo: como entrar em sintonia?

Há pouco mais de um ano, foi anunciada, uma proposta do Ministério da Educação que

almeja reorganizar o currículo do Ensino Médio. Observe a figura abaixo.

Figura 1 – Proposta do Ministério da Educação de mudança do Ensino Médio

http://www1.folha.uol.com.br/educacao/1138074-mec-vai-propor-a-fusao-de-disciplinas-do-ensino-medio.shtml

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A figura parece gerar um certo desconforto em pessoas que tenham tido uma educação

disciplinar. Como acompanhar o mundo contemporâneo que passa por essas mudanças

aceleradas, plurais, densamente transformadoras, que desestabilizam os humanos e mais

especialmente o educador? ( LOPES LOURO,2003, p. 41).

Bauman (2000) propõe a fluidez e liquidez como as principais metáforas para o momento

em que vivemos. Conforme esse autor, os fluidos se movem facilmente. Eles fluem, esvaem-

se,vazam. Diferentes dos sólidos, não são facilmente contidos ( BAUMAN, 2000, p.8 ).

Essa metáfora acena para a ideia de mobilidade que dificilmente pode ser contemplada nas

organizações curriculares do ensino tradicional, que mantêm as disciplinas justapostas,

isoladas. Esta perspectiva fragmentada evidencia a excessiva especialização e incita o

olhar do aluno numa única, restrita e limitada direção (FAZENDA, 2006, p.19). Não seria

a interdisciplinaridade uma forma de tratar dos problemas com que se defrontam os

indivíduos e as sociedades, provendo mesmo que de forma relativa, a fluidez proposta pela

nova ordem mundial? Porém, os docentes parecem não estar preparados para mudanças

similares às que inauguram esta subseção.

1.2 Que práticas de letramentos almejamos?

Práticas de letramentos devem procurar desestabilizar maneiras cristalizadas de ver o

mundo social, além de buscar a lógica da hibridade. O módulo idealizado, a partir do

proposto durante os encontros, procurou motivar esta perspectiva e a premissa de se alinhar

à Teoria Sociocultural de Vygotsky ([1930], que preconiza a necessidade do outro

discutida por Bakhtin, que pode auxiliar a vencer as barreiras disciplinares.

Ao discutir os projetos interdisciplinares durante as sessões reflexivas, procurei, ainda

reafirmar que letramentos são práticas sociais (LEMKE,1998) e as intervenções cabíveis

dentro do que preconizamos no viés dialógico.

1.3 Reflexão crítica como (trans)formação da prática

Aprofundar a intricada questão da reflexão crítica extrapola o escopo deste estudo.

Contudo, considero pertinente fazer algumas ponderações sobre a questão neste ponto para,

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pelo menos, situar o leitor numa temática ainda recorrente nos estudos da (trans)formação

da prática docente no viés da reflexão crítica, que tanto se almeja na formação continuada.

É necessário explicitar e deixar claro que reflexão não é, por definição, crítica, como

preconiza Brookfield (1995), para quem a reflexão se torna crítica quando tem dois

propósitos distintos. O primeiro envolve entender como considerações de poder

perpassam, moldam e distorcem os processos e as interações educacionais. O segundo é

questionar certezas (BROOKFIELD, 1995, P. 8). Szundy (2013, p. 61) explicita:

Para que esses dois propósitos venham a ser alcançados no diálogo entre

professores e pesquisador, tornando-o de fato um espaço para a reflexão

crítica em relação à prática dos participantes, é fundamental que as

ideologias retratadas e refratadas nos enunciados do professor e do

pesquisador sejam identificadas e que as suas relações com o contexto

social, histórico e cultural mais amplo sejam analisadas e discutidas

(SZUNDY, 2013,p. 61).

Desta forma, foi sob essa perspectiva que entendi o conceito de reflexão crítica do

professor em serviço. Procurei criar arenas de contestação, e propiciar um clima de

ressignificação, sem eliminar o que o grupo de professores havia idealizado. Pautada nesta

premissa, creio que consegui costurar o que havia sido discutido durante o módulo.

Procurei ofertar a base para a autonomia que desejamos moldadas com práticas mais

conscientes e dialógicas.

2 Autonomia sociocultural: afinal o que preconizamos?

Na área de autonomia,muitos estudos têm abordado a importância da busca pela

autonomia na aprendizagem de línguas. Nesta pesquisa abre-se uma nova possibilidade,

que seria considerar a proposta que a formação continuada possa se constituir como um

espaço que possivelmente estimula o docente em serviço a se tornar autônomo. Refiro-me,

portanto, à proposta de autonomia sociocultural. Com o objetivo de justificar tal opção e

tentar elucidar a pergunta que inaugura esta seção, é necessário, pensar e problematizar o

conceito. O dicionário de português Aurélio define autonomia da seguinte forma com grifos

meus.

Aptidão ou competência para gerir sua própria vida, valendo-se de seus

próprios meios, vontades e/ou princípios..Direito ao livre arbítrio que faz

com que qualquer indivíduo esteja apto para tomar suas próprias

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decisões. Faculdade do ser humano de se autogovernar de acordo com

seus padrões de conduta moral sem que haja influência de outros

aspectos exteriores. (NICOLAIDES, 2011, p.175).

Tal definição parece defender uma proposta em que o indivíduo toma suas próprias

decisões, de maneira unitária e sem nenhum comprometimento e/ou interação com as

diversas esferas sociais de ação humana. Tal afirmação se evidencia pelo uso das palavras

grifadas e pela última sentença, demonstrando mais profundamente que esta visão de

autonomia coloca o sujeito em uma posição isolada, em que ele vivencia tomada de

decisões de acordo com seus próprios meios. Já segundo Bakhtin ([1920-24]2010), viver é

um evento singular e não apenas executar ações mecânicas: gerir sua própria vida, estar

apto, autogovernar. Para o autor, viver significa ter um posicionamento crítico perante as

construções sociais e interagir com o mundo social. Relaciono, neste âmbito, a concepção

do ato responsável (BAKHTIN[1920-24]2010). Porém, ser responsável para esse filósofo,

significa mais do que ser dedicado ou executar suas tarefas com zelo. Acredito que na

verdade inclui interagir, enxergar-se como um ser inacabado e admitir que em vários

momentos precisamos do outro para manter-nos engajados no diálogo.

Esta definição problematizada parece se afastar do conceito de autonomia a que este estudo

se afilia. Parece não levar em consideração que o ser autônomo está inserido em um

contexto, e que é possível que sofra a influência de aspectos exteriores, o que se distancia

do final da definição preconizada pelo dicionário.

O que estimulei durante o módulo, além da autonomia: agir no mundo com assistência de

um par mais competente e agir no mundo autonomamente, consciente de suas ações

(AARÃO, 2003, p 36). Essa premissa remete à Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP),

preconizada por Vygotsky. Neste âmbito o fator sociocultural se manifesta demonstrando

que o ser autônomo, privilegia o trabalho dialógico como um possível estímulo à criação de

projetos mais autônomos. Quero dizer que, ao elaborar um projeto interdisciplinar, o

docente pode inicialmente ter-se valido de recursos próprios, de forma autônoma, mas,

motivado, vai além.

3 Caminhos metodológicos

Ao circular por vários discursos relacionados a interdisciplinaridade e autonomia

sociocultural deparei-me com a associação das disciplinas às ondas do mar. Por entender

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que a mistura das ondas possa representar metaforicamente a autonomia sociocultural que

preconiza a interação, que só é viável mediante o encontro, que no caso são as ondas

quando chegam à praia. Com base na metáfora das ondas, construo esta seção com a figura

do pescador que observa o mar e que se prepara, logo após, tem o resultado de seu

empenho: o pescado. Enfoco isso, a organização, o caminho metodológico que trilhei e

buscar possíveis respostas. Logo estabeleço um paralelo entre o preparo para um dia de

trabalho do pescador com as minhas opções metodológicas, que incluem os instrumentos

que utilizei e a materialidade dos dados gerados. O pescador separa o que é produtivo para

a venda e eu, olho para os dados e vejo o que pode dialogar com as minha fundamentação.

Desta forma, sistematizei meu estudo, gerei meus dados e procurei olhar para o meu

contexto para tornar meus registros mais relevantes e triangulá-los para a análise

(SPRADLEY, 1980). É uma perspectiva interpretativista de base etnográfica. Porém, tenho

em mente que tempestades são possíveis, e que para elas preciso estar preparada até porque,

segundo Sommerville (1993), como acontece com o mar, pode haver tempestades, e

também calmarias, é possível que os dados não respondam às inquietações.

Os dados são de uma narrativa postada em um grupo fechado criado em uma rede social, a

qual os alunos deveriam postar discursos que almejassem responder as seguintes questões:

Depois de sua graduação, você já havia feito algum curso de formação continuada? O que a

fez começar a pós-graduação que você frequenta hoje? Até que ponto os pontos abordados

no módulo foram novos para você? De que forma o módulo auxiliou no seu processo de

reflexão como docente? Como foi o processo de elaboração do projeto interdisciplinar? Até

que ponto você se sente preparado para criar projetos interdisciplinares depois do módulo?

3.1 Diálogos em pauta: a narrativa da aluna e as reflexões da professora-

pesquisadora

Chega o momento de discutir a análise. Todos os nomes utilizados são fictícios, para que a

privacidade seja preservada.

O primeiro ensinamento me vem quando identifico o contraste existente entre as diferentes

perspectivas do conceito de interdisciplinaridade. No primeiro encontro questionei: O que é

a interdisciplinaridade? Tenho anotadas em meu diário de pesquisa as seguintes definições:

É cada um na sua sala tentando usar conhecimentos de outras matérias. É algo

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relacionado às matérias alheias. Um tema é escolhido e cada professor trabalha nele como

quiser. Confundo tudo: multidisciplinaridade, interdisciplinaridade, transdisciplinaridade.

Não sei nem ensinar a minha matéria. Estou perdida!

Muitos responderam de maneira incompleta, outros demonstram dúvida e são vagos na

definição. Não pude localizar respostas que contemplassem a perspectiva Vygotskiana de

construção do conhecimento, muito menos a questão do diálogo no viés do par mais

competente. Creio que estes docente iriam sentir-se inseguros caso o governo decidisse

implementar, a proposta anunciada no início da subseção 1.1.

Optei por iniciar questionando os docentes em relação ao conceito de interdisciplinaridade,

pois acredito que os pressupostos precisam estar claros para que o docente pense e

considere a possibilidade de ressignificar a prática na perspectiva dialógica. Relaciono estes

dados do meu diário, com a narrativa da aluna postada na plataforma, na tentativa de

promover um contraste entre o início e o final do módulo.

10/12/2013(última aula) Narrativa de Kate (grifos meus)

Pelo fato de trabalhar textos de diversas áreas do conhecimento em sala

de aula, a disciplina me fez perceber que é possível trabalhar em

conjunto com outras disciplinas, em uma escola, através de projetos

desenvolvidos em conjunto com outros docentes de outras áreas do

conhecimento. Como docente, o enriquecimento pessoal em descobrir

mais sobre as outras disciplinas (por meio do diálogo entre professores

de outras disciplinas) é notório, pois acrescenta uma bagagem melhor

para transmissão de conhecimento aos discentes. E os discentes ganham

mais com essa troca de conhecimento dentro das disciplinas, uma vez

que não vêem a disciplina de maneira singular.

Eu tenho o olhar interdisciplinar que não tinha antes, diante da tarefa

de um futuro projeto interdisciplinar. Sem a colaboração do corpo

docente acho impossível a criação de um projeto interdisciplinar.

O fragmento parece apontar para uma visão otimista em relação à literatura utilizada. As

três primeiras expressões em negrito evidenciam claramente o valor teórico que os textos

problematizados agregaram. As últimas falas grifadas parecem dar suporte à premissa que a

literatura que circulou pôde desestabilizar crenças cristalizadas. Porém, há indícios, no

excerto do meu diário, de que sete encontros não são suficientes para aprofundar o tema em

questão.

10/12/2013 - Neste dia perguntei aos alunos: A literatura utilizada

contribuiu para a compreensão do assunto? Marina disse que sim, mas

que foi tudo muito corrido, que sete encontros não são suficientes.

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Este dado ilustra claramente um ponto nevrálgico do módulo, e compartilho da mesma

ótica. Creio que este poderia amalgamar-se a um outro módulo do curso: Práticas de

letramento em educação e desta forma a turma teria quatorze encontros. Acredito que os

dois módulos ocupam-se do mesmo campo de saber, que são letramentos. A sutil diferença

é que o módulo problematizado nesta pesquisa aprofunda a interdisciplinaridade. Fica a

sugestão de se unir os módulos, que não cabe aqui discutir.

Mapeando mais a narrativa, tentarei responder a segunda pergunta: Como o diálogo que

tiveram comigo levou os professores-participantes a refletir sobre a própria prática no que

se refere à produção de projetos que envolvam diferentes linguagens?

O primeiro passo para a aquisição conceitual interdisciplinar seria o

abandono das posições acadêmicas prepotentes, unidirecionais e não

rigorosas que fatalmente são restritivas, primitivas e „tacanhas‟,

impeditivas de aberturas novas, camisa-de-força que acabam por restringir

alguns olhares, tachando-os de menores. Necessitamos, para isso,

exercitar nossa vontade para um olhar mais comprometido e atento às

práticas pedagógicas rotineiras menos pretensiosas e arrogantes em que

a educação se exercer com competência.(grifos meus). (FAZENDA, 2006,

p.13).

Fica claro que dei suporte suficiente, orientei, promovi um clima de interação, entendi as

limitações de quem nunca elaborou algo parecido, mas infelizmente não é possível localizar

nos dados se eu os fiz refletir sobre a própria prática. Ao citar muitas vezes ficamos muito

no nosso mundo, Kate não cita o conceito de par mais competente trabalhado e nem

consigo mapear algo que dê suporte nas minhas anotações no diário. É possível que um

roteiro pudesse ter me ajudado e orientado o grupo. Além disso, se os módulos se

amalgamassem, teríamos dois professores com mais experiência para fazer as intervenções

colaborativas. Sigo para a terceira e última pergunta: Até que ponto os docentes-

participantes sentem-se mais autônomos para elaborar os seus projetos dialógicos com

mais agência?

Não é objetivo mensurar se os docentes-participantes sentem-se mais autônomos. A questão

é olhar e localizar indícios que sirvam para reflexão de quem se ocupa da formação

continuada e elegem a perspectiva sociocultural. Procuro localizar se o módulo de alguma

forma estimulou a criação de projetos interdisciplinares de forma mais consciente e mais

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autônoma na vida deste profissional. Transcrevo a seguir a narrativa da aluna na tentativa

de elucidar esta questão.

Para elucidar a terceira pergunta, trago para este fórum excertos do meu diário. No último

dia indaguei se eles percebiam alguma mudança em suas crenças em relação ao nosso

objeto de estudo obtive este dado:

10/12/2013Ao iniciar as aulas entendia interdisciplinaridade como algo

só feito na escola, algo complicado demais. Contudo, percebi que

podemos encontrar interdisciplinaridade fora dos portões da escola... eu

posso levar isso para o meu cotidiano e quem sabe me ajudar na minha

formação continuada.. Pretendo fazer mestrado... acho que isto vai me

ajudar e por consequência melhorar a minha sala de aula.

As sentenças em negrito evidenciam o estímulo à autonomia. Neste sentido, seria

compreender autonomia como um fenômeno sociocultural, que tem como uma das

características o agir com responsabilidade. Este fato é destacado pela sentença que

expressa o desejo da docente em dar continuidade aos seus estudos acadêmicos.

4 Considerações finais

A pesquisa e as reflexões apresentadas neste artigo examinaram alguns aspectos que julgo

crucial para se compreender melhor o momento que estamos vivendo enquanto formadores

neste contexto contemporâneo. Assumo que nós, devemos ser mais ousados, e buscar

soluções mais complexas, criativas e anunciar o desenho de um novo futuro.

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INDERDISCIPLINARIDADE: DESAFIOS NA SUPERAÇÃO DO

CONHECIMENTO FRAGMENTADO

Franchys Marizethe Nascimento Santana Ferreira

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

Resumo

Este estudo tem como meta apresentar um quadro de discussões e reflexões acerca da

prática interdisciplinar na área educacional. Para tanto, referendamos nossos estudos sobre

o respectivo tema em autores renomados como Fazenda (1999; 1997; 1996;); Japiassú

(1976); Perrenoud (2010); Magalhães (2009); dentre outros. Entende-se que o aspecto

interdisciplinar constatada nas leituras realizadas é de articulação dos saberes de diferentes

disciplinas/áreas do conhecimento em favor de um ensino contextualizado e holístico. A

interdisciplinaridade vem sendo marcada historicamente por um movimento de mudanças

instituído em vários setores da sociedade, não somente na educação, mas também de

natureza econômica, ambiental, política, social ou tecnológica. Embora seu enfoque ocorra

com ênfase na área educacional outros setores da ciência também vislumbram a

necessidade de sua prática por acreditarem na necessidade de pensamentos e atitudes

abrangentes, capaz de compreender a complexidade da realidade e construir um

conhecimento que considere essa amplitude. Tal aspecto refere-se a uma nova concepção

de ensino e de currículo, baseada na interação e integração entre os diversos ramos dos

conhecimentos que consequentemente oportunizará novas atitudes. Ressalta-se que a

interdisciplinaridade necessita estar voltada também a um diálogo com as diversas ciências,

tornando o saber sobre um clivo universal. Assim, é possível repensar nossa vida, nossa

prática profissional, nossas relações entre idéias e realidade, entre professor e aluno e teoria

e práxis. Neste sentido é relevante considerar o professor o sujeito que precisa romper e

assumir novos paradigmas educacionais no processo de transformação, tornando necessário

que sua formação contemple abordagens críticas e reflexivas para traçar novas ações que

estejam imbuídas de atitudes interdisciplinares que possam dialogar com outras formas de

conhecimento e ao mesmo tempo promover um diálogo entre as diversas áreas do

conhecimento.

Palavras-Chave: Prática Pedagógica Interdisciplinaridade, Prática Pedagógica,

Conhecimento.

Introdução

Considerando que o professor é o sujeito que precisa romper e assumir novos paradigmas

educacionais no processo de transformação é necessário que sua formação contemple

abordagens críticas e reflexivas para traçar novas ações que estejam imbuídas de atitudes

interdisciplinares que possam dialogar com outras formas de conhecimento e ao mesmo

tempo promover um diálogo entre as diversas áreas do conhecimento.

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763ISSN 2177-336X

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A interdisciplinaridade vem sendo marcada historicamente por um movimento de

mudanças instituído em vários setores da sociedade, não somente na educação, mas

também de natureza econômica, ambiental, política, social ou tecnológica. Embora seu

enfoque ocorra com ênfase na área educacional outros setores da ciência também

vislumbram a necessidade de sua prática por acreditarem na necessidade de pensamentos e

atitudes abrangentes, capaz de compreender a complexidade da realidade e construir um

conhecimento que considere essa amplitude. Tal aspecto refere-se a uma nova concepção

de ensino e de currículo, baseada na interação e integração entre os diversos ramos do

conhecimentos que consequentemente oportunizará novas atitudes.

A rapidez das mudanças em todos os setores da sociedade atual (científico, cultural,

tecnológico ou político-econômico), o acúmulo de conhecimentos, as novas exigências do

mercado de trabalho, sobretudo no campo da pesquisa, da gerência e da produção, têm

provocado uma revisão didático-pedagógica do processo de educação escolar.

Consequentemente uma nova concepção de currículo e posturas frente ao processo de

ensino- parendizagem tem sido necessária no romper de paradigmas, o que implica em uma

série de competências e habilidades a serem desenvolvidas pela escola: competência

linguística, lógico-matemática, espacial, cinestésica, musical, pictórica, intrapessoal e

interpessoal, dentre outras. (GARDENER, 1995).

Constata-se urgência da interdisciplinaridade na produção e socialização do conhecimento

proposta por inúmeros autores, que tem um ponto em comum em relação ao seu sentido e

finalidade no campo educativo com características de abordagens que contemplam um

movimento que caminha para novas formas de organização e produção do conhecimento.

Na abordagem de Fazenda (1996) a interdisciplinaridade no campo pedagógico será

articuladora do processo de ensino-aprendizagem na medida em que se produzir como uma

mudança de atitude perante o conhecimento, numa relação de reciprocidade e mutalidade

que produz o diálogo entre os agentes envolvidos no processo, substituindo uma concepção

cartesiana pela unitária do ser humano.

Assumir uma atitude interdisciplinar não significa abandonar ou menosprezar as

especificidades de cada disciplina, mas perceber o que as une ou as diferenciam, para

encontrar os elos, ou seja, as disciplinas podem e devem contribuir para a construção e

reconstrução do mesmo conhecimento. Para isso são necessárias novas atitudes frente ao

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saber, pois o professor será desafiado a criar e inovar, e tal ação exige romper com os

paradigmas que há séculos dominam os sistemas de ensino, e consequentemente a prática

de inúmeros professores. Para efetivar a mudança é necessário buscar alternativas,

pesquisar e investir na formação continuada que propicie e contribua com este processo de

transformação.

Morin (2000) faz uma crítica em relação a educação no sentido de formar inteligências

parceladas, compartimentada e mecanicista. Ressalta que os sistemas de ensino precisam

romper com as fragmentações para mostrar as correlações e contextualizações entre os

saberes, tendo como meta uma formação que valorize o conhecimento contextual e

promova o saber globalizado. Assim, a interdisciplinaridade deve ser trabalhada de forma

contextualizada e partir do conhecimento inicial do aluno a fim de desenvolver

competências que ampliem seu conhecimento inicial sobre o tema proposto.

1 A formação dos futuros docentes: perspectivas da interdisciplinaridade

Abarcar a questão da formação neste contexto, requer atitudes que desmistifiquem o

processo ensino-aprendizagem e que promova um educador que esteja motivado a interagir

com os aspectos sociais, históricos e culturais, para assim promover uma nova forma de

trabalho, onde os agentes possam interagir nas construções dos elementos destacados.

Atualmente, nas instituições de ensino as disciplinas vêm sendo tratadas como áreas

específicas. O professor não pode e/ou não quer se comprometer com a disciplina do outro,

esquecendo-se, inclusive que algumas, por natureza são áreas afins. Tal fato instiga ao

questionamento sobre até onde as informações levadas aos alunos, dessa forma, seriam

realmente fontes de conhecimento. É para transpor esses conceitos que se destaca a

interdisciplinaridade. As atitudes interdisciplinares precisam vencer inúmeros obstáculos

epistemológicos como a resistência dos educadores, inércia dos sistemas de ensino, a

valorização cada vez mais acentuada das especializações, a pedagogia que só leva em

consideração a descrição e análises objetivas dos fatos, o não questionamento das relações

entre as ciências humanas e as ciências naturais.

Outro aspecto relevante é o fato de estabelecerem alguns consensos possíveis no meio das

diversificadas reflexões que se afloram sobre o tema, considerando a concepção de que o

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movimento pela interdisciplinaridade, apesar de algumas falhas conceituais, traz uma nova

proposta curricular com características inovadoras e necessárias quando se propõe a inter-

relação das diversas áreas do conhecimento e promove um processo do ensinar/aprender

mais significativo. Porém, Japisssu (1976) apresenta em suas reflexões as dificuldades de

concretizar uma metodologia interdisciplinar devido ao fato de ser um projeto difícil de ser

estabelecido com rigor, pois é vasto e complexo, e precisa que os professores dispostos a

assumi-la estejam impregnados de um “espírito epistemológico”.

Segundo Fazenda (1979, p. 8) a “interdisciplinaridade não se ensina, nem se aprende,

apenas vive-se, exerce-se e, por isso, exige uma nova pedagogia: a da comunicação”. Uma

de suas preocupações está relacionada à marca terminológica considerando que a

interdisciplinaridade recebe diferentes conceitos de interpretações.

Todos os benefícios dessa prática estão relacionados a dois termos em que se baseiam seus

argumentos: a integração e interação entre as disciplinas Entretanto se preocupa em

determinar os principais obstáculos, sendo o primeiro o desafio da organização hierárquica

das disciplinas, onde algumas são consideradas de excelência. O segundo aspecto é o

comodismo das escolas ao preservar a ideia de supremacia das ciências o que gera

comodismo dos professores. O terceiro ponto é a dificuldade em definir e seguir as etapas

de um método interdisciplinar, bem como trabalhar com a formação fragmentada dos

professores. Por isso, é necessário promover a construção de novos espaços e tempos

favoráveis ao trabalho em equipe.

Destaca-se porém, também é necessário assumir uma “atitude interdisciplinar”, que rompa

com os limites das disciplinas na construção de um conhecimento globalizante. Tal ação

está intrinsecamente ligada ao compromisso do professor, no envolvimento e

comprometimento com as ações práticas, na integração e estudo de aprofundamento teórico

e na postura ética que envolve o conhecimento. (FAZENDA, 1996).

Dessa maneira, o educador elimina a visão fragmentada para assumir uma postura integrada

com a realidade, compreendendo que sua área de formação não é suficiente para

compreender todo o processo ensinar/aprender. É necessário que aproprie das múltiplas

relações conceituais que sua área possa estabelecer com outras ciências, tornando o

conhecimento reconstrutível na medida em que alia sua especificidade dialeticamente por

meio de metodologias produtivas.

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1.1 Os desafios e perspectivas de uma atitude interdisciplinar

O enfrentamento das dificuldades apontadas pode sugerir modificações no sistema

educacional, pois a incapacidade de pensar uma complexidade é resultado do sistema

educativo que vivemos. A didática atual não possibilita a formação de um pensamento não

fragmentado, uma vez que essa forma de pensamento é fruto de uma didática tradicional.

Assim, os professores acabam reproduzindo exatamente o processo em que foram formados

em sua vida acadêmica ao considerar o saber (conteúdo) já produzido mais relevante que as

experiências que o aluno possa vir a adquirir.

Parte-se da premissa de que o diálogo, suposto pela autora, é na verdade o grande propósito

dessa atitude interdisciplinar que significa desenvolver uma relação com o outro e com o

próprio mundo, pois é necessário antes de tudo conhecer a realidade e fazer a conotação

com o conhecimento científico, isto é, a produção científica que tem por objetivo difundir

novas idéias. Esta relação baseia-se na relação com nossos pares que estão em sala de aula

e também aqueles que estão conosco no campo da pesquisa.

Neste contexto, a interdisciplinaridade torna-se um dos principais complementos no

conhecimento formal transmitido como uma nova dinâmica na metodologia aplicada. Essa

definição fica mais específica quando consideramos que todo conhecimento mantêm um

diálogo permanente com outros questionamentos de confirmação e de aplicação.

Atualmente surgem projetos que reivindicam uma visão interdisciplinar, sobretudo no

campo do ensino e do currículo. A discussão sobre interdisciplinaridade tem tido um espaço

importantíssimo na sociedade contemporânea, principalmente nas instituições educacionais,

embora para muitos professores pareça algo novo. Isto porque com a fragmentação do

conhecimento e a verificação da importância do diálogo entre as diferentes disciplinas para

compreender o mundo e o ser humano da atualidade, está sendo efetivado um grande

movimento de promoção da interdisciplinaridade. (GADOTTI, 1993).

A interdisciplinaridade pauta-se numa proposta de romper com as barreiras entre as

disciplinas, superando a compartimentalização do pensar transpondo para um trabalho

integrado do saber nos diversos campos do conhecimento. Propõe uma nova postura, uma

mudança de atitude frente ao contexto, “uma postura interdisciplinar”, que proporcionará

uma visão global e inclusiva. (FAZENDA, 1997).

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767ISSN 2177-336X

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Nas instituições de ensino constata-se que as disciplinas escolares são ensinadas, em geral,

de forma independente, o que conhecemos como disciplinaridade. Nesta dinâmica os

educandos não são instigados a perceberem os elos existentes entre os conteúdos ou entre

as questões do cotidiano. Um exemplo constatado por nós, enquanto professora de estágio,

foi observar que a matemática ensinada na escola não tem conotação com a matemática do

dia a dia do educando. Encontramos em sala de aula um menino, que mora próximo da

minha residência e nos finais de semana vende picolé e consegue ter uma relação

consciente com o sistema monetário, dando troco corretamente, mas não consegue resolver

as contas de “arme e efetue” que a professora passou na lousa. Isto porque a forma

metodológica como o conteúdo é mediado, é mais uma transmissão, não tem significado

para ele. Indagando a respectiva professora sobre o fato de ser mais adequado ela elaborar

um problema que envolvesse a realidade dos alunos para ser mais significativo ela

respondeu que era aula de matemática e precisava trabalhar com números.

Japiassu (1976) define como ciência a disciplina, daí a precisão terminológica para

disciplinaridade, que seria a exploração do universo desta ciência. Portanto, a

interdisciplinaridade se distingue por não se limitar às metodologias de apenas uma ciência,

tendo por objetivo o conhecimento unitário e não fragmentado, como encontramos nas

instituições de ensino. Neste caso, podemos afirmar que a disciplinaridade, característica

dos currículos escolares, prejudica a formação integral e o conhecimento científico dos

sujeitos ao não possibilitar conhecimentos úteis e a capacidade de pensar globalmente os

problemas que lhe são impostos. Neste sentido a interdisciplinaridade torna-se relevante ao

considerarmos que o conhecimento especializado precisa ser submetido a análises críticas.

A multidisciplinaridade e a pluridisciplinaridade são confundidas algumas vezes com a

interdisciplinaridade por trabalharem constituídas por duas ou mais disciplinas, se tiver a

escolha de um tema em comum ou cada professor contribui com o conhecimento específico

de sua área. A integração de disciplinas pode até ter sucesso na sala de aula, pois os alunos

começam a se deparar com uma nova metodologia e conseguem entender o conteúdo de

uma forma mais ampla, mas não pode ser confundida, portanto existe uma diferenciação

entre os dois temas abordados.

O último grau de interação apresentado, a transdiciplinaridade, também é citado por

Japiassú (1976) para definir uma etapa superior à interdisciplinaridade, onde haveria um

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sistema total, sem limites nas fronteiras disciplinares, onde as disciplinas dialogam não

somente entre elas, trocando suas informações de caráter científico, mas também com o

conhecimento socialmente produzido pelos alunos e professores, quase uma utopia,

principalmente pela falta de determinação de um conceito em comum para a

interdisciplinaridade. “Não podemos alimentar ilusões: ainda está por ser construída uma

teoria interdisciplinar”. (p.81).

Destaca-se que a fragmentação do conhecimento, conhecida nas escolas por “disciplinas”

tem prejudicado o processo educacional, pois se constata que o conhecimento é separado

por inúmeros conteúdos relativamente estanques, apresentados de forma desvinculada e

desconexa. O que ocasiona perda de sentido para os educandos que não conseguem

discernir as semelhanças e relações entre as diferentes áreas do conhecimento.

Por mais que exista a vontade de mudança nas práxis do professor ainda prevalecem

posturas tradicionais em que é simplesmente o transmissor de informação para seu aluno. O

processo de ensino-aprendizagem necessita de um mecanismo mais dinâmico e integrador

que favoreça as relações pedagógicas entre professores e alunos. Atualmente a função do

professor não é mais unicamente ser o provedor do conhecimento. É necessário que assuma

uma postura de mediador da aprendizagem, provocando e questionando o aluno, instigando

ao sucesso de suas buscas e consequentemente suas respostas desejadas. As escolas

precisam ser ambientes adequados para o processo ensinar/aprender por meio de uma

conduta social que tenha qualidade e um campo fértil para aprendizagens não somente de

ensino, mas também de habilidades e respeito mútuo entre seus sujeitos.

O início da atitude interdisciplinar está basicamente na ação, de acordo com a interação e

integração das disciplinas e também entre os sujeitos das ações educativas. Isso não

significa o fim das disciplinas, mas uma relação harmônica entre as mesmas. Tendo como

objetivo desenvolver ações cooperativas e reflexivas. Consequentemente alunos e

professores tornam-se sujeitos de suas ações e, comprometem-se num processo de

investigação, redescoberta e construção coletiva de conhecimentos. Pois ao dividir ideias,

ação e reflexões cada integrante do grupo tornam-se ativo no processo.

A partir dessas colocações é essencial que os conteúdos ministrados em cada disciplina

sejam considerados como instrumentos culturais, necessários para a formação global.

Fazenda (1997) afirma que é necessário conhecermos como os conteúdos nasceram, se

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769ISSN 2177-336X

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desenvolveram e são estudados. A interdisciplinaridade beneficiará as ações pedagógicas

que ampliam as capacidades dos educandos em expressar-se por meio das múltiplas

linguagens, posicionar-se diante das informações e interagir ativamente com o meio físico e

social.

Dessa maneira, torna-se essencial a elaboração de meios que atue contra o saber

fragmentado. Tendo por objetivo à recuperação da unidade humana pela passagem de uma

subjetividade para uma intersubjetividade e, assim sendo, recupera a ideia primeira de

cultura (formação do homem total), o papel da escola (formação do homem inserido em sua

realidade) e o papel do homem (agente das mudanças do mundo). (FAZENDA, 1996).

A discussão sobre interdisciplinaridade mostra a educação numa nova maneira de resgatar o

sentido e o fazer ensinar na prática pedagógica. Durante décadas o conhecimento foi

construído e difundido sem ter sido revisado ou contestado. Para o professor era imbuída a

tarefa de memorizar o conteúdo transmitido de forma fragmentada, em sua disciplina.

Consequentemente tínhamos um conhecimento limitado e desassociado da realidade,

compondo um panorama de informações desarticuladas e até mesmo antagônicas. (LUCK,

2007).

2 Caminhos Metodológicos

Constatamos por meio de levantamentos bibliográficos, análises e atividades desenvolvidas

nas instituições de ensino, ao longo de nossa pesquisa no Curso de Doutorado que a

abordagem interdisciplinar está sendo pensada e existem alguns encaminhamentos

inseridos nos planejamentos. Os professores estão buscando caminhos para sua aplicação

na organização do trabalho pedagógico, pois acreditam que ela torna-se fundamental na

medida em que busca a interação de conceitos e métodos, o que conduz o educando a uma

visão mais próxima do movimento, da totalidade e das contribuições da realidade, ou seja, é

uma ação pedagógica interativa e integrativa entre professor, aluno e os conhecimentos,

dentre eles os do senso comum e os científicos.

Podemos afirmar que se a compartimentalização dos conhecimentos, que impera

atualmente em nosso sistema de ensino, for substituída pela interdisciplinaridade será uma

nova forma mais criativa de institucionalizar e elaboração de novos conhecimentos nas

escolas, nos currículos e campos de pesquisas. O trabalho interdisciplinar permite um olhar

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770ISSN 2177-336X

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universal sobre o conhecimento, o que permite possuir habilidades para construir as

respostas possíveis ou necessárias a cada contexto. Sendo assim, é possível repensar nossa

vida, nossa prática profissional, nossas relações, nossas circunstâncias, lidar com as

questões cotidianas de outras maneiras, criar outro cotidiano, e principalmente, construir

não apenas uma nova prática profissional, mas uma nova realidade, para todos os agentes

do processo educacional.

3 Superação na fragmentação do conhecimento

Atualmente, a educação básica está organizada na separação de anos e níveis de ensino.

Cada ano, por sua vez, está dividido em disciplinas, que por sua vez possuem divisões de

conteúdos. O currículo escolar organiza essa separação e determina quais disciplinas serão

lecionadas em cada ano e cabe ao professor cumprir o que está determinado. A organização

curricular fragmenta o conhecimento por meio das disciplinas e não possibilita um melhor

entendimento pelos alunos.

A instituição de ensino precisa ser considerada ao mesmo tempo um instrumento de acesso

do sujeito à cidadania como também a um ambiente de vivências para a vida. Sendo assim,

sua organização curricular, pedagógica e didática precisa contemplar as diversas formas de

ritmos, culturas, interesses, concepções, dentre outros aspectos que diferem o Ser. Esta

instituição social, onde inúmeras vozes são ouvidas não pode ignorar a amplitude do

conceito de ciência, que por sua vez não delimita sua relação entre política, economia,

cotidiano, artes, entre outras. Consequentemente tal envolvimento influencia o processo de

ensino-aprendizagem, sendo necessário que o educador assuma uma atitude interdisciplinar

frente ao conhecimento para ser possível uma melhor compreensão de mundo pelos seus

educandos. (POMBO, 2003).

Assumir tal atitude significa romper com os paradigmas da própria formação, pois a

interdisciplinaridade somente é possível a partir do momento em que o educador for capaz

de partilhar o domínio, que considera, do “seu” saber e tiver a ousadia de aprender numa

relação de troca e aprendizagem com seus pares. Esta concepção interdisciplinar já vem

sendo apresentada como uma proposta emergente na quebra de paradigmas na teoria das

múltiplas inteligências de Gardner, no construtivismo piagetiano, na pedagogia libertadora

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de Paulo Freire e inúmeros outros estudiosos que demonstram a necessidade de uma visão

holística na educação.

Evidencia-se a desconexão na relação entre educador e educando, teoria e ação, ideia e

realidade, favorecendo a despersonalização do processo pedagógico. Contrapondo a estes

aspectos, a interdisciplinaridade está em busca do conhecimento holístico. Significa que

tenha origem em várias áreas, ou seja, vai em sentido contrário do que atualmente está

exposto nas escolas: um conhecimento centrado somente em uma área. Tem por objetivo

garantir um novo posicionamento diante do conhecimento, em busca do ser como pessoa

integral, garantindo a elaboração do conhecimento global rompendo com os limites das

disciplinas. Mas para isso segundo Fazenda (1997) será necessário que o educador assuma

uma postura interdisciplinar com atitudes de inclusão.

Existem grandes avanços também para a escola que possui a interdisciplinaridade como

eixo de trabalho, ela torna sua proposta pedagógica mais ágil e eficiente, seus alunos

assumem uma postura com mais responsabilidade, o que diminui a indisciplina e toda a

comunidade escolar trabalha em colaboração. Outro desafio é a metodologia de trabalho,

mas para isso é necessário atitude e método envolvendo integração de conteúdos, deixando

de ser ministrado de forma fragmentada para uma concepção unitária do conhecimento,

principalmente porque o processo ensino-aprendizagem é centrado na concepção de que

aprendemos durante toda nossa vida, logo significa articularmos o saber, a informação, a

experiência, meio ambiente, escola, comunidade, dentre outros aspectos que envolvem o

processo educacional. (FAZENDA, 1999).

Significa que o professor tem papel relevante porque precisa ser o alicerce do aluno,

ajudando-o a descobrir, a reconstruir e atuar frente ao conhecimento adquirido. O fazer

pedagógico deve ir além de uma visão fragmentada e descontextualizada do ensino,

tornando a aprendizagem mais atrativa por meio da interação professor/aluno,

aluno/professor.

A prática pedagógica por meio da interdisciplinaridade vislumbra a construção de uma

escola mais participativa e decisiva na formação do sujeito social. O seu objetivo atual é

favorecer a vivência de uma realidade global que interage com as experiências do cotidiano

do educando, favorecendo sua autonomia intelectual e moral. Mais do que interagir,

interdisciplinaridade é a ação de partilhar as experiências e conhecimentos entre os seres

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humanos, se houver troca de vivências e conhecimentos das diferentes áreas do saber, o que

possibilita a mudança tanto do indivíduo como da coletividade. Esta relação entre a

autonomia intelectual e interdisciplinaridade é imediata. Segundo Piaget (1996) o sujeito

não espera que o conhecimento seja transmitido a si por um ato de caridade, mas sim

aprende por meio de suas próprias experiências sobre os objetos do mundo, organizando

seu pensamento e construindo suas categorias.

Quando refletimos sobre a formação e prática interdisciplinar o termo mais utilizado é

“desafio”, por ter em sua proposta a realização do encontro das interfaces dos diferentes

saberes. Também porque traduz o exercício permanente de interação entre seres – saberes –

fazeres, com as devidas subjetividades inerentes a cada uma.

A educação precisa abarcar a coletividade do contexto onde atua. Discorrer sobre cultura

significa destacar suas semelhanças e diferenças, pois cada grupo é determinado por ela, e

cabe ao professor a valorização e destaque à diversidade cultural encontrada em seu âmbito

de trabalho, significa ter olhares diferenciados sobre seus educandos.

Fazenda (1993) aponta que outro desafio é a formação de professores, não se pode definir

interdisciplinaridade como simples junção de disciplinas, mas sim considerá-la como

atitude ousada em busca do conhecimento, considerando os aspectos que envolvem a

cultura do contexto onde se formam e também em que atuarão. Destaca que os cursos de

formação, geralmente, são ministrados de maneira errônea porque simplesmente trabalham

perguntas “intelectuais” que já sabem como serão respondidas. Sugere que o professor faça

perguntas “existenciais” a seus alunos para despertar respostas inesperadas e aflorar seus

talentos. Significa explanar questões importantes de forma simples e significativa para que

o educando tenha a oportunidade de construir sua argumentação. Ressalta que os currículos

organizados por disciplinas proporcionam aos alunos adquirirem acúmulo de informações e

não o pensar interdisciplinar que aborda uma dimensão libertadora possibilitando o

enriquecimento da nossa relação com o outro e também com o mundo.

Augusto (2004) desafia os professores a serem os protagonistas na implantação e

implementação de práticas interdisciplinares nas instituições de ensino, ao afirmar que

somente por meio dessa atitude será possível ao aluno perceber as relações entre as

disciplinas escolares, possibilitando um conhecimento mais abrangente, exigidos na

contemporaneidade.

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Considerações Finais

Atualmente a própria sociedade contemporânea tem exigido mais investimento na

educação, isso significa refletir sobre a necessidade de reformas educativas e propostas de

mudanças na formação do professor, enriquecida com debates sobre a ética profissional no

exercício da docência. Tal fato consequentemente trará evolução e transformações na

estrutura organizacional e funcionamento das instituições de ensino, interferindo

diretamente nas suas propostas curriculares, domínio teórico e atitudes metodológicas.

Não queremos aqui reduzir as reformas educacionais e a profissionalização da carreira

docente como o único caminho para a solução dos problemas socioeconômicos,

institucionais e culturais que condicionam atuação docente, mas é necessário que tenhamos

a autonomia e o poder de decisão no coletivo das instituições de ensino.

Acreditamos que quando se assume uma atitude interdisciplinar consequentemente ocorre

um movimento em benefício do processo ensinar-aprender ressignifcando a prática

pedagógica. Considerando que temos grandes problemas sociais, econômicos e ambientais

é essencial almejarmos um ensino, mais humano, que parta da integração e oriente melhor

os educandos a usufruírem com competência os conhecimentos intermediados pela escola,

tornando-se um profissional e, principalmente, cidadão.

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